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INQUÉRITO POLICIAL

ÍNDICE
1. INTRODUÇÃO.....................................................................................................................4
Investigação Preliminar......................................................................................................................................................4
Conceito....................................................................................................................................................................................4
Dupla Função.........................................................................................................................................................................4
Finalidades............................................................................................................................................................................... 5
Provas Cautelares.................................................................................................................................................................6
Provas Não Repetíveis........................................................................................................................................................6
Provas Antecipadas.............................................................................................................................................................6

2. PRESIDÊNCIA E CARACTERÍSTICAS............................................................................ 7
Presidência...............................................................................................................................................................................7
Características.........................................................................................................................................................................7

3. MODOS DE INSTAURAÇÃO E IDENTIFICAÇÃO CRIMINAL.......................................12


Modos de Instauração.......................................................................................................................................................12
Identificação Criminal........................................................................................................................................................ 13
Identificação Genética...................................................................................................................................................... 13

4. INDICIAMENTO E DESINDICIAMENTO......................................................................... 15
Indiciamento......................................................................................................................................................................... 15
Desindiciamento................................................................................................................................................................. 16

5. PRAZOS............................................................................................................................ 17
Natureza dos prazos ..........................................................................................................................................................17
Prazos especiais...................................................................................................................................................................17

6. RELATÓRIOS E PROVIDÊNCIAS DO MINISTÉRIO PÚBLICO..................................... 19


Relatório do Inquérito Policial......................................................................................................................................... 19

7. ARQUIVAMENTO..............................................................................................................21
Arquivamento: Introdução...............................................................................................................................................21
Arquivamento: Hipóteses.................................................................................................................................................21
Desarquivamento...............................................................................................................................................................23

8. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL E ARQUIVAMENTO IMPLÍCITO............. 24


Acordo de Não Persecução Penal...............................................................................................................................24
Arquivamento Implícito....................................................................................................................................................25

9. TRANCAMENTO.............................................................................................................. 26

10. PODERES INVESTIGATIVOS DO MP...........................................................................27


Pontos Divergentes............................................................................................................................................................27
Precedente do STF.............................................................................................................................................................27
Espécies..................................................................................................................................................................................27

11. JUIZ DE GARANTIAS.................................................................................................... 28


Conceito................................................................................................................................................................................. 28
Suspensão da eficácia......................................................................................................................................................29
Funções..................................................................................................................................................................................29
1. Introdução
Investigação Preliminar
Antes de tudo, é importante pontuar que o inquérito policial é uma das várias espécies de
investigação preliminar. Assim, o inquérito policial figura junto das Comissões Parlamentares
de Inquérito (CPIs), sindicâncias, dentre outras espécies, no gênero investigação preliminar.

Conceito
O inquérito policial pode ser definido como um conjunto de atividades desenvolvidas
concatenadamente por órgãos os Estado a partir de uma notícia-crime, com caráter
prévio e de natureza preparatória com relação ao processo penal em si.

Além disso, o inquérito se serve à averiguação da autoria e das demais circunstâncias de um


fato aparentemente delituoso, com objetivo de justificar a instauração ou não do processo,
por meio da realização de diligências.

Com o inquérito, busca-se identificar fontes de prova e colher elementos de informação


quanto à autoria e à materialidade da infração penal, possibilitando ao titular da ação
penal ingressar em juízo. Ademais, trata-se de procedimento administrativo inquisitório e
preparatório presidido pela autoridade policial.

Como é possível depreender do conceito, o inquérito não é um processo, mas um


procedimento administrativo, o que nos leva à conclusão de que ele não possui amplas
possibilidades de defesa e de resposta por parte do investigado, caracterizando um
procedimento essencialmente inquisitorial.

Tratando-se de investigação preliminar, com caráter instrumental, e não de processo, dessa


fase não resulta a imposição de uma sanção, pois somente visa ao fornecimento de elementos
de informação ao titular da ação penal, o que permite a não observância do contraditório
e da ampla defesa.

Nesse caso, pode-se atribuir essa característica à necessidade de dar maior agilidade às
investigações, otimizando a identificação de fontes de prova e elementos informativos.

Dupla Função
Nesse sentido, é importante destacar que o inquérito policial tem uma função preservadora
e uma função preparatória.

Quanto à função preservadora, o inquérito impede a instauração de um processo penal


temerário, ou seja, que parte unicamente de razões arbitrárias, resguardando a liberdade do
inocente e evitando custos desnecessários para o Estado.

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Isso porque o inquérito fornece elementos informativos e eventuais elementos de prova
que permitem ao titular da ação penal ingressar em juízo – ou seja, instaurar a ação penal
– com base em um substrato fático mais consolidado, o que se confunde, também, com a
função preparatória. Esta, por sua vez, se manifesta no fato de que o inquérito policial tem o
condão de embasar e lastrear a ação penal em informações mais sólidas, que foram obtidas
previamente, ainda que ao arrepio do princípio do contraditório.

Finalidades
Como dito, o inquérito policial pode levantar elementos informativos e elementos de prova.
Contudo, aqui, vale uma ressalva: elementos informativos não se confundem com provas!

• Elementos informativos são produzidos sem o contraditório, sem ampla defesa, sem dialética
entre as partes, pois, nesse momento, ainda não há que se falar em acusados (nos termos do art. 5º,
LV, da CF/88). Apesar disso, são de extrema importância para a persecução penal, pois auxiliam a for-
mação da opinio delicti do órgão da acusação e podem amparar a decretação de medidas cautelares
pelo magistrado.
• Já as provas, por sua vez, para serem produzidas, dependem necessariamente do contraditório
judicial, o que ocorre, em regra, no curso da ação penal. Quanto às provas, portanto, o contraditório
figura como uma verdadeira condição de validade, vez que estas só podem ser consideradas como
tal quando houver participação dialética entre as partes.

Nesse sentido, vale destacar o art. 155 do Código de Processo Penal (CPP)

Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não
podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação,
ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.

Isso significa, basicamente, que, no momento de valorar todas as provas que lastreiam o
caso concreto, o juiz não poderá se utilizar apenas dos elementos informativos colhidos no
inquérito policial, pois foram produzidos sem o contraditório, sem possibilidade de defesa,
sem dar o investigado – e posterior acusado – a chance de desconstituir ou problematizar sua
veracidade. Como isso caracterizaria um processo extremamente arbitrário e inquisitorial, o
CPP veda a formação da convicção do juiz com base unicamente nos elementos informativos
do inquérito, que devem ser a ela complementares, auxiliares, e não sua fonte principal. Deve
ser priorizada, portanto, a apreciação das provas produzidas em juízo (ou seja, com observância
do contraditório).

Atenção: O artigo apresenta uma ressalva importante: o juiz pode se valer das provas
cautelares, não repetíveis e antecipadas, produzidas em sede de inquérito policial, para
formar sua convicção.

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Provas Cautelares
São aquelas que, se não produzidas, em razão do decurso do tempo, corre-se o risco da perda
do objeto da prova. Elas não demandam autorização judicial e podem ser produzidas em
ambas as fases (inquérito e processo penal) sem observância do contraditório no momento
de sua formação, pois, nesse caso, fala-se em contraditório diferido.

Nas palavras de Renato Brasileiro de Lima (2020, p. 58), contraditório diferido ou postergado
é aquele realizar sobre a prova, após sua formação. Em outras palavras, a observância do
contraditório se dá posteriormente, dando-se oportunidade ao acusado e a seu defensor
de contestar, no curso do processo, a providência cautelar e/ou a prova obtida em sede de
inquérito.

É o caso da interceptação telefônica judicialmente autorizada no curso das investigações.


Durante a interceptação, ao investigado não é dado o direito de defesa. Contudo, finda a
interceptação, é juntado aos autos o laudo de degravação e o resumo das operações
realizadas, dando-se vista à defesa para que possa se manifestar.

Provas Não Repetíveis


São aquelas que, uma vez produzidas, corre-se o risco da perda do objeto de prova em
razão do perecimento, desaparecimento ou destruição da fonte probatória. Em razão de sua
natureza, não demandam autorização judicial e podem ser, em regra, produzidas em ambas
as fases da persecução penal – tanto no inquérito quanto no curso da ação penal – sem
observância do contraditório no momento de sua formação.

Exemplo: imagine que uma pessoa tenha sofrido lesões corporais de natureza leve. O exame
pericial que se realiza logo depois que a pessoa sofreu a agressão dificilmente terá os mesmos
resultados se for efetuado em momento posterior, e até mesmo se for efetuado novamente,
pois os vestígios deixados pela infração penal provavelmente desaparecerão com o passar
do tempo. Assim, em razão do curto período de tempo que se tem para produzi-la, tal
prova independe de autorização judicial e pode ser determinada pela autoridade policial – o
Delegado – de imediato.

Provas Antecipadas
São aquelas produzidas em momento diferente do processo penal em si, mas com observância
do contraditório no momento de sua formação. Ou seja, são produzidas em momento
processual distinto daquele legalmente previsto ou até antes mesmo do processo, em razão
de uma situação de urgência e relevância.

Diferentemente das demais, neste caso, é imperiosa a autorização judicial para sua realização.
Um exemplo é a colheita das alegações de uma testemunha que se encontra em estado
grave de saúde, acamada em um hospital, com altos riscos de vir a falecer.

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2. Presidência e Características
Presidência
A Lei nº 12.830/13 dispõe sobre os elementos da condução da investigação preliminar e, em
seu art. 2º, determina que a presidência do inquérito policial (IP) e do termo circunstanciado
(TC, que é o procedimento previsto para investigação de infrações penais no âmbito dos
Juizados Especiais Criminais) é atribuição da autoridade policial. Vejamos a letra da lei:

Art. 2º As funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais exercidas pelo delegado de polícia são
de natureza jurídica, essenciais e exclusivas de Estado.

§ 1º Ao delegado de polícia, na qualidade de autoridade policial, cabe a condução da investigação criminal


por meio de inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei, que tem como objetivo a apuração das
circunstâncias, da materialidade e da autoria das infrações penais.

Características
PROCEDIMENTO ESCRITO
O inquérito policial é um instrumento que deve ser reduzido a termo, ou seja, deve constar
concretamente dos autos, nos termos do art. 9º do CPP:

Art. 9º Todas as peças do inquérito policial serão, num só processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e,
neste caso, rubricadas pela autoridade.

Sobre a possibilidade de se utilizar recursos de gravação audiovisual no curso das investigações


policiais, há discussão doutrinária, vez que, embora o CPP não faça menção a esse tipo de
gravação, é possível fazer uma interpretação progressiva do diploma processual (que entrou
em vigor no ano de 1942, quando não existiam recursos tecnológicos nesse sentido) ou uma
interpretação subsidiária do art. 405, §1º do CPP:

Art. 405. Do ocorrido em audiência será lavrado termo em livro próprio, assinado pelo juiz e pelas partes,
contendo breve resumo dos fatos relevantes nela ocorridos.

§ 1º Sempre que possível, o registro dos depoimentos do investigado, indiciado, ofendido e testemunhas será
feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual,
destinada a obter maior fidelidade das informações .

§ 2º No caso de registro por meio audiovisual, será encaminhado às partes cópia do registro original, sem
necessidade de transcrição.

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OFICIOSIDADE
Dizer que o inquérito policial é um procedimento oficioso significa que, tendo o conhecimento
do cometimento da infração penal, a autoridade policial deve instaurar o inquérito policial
de ofício (ex officio), nos termos do art. 5º, I, do CPP, exceto nos casos de ação penal pública
condicionada à representação e de delitos de ação penal privada.

Assim, se a instauração do inquérito policial está condicionada à manifestação da vítima ou de


seu representante legal, uma vez demonstrado o interesse do ofendido na persecução penal,
a autoridade policial é obrigada a agir de ofício, determinando as diligências necessárias.

OFICIALIDADE
A investigação precisa necessariamente ser realizada por agentes constantes do quadro de
funcionários da Administração Pública. Em outras palavras, essa característica determina
que é vedada a delegação de atividades investigativas a particulares.

Ademais, quem também nunca poderá conduzir a investigação é o juiz, em razão da


necessidade de permanecer equidistante das partes, a fim de manter a imparcialidade de
seu julgamento. Nesse sentido, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH), inclusive, já
se manifestou ao determinar que a atividade investigativa é incompatível com a função de
julgador do juiz (Clique aqui para consulta).

Assim, de acordo com a doutrina majoritária, o juiz tem uma função garantidora, ou seja,
de dar ao processo um julgamento justo, imparcial, respeitadas as garantias processuais e
constitucionais, em razão da adoção do sistema acusatório em nosso sistema processual
penal.

DISCRICIONARIEDADE
A persecução penal no inquérito policial concentra-se na figura da autoridade policial, do
Delegado de Polícia, que pode determinar ou postular, com discricionariedade, todas as
diligências que julgar necessárias ao esclarecimento dos fatos.

Isso quer dizer que o Delegado, no exercício de sua atribuição, tem uma margem de atuação
para determinar, por meio de um juízo de oportunidade e conveniência, quais são as
providências essenciais à coleta de elementos de autoria e materialidade da infração penal.
Trata-se de um juízo próprio dos agentes da Administração Pública que, apesar de possuir
certa margem de autonomia, está adstrito ao que é determinado em lei.

INQUISITORIAL
Como visto na aula anterior, o IP é um instrumento inquisitorial. Não há, via de regra, a
dialética das partes, o exercício do contraditório e da ampla defesa. Em se tratando de um
procedimento administrativo, e não de processo judicial, não há imposição de sanção como
resultado, pois o que se visa é a colheita de elementos informativos que sirvam de base à
opinio delicti do titular da ação penal e posterior denúncia (função preparatória).

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Contudo, esse entendimento de que o inquérito policial é desprovido da observância do
contraditório e da ampla defesa tem sido mitigado em razão de diversos fatores, dentre eles
a Lei 13.245/216, que alterou o Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/1994) para estabelecer o
direito dos advogados de dar assistência a seus clientes investigados durante a apuração de
infrações.

Não observado esse direito, corre-se o risco de ser declarada a nulidade do interrogatório e do
depoimento do investigado, tornando-se também nulos todos os elementos investigatórios e
probatórios deles decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente.

Além disso, passou a ser direito do advogado a elaboração e apresentação de razões e


quesitos durante o curso da investigação. Consta expressamente da lei:

Art. 7º. São direitos do advogado:

XXI - assistir a seus clientes investigados durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta
do respectivo interrogatório ou depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos investigatórios e
probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente, podendo, inclusive, no curso da respectiva
apuração:

a) apresentar razões e quesitos;

Assim, a nova redação conferida à Lei 8.906/94 faz questionar a verdadeira natureza jurídica
das investigações preliminares, levando parte da doutrina a sustentar que, agora, trata-se
de procedimento sujeito ao contraditório diferido e à ampla defesa, em consonância com
os mandamentos do art. 5º, LV, da Constituição Federal, cujo teor assegura aos litigantes,
em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral, o contraditório e a ampla
defesa, com os meios e recursos a ela inerentes, assim como a assistência de advogado (art.
5º, LXIII, CF/88).

Outra parcela da doutrina, entretanto, permanece com o entendimento de que a investigação


preliminar é um procedimento inquisitorial, reforçando a ideia de que não há possibilidade de
sanção direta, bem como que a falta de contraditório e ampla defesa nessa fase é compensada
por mecanismos legislativos tendentes a evitar que o juiz firme sua convicção apenas com os
elementos informativos nela colhidos (como é o caso do art. 155 do CPP).

Atenção: em julgamento da 2ª Turma do STF, concluiu-se que, apesar da alteração do art.


7º, inciso XXI do Estatuto da OAB pela Lei nº 13.245/16, não há necessidade de intima-
ção prévia da defesa técnica do investigado para a tomada de depoimentos orais nesta
fase de inquérito policial, sob pena de nulidade.

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Para o Ministro, por se tratar de procedimento informativo de natureza inquisitorial, pode
haver uma mitigação das garantias do contraditório e da ampla defesa. Há um reforço das
prerrogativas do advogado, mas não há direito subjetivo de intimação prévia e tempestiva do
calendário de inquirições a ser definido pela autoridade policial (Pet 7.612/DF, Rel. Min. Edson
Fachin, j. 12/03/2019).

INDISPONIBILIDADE
De acordo com o art. 17 do CPP, a autoridade policial não poderá mandar arquivar autos de
inquérito policial. Diante da notícia de uma infração penal, o Delegado de Polícia não está
obrigado à instauração do inquérito policial, devendo, antes de tudo, verificar a procedência
das informações e a tipicidade da infração penal em questão.

Contudo, uma vez instaurado o inquérito, não incumbe à autoridade policial promover seu
arquivamento, senão por determinação do Ministério Público – mais precisamente, o promotor
natural do caso -, com posterior homologação pela instância superior de revisão, nos termos
do art. 28, caput¸ do CPP, com redação dada pela Lei 13.964/19 – o Pacote Anticrime.

Vale adiantar que o inquérito policial poderá ser desarquivado mediante aparição de provas
novas, cuja determinação é privativa do Ministério Público (vide Súmula 524 do STF).

Assim, de acordo com o STJ, são três os requisitos para que uma prova seja considerada
prova nova, nos termos do art. 18 do CPP:

• que seja formalmente nova, isto é, sejam apresentados novos fatos, anteriormente desconheci-
dos;
• que seja substancialmente nova, isto é, tenha idoneidade para alterar o juízo anteriormente profe-
rido sobre a desnecessidade da persecução penal; e
• que seja apta a produzir alteração no panorama probatório dentro do qual foi concebido e acolhido
o pedido de arquivamento.

Vide STJ, 6ª Turma, RHC 18.561/ES, Min. Hélio Quaglia Barbosa, j. 11/04/2006, DJ 1º/08/2005,
p. 545.

SIGILOSO
O princípio da publicidade dos atos processuais está consagrado na Constituição Federal e
na Convenção Americana sobre Direitos Humanos.

Assim, a regra é que haja ampla publicidade dos atos praticados no curso da ação penal,
ressalvadas as hipóteses em que se justifica a restrição da publicidade, como em casos de
defesa da intimidade, interesse social no sigilo e imprescindibilidade à segurança da sociedade
e do Estado (BRASILEIRO, 2020, p. 184).

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Dessa forma, se até a fase processual da persecução penal admite a restrição da publicidade,
por que não o poderia também a fase investigatória, que já possui um acentuado caráter
inquisitorial?

Para que sejam bem feitas as investigações e para o sucesso das diligências, é necessário
que haja um sigilo sobre isso, sobretudo porque, muitas vezes, o elemento surpresa é o que
permite a obtenção de um elemento informativo relevante. Obviamente, esse sigilo não
impede que o Ministério Público e o juiz tomem conhecimento do andamento da investigação.

Porém, mais que isso: o advogado tem o direito de examinar, em qualquer instituição
responsável por conduzir a investigação, mesmo sem procuração, autos de flagrante e
de investigações de qualquer natureza, findos ou em andamento, ainda que conclusos à
autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos, em meio físico ou digital, nos
termos da Lei nº 8.906/94, art. 7º, XIV, com redação dada pela Lei nº 13.245/16.

Contudo, é vedado ao advogado e ao investigado consultar informações sobre diligências em


andamento, tendo em vista o sigilo interno, que visa assegurar a eficiência das investigações.
Assim, somente as informações sigilosas já documentadas podem ser visualizadas pela
defesa. Nesse sentido também é o teor da Súmula Vinculante nº 14, cujo teor é o seguinte:

É direito do defensor, no interesse do representado, terá acesso amplo aos elementos de prova que, já
documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária,
digam respeito ao exercício do direito de defesa.

DISPENSÁVEL
Tendo em vista que a finalidade do inquérito policial é a coleta de elementos de informação
quanto à autoria e à materialidade da infração penal, caso o titular da ação penal já possua
esses elementos em mãos, o inquérito policial pode se tornar dispensável.

Essa característica da dispensabilidade decorre de interpretação a contrario sensu do art. 12


do CPP, que preceitua que “o inquérito policial acompanhará a denúncia ou a queixa, sempre
que servir de base a uma ou outra”.

Assim, se o inquérito não servir de base, não precisará acompanhá-las. Ademais, o art. 39,
§5º do CPP determina que o órgão do Ministério Público dispensará o inquérito se com a
representação forem oferecidos elementos que o habilitem a promover a ação penal e, neste
caso, oferecerá a denúncia no prazo de 15 (quinze) dias.

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3. Modos de Instauração e Identificação Criminal
Modos de Instauração
O art. 5º do CPP determina as possibilidades de instauração do inquérito policial:

Art. 5º Nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado:

I - de ofício;

II - mediante requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público, ou a requerimento do ofendido ou de


quem tiver qualidade para representá-lo.

§ 3º Qualquer pessoa do povo que tiver conhecimento da existência de infração penal em que caiba ação
pública poderá, verbalmente ou por escrito, comunicá-la à autoridade policial, e esta, verificada a procedência
das informações, mandará instaurar inquérito.

§ 4º O inquérito, nos crimes em que a ação pública depender de representação, não poderá sem ela ser iniciado.

§ 5º Nos crimes de ação privada, a autoridade policial somente poderá proceder a inquérito a requerimento de
quem tenha qualidade para intentá-la.

Em regra, os delitos são de ação penal incondicionada. Ou seja, se a lei não determina que
determinada ação penal “se procede mediante representação ou requisição do Ministro da
Justiça” (crimes de ação penal pública condicionada) ou se “procede mediante queixa” (crimes
de ação penal privada), entende-se que trata da regra geral da ação penal incondicionada.

Assim, têm-se as seguintes possibilidades de instauração:

• de ofício, pela autoridade policial, em cumprimento ao princípio da obrigatoriedade, pois ela está
adstrita ao dever de instaurar o inquérito caso tome conhecimento da ocorrência de delito no exercí-
cio rotineiro de suas funções;
• mediante requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público. No caso do Ministério Públi-
co, em cumprimento ao art. 129, VIII da CF/88, o órgão estará cumprindo com sua função institucional
de requisitar diligências investigatórias e instaurar inquérito policial. Em que pese não haver hierarquia
entre Ministério Público e autoridade policial, o princípio da obrigatoriedade deve ser observado;
• mediante requerimento do ofendido ou de seu representante legal, que, sempre que possível,
deverá esclarecer a narração do fato, a individualização do indiciado e a nomeação das testemunhas.
É possível, ainda, que a autoridade policial verifique a procedência das informações antes de instaurar
o inquérito, evitando-se uma investigação temerária e abusiva;
• mediante notícia oferecida por qualquer do povo, ocasião em que qualquer pessoa do povo, ver-
balmente ou por escrito, poderá comunicar a ocorrência do crime à autoridade policial, que também
averiguará a procedência das informações.

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Identificação Criminal
Para que o Estado consiga punir o autor do delito, é essencial que se tenha conhecimento
efetivo de sua correta identidade, sobretudo em razão do princípio da individualização da
pena, constante do art. 5º, XLV, 1ª parte, da CF/88), o qual determina que nenhuma pena
pode passar da pessoa do condenado. Assim, embora normalmente se saiba exatamente
que determinada pessoa praticou um crime, em alguns casos é possível haver dúvida acerca
da identidade do sujeito, o que é resolvido pela identificação criminal.

Assim, a identificação criminal é o gênero do qual constam a identificação datiloscópica (feita


com base nas saliências papilares da pessoa), a identificação fotográfica e a identificação
genética, incluída no ordenamento pela Lei 12.037/2009.

Com o advento da CF/88, mais precisamente com o surgimento do art. 5º, inciso LVIII,
determinou-se que a pessoa civilmente identificada não será submetida à identificação
criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei. Antes disso, a regra era que se procedesse à
identificação criminal ainda que o indivíduo tivesse se identificado civilmente.

Era esse o posicionamento, inclusive, do STF, visualizado por meio da Súmula nº 568, cujo
teor era “a identificação criminal não constitui constrangimento ilegal, ainda que o indiciado
já tenha sido identificado civilmente”.

Assim, mudou-se a regra, de forma que o art. 3º da Lei 12.037/2009 estabelece os casos em
que a identificação criminal poderá ocorrer a despeito de prévia identificação civil:

• quando o documento apresentar rasura ou tiver indício de falsificação;


• quando o documento apresentado for insuficiente para identificar cabalmente o indiciado;
• quando o indiciado portar documentos de identificação distintos, com informações conflitantes
entre si;
• quando a identificação criminal for essencial às investigações policiais, segundo despacho da
autoridade judiciária competente, que decidirá de ofício ou mediante representação da autoridade
policial, do Ministério Público ou da defesa;
• quando constar de registros policiais o uso de outros nomes ou diferentes qualificações;
• quando o estado de conservação ou a distância temporal ou a localidade da expedição do docu-
mento apresentado impossibilite a completa identificação dos caracteres essenciais.

Identificação Genética
A possibilidade de identificação genética do indiciado gera certo alvoroço na doutrina,
sobretudo porque há quem diga que não se pode obrigar o investigado a contribuir com as
investigações, e qualquer decisão judicial nesse sentido é capaz de violar o princípio da não
autoincriminação (nemo tenetur se detegere).

Contudo, outra parte da doutrina assevera que é possível a obtenção do perfil genético do
investigado desde que colhido o material genético por meio de conduta passiva, ou seja, não

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obrigando o indivíduo a praticar qualquer movimento, ou por meio de material descartado
voluntária ou involuntariamente, como cigarros, pentes, escovas de dente, cabelos, etc.

Quanto ao tema, o STF tem o posicionamento de que o acusado não é obrigado a fornecer
material genético para sua identificação criminal (STF, Pleno, HC 71.373/RS, Rel. Min. Marco
Aurélio, DJ 22/11/1996). Contudo, o mesmo STF também possui julgados no sentido de que a
obtenção do DNA é válida se a coleta se der por meio não invasivo (ex: fio de cabelo encontrado
no chão).

A exemplo, tem-se o caso de uma cantora chilena em que o STF considerou válida a coleta
da placenta para que fosse colhido material genético para exame de DNA, vez que se tratava
de objeto expelido do corpo de forma involuntária, como consequência do parto (STF, Pleno,
Rcl-QO 2.040/DF, Rel. Min. Néri da Silveira, DJ 27/06/2003).

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4. Indiciamento e Desindiciamento
Indiciamento
CONCEITO
De acordo com o professor Aury Lopes Jr., indiciamento é o ato de atribuir a alguém a prática
de determinado fato punível e pressupõe um grau mais elevado de certeza da autoria que a
situação de suspeito (LOPES JR., 2016, p. 126).

Já de acordo com o professor Renato Brasileiro de Lima, o indiciamento possui um caráter


ambíguo, constituindo-se, ao mesmo tempo, fonte de direitos, prerrogativas e garantias
processuais e fonte de ônus e deveres, que representam alguma forma de constrangimento,
além da inegável estigmatização social que a publicidade lhe imprime (BRASILEIRO, 2020, p.
223).

O indiciado não se confunde com um mero suspeito ou investigado, nem tampouco com o
acusado, pois contra ele existem mais do que frágeis indícios de autoria, ou seja, há um juízo
positivo de probabilidade de ser o agente do delito, mas ainda não houve o recebimento da
peça acusatória pelo magistrado, momento em que nasce a figura do acusado.

MOMENTO
O indiciamento pode se dar desde a lavratura do auto de prisão em flagrante até o relatório
final produzido pela autoridade policial. Recebida a peça acusatória pelo magistrado, não mais
é possível o indiciamento, pois se trata de ato próprio da fase investigatória.

Nessa linha, o STJ tem entendimentos no sentido de que o indiciamento em momento


posterior ao recebimento da denúncia é causa de ilegal e desnecessário constrangimento
à liberdade de locomoção, visto que tal procedimento não se justifica mais em sede de ação
penal.

Decisões para consulta:

• STJ, 6ª Turma, HC 182.455/SP, Rel. Min. Haroldo Rodrigues – Desembargador Convocado do TJ/
CE – j. 05/05/2011;
• STJ, 5ª Turma, HC 179.951/SP, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 10/05/2011;
• STJ 5ª Turma, HC 174.576/SP, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 28/09/2010.

ESPÉCIES
O indiciamento pode ser feito de forma direta (pessoalmente, na presença e ciência do
indiciado) ou indireta (em caso de indiciado ausente). A regra é que o indiciamento seja feito
na presença do investigado, mas é possível que, não conseguindo localizá-lo, por encontrar-
se em local incerto e não sabido, ou quando intimado para ato processual ele deixa de
comparecer de forma injustificada, seja feito seu indiciamento na forma indireta.

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PRESSUPOSTOS
A lei 12.830/2013, em seu art. 2º, §6º, dispõe que:

§ 6º O indiciamento, privativo do delegado de polícia, dar-se-á por ato fundamentado, mediante análise técnico-
jurídica do fato, que deverá indicar a autoria, materialidade e suas circunstâncias.

Assim, podemos ver que se trata de um ato privativo do delegado de polícia que, em uma
análise técnico-jurídica do fato, indica a autoria, a materialidade e as circunstâncias do delito,
de forma fundamentada. Isso significa dizer que o indiciamento não pode ser requisitado pelo
Ministério Público ou pelo juiz, pois é um ato específico da autoridade policial.

Nessa linha, cabe ressaltar que qualquer pessoa pode ser indiciada pela autoridade policial,
salvo algumas exceções, sendo elas:

• magistrados ou membros do Ministério Público: segundo as leis orgânicas que regem a magistra-
tura e o exercício das atividades do Ministério Público, magistrados e promotores/procuradores não
podem ser indiciados, devendo, nesses casos, o inquérito ser remetido aos respectivos órgãos de
classe (Art. 41, inciso II e parágrafo único da Lei nº 8,625/93 e art. 33, parágrafo único da LC 35/79)
• investigado que possua foro por prerrogativa de função (deputados, senadores, etc.): é necessário
que se remeta os autos do inquérito ao foro competente, com a devida autorização do tribunal com-
petente para tanto. Isso foi o quanto pacificado na Questão de Ordem suscitada no Inq. 2.411, em que
o Plenário do STF entendeu que a autoridade policial não pode indiciar parlamentares sem a prévia
autorização do ministro-relator do inquérito, ficando a abertura do próprio procedimento investigató-
rio (inquérito penal originário) condicionada à autorização do Relator (STF, Pleno, Inq 2.411 QO/MT, Rel.
Min. Gilmar Mendes, DJe 74 24/04/2008).

Desindiciamento
Trata-se de um ato que garante ao investigado que esse indiciamento seja motivado, de forma
que ele só ocorrerá se forem colhidos indícios suficientes de sua autoria ou participação no
delito.

Assim, ausente qualquer elemento informativo quanto ao envolvimento do investigado na


prática delituosa, a jurisprudência tem admitido a impetração de habeas corpus para inibir o
constrangimento ilegal daí decorrente, buscando o desindiciamento.

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5. Prazos
Natureza dos prazos
Em caso de indiciado solto, o prazo tem a natureza processual penal. Em caso de indiciado
preso, há duas correntes sobre a natureza do prazo do inquérito:

• A primeira corrente, liderada por Guilherme Nucci, leciona tratar-se de um prazo penal material,
seguindo a regra do art. 10 do CP, o que significa que o dia de início do prazo será computado;
• A segunda corrente, por sua vez, ensina que não se confunde o prazo de prisão (essencialmente
penal material) com o prazo de conclusão do inquérito policial, sendo este um prazo processual penal.
Assim, conta-se o prazo a partir do primeiro dia útil após a prisão, sendo que, caso o prazo termine em
sábado, domingo ou feriado, estará automaticamente prorrogado até o primeiro dia útil.

Prazos especiais
O Código de Processo Penal, em seu art. 10, determina que o prazo para conclusão do inquérito
de indiciado solto é de 30 dias, enquanto o prazo para o indiciado preso é de 10 dias.

Art. 10. O inquérito deverá terminar no prazo de 10 dias, se o indiciado tiver sido preso em flagrante, ou estiver
preso preventivamente, contado o prazo, nesta hipótese, a partir do dia em que se executar a ordem de prisão,
ou no prazo de 30 dias, quando estiver solto, mediante fiança ou sem ela.

Já a Lei nº 5.010/66 (que organiza a Justiça Federal de primeira instância), em seu art. 66,
determina que o prazo para a conclusão do inquérito policial será de 15 dias para o indiciado
preso, prorrogáveis por mais 15, desde que fundamentado. Quanto ao indiciado solto, a lei é
silente, aplicando-se o art. 10 do CPP.

A Lei nº 11.343/06 (Lei de drogas), por sua vez, prevê que o inquérito policial deve ser concluído
no prazo de 10 dias em caso de indiciado preso e de 90 dias quanto solto, sendo que tais
prazos podem ser duplicados pelo juiz, desde que ouvido o membro do Ministério Público e
que haja pedido justificado pela autoridade policial.

Caso tenha sido decretada a prisão temporária do investigado que cometeu crime hediondo,
o prazo da prisão é de 30 dias, prorrogável por igual prazo em caso de extrema e comprovada
necessidade (Lei nº 8.072/90, art. 2º, §4º). Nesse caso, entende-se que o prazo para finalizar
o inquérito não deve ultrapassar os possíveis 60 dias (Renato Brasileiro, 2020, p. 229).

Na hipótese de prisão temporária em crime que não se enquadre na lei anterior (ou seja, que
verse sobre a Lei nº 7.960/89), o prazo da prisão é de 5 dias, prorrogável por mais 5 dias e,
neste caso, não há dúvida de que deve ser respeitado o prazo estabelecido no art. 10 do CPP
(10 dias), já que coincidentes.

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No Código Processual Penal Militar, o prazo de conclusão do inquérito policial é de 20 dias no
caso de indiciado preso e de 40 dias em caso de indiciado solto, permitindo-se a prorrogação,
neste caso, por mais 20 dias.

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6. Relatórios e Providências do Ministério Público
Relatório do Inquérito Policial
Nos termos do art. 10, §1º do CPP, o inquérito policial deverá ser finalizado por meio de um
relatório produzido pela autoridade policial, nele constando minuciosas informações sobre
todo o desenrolar do inquérito, cujo destinatário é a autoridade judiciária.

Em outras palavras, o relatório do inquérito policial é uma peça eminentemente descritiva,


onde devem ser esboçadas as principais diligências realizadas na fase investigatória e,
inclusive, as que não foram realizadas e quais as razões para isso.

Apesar de ser um dever funcional para a autoridade policial, não se trata, contudo, de peça
obrigatória para o oferecimento da denúncia, pois, como vimos, nem mesmo o inquérito
policial em si é considerado essencial para tanto.

Ao menos em regra, a autoridade policial deve abster-se de fazer qualquer juízo de valor no
relatório, pois deve reservar ao titular da ação penal a formação da opinio delicti.

Essa regra, no entanto, é mitigada pelo art. 52, I da Lei de Drogas, que prevê expressamente que
a autoridade policial relatará sumariamente as circunstâncias do caso, justificando as razões
que a levaram a classificar o delito em determinada modalidade, indicando a quantidade e a
natureza da substância ou do produto apreendido, bem como o local e as condições em que
se desenvolveu a ação criminosa e, ainda, as circunstâncias da prisão, conduta, qualificação
e antecedentes do agente (Lei 11.343/06).

Art. 52. Findos os prazos a que se refere o art. 51 desta Lei, a autoridade de polícia judiciária, remetendo os
autos do inquérito ao juízo:

I - relatará sumariamente as circunstâncias do fato, justificando as razões que a levaram à classificação do


delito, indicando a quantidade e natureza da substância ou do produto apreendido, o local e as condições em
que se desenvolveu a ação criminosa, as circunstâncias da prisão, a conduta, a qualificação e os antecedentes
do agente;

Nesse caso, vale ressaltar que o Ministério Público não está vinculado à classificação feita pela
autoridade policial, tampouco o magistrado, para fins de concessão de liberdade provisória.

PROVIDÊNCIAS A SEREM ADOTADAS APÓS A REMESSA DOS AUTOS DO INQUÉRITO


POLICIAL
Em se tratando de crime de ação penal pública, os autos são remetidos ao Ministério Público,
que pode escolher dentre as seguintes possibilidades:

• Arquivar o procedimento, caso entenda que não há elementos suficientes para o oferecimento da
denúncia;

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• Oferecer denúncia
• Requisitar novas diligências (art. 16, CPP): de acordo com esse artigo, o Ministério Público não po-
derá requerer a devolução do inquérito à autoridade policial senão para novas diligências imprescindí-
veis ao oferecimento da denúncia.

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7. Arquivamento
Arquivamento: Introdução
Como já vimos, a autoridade policial não poderá mandar arquivar os autos de inquérito, de
acordo com o art. 17 do CPP (“A autoridade policial não poderá mandar arquivar autos de
inquérito”).

O arquivamento também não pode ser determinado de ofício pela autoridade judiciária,
pois incompatível com a função de julgador imparcial a que o juiz deve se prestar. Esse
entendimento, inclusive, já foi exarado pelo Supremo Tribunal Federal no HC nº 88.589/GO e
Inq. 2.913.

Assim, incumbe exclusivamente ao Ministério Público avaliar se os elementos de informação


que constituem os autos do inquérito são suficientes ou não para o oferecimento da denúncia
e, em razão disso, nenhum inquérito policial pode ser arquivado sem expressa determinação
do Ministério Público nesse sentido.

Arquivamento: Hipóteses
Embora o Código de Processo Penal silencie a respeito das hipóteses que autorizam o
arquivamento do inquérito policial, são aplicadas, analogicamente, as hipóteses de rejeição
da peça acusatória e de absolvição sumária, previstas no art. 395 e 397 do CPP, sendo elas,
basicamente:

• Ausência de pressuposto processual ou de condição para o exercício da ação pena (ex: retratação
da representação);
• Falta de justa causa para o exercício da ação penal (ex: ausência de lastro probatório mínimo
quanto à prática do delito e à autoria);
• Quando o fato investigado evidentemente não constituir crime (ex: atipicidade da conduta, com
aplicação do princípio da insignificância);
• Existência de manifesta causa excludente de ilicitude (ex: legítima defesa)
• Causa extintiva de punibilidade;
• Cumprimento de acordo de não persecução penal

Atualmente, com o advento do Pacote Anticrime, a Lei 13.964/19 trouxe uma nova redação
para o art. 28 do CPP, simplificando o procedimento de arquivamento e consagrando
expressamente mais um pilar do sistema processual acusatório.

Antes dessa alteração, o arquivamento do inquérito devia ser requerido à autoridade


judiciária que, não concordando, podia remeter os autos ao procurador-geral, para que este:
a) oferecesse a denúncia; b) designasse outro órgão do Ministério Público pra oferecê-la; ou
c) reiterasse o pedido de arquivamento, ao qual o juiz estaria vinculado.

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Contudo, o artigo 28 do CPP foi alterado para a seguinte redação:

Art. 28. Ordenado o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer elementos informativos da mesma
natureza, o órgão do Ministério Público comunicará à vítima, ao investigado e à autoridade policial e encaminhará
os autos para a instância de revisão ministerial para fins de homologação, na forma da lei.

§ 1º Se a vítima, ou seu representante legal, não concordar com o arquivamento do inquérito policial, poderá, no
prazo de 30 (trinta) dias do recebimento da comunicação, submeter a matéria à revisão da instância competente
do órgão ministerial, conforme dispuser a respectiva lei orgânica.

§ 2º Nas ações penais relativas a crimes praticados em detrimento da União, Estados e Municípios, a revisão do
arquivamento do inquérito policial poderá ser provocada pela chefia do órgão a quem couber a sua representação
judicial.

Dessa forma, é possível notar que a atuação do Ministério Público no pedido de arquivamento
não mais está adstrita à análise do Poder Judiciário, deixando de ser um requerimento para
ser uma comunicação. Assim, não há mais que se falar em controle judicial do arquivamento,
pois se trata de uma decisão do Ministério Público de não acusar.

Ocorrendo discordância por parte da vítima ou de seu representante legal com a decisão
de arquivamento por parte do MP, a providência a ser tomada também está estabelecida na
letra da lei, devendo a vítima (ou o representante), no prazo de 30 dias contados a partir do
recebimento da comunicação, submeter a matéria à revisão da instância competente do
órgão ministerial. Para o professor Renato Brasileiro, o §1º do art. 28 do CPP funciona como
um verdadeiro consectário do direito de petição da vítima, nos exatos termos do art. 5º, XXXIV
da CF/88 (Renato Brasileiro, 2020, p. 245).

Ainda, nos termos do art. 19 do CPP, há determinação para que os autos do inquérito de
crime em que não caiba ação penal pública sejam remetidos ao juízo competente, onde
aguardarão a iniciativa do ofendido ou de seu representante legal. Na prática, o que ocorre é
que, por vezes, os autos são enviados ao Ministério Público para que se averigue a existência
de eventual crime de ação penal pública.

Art. 19. Nos crimes em que não couber ação pública, os autos do inquérito serão remetidos ao juízo competente,
onde aguardarão a iniciativa do ofendido ou de seu representante legal, ou serão entregues ao requerente, se
o pedir, mediante traslado.

OBSERVAÇÃO
O novo procedimento de arquivamento proposto pela Lei 13.964/90, constante do art. 28 do
CPP, está, atualmente, com a eficácia suspensa, em razão da medida cautelar concedida pelo
Min. Luiz Fux nos autos da ADI nº 6305 (j. 22/01/2020).

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Nessa ação, também se determinou, nos termos do art. 11, §2º da Lei 9868/99, que a redação
revogada do art. 28 do CPP permaneça em vigor enquanto perdurar essa medida cautelar.
Sendo assim, fique atento! Ainda está em vigor a redação antiga do artigo 28 do CPP, mas
isso pode mudar logo menos!

Desarquivamento
Como vimos anteriormente, o inquérito policial pode ser desarquivado caso haja notícia de
novas provas pela autoridade policial. Contudo, para que esse procedimento não se dê de
forma arbitrária, é necessário pensar no que são as “provas novas” a que se refere o art. 18 do
CPP (“Art. 18. Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por
falta de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de
outras provas tiver notícia”).

Como vimos, o entendimento do STJ é de que tais provas precisam ser substancialmente
novas (inéditas, desconhecidas até então, porque ocultas ou inexistentes); formalmente
novas (já conhecidas e até já utilizadas, mas que ganham nova versão – como exemplo,
uma testemunha que havia sido ameaçada em seu primeiro depoimento); e aptas a produzir
alguma alteração no panorama probatório dentro do qual foi concebido e acolhido o pedido
de arquivamento.

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8. Acordo de Não Persecução Penal e Arquivamento
Implícito
Acordo de Não Persecução Penal
Com o advento do Pacote Anticrime (Lei 13.964/19), foi incluído o art. 28-A no CPP, o qual versa
sobre a possibilidade de ser firmado entre o investigado e o Ministério Público um acordo de
não persecução penal, caso sejam cumpridos alguns requisitos e pressupostos.

Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente
a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o
Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para
reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente:

I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo;

II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto
ou proveito do crime;

III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada
ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do
Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal

IV - pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro
de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que
tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente
lesados pelo delito; ou

V - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e
compatível com a infração penal imputada.

O acordo de não persecução penal configura um negócio jurídico de natureza extrajudicial,


necessariamente homologado pelo juiz competente – em regra, pelo juiz das garantias -,
celebrado entre o Ministério Público e o autor do fato delituoso, devidamente assistido por
seu advogado ou defensor público, que confessa formal e circunstanciadamente a prática
do delito, sujeitando-se ao cumprimento das condições não privativas de liberdade previstas
nos incisos do art. 28-A do CPP. Em troca disso, o Ministério Público se compromete a não
oferecer a denúncia contra o investigado, declarando-se a extinção da punibilidade caso o
acordo seja integralmente cumprido (BRASILEIRO, 2020, p. 274).

Como é possível notar, o acordo de não persecução penal é uma troca feita entre o investigado
e o Ministério Público. Quando o investigado confessa a prática do delito e se enquadra nas
hipóteses de oferecimento do acordo previstas no art. 28-A do CPP, é lícito que Ministério
Público firme esse compromisso com ele.

Contudo, algumas regras devem ser observadas, dentre elas:

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• A infração penal não pode ter sido cometida mediante violência ou grave ameaça;
• A pena mínima prevista para o delito deve ser inferior a 4 (quatro) anos, já computadas as causas
de aumento e diminuição de pena aplicáveis ao caso concreto (§1º do art. 28-A)

Além disso, o acordo de não persecução penal não será cabível quando:

§ 2º O disposto no caput deste artigo não se aplica nas seguintes hipóteses:

I - se for cabível transação penal de competência dos Juizados Especiais Criminais, nos termos da lei;

II - se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem conduta criminal habitual,
reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas;

III - ter sido o agente beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento da infração, em acordo de não
persecução penal, transação penal ou suspensão condicional do processo; e

IV - nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por
razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor.

Arquivamento Implícito
Trata-se de uma hipótese de arquivamento não admitida pela jurisprudência, que ocorre
quando o Ministério Público deixa de oferecer denúncia em face de algum fato supostamente
punível ou em face de algum investigado sem a sua manifestação expressa do porquê desse
procedimento. É o caso, por exemplo, da ocorrência de um delito de furto cometido por João
e Pedro, mas cuja peça acusatória verse somente contra Pedro.

Na lição de Afrânio Silva Jardim (2002, p. 170), esse arquivamento se consuma quando o juiz
não se pronuncia na forma do art. 28 com relação ao que foi omitido na peça acusatória.

A maior parte da doutrina e da jurisprudência não reconhece esse tipo de arquivamento, pois,
como bem se sabe, o arquivamento deve ser um ato fundamentado. Logo, ainda que o órgão
do Ministério Público não tenha se manifestado expressamente em relação a determinado
fato delituoso ou agente do delito, não há que se falar em arquivamento implícito.

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9. Trancamento
Na lição do professor Renato Brasileiro de Lima (2020, p. 256), entende-se que a instauração
do inquérito policial contra pessoa determinada traz consigo um inegável constrangimento.
Em que pese ser um procedimento meramente investigatório e do qual não resulta nenhuma
sanção em concreto, o fato de um indivíduo estar sendo investigado pela autoridade policial
acarreta uma estigmatização social muito grande, podendo marcá-lo por muito tempo.

Em alguns casos, esse constrangimento pode, ainda, ser tido como ilegal, quando a instauração
do inquérito se mostrar extremamente abusiva. Nesses casos de abusividade, é possível falar
em trancamento do inquérito policial.

Trata-se de medida de natureza excepcional que ocorre quando houver:

• manifesta a atipicidade formal ou material da conduta delituosa: como exemplo, pensemos em


um inquérito instaurado para apurar o furto de uma lata de leite em pó, avaliada em R$2,00. Sobres-
saindo o princípio da insignificância como causa supralegal de exclusão de tipicidade, não se pode
falar em um constrangimento legal;
• presença de causa extintiva da punibilidade: supondo que houve fraude no pagamento de um
cheque, mas, logo após essa conduta, o agente efetuou a reparação do dano (ou seja, antes do ofe-
recimento da denúncia), tem-se extinta a punibilidade do agente.
• instauração de inquérito policial em crime de ação penal de iniciativa privada ou de ação penal pú-
blica condicionada à representação sem que o ofendido ou seu representante legal tenham efetuado
o requerimento (trata-se de condição essencial à instauração do IP).

Nesses casos, é possível contestar esse constrangimento ilegal causado pela instauração
do inquérito policial por meio de habeas corpus, requerendo-se o trancamento do respectivo
inquérito. Contudo, para que o HC seja cabível, é necessário que haja uma ameaça, ainda
que potencial, à liberdade de locomoção do investigado. Assim, em se tratando de infração
penal à qual não se comina pena privativa de liberdade, o instrumento a ser manejado não é
o habeas corpus, mas o mandado de segurança:

Vejamos a Súmula nº 693 do STF:

Não cabe habeas corpus contra decisão condenatória a pena de multa, ou relativa a processo em curso por
infração penal a que a pena pecuniária seja a única cominada.

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10. Poderes Investigativos do MP
Pontos Divergentes
Na hipótese de o investigado ser membro do Ministério Público, a investigação não é atribuída
à autoridade judiciária, mas ao respectivo Procurador-Geral, por força do art. 18, parágrafo
único, da LC 75/93 e art. 41, parágrafo único, da Lei 8625/93. Quanto à isso, não há discussão.

Contudo, a doutrina e a jurisprudência por um longo tempo discutiram a possibilidade de


o Ministério Público exercer o poder investigatório próprio de inquéritos policiais que não
tenham como investigado um membro do próprio Ministério Público.

Enquanto um lado da doutrina e dos tribunais superiores posicionava-se contrariamente


a essa possibilidade (em razão, por exemplo, de violação ao sistema acusatório e ausência
de instrumento idôneo para essa investigação), outra parte da doutrina e da jurisprudência
posicionava-se a seu favor, em razão, por exemplo, da Teoria dos Poderes Implícitos (se a
Constituição Federal deu ao Ministério Público a titularidade da ação penal, implicitamente
deu a ele o poder de realizar também os “meios” destinados a esse fim, como a investigação).

Precedente do STF
Fato é que, em julgamento histórico, o STF, no RE 539.727, pacificou o entendimento de que
é possível que o Ministério Público, em situações excepcionais, tenha competência para
promover, por autoridade própria, e por prazo razoável, investigações de natureza penal,
desde que respeitados os direitos e garantias que assistem a qualquer indiciado ou pessoa
sob investigação do Estado.

Também deve ser respeitada a cláusula de reserva de jurisdição nos casos em que a atuação
do Poder Judiciário é essencial, bem como as prerrogativas de profissionais brasileiros, como
os advogados.

Ademais, essa atuação do Ministério Público é subsidiária, ou seja, já havendo atuação da


autoridade policial em inquérito para averiguar o mesmo delito, é possível a impetração de
habeas corpus.

Espécies
Um dos motivos que o STF elencou para pacificar esse entendimento foi o poder de controle
externo da atividade investigatória policial dado ao Ministério Público pela Constituição
Federal, em seu art. 129, VII. Esse controle pode se dar de forma difusa, quando exercido
por todos os órgãos do Ministério Público com atribuição criminal, ou concentrada, quando
exercido por todos os órgãos do MP com atribuição específica para o controle externo da
atividade policial.

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11. Juiz de Garantias
Conceito
Nessa última aula, traremos algumas noções gerais sobre o juiz das garantias, uma nova
figura incluída pelo Pacote Anticrime (Lei 13.964/19).

O juiz das garantias, na dicção do art. 3º-B, caput, do CPP, é responsável pelo controle da
legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos individuais cuja franquia
tenha sido reservada à autorização prévia do Poder Judiciário.

Basicamente, o que se tem é um juiz com competência para o exercício da função de garantidor
dos direitos fundamentais no curso da fase investigatória da persecução penal. Esse juiz,
após atuar como protetor de garantias processuais fundamentais nesta fase, fica impedido
de figurar, no processo judicial do mesmo caso, como julgador – tarefa que é exercida pelo
juiz da instrução.

Vê-se claramente que o Código de Processo Penal estabeleceu uma competência funcional
de acordo com o momento da persecução penal. Em se tratando de fase investigativa, o
juiz das garantias preside como assegurador dos direitos fundamentais do investigado. Já
na fase processual, após o recebimento da peça acusatória, passa-se esta competência ao
juiz da instrução, responsável pelo julgamento do caso, cuja competência permanece até o
trânsito em julgamento de eventual sentença penal condenatória (ou absolutória).

O principal objetivo da criação do juiz das garantias no processo penal brasileiro é minimizar as
chances de macular a imparcialidade do juiz da causa. Até o advento dessa figura, a sistemática
prevista era que o juiz eu determinasse qualquer ato decisório na fase investigatória tornava-
se prevento para prosseguir no feito até o julgamento final (CPP, art. 75, parágrafo único e art.
83).

Assim, o juiz que, no curso do inquérito policial, determinou uma interceptação telefônica
e teve acesso a todos os elementos informativos dessa fase, tornava-se o mesmo juiz que
julgaria o acusado ao final da ação penal. Isso gera, obviamente, uma série de pré-julgamentos
sobre o investigado, que nem sempre são verdadeiros. Contudo, é fato que o conhecimento
desses elementos informativos pelo juiz da causa sempre pôs em risco sua imparcialidade no
momento de julgar o processo, motivo por que surge o juiz das garantias.

Dessa forma, o que se busca com o juiz das garantias é afastar o magistrado que julgará o
feito dos elementos informativos colhidos na fase investigatória. Busca-se uma blindagem,
uma garantia de imparcialidade, de forma que o julgamento da causa possa ser feito sem
pré-julgamentos.

Por fim, vale ressaltar que o juiz das garantias, no contexto dessa reforma do sistema
processual penal, tornou-se uma figura extremamente importante para assegurar o caráter
acusatório que se espera obter. Isso porque, afastando-se o juiz da causa de possíveis

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contaminações subjetivas e preconceitos oriundos da fase investigativa, é possível que haja
um julgamento equidistante, mais justo e mais correto do ponto de vista da paridade de
armas, do contraditório e da ampla defesa.

Suspensão da eficácia
Após a decisão dada pelo Min. Luiz Fux na ADI 6.299 MC/DF, j. 22/01/20, houve suspensão
sine die (sem data) da eficácia da implantação do juiz das garantias e seus consectários
(art. 3º-A, 3º-B, 3º-C, 3º-D, 3º-D, 3º-Ee 3º-F). Dessa forma, ainda se encontra suspensa sua
implantação no sistema processual penal brasileiro.

Funções
É extremamente importante ter em mente quais são as funções do juiz das garantias e quais
providências podem ser por ele tomadas na fase investigatória da persecução penal. Para
tanto, olhemos para a letra da lei:

Art. 3º-B. O juiz das garantias é responsável pelo controle da legalidade da investigação criminal e pela
salvaguarda dos direitos individuais cuja franquia tenha sido reservada à autorização prévia do Poder Judiciário,
competindo-lhe especialmente:

I - receber a comunicação imediata da prisão, nos termos do inciso LXII do caput do art. 5º da Constituição
Federa

lII - receber o auto da prisão em flagrante para o controle da legalidade da prisão, observado o disposto no art.
310 deste Código;

III - zelar pela observância dos direitos do preso, podendo determinar que este seja conduzido à sua presença,
a qualquer tempo;

IV - ser informado sobre a instauração de qualquer investigação criminal

V - decidir sobre o requerimento de prisão provisória ou outra medida cautelar, observado o disposto no § 1º
deste artigo;

VI - prorrogar a prisão provisória ou outra medida cautelar, bem como substituí-las ou revogá-las, assegurado,
no primeiro caso, o exercício do contraditório em audiência pública e oral, na forma do disposto neste Código ou
em legislação especial pertinente;

VII - decidir sobre o requerimento de produção antecipada de provas consideradas urgentes e não repetíveis,
assegurados o contraditório e a ampla defesa em audiência pública e oral;

VIII - prorrogar o prazo de duração do inquérito, estando o investigado preso, em vista das razões apresentadas
pela autoridade policial e observado o disposto no § 2º deste artigo;

IX - determinar o trancamento do inquérito policial quando não houver fundamento razoável para sua instauração
ou prosseguimento;

X - requisitar documentos, laudos e informações ao delegado de polícia sobre o andamento da investigação;

XI - decidir sobre os requerimentos de:

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a) interceptação telefônica, do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática ou de outras
formas de comunicação;

b) afastamento dos sigilos fiscal, bancário, de dados e telefônico;

c) busca e apreensão domiciliar;

d) acesso a informações sigilosas;

e) outros meios de obtenção da prova que restrinjam direitos fundamentais do investigado;

XII - julgar o habeas corpus impetrado antes do oferecimento da denúncia;

XIII - determinar a instauração de incidente de insanidade mental;

XIV - decidir sobre o recebimento da denúncia ou queixa, nos termos do art. 399 deste Código;

XV - assegurar prontamente, quando se fizer necessário, o direito outorgado ao investigado e ao seu defensor
de acesso a todos os elementos informativos e provas produzidos no âmbito da investigação criminal, salvo no
que concerne, estritamente, às diligências em andamento;

XVI - deferir pedido de admissão de assistente técnico para acompanhar a produção da perícia;

XVII - decidir sobre a homologação de acordo de não persecução penal ou os de colaboração premiada, quando
formalizados durante a investigação;

XVIII - outras matérias inerentes às atribuições definidas no caput deste artigo

§ 2º Se o investigado estiver preso, o juiz das garantias poderá, mediante representação da autoridade policial e
ouvido o Ministério Público, prorrogar, uma única vez, a duração do inquérito por até 15 (quinze) dias, após o que,
se ainda assim a investigação não for concluída, a prisão será imediatamente relaxada.

Art. 3º-C. A competência do juiz das garantias abrange todas as infrações penais, exceto as de menor potencial
ofensivo, e cessa com o recebimento da denúncia ou queixa na forma do art. 399 deste Código.

§ 1º Recebida a denúncia ou queixa, as questões pendentes serão decididas pelo juiz da instrução e julgamento.

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Inquérito Policial

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