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ROSSETTI

18?EDIÇÃO

Í.44.JÍ5
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_ INTRODUÇÃOÀ _
ECONOMIA
U j I I ■ <■ IV T

n t l u
A A brang ência e as
Lim itaçõ es da Eco no m ia

A ativ id ad e eco nô m ica se d efine a partir d a interação d e co m p lexas variá­


v eis. Dad as as lim itaçõ es d o esp aç o g eo g ráfico e d o s m eio s naturais, ela é
influenciáv el p o r fato res antro p o ló g ico -culturais, p elo o rd enam ento p o líti­
co , p elo p ro g resso tecno ló g ico e p elo im p rev isív el co m p o rtam ento d o s
d iferentes grup o s so ciais d e q u e se co nstituem as naçõ es. Pro curar co m ­
p reend er, em to d a sua extensão , esses eixo s d e sustentação é a tarefa m ais
im p o rtante d o s q ue se d ed icam à eco no m ia.

DENISE FLOUZ A T
Économie contemporaine
O estud o d o s asp ecto s eco nô m ico s da v id a faz p arte d e um a d as mais ab rang en­
tes categ o rias d o co nhecim ento hum ano , as c iê n c ia s so c iais.
G enericam ente, a eco no m ia centra sua atenção nas c o n d i ç õ e s d a p ro s p e ­
ri d a d e m a te ri a l , na a cu m u l a çã o d a ri q u e z a e em sua d i s tri b u i çã o a o s q u e
p a rti c i p a ra m d o e s f o rç o s o ci a l d e p ro d u çã o .

A ênfase m aio r o u m eno r co m que cad a um d esses asp ecto s é tratad o fica
na d ep end ência d o p ensam ento central a q u e se subo rd ina cad a uma d as esc o ­
las d o p ensam ento eco nô m ico .
D ad o seu enq u ad ram ento no cam p o d as ciências so ciais e suas lig açõ es
\ co m d iferentes co rrentes d e p ensam ento , c ab e d e início d estacar, p ara um a bem
\ fund am entad a co m p reensão d a eco no m ia:
\
! □ A s lig açõ es d a eco no m ia co m o utras ciências so ciais.
/ □ A fixação d o s p o nto s b ásico s em q u e se ap ó ia o estud o d a •economia.
^ □ As d iferentes c o n c ep ç õ es d a eco no m ia, env o lv end o seu o b jeto e c o n ­
ceito .
a A m eto d o lo g ia d e d esenv o lv im ento d o co nhecim ento eco nô m ico .
□ As d iv isõ es usuais da eco no m ia.
□ O sig nificad o e as lim itaçõ es d as leis eco nô m icas.

_____________________ \ _____________________________________

1 .1 A E co n o m ia co m o C iê n cia S o cial

A s C iê n c ia s As ciências so ciais o cu p am -se d o s d iferentes asp ecto s d o co m p o rtam ento hum a­


no . Po d em ser tam bém caracterizad as co m o ci ê n ci a s d o c o m p o rta m e n to o u,
So c ia is o u d o
alternativ am ente, c o m o c i ê n c i a s h u m a n a s . C o m p reend em áreas d istintas, à
C o m p o rta m e n to m ed id a q u e se p o ssam d iferenciar, p o r sua natureza, o s d iferentes asp ecto s da
ação d o ho m em co m o s quais cad a uma d elas se env o lv e.
A c i ê n ci a p o l í ti ca trata d as relaçõ es entre a nação e o Estad o , d as fo rm as
d e g o v erno e d a co nd u ção d o s neg ó cio s p úblico s. A s o c io lo g ia o cu p a-se d as

30 A C O M PREEN SÃ O D A ECO N O M IA
relaçõ es so ciais e da o rg aniz ação estrutural d a so cied ad e. A a n tro p o l o g i a cu l ­
tu ra l v o lta-se p ara o estud o d as o rig ens e d a ev o lu ção , d a o rg aniz ação e das
d iferentes fo rm as d e exp ressão cultural d o ho m em . A p s i co l o g i a o cu p a-se d o
co m p o rtam ento d o ho m em , d e suas m o tiv açõ es, v alo res e estím ulo s. A o d i re i to
c ab e fixar, co m a p recisão d itada p elo s uso s, co stu m es e v alo res d a so cied ad e,
as no rm as q u e reg ularão o s d ireito s e as o b rig açõ es ind iv id uais e so ciais. E à
e c o n o m i a , q u e, co m o as d em ais áreas, abrang e ap enas um a fração d as ciências
so ciais, co m p ete o estud o d a ação eco nô m ica d o ho m em , env o lv end o essencial­
m ente o p ro cesso d e p ro d ução , a g eração e a ap ro p riação da rend a, o d isp ên-
d io e a acum ulação .
À sem elhança d o q u e o co rre co m o s d em ais ram o s d as ciências so ciais, não
se p o d e co nsid erar a eco no m ia co m o fechad a em to m o d e si m esm a. Pelas im­
p licaçõ es da ação eco nô m ica so b re o utro s asp ecto s d a v id a hum ana, o estud o
d a eco no m ia im p lica a abertura d e suas fro nteiras às d em ais áreas d as ciências
hum anas. Esta abertura se dá em d up la d ireção , assum ind o assim caráter b iu n í
v o c o . D e um lad o , p o rq u e a eco no m ia busca alicerçar seus p rincíp io s, c o n c ei­
to s e m o d elo s teó rico s não ap enas na sua p ró p ria co erência, co nsistência e ad e­
rência à realid ad e, mas aind a no s d esenv o lv im ento s d o s d em ais cam p o s d o c o ­
nhecim ento so cial. D e o utro lad o , p o rq u e p o d e influir no q u estio nam ento d o s
p rincíp io s e d as aq u isiçõ es co nceitu ais d esses m esm o s cam p o s. E vai aind a além ,
abrind o suas fro nteiras à f il o s o f i a e à é ti c a ; à h i s tó ri a e às d iferentes m anifes­
taçõ es da re l i g i ã o ; à te cn o l o g i a e ao s v ariad o s ram o s q u e atu alm ente se o c u ­
p am d o estud o d o m e i o à m b i e n te .

Reina >es As relaçõ es biu nív o cas d a eco no m ia co m o utro s ram o s d o co nhecim ento hum a­
n o se enco ntram exp licitad as na Figura 1.1. E fo ram assim sintetizad as p o r Leo -
Biu rm o eas da
hard Silk:1
E c o n o m ia
kiO s e c o n o m i s ta s n ã o te m s e u tra b a l h o l i m i ta d o p e l as id é ias f o r­
m a is d e u m a ú n i ca d is ci p l in a. A s f il o s o f ias p o l í ti cas e o s p ri n cí p i o s
é ti co s a q u e s u b o rd i n a m s e u s v a l o re s , s u as v id as e a v a ri a d a g a m a
d e s u as p e rc e p ç õ e s p ro c u ra m e x p l i c a r m u i tas c o i s a s q u e u l tra p a s ­
s a m a l ó g i ca e x p l í c i ta d c s e u tra b a l h o p ro f i s s i o n a l ."

Entre o s eco no m istas co ntem p o râneo s q u e trataram d as lig açõ es entre a


eco no m ia e o utro s ram o s, Kenneth Bo u ld ing 2 é g eralm ente citad o co m o um d o s
q u e as resum iram co m m aio r clarez a e o bjetiv id ad e. São d ele as seg uintes o b ­
serv açõ es:

‘O s p ro b l e m a s e c o n ô m i c o s n ã o tê m c o n to rn o s b e m d e l i n e a d o s .
Ele s s e e s te n d e m p c rc e p ti v c l m e n te p e l a p o l í ti ca , p e l a s o ci o l o g i a
e p e l a é ti ca , a s s i m (co rn o h á q u e s tõ e s p o l í ti ca s , s o ci o l ó g i ca s o u é ti ­
ca s q u e s ã o e n v o l v i d a s o u m e s m o d e c o rre n te s d e p o s tu ra s e c o n ô ­
m i ca s . N ão s e rá e x a g e ro d i z e r q u e a re s p o s ta f in al às q u e s tõ e s c ru ­
ci a i s d a e c o n o m i a e n c o n tra - s e e m al g u m o u tro c a m p o . O u q u e a
re s p o s ta a o u tra s q u e s tõ e s h u m a n a s , f o rm a l m e n te tra ta d a s e m
o u tra s e s f e ra s d as c i ê n ci a s s o ci a i s , p a s s a rá n e c e s s a ri a m e n te p o r
al g u m a re v i s ã o d o o rd e n a m e n to re a l d a v i d a e c o n ô m i c a o u d o
c o n h e c i m e n to e c o n ô m i c o ."

A A BRA N G ÊN C IA E A S IIM IT A Ç Õ ES D A EC O N O M IA 31
FIG URA 1.1
O ca rá te r b iu n ív o co
d as re laçõ e s d a
e co n o m ia co m
o u tro s ram o s d o
co n h e cim e n to
s o cial.

Seg u nd o esta c o n c e p ç ão m ais ab rang ente, o s co nflito s relacio nad o s ao s


p ro cesso s d e p ro d ução , d e acum u lação d a riquez a, d e rep artição , d e d ifusão d o
b em -estar e da p lena realiz ação d o b em -co m u m não se lim itam às so lu çõ es en­
co ntrad as na área eco nô m ica. Tam b ém não se enco ntram , iso lad am ente, em
q u aisq uer o utro s ram o s d as ciências so ciais o u em o utro s co m p artim ento s d o
co nhecim ento hum ano . Cada um d o s m ó d ulo s d o co nhecim ento hum ano , so cial
o u exp erim ental, não p assa d e uma fração d e um to d o m aio r, co nstituíd o p o r
sub co nju nto s interd ep end entes, d e so m a unitária.
Em síntese, p o d e-se inferir que as interfaces da eco no m ia co m o utro s ra­
m o s d o co nhecim ento so cial d eco rrem d e q u e as relaçõ es hum anas e o s p ro b le­
m as nelas im p lícito s o u d elas d eco rrentes não são facilm ente sep aráv eis seg u n­
d o nív eis d e referência rig o ro sam ente p ré-classificad o s. O referencial eco nô m i­
c o d ev e ser v isto ap enas comçT uma ab stração útil, p ara q u e se analisem asp ec­
to s esp ecífico s da luta hum ana p ela so brev iv ência, p ro sp erid ad e, bem -estar in­
d ivid ual e b em -co m um . O co rre, to d av ia, que essa m esm a luta não se esg o ta no s
lim ites d o que se co nv encio no u cham ar d e relaçõ es eco nô m icas. Vai m uito além ,
abrang end o asp ecto s q u e d iz em resp eito à p o stura ético -relig io sa, às fo rm as d e
o rg aniz ação p o lítica, ao s m o d o s d e relacio nam ento so cial, à estruturação da o r­
d em juríd ica, ao s p ad rõ es d as co nq u istas tecno ló g icas, às lim itaçõ es im p o stas
p elas co nd içõ es d o m eio am biente e, m ais abrang entem ente, à fo rm ação cultu­
ral da so cied ad e. A Figura 1.2 resum e, esq uem aticam ente, essas o b serv açõ es.

32 A CO M PREEN SÃ O DA ECO N O M IA
FIG U R A 1 . 2

A ação e co n ô m ica
e s e u s p ri n c i p a i s
c o n d i c i o n a m e n to s .
Fatores c o n d ic io n a n te s d a a ç ã o , d a s re la ç õ e s e
d o c o m p o rta m e n to e c o n ô m ic o

F o rm a s
de o rg a n iz a ç ã o p o lític a
d a s o c ie d a d e

P osturas
é tic o -re lig io s a s
M o d o s de
r e la c io n a m e n to
so cia l

C o n d iç õ e s lim ita tiv a s d o


m e io a m b ie n te E s tru tu ra ç ã o
da
o rd e m ju ríd ic a

F o rm a ç ã o
P adrões d as
c u ltu ra l d a
c o n q u is ta s
s o c ie d a d e
te c n o ló g ic a s

Fatores q u e p o d e m ser c o n d ic io n a d o s p e la a ç ã o ,
p e la s re la çõ e s e p e lo c o m p o rta m e n to e c o n ô m ic o

D e Q u e se A d esp eito da co m p lexa teia d e relaçõ es so ciais e da m ultip licid ad e d o s fato res
co nd icio nantes que env o lv em a ação eco nô m ica, há, entretanto , um co nju nto
O cup a a
d estacad o d e asp ecto s p articulares da realid ad e so cial q u e grav itam m ais esp eci­
Ec o n o m ia ficam ente no cam p o d e interesse da eco no m ia. Um d eles é o p o linô m io p ro d u -
çã o - d i s tri b u i çã o - d i s p ê n d i o - a cu m u l a çã o , d estacad o p o r J. B. Say ,3 um d o s m ais
reco nhecid o s teó rico s da eco no m ia clássica. O utro é o trinô m io ri q u e z a - p o b re -
z a - b e m - e s ta r, d estacad o p o r o utro m estre no táv el, A. M arshall.4 O u então o utro
binôrpio, c re s c i m e n to - d e s e n v o l v i m e n to , citad o p o r Kuznets.5 O utro aind a é
o trinô m io re c u rs o s - n e c e s s i d a d e s - p ri o ri d a d e s , ap ro fund ad o p o r L. Ro bb ins.6

A A BRA N G ÊN C IA F. A S LIM ITA Ç Õ ES DA EC O N O M IA 33


Uma relação m ais extensa d e g rand es tem as d e q u e se o cup a a eco no m ia
incluiría:

□ Escavssez. A escassa d isp o nibilid ad e d e recurso s p ara o p ro cesso p ro ­


d utiv o . Sua co nfo rm ação . Seus custo s. Sua exau stão o u cap acid ad e d e
reno v ação .
□ E m p re g o . O em p reg o d o s recurso s. A o cio sid ad e d o s q u e se en c o n ­
tram d isp o nív eis. O d esem p reg o , suas causas e co nseq ü ências.
□ P ro d u çã o . O p ro cesso p ro d utiv o co m o catego ria básica. D eco rrências
da p ro d ução : a g eração d e rend a, o d isp ênd io e a acum ulação . A ri­
q u ez a, a p o b rez a e o bem -estar.
□ A g e n te s . Co m o se co m p o rtam o s ag entes eco nô m ico s. Em q u e co nfli­
to s d e interesse se env o lv em . Q uais suas fu nçõ es típ icas. Q uais suas
m o tiv açõ es.
□ T ro ta s Fund am ento s d o sistem a d e tro cas: d iv isão d o trabalho , esp e­
cializ ação , bu sca p o r eco no m ias d e escala. Eficiência co m p arativ a d o s
sistem as d e tro cas em relação à auto -suficiência.
□ V al o r. Fund am ento s d o v alo r d o s recurso s e d o s p ro d uto s d eles d e­
co rrentes. Raz õ es o bjetiv as e subjetiv as q u e d efinem o v alor.
o M o e d a. Co m o e p o r que se d eu seu ap arecim ento . C o m o ev o luiu.
Fo rm as atuais e futuras d e m o ed a. Razõ es d a v ariação d e seu v alo r.
C o nseq ü ências d as d uas categ o rias básicas d e v ariação d o v alo r da
m o ed a: a inflação e a d eflação .
□ P re ço s . D iferentes abo rd ag ens. O s p reço s c o m o exp ressão m o netária
d o v alo r. C o m o resultad o d a interação d e fo rças d e o ferta e d e p ro cu ­
ra. Co m o o rientad o res p ara o em p reg o d o s recurso s. Co m o m ecanis­
m o d e co o rd enação d o p ro cesso ec o nô m ic o co m o um to d o .
□ M e rcad o s . Tip o lo g ia e características d o s•m erc ad o s.,A p ro cura e a
o ferta: fato res d etenninantes. O eq uilíbrio , as fu nçõ es e as im p erfei­
ç õ es d o s m ercad o s.
□ C o n c o rrê n c i a . D iferentes estruturas co nco rrenciais: d a co nco rrência
p erfeita ao m o no p ó lio . Im p acto s so ciais d e cad a um a d elas. Fu nçõ es
da co nco rrência. Razõ es p ara co ntro le d e suas im p erfeiçõ es. Razõ es
p ara sua p reserv ação .
□ R e m u n e ra çõ e s . Tip o lo g ia e características d as d iferentes fo rm as d e
rem u neraçõ es p agas ao s recurso s d e p ro d ução . O s salário s, o s juro s,
as d ep reciaçõ es, o s aluguéis, o s royalties, o lucro . Nat.urezat d e cad a
uma d essas fo rm as. Co nflito s que d eco rrem d e suas d iferentes p artici­
p açõ es na rend a d a so cied ad e co m o um to d o .
o A g re g ad o s . D eno m inação d ad a às g rand es categ o rias d a Co ntabilid a­
d e So cial, co m o o Pro d uto Interno Bruto e a Rend a N acio nal. Co m o
m ed i-lo s. O q u e sig nificam . C o m o em p reg á-lo s p ara aferir o d esem p e­
nho d a eco no m ia c o m o um to d o .
□ T ra n s a çõ e s . Catego rias básicas: reais e financeiras. A brang ência: in­
ternas, ae. âm bito nacio nal; externas, d e âm bito internacio nal. M eio s
d e p ag am qnto env o lv id o s. Causas e c o nseq ü ências d e d eseq uilíb rio s,
no tad am énte no âm bito externo .

34 A C O M PREEN SÃ O D A EC O N O M IA
□ C re s ci m e n to . A exp ansão da eco no m ia c o m o um to d o . C rescim ento
e d esenv o lv im ento : d iferenças co nceitu ais. C rescim ento e ciclo s e c o ­
nô m ico s.
□ E q u il íb rio . Co m o se estab elece o eq uilíbrio geral, estático e d inâm ico
d o p ro cesso ec o nô m ic o . C o m o e p o r q u e, a d esp eito da co m p lexa
teia d as relaçõ es eco nô m icas e d o s d eco rrentes co nflito s d e interesse
q u e as env o lv em , a o rd em se so b rep õ e ao cao s. Q uais o s m ecanism o s
q u e d ão sustentação ao p ro cesso eco nô m ico , p ara que siga seu curso ,
ap esar da am p litud e d o s m o v im ento s d e alta e d e baixa, d e d ep ressão
e d e exp ansão .
□ O rg a n i z a çã o . Fo rm as alternativ as, d o p o nto d e vista institucio nal, para
a o rg aniz ação eco nô m ica d a so cied ad e. A ntag o nism o s entre o cap ita­
lism o liberal e o so cialism o centralista. M atrizes id eo ló g icas q u e o s
sup o rtam . Pad rõ es e d esd o bram ento s d as alternativ as extrem ad as. O b ­
jetiv o s e resultad o s.

1 .2 A Q u an tif icação d a R ealid ad e E co n ô m ica

N ão o bstante extensa em relação às sínteses a que no s referim o s, as d e Say,


M arshall, Kuznets e Ro bbins, essa relação d e grand es tem as d e que se o cu p a a
eco no m ia não é exaustiv a. Cad a um d o s tem as tem m últip lo s d esd o bram ento s.
C o njunto s e sub co nju nto s d e tem as relacio nad o s a cad a um d eles p o d erão ser
d estacad o s, co b rind o d iferentes asp ecto s e p articularid ad es da v id a eco nô m ica.
To d o s, p o rém , têm uma característica co m um : s ã o p a s s í v e i s d e a l g u m a
f o rm a d e m e n s u ra ç a o .

Esta característica co stum a ser ap o ntad a co m o uma d iferença m arcante entre


a eco no m ia e o utro s ram o s d o co nhecim ento so cial. Em eco no m ia é p o ssív el:

□ Q uantificar resultad o s.
□ Co nstruir id entid ad es quantificáv eis.
□ Estabelecer relaçõ es quantitativas entre d iferentes catego rias d e transaçõ es.
□ D esenv o lv er m o d elo s exp licativ o s da realid ad e, basead o s em sistem as
d e eq u açõ es sim ultâneas.
□ Pro ced er a análises fund am entad as em p arâm etro s quantificad o s.
□ D esenv o lv er sistem as quantitativ o s p ara d iag nó stico s e p ro g nó stico s.

Esta p articularid ad e da eco no m ia p o ssibilito u o surg im ento d e co rrentes e c o ­


nô m icas fund am entad as no m é to d o m a te m á ti co , bem co m o o d esenv o lv im en­
to d e um im p o rtante ram o auxiliar d e inv estig ação eco nô m ica, a e c o n o m e tri a .
O significad o d esse ram o está sintetizad o no Q uad ro 1.1. N o Q uad ro 1.2 enco n­
tra-se uma síntese d as fo nnas usuais d e ind icaçõ es quantitativas em eco no m ia.

U n id ad e s A u n i d a d e m o n e tá ri a é a b ase d o p ro cesso d e q u antificação em eco no m ia.


A lém d e exerc er o utras funçõ es, q u e m ais à frente serão analisad as, a m o ed a é,
A d o tad as
fund am entalm ente, u n i d a d e d e c o n ta e d e n o m i n a d o r c o m u m d e v a l o re s .

A A BRA N G ÊN C IA E A S LIM ITA Ç Õ ES D A EC O N O M IA 35


Q UA D RO 1.1
A e co n o m e tria: sig n if icad o e ap licaçõ e s.

A e c o n o m e tria é um ramo da eco no m ia que co m ­ O s cam p o s de inv estigação em que a eco no m etria
bina a análise eco nô m ica, a matemática e a estatística. enco ntro u m aio r ap licação foram:
Trabalha co m a d eterm inação , p o r m éto d o s matemáti­ A an álise d o e q u ilíb rio g eral d a e c o n o m ia c o m o
co s e estatístico s, cte leis quantitativas que regem a vida u m to d o . Seu p ro p ó sito é d emo nstrar co m o se realizam
eco nô m ica. ajustes m utuamente co nsistentes. Pela variedade d e equa­
A d eno m inação “eco no m etria" foi introd uzida em çõ es que se incluem em análises d esta natureza, as so lu­
1926 p elo eco no m ista e estatístico no rueg u ês Ragnar çõ es d o s m o d elo s eco no m étrico s co rresp o nd entes to r­
Frisch, que recebeu o Prêmio N o bel d e eco no m ia em nam -se bastante co m p lexas. Po r isso , o s m o d elo s d e
19Ó9- Insp iro u-se no termo “biom etria” , que ap areceu no equilíbrio geral têm sido mais em p reg ad o s co m o instru­
final d o século XIX para d esignar a área d e estud o s bio ­ mental teó rico para a co m p reensão d o m ecanism o ec o ­
ló g ico s q u e em p rega m éto d o s estatísticos. Co mo m éto ­ nô m ico co m o um to d o d o que, p ro priam ente, co m o fer­
d o d iferenciad o de estud o da vida eco nô m ica, a eco no ­ ramenta o p eracio nal.
m etria d esenv o lv eu -se rap id am ente ap ó s a Prim eira A an álise m atric ial d o s flu x o s d e b e n s e se rv i­
Guerra Mundial. ç o s e n tre o s d ife re n te s se to re s d a e c o n o m ia n ac io ­
A eco no m etria d esenv o lv eu-se em resp o sta às co n ­ nal. Sua d eno m inação usual é matriz de insumo -p ro du-
d içõ es mutáveis da vida eco nô m ica. O estud o d o s ciclo s to. A matriz revela a relação d e cad a seto r d e p ro d ução
eco nô m ico s to m o u-se uma p reo cu p ação crescente, tan­ da eco no m ia co m to d os o s demais. O s m o d elo s matriciais
to para grandes co rp o raçõ es em p resariais, co m o para a de insum o -p ro d uto to rnam -se particularm ente úteis para
so cied ad e co m o um to d o . Se, p o r exem p lo , uma grande o p lanejam ento das eco no m ias so cialistas, em que a ini- 1
em p resa p ud esse p rev er as flutuaçõ es eco nô m icas co m ciativa go v ernam ental substituiu p o r co m p leto o s m eca­
um grau de p recisão razo ável, p o deria, até certo p o nto , nism o s da livre iniciativa em presarial.
ilhar-se d e seus efeito s ad v erso s. A d icio nalm ente, a so ­ A te o ria d o s jo g o s, c o m o in stru m e n to im p o r­
cied ad e co m o urn to d o , o p erand o p o r m eio d e go v erno tan te p ara sim u lar q u e stõ e s e straté g ic as. Em situa­
ou d e o rg anizaçõ es d e pesquisa, estava interessada em çõ es em q ue existem interesses co nflitantes e d iferentes
p rev er as tend ências eco nô m icas para co ntro lá-las, m e­ hip ó teses d e reaçõ es às açõ es co ncretas a determinadas
lhorar seu curso ou co m p ensá-las. Tud o isto estimulo u a d ecisõ es, sim ulaçõ es co m base em parâmetro s quantifi-
p esquisa eco no m étrica. cãv eis são esp ecialm ente úteis. N este cam p o , a eco no ­
A análise eco no m étrica é ho je esp ecialm ente útil tan­ metria utiliza co nceito s estatístico s d e p ro babilid ad e, p ro ­
to para p rever o futuro, co m o para analisar po líticas p ú­ curand o inferir as chances d e d iferentes categ o rias de
blicas. Com a exp ansão das atividades eco nô m icas d os reaçõ es. Sua ap licação é p articularm ente o bserv ad a na
go v erno s nacio nais, to rno u-se crescente a necessid ad e o rientação d o p ro cesso d ecisó rio d e grandes co rp o ra- 1
d e determinar co m a exatid ão possível o s efeito s da atua­ çõ es.
ção do seto r p úblico so bre o s indivíduos e as o rganiza­
çõ es emp resariais. As técnicas eco no m étricas passaram Fo n te : OSER, Jaco b , BLANCHFIELD, W illiam C. Histó­
a fo rnecer instrumentos e quad ro s analítico s para essas ria do pensamento econômico. São Paulo : Atlas,
d eterm inaçõ es. 1987.

Para quantificar ativ id ad es eco nô m icas internas, p ro cesso s e resultad o s, a unid a­


d e d e referência é a m o ed a co rrente d o país. Para transaçõ es ou co m p araçõ es
externas, em p reg am -se d ivisas internacio nalm ente aceitas, as cham ad as m o ed as
fo rtes d o s p aíses centrais, co m o o d ó lar d o s Estad o s Unid o s. Na co nv ersão d e
uma unid ad e m o netária p ara o utra, ad o ta-se a relação d e tro ca entre elas - a
taxa cam bial.
São , assim , exp ressas m o netariam ente não só as transaçõ es usuais d o d ia-a-
d ia e seus resultad o s acum ulad o s, b em co m o m agnitud es g lo bais, d e q u e é exem ­
p lo o Pro d uto Interno Bruto , isto é, a so m a d e to d o s o s b ens e serv iço s finais
p ro d uzid o s p ela eco no m ia d o p aís. D ad a a d iv ersid ad e d o s b ens e serv iço s p ro ­
d uzid o s, não hav eria o utra fo rm a d e exp ressai; uma m agnitud e d esta grand eza e
co m p lexid ad e.
As q u antificaçõ es em unid ad es m o netárias ap ó iam -se tam bém o u se co m p le­
m entam p o r quantificaçõ es em u n i d ad e s n ã o m o n e tá ri a s , co m o as d o s siste­
mas m etro ló g ico s usuais e suas co nv ersõ es.

36 A C O M PREEN SÃ O D A ECO N O M IA
Q UA D RO 1 .2
A q u an tif icação d a realid ad e e as v ariáv eis e co n ô m icas : f o rm as u su ais d e in d icaçõ es
q u an titativ as.
.
.
M o n e tá r ia s □ M o e d a c o r r e n te d o p a ís ( a ) .
(A m o e d a c o m o □ D iv is a s e x te r n a s ( b ) .
u n id a d e d e c o n ta e □ R e l a ç õ e s c a m b ia i s e n tr e ( a ) e ( b ) .
U n id a d e s
d e n o m in a d o r
a d o ta d a s
c o m u m d e v a lo r e s )

N ão m o n e tá r ia s □ S is te m a s m e tr o ló g ic o s u s u a is e s u a s c o n v e r s õ e s .

V a riá v e is - f lu x o □ In d ic a m m a g n itu d e s m e d id a s a o l o n g o d e d e t e r m i ­
D is tin ç ã o
n a d o p e r í o d o d e te m p o .
f u n d a m e n ta l
e n tr e v a riá v e is
V a r iá v e is - e s to q u e □ In d ic a m m a g n itu d e s m e d id a s e m d e te r m in a d o m o ­
e c o n ô m ic a s
m e n to .
q u a n tif íc ã v e is

R e la ç õ e s f u n c io n a is o In d ic a m r e l a ç õ e s e n tr e d u a s v a r iá v e is , e x p r e s s a n d o a
□ L in e a r e s c o r r e s p o n d ê n c i a f u n c io n a l e n tr e e la s .
□ N ã o lin e a r e s

R e la ç õ e s R e la ç õ e s o In d ic a m v a r i a ç õ e s c u m u la tiv a s , n o d e c u r s o d e s é r ie s
e n tr e in c r e m e n ta is h is tó r ic a s , e n tr e d u a s v a riá v e is .
v a riá v e is □ In d ic a m a r e s p o s ta d e u m a o u d e um c o n ju n to de
v a r iá v e is a d e te r m in a d a a ç ã o e c o n ô m i c a .

R e la ç õ e s m a tr ic ia is □ In d ic a m a i n te r d e p e n d ê n c ia d e c o n ju n to s in te r c o n s is -
te n te s d e v a riá v e is .
.

N ú m e ro s - ín d ic e s □ In d i c a m v a ria ç õ e s d e g r u p o s , d e c o n ju n to s o u de
a g re g a ç õ e s d e d a d o s e c o n ô m ic o s .

M e d id a s d e □ Ex p re ssa m em te r m o s m é d io s , m e d i a n o s o u m o d a is
te n d ê n c ia c e n tr a l a o b se rv aç ão d e d e te r m in a d a s i tu a ç ã o o u tr a n s a ç ã o
e c o n ô m ic a .

Q u o c ie n te s □ R e s u lta d o d a d iv is ã o d e v a r iá v e is e c o n ô m i c a s , e x p r e s ­
san d o :
F o r m a s u s u a is
□ V a r ia ç õ e s a o l o n g o d o te m p o .
d e in d ic a ç õ e s
□ P ro p o rç õ e s e m d e te r m in a d o m o m e n to .
! q u a n tita tiv a s

C o e f ic ie n te s □ E x p r e s s a m p a r â m e tr o s d e c o r r e l a ç ã o , s i m p le s o u m ú l­
tip la , e n tr e v a r iá v e is e c o n ô m ic a s ,
o E x p r e s s a m g ra u s d e c o n c e n tr a ç ã o ( o u d e d is p e r s ã o )
d e d e te r m in a d a s c o n d i ç õ e s e s tr u tu r a is d a e c o n o m i a .

V a lo r e s a b s o lu to s □ Ex p re ssa m r e s u lta d o s d e tr a n s a ç õ e s :
□ E s p e c íf i c a s ; d e u m d a d o a g e n te , o u in te r a g e n te s .
o D a a tiv id a d e e c o n ô m i c a a g r e g a ti v a m e n te c o n s i d e ­
rad a.
r
____________________________ L
i

A A BRA N G ÊN C IA E A S LIM ITA Ç Õ ES D A EC O N O M IA 37


D is tin ç ã o En tre Um a d as mais im p o rtantes d istinçõ es, no cam p o da eco no m ia quantificad a, diz
resp eito à natureza d as v ariáv eis quantificáv eis. A d eno m inação g enérica v a ri á ­
V ariáv e is
v e l ap lica-se a cad a uma d as exp ressõ es que co m p õ em su b co nju nto s d e d ife­
Q u a n tif ic á v e is rentes categ o rias d e ativ id ad es eco nô m icas. D iz-se, p o r exem p lo , q u e o p ro d uto
d a ativ id ad e eco nô m ica é uma v ariáv el; são tam bém v ariáv eis as d iferentes cate­
g o rias d e rend a g erad as no d ecu rso d o p ro cesso d e p ro d ução ; o co nsu m o , en­
q u anto fo rm a d e d isp ênd io d a rend a, é o utra v ariáv el; a p arcela da rend a não
co nsum id a, d eno m inad a p o u p ança, é tam bém uma v ariáv el. São tam bém v ariá­
v eis o p reç o e as q uantid ad es o fertad as e p ro curad as d e um b em eco nô m ico
qualq uer. A s exp o rtaçõ es e as im p o rtaçõ es d e m ercad o rias d e um p aís são d o is
o utro s exem p lo s d e v ariáveis eco nô m icas. E o sald o líquid o da balança co m ercial
d o p aís tam bém é uma v ariáv el. Um últim o exem p lo : a taxa d e juro s é o utra
im p o rtante v ariáv el eco nô m ica.
V ari áv e i s e c o n ô m i c a s são , p o rtanto , exp ressõ es ind icativ as d e d iferentes
categ o rias d e ativ id ad es ec o nô m ic as - transaçõ es, p ro cesso s, resultad o s. Essa
d eno m inação g enérica resulta d e q u e elas v a ri a m em d eterm inad o p erío d o d e
tem p o - algum as a curto ou até a curtíssim o p razo ; o utras a m éd io e a lo ng o
p raz o s.
Q uanto a sua natureza, as v ariáv eis .eco nô m icas são usualm ente classifica­
d as em d uas categ o rias: v a ri ã v e i s - f l u x o e v a ri á v e ts - e s to q u e .
As v a ri á v e l s - f l u x o são ind icad o res q u e se referem , necessariam ente, a tran­
saçõ es o co rrid as a o l o n g o d e d e te rm i n a d o p e rí o d o d e te m p o . O Pro d uto In­
terno Bruto é exem p lo clássico d e v ariáv el-fluxo . Sua m ag nitud e asso cia-se a
d eterm inad o p erío d o . Usualm ente, o PIB é aferid o p ara p erío d o s anuais. Resulta
d a so m a d o s fluxo s d e p ro d ução o co rrid o s ao lo ng o d e d eterm inad o ano . Para
cad a ano , o b tém -se um a m ag nitud e d iferente. A no a ano , o PIB v aria. Mais exem ­
p lo s: as exp o rtaçõ es, as im p o rtaçõ es; o s tributo s arrecad ad o s e o s gasto s co rren­
tes d o g o v erno são , tip icam ente, v ariav eis-fluxo .
As v a ri á v e i s - e s to q u e são m ed id as q u e exp ressam m ag nitud es e m d e te r­
m i n a d o m o m e n to . O nív el d as reserv as cam biais d e um p aís é, tip icam ente,
um esto q u e. O s m eio s d e p ag am ento são tam bém esto q u es. Mais exem p lo s: o
v alo r d e m ercad o d o co nju nto d as em p resas neg o ciad as nas Bo lsas d e V alo res;
a riqueza nacio nal acum ulad a e a p o p u lação eco no m icam ente m o bilizáv ei.
Uma analo g ia p o d erá esclarecer m elho r essa d istinção fund am ental. Sup o ­
nha-se que as reserv as internacio nais d e um p aís se enco ntrem em um reserv a­
tó rio . Seu nív el, e m d e te rm i n a d o m o m e n to , é um esto q u e, q u e v aria p ara
m ais e p ara m eno s, em fu n ção d e flu xo s, d e q u e são exem p lo s o s g asto s c am ­
biais co m im p o rtaçõ es (saíd as d o reserv ató rio ) e as receitas cam biais co m e x ­
p o rtaçõ es (entrad as). O utro exem p lo : a p arcela da riqueza nacio nal exp ressa
p elo total d o s inv estim ento s em m áquinas, eq uip am ento s e ed ificaçõ es é tam ­
b ém um esto q u e, cu jo nív el varia p ara m eno s, em fu nção d e d esg astes físico s e
d ep reciaçõ es; e p ara m ais, se o co rrerem no v o s flu xo s d e inv estim ento s.

R e la ç õ e s e n tre A s v ariáv eis eco nô m icas, esto q u es o u fluxo s, não são exp ressõ es iso lad as, d es­
p ro v id as d e c o n ex õ es. Elas rep resentam m ag nitud es g eralm ente resultantes d e
V a riá v e is
co m p lexas teias d e relaçõ es e d e estruturas interco nectad as. Estab eleeem -se, as­
sim, entre as v ariáv eis ecõ nô m icas, d iferentes fo rm as d e relaçõ es, d e que são
exem p lo s as f u n ci o n a i s , as i n c re m e n ta i s e as m a tri ci a i s .

38 A C O M PREEN SÃ O D A ECO N O M IA
R EIA Ç Õ ES FU N C IO N A IS. A s re l a ç õ e s f u n ci o n a i s exp ressam a co rresp o n­
d ência o u o reg im e d e d ep end ência entre v ariáv eis. Relaçõ es d esta natureza são
usualm ente v erbaliz ad as da seg uinte fo rm a: a v ariáv el X é função d e Y. Isto
sig nifica q u e a m agnitud e d e X d ep end e da d e Y. V am o s a d o is exem p lo s:

1. A s quantid ad es p ro curad as d e d etenninad o p ro d uto são fu nção d e seu


p reço . Trata-se d e um a relação inv ersa: q u anto m eno res o s p reço s,
m aio res as quantid ad es p ro curad as. Esta relação funcio nal d e co rres-
* p o nd ência entre quantid ad es p ro curad as (QP) e p reço s (P) g eralm en­
te é exp ressa da seg uinte fo rm a:
QP = / CP)
D ev e-se ler: as quantid ad es p ro curad as são função d o p reço .
2. O flu xo anual d e co nsu m o o b seiv ad o em d eterm inad o p aís é fu nção
d a rend a d e q u e a so cied ad e d isp õ e. Trata-se d e um a fu nção d ireta:
q u anto m aio r o nív el d e rend a, m aio r p o d e ser o d e co nsu m o . Esta
relação funcio nal d e co rresp o nd ência entre rend a ( Y) e co nsu m o ( O
g eralm ente é exp ressa da seg uinte fo rm a:
C = f( Y )
D ev e-se ler: o co nsu m o é função d a rend a.

R ELA Ç Õ ES IN C REM EN T A IS As re l a ç õ e s i n c re m e n ta i s exp ressam v aria­


çõ es cum ulativ as entre v ariáveis que, ao lo ng o d o tem p o , seg uiram suas p ró p rias
trajetó rias, d ep end entes o u não d e fato res co m uns o u interco nectad o s. Exp res­
sam tam bém a resp o sta d e d eterm inad o co nju nto d e v ariáv eis eco nô m icas a d e­
term inad a o co rrência v erificad a em o utra v ariáv el. O s increm ento s são usual­
m ente ind icad o s p ela letra greg a d elta (A ). O entend im ento d essa categ o ria de
relação fica sim p les atrav és d e d o is exem p lo s:2
1

1. A o lo ng o d e d eterm inad o p erío d o d e tem p o , exp and iram -se a rend a


nacio nal c o m o um to d o ( Y) e a m assa salarial ( W) , um d e seu s m ais
im p o rtantes co m p o nentes. Ind icand o o s au m ento s, o u increm ento s,
d essas d uas v ariáv eis resp ectiv am ente p o r A K e A W, a relação incre­
m entai seria d ad a p or:
AY
AW
D ev e-se ler: relação increm entai rend a-salário s.
Uma relação increm entai unitária ind icaria q u e as d uas v ariáv eis se
exp and iram em iguais p ro p o rçõ es. Se inferio r a um, a m assa salarial
exp and iu -se p ro p o rcio nalm ente mais q u e a rend a nacio nal co m o um
to d o ; se m aio r que um, ind icaria p erd as da categ o ria salário s em rela­
ção à rend a co m o um to d o .
2. Em d eterm inad o p erío d o d e tem p o , o s inv estim ento s em no v o s b ens
d e cap ital (m áq uinas, eq u ip am ento s, ed ificaçõ es) atingiram d eterm i­
nad a m agnitud e. Em resp o sta \a esses inv estim ento s, criam -se no v o s
em p reg o s p ara a p o p u lação ecõ no m icam ente m o bilizáv el. Ind icand o
o s no v o s inv estim ento s p o r AI é o s no v o s em p reg o s p o r AE, a relação
increm entai seria d ad a p or:
AI
AE

A A BRA N G ÊN C IA E A S LIM ITA Ç Õ ES D A EC O N O M IA 39


FIG URA 1 .3
T ra n sa çõ e s In fe rin d u s tria is
Estru tu ra
sim p lif icad a d e \ P ro d u tos
u m a m atriz d e
A B c D K N
In su m o s i
in su m o -p ro d u to :
u m e xe m p lo d e A
D e s tin o d o 4.
tran s açõ e s p ro d u ç ã o 4
B . . .

e xp re s s as so b a
O rigem
f o rm a d e re laçõ e s da
C
m atriciais. p ro d u ç ã o

K m
N

D ev e-se ler: relação increm entai inv estim ento s-em p reg o .
N o te-se que, nesta relação , estam o s co m p arand o d uas v ariáv eis e c o ­
nô m icas d efinid as p o r d iferentes unid ad es. O s inv estim ento s são ind i­
cad o s em unid ad es m o netárias; o em p reg o , p o r núm ero d e trabalha­
d o res. C aso , p o r exem p lo , o s no v o s inv estim ento s tenham to taliz ad o ,
ao lo ng o d e d eterm inad o p erío d o , R$ 20 b ilhõ es, g erand o 500 mil
no v o s em p reg o s d ireto s e ind ireto s, teríam o s uma relação increm entai
d e 40.000 p o r 1. Isto significa que, p ara cad a R$ 40 mil em no v o s
inv estim ento s, g era-se um em p reg o no v o na eco no m ia.

R ELA Ç Õ ES M A TRIC LA IS. As re l a ç õ e s m a tri c i a i s ind icam a interd ep en­


d ência d e co njunto s interco nsistentes d e v ariáv eis. São ind icad as atrav és d a co ns­
trução d e m a tri z e s d e d u p l a e n tra d a , co rrelacio nand o -se linhas e co lu nas d e
v ariáv eis interco nsistentes. D e no v o , v am o s buscar um exem p lo p ara sim p lificar
o entend im ento d essa categ o ria d e relaçõ es entre v ariáv eis eco nô m icas.
Sup o nham o s o co nju nto d ad o p elo s seto res ind ustriais d e d eterm inad a e c o ­
no m ia (q u ím ico , m etalúrg ico , têxtil, alim ento s, p ap el-p ap elão , eq uip am ento s d e
transp o rte, m ateriais elétrico s e d e co m u nicaçõ es, b o rracha,-m ad eira e o utro s
m ais). Entre seto res ind ustriais estab elecem -se relaçõ es m atriciais, à m ed id a que,
d e um lad o , cad a um d eles p ro d uz p ara o s d em ais e, d e o utro lad o , cad a um
d eles é ab astecid o p elo s d em ais.
V am o s cham ar d e i n s u m o s o s-flu xo s d e m ateriais e co m p o nentes que cad a
seto r receb e d o s d em ais para p ro cessar, sua p ro d ução ; e d e p ro d u to s o s fluxo s
d e p ro d u ção q u e cad a ram o env ia p ara,'o s d em ais. O s insum o s são entrad as; os
p ro d uto s são saíd as. V am o s co lo car as entrad as nas co lu nas d e no ssa m atriz e as
saíd as nas linhas, ind icand o p o r A, B, C, D, ..., K, ..., N o s seto res industriais
co nsid erad o s.
A matriz d e insum o -p ro d uto , cruzand o linhas e co lu nas, teria a co nfo rm a­
ção ind icad a na Figura 1.3.

40 A C O M PREEN SÃ O D A ECO N O M IA
O s cruz am ento s d as linhas e co lu nas d efinem células, E cad a célu la ind ica
um a relação intra o u interseto rial d e recíp ro ca d ep end ência: o q u anto cad a se ­
to r d ep end e d e o utro p ara realizar (.entrad as) o u esco ar (saíd as) sua p ro d ução .
C o nstruçõ es m atriciais co m o esta ev id enciam a estrutura d as relaçõ es estab eleci­
d as d entro d o ap arelho d e p ro d ução d as eco no m ias nacio nais. São instrum ento s
úteis para ind icar exced entes d e p ro d ução o u garg alo s d e sup rim ento s. Ind icam
aind a im p acto s, so b re to d o o sistem a, d eco rrentes da exp ansão o u da retração
d e d eterm inad o seto r.

Fo rm as U su ais Os i n d i ca d o re s e c o n ô m i c o s , o u ind icaçõ es quantitativ as d e v ariáv eis ec o n ô ­


d e In d ic a ç õ e s m icas, são usualm ente exp resso s atrav és d e n ú m e ro s - í n d i c e s , m e d i d as d e te n ­
d ê n c i a c e n tra l , q u o ci e n te s , co e f i c i e n te s e v a l o re s ab s o l u to s .
Q u an titativ as
Os n ú m e ro s - í n d i ce s ind icam v ariaçõ es d e co nju nto s d e d ad o s ec o nô m i­
co s. Há d iferentes critério s para seu cálculo . To d o s, p o rém , co nd uz em a v alo res
q u e exp ressam um a esp écie d e síntese d o co nju nto d as v ariaçõ es d o s d ad o s
eco nô m ico s co nsid erad o s. V am o s a d o is exem p lo s:

1. O INPC - índ ice N acio nal d e Preço s ao Co nsum id o r ind ica a v ariação
m ensal d o s p reço s d e uma cesta d e b ens e serv iço s p ag o s p elo s c o n ­
sum id o res d e d eterm inad a faixa d e rend a. Resulta da m éd ia p o nd era­
d a d o s índ ices calculad o s nas d ez p rincip ais reg iõ es m etro p o litanas
d o p aís. C o m o o INPC, o s d em ais índ ices d e p reço s m ed em v ariaçõ es
d e co nju nto s o u g rup o s d e p reço s, não d o p reço d e um único e d e­
term inad o p ro d uto . Trata-se, p o rtanto , d e uma ind icação d e natureza
ag regativ a.
2. O INA - Ind icad o r d o Nível d e A tiv id ad e rev ela o d esem p enho da
ativ id ad e p ro d utiva e suas v ariaçõ es ao lo ng o d o tem p o . Exp ressa as
flu tuaçõ es da eco no m ia, resultand o da m éd ia p o nd erad a d e índ ices
d e d esem p enho d e d iferentes g rup am ento s d e seto res d e p ro d ução .

N o s d o is caso s, o s núm ero s-índ ices são ind icaçõ es agregativ as. Refletem ,
p o rtanto , v ariaçõ es d e d ad o s eco nô m ico s agrup ad o s.
As m e d i d a s d e te n d ê n c i a c e n tra l são fo nnas usuais d e ind icação d e d e­
term inad as v ariáv eis eco nô m icas, cujas m ag nitud es refletem v alo res transacio ­
nais p raticad o s “em m éd ia”. O s exem p lo s mais co m u m ente citad o s são as taxas
d e juro s e d e câm bio . A s taxas d iv ulgad as são a m éd ia d as efetiv am ente p ratica­
d as, em d eterm inad o p erío d o , no s m ercad o s financeiro e cam bial. As transaçõ es
efetiv am ente realiz ad as estiv eram , em geral, bastante p ró xim as da m éd ia, umas
acim a o utras abaixo , reg istrand o a caçla m o m ento as co nd içõ es p rev alecentes
no s m ercad o s. C o nsid eram -se co m o ind icad o res as co rresp o nd entes tend ências
centrais. .7
O s q u o ci e n te s resultam da d iv isão d e v ariáv eis eco nô m icas, exp ressand o
v ariaçõ es ao lo ng o d o tem p o o u p ro p o rçõ es em d eterm inad o m o m ento . Vam o s
v er d o is exem p lo s sim p les:

1. A ta x a d e d e s e m p re g o é q u o ciente q u e resulta da d iv isão da p o p u ­


lação eco no m icam ente ativa p ela eco no m icam ente m o bilizáv el, em d e­
term inad o m o m ento .

A A BRA N G ÊN C IA E A S IJM 1TA Ç Õ ES D A EC O N O M IA 41


2. A e s tru tu ra cio c o n s u m o d e d eterm inad a classe so c io ec o nô m ic a é
exp ressa p o r um co nju nto d e q u o cientes. Resulta d a d iv isão d e cad a
categ o ria d e co nsu m o co nsid erad a (alim entação , habitação e transp o r­
tes, p o r exem p lo ) p elo co nsu m o to tal. Ind ica, p o rtanto , um co nju nto
esp ecífico d e d ad o s, exp resso s co m o p ro p o rçõ es d o to d o .
Os c o e f i c i e n te s exp ressam , g eralm ente, p arâm etro s d e co rrelação entre
v ariáv eis eco nô m icas. Há d eterm inad as funçõ es eco nô m icas, em que o s co eficien­
tes d as v ariáv eis co nsid erad as são ind icad o res m ais im p o rtantes q u e as p ró p rias
v ariáv eis. Em o utro s caso s, calculam -se co eficientes p ara ind icar graus d e c o n ­
centração o u d e d isp ersão q u e se o bserv am em d eterm inad o s asp ecto s da reali­
d ad e eco nô m ica. V am o s a d o is exem p lo s:

1. O c o eficiente d e Pareto é um co nhecid o ind icad o r d o grau d e d esi­


g uald ad e na d istribuição d a rend a nacio nal às d iferentes classes so cio -
eco nô m icas. É um d o s co eficientes d e uma fu nção não linear q u e e x ­
p ressa a co rresp o nd ência entre as v árias faixas d e rend a e o s resp ecti­
v o s núm ero s d e ind iv íd uo s q u e as receb em .
2. O co eficiente d e Gini é o utro ind icad o r ec o nô m ic o bastante co n h eci­
d o e utilizad o . Ele resulta d a relação entre d uas áreas d e um d iagram a
que ev id encia co nd içõ es estruturais d e co ncentração o u d e d isp ersão .
Rev ela, p o r exem p lo , o q uanto é co ncentrad a, em p o ucas em p resas, a
co nco rrência em d eterm inad o seto r d e p ro d ução . O u o q u anto a ren­
d a. a riqueza o u as terras estão co ncentrad as nas m ão s d e p o u co s ou,
então , d isp ersas e m elho r d istribuíd as.

Finalm ente, as ind icaçõ es em v a l o re s a b s o l u to s co m p õ em o g ro sso da


q u antificação da realid ad e eco nô m ica. Resultam d e um a m ultip licid ad e d e le­
v antam ento s, co nso lid açõ es e cálcu lo s sistem aticam ente realiz ad o s. Lev antam en­
to s censitário s, estatísticas eco nô m icas resultantes d e co nso lid açõ es feitas p o r
ó rg ão s d e g o v erno e entid ad es d e classe e resultad o s d e cálcu lo s sistem atizad o s
são g eralm ente ap resentad o s, em d ad o s p rim ário s, so b a fo rm a d e v alo res ab so ­
luto s. O s censo s d em o g ráfico s e eco nô m ico s, o s lev antam ento s nas áreas d as
finanças p úblicas, d o sistem a financeiro e d as transaçõ es internacio nais, b em
co m o o cálculo d e cad a um a d as co ntas d o Sistem a d e Co ntabilid ad e So cial são
ap resentad o s, p rim ariam ente, na fo rm a d e v alo res abso luto s, exp resso s m o neta-
riam ente o u p elas m ed id as d o sistem a m etro ló g ico usual.

O Fato A p articularid ad e q u e acab am o s d e ev id enciar (a p o ssib ilid ad e d e tratam ento


quantitativ o ) não d ev e o fuscar no ssas p rim eiras o b serv açõ es acerca d o caráter
K c u n ô rn ic o :
so cial da eco no m ia. Cad a v ariáv el"è3q?ressa resultad o s p ro d uz id o s p o r um co m ­
Fu n d a m e n to s e p lexo sistem a d e relaçõ es so ciais, fund am entad o em d ad o o rd enam ento p o líti-
N atu re z a co -institucio nal e insp irad o em m atrizes id eo ló g icas e d o utrinas d e referência. O
fato e c o n ô m ic o ap resenta-se, na realid ad e, co nd icio nad o p o r uma m ultip lici­
d ad e d e fato res extra-eco nô m ico s.
À busca d e uma p rim eira síntese, v am o s reco rrer a um d o s m ais no táv eis
p ensad o res da eco no m ia, J. A. Schu m p eter:7

o O p ro cesso so cial, na realid ad e, é um to d o indiv isív el. N o entanto , em


seu trabalho m eto d o ló g ico , a m ão classificad o ra d o inv estigad o r p ro -

42 A CO M PREEN SÃ O D A ECO N O M IA
cura sep arar, p o r sua natureza, cad a um d o s fato s q u e co m p õ em a in­
d escritív el teia d as relaçõ es so ciais. A classificação d e um fato co m o
e c o n ô m i c o env o lv e, assim, uma abstração - a primeira d as muitas que
são imp o stas p elas co nd içõ es técnicas d a có p ia m ental da realid ad e.
□ O s f ato s s o ci a i s resultam d o co m p o rtam ento hum ano . Eles se carac­
teriz arão c o m o f a to s e c o n ô m i c o s à m ed id a q u e to d o o co nju nto d o s
asp ecto s so ciais q u e o s env o lv e fo r d e certa fo rm a eclip sad o p o r c o n ­
sid eraçõ es o u m o tiv açõ es d e o rd em eco nô m ica. O eclip se, no entan­
to , será sem p re p arcial, à m ed id a q u e cad a um d o s fato s d estacad o s
tam bém env o lv e co nsid eraçõ es o u m o tiv açõ es éticas, so ciais e p o líti­
cas, além d e estarem subo rd inad o s a to d o um co nju nto d e no rm as
juríd icas o u d e v alo res culturais.
□ A d escrição e análise d o s elo s causais q u e ligam o s fato s eco nô m ico s
ao s não ec o nô m ico s e a d esco b erta d a lo g icid ad e q u e o rienta as rela­
çõ es so ciais c o m o um to d o d ev em estar sem p re p resentes nas abstra­
çõ es q u e elab o ram o s p ara sistem atizar o co nhecim ento d o s asp ecto s
eco nô m ico s d o p ro cesso so cial.

C o nso lid and o o s co nteú d o s até aqui d esenv o lv id o s, a Figura 1.4 sintetiza as
interfaces d a eco no m ia co m o utro s cam p o s d o co nhecim ento so cial, d estacand o
as relaçõ es biunív o cas q u e se p o d em estab elecer entre eles, tanto no âm bito da
co nstru ção d o co nhecim ento , co m o no o rd enam ento efetiv o d a v id a em so c ie­
d ad e. Sintetiza aind a as *categ o rias centrais e o s tem as d e m aio r relev ância que
grav itam no cam p o mais esp ecífico d a eco no m ia - to d o s, p ratícam ente, p assí­
v eis d e q uantificação .
Para leitura, o Q uad ro 1.3 traz, em seq ü eneiação livre, trecho s selecio nad o s
d o s três p rim eiro s cap ítulo s d e Principies of economics, d e A lfred M arshall,8 p u­
blicad o em 1890. Rev ela o entend im ento d e um d o s m ais fecu nd o s m estres da
eco no m ia neo clássica so b re o o b jeto d a eco no m ia e a.s q u estõ es b ásicas d e que
se o cu p am o s eco no m istas. C o m o p ano d e fund o , o texto d estaca o o rd enam en­
to m aio r d a v id a em so cied ad e, lastread o em p rincíp io s institucio nais, m arcad a-
m ente ético s. É leitura relev ante para um a b em fund am entad a c o m p re e n s ã o
d a e co n o m ia.

1 .3 O C o n ceito d e Eco n o m ia

D im e n s ã o e A co m p lexa teia d as relaçõ es so ciaisxe a m ultip licid ad e d o s fato res co nd icio nan-
tes da ativ id ad e eco nô m ica d ificultar^, d e certa fo rm a, a fo rm u lação d e uma
A d jc tiv a ç a o
d efinição abrang ente p ara a eco no m ia.' A lém d isso , co m o já d estacam o s, a e c o ­
in ic iais: a no m ia é fo rtem ente influenciad a, tanto em sua co nstru ção c o m o ram o d o c o ­
H c o n o m ia P o lític a nhecim ento , c o m o na realid ad e, p o r d iferentes c o n c ep ç õ es p o lítico -id eo ló g icas,
alg um as até co nflitantes entre si. C o nseq ü entem ente, cad a co rrente d e p ensa­
m ento eco nô m ico enxerg a a realid ad e so b âng ulo s d iferenciad o s, a p artir d o s
quais elab o ra suas c o n c ep ç õ es, estab elec e seus c o nc eito s e fo rm ata seus m o d e­
lo s. E tem m ais: ao lo ng o d o tem p o , as instituiçõ es eco nô m icas e as c o n c ep ç õ es
p o lítico -id eo ló g icas se m o d ificam . To rna-se g eralrhente m aio r a co m p lexid ad e

A A BRA N G ÊN C IA E A S LEM ITA Ç Õ ES D A EC O N O M IA 43


FIG URA 1*4
A COMPREENSÃO DA ECONOMIA

C ateg o rias ce n trais


e tem as d e alta
A n tr o p o lo g ia
re le v ân cia d a • C u ltu ra l
e co n o m ia: Recursos E m p re g o
in te rf ace s d e cad a
u m d eles co m
d esen v o lv im en to s O polinômio
d o s d em ais cam p o s clássico de Say
d o co n h e cim e n to □ P ro d u ç ã o
so cial. o D is trib u iç ã o
O trinômio
de Marshall
□ D is p ê n d io
□ A c u m u la ç ã o o Pobreza
□ R iq u eza
O bihômio de □ B e m -e s ta r
Kuznets
□ C re s c im e n to O trinômio de
□ D e s e n v o lv im e n to Robbins
V
i
r—' n
( \
O r g a n iz a - a

ção
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E q u ilíb rio
( "------------
r N C o n c o r-
L ........ . . .
C re s c i- rê n c ia
\
X m e n to __________ r y _ j
R e m u n e ra -

T ra n s a ­ A g re g a d o s ções

ções
J
Q UA D RO 1 .3
Eco n o m ia: U m estu d o d a riq u ez a e u m ram o d o estu d o d o h o m em .

A eco no m ia é um estud o da hum anid ade nas ativi­ custo s e o s benefício s de determinada ação ou d e um
d ad es co rrentes da vida; examina a ação individual e so ­ em p reend im ento , antes d e executá-lo . E em que é p o s­
cial em seu s asp ecto s mais estreitam ente ligad os à o b ­ sível calcular seus resultad os e efeito s.
tenção e ao uso d as co nd içõ es materiais do betn-estar. Aqui d ev em o s ter p resente que o s mo tiv os d as açõ es
Assim, d e um lad o, é um estud o da riqueza; e, de hum anas nào residem, necessariam ente, ap enas em b e­
o utro, e mais impo rtante, uma parte do estud o d o ho ­ nefício s materiais, eco no m icam ente m ensuráveis. Env o l­
mem. O caráter d o ho m em tem sido m o ld ad o p o r seu vidos p elas fo rças da co nco rrência, muitos ho m ens d e
trabalho quo tid iano e p elo s recurso s materiais que em ­ neg ó cio s são muitas v ezes estimulad os mais p ela exp ec­
prega, m ais d o que p o r outra influência qualquer, à p ar­ i tativa d e v encer seus rivais d o que p ro p riam ente p o r
te a d o s ideais religio so s. O s d o is grand es fatores na his­ acrescentar mais a sua própria riqueza. Po r o utro lado , o
tória d o mundo têm sido o religio so e o eco nô m ico . A qui d esejo de o bter a ap ro v ação o u de evitar a censura d e
e ali o ardo r do esp írito militar o u artístico p red om inou seus p ares, no m eio so cial em que vivem, p o dem tam­
po r algum tem p o ; mas as influências religiosas e eco nô ­ bém levar co m um ente a açõ es e d ecisõ es d e significati­
micas nunca foram d eslo cad as d o primeiro p lano , m es­ v o s efeito s eco nô m ico s.
m o p assageiram ente, e quase sem pre foram mais impo r­ Po d emo s melhor ilustrar essas idéias enum erand o al­
tantes d o que as o utras to d as juntas. gumas das principais questõ es estudadas pela eco no m ia.
Vista d esta fo nna, a eco no m ia é um estud o d o s ho ­
mens tal co m o vivem, agem e p ensam no s assunto s co ­ □ Q uais as causas que afetam o co nsum o e a p ro ­
muns da vida. Mas diz respeito , p rincip alm ente, ao s m o ­ d ução , a d istribuição e a troca d e riquezas; a
tivos que afetam, de mo d o intenso e co nstante, a co nd u­ o rg anização da indústria e d o co m ércio ; o co ­
ção d o ho m em no cam p o d as transaçõ es m ercantis e d os m ércio exterio r; as relaçõ es entre em p reg ad o s
neg ó cio s. K co m o as transaçõ es e seus benefício s são e em p regad o res. Como estas questõ es são in­
m ensuráv eis, a eco no m ia co nseguiu avançar mais que fluenciad as umas p elas outras.
o s o utro s ramo s d o estud o d o ho m em . Assim co m o a □ Qual o alcance e a influência da liberd ad e ec o ­
balança de p recisão d o quím ico torna sua d isciplina mais nô m ica, Q ual sua im po rtância, efeito s imed ia- .
exata que outras ciências físicas, a balança d o eco no m is­ to s e mais remoto s. Até que p o nto o s inco nv e­
ta, ap esar d e mais grosseira e imperfeita, deu à eco no ­ nientes da liberd ad e eco nô m ica, para o s que
mia uma exatid ão m aio r d o que a d e qu alquer o utro d ela nào se beneficiam , justificam m o d ificaçõ es
ramo d as ciências sociais. N aturalmente, era termo s co m ­ em instituiçõ es co m o a p ro p ried ad e e a livre
parativo s, a eco no m ia nào tem a m esm a p recisão das em p resa. Em que medida p o deriam o s fazer es­
ciências físicas exatas, p o is ela se relacio na co m as fo r­ sas m o d ificaçõ es sem enfraqu ecer a energia d os
ças sutis e sem pre mutáveis da natureza humana. que p ro m o vem o pro gresso .
É essencial no tar que o eco no m ista nào se arro ga a □ Como d ev e ser distribuída a incid ência d e im­
p o ssibilid ad e de medir o s m o tiv o s e as inclinaçõ es hu­ po stos entre as d iferentes classes da so ciedad e.
manas. Ele só o faz ind iretamente, através d e seus efei­ Quais o s em p reendim ento s d e que a so ciedad e,
to s. Avalia as m o tiv açõ es da ação po r seus resultados, p o r ela mesma, deve encarregar-se e quais o s que
do m esm o m o d o co m o o faz o cid ad ão co m um , diferin­ se farão p o r interméd io d o gov erno . Em que m e­
d o d ele so m ente p elas m aio res p recauçõ es que toma em dida o go v erno d eve regulamentar a forma co m o
esclarecer o s limites d e seu co nhecim ento . A lcança suas o s ho m ens de em p resa dirigem seus negó cio s.
co nclu sõ es pro visó rias pela o bserv ação da co nd uta hu­ 3 So b que aspectos diferem o s d everes de uma na­
mana so b certas co nd içõ es, sem tentar p enetrar ques­ ção em relação a outra, em matéria eco nôm ica,
tõ es d e o rd em transcend ental. Na utilização d o co nheci­ dos que têm entre si o s cidadãos de uma mesnva
mento , co nsid era o s incentiv o s e o s fins últimos que le­ nação .
varam à busca d e d eterm inad as satisfaçõ es. As medidas '\
eco nô m icas d essas satisfaçõ es são o p o nto d e partida da A ssim co nsid erad a, a eco no m ia é o estud o d as co n-
eco no m ia. diç.õés materiais da vida em so cied ad e e d o s mo tivo s que |
levam o s ho m ens a açõ es que têm co nseq uências eco - !
Passem o s, agora, a o utro p o nto . Q uand o d izem o s
nô m icas. Sào seus o bjeto s o estud o da p o b rez a, enquan- j
que um resultad o o u efeito é med id o p ela ação que o
to estud o das causas da d egrad ação de uma grand e par­
causo u,' não estam o s admitindo que to d a ação humana
te da hum anid ad e; das co nd içõ es, m o tiv açõ es e razões
d eliberad a seja resultad o d e um cálculo eco nô m ico . As
da riq u ez a; das açõ es individuais e so ciais ligadas à o b­
p esso as nào p o nd eram p reviamente o s resultad os ec o ­
tenção d o b em -estar.
nô m ico s d e cad a uma d e suas açõ es. Nem to d as as açõ es
hum anas são o b jeto d e cálculo eco nô m ico . Mas o lado
da vida d e que a eco no m ia se o cup a esp ecialm ente é Fo n te : MARSHALL, Alfred. Principies o f economics. 8.
aqu ele em que o co rre, co m mais freqüência, calcular o s ed . Londres : Macmillan, 1961.

A A BRA N G ÊN C IA E A S IJM TTA Ç Õ ES D A EC O N O M IA 45


d o p ro cesso eco nô m ico . Surg em no v as p reo cu p açõ es. E ev o lu i, d eco rrentem en­
te, o c o nceito d e eco no m ia.
Em seu nasced o u ro , a d eno m inação usual da eco no m ia era ad jetiv ad a. D e­
no m inav a-se e c o n o m i a p o l í ti ca . Co m o tem p o , a ad jetiv ação caiu em d esuso .
Ev o luiu, sim p lesm ente, p ara e c o n o m i a . Mas nad a im p ed e q u e, no futuro , a
v elha ad jetiv ação p o ssa v o ltar o u o utra fo rm a d e sim p lificação p o ssa o co rrer,
fruto , p o r exem p lo , d e fusõ es interd iscip linares.
A exp ressão e c o n o m i a p o l í ti ca afirm o u-se a partir d o início d o sécu lo XVII.
Em bo ra filó so fo s d a G récia A ntiga, co m o Platão e A ristó teles, e o s esco lástico s
da Id ad e M éd ia tenham exp lo rad o tem as d e co nteú d o eco nô m ico , a exp ressão
é atribuíd a ao m ercantilista francês A nto ine d e M o ntchrétien, auto r d e um Traité
à'économiepolitique. p u blicad o em 1615.
A té cheg ar ao tratad o d e M o ntchrétien, cia A ntigüid ad e ao Renascim ento , as
q u estõ es eco nô m icas d e m aio r relev ância eram o s sistem as da p o sse territo rial, a
serv id ão , a arrecad ação d e tributo s, a o rg aniz ação d as p rim eiras co rp o raçõ es
(d o s artificia e das fralemitates), a co ncessão d e m ercad o s, o co m ércio inter-
reg io nal, a cunhag em e o em p reg o d e m o ed as. E cad a um a d essas q u estõ es era
tratad a so b o s âng ulo s da p o lítica, da filo so fia e d o d ireito canô nico .
As d im ensõ es da eco no m ia, enq u anto ram o d o co nhecim ento , só se alarg a­
ram co m a m aio r co m p lexid ad e assum id a p elas q u estõ es eco nô m icas, ap ó s o
Renascim ento , co m o d esenv o lv im ento d o s no v o s Estad o s-naçõ es m ercantilistas
- Esp anha, Po rtugal, Inglaterra, França e A lem anha. N esse p erío d o , o s p ensad o ­
res p ó s-renascentistas d efiniam a eco no m ia co m o ram o d o co nhecim ento essen­
cialm ente v o ltad o para a ad m inistração d o Estad o , so b o o b jetiv o central d e
p ro m o v er seu fo rtalecim ento . Justificav a-se, assim , a ad jetiv ação - e c o n o m i a
p o l í ti ca .

A s Fro n te ira s N o sécu lo XV III, no v as c o n c ep ç õ es se d esenv o lv eram . A p reo cu p ação central já


A m p liad as: não era co m o fo rtalecim ento d o Estad o , m as co m a riqueza d as naçõ es. Duas
im p o rtantes o bras fo ram p ublicad as e, co m elas, seg und o se co nv encio no u , abriu-
o s C o n c e ito s
se uma no v a era no estud o d a eco no m ia: a era clássica, co incid ente co m o Ilu-
C lá s s ic o e m inism o , a Id ad e da Razão . A p rim eira d as d uas im p o rtantes o bras fo i Tableau
N e o c la s s ic o économique, de Franço is Q uesnay , p ublicad a em 1758. A seg und a, An inquiry
into the nature and causes of the wealth of nations, d e A dam Smith, p ublicad a
em 1776 .
Q uesnay fund am ento u seu p ensam ento em lev antam ento s quantitativ o s: suas
tabelas eco nô m icas são co nsid erad as co m o um trabalho em brio nário d e análise
d e interd ep end ência, um p rim eiro esb o ç o d e relaçõ es m atriciais. Seu interesse,
p o rém , ia além da quantificação .) Ele queria d em o nstrar co m o se fo rm av a a ri­
quez a e co m o ela se d istribuía entre três classes so ciais: a d o s p ro d uto res rurais,
a d o s artesão s urbano s e a d o s no bres p ro p rietário s.
Smith fund am ento u-se em axio m as filo só fico s. N ão fo ram co m a riqueza
d as naçõ es suas p rim eiras p reo cu p açõ es acad êm icas. Em 1759, ele p ublico u sua
primeira o bra, Theoiy of moral sentiments. O s sentim ento s m o rais, as p aixõ es
o riginais da natureza hum ana, a busca da ap ro v ação so cial, as razõ es m aio res da
acum u lação e da co nserv ação da fo rtuna m aterial fo ram o s p ressup o sto s d e sua
d escrição da o rd em eco nô m ica, fund am entad a nas leis q u e reg em a f o rm a ç ã o ,
a a c u m u l a çã o , a d i s tri b u i çã o e o c o n s u m o d a ri q u e z a

46 A C O M PREEN SÃ O DA ECO N O M IA
Este p o linô m io fo i a b ase d o co nceito clássico d e eco no m ia. A m aio r p arte
d o s eco no m istas clássico s, q u e v iv eram na transição d o s sécu lo s XV III e XIX,
co m o o p asto r Tho m as M althus, o financista Jo h n Law , o p o lítico Stuart Mill, o
b anq u eiro Richard Cantillo n, o neg o ciante Dav id Ricard o e o teó rico Jean Bap -
tiste Say d efiniam a eco no m ia, p artind o d estes quatro fluxo s. Say, co nsid erad o
um d o s m ais no táv eis m estres d a era clássica, assim d efiniu a eco no m ia em seu
Traité d'économie politique, p ublicad o já no início d o sécu lo XIX, em 1803:

“A e c o n o m i a p o l í ti ca to rn a c o n h e c i d a a n a tu re z a d a ri q u e z a ; d e s ­
s e c o n h e c i m e n to d e s u a n a tu re z a d e d u z o s m e i o s d e s u a f o rm a ­
ç ã o , re v e l a a o rd e m d e s u a d i s tri b u i çã o e e x a m i n a o s f e n ô m e n o s
e n v o l v i d o s e m s u a d i s tri b u i çã o , p ra ti ca d a a tra v é s d o c o n s u m o / '

N o c o nceito clássico , da fo rm ação ao co nsu m o da riqueza, p assand o p ela


acum u lação e p ela d istribuição , to d o o p ro cesso ec o nô m ic o hav eria d e ser cui­
d ad o sam ente classificad o e inv estigad o . Daí resultariam seus nú cleo s d e susten­
tação : co njunto s interco nsistentes d e p rincíp io s, teo rias e leis exp licativ as da reali­
d ad e eco nô m ica. N ão é d ifícil entend er q u e ênfases d iferenciad as em um ou
o utro term o d o p o linô m io clássico fo ram a b ase d e d iferenciad o s entend im ento s
p o lítico -id eo ló g ico s so b re a eficácia so cial d e d iferentes fo rm as d e o rg aniz ação
d as ativ id ad es eco nô m icas.
A ênfase no p ro cesso d e acum u lação cap italista e no s m ecanism o s d e re­
p artição d o s esfo rço s so ciais d e p ro d ução d esag uo u na p ro p o sta so cialista. O s
neo clássico s, m ais co nserv ad o res, buscaram entend er o eq uilíbrio d o p ro cesso
eco nô m ico , tal c o m o se ap resentav a. Em bo ra m uito s d eles tenham reag id o às
iniqüid ad es so ciais, não p ro p useram fo rm as alternativ as e rev o lu cio nárias p ara a
o rg aniz ação eco nô m ica da so cied ad e, cuid and o p o rém d e ap o ntar o s v ício s da
o rd em estabelecid a e o s d eco rrentes m ecanism o s d e ajuste e co rreção . Po r isso
m esm o , sintetizaram o s tem as cruciais da eco no m ia em um no v o trinô m io : ri-
q u e z a - p o b re z a - b e m - e s ta r. E antecip aram o s fund am ento s d a co nd uta e c o n ô ­
m ica d o ho m em : a escassez d e recurso s d iante d e necessid ad es ilimitáv eis.
O s p o nto s fund am entais da abo rd ag em neo clássica, sintetiz ad o s p o r Mar­
shall, são :

□ A s necessid ad es e o s d esejo s hum ano s são inúm ero s e d e v árias esp é­


cies. A p enas em estág io s prim itiv o s d e civ iliz ação são suscetív eis d e
serem satisfeito s. Na v erd ad e, o ho m em não civ ilizad o não tem mais
necessid ad es d o que o anim al, mas à m ed id a q u e vai p ro gred ind o , elas
aum entam e se d iv ersificam, ao m esm o tem p o em que surg em no v o s
m éto d o s cap azes d e satisfazê-las.
□ As m ud anças no s estág io s culturais d as so cied ad es o rg anizad as im p li­
cam m aio r quantid ad e é "diversid ade d e utilid ad es. A e c o n o m i a e x a ­
m in a a a ç ã o in d iv id u al e s o ci a l , e m s e u s a s p e c to s m ais e s tri ta ­
m e n te l ig ad o s à o b te n ç ã o e ao u s o d o s e l e m e n to s m a te ri a i s d o
b e m - e s ta r. A s s im , d e u m l ad o , é u m e s tu d o d a riq u e z a ; e, d e o u ­
tro , e m a is i m p o rta n te , é u m a p a rte d o e s tu d o d o h o m e m .

□ A eco no m ia é um estud o d o s ho m ens tal c o m o v iv em , ag em e p en ­


sam no s assunto s o rd inário s da vida. Mas diz resp eito , p rincip alm ente,
ao s m o tiv o s que afetam , d e m o d o intenso e co nstante, a co nd u ção d o
ho m em no trato co m as q u estõ es q u e interferem em sua riqueza e nas
co nd içõ es m ateriais d e seu bem -estar.

A A BRA N G ÊN C IA E A S U M ITA Ç Õ ES D A EC O N O M IA 47
C abe o bserv ar q u e a síntese d e M arshall nào se lim ito u à d escrição e à
análise d o s p ro cesso s ec o nô m ic o s relacio nad o s ao trinô m io riq u ez a-p o brez a-
bem -estar. Fo i além , ao d iscutir asp ecto s ético s lig ad o s à co nd uta hum ana e às
fo rm as d e o rg aniz ação d a so cied ad e que p o d eriam am p liar o u d iminuir, em fun­
ção d o p ro cesso d istributiv o , o núm ero d o s que têm d e fato acesso às co nd içõ es
m ateriais p o ssív eis d e ser alcançad as em d ad o estág io cultural. Traço s d a o rg ani­
z ação so cial, co m o a lib erd ad e d e em p reend im ento e a co nco rrência, fo ram ana­
lisad o s so b a ó p tica d e sua influência na g eração e d ifusão d o b em -estar so cial.
D aí fo ram d eriv ad as alg um as d e suas mais co ntund entes o b serv açõ es so b re o
caráter so cial da eco no m ia. Entre as m ais citad as, d estacam -se:

□ O estud o d as causas da p o brez a é o estud o d as causas da d eg rad ação


d e g rand e p arte da hum anid ad e.
□ A escrav id ão era co nsid erad a p o r A ristó teles co m o uma regra d a natu­
reza, e p ro v av elm ente tam bém o era p elo s p ró p rio s escrav o s no s tem ­
p o s antig o s. Mas ag o ra, afinal, no s d isp o m o s seriam ente a inv estigar
se é necessário hav er g rand e núm ero d e p esso as co nd enad as d esd e o
b erço ao trabalho rude, a fim d e p ro v er o s req uisito s d e uma v id a
refinad a e culta p ara o utro s, enq u anto elas p ró p rias são im p ed id as
p o r sua p o brez a e labuta d e ter qu alq uer co ta d e p articip ação naq uela
fo rma d e vida.
□ Em um m und o no qual to d o s o s ho m ens fo ssem p erfeitam ente v irtuo ­
so s, to d o s p ensariam só em seus d ev eres e nenhum d esejaria ter uma
co ta d e co nfo rto m aio r d o que a d e seus co ncid ad ão s. O s m ais fo rtes
facilm ente sup o rtariam o fard o m ais p esad o e ad m itiríam q u e o s m ais
fraco s, em bo ra p ro d uz ind o m eno s, elev assem seu co nsu m o . Felizes
nessa m aneira d e p ensar, eles trabalhariam p ara o bem geral co m to d a
a energ ia, esp írito inv entiv o e iniciativ a q u e tiv essem . Mas a histó ria
em geral, e esp ecialm ente a d as av enturas so cialistas, m o stra q u e o s
ho m ens co m uns raram ente são cap az es d e um id eal altruísta p o r tem ­
p o co nsid eráv el. Mas, em co ntrap artid a, têm um a cap acid ad e d e serv i­
ç o d esinteressad o m uito m aio r d o que a q u e d em o nstram . E a co nc o r­
rência, p o r seu lad o , nào registra ap enas efeito s p ernicio so s; sua p ro s-
criçào p o d eria ser mais anti-so cial d o q u e ela p ró p ria.
□ Co nclu siv am ente: co nstitui o fim últim o da eco no m ia d esco brir co m o
se p o d e co m binar o latente ativ o so cial d as v irtud es hum anas co m as
fo rças da co nco rrência p ara a p ro m o ção d o bem -estar so cial.

A P e rsp e c tiv a O b inô m io p ro d uçào -d istrib uiçào (entend end o -se d istribuição no sentid o d e p ro ­
cesso rep artitiv o o u, m ais sim p lesm ente, co m o rep artição ) é a b ase a partir da
So c ia lis ta
qual a p ersp ectiv a so cialista co nstruiu sua c o n c ep ç ão so b re a m atéria d e que se
o cu p a a eco no m ia.
O s p o nto s b ásico s d essa p ersp ectiv a fo ram assim fixad o s p o r O skar Lang e:9

□ O ho m em , v iv end o em uma so cied ad e q u e se enco ntra em certo nív el


d e d esenv o lv im ento histó rico , sente necessid ad es d e naturezas d iv er­
sas. Uma p arte d estas é d e caráter b io ló g ico , send o sua satisfação in­
d isp ensáv el à v id a; o utra p arte é co nseq ü ência d a vida em co m um na
so cied ad e e p ro d uto d e um co nju nto d e co nd içõ es d eterm inad as p elo

48 A C O M PREEN SÃ O D A ECO N O M IA
estág io cultural alcançad o . M esm o as necessid ad es b io ló g icas se re­
v estem d e um caráter e d e um a fo rm a q u e sào fu nção d a cultura da
so cied ad e. A s necessid ad es d o s ho m ens, em bo ra p rim itiv am ente o rig i­
nad as d as bio ló g icas, sào p o r co nseg uinte um p ro d uto da vida so cial e
em co m um . D ep end em , assim , d o grau d e d esenv o lv im ento d a so c ie­
d ad e hum ana.
□ Para satisfazer às necessid ad es hum anas, é ind isp ensáv el a p ro d ução
o u usufruto d e b ens q u e o ho m em extrai d a natureza, transfo rm and o -
o s, m o d ificand o seus caracteres, d eslo cand o -o s no esp aço e esto can­
d o -o s. A ativ id ad e hum ana q u e co nsiste em ad ap tar o s recurso s e as
fo rças da natureza co m a finalid ad e d e satisfazer às necessid ad es hu­
m anas é d esignad a p elo term o p ro d u çã o . Trata-se d e uma ativ id ad e
co nsciente e intencio nal, fund am entad a no tra b a l h o .
□ Das c o n ex õ es entre a p ro d u ção e o trabalho se extraem o s elem ento s
vitais d o p ro cesso eco nô m ico . A p ro d ução é um a to s o ci a l , que en­
v o lv e d iv isão d o trabalho . O trabalho d e um ho m em é ap enas uma
p arte d o trabalho co m b inad o e asso ciad o d e to d o s o s m em bro s da
so cied ad e. É uma p arte d o tra b a l h o s o cial , cu jo p ro d uto é rep resen­
tad o p elo s b ens q u e serv em , d ireta o u ind iretam ente, p ara satisfazer
às necessid ad es hum anas, m anifestad as d e fo rm as d iferentes em d ife­
rentes so cied ad es.
□ A realização co m p leta d esse p ro cesso so cial inclui, p o r fim, a d i s tri ­
b u i ç ã o ou re p a rti ç ã o d o p ro d uto so cial d o trabalho . A rep artição
rev este-se tam bém d e caráter so cial. É, p o r sua natureza, um ato so cial,
que assum e d iferentes fo rm as, d e aco rd o co m o s graus d e d esenv o lv i­
m ento da so cied ad e. Há v ínculo s, q u e se cristalizam histo ricam ente,
entre o s m o d o s d e p ro d ução e a m aneira co m o se o p era a d istribui­
ção d o esfo rço so cial d e p ro d ução . Km sua Introdução à crítica da
economia política, Marx acentuo u que “as relaçõ es e o s m o d o s d e dis­
tribuição ap arecem sim p lesm ente co m o o anv erso da p ro d ução . A es­
trutura da d istribuição é d eterm inad a p ela estrutura da p ro d ução ”.
□ C o nclusiv am ente: enq u anto as relaçõ es d e p ro d u ção d ep end em d o
nív el histó rico d as fo rças p ro d utiv as, isto é, d a atu ação so cial d o h o ­
m em no trato co m a natureza, as relaçõ es d e d istribuição d ep end em
d as relaçõ es d e p ro d ução . A m aneira c o m o se o p era a d istribuição
d o s p ro d uto s na so cied ad e é d eterm inad a p ela m aneira co m o o s h o ­
m ens p articip am d o p ro cesso d e p ro d ução .
□ O e s tu d o d as l e is s o c i a i s q u e re g u l a m a p ro d u ç ã o e a d i s tri b u i ­
ç ã o d o s m e i o s m a te ri a i s d e s ti n a d o s a s a ti s f a z e r às n e ce s s i d a d e s
h u m a n a s re s u m e o c a m p o d e q u e s e o c u p a a e c o n o m i a .

A Sis te m a tiz a ç à o A p arentem ente m eno s influenciad a p o r sistem as id eo ló g ico s, um a tentativ a m ais
recente (e tam bém m ais atraente) d e caracteriz ar o s fato s ec o nô m ico s e d e d eli­
d e R o b b in s
m itar co m m aio r nitid ez o s asp ecto s eco nô m ico s da vida so cial fo i em p reend id a
na p rim eira m etad e d o s ano s 30, em um no táv el ensaio d e Lio nel Ro b b ins10
so b re a natureza e o sig nificad o da eco no m ia.
A sistem atiz açào d e Ro bbins não p artiu, c o m o a m aio r p arte d as que a an­
teced eram , d e categ o rias co nv encio nais d e fato s eco nô m ico s, c o m o p ro d ução ,

A A BRA N G ÊN C IA E A S LIM ITA Ç Õ ES DA EC O N O M IA 49


d istribuição , d isp ênd io , acum ulação , riqueza e bem -estar. O s p o nto s em que se
fixo u fo ram o s seguintes:

□ M ULTIPLIC ID A D E D E FIN S. Ind ep end entem ente d e sua classificação


c o m o ec o nô m ico s o u não eco nô m ico s, são m ú l ti p l o s o s f in s q u e a
ativ id ad e hum ana p ro cura alcançar.
□ PRIO RIZ A Ç Ã O D E FIN S PO SSÍV EIS, A lém d e m últip lo s, o s fins p o s­
sív eis, alm ejad o s p elo ho m em , têm im p o rtância d iv ersa e p o d em ser
classificad o s p o r o rd em d e p ri o ri d a d e , em bo ra esta v arie no tem p o e
no esp aço e, resp eitad a a ind iv id ualid ad e d e cad a um, p o ssa tam bém
v ariar d e ind iv íd uo p ara ind iv íd uo .
□ LIM IT A Ç Ã O D E M EIO S. O s m e io s para alcançar a m ultip licid ad e d o s
fins p o ssív eis são l im i tad o s .
□ EM PREG O A LTERN A TIVO D O S M EIO S O s m eio s têm u so s alte rn a
tiv o s e, p o r isso m esm o , p o d em ser m o bilizad o s p ara o s mais d iv er­
so s fins.

Para Ro bbins, nenhum a d essas quatro co nd içõ es, iso lad am ente co nsid era­
da, é suficiente p ara caracteriz ar o fato eco nô m ico . Este é caracteriz ad o p o r um
im p o rtante elem ento , q u e estab elec e o s elo s d e lig ação entre as quatro co nd i­
çõ es v istas co m o um to d o . Este elo é a ca p a ci d a d e h u m a n a d e f a z e r e s c o ­
l h as , em face d a m ultip licid ad e d e fins p retend id o s e aind a d a d iv ersid ad e d e
m eio s p ara alcançá-lo s. A d em ais, o s ato s d e esco lha tam bém d eco rrem d o fato
d e o s recurso s p o d erem ser m o biliz ad o s p ara d iferentes fins, em b o ra sejam es­
casso s o u lim itad o s. O f a to e c o n ô m i c o re s u m e - s e , a s s i m , n o s a to s d e e s c o ­
l h a e n tre f in s p o s s í v e i s e m e io s e s c a s s o s a p l i cá v e i s a u s o s a l te rn a ti v o s .

A p rim eira lição q u e se extrai d essa sistem atiz ação d iz resp eito à e c o n o m i -
cid a d e d a a ç ã o h u m a n a . Esta d eco rre da in e v i tab i l id ad e d a e s c o l h a . Entre
uma m ultip licid ad e d e o p çõ es so b re as açõ es q u e p resum iv elm ente co nd uzirão
à g eração e acum u lação d as m ais v ariad as categ o rias d e riqueza e ao s mais d i­
v erso s estág io s d e p ro sp erid ad e e bem -estar, o ho m em está ag ind o eco no m ica­
m ente q u and o p ro ced e a um a esco lha d eterm inad a. Seja qual fo r esta esco lha,
ela co nd uzirá:

1. A o a l c a n c e d o f im p ro p o s to , to ta l o u p a rc i a l m e n te , s o b d i f e re n ­
te s g ra u s d e e f i ci ê n ci a . A isto se dá a d eno m inação g enérica d e b e ­
n e f í ci o .

2. À u ti l i z a çã o d e m e i o s d i s p o n í v e i s , ta m b é m s o b d i f e re n te s g rau s
d e e f i ci ê n ci a . A isto se dá a d eno m inação g enérica d e cu s to .

3. A d e te rm i n a ç ã o d e c o m o s e u ti l i z a rã o o s m e i o s d i s p o n í v e i s n a
c o n s e c u ç ã o d o f im p ro p ô s to . A o s m ecanism o s e critério s q u e e n ­
v o lv em a d estinação d o s m eio s utiliz ad o s se d á a d eno m inação g e ­
nérica d e a l o c a ç ã o .
4. À n ã o - c o n s c c u ç ã o d e o u tro s f in s. A esco lha d e d eterm inad o fim e a
c o nseq ü ente utilização d e m eio s escasso s im p lica necessariam ente a
red u ção d a cap acid ad e efetiv a da so cied ad e p ara o b ter o utro s b enefí­
cio s. A esta quarta d eco rrência d o p ro cesso d e esco lha se d á a d eno ­
m inação d e c u s to d e o p o rtu n i d a d e .

Q u aisq u er esco lh as feitas p o r ind iv íd uo s, em p resas, g o v erno s o u o utro s


ag entes eco nô m ico s quanto à a l o c a ç ã o d e recurso s im p licam , p o rtanto , uma

50 A CO M PREEN SÃ O D A ECO N O M IA
FIG IJRA 1.5
U m a sín tese
seq ü en cial d o s
co n ce ito s b ásico s
d a sistem atiz ação
d e R o b b in s.

relação entre cu s to s (o s m eio s em p reg ad o s) e b e n e f í ci o s (o s fins alcançad o s),


b em co m o a o co rrência d e c u s to s d e o p o rtu n i d a d e (o utro s fins que, co m o s
m esm o s recurso s, p o d eríam ter sid o alcançad o s). A sistem atiz ação d e Ro bbins
está esquem atiz ad a na Figura 1.5. E no Q uad ro 1.4 resum im o s um texto d e C.
N ap o leo ni" so b re essa sistem atiz ação .
D esta sistem atiz ação resulta, co m rigo r co nceitu ai, um co nceito d e e c o n o ­
mia essencialm ente v inculad o ao fato eco nô m ico . D esd e q u e este resulta d e ato s
de esco lha entre fins e m eio s, a eco no m ia p o d e ser v ista co m o um ram o d as
ciências so ciais que se o cup a da ad m inistração eficiente d o s escasso s recurso s
existentes, em p reg ad o s na c o n sec u ç ão d o s fins q u e tenham sid o estabelecid o s
p ela so cied ad e - q u er seja atrav és d e d escentraliz ad o p ro cesso d ecisó rio , quer
seja atrav és d e um p o d er central. O u, co m o Ro bbins a d efiniu:

A A BRA N G ÊN C IA F. A S LIM ITA Ç Õ ES DA EC O N O M IA 51


Q u ad ro 1 .4
O co n ce ito d e e co n o m ia n a sistem atiz ação d e R o b b in s.

Em 1932, o eco no m ista inglês Lionel Ro bbins. em p o ssib ilid ad e d e faz e r e sc o lh as. Q uand o , d e um lado,
■ seu En saio so b re a n atu rez a e a im p o rtân c ia d a e c o ­ o s m eio s são limitados e ap licáveis a usos alternativo s e,
n o m ia, exp licito u no v o s co nceito s so bre o fato eco nô ­ d e o utro lado , o s fins são graduáveis p o r o rd em d e im­
mico e, sim ultaneam ente, so bre a eco no m ia. p o rtância, a conduta humana assum e necessariam ente a
Para co m p reend er a sistem atização d e Robbins, d e­ forma d e uma e s c o lh a e tem. então , uma d im e n são
v em o s partir d o co nceito w alrasiano de escassez. L. W al- e c o n ô m ic a . A eco no m ia v em assim a co nfig u rar-se
raz d efine co m o escassa uma co isa que seja ao m esm o co m o a ciência q u e estuda a co nd uta humana na utiliza- 1
tem p o útil e limitada em relação às necessid ad es a que çào d e m eio s escasso s para atend er a fins alternativos.
ela p o ssa satisfazer. Se as riquezas são escassas, isto é, Com esta d efinição , clareav a-se o caráter essencial do
se co m elas não é p o ssív el satisfazer às necessid ad es até trabalho científico em eco no m ia: a d eterm inação d o s re­
a saturação , d eco rre que o p ro blem a que cad a agente sultado s que o ato d e esco lha alcança em uma série de
eco nô m ico d ev e reso lv er co nsiste em tirar o máxim o pro ­ caso s particulares, d e m axim izaçào na realização d e fins
v eito d o s recurso s escasso s a sua d isp o sição . O co nsu ­ o u d e m inimizaçào no em p rego d e m eio s. A im p ortân­
midor, p o r exem p lo , tend e a distribuir seus rend imento s cia que Robbins, co m rigor, atribuiu a esta questão es­
entre vários bens, p ro curand o maximizar sua utilidade. sencial contribuiu para rem ov er incertezas so bre a natu­
O pro duto r tend e a distribuir recurso s entre as várias al­ reza da ciência eco nô m ica, fav o recend o no tav elm ente
ternativas d e p ro d ução q ue lhe são acessív eis, d e m o d o seu p ro g resso ulterior. Lsto foi bem d em o nstrad o em um
a maximizar seus reto rno s. Um p o up ad o r que d isp onha d o s m o num ento s da m o d erna sistem atização científica
de certo m o ntante p ro cura d istribuí-lo entre as várias al- em eco no m ia, o s Fundamentos da análise econômica,
! tem ativ as de ap licação , para maximizar sua renda futu­ d o am ericano P. Samuelso n, d e 1947.
ra. E assim sucessiv am ente. To d o s esses caso s são esp e­ Uma d as questõ es mais im p o rtantes, d eco rrentes da
cificaçõ es d o p ro blem a geral d e tornar m áxim o um re­ sistem atização d e Ro bbins, diz resp eito à neutralid ade
sultado, co nd icio nad o p o r d eterminad a, e escassa, d is­ da eco no m ia, d eixand o aqui claras suas interfaces co m \
p o nibilid ad e d e m eio s. Isto é o m esm o que to m ar míni­ o utro s ramo s d o co nhecim ento so cial. D o p o nto d e vista
m o o d isp ênd io de m eio s para alcançar um d ad o resul­ formal, a eco no m ia é ind iferente em relação ao s fins
tad o . que um co njunto d e recurso s é cap az d e atingir. O co r­
Esta bem co nso lid ad a co m p reensão teó rica sugeriu re, p o rém , q u e o s fins que a ação hum ana estab elece
a Robbins a procura d e uma d efinição para o fato e c o ­ estão naturalm ente sujeito s a o utro s tip o s d e av aliação ,
n ô m ic o , que não fo sse ap enas classificató ria, mas analí­ d o s p o nto s d e vista ético e p o lítico , p o r exem p lo . Co m o
tica. Ele p retendeu ind icar em que co nsistiría o asp ecto Ro bbins d estaca, isto não significa que o eco no m ista
p ro priam ente eco nô m ico da co nd uta humana. não p o ssa nem deva exp ressar juízo s d e v alo r acerca
A pro fund and o o co nceito w alrasiano d e escassez, d os fins que se p retend e alcançar e da fo rm a co m o se­
Robbins estabeleceu quais seriam as co nd içõ es, necessá­ rão em p reg ad o s o s co rresp o nd entes m eio s d isp o nív eis.
rias e suficientes, que to m am a ação hum ana suscetív el Mas, ao transitar da abo rd agem p uratnente eco nô m ica
d e co nsid eração eco nô m ica. Fo ram quatro as co nd içõ es para o utras categ o rias d e co nsid eraçõ es, o eco no m ista
definid as: as duas primeiras d izem resp eito ao s fins e as transita d o q u e se co nv encio no u cham ar d e eco no m ia
d uas o utras ao s m eio s d e ação . A primeira co nd ição é “p o sitiv a” p ara a eco no m ia “no rm ativ a”. Vale d izer, da
que o s fins sejam múltiplos; a segund a, que o s fins te­ “ ciência eco nô m ica" p ara a "p o lítica eco nô m ica” . N es­
nham d iferentes graus d e impo rtância e po ssam ser hie- se trânsito , to rnam -se inev itáv eis juízo s de v alo r e cru­
rarquizado s; a terceira é que o s m eio s sejam limitados; e zam ento s co m co nsid eraçõ es extra-eco nô m icas, siste­
a quarta é que o s m eio s tenham usos alternativo s. matizadas. em o utro s cam p o s d o co nhecim ento , co m os
quais, então , se to rnam inexo ráv eis as relaçõ es d e in­
Iso lad am ente co nsid erad a, nenhum a d essas quatro
terd ep end ência;
co nd içõ es está apta a caracterizar o fato eco nô m ico . Vis-
1 tas, p o rém , em co njunto , d efinem qual o elem ento es­ Fo n te : NAPOLEONI, Cláudio. O pensamento econômico
sencial d o asp ecto eco nô m ico da co nd uta hum ana: a do século XX. Rio de Janeiro : Paz e Terra, 1979-

“A e c o n o m i a é a c i ê n c i a q u e e s tu d a as f o rm a s d e c o m p o rta m e n to
h u m a n o re s u l ta n te s d a re l a ç ã o e x i s te n te e n tre as i l i m itad as n e ­
ce s s i d a d e s a s a ti s f a z e r e o s re c u rs o s q u e , e m b o ra e s c a s s o s , s e p re s ­
ta m a u s o s a l te rn a ti v o s .”

Esse co nju nto d e elem ento s co nceitu ais (m e i o s e s c a s s o s , f in s a l te rn a ti v o s e


i l i m itáv e i s , e s c o l h a e a l o c a ç ã o ) está p resente na m aio r p arte d as mais rec en ­
tes d efiniçõ es d e eco no m ia. Selecio nam o s as seg uintes:

52 A C O M PREEN SÃ O D A ECO N O M IA
□ U m b re i t, H u n t e K i n te r:12 “A eco no m ia é o estud o d a o rg aniz ação
so cial atrav és da qual o s ho m ens satisfazem suas necessid ad es d e b ens
e serv iço s escasso s/ ’
□ L e f tw Í ch :B “Em bo ra nem sem p re seja fácil sep arar a d em arcação d as
fro nteiras q u e sep aram a eco no m ia d e o utro s cam p o s d o co nhecim ento
social,, há atualm ente co nco rd ância geral em relação a seu co nteú d o
p rincip al. A o se o cu p ar d as co nd içõ es g erais d o bem -estar, o estud o
d a eco no m ia inclui a o rg aniz ação so cial q u e im p lica d istribuição d e
recurso s escasso s entre necessid ad es hum anas alternativ as, co m a fi­
nalid ad e d e satisfazê-las a nív el ó tim o .”
□ B a rre : 14 “A eco no m ia é a ciência v o ltad a p ara a ad m inistração d o s
escasso s recurso s d as so cied ad es hum anas: ela estud a as fo rm as assu­
m id as p elo co m p o rtam ento hum ano na d isp o sição o nero sa d o m un­
d o exterio r, d eco rrente da tensão entre d esejo s ilimitáv eis e m eio s li­
m itad o s.”
□ S to n i e r e H a g u e :B “N ão ho uv esse escassez nem necessid ad e d e re­
p artir o s b ens entre o s ho m ens, não existiríam sistem as eco nô m ico s
nem eco no m ia. A eco no m ia é, fund am entalm ente, o estud o da escas­
sez e d o s p ro blem as d ela d eco rrentes.”
□ R o g e rs ,1(> auto r d e um m anual d e intro d ução à eco no m ia c u jo título
p rincip al, sug estiv am ente, é Choise, isto é. Escolha: “A eco no m ia diz
resp eito ao estud o d e um fenô m eno cham ad o escassez . Em bo ra o ho ­
m em tenha sid o até aqui b em -su ced id o em fazer co m q u e se exp an­
d issem a p ro d ução d e b ens e serv iço s necessário s a sua v id a, ele não
co nseg uiu red uzir substancialm ente a d iferença entre seus d esejo s e
o s m eio s cap az es d e satisfazê-lo s. Co ntinua, assim , agindo economica­
mente\ p o is aind a não se liberto u e, p resum iv elm ente, não será fácil
libertar-se d o d ifícil exerc íc io d a escolha.”
□ H o rsm an : “Esco lher a m elho r fo rm a d e em p reg ar recurso s escasso s
p ara o b ter b enefício s m áxim o s: este é o p ro blem a b ásico d e to d as as
so cied ad es eco no m icam ente o rg aniz ad as.”

U m a Prim e ira O Q uad ro 1.5 sintetiza ak.três ab o rd ag ens co nsid erad as: a neo clássica, a so cialis­
Sín te s e : as ta e a d e Ro bbins.

Q u e s tõ e s Há nítid as lig açõ es fo rm ais entre as três abo rd ag ens. A razão d e ser d a e c o ­
no m ia está p resente nas três fo rm as d e d elim itar o cam p o esp ecífico d o c o n h e­
P re s e n te s e m
cim ento eco nô m ico - o e s tu d o d as f o rm a s a p l i ca d a s p e l o h o m e m n a i n c e s ­
A b o rd a g e n s s a n te b u s c a d e m e i o s p a ra s a ti s f a z e r as c o n d i ç õ e s i l i m i tá v e i s d e b e m -

D istin tas e s ta r.

São traço s co m uns d as três abo rd ag ens:

□ Fo co na tensão entre necessid ad es e recurso s.


□ Ênfase em co m p reend er o co m p o rtam ento hum ano e as fo rm as d e
o rg aniz ação da so cied ad e p ara ad m inistrar a tensão básica entre fins e
m eio s.
Elem ento s presentes-, lim itação d e m eio s, m ultip licid ad e d e necessid a­
d es e m ecanism o s d e alo cação e d istribuição .

A A BRA N G ÊN C IA E A S H M ITA Ç Ò ES D A EC O N O M IA 53
Q u ad ro 1.5
A ab o rd ag em A p e rs p e ctiv a A sis tem atiz ação
O co n ce ito d e
n e o cl ás sica so cialista d e R o b b in s
e co n o m ia: trê s
ab o rd ag en s □ A e c o n o m ia é um □ As n e c e s s id a d e s □ A s o c i e d a d e te m o b ­
e s tu d o d o s h o m e n s h u m a n a s s ã o d e te r ­ je tiv o s m ú ltip lo s , ili­
d istin tas.
ta l co m o v iv e m , m in a d a s p e lo e s tá ­ m ita d o s , m a s m e io s
ag em e p e n sam n o s g io c u l tu r a l d a s o ­ lim ita d o s . A c o n d u ­
a s s u n to s o r d in á r i o s c ie d a d e . ta e c o n ô m i c a co n­
d a v id a . s is te em e s c o lh e r
□ P a ra s a tis f a z e r a u m
e n tr e f in s p o s s í v e i s
□ F o c a liz a , p r in c ip a l­ p ad rão de n e c e s s i­
e m e io s escasso s
m e n te , a c o n d u ç ã o d ad es, o ho m em se
p a ra a lc a n ç á - lo s .
d o ho m em no tra to d e d ic a a u m a to s o ­
co m q u e s tõ e s que c ia l: a p r o d u ç ã o . □ A e c o n o m ia é um
in te rf e r e m e m s u a ri­ ra m o q u e e s tu d a a s
□ A re a liz a ç ã o d esse
q u e z a e b e m - e s ta r . fo rm as d o c o m p o r­
p ro c e s s o se c o m p le ­
ta m e n to hu m ano
□ O f in i ú ltim o d e q u e ta co m a d i s tr i b u i ­
q u e re s u lta m d a re ­
c u id a a e c o n o m ia ção do p r o d u to so ­
la ç ã o e n tr e n e c e s s i ­
c o n s i s te em d esco ­ c ia l.
d ad es i l i m i ta d a s e
b rir c o m o a s v ir tu ­
□ O e s tu d o d as le is re c u rs o s e s c a s s o s .
d es hu m anas e a
s o c i a is q u e re g u la m
c o n c o r r ê n c ia p o d e m □ M e io s e s c a s s o s , f in s
a p r o d u ç ã o e a d is ­
c o n d u z ir a o b e m - e S'- a lte r n a tiv o s , e s c o l h a
tr i b u i ç ã o re su m e o
ta r s o c ia l. e a lo c a ç ã o são os
cam p o de que se
e l e m e n to s a p a r ti r
o c u p a a e c o n o m ia .
d o s q u a is s e d e f in e
o c a m p o d e q u e se
o c u p a a e c o n o m ia .

1 .4 A M eto d o lo g ia d e D esen v o lv im en to d o
C o n h ecim en to Eco n ô m ico

A C o n s tru ç ã o d o A ro bustez d e seus p ressup o sto s e a co nstatação d e q u e há traço s co m uns entre


as d iferentes abo rd ag ens d a eco no m ia, no ta d am ente quanto a seu sig nificad o e
C o n h e c im e n to :
p ro p ó sito s, não esco nd em p o r inteiro d uas d e suas m ais d esafiantes característi­
Se n s o c o m u m . cas: d e um lad o , a d elim itação entre o s e n s o c o m u m e o co nhecim ento e c o n ô ­
C iê n c ia e m ico cientifica m ente sistem atizad o ; d e o utro lad o , a v incu lação da sistem atiza-
ção científica a p a ra d i g m a s i d e o l ó g i co s .
Id e o lo g ia
Estas d uas características resultam d e d uas d iferentes situaçõ es:

1. O s e n s o c o m u m e m e c o n o m i a . Na m ais p ura ac ep ç ão m arshalliana,


a eco no m ia “cuid a d as ativ id ad es co rrentes da v id a”. Trata d as açõ es,
interaçõ es e reaçõ es d e uma m ultip licid ad e d e ag entes, q u e interfe­
rem no p ro cesso ec o nô m ic o em caráter p erm anente, d efinind o e x p e c ­
tativ as, influ enciand o curso s d e aç ão e interp retand o causas e efeito s
d o o rd enam ento co rrente d e q u e p articip am . D eco rrentem ente, há em
eco no m ia g rand e núm ero d e axio m as que d eriv am d o quo tid iano d a

54 A C O M PREEN SÃ O DA ECO N O M IA
v id a e exp ressam o entend im ento d e cad a ag ente o u o senso co m um
q u e se fo rm a so b re cau sas e efeito s d o o rd enam ento d o p ro cesso e c o ­
nô m ico .

2. A v i n c u l a ç ã o a p a ra d i g m a s i d e o l ó g i co s . Em eco no m ia, não é fácil


d em arcar o s lim ites entre o co n h ecim en to científico e a ac ep ç ão id e­
o ló g ica. D e certa fo rm a, esta d ificuld ad e refo rça as relaçõ es biunív o -
cas d a ec o no m ia c o m o u tro s ram o s d o c o n h ecim en to so cial. E faz
sem p re ressurgir, ap esar d a d elim itação sistem atiz ad a d e seu cam p o
d e inv estig ação , seu s estreito s laço s co m a filo so fia, a p o lítica e a
ética.

A d ificuld ad e d e d elim itação entre s e n s o c o m u m , c i ê n c i a e i d e o l o g i a não


se restring e, o bv iam ente, à eco no m ia. No Q uad ro 1.6, co nstata-se sua extensão
p raticam ente a to d o s o s o utro s cam p o s d o co nhecim ento hum ano . Na ec o n o ­
mia, p o rém , as d ificuld ad es d e d elim itação p arecem sup erar a d e o utro s ram o s,
p ela fo rça e p ela cap acid ad e d e p ressão d o s ag entes eco nô m ico s e p ela m ag ni­
tud e d o s interesses env o lv id o s. Po r isso m esm o , é útil ap ro fund ar esses c o n c ei­
to s, no tad am ente q uanto a seu sig nificad o e atributo s. A clara co m p reensão d e
cad a um d eles tem m uito a v er c o m a co nstru ção d o co nhecim ento científico
em eco no m ia e co m sua co m p artim entaliz ação usual.

O s p rincip ais atributo s d o s co nceito s d e senso co m um , ciência e id eo lo g ia


enco ntram -se sintetiz ad o s na Figura 1,6. Reg istram -se tam bém ali, em ilustração
grafica, as interfaces entre o s três co nceito s.

□ O S e n s o c o m u m . O entend im ento d o ho m em so b re o m und o q u e


o cerca, tanto no âm bito d e suas relaç õ es c o m as fo rças d a natureza,
q u anto no q u e d iz resp eito às d iferentes m anifestaçõ es d e sua inte­
ração so cial, c o m eç a p o r um c o nju nto d e c o n h e c i m e n to s « c ríti­
c o s , g eralm ente d eno m inad o s p ela exp ressão s e n s o c o m u m . À m e­
d id a q u e o ho m em vai am p liand o seu co ntato co m a naturez a e co m
seu s p ares, v ai tam bém acu m u land o no v o s co nju nto s d e habilid ad es
e d e p ráticas e, ap m esm o tem p o , exercitand o sua c o nsc iênc ia, seu
d iscernim ento , seü tino e sua p erícia. Po r herança cultural, g eraç õ es
q u e se su ced em am p liam , testam e su b m etem à p ro v ação ex p eri­
m ental o s co nh eciniento s acum u lad o s q u e lhes fo ram transm itid o s.
Bo a p arte d estes nad a m ais é d o q u e um e n te n d i m e n to su p e rf ic ial
acerca d a co isa p retensam ente co nhecid a e d o m inad a. O utra p arte
resum e-se à c re d u l i d a d e , em g eral d eco rrente d e tentativ as p rim iti­
v as e inacab ad as d e exp licar o d esc o n h ec id o . E o utra p arte não vai
além d a p ra ti c i d a d e , sem , co ntu d o , exp licar p o r q u e as co isas ac o n ­
tecem o u p o r q u e d eterm inad o s fenô m eno s se m anifestam . A este
sistem a d e co nhecim ento , a q u e p o d em o s cham ar s e n s o c o m u m ,
d ev e-se exp ressiv a p arcela d o d o m ínio inicial d o ho m em so b re o s
m ais v ariad o s cam p o s d e sua atu ação .

A ABRANGÊNCIA E AS LIMITA ÇÕES DA ECONOMIA 55


Q UA D RO 1 .6
U m e s p aço co n tín u o : a ciê n cia e n tre o s e xtre m o s d o sen so co m u m e d a id eo lo g ia.
• .... ......... ...

Senso comum - —f— Ciência ------- — - Ideologia


i
I

O p ro blem a central da m eto d o lo gia é a d em arcação Enco ntram o s id eo lo gia na p ro d ução científica p o r­
científica, o u seja, a d efinição d o q u e é o u nào ciência. que, send o a ciência um fenô m eno so cial, nào p o d e es­
Por incrível q ue p areça, não há co isa mais contro versa cap ar ao p o sicio nam ento p o lítico , m anifesto o u latente.
em ciência d o que sua própria d efinição . Enco ntram o s senso co m um p o rque não so m o s cap azes
É sem p re mais fácil definir pela exclusão , o u seja, d e d iscursar so bre to d o s o s assunto s co m co nhecim ento
definir o q u e a ciência não é. Po d em o s imaginar um es­ esp ecializad o .
p aço co ntínuo , no m eio d o qual co lo cam o s a c iê n c ia e A ceitand o -se, então , que a ciência d ifere do senso
nos extrem o s o se n so c o m u m e a id eo lo g ia. A o dizer­ co mum e da id eo lo gia, quais seriam o s critério s d e cíen-
mo s que se trata d e um esp aço co ntínuo , aceitam o s que tificidade, para não ficarmo s ap enas numa d efinição po r
, o s limites entre estas categ o rias não são estanques; p elo exclusão ? Po d em o s imaginar critério s in te rn o s e e x te r­
co ntrário , eles se sup erp õ em nas o rlas d e co ntato . n o s. O s interno s são :
O critério d e d istinção d o s e n so c o m u m seria o □ C o e rên c ia. Significa argum entação estruturada,
c o n h e c im e n to a c rític o , im ed iatista, q u e acred ita na co rp o não co ntrad itó rio d e enunciad o s, d esd o ­
| sup erficialidad e d o fenô m eno . A d o na-d e-casa tam bém bram ento d o tema d e forma estruturada, d ed u­
1 sabe d e inflação , p o rque p erceb e facilm ente a subid a ção ló gica de co nclusõ es.
contínua d o s p reço s; mas seu co nhecim ento d o p ro ble­ □ C o n sistê n c ia. Significa a cap acid ad e d e resistir
ma é d iferente d aquele d o eco no m ista, que tem para ele a arg um entaçõ es co ntrárias.
já uma teo ria elabo rad a (o u v árias) e uma av aliação críti­
□ O rig inalid ad e. Significa p ro d ução não tauto ló-
ca d e p ro fundidad e. Po d em -se co lo car d entro do senso
gica nem m eram ente rep etitiva, rep resentand o
co mum tam bém m o d o s ultrapassad os d e co nhecer fenô ­
uma co ntribuição ao co nhecim ento .
m eno s, co nsid erad o s co m o crend ices o u co isas sem e­
lhantes. O trabalhado r rural p o d e ter seu m éto d o d e p re­ □ O b jetiv ação . Significa a tentativa d e repro duzir
v isão d e chuva, usando co m o indicado r impo rtante o zur­ a realidade assim co m o ela é, não co m o go sta­
rar do burro; o agrô no m o se sentirá inclinad o a rejeitar ríamo s que fo sse. -
este m éto d o e a buscar o utros ind icad o res tido s p o r mais
A lém destes, há ainda critério s externo s, redutíveis
críticos e realistas. Muitas d o enças são curad as p o r m é­
à intersubjetivid ad e, d e q u e sao exem p lo s a d iv u lg ação ,
to d o s caseiro s, resultantes d e co nhecim ento s histo rica­
a c o m p araç ão c rític a e o re c o n h e c im e n to g e n e rali­
mente acum ulad o s; a m edicina acad êm ica p o d e aceitar
z ad o . /
certo s m éto d o s, m as há d e p referir vias testad as p o r ex­
p eriências críticas, realizadas em labo rató rio s d e p esqui­ A exig ência d e critério s externo s d eco rre d o cará­
sa. Em tudo, o critério d e d istinção é o esp írito crítico ter so cial e histó rico da ciência. Equiv ale a d iz er que a
n o tratamento d o fenô m eno , traduzido em característi­ ciência não é um to d o acabad o . Uma ciência acab ad a
cas co m o pro fund id ad e e rigor ló gico . d estruiría a co ncep ção d e p ro cesso científico e p erd e­
ría a no ção d e uto p ia da v erd ad e. To d a ceoria não p as­
O critério d e d istinção da id eo lo g ia será o c aráte r
sa d e um tijo lo substituív el no ed ifício inacabáv el da
ju stifle ad o r d este tip o d e co nhecim ento . Justificar, ao
ciência. Equiv ale a d izer q ue o p ro d uto da ciência é
contrário de argumentar, significa buscar a co nv icção , a
p assív el d e d iscussão , exceto se intro d uzirm o s o d o g-
ad esão , a d efesa d o p ro blem a em fo co . Enquanto o sen­
matismo .
so co mum co stum a ser uma po stura singela, a id eo lo gia
alcança nív eis da m aio r so fisticação , m esm o p o rque sua Ao p erigo d o d ogmatismo co rresp o nd e o d o relati- j
arma mais v antajo sa é seu env o lv im ento co m a ciência, v ismo : não hav end o p o ssibilid ad e de fund am entação úl- í
na procura de vestir a p rescrição co m a cap a d e d escri­ tima, a ciência então nào passaria d e um jo go d iletante e
ção . Inclui a d eturp ação d o s fato s em fav or da p o sição a d esco m p ro m issad o , em que cad a qual diz o que quer e j
ser d efend id a, e cheg a m esm o à falsificação, quand o atin­ aceita o q u e bem entend er. Tal relativismo não é susten- J
ge o nível da pró pria mentira. As interp retaçõ es diver­ tável so cio lo gicam ente, p o rque a ciência nào é um fenô - |
gem bastante quanto à impo rtância d o fenô m eno id eo ­ m eno individual, mas so cial, ou seja, a d em arcação cien­
ló g ico , hav end o o s que o julgam p red o m inante e avas- tífica é feita mais p èla co m unid ad e que p elo indivíduo.
salad o r (num mar d e id eo lo gia há p equenas ilhas d is­
persas d e ciência) e o s que o julgam cad a vez mais resi- Fo n te : DEMO, Ped ro . M etodologia científica em ciên­
| dual (num mar de ciência restam ainda p o ucas ilhas de cias sociais. São Paulo : Atlas, 1980.
j id eo lo gia).

56 A COMPREENSÃO DA ECONOMIA
FIG URA 1.6
S en so co m u m ,
ciê n cia e id eo lo g ia:
atrib u to s Senso comum Ciência Ideologia
d if e re n ciad o re s. □ Superficialidade □ Coerência □ Just ificação
□ Credulidade □ Consist ência □ Partidarismo
□ Prat icidade □ Objet ividade ~ Klormat ização

□ C o n s tru ç ã o d a ci ê n ci a . Partind o d e sistem as d e co nhecim ento s acrí-


tico s, o ho m em v ai, p ro g ressiv am ente, à bu sca d o c o n h e c i m e n to
cie n tíf ico . Da info rm ação à co nsciência, d o entend im ento à inteligên­
cia, da prática ao s ensaio s exp erim entais, o senso co m um vai d and o
lugar ã ciência, co m o suced er das g eraçõ es. As práticas ag ríco las rudi­
m entares, p o r exem p lo , d eram lugar à agro no m ia exp erim ental, à p es­
quisa agro nô m ica e à seleção g enética d e esp écies v egetais. No cam p o
d as ciências hum anas, a análise da interação esp o ntânea ensejo u a clas­
sificação e co d ificação d as mais variadas m anifestaçõ es so ciais, p ro cu­
rand o -se co nhecer as razõ es ou m o tiv o s d as d iferentes fo rmas d e co m ­
p o rtam ento ou d e reação d o ho m em . Este no v o co njunto d e co nheci­
m ento s, sistem aticam ente elabo rad o e exp erim entad o , traduziu, em eta­
pas sucessiv as, a p assagem d o senso co m um à ciência, cab end o no tar
que, na co nstrução d o co nhecim ento científico , o ho m em busca p elo
m eno s três relev antes critério s d e cientificid ad e. Primeiro, a co e rê n ci a ,
significand o falta d e co ntrad içõ es, argum entação estruturada, co rp o não
co ntrad itó rio d e enunciad o s, d esd o bram ento d o co nhecim ento d e fo rma
o rganizad a, co nclu sõ es a partir d e d ed uçõ es ló g icas. Seg und o , a c o n ­
s is tê n cia, no sentid o d e resistência à arg um entação co ntrária. E, tercei­
ro, a o b j e tiv id ad e , no sentid o d e rep ro d ução da realid ad e co m o ela é,
não co m o o o bserv ad o r go staria q u e fo sse.
□ I d e o l o g ia e n o rm a s . Integrand o -se ao estad o d o co nhecim ento hum a­
no e rep ro d uzind o seu p o s i ci o n a m e n to em relação ao m und o que o
cerca, surge e se cristaliza um terceiro co rp o d e idéias e d e entend i­
m ento s, que cham am o s i d e o l o g i a A d istinção entre ciência e senso
co m um fund am enta-se, co m o v im o s, em um co njunto d e critério s g e­
ralm ente aceito s; aind a assim, esses d o is co m p artim ento s não se p o d em
co nsid erar estanques, entrelaçand o -se co m o elo s d e uma m esm a co r­
rente. Da d istinção entre ciência e id eo lo gia tam bém resultam elo s entre­
laçad o s, não o bstante o s critérios co m que se d efine a ciência sejam bem
diversos d aqueles co m que se id entificam as id eolo gias. Estas se caracteri­
zam pela j u stif icação , p elo p artid ari s m o e pela n o rm atiz ação .
A id eo lo g ia surg e da exig ência d e l e g iti m a çã o , co m um às m ais d ife­
rentes fo rm as d e o rd enam ento institucio nal. O cam p o em q u e grav i­
tam as p o sturas id eo ló g icas é d iv erso d aq u eles em q u e se aco m o d am
o senso co m um e a ciência. A id eo lo gia exp ressa um co njunto d e valo -

A ABRANGÊNCIA F. AS LIMITAÇÕES DA ECONOMIA 57


res, crenças, co nv icçõ es, p rescriçõ es e no rmas. Estas se d esenv o lv em a
partir d a necessid ad e q u e to d a o rg aniz ação so cial tem d e se legitimar.
A o co ntrário d o senso co m um e da ciência, as id eo lo g ias não buscam a
neutralid ad e, a exp licação sim p les e o bjetiv a co m que o ho m em p ro cu­
ra co m p reend er o m und o q u e o cerca. O caráter cliferenciad o r d a id eo ­
lo g ia é sua não -neutralid ad e. O d iscurso id eo ló g ico é p red o m inante­
m ente partidário e significa p o sicio nam ento s p o lítico s d eriv ad o s d e co r­
rentes filo só ficas e d e interesses d e classe. O co rre, p o rém , que a justifi­
cação id eo ló g ica enco b re-se co m o v éu d o arg um ento científico . Daí
resultam o s elo s d e encad eam ento entre a ciência e a id eo lo gia. E nem
sem p re é fácil sep ará-lo s, no tad am ente no cam p o d as ciências so ciais.
Geralm ente, as id eo lo gias (o u seja, a necessid ad e de legitimação d e d e-
tenninad o s o rd enam ento s institucio nais) são v eiculad as p o r grup o s d o ­
m inantes o u p o r grup os que aspiram ao p o d er. Tem -se, assim, em geral,
a id e o l o g ia d o m i n an te , à qual se co ntrap õ em id e o l o g ias al te rn ativ as
ou e m e rg e n te s . Cada uma d elas gravita em to m o de d iferentes sistemas
d e valo res, crenças e co nv icçõ es; p o r isso, cada uma p ro p õ e no rm as dife­
rentes para o o rd enam ento o u o reo rd enam ento da so cied ad e, em suas
mais d iferentes m anifestaçõ es, entre as quais se d estaca a eco no m ia.

A E la b o r a ç ã o cia As d ificuld ad es d e d istinção entre o s três co nceito s que acab am o s d e exp lo rar, o
senso co m um , a ciência e a id eo lo g ia, não im p lica a extrem ad a co nv icção d e
C iê n c ia : O s
que, em eco no m ia, é im p o ssív el sep arar a co nstru ção científica, d e um lad o , d o
M é to d o s In d u tiv o
entend im ento co rrente, acrítico e sup erficial e, d e o utro lad o , da ap arente p ro ­
e D e d u tiv o fund id ad e d as justificaçõ es id eo ló g icas.
Realm ente, essa tarefa não é fácil. D e um e d e o utro lad o , é d ificultad a p elo
jo g o d e interesses env o lv id o s. Reco nhecem -se, p o rém , aind a q u e p o ssiv elm ente
co ntam inad o s p o r p ressup o sto s id eo ló g ico s, co nju nto s referenciais d e p rincíp io s,
teo rias, leis e m o d elo s eco nô m ico s, elab o rad o s a p artir d as m eto d o lo g ias c o n ­
v encio nais da elab o ração científica. A este co nju nto é que se dá a d eno m inação
g enérica d e te o ri a e c o n ô m i c a o u, sim p lesm ente, e c o n o m i a ,
Na co nstru ção d a eco no m ia, co m o usualm ente o co rre em o utro s ram o s d o
co nhecim ento hum ano , o instrum ental em p reg ad o assenta-se so b re b a s e s m e ­
to d o l ó g i ca s . C o m o o b serv a D em o ,18 em bo ra a m eto d o lo g ia não d ev a ser su-
p erv alo rizad a, d ad a sua natureza instrum ental, ela d esem p enha p ap el d ecisiv o
na fo rm ação d o s p ro d uto res d e ciência, à m ed id a q u e o s faz em co nscientes d e
seus lim ites e d e suas p o ssib ilid ad es - “p o d e-se m esm o d iz er q u e a m ed io crid a­
d e e a falta d e p reo cu p ação m eto d o ló g ica c o in c id em ’.
A m eto d o lo g ia da elab o ração científica, em sua estrutura fund am ental, bus­
ca, c o m o p rim eiro p asso , o b s e rv a r s i s te m a ti c a m e n te a re a l i d a d e . D ep o is,
elab o rar m o d elo s sim p lificad o s que a rep ro d uzam , q u e id entifiq uem relaçõ es
d e causas e efeito s e que interp retem o s m ais v ariad o s ev ento s e seus d esd o b ra­
m ento s. N o p ro cesso d e elab o ração , b asicam ente, reco rre-se a d uas abo rd ag ens
d istintas, ainda que co m p lem entares: a i n d u çã o e a d e d u çã o . A ssim, em sua
ac ep ç ão m ais sim p les, as b ases so b re as quais se co nstró i o co nhecim ento cien­
tífico co nstituem -se, p relim inarm ente, d e p ro cesso s d escritiv o s q u e co nd uzam
ao reco nhecim ento d a realid ad e e, sub seq ü entem ente, d e d uas abo rd ag ens m e­
to d o ló g icas d istintas, em bo ra co m p lem entares, a indutiva e a d ed utiv a.
Em síntese, essas três b ases são :

58 A COMPREENSÃO DA ECONOMIA
1. O re c o n h e c i m e n to . Co nsiste na o b serv ação sistem atizad a d a realid a­
d e. Uma v ez d efinid o o cam p o esp ecífico d e inv estig ação d e um as­
p ec to d a realid ad e eco nô m ica, o b serv am -se, classificam -se e d escre­
v em -se as categ o rias d essa m esm a realid ad e q u e sejam p ertinentes à
inv estig ação p retend id a. O reco nhecim ento env o lv e, assim , a am p la
o b serv ação d o m und o real, a p artir d a qual são selecio nad o s fato s,
d ad o s e relaçõ es d e co m p o rtam ento q u e sirvam para sua co m p reen­
são o u interp retação .
2. A i n d u çã o . A reunião d e info rm açõ es, resultantes d e p ro cesso s siste­
m atizad o s d e reco nhecim ento , p o d e co nd uz ir à fo rm ulação d e p rincí­
p io s, teo rias, leis o u m o d elo s exp licativ o s d a realid ad e o bserv ad a. A
transp o sição d o p ro cesso d e reco nh ecim ento d a realid ad e p ara sua
abo rd ag em teó rica sistem atizad a é o q u e caracteriz a o m é to d o i n d u ­
tiv o d e inv estig ação . Este m éto d o é, p o r excelência, o em p reg ad o p ela
eco no m etria. A co p lad o s ao s d esenv o lv im ento s d a m atem ática e d a es­
tatística, o s m o d elo s eco no m étrico s d eriv am d e lev antam ento s siste­
m ático s e q uantificad o s d e v ariáv eis eco nô m icas, b em c o m o d as rela­
ç õ es estabelecid as entre elas. N ecessariam ente, p o rém , p o r m aio r q u e
seja sua ab rang ência e co m p lexid ad e, o m o d elo eco no m étrieo é uma
sim p lificação d a realid ad e o bserv ad a, o m esm o o co rrend o co m p rin­
cíp io s, teo rias e leis d ele d eriv ad as. A inda assim , é um a sim p lificação
d a realid ad e o bserv ad a. Tem , p o rtanto , o caráter d e um a ab stração
exp erim ental. *
3. A d e d u çã o . A abo rd ag em d ed utiv a resulta d e p ro cesso s ap rio rístico s,
p elo s quais se lev antam hip ó teses so b re realid ad es não inv estigad as a
p artir d e lev antam ento s sistem atiz ad o s, q uer p ela natureza d as q u es­
tõ es env o lv id as, q u er p o r sua co m p lexid ad e. A s hip ó teses fo rm ulad as
são o b jeto d e d esenv o lv im ento s teó rico s, cuja factibilid ad e não se su­
jeita, p o rém , à m ensu raçâo co nv encio nal, m as à tip ificação d e fato s
o u d e co m p o rtam ento s d ed uzid o s d e ab straçõ es so b re a realid ad e c o n ­
creta. Tal é, em essência, o q u e caracteriz a o m é to d o d e d u ti v o d e
inv estig ação .

O em p reg o d e um o u d e o utro m éto d o d e inv estig ação , p ara a co nstru ção


sistem atizad a d a eco no m ia, d ep end e d a natureza d o s fato s ec o nô m ic o s co m que
se está lid and o . O m éto d o ind utiv o p resta-se, m ais p ro p riam ente, à inv estig ação
d e asp ecto s d a realid ad e eco nô m ica p assív eis d e m ensu raçõ es m ais p recisas. O
d ed utiv o , p o r sua v ez, çKad o tad o p ara teo riz ar situ açõ es sujeitas a tal nú m ero d e
influ ências entrelaçad as q u e se to rna d ifícil sep arar elem ento s relev antes p ara
o b serv açõ es, o rd enam ento s e interp retaçõ es d eriv ad as d e lev antam ento s estatís­
tico s. O s p rincíp io s q u e p ro curam exp licar o co m p o rtam ento racio nal d o s indi­
v íd uo s na esco lha d e p ad rõ es d e co nsu m o q u e m axim iz em sua satisfação são ,
g eralm ente, d eriv açõ es d o m é to d o d e d u tiv o . Já as relaçõ es funcio nais d e d e­
p end ência entre, p o r exem p lo , a rend a e o co nsu m o d a so cied ad e co m o um
to d o resultam d a ap licação co nv encio nal d o m é to d o in d u tiv o so b re séries d e
d ad o s sistem aticam ente lev antad o s.
N o final d o sécu lo XIX, q u and o se acend eu o d eb ate so b re a m eto d o lo g ia
m ais ap ro p riad a à inv estig ação eco nô m ica, G ustav Schm o ller e Carl M eng er, d o is
p ensad o res d a cham ad a esco la histó rica alem ã, ao final d e um lo ng o d eb ate
d eno m inad o d e m e th o d e n s tre i t, o u a b a ta l h a d o s m é to d o s , co nclu íram que
“a o b serv ação e a d escrição , a d efinição e a classificação são ativ id ad es p rep ara­

A ABRANGÊNCIA E AS LIMITA ÇÕES DA ECONOMIA 59


tó rias. Mas o que d esejam o s alcançar p o r seu interm éd io é o co nhecim ento da
interd ep end ência d o s fato s eco nô m ico s. Para isso , a ind ução e a d ed u ção se
fazem tão necessárias para o p ensam ento científico , co m o as p ernas d ireita e
esq uerd a p ara a cam inhad a". Na realid ad e, não é a natureza d o s m éto d o s em ­
p reg ad o s que co nfere m aio r p e rti n ê n ci a , p ro p ri e d a d e o u a p l i cab i l id ad e ao s
fund am ento s, às relaçõ es co m p o rtam entais, às d efiniçõ es d e eau sa-e-efeito e à
m o d elag em da eco no m ia. Estes três atributo s d eco rrem d e resultad o s a que o s
eco no m istas co nseg u em cheg ar, p o r d iferentes cam inho s d e sistem atiz açào m e­
to d o ló g ica.
Na Figura 1.7, esq uem atiz am o s o s m éto d o s d e inv estig ação d estacad o s. O
trabalho p rep arató rio , p relim inar, é a o b serv ação sistem ática da realid ad e, quer
p ara o tratam ento ind utiv o d e lev antam ento s quantitativ o s, q u er p ara a fo rm ula­
ção d ed utiv a d e hip ó teses.
Q u and o o b serv ad o s sistem aticam ente, o s fato s g eralm ente m o stram q u e a
realid ad e eco nô m ica se co m p o rta d e fo rm a quase sem p re o rd enad a, p rev isív el e
teo ricam ente p assív el d e m o d elação , ap esar das q uase ind escritív eis teias d e re­
laçõ es q u e se estab elecem entre o s ag entes ec o nô m ico s e o s p rincip ais seto res
em q u e a ativ id ad e eco nô m ica c o m o um to d o p o d e ser d esm em brad a. N ão o b s­
tante sejam p arte integ rante d e um am p lo co nju nto d e relaçõ es so ciais, influen­
ciad as, co m o já d estacam o s, p o r q u estõ es extra-eco nô m icas, o s fato s eco nô m i­
co s se m anifestam co m certa regularid ad e e d e aco rd o co m alg um as p reco nd i-
ç ò es d eterm inad as. Daí p o r que, em eco no m ia, é p o ssív el d efinirem -se relaçõ es
entre v ariáv eis. As relaçõ es causais estab elecid as, p o r cam inho s d ed utiv o s ou
ind utiv o s, ev id enciam que a o b serv ação sistem ática d a realid ad e, em eco no m ia,
é p assív el d o que se p o d e cham ar d e “interp retaçõ es científicas”, d as quais re­
sultam as fo rm as usuais d e d escrição científica da realid ad e eco nô m ica - p rincí­
p io s g erais, teo rias, leis e m o d elo s.
O co nju nto sistem atizad o d essas d escriçõ es é a exp ressão da eco no m ia, en ­
quanto ciência so cial. Vistas em co njunto , são g eneraliz açõ es v alid ad as p ela o b ­
serv ação da realid ad e co ncreta. São aind a su p o siçõ es teó ricas testad as. O u m o ­
d elo s sim p lificad o res, co nstruíd o s a partir d e relaçõ es funcio nais o u d e id entid a­
d es que p ro curam rev elar o s m ecanism o s que g o v ernam a realid ad e.
O esq uem a sintetiz ad o na Figura 1.7 ev id encia, tam bém , q u e há um p erm a­
nente p ro cesso d e retro alim entação na co nstru ção d o co nhecim ento eco nô m i­
co . N o vas realid ad es exig em no v as ab o rd ag ens teó ricas. O s fato s eco nô m ico s,
co m o d e resto o s fato s so ciais co m o um to d o , co m p o rtam d uas d im ensõ es - a
te m p o ra l e a e s p acial . A realid ad e eco nô m ica varia no tem p o e no esp aço ,
sujeita às m utantes co nd içõ es d eriv ad as d e no v as realid ad es culturais, p o líticas,
institucio nais, tecno ló g icas o u am bientais. D aí p o r q u e se exig em reelab o raçò es,
d eriv ad as d as no v as o b serv açõ es so b re a realid ad e m o d ificad a: o s p o stulad o s da
eco no m ia, a d esp eito d e sua elab o ração p o r m éto d o s científico s, não se ap re­
sentam co m o v erd ad es d efinitiv as. Mas esta p articularid ad e não d iferencia, p o r
si só , a eco no m ia das d em ais ciências. M esm o as ciências exatas e exp erim entais
estão sujeitas à p erm anente v alid ação d e seus quad ro s referenciais e d e suas
hip ó teses.
C o nseq ü entem ente, as sim p lificaçõ es e interp retaçõ es da realid ad e, resul­
tantes d o s trabalho s d e teo riz ação e d e m o d elação co nfro ntam -se p erm anente­
m ente co m essa m esm a realid ad e. É fund am ental, no o rd enam ento m eto d o ló g i­
c o d e co nstru ção da eco no m ia, o co nstante intercruzam ento d o s fato s co m as
g eneraliz açõ es teó ricas. C o m o registra H ersko v its:19

60 A COMPREENSÃO DA ECONOMIA
FIG URA 1 .7
xA c o n s t r u ç ã o d a
e co n o m ia: d a
o b s e rv a ç ã o
s i s t e m a ti z a d a d a
re a l i d a d e à
m o d e lação
s i m p l i f i c a d o ra e
i n te rp re ta ti v a .

“ N e n h u m a c i ê n c i a s o c i a l p o d e c u m p r i r s e u s o b j e ti v o s s e n ã o
a te n d e r a o p ri n c í p i o d e q u e o s p ro b l e m a s s ó p o d e m s e r c o m ­
p re e n d i d o s c o m c l a re z a e o s d a d o s s o m e n te p o d e m l e v a r a i n ­
t e r p r e t a ç õ e s v á l i d a s m e d i a n te a c o n tí n u a r e f e rê n c i a c ru z a d a
e n tre as h i p ó te s e s e o s f a to s .”

O p ro cesso d e v alid ação p o d e d ar-se não só p ela co m p ro v ação d ed utiva


d as hip ó teses fo rm ulad as, co m o p elo s resultad o s da ap licação d e elab o raçõ es
teó ricas à realid ad e co ncreta. A fo rm ulação d e p o líticas eco nô m icas g eralm ente
se fund am enta em co nhecim ento s d eco rrentes d e sistem atiz açõ es teó ricas. No
co nfro nto co m a realid ad e, v alid am -se o u rejeitam -se, to tal o u p arcialm ente, o s
co nhecim ento s acum ulad o s.

A ABRANGÊNCIA E AS LIMITAÇÕES DA ECONOMIA 61


F u n d a m e n to s O atributo d a te m p o ra l i d a d e e, d e certa fo rm a, tam bém o d a d i m e n s ã o e s p a ­
c i a l d a realid ad e eco nô m ica transp arecem clararnente em qu alq uer tentativ a d e
T e ó r ic o s e
co nstru ção da á rv o re g e n e a l ó g i ca d a e c o n o m i a - exp ressão cunhad a p o r Sa-
V in c u la ç ã o m uelso n20 p ara d esig nar as interlig açõ es entre as p rincip ais e s c o l a s d o p e n s a ­
id e o ló g ic a : m e n to e c o n ô m i c o . A lém d esses d o is atributo s, transp arecem aind a as v incula-

A s E s c o la s ç ò es d a eco no m ia c o m d iferentes c o rre n te s i d e o l ó g i ca s , d o m inantes o u alter­


nativas, d esenv o lv id as em cad a m o m ento histó rico .
E c o n ô m ic a s
A s esco las d o p ensam ento eco nô m ico co rresp o nd em , assim, não só a c o n ­
junto s sistem atizad o s e interco nsistentes d e p rincíp io s teó rico s, co m o tam bém a
sistem as d e idéias e d e v alo res, co m p ro m etid o s co m q u estõ es éticas, p o líticas e
so ciais. C o nseqüentem ente, não são inteiram ente d isso ciáv eis a d ireção e o s resul­
tad o s da inv estigação científica d e cad a esco la e sua subjacente matriz id eo ló g ica.
A Figura 1.8 é uma alternativ a d e ap resentação d o s g rand es tro nco s da ár­
v o re g enealó g ica da eco no m ia. As interlig açõ es entre as p rincip ais esco las d e­
co rrem d e q u e nenhum a d elas p o d e ser co nsid erad a um a ilha, no sentid o estrito
d a p alav ra. Cad a co rrente está v inculad a, p o r raz õ es id eo ló g icas o u p o r p rincí­
p io s teó rico s, a um a o u m ais co rrentes antecesso ras. C o m o registram O ser e
Blanchfield ,2] “no v as v ertentes teó ricas g eralm ente se b aseiam em id éias p red e-
cesso ras. O utras d eco rrem d e o p o siçõ es às p reced entes, d eriv and o o p ensam en­
to para no v as d ireçõ es. Mas tanto em um co m o em o utro caso , há ev id entes
lig açõ es entre as p rincip ais v ertentes”.
As lig açõ es se d ão p o r d o is canais. O primeiro é o da co n v e rg ê n ci a d o s
f u n d a m e n to s te ó ri co s . O segund o , e m ais im po rtante, é o d a v i n cu l a çã o id e o ­
l ó g ica. Tal é a fo rça d essa v incu lação q u e o estud o d o surg im ento e ev o lu ção
d as id eo lo g ias so b rep õ e-se ao estud o d o surg im ento e ev o lu ção d as p rincip ais
esco las d o p ensam ento eco nô m ico .
O surg im ento e a co nso lid ação d e d eterm inad a id eo lo g ia se d á em três
m o m ento s d istinto s, assim sintetiz ad o s p o r C hauí:22

1. Ela se inicia co m o um co nju nto sistem ático d e id éias q u e o s p ensad o ­


res d e um a classe em ascensão p ro d uzem p ara que essa no v a classe
ap areça co m o rep resentante d o s interesses d e to d a a so cied ad e, legiti­
m and o a luta d a no v a classe p elo p o d er.
2. Pro sseg u e v ia p o p u lariz ação , to rnand o -se um co nju nto d e id éias e
v alo res ac eito s p o r to d o s o s q u e são co ntrário s à estrutura d o m inan­
te existente e co nso lid and o -se à m ed id a quá. é interio riz ad o p ela co ns­
ciência d e to d as as catego rias so ciais não d o m inantes d a so cied ad e.
3. Uma v ez interio rizad a e sed im entad a, a id eo lo g ia p ro p o sta dá susten­
tação a um a no v a estrutura d e d o m inação , m esm o q u e o s interesses
d as categ o rias so ciais d e q u e em erg iu sejam sufo cad o s p elo s interes­
ses p articulares da no v a classe d o m inante.

Fo i assim , so b esta p ersp ectiv a d e interp retação , q u e surgiram e se d esen­


v o lv eram o s grand es tro nco s d a eco no m ia.
O m e rca n ti l i s m o co sturo u o s interesses d o Estad o co lo nialista d o s sécu lo s
XV I e XVII.
A f i s i o cra ci a e a e s c o l a cl á s s i ca trad uziram o s id eais d o liberalism o ind i­
v id ualista d o sécu lo XV III - a crença d e q u e o bem -estar da so cied ad e p o d eria
ser alcançad o p o r instituiçõ es co m o a p ro p ried ad e privada d o s m eio s d e p ro d u-

62 A COMPREENSÃO DA ECONOMIA
FIG URA 1 .8 Prin cip ais co rre n te s d o p e n s am e n to e co n ô m ico : u m a sín tese.

D-

170 0

1750 —

1850 —

1900

1930

198 0

A ABRANGÊNCIA E AS LIMITAÇÕES DA ECONOMIA 63


ção , a liberd ad e d e em p reend er e as fo rças regulad o ras d o s m ercad o s liv res e da
co nco rrência. O s fund am ento s d o fo rtalecim ento d o Estad o m ercantilista ruíram
so b as no v as co nstru çõ es teó ricas e d o utrinárias d as esco las liberais. Mais à fren­
te, fo rtaleceram -se o s id eais d o s o ci a l i s m o , co m o reação às iniq üid ad es atribuí­
v eis à o rd em liberal, no tad am ente o crescente d istanciam ento entre o s em p reen­
d ed o res e a classe trabalhad o ra. A partir d o final d a p rim eira m etad e d o sécu lo
X IX , co m o m a rx i s m o , a estrutura teó rica d o p ensam ento so cialista co nso lid o u -
se. O s fund am ento s d e um a no v a c o n c ep ç ão d e eco no m ia e d e o rd enam ento
d o p ro cesso ec o nô m ic o estav am d efinid o s.
Paralelam ente à co nso lid ação teó rica e à cientificid ad e d o so cialism o , a e s­
co la neo clãssica, aind a no sécu lo XIX, p ro curo u resg atar o s p rincíp io s id eo ló g i­
co s d o m o d elo liberal. O s eco no m istas d eno m inad o s m a rg i n a l i s ta s eram c o n ­
tra as tend ências d eco rrentes d o s p receito s so cialistas. D esenv o lv eram eng enho ­
so s m o d elo s teó rico s d ed utiv o s p ara co m p ro v ar a hip ó tese d e q u e o eq uilíbrio
geral da eco no m ia, fruto d a racio nalid ad e, d o utilitarism o e d o hed o nism o ind i­
v id uais era co m p atív el co m a realiz ação d o m áxim o b enefício so cial - d esd e
q u e não se p raticassem interferências nas leis naturais da eco no m ia, c o m o as
p ro p o stas p elo s so cialistas.
O s d esd o bram ento s d essas d uas g rand es co rrentes d o p ensam ento ec o n ô ­
m ico , liberalism o clássico e so cialism o m arxista, estend eram -se p elo sécu lo XX.
O m o n e ta ri s m o e a e c o n o m i a d o b e m - e s ta r são esco las mais recentes
atrelad as à id eo lo g ia neo clássica.
O i n s ti tu ci o n a l i s n i o reto m o u a d iscu ssão d a harm o nia natural da vida e c o ­
nô m ica, m o strand o q u e cho q u es d e interesses p o d eriam tam bém d esag uar em
d esajustam ento s. E p ro curaram a ev id enciação indutiva d e suas hip ó teses, fun­
d am entad a em estud o s estatístico s so b re o funcio nam ento real d o sistem a e c o ­
nô m ico . Rejeitaram , assim , a teo riz açào d ed utiv a e as ab straçõ es d o m arg inalis-
m o hed o nista.
O k e y n e s i a n i s m o busco u a co nciliação : criar c o nd içõ es p ara co nd u ção da
eco no m ia da fo rm a mais eficiente p o ssív el, sem o fend er suas b ases institucio ­
nais. D e um só g o lp e, refuto u tanto a interv enção rev o lu cio nária d o so cialism o
d e Estad o e o liberalism o p leno d e d eriv ação clássica: a co nciliação d a eficiência
eco nô m ica, da justiça so cial e d a lib erd ad e p o lítica fo i seu o b jetiv o m aio r.
Po r fim, o s mais recentes d esenv o lv im ento s, o n e o l i b e ra l i s m o e a e c o n o ­
m i a p o l ítica d a n o v a e s q u e rd a buscam m ais ad equar ao s no v o s tem p o s as co n­
tribuiçõ es d e seus p red ecesso res, ev o luind o p ara uma no v a o rd em m eno s rad ical,
d o q u e p ro p o r no v as rupturas co nceituais e institucio nais. N ão o bstante ainda
estejam em cam p o s o p o sto s q u anto à estratég ia d e co nd u ção d e eco no m ias na­
cio nais, as d istâncias entre estas d uas c o rrentes.são m eno res q u e as o bserv ad as
entre o s d o is grand es tro nco s id eo ló g ico s que m arcaram o s últimos 225 ano s. A
exacerb ação da co nfro ntação id eo ló g ica extrem ad a lev o u à d iv isão d o m und o em
d uas p o rçõ es rad icalm ente o p o stas, d urante b o a p arte da segund a m etad e d o sé­
culo XX - o s 40 ano s da Guerra Fria, d e 1945 a 1985. Co m o fim das rad icaliza­
çõ es e co m a flexão histó rica d as d uas o rto d o xias (a liberal e a socialista m arxista)
a tend ência d o m inante é a co nv erg ência para o centro d esrad icalizad o .
O s d esenv o lv im ento s m ais recentes p arecem , assim , caracteriz ar-se mais p o r
tend ências centríp etas (d eslo cam ento s d as extrem id ad es id eo ló g icas p ara o c e n ­
tro ) d o que p o r tend ências centrífug as (d eslo cam ento s p ara as extrem id ad es),
que m arcaram no s sécu lo s p reced entes o surg im ento e a afirm ação d as d iferen­
tes co rrentes d o p ensam ento eco nô m ico . A té que p o nto esses no v o s d esenv o lv i­
m ento s ap o ntam na d ireção d o f im d as i d e o l o g i a s p arece ser, d aqui para a
frente, uma d as m ais intrigantes q u estõ es d a eco no m ia.

64 A COMPREENSÃO D A ECO NO M IA
1 .5 C o m p artim en taliz ação U su al d a
Eco n o m ia

P r o p o s iç õ e s O s co nceito s d e senso co m um , ciência e id eo lo g ia, as m eto d o lo g ias b ásicas d e


co nstru ção da eco no m ia e as v ineu laçõ es entre fund am ento s teó rico s e p ressu­
P o sitiv as e
p o sto s id eo ló g ico s são , em co nju nto , essenciais p ara a co m p reensão d o s c o n­
N o rm ativ as: teúd o s e d o s sig nificad o s d o s p rincip ais co m p artim ento s d a eco no m ia.
D if e r e n c ia ç ã o A p rim eira e m ais im p o rtante d iferenciação é entre as exp ressõ es e c o n o ­
Fu n d a m e n ta l m i a p o s i ti v a e e c o n o m i a n o rm a ti v a . F.sta d iferenciação é atribuíd a a Jo h n
N ev ille Key nes, filó so fo e reno m ad o eco no m ista p o lítico d o final d o sécu lo XIX,
p ai d e Jo h n M aynard Key nes, um d o s m ais influentes eco no m istas d a p rim eira
m etad e d o sécu lo XX. Suas no çõ es d e p o s i ti v o e n o rm a ti v o certam ente resul­
taram d o rigo r d e seu p ensam ento ló g ico fo rm al.
Em bo ra à p rim eira vista p o u co relev ante, essa d iferenciação fund am ental é
m uito im p o rtante p ara a co nstru ção científica. Para Lip sey ,25 auto r d e um texto
d e referência, d e Introdução ã economia positiva, “ a cap acid ad e d e sep arar o s
juíz o s no rm ativ o s d o s p o sitiv o s d ev e ser vista co m o um a d as p rincip ais razõ es
d o p ro g resso da eco no m ia e tam bém d e o utro s ram o s d o co nhecim ento hum a­
no .
A eco no m ia positiVa trata a realidade como ela é. A eco no m ia no rm ativ a
co nsid era m ud anças nessa m esm a realid ad e, p ro p o nd o co m o ela deve ser. Essa
d iferenciação será m elho r co m p reend id a atrav és d e alg uns exem p lo s. Fo i esse o
recurso utilizad o p o r Lip sey p ara b em fixar a d iferença entre as d uas no çõ es. "A
afirm ação d e q u e a cisão do átomo é impossível, é um a p ro p o sição p o sitiv a, que
p o d e ser co nfirm ad a o u refutad a (c o m o d e fato fo i) p ela ciência. Já a afirm ação
os cientistas não devem proceder à cisão do átomo é uma p ro p o sição no rmativ a,
q u e im p lica juízo s ético s d ep end entes da p o sição filo só fica o u p o lítica d e quem
a fo rm ulo u e q u e, p o r isso m esm o , não p o d e ser d efinitiv am ente refutada ou
co nfirm ad a, uma v ez que d ep end e d e juízo s d e valo r, p esso ais e subjetiv o s. A
p ergunta quais são as medidas que reduzem o desemprego e quais as que evitam
a inflação é d e natureza p o sitiv a. É no rm ativ a a p ro p o sição devemos dar mais
importância ao desemprego do que à injlação. A p ergunta p o d e ser resp o nd id a,
o bjetiv am ente, p o r esq uem as co nceitu ais d a eco no m ia. Uma sim p les listagem ,
não hierarquizad a, d as d iferentes m ed id as p o ssív eis, d ificilm ente será o b jeto d e
co ntro v érsias. Já a p ro p o sição é no rm ativ a e p assív el d e co ntro v érsia: afinal, a
p ro p o sição o p o sta é tam bém ad m issív el. Uma o u o utra estarão na d ep end ência
d e juíz o s d e v alo r so b re q u estõ es d ireta e ind ireta m ente env o lv id as na p ro p o si­
ção o rig inal.”24 j
A e c o n o m i a d e s cri ti v a e a te o ri a e c o n ô m i c a situam -se, p rep o nd erante­
m ente, no cam p o da eco no m ia p o sitiv a. A p o l í ti ca e c o n ô m i c a é, p rep o nd e­
rantem ente, no rm ativ a. A Figura 1.9, co nstruíd a a p artir d e esq uem a p ro p osso
p o r Bro nfenb renner,2Sajud a a esclarecer essa d istinção . Não o bstante o s d iferen­
tes tro nco s da teo ria eco nô m ica estejam im p reg nad o s p elas id eo lo g ias subjaceifc-
tes a sua ap arição e d esenv o lv im ento , eles buscam estab elecer v erd ad es ciemifât-
cam ente co m p ro v áv eis p elas m eto d o lo g ias co nv encio nais d a d ed u ção e d a in ­
d ução . Já as p ro p o siçõ es d e p o lítica eco nô m ica são , q u anto a sua p ró p ria signi­
ficação , no rm ativ as. N ecessariam ente, env o lv em esco lhas fund am entad as em gui­
zo s d e v alo r.

A AB RAN G Ê N C IA E AS U M ITAÇ Ò E S D A E CO NO M IA
FIG URA 1.9
Eco n o m ia p o sitiv a
e e co n o m ia
n o rm ativ a: u m
esq u em a au xiliar
p ara co m p re e n s ão
co n ceitu ai.

Essa d istinção sim p les entre p ro p o siçõ es no rm ativ as e p o sitiv as co nd uz a


uma q u estão m eto d o ló g ica relev ante: a im p o ssibilid ad e ló g ica d e se d ed uzirem
afirm açõ es p o sitiv as d e juíz o s no rm ativ o s e v ice-v ersa. O utro exem p lo sim p les
ajud a a co m p reend er esta q u estão d e m éto d o . Sup o nha-se q u e alg uém afirme
que: 1. quand o as taxas d e crescim ento da p o p u lação são sup erio res às da e x ­
p ansão da rend a nacio nal co m o um to d o , a rend a per capita se red uz; 2. a red u­
ção da rend a per capita im p lica p erd a d o p o d er aquisitiv o real da so cied ad e,
m antid o s o s nív eis v ig entes d e p reço s; e 3. lo g o , co m o é d esejáv el a m anuten­
ção e, m esm o , a am p liação d o p o d er aquisitiv o real, d ev em ser ad o tad as p o líti-

66 A COMPREENSÃO D A ECONOMIA
FIG URA 1.10 C o m p artim en to s usuais da eco n o m ia: co n e xõ e s en tre p rin cip ais seg m en to s

cas d e c o n ten ç ão d o crescim ento p o p u lacio nal. As afirm açõ es (1) e (2) são
factuais, p o sitiv as; a p ro p o sição (3) é d e caráter no rm ativ o . N ão há, entre elas.
relaçõ es ló g icas e fo rm ais. As d uas p rim eiras não são c o nd içõ es suficientes para
d ar sustentação á terceira. E esta p o d e ser até m elho r justificad a p o r o utras ra­
z õ es, d iferentes d as d uas p rim eiras co nsid erad as.

A ABRANGÊNCIA F. AS LIMITAÇÕES DA ECONOMIA 6T


Esta ressalva m eto d o ló g ica não implica a inexistência d e c o nexõ es entre o s
co m p artim ento s p o sitiv o e no rm ativ o , em eco no m ia. Basta exam inar as c o nexõ es
ind icad as na Figura 1.9 para se o bserv ar que a p o lítica eco nô m ica, não o bstante
seja fo rmulada a partir d e esco lhas q u e env o lv em juízo s d e valo r, tem o resp ald o
da m o d eiação teó rica d esenv o lv id a p elo s d iferentes tro nco s da eco no m ia po sitiva.
Na realid ad e, a p o lítica eco nô m ica, d esd e que tecnicam ente resp ald ad a, busca
sustentação na teo ria eco nô m ica. E é exatam ente esta sustentação q u e lhe c o n fe­
re m aio r grau d e co nfiabilid ad e, red uzind o o s graus d e risco e d e incerteza so bre
o s efeito s esp erad o s, d eco rrentes d e curso s d e ação p o sto s em prática.
Visto s so b este âng ulo , o s d iferentes co m p artim ento s em q u e usualm ente
se subd iv id e a eco no m ia p o sitiv a alim entam o p ro cesso p o lítico d e esco lha da
eco no m ia no rm ativ a. A Figura 1.10 fo i co nstruíd a p ara ev id enciar co m m ais d e­
talhes as c o n ex õ es existentes entre o s d o is cam p o s. O d esd o b ram ento d o s d ife­
rentes seg m ento s da eco no m ia p o sitiv a fund am enta-se na d iv isão usual entre
m i c ro e c o n o m i a e m a c ro e c o n o m i a .

A M ic r o e c o n o m ia : A m icro eco no m ia está v o ltad a, fund am entalm ente, para:

A A b o rd a g e m
□ As unid ad es ind iv id ualizáv eis da eco no m ia, co m o o co nsu m id o r e a
M ic r o s c ó p ic a em p resa, co nsid erad as iso lad am ente o u em ag ru p am ento s ho m o g ê­
neo s.
□ O co m p o rtam ento d o co nsum id o r: a busca da satisfação m áxim a (d ad a
sua restrição o rçam entária) e o utras m o tiv açõ es.
□ O co m p o rtam ento da em p resa: a busca d o lucro m áxim o (d ad as as
estruturas d e custo s e a atu ação d a co nco rrência) e o utras m o tiv açõ es.
□ A estrutura e o s m ecanism o s d e funcio nam ento d o s m ercad o s. As c o n ­
fo rm açõ es b ásicas da o ferta e d a p ro cura, m icro sco p icam ente co nsi­
d erad as.
□ As fu nçõ es e as im p erfeiçõ es d o s m ercad o s, na alo cação eficaz d o s
escasso s recurso s d a so cied ad e e na g eração d o s p ro d uto s d estinad o s
a satisfazer às necessid ad es tid as co m o ilim itáveis.
□ As rem u neraçõ es p agas ao s ag entes q u e p articip am d o p ro cesso p ro ­
d utiv o e a co nseq ü ente rep artição funcio nal d a rend a so cial.
□ O s p reço s receb id o s p elas unid ad es q u e g eram cady/ um d o s b ens e
serv iço s q u e co m p õ em o p ro d uto so cial. /
□ A interface entre custo s e b enefício s p riv ad o s e o interesse m aio r d o
b em -co m u m .

A abo rd ag em m ícro eco nô m ica rem o nta ao s p rim eiro s auto res clássico s, co m o
Smith, Ricard o , Say e Stuart-Mill. Partindo da análise d o co m p o rtam ento racio na-
lista d o “ho m em eco nô m ico ”, tanto p ro d uto res quanto co nsum id o res, eles inv esti­
garam o s m ecanism o s de funcio nam ento e d e equilíbrio da eco no m ia. Fruto da
filo so fia libera 1-individualista q u e p rev aleceu na p rim eira m etad e d o século XVIII,
a eco no m ia clássica ap ro fund o u o s o b jetiv o s m axim iz antes d o s ag entes indivi­
d uais e o s p o tenciais d eco rrentes d e p ro m o ção da riqueza nacio nal. O s margina-
listas retom aram, no sécu lo XIX, essa m esm a abo rd agem , exp lo rand o -a, p o rém , a
partir d e o utras v ertentes teó ricas. Jev o ns, M eng er e Bõ hm -Baw erk co lo caram o
indivíd uo no centro d a reflexão eco nô m ica. Suas m o tiv açõ es subjetiv as fo ram teo -

68 A COMPREENSÃO DA ECONOMIA
rizadas. E das d ecisõ es individuais, sustentad as p o r p o sturas utilitaristas e hed o nis­
tas, d eco rreriam m ecanism o s d e interação cap azes d e justap o r o s interesses priva­
d o s ao s so ciais. A m eto d o lo gia fund am ental d essa abo rd agem é dedutiva. O nível
d e abstração env o lv id o é necessariam ente alto , ao inv estigar catego rias d o tip o
u til id ad e , v al o r, s a ti s f ação , i n d i f e re n ça e b e m - e s tar.

Pelo s d esenv o lv im ento s q u e lhe d eram o rig em , a m icro eco no m ia é tam ­


b ém cham ad a d e te o ri a d o s p re ç o s . N o m o d elo liberal-ind iv id ualista, fo rte­
m ente v inculad o à trad ição m icro eco nô m ica, é p elo livre m ecanism o d o sistema
d e p reço s q u e as açõ es ind iv id ualiz ad as d o s p ro d uto res e d o s co nsu m id o res
p o d em ser articulad as e co o rd enad as. A o estud ar a fo rm ação d o s p reço s, a m i­
cro eco no m ia env ered a p ara o estud o da o ferta, p ela qual são resp o nsáv eis o s
p ro d uto res, e d a p ro cura, que d ep end e d o co m p o rtam ento , m o tiv açõ es e rea­
ç õ es d o s co nsum id o res. Trata, aind a, d o estud o d o s m ercad o s, em suas várias
fo rm as e estruturas, exam inand o as c o nd içõ es g erais d e eq uilíbrio d as em p resas
em cad a um a d as situ açõ es co nco rrenciais p o ssív eis. E inv estiga, na esteira da
análise d o p ro cesso p ro d utiv o , o s m ercad o s d o s recurso s d e p ro d ução e as re­
m u neraçõ es co rresp o nd entes (p o r exem p lo , o s salário s p ag o s no m ercad o d e
trabalho e o s lucro s atribuíd o s à cap acid ad e em p resarial), p ara afinal cheg ar à
teo ria d a rep artição d a rend a.
A d esp eito d e sua abo rd ag em m icro scó p ica, a m icro eco no m ia interesso u-se
tam bém p elo eq uilíb rio geral d o sistem a eco nô m ico , a partir d a interd ep end ên­
cia entre as ativ id ad es d o s p ro d uto res, p ro p rietário s d e recurso s e co nsu m id o ­
res. O p ressup o sto teó rico é o eq uilíbrio geral, so b a situação d o ó ti m o e c o n ô ­
m i co . Pelo s m ecanism o s d a livre tensão q u e se m anifesta em cad a m ercad o , via
p reço s, o rientam -se as açõ es co nv erg entes d e cad a um d o s ag entes d o p ro cesso
ec o nô m ic o . O s p ro d uto res m axim izam seus lucro s; o s co nsu m id o res, sua satisfa­
ção ; o s recurso s escasso s são ap licad o s d a fo rm a m ais eficaz p o ssív el, m axim i­
zand o tanto o c o nceito d e reto rno s p riv ad o s, q u anto o d e reto rno so cial co m o
um to d o . O funcio nam ento d esse sistem a co rresp o nd e ao d e um jo g o não c o o ­
p erativ o , tensio nad o , no sentid o d e que cad a unid ad e individual cuid a d e seus
p ró p rio s interesses, sem co aliz õ es co m as d em ais. A m axim iz ação teó rica é tal,
so b este c o nceito d e alo cação ó tim a e eficiente, q u e nenhum d o s p articip antes
d o sistem a p o d e, em d ad o m o m ento , m elho rar sua p ró p ria p o sição sem sacrifi­
car o s níveis d e satisfação , tam bém m áxim o s, d e o utro o u de outros participantes.
Para ab rang er to d a a d im ensão d este univ erso teó rico , a m icro eco no m ia
d esd o b ra-se no s quatro co nju nto s d estacad o s na Figura 1.10: o co nsum id o r e a
análise da p ro cura, a em p resa e a análise d a o ferta, a estrutura co nco rrencial e o
eq uilíbrio d e m ercad o s, a rem uneração d e fato res d e p ro d ução e a rep artição da
rend a. Interarticulad as, essas quatro ram ificaçõ es teó ricas co m p reend em um am ­
p lo esp ectro de funçõ es essenciais exercid as no interio r d o s sistem as eco nô m ico s.

A M a crc i c c o n o m k i : A m acro eco no m ia está v o ltad a, fund am entalm ente, para:

A A b o rd a g e m
□ O co m p o rtam ento da ec o no m ia em seu co nju nto , ag reg ativ am ente
M a c r o s c ó p ic a co nsid erad o . A unid ad e d e referência é o to d o , não suas p artes indivi­
d ualiz ad am ente co nsid erad as.
□ O d esem p enho to talizad o d a eco no m ia. As causas e o s m ecanism o s
co rretiv o s d as grand es flu tuaçõ es co njunturais. O s alto s e b aixo s da
eco no m ia co m o um to d o .

A ABRANGÊNCIA E AS LIMITA ÇÕES DA ECONOMIA 69


□ O s ag reg ad o s eco nô m ico s, resultantes d e m ensuraçõ es g lo bais, d e que
são exem p lo s o Pro d uto Interno Bru to e a Rend a N acio nal - o u seja.
resp ectiv am ente, a so m a d e to d o s o s bens e serv iço s finais p ro d uzid o s
d entro d as fro nteiras eco nô m icas d e d eterm inad o p aís e a rend a ap ro ­
priad a p elo co nju nto d e to d as as unid ad es p aiticip antes d o p ro cesso
ec o nô m ic o .
□ As relaçõ es entre m acro v ariáv eis. Po r exem p lo , as c o n ex õ es entre o
nív el d o s inv estim ento s e o nív el d o em p reg o d e to d o s o s recurso s.
□ M ed id as d e tend ência central, c o m o as taxas d e juro s e d e câm bio ,
b em co m o suas influências so bre o d esem p enho d a eco no m ia co m o
um to d o .
□ V ariáv eis-fluxo e v ariáv eis-esto q ue calculad as p ara a eco no m ia agre-
gativ am ente co nsid erad a. Fluxo s ag reg ad o s, p o r exem p lo , co m o a ren­
d a, o co nsu m o , a p o u p ança e a acum ulação . Esto q u es ag reg ad o s, p o r
exem p lo , co m o o s m eio s d e p ag am ento e as reserv as d e d iv isas inter­
nacio nais.
□ A s tro cas internacio nais d e b ens e serv iço s, v istas co m o um to d o . O s
fluxo s to taliz ad o s d o s m o v im ento s internacio nais d e cap itais. O reg is­
tro e a co ntabiliz ação d esses m o v im ento s, p o ssib ilitand o lev antam en­
to s co m o o Balanço Internacio nal d e Pag am ento s.
□ As finanças p úblicas. O s tributo s arrecad ad o s p o r to d as as esferas de
g o v erno . O s d isp ênd io s p úblico s, co rrentes e d e inv estim ento s. As e x e ­
cu çõ es o rçam entárias. O eq uilíbrio d as co ntas p úblicas.
□ A s grand es d isfunçõ es d a eco no m ia. Q u estõ es g lo bais, ag reg ad as, d e
m assa, co m o a inflação e o d esem p reg o .
□ O crescim ento e o d esenv o lv im ento das eco no m ias nacio nais. A d e­
term inação d e seus p rincip ais fato res co nd icio nantes.
□ O s ind icad o res b ásico s p ara co m p araçõ es internacio nais d o d esem p e­
nho to taliz ad o d as eco no m ias nacio nais, c o m o o s nív eis d e p ro d uto e
d e rend a per capita, o s p ad rõ es d e p ro d utiv id ad e e o s d e co m p etitiv i­
d ad e.

Co m o a abo rd ag em m icro eco nô m ica, tam bém a m acro eco nô m ica rem o nta
ao s p rim eiro s auto res clássico s, em b o ra seu m aio r d esenv o lv im ento se tenha
d ad o no sécu lo XX, p articularm ente a partir d o s ano s 30. O s eco no m istas clássi­
co s se o cup aram tam bém d e q u estõ es relacio nad as ao d esem p enho da ec o n o ­
m ia co m o um to d o , trabalhand o so b re hip ó teses q u e co nd uziríam ao equilíbrio
geral. E, m esm o antes d eles, o s m ercantilistas tinham p reo cu p açõ es m arcad a-
m ente m acro eco nô m icas. Sua unid ad e d e análise era o Estad o e as q u estõ es
co m q u e trataram fo ram, p o r exem p lo , o s efeito s d as tro cas internacio nais, o
p ro cesso d e acum u lação d o Estad o m ercantil e o s sistem as m o netário s.
Co m o ad v ento da era clássica, o d eslo cam ento da unid ad e d e análise para
o “ho m em ec o n ô m ic o ” não sig nifico u que as q u estõ es de o rd em g lo bal tenham
sid o d esco nsid erad as. As crises e o s ciclo s eco nô m ico s d ep ressiv o s fo ram o b jeto
d e p reo cu p ação , nâo o b stante o s eco no m istas clássico s acred itassem q u e a o r­
d em natural e o livre funcio nam ento d o s m ercad o s, so b a tensão d o s co m p o rta­
m ento s individ uais m axim izantes, eram co nd içõ es suficientes p ara garantir o eq u i­
líbrio geral da eco no m ia. A o co nserv ar a d eno m inação ad jetiv ad a, e c o n o m i a
p o l í ti ca , q u e v eio d o p erío d o m ercantilista, a eco no m ia clássica não m erg ulho u
ap enas em q u estõ es d e âm bito m icro eco nô m ico . São tem as clássico s a d i v e rs i ­
d ad e d o p ro g re s s o e a riq u e z a d as n a çõ e s , as v a ri a çõ e s d o v a l o r d a m o c

70 A COMPREENSÃO DA ECONOMIA
d a, o s p ap é i s d o g o v e rn o , a d i s tri b u i çã o d a re n d a ag re g ativ ain e n te c o a m
d e ra d a e, mais im p o rtante, um a p ri m e i ra te n tati v a d e c o m p re e n d e r c o m o
s e d av a o e q u i l íb ri o d o s i s te m a e c o n ô m i c o . C laram ente, sua ab o rd ag em m i­
cro scó p ica e seu m éto d o d ed utiv o não sig nificaram d escaso p ara co m as q u es­
tõ es d e grand e escala.

No sécu lo XIX, p articularm ente a partir d e 1867, co m a p u b licação d o p ri­


m eiro v o lum e d o Das kapital, d e Karl M arx, esses g rand es tem as clássico s fo ram
reto m ad o s p elo s so cialistas, em bo ra so b o utro p arad igm a id eo ló g ico . A e c o n o ­
mia m arxista ap ro fund o u tem as co m o a c i rc u l a ç ã o , a re p ro d u ç ã o c a a c u m u ­
l a çã o d o c a p i ta l s o ci a l , a p ro d u çã o g l o b al d a s o ci e d a d e e su a re p a rti ç ã o ,
as te n d ê n ci a s d e l o n g o p ra z o d o s i s te m a ca p i ta l i s ta l ib e ral e o d e te rm i n i s ­
m o h i s tó ri c o d as c ri s e s d e g ra n d e s p ro p o rç õ e s q u e o atingiriam .

Mas o d esenv o lv im ento m aio r d a teo ria m acro eco nô m ica d eu-se m esm o no
sécu lo XX, co m a eco no m ia key nesiana.

A g rand e d ep ressão d o s ano s 30, q u e p ro v o co u um a d as mais intrigantes


o nd as d e d esem p reg o d e to d a a histó ria eco nô m ica, p ro p ag ad a em cad eia d e
um p aís p ara o utro , d eslo co u o interesse da inv estig ação m icro eco nô m ica para
q u estõ es d e o rd em m acro eco nô m ica. O s p ressup o sto s da trad ição clássica e tam ­
b ém o s d o so cialism o fo ram rev isto s. Entre o utras, uma g rand e q u estão q u e
exig ia resp o sta era o que d eterm ina o nív el geral d o em p reg o . O u então , o que
faz flutuar o s nív eis da p ro d ução e d o em p reg o g lo bais.

Na busca d as resp o stas, a ab o rd ag em m acro scó p ica d e J. M. Key nes foi


sintetizad a numa d as m ais im p o rtantes e p o lêm icas o b ras d o p ensam ento e c o ­
nô m ico , General theory of employment, interest and money, p ublicad a em 1936.
Seus tem as centrais fo ram a d efinição d e no v as unid ad es d e análise, co m o a
rend a, o co nsum o , a p o up ança e o inv estim ento ag re g a t iv a m ci U e c o n s i d e ra ­
d o s ; o s e l e m e n to s d e te rm i n a n te s d o s n ív e is d a p ro d u çã o e d o e m p re g o g l o ­
b ais ; o s m o v i m e n to s cí cl i co s d a e c o n o m i a c o m o u m to d o ; e a d efinição d e
no v o s p arâm etro s e d e no v as m o tiv açõ es p ara a a ç ã o e c o n ô m i c a d o E s tad o .

Para abrang er as d im ensõ es d este univ erso teó rico , a m acro eco no m ia d es­
d o b ra-se no s d o is g rand es co nju nto s d estacad o s na Figura 1.10: o sistem a d e
co ntabilid ad e so cial e a análise d e m acro v ariáv eis. As finanças p úblicas, a e c o ­
no m ia m o netária, a eco no m ia internacio nal e as teo rias d o crescim ento e d o
d esenv o lv im ento fazem p arte d este uniy èrso . O s sistem as d e co ntas nacio nais e
o utro s lev antam ento s ag regativ o s sistem atiz ad o s sup rem o s d ad o s exig id o s para
a co m p reensão e a m o d elação da realid ad e m acro eco nô m ica. D eco rrentem ente,
a m eto d o lo g ia d o m inante d a inv estig ação m acro eco nô m ica é indutiva.

D ev e ter ficad o ev id ente q u e as p alav ras e exp ressõ es-chav e q u e m ais em ­


p reg am o s p ara elu cid ar o co nceito e o cam p o d e interesse d a m acro eco no m ia
foram a g re g a d o , c o n j u n to , to ta l i z a d o , c o m o u m to d o , n ív e is g e ra i s e p a ­
d rõ e s g l o b ai s . Efetiv am ente, enq u anto a m icro eco no m ia cuid a d e asp ecto s da
realid ad e eco nô m ica em escala red uzid a, a m acro eco no m ia trata d e q u estõ es d e
g ra n d e e s ca l a .

O Q uad ro 1.7 resum e as q u estõ es cruciais d e q u e tratam esses d o is grand es


univ erso s d e análise, enfatiz and o p o rém q u e eles não se exclu em m utuam ente.
Faz em p arte d e um m esm o cam p o d o co nhecim ento e tratam d e q u estõ es que,
em essência, rem etem a co nteú d o s co nv erg entes.

A ABRANGÊNCIA E AS LIMITAÇÕES DA ECONOMIA 71


Q UA D RO 1 .7
M acro eco n o m ia e m icro e co n o m ia: a co n v e rg ê n cia d e seu s co n teú d o s.

Co nsid erem o s as três seguintes d efiniçõ es sintetiza­ sível d e custo s d e m ão -d e-o bra, m atérias-primas, bens
d as d e m acro eco no m ia: d e cap ital, e o utros insumo s co m vistas à o btenção de
d eterminad o p ro duto . Preo cup a-se. também, co m a for­
□ "A exp ressão m acro eco no m ia ap lica-se ao es­ ma pela qual o consum id o r d etermina a d istribuição de
tudo d as relaçõ es entre o s grand es ag reg ad o s seus gasto s entre o s muitos p ro duto s e serv iço s q ue es­
eco nô m ico s" (R. G. D. A llen, M acroeconomic tão a sua d isp o sição , de tal m o d o que p o ssa maximizar
theory). o benefício auferid o. A m icro eco no m ia toma co m o d a­
□ “A teoria m acro eco nô m ica é a teoria da renda, d o s o pro duto, o em p reg o e o d isp ênd io glo bais, co m
d o em p reg o , d os níveis gerais de p reço s e da to d o s o s bens e serv iço s, seguind o no exam e d e co m o
m o ed a” (J. M. Culbertson, M ucroeconomic tbe­ o s recurso s são alo cad o s entre as várias em p resas indivi­
ory and stabilizatiori). duais e da fo m ia p ela qual o s p reço s d o s vários p ro d u­
o "A m acro eco no m ia é a parte da eco no m ia que tos d essas em p resas são estabelecid o s. A m icro eco no m ia
estuda as méd ias glo bais e o s agregad os d o sis- indaga d e q u e forma o s gasto s d o s co nsum id o res se d es­
ma” (K. E. Boulding, Economic cinalysis). lo cam d o p ro d uto d e uma em p resa para o d e uma co n ­
co rrente, e d e que m o d o tál m udança fará co m que o
To d as elas d estacam a idéia de que a m acro eco no ­ em p reg o e o pro duto sejam realo caclo s entre seto res de
mia trata d o funcio nam ento da eco no m ia c o m o u m p ro d ução e em presas.
to d o , inclusive co m o são d eterminad o s o p ro d uto e o
Ind icad o res g lo b ais q u e a m icro eco no m ia to m a
em p rego total d e recurso s da eco no m ia e o que faz co m
com o d ad o s, a m acro eco no m ia toma co m o v ariáv eis,
que seus níveis flutuem. A m ac ro e c o n o m ia tenta ex ­
cu jas relaçõ es e m agnitud es d ev em ser estabelecid as.
plicar p o r que, às v ezes, ap enas 3% da fo rça d e trabalho
O p o stam ente, o que a m acro eco no m ia to ma co m o d a­
está d esem p regad a e, em o utras o casiõ es, esta taxa atin­
d o s (a estrutura d os gasto s d o s co nsum id o res entre o s
ge 7% o u mais, da mesm a forma co rno tenta exp licar
prod uto s d e d iferentes seto res da eco no m ia), a m icro e­
p o r que, em certas o p o rtunid ad es, há uma p lena utiliza­
co no m ia toma co m o v ariáv eis d e seus d esenv o lv im en­
ção da cap acid ad e produtiva da eco no m ia, quand o m en­
to s teó rico s.
surada em função d e seus trabalhad o res, fábricas, eq ui­
p am ento s e co nhecim ento s tecno ló g ico s, e p o r que em Embo ra estas d istinçõ es ajud em a esclarecer d iferen­
o utras situaçõ es bo a parte dessa cap acid ad e se enco ntra ças essenciais entre a m acro e a m icro eco no m ia, ev id en­
o cio sa. Pro cura, do m esm o m o d o , exp licar p o r que o ciand o a d iversidade de seus fo co s, na prática a eco no ­
total d e bens e serv iço s p ro d uzid o s cresce a uma taxa mia não é co nd uzid a a partir de d o is co m p artim ento s
média d e 4% ao ano em uma d écad a e a uma taxa m é­ sep arad o s e estanques. Eles são interco m p lem entares. Ao
dia d e 2% em outra, e, d o m esm o m o do , p o r que em se analisarem variáveis m acro eco nô m icas e suas relaçõ es,
d eterm inad o s p erío d o s de tem p o o s nív eis d o s p reço s d ev e-se, d o m esm o m od o, levar em co nta alteraçõ es em
se elev am acentuad am ente, ao p asso que em o utros p e­ v ariáv eis m icro eco nô m icas, p o is estas p o d em exercer
río d os o s p reço s p erm anecem estáv eis o u cheg am até im p acto s so bre as m acro eco nô m icas. À medida que se
a baixar. analisa o p ro cesso eco nô m ico que d etermina o bem -es­
tar material d e uma nação , d ev em -sc co nsid erar tanto o s
Em resum o , a m acro eco no m ia tenta resp o nd er a
asp ecto s m acro eco nô m ico s co m o o s m icro eco nô m ico s.
questõ es realm ente “relev antes” da vida eco nô m ica: p le­
Do p o nto de vista hjacro eco nô m ico , o bem-estar material
no em p reg o o u d esem p rego , p ro d ução a plena cap aci­
d e uma nação será 'tanto m aio r quanto mais p ró xima a
d ad e ou o cio sid ad e, taxa satisfatória ou insatisfatória d e
eco no m ia estiver d o p le n o e m p re g o de seus recurso s.
d esenv o lv im ento , inflação o u estabilid ad e d o s nív eis d e
Do p o nto d e vista m icro eco nô m ico , o bem-estar material
p reço s.
será tanto mais elev ad o quanto mais a eco no m ia se ap ro ­
Po r o utro lado, a m ic ro e c o n o m ia não se o cup a da ximar d a alo c aç ão ó tim a d e seus recurso s. É ev id ente
p ro d ução gsáral, do em p rego total o u d o s d lsp ênd io s g lo ­ que as m etas básicas m acro eco nô m icas e m icro eco nô ­
bais co m io d o s o s b ens e serv iços co m binad o s, mas da m icas são co mp atíveis: o m áxim o d e bem -estar para a
p ro d ução de d eterminad o s bens e serv iço s d e em p resas p o p u lação co m o um to d o , cuja realiz ação é o o bjetiv o
individuais e d o d lsp ênd io esp ecífico co m d eterm inad os prim o rdial da p o lítica eco nô m ica so m ente p o d e ser co n­
p ro duto s feito p o r co nsum id o res em mercad o s delimita­ seguid o co m a co njunção da p le n a u tiliz aç ão co m a
dos. A unid ad e d e estud o é a p arte, e não o to d o . Por alo c aç ão ó tim a. São , assim, co nv erg entes o s fo co s e o s
exem p lo : a m icro eco no m ia visa exp licar co m o a em p re­ co nteúd o s da macro e da m icro eco no m ia.
sa individual d ecid e qual será o p reço d e vend a d e um
pro duto em particular, que m o ntante de p ro d ução m axi­ Fo n te : SHAP1RO, Ed w ard. M acroeconomic analysis,
mizará seus lucros e qual a co m binação mais baixa p o s­ 5. ed . New Yo rk : HJB, The Dryd en Press, 1991.

72 A COMPREENSÃO DA ECONOMIA

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