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Resumidamente, porque somos

influenciáveis, excessivamente
confiantes e insistimos em fazer
várias tarefas ao mesmo tempo. Co-
mo se não bastasse, nossos olhos
não veem tudo o que está em nossa
frente e nossa memória inventa e
distorce fatos, afirmam cientistas.
Difícil aceitar, em uma sociedade
em que as falhas e erros não são
bem tolerados e a sensação de estar
certo em uma discussão é um de-
leite. Mas as explicações científicas
vão na contramão dessa cultura do
acerto. Sim, errar, além de huma-
no, é inevitável. "Temos falhas de
design e, ainda por cima, achamos
que estamos acima da média", diz
o jornalista norte-americano Jose-
ph Hallinan, vencedor do prêmio
Pullitzer e autor do livro Por que
cometemos erros?, lançado em 2010.
Essas falhas, tão impregnadas em
como entendemos o mundo, são
parte do nosso aprendizado. Há
quatro anos debruçado sobre o
assunto, Hallinan é um dos novos
adeptos do que começa a ser chama-
do de "errologia", ou o estudo dos
nossos tropeços. O termo foi cunha-
do por Kathryn Schulz, autora do
livro Being Wrong (a ser lançado no
Brasil em maio), no qual faz uma
digressão sobre o papel do erro na
sociedade. A obra, que atingiu o to-
po da lista dos livros de não-ficção
mais vendidos da livraria on-line
Amazon, defende que entender os
mecanismos das falhas no traz be-
nefícios. "Os erros representam um
motor de inovação. Lidar melhor
com eles nos faz aprender mais e ser
mais tolerantes", diz Kathryn.
Em ciência cognitiva, "errando é
que se aprende" não é apenas um
dito popular. "Os processos que
nos levam a aprender e os que nos
levam a cometer erros derivam do
mesmo recurso mental", afirma a
psicóloga cognitiva Lilian Milnitsky
Stein, professora da Pontifícia Uni-
versidade Católica do Rio Grande
do Sul (PUC-RS) e pós-doutoranda
na Universidade de Barcelona, na
Espanha. Um dos motivos para isso
acontecer é que na base do nosso
conhecimento está a indução, tipo
de aprendizado a partir da repeti-
ção de padrões já armazenados em
nosso cérebro. Se uma criança vê
meia dúzia de vezes um interruptor
ser apertado e a luz se acender em
seguida, ela gravará em sua mente
que aquele tipo de botão serve para
acionar a lâmpada, mesmo quan-
do avistar um interruptor diferente
do que está acostumada a usar. É
uma conclusão precipitada, mas
que funciona na maior parte das
vezes e agiliza o aprendizado (ca-
so contrário, a cada vez que visse
um interruptor novo ela o testaria
diversas vezes até entender sua fun-
ção). O palpite baseado em experi-
ências prévias dispensa essa perda
de tempo. Da mesma maneira, você
não aprendeu a falar português por-
que alguém lhe explicou as regras
gramaticais quando era bebê, mas
porque identificou padrões nas ar-
ticulações de palavras e passou a
replicá-los, ainda que com erros nas
primeiras tentativas.

PILOTO AUTOMÁTICO
Conforme esses padrões são apre-
endidos, não precisamos analisar
situações corriqueiras em detalhes.
Basta encaixá-las nas generaliza-
ções já criadas no cérebro. Um
exemplo disso é que deciframos
sem muita dificuldade o que está
escrito em frases como "N0554
C 4 B 3 Ç 4 CONS3GU3 F4Z3R
C01545 1MPR35510N4ANT35".
Você não lê letra por letra, mas
procura os padrões de palavras
armazenados em sua cabeça e, ra-
pidamente, entende o que deveria
estar escrito, e não o que realmente
está. Essa forma de lidar com a in-
formação faz com que, mesmo com
poucos dados, consigamos deduzir
muitas coisas. "Logo que vemos
um objeto, tentamos encaixar seus
dados preliminares nos protótipos
já formados", explica João de Fer-
nandes Teixeira, Ph.D em ciência
cognitiva na Tuffts University, nos
Estados Unidos.
O processo quase sempre funcio-
na. Quase. A associação automática
pode gerar erros como o da auxiliar
de enfermagem da Santa Casa de
Misericórdia. Os frascos de soro
e de vaselina eram praticamente
idênticos, o rótulo da mesma cor e
que ocorre e que, como na maioria rar muitos para desenvolver nossa
dos casos a radiografia não mos- cognição. Se você ficar atento aos
tra evidências da doença, o padrão estímulos que vêm do pé, da mão,
de raio X "saudável" pode ser acio- de todos os lugares, não consegue
nado automaticamente quando o ter foco", afirma Barbara Tversky,
médico analisa um exame em que Ph.D em psicologia e professora
há algo errado. "As expectativas da Universidade de Stanford, nos
têm um efeito forte sobre a percep- Estados Unidos.
ção visual. Frequentemente nossa
cognição perde alvos que não são DIGA-ME C O M Q U E M A N D A S
coisas comuns", diz JeremyWolfe, Os padrões guardados em nossa
Ph.D em oftalmologia e radiologia mente podem também mudar o
pela Universidade de Harvard, nos conteúdo do que vemos. Um dos
o líquido tem a mesma aparência. Estados Unidos. maiores aprendizados da "errolo-
"Parece ter sido um caso típico de O estudo sistemático desse tipo gia" é que nossa percepção não de-
erro de projeção de padrão. Ela po- de erro faz com que médicos criem pende só dos sentidos. Há algumas
de realmente ter olhado o frasco uma série de procedimentos para décadas, cientistas cognitivos vem
errado e percebido o correto em seu evitá-los. Mas será que cada um demonstrando que criamos "estere-
cérebro", diz Fernandes Teixeira, de nós consegue aprender com os ótipos" mentais que mudam nossa
também professor da Universidade erros mais triviais? Em boa par- percepção. Se alguém lhe apresenta
Federal de São Carlos (UFSCar). A te das vezes, não. É só pensar no uma pessoa dizendo que é um ca-
Santa Casa entendeu isso e, uma que os pesquisadores chamam de minhoneiro, por exemplo, você ten-
semana após a morte da paciente, "problema da cerveja na geladei- de a achar que essa pessoa é mais
mandou trocar etiquetas e rótulos ra". Você pode procurar a latinha na pesada do que se lhe dissessem que
de frascos de seus remédios nos 39 prateleira em que sempre a deixa. é um dançarino, constatou-se. Em
hospitais da rede. A assistente de Se ela foi mudada de lugar, você estudos que começaram em 2005,
enfermagem, no entanto, foi indi- pode ficar um tempão procurando o Ph.D em psiquiatria e neurociên-
ciada por homicídio culposo. algo que está bem debaixo do seu cia Gregory Berns, da Universidade
nariz, ainda que fora do local de de Emory, nos Estados Unidos, co-
O L H O U M A S N Ã O VIU hábito. "Você não procura o objeto locou na mesma sala quatro atores
Esse tipo de falha está longe de ser em si, mas os padrões que estão fingindo ser voluntários e um único
exceção. Pesquisadores da Clínica armazenados no seu cérebro", diz voluntário real. Deu a todos a tarefa
Mayo, no Arizona, Estados Unidos, Wolfe. Essa tendência a encaixar o de comparar formas geométricas
deixaram a comunidade médica em mundo em padrões já conhecidos é simples e dizer se eram iguais. Os
estado de alerta ao estudar, em responsável pela chamada cegueira atores davam a resposta incorreta
1982, exames de raios X antigos de mudança. Algumas informações antes de o voluntário falar, tentan-
de pacientes que desenvolveram visuais são sumariamente ignora- do induzi-lo ao erro. Funcionou.
câncer de pulmão. O estudo mos- das simplesmente porque não te- Quando os voluntários estavam
trou que, em 9 0 % dos casos, os mos como lidar com tudo o que ve- sozinhos, acertavam 9 0 % das res-
tumores já eram visíveis antes do mos ao mesmo tempo. "Nosso cé-
diagnóstico, e a falta de identifica- rebro recebe milhares de instintos
ção fez com que progredissem. O a todo momento, precisamos igno-

rentemente sobre as falhas, para gue tratar os outros e a si mesmo


preveni-las ou abraçá-las. com mais compreensão e perdão.
Sim, está relacionado à humildade Temos de entender que não comete-
e a metacognição — saber pensar mos erros porque somos maus. Cul-
Erros são embaixadores da informa- sobre como você mesmo entende o turalmente pensamos quequem erra Se você pegar dois garotos de 18
ção. Quando acontecem, significa mundo. Artistas, por exemplo, têm é estúpido, preguiçoso ou intelectu- anos, mandar um para a faculdade
que temos uma crença sobre o mun- uma atitude mais receptiva porque almente menor. Isso não é verdade. de ciências políticas e outro para a
do que colapsa. Ao ver que nossa as falhas são parte do processo Erramos por causa da estrutura da de engenharia, verá que, depois de
percepção não correspondia à reali- criativo. Já para políticos, hesitar, nossa mente, nosso organismo é alguns anos, ambos têm uma atitu-
dade, podemos mudar. Quando uma mudar de idéia e reconhecer um erro feito para errar. Se conseguir supe- de diferente sobre o erro. Isso sig-
das hipóteses que estão por aí falha, não faz parte do metiê. Se ele agir rar o seu instinto de sentir vergonha nifica que podemos, como cultura,
cientistas propõem outra e fazem o dessa forma, provavelmente será por causa de um erro, de ignorá-lo escolher que ideias queremos ou
conhecimento avançar. punido nas urnas. ou culpar outras pessoas, conse- não passar.
postas. Quando acompanhados pe- para interpretar o que aconteceu.
lo atores, acertavam apenas 5 0 % . "Em vez de simplesmente lembrar
Um scanner ligado à mente dos o que ocorreu, preenchemos as la-
pesquisados durante o teste mos- cunas das recordações usando pa-
trou que, conforme os atores iam drões cerebrais já armazenados",
emitindo opiniões erradas, áreas diz a psicóloga Barbara Tversky.
relacionadas à percepção visual no O mecanismo funciona para dar
cérebro do voluntário alteravam pa- sentido ao que está sendo reme-
drões seu funcionamento. "É como morado em determinado contexto.
se a imagem real e a da imaginação Nossa memória é parcial — e pode
(criada quando você ouve as opi- ser modificada de acordo com o
niões) se misturassem", sugere momento em que a retomamos. A
Berns. O nazista Joseph Goebbels produtora de TV Bruna Pellegrini,
não estava errado. Uma mentira de 28 anos, percebeu esse tipo de
contada diversas vezes sobre algo engano recentemente. Filha de um
pode, portanto, mudar nossa opi- médico de pronto-socorro, ela teve
nião sobre isso. E até criar no cére- sarna quando criança. A doença, to-
bro um padrão que muda a maneira dos os amigos de Bruna sabiam, foi
como enxergamos a realidade. "Não transmitida pelo pai, que havia sido
é apenas uma analogia, as opini- contagiado no hospital. Há cerca
ões de outros literalmente alteram de dois meses, ela contou essa his-
a nossa percepção e o processamen- tória para o namorado na frente da
to de informações na mente", diz família e foi interrompida por uma
Berns. Para cientistas sociais, esse gargalhada. "Meu pai perguntou
fenômeno da contaminação de opi- de onde eu tinha tirado isso. Disse
niões também pode ser atribuído que peguei a sarna na escola, de um
à vontade de ser aceito. "Há uma coleguinha, e que ele nunca havia
dificuldade em ser diferente. Em contraído a doença. Fiquei pasma.
pesquisas de mercado, por exemplo, Tinha certeza absoluta, contei essa
os entrevistados tendem a repetir história durante 20 anos."
a resposta dada por outras pessoas
anteriormente", afirma Francirosy
Ferreira, doutora em antropologia
pela Universidade de São Paulo.

REESCREVENDO O PASSADO
O alemão Ulric Neisser guardou
bem na memória o dia 7 de dezem-
bro de 1941. Ele tinha 13 anos e
morava nos Estados Unidos quan-
do o porto de Pearl Habor foi ata-
cado pelos japoneses na Segunda
Guerra. Durante décadas, podia
recordar claramente o momento
em que o jogo de beisebol que es-
cutava no rádio foi interrompido
para anunciar o bombardeio. Qua-
renta anos depois, já com diploma
de doutorado em ciência cognitiva Essas memórias falsas são estu-
por Harvard, Neisser percebeu que dadas por dezenas de especialistas
havia algo estranho com essa lem- para evitar um erro particularmen-
brança: as temporadas de beisebol te cruel. De acordo com a ONG
nunca foram jogadas em dezembro. Innocence Project, há pelo menos
Era impossível que aquela recor- 175 pessoas condenadas por engano
dação, tão viva, fosse verdadeira. nos Estados Unidos por conta de
A descoberta fez o pesquisador se memórias falsas. São casos como o
transformar em um dos pioneiros de Ronald Cotton, que cumpriu 11
a estudar memórias falsas. anos de prisão por um estupro que
Quanto mais fraca a recordação, não cometeu. Ele só foi solto de-
maior a chance de usarmos infor- pois que um exame de DNA provou
mações que nada têm a ver com ela que a vítima, que havia identificado
Cotton duas vezes como o agressor, tados Unidos, mostrou que, quan- ESQUECI A SENHA
estava errada. "Uma impressão fal- do tinham de recordar as notas Você pode até não identificar lem-
sa pode ser incorporada pela pessoa do colégio, imaginavam sempre branças que foram distorcidas com
num momento de tensão. Conscien- um desempenho melhor do que o tempo, mas certamente a memó-
te disso, a polícia hoje trabalha para de fato haviam alcançado. A nota ria já lhe faltou em algum momento
evitar que isso aconteça", diz Bar- A teve 8 9 % de lembrança contra que precisava. De acordo com jornal
bara Tversky, que já deu dois pare- apenas 23% da nota D. "Isso expli- New York Times, a cada semana pelo
ceres em julgamentos invalidando ca por que apostadores continuam menos mil leitores esquecem seus
testemunhos que poderiam estar na jogatina, mesmo após grandes códigos para acessar o conteúdo
viciados por memórias inventadas perdas. Na memória deles, suas on-line. A culpa, em boa parte dos
ou distorcidas. perdas geralmente são bem me-
Um experimento com estudan- nores do que a realidade mostra",
tes universitários de Ohio, nos Es- diz Joseph Hallinan.
casos, é do contexto (ou da falta ERROS EMOCIONAIS rotransmissores, como adrenalina
dele). Quando a senha não remete Outra fonte de enganos e falhas em e cortisol, que podem afetar profun-
a nada conhecido, a memorização é nosso comportamento está ligada à damente nossa capacidade de aten-
mais difícil. Vale o mesmo princípio anatomia cerebral, por assim dizer. ção e de cognição seletiva", afirma
da cerveja na geladeira: se o que A mesma região do cérebro que res- Leonardo Ferreira Almada, Ph.D
tentamos lembrar não se encaixa ponde pela percepção e pela aten- em neurociência afetiva e professor
bem nos protótipos formados pelas ção, o córtex pré-frontal, também da Universidade Federal de Goiás.
repetições cotidianas, a chance de está envolvida no processamento Segundo o especialista, essa con-
esquecer aumenta. de emoções. Por conta disso, a com- fusão cerebral ocorre porque nosso
Que o diga o cirurgião-dentista preensão do mundo e a propensão a organismo passou por um processo
Thomas Paschoarelli, de 24 anos, errar e aprender estão intimamente evolutivo para identificar situações
de São Paulo. Famoso entre os ami- ligadas ao que sentimos. A estudan- de perigo, de luta ou de fuga. Em
gos por sua capacidade de esquecer, te de medicina Cibele Matsuura, um contexto de batalha em que
ele um dia apagou da memória que de 26 anos, descobriu isso da pior aparece a ansiedade, faria sentido
havia ido de carro encontrar os co- forma. Sempre entre as melhores inundar o cérebro com esse tipo de
legas. E voltou a pé para casa. "No alunas da classe no ensino médio, substâncias para ficar alerta. Ago-
dia seguinte, meu pai me pediu o ela chegou a prestar vestibular co- ra, se isso acontece numa situação
carro e não o encontrou na gara- mo treineira no 2º colegial e teria em que é preciso usar o raciocínio
gem. Tinha ficado na frente do bar passado com os pontos que conse- ou relembrar, o cérebro falha.
em que eu estive na noite anterior. guiu. Entretanto, no ano seguinte, Em alguns casos, esse tipo de
Como nunca ia de carro para lá, na seus pais perderam o emprego, ela apagão, que nos torna irracionais
minha cabeça fazia sentido voltar a terminou o namoro e sua mãe se por instantes, está ligado a fatores
pé", diz Paschoarelli. Isso também mudou para trabalhar no Japão. O genéticos. É o que os especialistas
explica por que, embora sejamos resultado é que não passou na prova sintetizam como cegamento do in-
particularmente bons em reconhe- para entrar da faculdade — nem nos divíduo. A pessoa perde a capacida-
cer rostos, esquecemos de nomes. quatro anos seguintes. "Até o 2º de de controle racional da situação
"Não só nomes, mas o formato da colegial, a minha menor nota era e, quase inevitavelmente, erra. É o
mão ou outras partes do corpo. 9. Mas tive um choque emocional que sente a jornalista Camila Bru-
Não há um sentido prévio para e aquilo me desestabilizava na hora nelli, de 27 anos, quando passa por
que a gente guarde esse tipo de da prova, dava branco. Eu queria um de seus acessos de explosão,
lembrança", afirma Martin Cam- lembrar de alguma coisa, mas não que já resultaram em agressão ao
marota, pesquisador do Centro de conseguia", conta a estudante, que namorado e escândalo público.
Memória da PUC do Rio Grande fez tratamento com psicólogo antes "Meus sentidos desaparecem, pas-
do Sul. Da mesma forma como se- de passar na Faculdade de Medici- so por cima do que tiver na frente
leciona os estímulos aos quais da- na de São José do Rio Preto (SP). e sempre acabo fazendo algo que
rá atenção, o cérebro seleciona as Nos casos de muita ansiedade, não queria", diz a paulistana, que
lembranças que serão guardadas e esse "branco" é comum. "Ocorre passou a tomar antidepressivos pa-
prioriza o que é essencial. uma liberação significativa de neu- ra se controlar. Esse problema "é

EXERCÍCIO CONTRA ANSIEDADE NÃO PERCA O B J E T O S VALIOSOS


Se a sua mente trava fazendo você errar em Cientistas que estudaram como guardamos
momentos importantes, corra, pedale, pratique senhas e escondemos objetos preciosos
esportes. "O exercício físico aumenta a disciplina e chegaram à conclusão de que a melhor estratégia
nossa capacidade de atenção seletiva. Ele também está em uma ação simples: escolha rápido. Tentar
libera hormônios com forte teor ansiolítico (que "cientificamente" pensar em um esconderijo
alivia a ansiedade)", diz o pós-doutor em psiquiatria ultrassecreto ou em uma senha à prova de tudo
Leonardo Almada. Em casos mais graves, psiquiatra. leva as pessoas a esquecerem mais facilmente.
tão biológico como ter propensão de scanners analisando suas ondas usar um bloquinho de anotações
à hipertensão", diz Almada. cerebrais, o que não parece muito também ajuda a depender menos
viável num futuro próximo." da memória e, consequentemente,
PREVENIR ERROS Se não dá para eliminar a falha, a errar menos (veja quadro abaixo).
Todos esses avanços no conheci- é possível tomar algumas precau- "Com checklists de perguntas obri-
mento de nossas falhas levantam ções para que ela não aconteça. gatórias de médicos a pacientes,
uma questão: é possível fazer com Ou entender que nossa mente não hospitais americanos conseguiram
que cessem? O consenso entre os é 100% confiável na hora de tomar diminuir o erro em até 47%", co-
cientistas é que não há como pôr decisões ou bater o martelo sobre menta Hallinan. Para o psicólogo e
um fim a isso, uma vez que o erro qualquer assunto. Um pouco de hu- autor do best-seller Positivamente
está intrinsicamente ligado à nossa mildade ajuda. Uma pesquisa com Irracional, Dan Ariely, errar menos
capacidade de aprender rápido, por mais de 2 mil gerentes de diversas tem conexão com a capacidade de
palpites que provavelmente (mas empresas revelou que 9 9 % deles evitar situações em que as emo-
nem sempre) estão certos. Entre- têm um nível de confiança em seu ções podem nos confundir. "Em
tanto, estudos de ponta mostram conhecimento acima daquilo que um certo estado emocional, temos
que podemos prever quando tipos realmente sabem. De acordo com o diferentes prioridades e desejos
simples de falhas ocorrem. Junto autor, o holandês Paul Schoemaker, rápidos que precisamos cumprir,
com outros neurocientistas, o ale- Ph.D em estudos da decisão huma- como quando vamos ao supermer-
mão Markus Ullsperger conduziu na e professor da Universidade da cado com fome", diz Ariely.
pesquisas (a última delas neste ano) Pensilvânia, nos Estados Unidos, Reconhecer que as falhas fazem
que analisaran ondas cerebrais esse engano tem muitas razões. parte do aprendizado também nos
das pessoas e conseguiram prever Além da tendência a esquecer erros ajuda a lidar com elas. Ou, ao menos,
quando elas iriam falhar em ativi- do passado, quanto mais informa- aceitá-las como um mal necessário
dades monótonas, como digitar um ções reunimos sobre algum assun- à evolução pessoal em vez de buscar
texto, por exemplo. "Identificamos to, mais certos estamos do nosso a perfeição constante. Passamos a
redes neuronais relacionadas a es- conhecimento naquele campo. vida acreditando estarmos certos
sas ações. Quase 30 segundos antes Além disso, o hábito cada vez mais a respeito de tudo, de convicções
de a pessoa cometer um erro, a ati- comum de desempenhar muitas intelectuais a julgamentos sobre
vidade nessas redes cai, enquanto tarefas ao mesmo tempo aumenta outras pessoas, por mais absurdo
em outras partes do cérebro, rela- f nossa chance de erro. O professor que isso possa parecer quando re-
cionadas ao relaxamento, a ativida- de Harvard Daniel Gilbert, Ph.D fletimos a respeito, diz a autora do
de aumenta", diz Ullsperger. Ainda em psicologia cognitiva, mostrou termo "errologia", Katryn Schulz.
não há uma aplicação prática para recentemente que ser interrompi- "Não é o caso de parar de errar,
essas conclusões. "Seria possível do logo após a aquisição de uma mas de admitir que está errado.
identificar quando um controla- informação pode nos levar a formar Sem sentir culpa por isso."
dor de vôo vai errar e retirá-lo da essas impressões falsas.
atividade nesse momento", diz o Introduzir no cotidiano ações
pesquisador. "Mas precisaríamos simples, como listas de tarefas ou

SE QUER ACERTAR. U M A COISA DE CADA V E Z E S C A P E DAS ARMADILHAS DO MARKETING


Ler milhares de notícias que chegam a todo momento atrapalha. Marqueteiros já estudaram centenas de "brechas" cerebrais
O psicólogo Daniel Gilbert, de Harvard, mostrou que a nossa para mudar a sua percepção no momento da compra. O
primeira reação com relação a qualquer informação após adquiri- truque, segundo Dan Ariely, é conhecer o seu lado irracional
la é aceitá-la como verdadeira. Só alguns momentos depois e driblar as pseudonecessidades criadas na hora que você
conseguimos refletir se ela faz sentido. A interrupção por outro avalia ser importante uma coisa que não precisa. Quando for
estímulo (twitter, facebook etc.) após se informar faz com que a ao supermercado, por exemplo, não compre com fome, vá
gente perca o senso crítico e cometa mais erros de avaliação. com dinheiro contado e sem cartão de crédito.

Fonte: Galileu, São Paulo, n. 276, p. 38-47, abr.. 2011.

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