Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
BÁSICA
PARA
ESTUDANTES
Thelma L Skare
ANO 2019
Faculdade
Evangélica
Mackenzie do PR
SUMÁRIO
1 Noções básicas de imunologia 1
2 Noções básicas de anatomia e fisiologia articular 36
3 Abordagem do paciente com queixas reumatologicas 45
Atlas de exame físico em reumatologia 56
4 Antiinflamatórios não hormonais 72
5 Glicocorticoides 83
6 Outros medicamentos em Reumatologia 93
6.1Tratamento da dor 106
6.2 Acupuntura no tratamento da dor 109
7 Laboratório em reumatologia 110
8 Noções de imagens em reumatologia 122
9 Diagnóstico diferencial de monoartrites 133
10 Diagnóstico diferencial das poliartrites 136
11 Artrite reumatoide 140
11.1 AR e aterogenese acelerada 162
11.2 Síndrome de Felty 162
12 Lupus eritematoso sistêmico 164
12.1 Lupus por droga 185
12.2 Lupus e infecção 187
13 Esclerodermia 189
13.1 Fenômeno de Raynaud 204
13.2 Fasciite eosinofílica 211
12.4 Doença por adjuvante (ASIA) 212
14 Sìndrome de Sjögren 214
14.1 Doença por IgG4 219
15 Polimiosite e dermatomiosite 220
16 Doença mista do tecido conjuntivo 231
17 Sindrome do anticorpo antifosfolipide 234
18 Gravidez e doenças reumáticas sistemicas 242
18.1- drogas antirreumáticas e gravidez 245
19 Outras vasculites 249
19.1- Polimialgia reumática 260
20 Espondiloartrites conceitos gerais 261
21 Espondilite anquilosante 267
22 Artrite psoriatica 274
23 Artrite Reativa e das doenças inflamatórias intestinais 279
24 Microcristalinas 285
25 Sépticas 306
25.1- Manifestações reumáticas da SIDA 318
26 Dor lombar 322
26.1- dor lombar e afastamento do trabalho 334
27 Dor cervical e cervicobraquialgia 356
28 Reumatismo de Partes moles 346
28.1- Lesão por esforço repetitivo 354
29 Fibromialgia 356
29.1- dor miofascial 361
30 Osteoartrite 362
31 Doenças do metabolismo ósseo 373
Doença de Paget 397
32 Febre reumática 400
33 Artrite idiopática juvenil 406
33.1 Doença de Still do Adulto 410
33.2 Colagenoses na infância 410
34 Manifestações oftalmológicas das doenças reumáticas 410
35 Manifestações dermatológicas das doenças reumáticas 428
1
INTRODUÇÃO
Para começar, imunologia é um ramo da biologia que se dedica ao estudo das reações
de defesa que conferem resistência aos elementos patogênicos.
Todos os organismos vivos são capazes de resistir a elementos patogênicos embora nem
sempre o façam da mesma maneira. Elementos biologicamente mais simples dispõem de
sistemas de defesa que também são mais simples. Já os mais complexos, dispõem de
mecanismos mais sofisticados e mais eficientes, num acompanhamento da evolução de suas
capacidades.
O ser humano possui um sistema imunológico que pode ser divido em dois grandes
grupos: o chamado sistema inespecífico e o específico ou antecipatório. Ser inespecífico é a
grande vantagem e, também, a grande desvantagem do primeiro grupo. Ele consta de um
sistema de defesa que já está pronto para enfrentar qualquer tipo de situação de alarme. Não
interessa quem é o inimigo. Seu ponto forte é a rapidez de início de ação. Todavia, como ele não
sabe contra quem vai atuar, ele trabalha em linhas gerais... e por isso pode não ser lá tão
eficiente. É uma “bomba” em cima de região inimiga. Destrói toda e qualquer coisa que
encontra, podendo, muitas vezes, atacar componentes que não deveriam ser atacados, no
famoso “fogo amigo”. São vários os componentes do sistema imunológico inespecífico. O
principal e mais bem estudado é o processo inflamatório, mas, existem, também outros como o
complemento, as barreiras mecânicas, moléculas circulantes como as pentraxinas e a proteína
C reativa e várias formas de células que vêm sendo descritas e que nos fazem ver que, talvez
este sistema possa ser inespecifico, mas tem, também, grandes sofisticações.
Já o segundo grupo, o do sistema imunológico especifico é especializado e inteligente.
Ele faz um reconhecimento de quem é o inimigo e “prepara” um sistema de ataque individual e
eficiente contra o mesmo. Seus grandes componentes são os linfócitos T e B. Entretanto,
conhecer o inimigo e preparar uma arma especial contra ele exige recursos e tempo e, enquanto
o sistema específico não está pronto para entrar em cena, o organismo fica na dependência do
sistema inespecífico para se defender.
Os linfócitos são agentes específicos contra um elemento estranho porque dispõe de
receptores que só reconhecem um determinado tipo de antígeno. A diversidade de produção
de receptores é determinada por codificação genética. Cada linfócito expressa um único gene e
o seu produto, ou seja, um único receptor. Todas as células que derivam deste linfócito-mãe
expressarão o mesmo receptor da célula inicial. Este grupo de células, expressando o mesmo
gene e o mesmo receptor é chamado de CLONE. Ora, pode se entender que, sendo desta
2
maneira, cada gene terá que ter o seu linfócito para se expressar. Assim, a população de
linfócitos de um indivíduo mostra-se como um verdadeiro mosaico de clones cobrindo todas as
possibilidades possíveis de encontro com elementos estranhos. Você já imaginou qual a sua
quantidade? Os linfócitos vagueiam pelo organismo em ciclos migratórios exibindo seus
receptores como verdadeiras armadilhas. Quando ele encontra o “antígeno da sua vida”, ele se
divide formando um clone de células iguais para conseguir fazer frente ao invasor e, assim, dar
conta do inimigo. A replicação leva tempo para acontecer, mas pode ser otimizada: num
primeiro encontro ela é mais demorada e leva alguns dias para se completar; em encontros
subsequentes o processo é bem mais rápido. Trocando em miúdos: quando alguém é exposto a
um antígeno, fica melhor protegido contra exposições futuras e este é o fundamento para que
se usem vacinas.
Um problema que nos interessa de perto e que será objeto de atenção especial mais
adiante é o de que as proteínas do próprio corpo podem ser apanhadas nas armadilhas dos
linfócitos ocasionando o que chamamos de autoimunidade. Este ataque deve ser prevenido a
todo custo, tornando os linfócitos tolerantes aos componentes do próprio corpo. Os
mecanismos de tolerância serão discutidos no final deste capítulo.
QUEM É O INIMIGO
Como já foi comentado anteriormente, não é a molécula inteira do antígeno que reage
com o sistema imune, e, sim, algumas de suas porções chamadas de epítopes ou determinantes
antigênicos.
A grande sofisticação do sistema imune dos seres mais evoluídos fica por conta do
sistema antecipatório ou antígeno específico cujos agentes efetores são os linfócitos T e B.
Quem aprecia um linfócito do ponto de vista morfológico, como células sanguíneas com núcleo
denso, e um pequeno anel citoplasmático, sem nenhuma organela especial, a não ser umas
poucas mitocôndrias, ribossomos e lisossomos, não imagina que células com uma estrutura tão
"vulgar" possam abrigar uma capacidade funcional tão extraordinária. Além disso, essa
população, embora sendo anatomicamente homogênea, possui subdivisões bastante distintas
do ponto de vista de distribuição de trabalho.
A primeira grande divisão dos linfócitos é feita em linfócitos do tipo T e linfócitos B. Os
linfócitos T são assim chamados porque, no seu processo de maturação, devem
obrigatoriamente passar pelo timo. (T=timo). Os linfócitos B são os linfócitos cuja maturação se
processa na medula óssea que seria o órgão equivalente à "bursa de Fabricius" identificada em
aves. (B=bursa).
devidamente apresentado por alguém que conheça a ambos. Quem faz as apresentações? O
antígeno de histocompatibilidade.
Os antígenos solúveis são reconhecidos junto com o HLA classe II; os antígenos virais
junto com os da classe I. Se você lembra o que são HLAs lá do 2º ano, tudo bem! Senão, espere
um pouquinho que vamos rever esta parte também.
Bem, até aqui estava tudo muito fácil, não? Vamos complicar um pouquinho? O
reconhecimento do antígeno ligado ao HLA pela célula T é o início de uma longa conversa entre
estas duas células. Assim que o reconhecimento inicial acontece, o linfócito T expressa várias
moléculas, que vão encontrar os respectivos receptores na célula apresentadora de antígeno.
Estes pares de moléculas são chamados de moléculas coestimulatórias. Existem várias
moléculas coestimulatorias que se ligam como se fossem um zíper – o que é chamdo de sinapse
imunológica. Um desses conjuntos é o da molécula B7 do macrófago que se liga ao CD28 da
célula T. Este par é importante porque ele tem um inibidor, o CTLA4, que é capaz de interromper
o processo de reconhecimento e assim abortar a estimulação do linfócito T. A administração de
CTLA4 exógena vem sendo usado como uma opção de tratamento para artrite reumatoide [é
um medicamento biológico chamado abatacepte. Outro parzinho de moléculas coestimulatórias
bem conhecido é o CD40-CD40L, mas existem muitos outros dos quais não falaremos aqui.
É só após o reconhecimento destes pares de moléculas coestimulatórias que o processo
de ativação do linfócito continua, com a elaboração de interleucina-2. Se não houver este
reconhecimento, o processo já iniciado cessa.
Repetindo: num primeiro momento existe o reconhecimento do antígeno montado no
HLA pelo receptor da célula T. É o primeiro sinal. Num segundo momento, as moléculas
coestimulatórias que aparecem, tanto do lado do linfócito como do macrófago, também se
ligam e formam um verdadeiro zíper que liga as duas células entre si. Este é o segundo sinal.
Lembre-se que o nome disso é sinapse imunológica.
Existem vários subtipos de linfócito T. Esta classificação pode ser feita ou de acordo com
o trabalho que ele executa, ou de acordo com as proteínas que aparecem em sua membrana
ou, ainda, de acordo com o tipo de antígeno de histocompatibilidade que ele reconhece. Preste
bem atenção porque isto causa uma confusão danada...
A primeira classificação é feita de acordo com os receptores de antígeno que aparecem
na membrana e esta é a primeira subdivisão que pode ser notada quando este linfócito está
amadurecendo no timo. Como já foi comentado existem linfócitos com receptores αβ e outros
com receptores γδ. Só os primeiros fazem parte do sistema imunológico especifico e são eles
que se diferenciam mais tarde em linfócitos CD4 e CD8. (CD= cluster of differentiation). Desta
maneira um linfócito maduro αβ ou é CD4+, CD8- ou é CD4- e CD8+, pelo menos em sua grande
maioria. De uma maneira geral os linfócitos CD4 são chamados de T helper e os CD8, de T
5
para isso esta célula B vai precisar de ajuda das células T helper. Para fabricar a IgM, a celula B
é autônoma e trabalha sem ajuda de ninguém... Por isso ela é a primeira imunoglobulina a ser
fabricada numa infecção. Lembra que, na imunologia, sempre que a gente achava uma sorologia
contra uma gente infeccioso do tipo Ig M queria dizer que era uma infecção recente? É por isso.
A mudança do tipo de imunoglobulina elaborada é regulada pelo linfócito T helper
através deligação das moléculas coestimulatorias, sendo importante aqui, a ligação entre o
ligante de CD 40 (CD40 L) com a proteína de superfície da célula B, que é, no caso, o CD40. Note
que este sistema é o mesmo já abordado na comunicação entre célula apresentadora de
antígeno e linfócito T. Este sistema CD40-CD40L também é importante para regular a
sobrevivência das células B. Existem pessoas com defeitos congenitamente determinados neste
link CD40-CD40L e não conseguem fazer outras imunoglobulinas a não ser a IgM – o que é
conhecido como Síndrome da hiper IgM.
O linfócito B, completamente diferenciado em célula secretora de anticorpo - ou seja-
a célula que é efetora- amadurece e vira plasmócito. Existem basicamente dois tipos de
plasmócitos. Os de vida curta - que trabalham enquanto a infecção está ativa e depois
desaparecem, e os plasmócitos de vida longa – que ficam secretando uma quantidade basal de
anticorpos. É graças a esta célula que, depois de uma infecção, a gente sempre fica “vacinado”
e o título dos anticorpos contra o agente infeccioso nunca retorna ao zero. O plasmócito de
vida longa, em geral, vai se alojar na medula óssea e quando ele resolve “bancar o pestinha”,
pode ficar escondidinho fazendo autoanticorpos!
Algumas destas células B, ao invés de passar a secretar anticorpos, persistem exibindo
a imunoglobulina de superfície e são chamadas de células da memória, as quais sobrevivem por
bastante tempo circulando entre o sangue, linfa e órgãos linfoides. A afinidade das
imunoglobulinas de superfície de uma célula B de memória é bem maior do que aquela do seu
precursor não estimulado e assim o organismo, quando encontra pela segunda vez com um
antígeno, já está capacitada a acionar rapidamente o sistema imunológico especifico.
Interleucina 10: Tem atividade anti-inflamatória porque inibe macrófagos e células dendriticas
ativadas.
Interferons (INF) tipo I: Os principais são os INF α e INFβ. O nome interferon vem da capacidade
que estas substâncias têm de interferir na infecção viral que é a sua principal finalidade.
Interferon tipo II: É o INF γ. Ativa macrófagos aumentando a sua capacidade microbicida; atua
na troca de fabricação de tipo de imunoglobulinas pelo linfócito B e diferencia células T em Th1.
Interleucina 2: É elaborada pelo linfócito T e é um grande fator para o seu próprio crescimento
respondendo pela sua expansão clonal após o reconhecimento do antígeno
Interleucina 17: Tem atuação pró-inflamatória e está associada a processos alérgicos. Induz a
formação de IL-6, GM-CSF, IL-1β, TGF-β, TNF-α, quimiocinas e prostaglandinas.
Existe um grande número de outras citocinas que não serão abordadas aqui, porque isto
escapa ao intuito desta revisão. Para guardar o principal veja que IL-1 IL-6 e TNFα são pró-
inflamatórias e que a IL-10, IL-4 e TGFβ tem atividade anti-inflamatória.
Quando uma citocina se liga ao seu receptor que está na membrana da célula, ela tem
que mandar a mensagem lá para dentro da célula para que, de uma forma ou outra, chegue ao
núcleo e o DNA “tome as devidas providências” para cumprir a ordem da citocina. Para isso ela
vai precisar de “mensageiros” que travessem o citoplasma e cheguem ao núcleo. Por que saber
isso? Porque existem alguns medicamentos que podem inibir alguns esses mensageiros e assim
anular a ordem da citocina. Um desses intermediários é um sistema de enzimas chamado de
JANUS kinases (ou JAKs - para os mais íntimos). Outro grupo é o dos STATs (Systems Transducers
and Activators of Transcription). Os sistemas JAK/STATs podem ser usados por mais do que uma
citocina. Assim é possível, inibindo só um deles, impedir a atuação de várias citocinas ao mesmo
tempo.
Um aparte curioso: o nome Janus das nossas amigas JAKs vem do deus romano JANUS
que deu origem ao nome do mês de janeiro e que era o deus das portas (das entradas, saídas e
das transições). Ele era representado por uma figura masculina com duas faces: cada uma
olhando para um lado: o de dentro e o de fora da porta... A “nossa” JAK olha para a ordem da
citocina que se ligou ao receptor e para as reações que irão ao núcleo aonde se cumprirão as
ordens da dita.
O SISTEMA DO COMPLEMENTO
A via clássica é assim chamada por ser a primeira a ser descoberta. É uma via de ativação
rápida, eficiente e mais moderna do ponto de vista evolutivo; a via alternativa é uma via
filogeneticamente mais primitiva, mais lenta e menos eficiente. Entretanto, a via clássica para
que seja ativada está na dependência de formação de anticorpos específicos, o que,
naturalmente, leva certo tempo para acontecer. A via alternativa, ao contrário, consegue se
ativar espontaneamente, não dependendo destes anticorpos, mantendo sempre um ritmo
basal, meio baixo de ativação. Já a via da manose-lectina é uma via muito parecida com clássica
só diferindo desta nos momentos iniciais, por não depender da formação de anticorpos. Assim,
frente a uma infecção, a via alternativa e a via do receptor da manose-lectina são as primeiras a
intervir na defesa, o que não acontece com a via clássica, a qual só será funcionante após o
organismo fabricar os anticorpos específicos.
14
Os elementos capazes de ativar cada uma dessas vias são diferentes. A via clássica é
ativada por complexos imunes contendo IgG1, IgG2, IgG3 e IgM e também por diversas
substâncias químicas como proteína C reativa, DNA e enzimas semelhantes à tripsina. A via
alternativa é ativada por complexos imunes contendo certos polissacarídeos como endotoxinas
bacterianas e cápsulas de fungos, membranas de diálise, veneno de cobra e contrastes
endovenosos usados para estudos radiológicos. A via da manose-lectina é ativada por certos
antígenos que têm moléculas com resíduos de manose e outros açúcares que seguem uma
determinada orientação espacial e são encontrados em vários micro-organismos.
Todas as vias convergem para a ativação do componente C3, que é onde se inicia a via
terminal ou comum. Eventualmente a via comum ou terminal pode ser ativada diretamente por
certas enzimas que não fazem parte do complemento, sem a participação das vias iniciais de
ativação.
Será que agente precisa mesmo saber todos os componenetes do complemento? Não
Apenas os principais. Saiba que na via clássica estão C1, C2 e C4. E que o C3 está no início da
comum. Isto é o suficiente para o dia a dia.
No quadro 1.4, algumas das situações associadas com o achado de uma dosagem diminuida de
complemento.
Bem, já analisamos a parte mais sofisticada do sistema imune que é privilégio dos
animais mais evoluídos. Só que, enquanto ela não age com toda a sua potência, o organismo
fica na dependência de uma defesa não específica, que nem por isso é menos importante e
16
espetacular em sua maneira de ação. Além disso, os componentes do sistema não específico
interagem com o específico e funcionam também na limpeza do campo após o final da batalha...
Ou seja- esta divisão entre sistema especifico e inespecífico é coisa feita pelo homem...
totalmente artificial!! Como ninguém avisou o organismo desta classificação, ele atua
misturando as duas...
Os principais componentes do sistema imunológico não específico no homem são
fagocitose, febre, resposta inflamatória e formação dos reagentes de fase aguda. De todos eles,
vamos analisar a fagocitose e a resposta inflamatória, que são os dois elementos que mais nos
interessam.
A FAGOCITOSE- Existem células no corpo humano que circulam no sangue e outros fluidos do
corpo e que migram para áreas onde existam elementos estranhos, com a finalidade de atacar
o intruso. Nesta luta a célula lança mão de várias armas, mas a principal delas é engolir o seu
inimigo. Por isto elas células são chamadas de fagócitos, ou seja, "células que comem".
Muitas células de nosso corpo são capazes de englobar pequenas partículas líquidas ou
sólidas (praticam endocitose), mas só os fagócitos conseguem ingerir partículas maiores
(fagocitose verdadeira) porque dispõe de métodos especiais para isto.
Os monócitos são fagócitos que se originam na medula óssea e têm uma meia vida
circulante de 1 a 3 dias. Quando os monócitos migram para o espaço extracelular eles passam a
se chamar de macrófagos, podendo ter nomes especiais conforme o local em que se encontrem,
como por exemplo: células de Küpffer no fígado, micróglia no SNC, macrófagos alveolares no
pulmão, etc... Existe um conceito por aí, de que os macrófagos são os maiores "comilões" do
organismo, o que não é verdadeiro. Embora eles estejam sempre a postos e por isto são as
primeiras células a se ver frente a frente com o inimigo (acabando, por isso, por ingerí-lo), matá-
lo por digestão intracelular não é o seu forte ficnado esta tarefa para os granulócitos. Seu
principal papel parece ser o de sentinela, avisando da presença do inimigo, e, através da
secreção de substâncias, atraindo outros fagócitos mais eficientes. Durante os períodos de paz
estas células servem para ingerir restos celulares e partículas inertes numa operação de limpeza.
O grande fagócito do organismo é o neutrófilo, o qual dispõe de métodos altamente
sofisticados para a digestão de antígenos. O único problema é que ele é "meio ceguinho", ou
seja, tem pouca habilidade intrínseca para distinguir o que é um antígeno daquilo que é próprio
do organismo e, para a seleção do seu alvo, está na dependência de outros elementos do
sistema imune. Se a identificação for inapropriada, a ação destrutiva dos neutrófilos pode se
fazer contra elementos do próprio organismo.
Os eosinófilos são também bons fagócitos e seus pratos preferidos são invasores de
grande porte como os parasitas. Os basófilos provavelmente não têm muita importância na
fagocitose, ou, pelo menos a gente, não sabe disso
Quando um fagócito não está envolvido com invasores ou com a limpeza dos próprios
restos celulares diz-se que ele está em estado de repouso andando para lá e para cá, com seu
metabolismo em nível basal. Para que ele comece a funcionar deve passar para um estado
ativado, o que acontece quando ele recebe estímulos, via receptores de membrana
citoplasmática, que transmitem sinais de ativação para citoplasma e núcleo. Só os eosinófilos
parecem estar sempre num estado de agitação crônica. Eles têm um nível basal de resposta que
os outros fagócitos não têm, só que, quando recebem sinal de ativação, não conseguem ficar
tão ativados quanto os outros.
Está servida a refeição ... Houve um imunologista que disse que “os fagócitos não engolem os
micróbios a menos que alguém passe manteiga neles”. Ora, a manteiga nada mais é do que a
opsonina, uma substância que, como já vimos anteriormente, facilita a fagocitose. Existem 3
tipos de opsoninas:
1. - os anticorpos IgG (porção Fc);
2. - a fração C3b do componente C3 do complemento;
17
3. - certos carboidratos e proteínas que se ligam a carboidratos como, por exemplo, manose,
fucose e resíduos de glicoproteínas.
O fagócito dispõe de receptores para a porção Fc da IgG e para o complemento (CR). O
terceiro grupo de opsoninas se liga à superfície do fagócito por reações químicas com
oligossacarí-deos da membrana citoplasmática.
Agora pare e pense bem ... Não é um paradoxo que, um sistema imune não
antecipatório que, supostamente tem que dar conta do inimigo já nos primeiros estágios de
infecção, dependa da formação de um anticorpo para funcionar como opsonina, o qual, por sua
vez, é um elemento do sistema antecipatório?
A melhor explicação para isto é a de que o fagócito se utiliza de um mecanismo
alternativo a opsonização, além de ser capaz de fagocitar bactérias não opsonizadas. As
bactérias sem cápsula são passíveis de fagocitose sem opsonização porque têm uma superfície
hidrofóbica que permite um contato direto com a membrana do fagócito. Já as capsuladas são
altamente hidrofílicas e repelem os fagócitos que se aproximam. Aliás, foi exatamente para se
livrar dos fagócitos que estas bactérias desenvolveram cápsulas... O mecanismo alternativo à
opsonização seria aproximação entre fagócito e bactérias via interação de lecitina e
oligossacarídeos. Outras possibilidades são a fagocitose de bactérias opsonizadas por
complemento ativado via alternativa e, finalmente, opsonização com anticorpos já existentes
que porventura reajam com alguns dos componentes existentes nas bactérias em questão, em
geral elaborados pelas células B1.
A fase da digestão... Depois que a partícula se fixa na membrana do fagócito ela é engolfada
formando uma vesícula, o fagossomo, que nada mais é do que uma bolsa formada ao redor do
elemento estranho, às custas de membrana citoplasmática. O citoplasma dos fagócitos está
repleto de pequenos vacúolos que estão cheios de enzimas. Esses vacúolos se chamam grânulos
nos neutrófilos e lisossomos nos macrófagos; a principal diferença entre elas está no seu
conteúdo enzimático. Os grânulos e os lisossomos estão se movendo livremente e sem direção
definida dentro da célula. Assim que o vacúolo fagocítico começa a se formar estes grânulos
colidem com o fagossomo e se aderem a ele despejando todo o seu conteúdo (e formando um
fagolisossomo). De verdade, o esvaziamento do conteúdo enzimático para dentro do fagossomo
começa quando ele ainda não se fechou completamente e pode existir escape de enzimas para
o meio extracelular, naturalmente, com todo o potencial de lesão do mesmo.
Uma das consequências da degranulação é a acidificação do fagossomo, a qual facilita a
morte do organismo ingerido. Além da bactéria não conseguir sobreviver em meio ácido, muitas
das enzimas funcionam melhor neste meio.
O que fazer com as sobras... Sempre que o fagócito destrói o elemento invasor aproveita muito
da sua matéria prima, como por exemplo, aminoácidos, açúcares e nucleotídeos, os quais são
reutilizados no metabolismo da célula. O problema é com os restinhos indigeríveis. Para eles, o
fagócito tem 3 opções possíveis, que são: a defecação, a indigestão ou a morte. Se ele optar pela
primeira possibilidade, irá despejar no meio extracelular não só os restos indesejáveis como
também muitas enzimas potencialmente danosas. A segunda alternativa leva o fagócito a
estocar material indigerível dentro dos lisossomos, os quais se fundem e formam uma grande
vesícula cheia de lixo. Optando por esta possibilidade o fagócito fica "cronicamente constipado"
e isto também não é bom para o organismo. Na última opção, o fagócito acumula o material
indesejável em tantos quantos vacúolos ele conseguir e, após isto, ele morre. O "cadáver" é
expelido do corpo na forma de secreções purulentas etc... Esta última forma de opção parece
ser a mais adequada e a mais frequente.
Quando uma célula exerce a fagocitose, segue-se um pico de consumo de oxigênio por
esta célula. Este consumo de oxigênio não tem nada a ver com o processo respiratório o qual é
executado pelas mitocôndrias. Na realidade, ele depende de um conjunto de enzimas - o
complexo NADPH oxidase, que existe na membrana da célula (e também na membrana do
18
O PROCESSO INFLAMATÓRIO - Os sinais clássicos da inflamação, calor, rubor, dor e tumor já são
conhecidos de longa data tendo sido descritos por Celsus no século I A.D. Inicialmente
considerada um fenômeno deletério, à medida que os conhecimentos sobre a sua fisiopatologia
foram elucidados, passou a significar defesa contra agentes infecciosos. É bem verdade que, em
certas situações, a resposta inflamatória é de tal magnitude que o organismo bem que passaria
melhor sem ela... Situações em que existe doença por causa de um funcionamento inadequado
do processo inflamatório são chamadas de autoinflamatórias.
Todo o processo de inflamação começa quando um macrófago ou célula dendritica
apanha o antígeno. As células dendriticas ou macrófagos são células que ficam rondando os
tecidos exatamente para isso. Para cuidar que nenhum elemento invasor entre. Ele se comporta
de uma maneira muito parecida com a de um cachorro tomando conta do terreno baldio. O que
acontece quando um ladrão entra? O cachorro late e assim atrai a atenção de outras pessoas
para ajudá-lo ou, ainda, morde o ladrão. Pois bem, é o que macrófago faz. Ele “late” citocinas
chamando o processo inflamatório e morde o ladrão para transformá-lo em epítopes
antigênicos que serão apresentados ao linfócito T junto com o HLA. Bem, este segundo pedaço
nós já vimos com a atuação do sistema imunológico específico. Vamos ver, portanto, o primeiro:
o processo inflamatório. Mas, antes disso, uma pergunta. Como o macrófago sabe que o ladrão
é um ladrão? Ou seja, como ele reconhece que o elemento é um invasor e o distingue das
próprias células do organismo? Porque ele tem receptores para isso. Os mais conhecidos são
chamados de receptores Toll like que reconhecem estruturas que são muito comuns nos micro-
organismos chamadas de PAMPs (Padrão Molecular Associado a Patógeno). Os Toll like não são
os únicos receptores, mas são os mais reconhecidos e por isso vamos nos concentrar neles.
Existem receptores Toll like que ficam na superfície do macrófago: alguns reconhecem
lipopolissacarideos de bactérias gram negativas, outros reconhecem flagelina etc... vejam que
não interessa quem tem essa molécula. O receptor simplemente reconhece a molécula e
...pronto! Sem mais perguntas. Por isso que este mecanismo está nos sistema inespecífico.
Entretanto existem micro-organismos que entram na célula e que tem que ser reconhecidos
como estranhos lá mesmo, dentro dela. É o caso dos vírus. Então existem receptores Toll like
que são intracelulares e que reconhecem DNA e RNA viral. São os receptores 3,7,8 e 9.
Uma vez reconhecido o elemento estranho o macrofago fabrica citocinas como IL-1. IL-
6 e TNF-α. A IL-1 e TNF-α chegam ao vaso mais próximo e desencadeiam o processo inflamatório.
Num período inicial, logo após o estímulo pelas citocinas ocorre uma vasoconstrição
transitória seguida de uma vasodilatação. A vasodilatação, em uma primeira fase, promove
transudação de líquido de baixo teor proteico. À medida que o processo progride, formam-se
espaços entre as células endoteliais resultando numa exsudação de macromoléculas para fora
do vaso. Esta perda de plasma acarreta num aumento de viscosidade sanguínea local e estase
dos eritrócitos. Nesta fase, leucócitos aderem ao endotélio vascular, em um processo chamado
de marginalização, e se espremem, passando através dos espaços entre as células endoteliais e
membrana basal, indo ganhar o espaço extracelular, onde está o inimigo.
Recentemente as questões da marginalização e da diapedese das células para fora do
vaso têm recebido considerável atenção. É que se descobriu um grupo de substâncias
responsáveis por este processo. Assim sendo, pode-se pensar no que fazer para impedir que ele
aconteça e, assim, inibir a inflamação.
Vamos parar um pouquinho para tentar entender o que acontece aqui. Quando o
leucócito vem “rolando” dentro do vaso e chega num local onde ele deve passar para fora do
mesmo, as células daquele lugar (leucócitos, plaquetas e células endoteliais) passam a expressar
um grupo de moléculas chamadas de moléculas de adesão. As primeiras delas são as seletinas.
Este grupo de moléculas é suficiente para desacelerar o fluxo dos leucócitos, mas não é
suficiente para imobilizá-los completamente. É como quando alguém lança um anzol; o peixe
fisgado não consegue ir longe, mas também não sai pulando para fora d’água. Pois bem... quem
vai puxar o peixe para fora da água, ou melhor, segurar o leucócito e permitir que ele penetre
20
dentro do vaso para sair do lado de lá, são outras moléculas, as integrinas e as pertencentes à
superfamília das imunoglobulinas. São estas moléculas que medeiam a fase definitiva da adesão
para que ocorra o extravasamento dos leucócitos para os sítios de inflamação. As integrinas se
localizam no lado do leucócito e as moléculas da superfamilia das imunoglobulinas se localizam
no endotélio vascular.
É interessante notar que, embora tenhamos falado das moléculas de adesão no
processo inflamatório elas também atuam em outras células como, por exemplo, os linfócitos
auxiliando-os a se localizarem nos pontos corretos. Além disso, desempenham um papel muito
importante na coagulação sanguínea, na embriogênese, na osteoporose (agindo como
elementos de ligação entre os osteoclastos e o a superfície do osso), em câncer, e, naturalmente,
em muitas doenças infecciosas dentre outros.
Pois um desses ácidos graxos é o ácido aracdônico. Quando uma célula sofre uma injúria
qualquer ou é estimulada de alguma maneira ocorre liberação deste ácido aracdônico. Se a
perturbação da membrana plasmática é do tipo inespecífico (por ex: traumática) existe uma
liberação de pequenas quantias de ácido aracdônico. Por outro lado, se o estímulo é específico,
determinado pela ocupação de receptores, a liberação é grande. Neste último caso, a liberação
do ácido aracdônico é determinada por uma enzima, a fosfolipase. O ácido aracdônico que foi
liberado tem vida muito curta. Ele é oxidado imediatamente por várias enzimas, seguindo dois
caminhos principais: ou ele se submete à ação da ciclo-oxigenase o que irá dar origem a várias
prostaglandinas, prostaciclina e tromboxane; ou ele se submete à ação das lipo-oxigenases, o
que irá originar leucotrienos e lipoxinas. Acompanhe a sequência no esquema da figura 1.8.
As prostaglandinas têm este nome devido à falsa crença de que eram elaboradas na
próstata e estocadas na vesícula seminal.
O tromboxane (TX) é importante para a agregação plaquetária; a prostaclicina é a
prostaglandina PGI2 e tem um efeito oposto ao do tromboxane. As outras PGs têm um efeito
biológico variado no aparelho reprodutor feminino, nas secreções gástricas, no controle da
pressão arterial e no processo inflamatório. Em altas concentrações agem diretamente nos
receptores de dor e no centro hipotalâmico causando febre.
Os leucotrienos não contem anéis em sua estrutura. Os leucotrienos C4, D4 e E4 influem
na contração de musculatura lisa principalmente da pele e pulmões. Estas substâncias eram
chamadas originalmente de SRS-A ou slow-reacting substance of anaphylaxis.. As lipoxinas
causam contração de músculos lisos, vasodilatação da microcirculação, quimiotaxia, e inibem a
atividade das células natural-killer.
Prostaglandinas, prostaciclinas, tromboxane, leucotrienos e lipoxinas são fabricadas
"sob medida" conforme a necessidade. Quando a célula é estimulada a sua síntese começa em
10 a 30 segundos, se mantém pelos próximos 1-5 minutos, e, daí, pára.
De acordo com o padrão de enzimas existentes no tecido, existe predominância para
fabricação de um determinado tipo de prostaglandina, que irá servir para as necessidades
específicas daquele tecido. Desta maneira, plaquetas fazem quase só tromboxane, células
endoteliais preferem a prostaciclina, células de túbulo renal fazem PGE2 etc...
Recentemente descobriu-se que não existe apenas uma ciclo-oxigenase e sim duas
delas, que são abreviadamente chamadas de COX-1 e COX-2. A COX-1 é a enzima responsável
por fabricar as prostaglandinas necessárias para as funções fisiológicas, ou seja, aquelas
prostaglandinas que servem para fabricar o muco do estômago, para manter o fluxo sanguíneo
renal, etc... è a ciclo-oxigenase boazinha! A COX-2 entra em ação quando existe um estímulo
inflamatório e as prostaglandinas que ela fabrica são pró-inflamatórias e destinadas a atender o
organismo em uma situação de exceção. Esta é pimentinha!!! Voltaremos a comentar este
assunto ao tratar dos anti-inflamatórios não hormonais, uma vez esta enzima é um dos seus
pontos de ação.
22
Os leucotrienos e lipoxinas são produzidos só por células brancas, o que aliás, já está
sugerido pelo seu nome.
O estímulo para o aumento destas proteínas inclui uma grande variedade de processos
inflamatórios e traumáticos, como p. ex., cirurgias, infarto do miocárdio, embolia pulmonar,
aneurisma dissecante de aorta, fraturas ósseas, infecções bacterianas agudas, crises abdominais
agudas como salpingite, pancreatite, colecistite etc, doenças do tecido conjuntivo, moléstia
reumática, artrite reumatoide, infecções virais agudas, neoplasias em estágio avançado e até
exercícios físicos extremos.
Teoricamente, cada uma destas proteínas ajudaria o organismo a reagir contra o
estímulo nocivo de uma maneira específica. Assim, um aumento de haptoglobina seria útil na
captação de hemoglobina liberada por eritrócitos destruídos no local da lesão, além do que, esta
proteína parece exercer certo efeito bacteriostático. Outro exemplo: um aumento de fibri-
nogênio proporciona melhoria nas condições de coagulação, assim como, um aumento de
substrato para a formação de fibrina intravascular. Uma elevação no nível de ceruloplasmina
pode ser útil durante o processo inflamatório porque esta proteína tem a capacidade de
deslocar a enzima superóxido desmutase. Da mesma maneira, -1 antitripsina e antiquimio-
tripsina mais elevadas refreariam um aumento da atividade das proteases.
As provas mais utilizadas para medir inflamação são a VHS (velocidade de
hemossedimentação), a proteína C reativa e a dosagem de mucoproteínas (esta última vem
caindo de moda).
É importantíssimo lembrar que:
23
A VHS tem sido empregada com duas finalidades: (A)-Como screening grosseiro de
doença inflamatória ou doença na qual exista injúria tissular; (B)- para monitorizar a atividade
destas doenças bem como a sua resposta à terapêutica. É uma prova sem especificidade
diagnóstica. Está aumentada em infecções principalmente nas bacterianas, desordens
linfoproliferativas e situações em que exista injúria tissular cmo infarto do miocárdio, lesão
isquêmica. Etc. Infecções virais fazem um aumento discreto. Além disso, a VHS aumenta no final
de gestação, após uso de contraceptivos, hipo e hipertireoidismo, e, após injeções in-
tramusculares. Uma VHS normal não afasta a existência de doença, assim como ela pode
aparecer temporariamente alterada na ausência de qualquer patologia. Quando é utilizada para
monitorizar a atividade de um processo inflamatório deve-se considerar, na interpretação do
resultado, o tempo de turnover das proteínas de fase aguda. Assim, o fibrinogênio e as outras
proteínas que influem na VHS em menor extensão, têm uma vida média de pelo menos 3-5 dias
e, mesmo que o estímulo inflamatório ceda, a VHS não retornará ao normal até que todos estes
elementos já fabricados sejam metabolizados. Neste ponto, outras provas, como a dosagem da
proteína C reativa e a dosagem da proteína sérica amiloide A (que têm uma vida média mais
curta que a do fibrinogênio), refletem a evolução do processo inflamatório de uma maneira
muito mais fiel que a VHS. Veja bem: se eu marcar um dia para a inflamação terminar, a
proteína C reativa normaliza em 3 dias, enquanto a VHS leva 2 semanas para retornar ao normal.
A grande vantagem da VHS está no seu baixo custo e na sua facilidade de obtenção.
PROTEÍNA C REATIVA (PCR) - Esta proteína tem este nome por ter sido descoberta através de
sua habilidade em precipitar o polissacarídeo C somático do pneumococo em presença de cálcio.
A proteína C reativa praticamente não existe no indivíduo normal, aparecendo apenas em
resposta a situações patológicas. No ser humano o enorme aumento, assim como a rapidez com
que ele acontece, sugere que a proteína C desempenha um papel fisiológico muito importante
na defesa do organismo, embora estas funções não estejam precisamente estabelecidas. Uma
delas é com certeza a ativação do complemento via clássica como já falamos anteriormente. O
fato de existirem receptores para proteína C em leucócitos (monócitos e neutrófilos) indica que
a proteína C deve influir na ativação destas células e na função fagocitária. Assim, a proteína C
seria um dos elementos constantes do sistema de defesa inespecífico. Outro papel desta
proteína seria a atividade de opsonina principalmente para antígenos nucleares prevenindo,
portanto, o aparecimento de auto-imunidade contra os mesmos. Interação de proteína C com
cristais de uratos e ativação do complemento é uma explicação para o fato de as crises de gota
ocorrerem após injúrias cirúrgicas. A proteína C tem uma estrutura química semelhante a da
proteína precursora da substância amiloide P.
O aumento de proteína C tem início rapidamente após a ocorrência de injúria tissular
(por ex: em I.A.M., em 8 horas). Sua concentração atinge um pico máximo em 24 - 72h, em taxas
que são proporcionais ao tamanho da injúria tissular existente. Se o processo desencadeante é
controlado, a proteína C diminui pela metade em 24 horas. Níveis persistentemente altos
sugerem processos inflamatórios crônicos e neoplásicos. Nas doenças crônicas o aumento é
mais discreto quando comparado aos vistos nos processos agudos (ocorrendo uma espécie de
taquifilaxia).
A interleucina-6 é considerada a citocina responsável pela indução de síntese de PCR.
Existem algumas doenças crônicas nas quais o aumento da proteína C é particularmente
discreto. São elas: esclerodermia, lúpus eritematoso sistêmico, dermatomiosite, retocolite
ulcerativa, Síndrome de Sjögren e leucoses. Quando se encontra uma proteína C relativamente
alta nestas doenças deve-se interpretar isto como um sinal de uma infecção intercorrente. No
caso da artrite reumatoide, no entanto, o nível de proteína C reflete com fidelidade o grau de
atividade da doença e, também de sua progressão. Quando um paciente com AR é colocado em
tratamento modificador de doença e a resposta a este tratamento é positiva, os níveis séricos
de proteína C reativa diminuem refletindo esta melhora. Desta maneira, a proteína C reativa
25
pode ser utilizada, nestes casos, como um fator preditivo da resposta ao tratamento. A proteína
C reativa é medida em cruzes ou, mais adequadamente, em mg/dl.
PROTEÍNA AMILOIDE SÉRICA A - Foi descoberta pelas suas relações antigênicas com a proteína
amiloide A, a qual se deposita extracelularmente nos tecidos na forma de fibrila ocasionando a
amiloidose. A proteína amiloide sérica A é uma apolipoproteína da subclasse HDL-3 das
lipoproteínas séricas. Sua biossíntese hepática é induzida pela IL-1.
Algumas proteínas de origem hepática são assim chamadas porque suas concentrações
diminuem durante a fase aguda. Um exemplo típico é a albumina. Estes reagentes negativos não
são tão sensíveis quanto os reagentes de fase aguda positivos.
26
A descrição destes componentes está aqui só para você saber que eles existem e para
notarem que o sistema imune inespecífico pode ser muito mais sofisticado do que aparenta. No
oitavo período não vamos nos preocupar com a atuação de cada uma destas células mas se vc
tiver intenções de ser um imunologista... divirta-se! Caso contrario passe direto arpa HLAs.
Os componentes celulares do sistema imunológico inespecífico podem ser dividos em
tres grupos principais: (a) células linfoides inatas; (b) células semelhantes à célula B; (c) células
T não convencionais. Veja no quadro abaixo a subdivisão estes grupos.
As células NK, lá do primeiro grupo, são muito importantes para defesa contra tumores
e células infectadas por vírus. Elas ficam sabendo que estas células não estão normais porque
percebem modificações na molécula de histocompatibilidade classe I da superfície das células
tumorais ou infectadas. Quando ativadas as células NK liberam grânulos com material citotóxico.
Sua ação acontece sem que a célula NK tenha tido contato anterior com o elemento estranho.
As célula C1, C2 e C3 são células que “ espelham” a atuação das células Th1, Th2 e Th17
respectivamente. As C1 fazem INF δ, as C2 fazem IL-4,IL-5, Il-9 e IL-13 e as células C3 fazem IL-
17e IL 22. Veja na figura abaixo a atuação das células linfoides do sistema inespecífico e a sua
respectica “imagem refletida” do sistema imunológico especifico. As células semelhantes aos
27
linfócitos B são as células B1, as células B da zona marginal e as as células B10. As duas
primeiras: as B1 e da zona marginal elaboram anticorpos do tipo IgM contra antígenos muito
comuns na natureza. Elas nascem “ prontas” para fabricar este anticorpos não precisando
passar por todo aquele processo do sistema especifico. A célula B10 elabora IL-10 e tem
características de uma célula reguladora. As do grupo das células T não variáveis são as NKT, os
linfocitos T com receptor γδ e as células MAIT ou linfócitos T associado a mucosa. Os linfócitos
MAIT e as NKT têm atividade citotóxica.
exposta ou extracelular. Esta cadeia está dividida em porções ou domínios comparáveis para
diferentes especificidades. Toda a variabilidade dos antígenos HLA-A, B e C está nos domínios
externos, enquanto que os próximos à membrana são constantes. Esta região constante é
-2
microglobulina. A cadeia leve, que é a ß-2 microglobulina, não tem porção trasmembranosa.
Os antígenos de classe II têm uma distribuição tissular mais restrita; eles se expressam
primariamente em linfócitos B e células apresentadoras de antígenos tais como os macrófagos.
Os HLA-II têm 2 subunidades: a cadeia α e a cadeia ß e ambas são transmembranosas. A
região variável responde pelas diferentes especificidades e está na cadeia ß.
A semelhança morfológica dos antígenos de classe I e II, moléculas de imunoglobulinas
e receptores de antígeno de célula T sugere que todas estas moléculas têm um gene ancestral
comum.
A B
FIGURA 1.13 - Estrutura dos HLAs (A)- Classe 1; (B) Classe 2.
A frequência com que um determinado HLA aparece na população varia com os fatores
geográficos e raciais. Estas variações devem ser lembradas ao se analisar a associação de um
determinado HLA com uma doença. Além disso, a associação de determinados antígenos com
uma doença pode ser diferente nos diferentes grupos étnicos.
Função - Os antígenos HLA classe I estão diretamente envolvidos em resposta celular a infecções
virais. Quando ocorre resposta celular contra as células infectadas por vírus, geram-se linfócitos
T citotóxicos. Estes são capazes de lizar a célula infectada pelo vírus como a um alvo. O
fenômeno requer interação célula a célula (entre linfócitos T citotóxicos e a célula alvo). Esta
interação ocorre entre células com HLA-A, B e C em comum. Em terminologia imunológica diz-
se que a resposta de linfócitos T citotóxicos é restrita por antígenos de classe I.
Quando um vírus invade a célula, ele se replica dentro do citoplasma ou do núcleo dela. É como
se o parasita estivesse dissolvido neste ambiente. O HLA-1 da célula infectada é fabricado dentro
do sistema retículo endotelial desta célula e o antígeno do vírus é levado até lá, acomplando-se
ao HLA. O conjunto todo migra, então, para a superfície celular onde é exposto para ser
reconhecido.
Já os antígenos de classe II têm a função de restringir a interação entre células imunes.
Para que o linfócito T seja levado a reagir contra um antígeno, este deve ser processado antes e
apresentado a ele por células como o macrófago. Esta apresentação só acontece entre células
com o mesmo HLA classe II. Assim, o reconhecimento do que é próprio (feito pelo HLA classe II)
é necessário para uma comunicação produtiva entre as células imunes. Nesta segunda situação,
o antígeno é capturado por células apresentadoras de antígenos dentro de pequenas vesículas
as quais se tornam ácidas e degradam o elemento invasor. O HLA classe 2 é elaborado no sistema
29
retículo endotelial e entregue dentro das vesículas ácidas onde se ligam aos epítopes, sendo o
conjunto todo transportado para a superfície célular. No quadro 1.9 as principais diferenças
entre os dois tipos de HLAs.
Na grande maioria dos casos o risco relativo é modesto, exceto no caso da espondilite e
o HLA B 27. Além disso, os antígenos HLA classe II estão mais frequentemente associados a
doenças que os da classe I.
O porquê da associação entre um HLA e uma determinada doença é um fato
desconhecido. Existem algumas tentativas de explicação para isto:
- um determinado HLA estaria associado com um determinado Ir (gene da resposta
imune, que determina quantitativamente o grau de resposta imune)
- um determinado HLA poderia funcionar como receptor para certos antígenos
- o próprio HLA poderia ser confundido com o antígeno (mecanismo do mimetismo
molecular
Uso clínico da tipagem do HLA- Tipagem do HLA tem sido útil na escolha de doadores para
transplantes. Além disso, é um instrumento importante para o entendimento da patogênese e
talvez para intervenção terapêutica em doenças autoimunes. Entretanto sua utilidade na
reumatologia clínica é ainda muito limitada.
população de certas células imunes quando houve proliferação das mesmas em resposta a um
agente microbiano.
A apoptose é regulada geneticamente. De maneira muito simplificada podemos dizer
que existem dois genes principais nesta regulagem: o fas (que FAZ apoptose) e o Bcl-2 (que
impede o seu aparecimento).
Do ponto de vista morfológico, nota-se que o núcleo e o citoplasma se condensam.
Fragmentos do interior da célula são “empacotados” em bolhas que aparecem na membrana
citoplasmática junto com receptores para opsoninas (o que irá permitir uma fagocitose com
digestão rápida dos componentes das bolhas). A chave do processo é manter a integridade da
membrana citoplasmática, evitando atrair células do processo inflamatório, as quais,
naturalmente, acabam espalhando enzimas por onde passam, com todos os seus “efeitos
colaterais”.
A apoptose pode ser desencadeada por estímulos externos (em geral, quando
receptores de morte celular se ligam aos seus respectivos ligantes como, por exemplo, a ligação
do fas com fasL) e internos (quando a célula responde a um agente ambiental agressivo como
calor, raios X, radiação ultravioleta) os quais provocam alteração nas funções das mitocôndrias
da célula.
Alterações no mecanismo de limpeza de células apoptóticas estão implicadas em
autoimunidade, principalmente em lúpus. Situações em que as bolhas da membrana
citoplasmática são eliminadas de maneira muito lenta ou incompleta permitem que o sistema
imune tenha acesso aos antígenos intracelulares, levando à formação de anticorpos contra tais
elementos.
interferência, por exemplo: esta pessoa tem uma infecção ou toma antibióticos, a microbiota
muda, mas tende a se recuperar e retornar ao estado anterior. Assim sendo o tipo de microbiota
que uma pessoa possui por toda sua vida é determinada ao nascer. A grande pergunta neste
contexto é se um parto por cesariana não poderia influenciar na microbiota (já que a flora
adquirida aqui é a de pele) e consequentemente, na incidência de doenças autoimunes...
Para que a autoimunidade apareça é necessário, antes de tudo, uma predisposição genética
para isto, ou seja, que as células imunes tenham “mau caráter”. Genes que regulam as moléculas
de HLA e a expressão do sistema fas-fas ligante são alguns dos elementos predisponentes. Sobre
este terreno predisposto fatores ambientais iniciam o processo. Ou seja, é necessária uma
“provocação” por parte do antígeno. Infecções, por exemplo, podem atuar neste sentido.
Determinados micro-organismos têm sequências antigênicas semelhantes às do próprio
individuo e podem levar a uma reação cruzada (reação de mimetismo molecular). Outros
parecem afetar a função das moléculas coestimulatórias, ou ainda, ao provocar lesão tissular,
revelando antígenos que estavam bem escondidos e expondo-os ao sistema imune. Um último
mecanismo proposto é produção de citocinas pelos microorganismos, as quais fazem
recrutamento de linfócitos.
Em reumatologia, você vai ouvir muito o termo “epitope spreading”, ou seja, - epítopes que se
espalham... Ele é usado para designar que, uma infecção “mostra” um autoantígeno para o
sistema imune, que passa a ser reconhecido n’outros locais de maneira agressiva e depois que
a infecção já foi curada.
As síndromes autoimunes podem ser divididas em induzidas ou espontâneas; sistêmicas
ou órgão-específicas. No homem, certas doenças autoimunes são claramente induzidas por um
estímulo externo como é o caso da febre reumática, em que o estímulo provocador é a infecção
estreptocócica. Já no lúpus e em outras doenças do tecido conjuntivo não existem evidências
convincentes de que exista um estímulo externo, embora se suspeite de que ele exista.
Doenças tidas como órgão-específicas são: tireoidite, pênfigo bolhoso e diabetes
mellitus. Nestas enfermidades um único órgão alvo está afetado e, os anticorpos ou células T
auto reativas irão se direcionar contra antígenos específicos deste órgão. No polo oposto está o
LES onde um número muito grande de autoanticorpos leva à agressão de múltiplos órgãos e a
uma clínica bastante variada.
Uma vez gerada a célula auto reativa ou um autoanticorpo, ele passa a causar dano aos
tecidos de várias maneiras. Estes mecanismos estão classificados por GELL e COOMBS da
maneira que se segue.
Reação tipo I (mediada pela IgE, anafilaxia)- Rinite alérgica, dermatite atópica, certos tipos de
asma, de urticária e anafilaxia têm sido identificadas como reações do tipo hipersensibilidade
imediata. A patofisiologia do processo envolve mediadores produtores de vasodilatação
acentuada com perda de líquido e de coloide. Esta perda produz redução de volume circulante
efetivo podendo ocasionar choque. Em algumas pessoas a broncoconstrição é proeminente;
noutras ocorrem cãibras abdominais. A vasodilatação é acentuada em nível de capilar e vênula
pós-capilar.
A gravidade da manifestação clínica depende da extensão do processo, o qual é
localizado em casos de rinite e urticária e generalizado em casos de anafilaxia.
Os mediadores químicos responsáveis pela hipersensibilidade imediata são: histamina,
SRS-A ou slow reacting substance of anaphylaxis, fator ativador plaquetário, prostaglandinas
estocados em grânulos, dentro de mastócitos e basófilos, que são células com receptores para
IgE em sua superfície. Quando o antígeno apropriado é introduzido, sua interação com o
anticorpo presente na superfície da célula leva a mesma a se degranular, secretando mediadores
farmacologicamente ativos.
Algumas drogas como morfina, codeína, quinina, polimixina B, curares, hidralazina e
meperidina podem causar degranulação de basófilos e mastócitos sem a mediação de IgE e, por
isso, causam reações que são chamadas de anafilactoides.
A liberação de mediadores pode ser suprimida aumentando-se o AMP cíclico
intracelular. Isto pode ser conseguido através de um aumento de sua produção por agentes tais
como epinefrina e isoproterenol ou pela administração de elementos que impeçam o seu
catabolismo pela fosfodiesterase, como é o caso da teofilina. Os efeitos da liberação dos
33
FIGURA 1.15- Reação de Gell e Coombs tipo 2. Citotoxicidade mediada pelo anticorpo
Reação tipo 3 (ou por formação de complexo imune)- Este mecanismo é bem evidente em
doenças como doença do soro, lúpus eritematoso sistêmico, artrite reumatoide com vasculite
etc.. Imunocomplexos circulantes existem em condições normais, mas as quantidades são, em
geral, muito pequenas e não causam dano. Para que ocorra este tipo de doença, a quantia de
complexos imunes deve estar aumentada, superando a capacidade de depuração pelo SRE.
Estes complexos imunes que sobram se depositam principalmente em paredes de vasos. Este
34
depósito é facilitado por condições locais, tais como vasodilatação e um aumento de pressão
hidrostática do sangue dentro do vaso.
Os complexos imunes depositados iniciam a sequência de ativação do complemento, o
qual gera dano às células endoteliais.
É comum, também, que estes complexos imunes fiquem retidos no parênquima de
órgãos que contém pontos de filtração sanguínea, como, por exemplo, no plexo coroide do
cérebro, no corpúsculo ciliar do olho e, naturalmente, nos glomérulos renais. Nestes pontos os
capilares têm poros maiores. Isto explica muito dos achados clínicos destas doenças. Além disto,
a constituição do complexo imune tem afinidade por certos tecidos, facilitando o seu depósito
nestes. Sabe-se, por exemplo, que complexos imunes formados por DNA-anti DNA têm uma
predileção especial pelos glomérulos renais, sendo parcialmente responsáveis pela lesão renal
encontrada no rim de pacientes lúpicos.
alto, ocorre passagem dos mesmos através da membrana basal, promovendo uma deposição
em células mesangiais ocasionando o aparecimento de uma glomerulonefrite do tipo mesangial.
Se o nível for baixo, o depósito acontece dentro da membrana basal, espessando-a e
promovendo aparecimento de uma glomerulonefrite do tipo membranoso.
Referências
Abbas AK, Lichtman A. Cellular and Mollecular Immunology. EUA: Sauders Elsevier Inc., Ed.7, 2012, p.562.
Carroll MV, Sim RB. Complement in health and disease. Advanced Drug Delivery Reviews 2011; 63: 965–975.
McHeyzer-Williams LJ, McHeyzer-Williams MG. Antigen-specific memory B cell devel-opment. Annu Rev Immunol 2005; 23:487-513
Wenink MH, Leijten EFA, Cupedo T, Radstake TRDJ. Review: Innate Lymphoid Cells: Sparking Inflammatory Rheumatic Disease?
Arthritis Rheumatol. 2017 ; 69(5):885-897.
Round JL, Mazmanian SK The gut microbiota shapes intestinal immune responses during health and disease. Nat Rev Immunol.
2009 ;9(5):313-23
36
MÚSCULOS, TENDÕES E LIGAMENTOS - Existe uma correlação direta entre a massa muscular
em volta de uma articulação e o grau de mobilidade da mesma. Além disso, esta massa muscular
ajuda a promover estabilidade, principalmente, em articulações proximais como ombro e
coxofemoral. Já nas articulações periféricas, a estabilidade é conseguida graças à sua própria
anatomia (o que restringe muito a sua mobilidade) e a ligamentos densos.
Quando existe edema intra-articular ocorre uma inibição reflexa da contração muscular,
sobrevindo atrofia muscular em articulações que porventura fiquem imobilizadas. Isto acontece
precocemente, em questão de dias, merecendo atenção por parte do médico atendente, numa
tentativa de evitar o processo.
Tendões são pontes entre músculos e ossos. Podem se subdividir e se inserir em vários
ossos. A maioria dos locais de fixação do tendão no osso são estruturas complexas e altamente
especializadas, nas quais fibras de colágeno do tendão se misturam à fibrocartilagem e ao osso.
Esse ponto de entrada de um tendão no osso é conhecido como êntesis e pode ser o local
primário de inflamação em certas doenças reumáticas como as espondiloartrites. Muitos
tendões, principalmente os dotados de grande amplitude de movimento, são providos de uma
bainha formada por células que lembram as sinoviais e que ajudam a promover o seu deslize
37
sem atrito. Estas bainhas contém ácido hialurônico, uma substância com viscosidade alta pro-
duzida pelas células locais. A função de deslize pode ser prejudicada pela formação de adesões
fibróticas entre tendões e suas bainhas ou entre vários tendões entre si. Estas fibroses se
formam, em geral, por cicatrizações cirúrgicas ou por processos inflamatórios seguidos de
imobilização.Ligamentos e tendões têm poucas diferenças estruturais e anatômicas. A mais
óbvia é a de que um ligamento faz ligação de osso com osso. Alguns ligamentos têm um teor
mais alto de elastina que os tendões. Muitas vezes, os ligamentos se parecem, ao exame
macroscópico, com reforços da cápsula articular.
BURSAS - Servem para auxiliar na função de deslise, diminuindo a fricção entre um tecido e
outro. São sacos fechados contendo células mesenquimais parecidas com as sinoviais.
Existem cerca de 70 bursas em cada lado do corpo, e elas podem ser superficiais ou
profundas. Bursas profundas formam-se na vida intra-uterina, junto com as articulações
sinoviais. As superficiais se formam alguns meses depois do nascimento, o que sugere que a
pressão e o atrito podem ser necessários para o seu desenvolvimento. Existem ainda, as bursas
adventícias, que aparecem bem mais tarde, em resposta à pressão direta sobre deformidades
ósseas e deformidades.
As bursas podem ser locais de infecção ou de depósito de cristais (principalmente de
uratos, em casos de gota).
OSSO SUBCONDRAL - Sua microestrutura deve ser adequada para que a cartilagem subjacente
possa ser saudável. A rigidez do osso é importante para transmissão de forças de impacto para
a cartilagem.
CÁPSULA ARTICULAR - Pode ser dividida em duas camadas: uma externa, fibrosa e rica em
fibras colágenas espessas e, uma interna, a membrana sinovial. A membrana sinovial é uma es-
trutura altamente flexível e forma o principal tecido intracapsular. É formada por 3 camadas:
uma íntima (também chamada militante), que elabora o líquido sinovial pata lubrificar a
38
durante o movimento. Na porção mais profunda eles orientam-se no sentido vertical indo se
inserir no osso subcondral. É o colágeno que confere resistência à tensão. Veja figura 2.2
A
FIGURA 2.2 (A)- Disposição das fibras de colágeno dentro da cartilagem. (B )- Estrutura da matriz
Tirar líquido sinovial de uma junta doente e estudá-lo pode ser considerado como uma
"biópsia líquida", sendo esta análise fundamental para o diagnóstico diferencial das doenças
reumáticas. Mesmo pequenas quantias podem ser retiradas de pequenas aericulações como a
primeira metatarsofalangiana. Até em pacientes com diagnóstico já estabelecido, a sinovianálise
pode dar pistas para novas situações como por ex: infecção bacteriana em articulação de um
paciente com AR ou LES; superimposição de doença por depósito de pirofosfato de cálcio em
paciente com osteoartrite etc...
O líquido sinovial normal é um ultrafiltrado do plasma com pequena quantia de proteínas
de grande peso molecular como fibrinogênio, 1C etc... ao qual se adicionou ácido hialurônico
produzido pelas células B da membrana sinovial. O conteúdo de proteínas é cerca de 1/4 da do
plasma.
O líquido sinovial normal é de cor palha, em quantias que variam de poucas gotas até 3,5
ml no joelho. As células são poucas (menos que 200/ml) e incluem células sinoviais grandes,
monócitos, macrófagos, linfócitos e neutrófilos, existindo um predomínio das mononucleares.
Um outro constituinte é a glicose, em quantidades um pouco menores que as do plasma.
COLETA DO LÍQUIDO - A punção deve ser executada sob condições estéreis. Os locais de punção
são múltiplos, estando na dependência da articulação em questão. Existem atlas especiais para
esta demonstração. Em certas situações, o líquido sinovial pode conter elementos que
provocam a sua coagulação, o que impossibilita a sua análise, sendo, por isso, prática comum se
fazer a coleta em frascos anticoagulados. A preferência do anticoagulante deve recair sobre a
heparina para que se evitem a formação de cristais que podem vir a confundir a análise posterior
do material. É importante, também, que o líquido coletado seja entregue ao laboratório em um
curto prazo de tempo para que não se alterem os resultados. A contagem leucocitária após 6
horas de coleta pode cair pela metade (por morte celular provocada pela falta de oxigênio e
nutrientes). Outra observação é a de que a lidocaína usada como anestésico para a punção, por
ter efeitos bacteriostáticos, não deve entrar em contato com o líquido a ser analisado,
principalmente em casos suspeitos de artrite séptica, para que isto não promova um resultado
falso negativo.
Fragmentos de prótese de metal ou plástico podem conferir uma cor cinza ou preta ao
líquido. Na sinovite pigmentada vilonodular aparece um líquido hemorrágico ou de coloração
laranja-amarronada. Líquido sinovial de paciente com gota pode conter um número muito
grande de cristais e por isso ter uma cor esbranquiçada.
Estrias de sangue podem resultar de acidente de punção. As causas de um líquido
uniformemente hemorrágico estão resumidas no quadro 2.1.
42
Preparo direto - Consiste no exame de uma gota do líquido sinovial a fresco, para cristais e
outros constituintes. Se só uma gota de líquido é obtida. Esta análise pode ser feita e a seguir a
lâmina é fixada e corada pelo Gram, se o caso assim o requerer.
Em geral, o líquido analisado não é centrifugado, mas isto pode ser feito na tentativa de
concentrar raros cristais ou células. O exame com microscopia óptica simples mostra eritrócitos
e leucócitos podem ser vistos e sua contagem pode ser estimada. Fragmentos de cartilagem
também podem ser visualizados. Ragócitos são leucócitos contendo corpúsculos de inclusão,
primariamente vistos na AR, mas também vistos em outras patologias. Estas inclusões
representam fagossomos distendidos ou vacúolos. Outros materiais que podem ser vistos:
fibrilas de fibrina, massas globulares de amilóide, fragmentos metálicos de próteses, gotas de
lipídeos (estes vistos em artrite traumática ou pancreatite necro-hemorrágica). Espículas de
medula óssea são achadas em casos de fraturas. Grumos globulares, semelhantes a moedas,
podem representar agregados de hidroxiapatita.
O exame de microscopia com luz polarizada tem por finalidade principal a detecção e
identificação de cristais. Cristais de urato aparecem como bastões ou agulhas e tem bir-
refringência negativa. Na crise de gota são encontrados dentro de células fagocitárias. Os cristais
de uratos obtidos de tofos são em geral mais longos e predominantemente extracelulares.
Cristais de pirofosfato de cálcio têm birrefringência fracamente positiva e são romboédricos e
mais curtos que os de urato. Uma grande variedade de material birrefringente pode ser visto à
luz polarizada: preparações de corticoide de depósito podem formar cristais semelhantes a
bastões, grânulos e fragmentos irregulares de birrefringência positiva ou negativa. Cristais de
colesterol podem ser vistos em sinovites crônicas, principalmente AR; têm formato de placa com
um sulco num dos cantos. Cristais de oxalato são encontrados em pacientes com insuficiência
renal crônica, sendo pleomórficos, mas incluindo sempre formas bi-piramidais grandes. Grumos
de cristais de hidroxiapatita são vistos ocasionalmente, mas estes cristais só podem ser
identificados com certeza por difração com R.X. ou microscopia eletrônica.
43
A B
B C
FIGURA 2.6- (A) Cristais de urato em liquido sinovial; (B)- Cristais de urato de tofos; (C) Cristais de
pirofosfato de cálcio; (D) Cristais de colesterol.
TESTES ESPECÍFICOS
A dosagem da glicose deve ser feita simultaneamente com a glicose sanguínea sendo, o
valor normal do líquido sinovial ligeiramente mais baixo do que o do sangue. Níveis muito baixos
(menores que 50% do valor plasmático) sugerem infecção ou AR. Pode-se dosar o complemento
hemolítico total ou as frações do complemento; tem valor quando comparado com níveis
séricos. Está diminuído em LES e hepatite; aumentado em artrite reativa.
Ao se pedir cultura não se deve esquecer que o meio deve ser adequado ao germe que se
procura. Se anaeróbios são procurados, não deixar de expelir todo o ar da seringa e usar um
meio de transporte para o laboratório que forneça condições de anaerobiose. Gonococos só são
cultivados em 25 a 30% dos casos. O líquido deve ser semeado em ágar-chocolate ou meio de
Thayer-Martin e deve-se fornecer CO2 à cultura. Fungos requerem o meio de Sabouraud e os
bacilos da tuberculose no de Lowenstein Jensen. Outros testes são determinação de pH (o
normal é 7.4; está mais baixo em inflamações); pesquisa de FAN e fator reumatoide (podem ser
identificados no líquido quando negativos no soro).
44
Referências:
Ferrari AJL, Líquido sinovial. Rev Bras Rheumatol 1996;36:87-92
Fye, KH. Aspiration & Joint Injection. In Imboden J, Hellmann DB, Stone JH (eds). Current Rheumatology: Diagnosis & Treatment.
Mc Graw Hill. New York, 2004: 10-7.
45
A anamnese e exame físico bem feitos são de suma importância em reumatologia, uma
vez que, nesta especialidade, não existe nenhum exame laboratorial que isoladamente forneça
um diagnóstico de certeza.
A ANAMNESE
IDENTIFICAÇÃO
a) Sexo. É interessante observar que existem doenças que incidem mais comumente em um dos
sexos, como por exemplo: artrite reumatoide e o lúpus eritematoso, nas mulheres. Já
espondilite anquilosante e gota preferem o sexo masculino. Dentro de uma mesma doença
podem existir variações clínicas dependendo do sexo do paciente. Assim, a artrose primária na
mulher é vista mais comumente em coluna cervical, dedos e joelhos; no homem, incide mais em
coxofemorais e coluna lombar.
b) Raça. A artrite reumatoide incide mais em brancos que em negros. A doença de Behçet e
Kawasaki são mais comuns na raça amarela.
c) Idade. Também interessa no que diz respeito a prevalência de certas enfermidades. A febre
reumática aparece preferentemente em crianças e jovens; a artrite reumatoide da criança é uma
doença totalmente diferente da artrite do adulto. A espondilite anquilosante inicia-se em
indivíduos jovens. A gota aparece em homens em qualquer idade; na mulher sua incidência
aumenta após a menopausa. A dermatomiosite da criança pode ser uma doença mais grave do
que a do adulto se estiver associada à vasculite do aparelho digestivo, que pode ser fatal.
d) Profissão. É importante porque o tipo de atividade física do indivíduo pode estar intimamente
relacionado com a doença apresentada. São alguns exemplos: cotovelo de tenista, epitrocleite
de golfista, esclerodermia em pessoas que se expõe aos solventes de tinta, tricloroetileno e
sílica, lombalgia nos indivíduos com profissão sedentária etc...
a)-Intensidade. Dores muito intensas são vistas em pacientes com crises agudas de gota, hérnia
de disco e nas bursites. Já a artrose e as doenças do tecido conjuntivo trazem dor com menor
46
intensidade. Não se deve esquecer que dor é um dado subjetivo e extremamente sujeito a
variações individuais e a influências do psiquismo. Uma dor descrita como intolerável em um
paciente capaz de exercer suas atividades normalmente é extremamente sugestivo de que
fatores emocionais estão ampliando o sintoma.
d)- Localização anatômica da dor. Se a dor está exatamente sobre a junta uma desordem
articular está presente; já, se a dor está entre as articulações, sugere um processo ósseo ou
muscular. Dor em localizações de tendões, fáscias ou bursas sugerem patologia destas
estruturas. A dor de estruturas profundas costuma ser menos focal do que as de estruturas
superficiais. Assim, um envolvimento de pequenas articulações nas mãos é mais corretamente
localizado do que o de estruturas mais profundas como coxofemorais e ombros.
e)- Caráter. Embora este tipo de descrição seja extremamente variável, a dor tipo "surda"
sugere envolvimento articular. Uma dor tipo queimada ou em pontadas sugere neuropatia.
f)- Padrão de envolvimento articular. É um dado que auxilia bastante no diagnóstico etiológico.
Assim, a AR. envolve grandes e pequenas articulações de maneira simétrica. Já as
espondiloartrites ocasionam preferentemente um envolvimento assimétrico, em articulações
de mm.ii. A gota inicial frequentemente afeta a primeira metatarsofalangiana (podagra)
evoluindo em ciclos de padrão monoarticular. À medida que a doença progride, toma o caráter
poliarticular. É importante, também, que se verifique se o envolvimento se faz de maneira
aditiva ou migratória. A AR. é um bom exemplo de envolvimento aditivo (no qual, novas
articulações vão sendo afetadas, somando-se às anteriormente já envolvidas). A moléstia
reumática é um bom exemplo de envolvimento migratório, no qual à medida que uma segunda
articulação é envolvida, a primeira melhora.
g)- Ciclo. A grande maioria dos processos articulares evolui de maneira cíclica podendo, nos
casos mais graves, tomar um aspecto continuado. O tempo de duração e frequência destes ciclos
são fatores importantes na determinação da agressividade do tratamento.
Além de dor, o paciente reumático pode ter outras queixas. A de edema é um elemento
importante na separação de uma artrite de uma simples artralgia. A percepção do paciente em
relação à sua presença é variável. O examinador tem que decidir muitas vezes se existe edema
ou não pelo exame físico. Não é raro uma pessoa obesa descrever como edema as coleções
adiposas que se formam aos lados do joelho. Edema que ocorre em área confinada e de maneira
aguda se faz acompanhar de sintomatologia dolorosa importante por causa da pressão exercida
pelo líquido nas paredes; já o edema crônico é mais bem tolerado por dar tempo para que ocorra
estiramento das paredes da sinóvia.
47
QUEIXAS REFERENTES A OUTROS APARELHOS - Não se deve esquecer que doenças reumáticas
podem ter envolvimento multissistêmico, como é o caso, por exemplo, das colagenoses. É
fundamental, portanto, prestar-se atenção às outras queixas do paciente, na tentativa de
verificar se pertencem ou não à patologia reumática básica.
EXAME FÍSICO
extremidade superior e seguem para o tronco e membros inferiores. O importante é que cada
examinador estabeleça a sua maneira de proceder e a execute sempre do mesmo modo, para
não acabar esquecendo algum segmento. Vamos descrever aqui o exame que segue a sequência
de membro superior para o inferior e inclui, por último, a coluna.
Punhos - Os movimentos do punho são de flexão palmar, dorsiflexão, desvio ulnar e radial e
circundação. Pronação e supinação da mão ocorrem por conta da articulação rádio-ulnar
proximal e rádio-ulnar distal. O edema da região do punho pode se dever a envolvimento das
bainhas de tendões e/ou da articulação propriamente dita. Quando é a bainha dos tendões que
49
está envolvida, o aumento de volume é mais localizado. Sinovite de uma articulação é mais
facilmente detectada palpando-se a superfície dorsal da mesma. Em processos inflamatórios
crônicos pode ocorrer subluxação da ulna, a qual aparece como uma proeminência em região
dorso lateral do punho e pode exercer pressão sobre os tendões extensores do 4º e/ou 5º dedos.
Este atrito pode promover ruptura destes tendões com perda da extensão destes dedos (caput
ulnae síndrome ou síndrome da cabeça da ulna).
Ganglion ou cisto sinovial é um aumento de volume cístico originário na cápsula
articular, que ocorre no dorso do punho. Em geral está preenchido com um material gelatinoso
e é uma verdadeira herniação da estrutura sinovial com a qual se conecta através de um canal
provido de válvula.
Chama-se contratura de Dupuytren à situação na qual a aponeurose palmar torna-se
espessada promovendo contratura em flexão ao nível da metacarpofalangiana. Ocorre
principalmente em 3º, 4ºe 5º dedos. A pele da palma da mão torna-se aderente a fáscia. É mais
frequente em diabéticos.
Tenossinovite estenosante (ou de De Quervain) é um processo inflamatório do tendão
do abdutor longo e extensor curto do polegar trazendo o aparecimento de dor junto ao processo
estiloide do rádio. É detectado através da manobra de Finkelstein, na qual o paciente fecha o
punho e o examinador procede ao seu desvio ulnar promovendo o aparecimento de dor sobre
o processo estiloide do rádio.
Síndrome do túnel carpiano resulta da pressão sobre o nervo mediano ao passar no
túnel do carpo promovendo o aparecimento de parestesias nos três dedos médios da mão
afetada.
A B
FIGURA 3.3- (A)- Anatomia do túnel do carpo; (B)- Diagrama da distribuição de parestesias
em Síndrome do túnel do carpo.
Cotovelos - O cotovelo é formado por três articulações, sendo a úmero-ulnar a que exerce o
principal papel. Ela tem um movimento em dobradiça. As outras duas, a rádio ulnar proximal e
a rádio umeral respondem pela rotação do antebraço. O exame do cotovelo é feito pinçando-se
o olécrano do paciente entre o polegar e o 2º ou 3º dedo e testando-se a sua mobilidade.
Limitações de movimento e crepitações podem ser notadas. Edema é percebido quando o
cotovelo está em extensão total. A presença de sinovite é comumente associada à limitação de
50
movimento. Sobre o processo olecraniano está a bursa olecraniana e bursites podem ocorrer
isoladamente ou em doenças como A.R. e gota. Deve-se também palpar diretamente sobre os
epicôndilos medial e lateral à procura do cotovelo de golfista (internamente) ou de tenista
(externamente). O exame da região torna-se mais completo com inspeção e palpação da
superfície extensora do antebraço à procura de nódulos subcutâneos.
Coxofemorais - O exame deve incluir observação de como o paciente anda e de como fica em
pé. Ao se olhar o paciente deve-se tentar alinhar as espinhas ilíacas ântero-superiores. Se existir
obliquidade, esta pode se dever à escoliose, discrepância no tamanho das pernas ou patologia
do quadril. Os movimentos do quadril são testados com o paciente em posição supina. Os
movimentos possíveis são os de: flexão, extensão, abdução, adução, rotação interna e externa
e circundação.
A presença de contratura em flexão é sugerida
pela persistência de lordose lombar e inclinação da pelve
quando o paciente se deita. Esta compensação pode ser
anulada através do teste de Thomas na qual o quadril
oposto é fletido para "apagar" a lordose lombar e fixar a
pelve. O defeito em flexão então aparece. Na rotina
diária, se o paciente não tem queixas específicas no
quadril pode-se fazer apenas um teste de screening com
a manobra de Fabere (F= flexão; ab= abdução; re=
rotação externa) ou seja, pede-se ao paciente para que
faça um 4 com as pernas. Em pacientes com queixas de
dor em face lateral da coxa, a região do grande trocanter
deve ser palpada à procura de sensibilidade local que
pode denotar a presença de bursite trocantérica.
FIGURA 3.4 –Diagrama de meralgia Chama-se meralgia parestésica à neuropatia de
parestésica compressão do nervo cutâneo lateral ao passar pela
fáscia da porção ao passar pela fáscia da porção
superior da coxa.
O diagnóstico da meralgia é feito ao se encontrar dor à palpação no ponto de penetração
do nervo na fáscia, o que ocorre aproximadamente 10 cm abaixo da espinha ilíaca ântero-
superior.
Existem várias bursas ao redor desta articulação, sendo as principais: a pré patelar, infra
patelares superficial e profunda, anserina, semimembranosa e do gastrocnêmio.
O exame do paciente deve incluir inspeção em pé; o suporte do peso pode demonstrar
defeitos de alinhamento não observados com paciente deitado.
Chama-se joelho varo ou “genu varum” ao desvio lateral do joelho com desvio medial
da perna; joelho valgo ou “genu valgum”, ao desvio medial do joelho com desvio lateral da
porção inferior da perna.
A
B
Assimetria por edema ou atrofia muscular pode ser notada. Atrofia da musculatura do
quadríceps é frequente nas artrites do joelho e aparece de maneira precoce. A porção posterior
do joelho deve ser observada à procura de aumento de volume no local. Cisto de Baker é um
aumento de volume da bursa semimembranosa medial que aparece como uma formação
globosa em fossa poplítea. Este cisto tem comunicação com a articulação do joelho, existindo,
nesta comunicação, uma válvula que permite a passagem de líquido em um único sentido, do
joelho para o cisto. Cistos poplíteos podem se romper e o líquido pode dissecar os músculos da
panturrilha promovendo edema e flogose no local, o que causa muita confusão com
tromboflebite. Edema localizado em região de patela pode ser devido à bursite pré-patelar que
é vista comumente em pessoas que costumam ficar ajoelhadas muito tempo (e por isso também
chamada de joelho de freira ou de lavadeira). Para que o joelho seja adequadamente palpado,
a musculatura deve estar relaxada (ou seja, o paciente deve estar deitado). Procura-se edema,
alterações de temperatura e nódulos. Em grandes coleções líquidas, a patela pode ser
empurrada de encontro à articulação ocorrendo o seu rechaço. Pequenas quantidades de
líquido podem ser postas em evidência através do sinal do abaulamento. Nele o examinador
comprime o lado medial da articulação e com a palma da mão faz uma compressão deslizante
no lado externo desenhando uma onda líquida em casos positivos. Instabilidade de ligamentos
pode ser posta a descoberto aplicando-se stress em varus, ou valgus e através do sinal da gaveta.
O sinal da gaveta aparece em ruptura de ligamentos cruzados. Para pesquisá-lo desloca-se o
platô da tíbia sobre o côndilo femoral com o joelho em flexão a 90ºe o quadril em flexão de 45º.
Em casos de suspeita de lesão de meniscos deve-se procurar estalidos e ruídos secos durante
extensão da articulação, além de sensibilidade ao longo da linha articular. Sintomas que
sugerem esta patologia são: sensação de entrave à mobilização do joelho e dor local. Perda de
extensão devido à contratura em flexão é um achado comum em artrites crônicas de joelho e
podem levar ao encurtamento do membro.
frouxa no aspecto antero-posterior, mas firmemente estabilizada por ligamentos nas posições
laterais. O arco do pé está suportado pela aponeurose plantar, pequenos músculos do pé e
tendões longos que cruzam o tornozelo em direção à sola do pé. A aponeurose ou fáscia plantar
é uma estrutura fibrosa que se estende do calcâneo e, no meio do pé se divide em porções que
vão até os cinco dedos. A área perto da inserção da aponeurose no calcâneo está
particularmente sujeita a efeitos de reações inflamatórias e traumas sendo comum a formação
de esporões.
Existem várias posições anormais do pé que devem ser reconhecidas:
•-pé chato ou valgo-plano: são aqueles em que existe abaixamento do arco longitudinal;
•-pé cavo: é o que tem elevação do arco longitudinal;
•-pé equino: é o formado por contratura do pé em flexão plantar. Este último aparece por
contratura do tendão de Aquiles e é frequente em pacientes confinados ao leito.
Das deformidades vistas nos dedos dos pés são algumas das mais comuns:
•-hallux-valgus ou joanete: é a deformidade do 1º pododáctilo, na qual existe desvio lateral do
1º dedo resultando numa angulação anormal e rotação da primeira metatarsofalangiana. O 1º
metatarsiano desvia-se medialmente o que torna o pé mais largo anteriormente e produz uma
proeminência do 1º osso metatarsiano. O 1º dedo fica sobre ou sob os demais. É comum a
formação de uma bursa ou calo sobre a cabeça proeminente do 1º metatarsiano.
•-dedo em martelo: deformidade que consiste na hiperextensão da metatarsofalangiana e
flexão da interfalangiana proximal. A interfalangiana distal pode ficar hiperestendida ou reta.
•-"cock-up toe": refere-se à subluxação da falange proximal ao nível das cabeças metatarsianas.
Estas se deslocam em direção à sola do pé aonde podem ser palpadas. As pontas dos dedos
ficam acima da superfície quando o pé está descansando.
Um calcanhar doloroso pode ter várias causas tais como esporões, tendinite do tendão
de Aquiles, bursite retrocalcânea, fraturas, periostites... A localização da dor revela a causa mais
provável dos sintomas.
Esqueleto axial - Os pontos de referência da anatomia das costas são importantes para ajudar a
localizar certas patologias. Para que sejam localizados, o paciente deve estar em pé, relaxado e
com os braços estendidos ao lado do corpo. A 7ª vértebra cervical e a 1ª torácica são
proeminentes na base do pescoço. A linha horizontal traçada entre os pontos mais altos da crista
ilíaca passa na coluna ao nível de L4. As "covinhas" sacras (espinhas ilíacas póstero-superiores)
estão alinhadas ao nível de S2.A inspeção da coluna pode revelar: escoliose, alterações no
alinhamento da pelve, cifose, hiperlordose lombar ou perda de lordose lombar. Espasmo
muscular pode ser proeminente em região paravertebral e é geralmente assimétrico. Percussão
das apófises espinhosas ajuda a localizar estruturas dolorosas, o que sugere doença de um
segmento específico da coluna.
As sacroilíacas podem ser palpadas e percutidas à procura de sensibilidade direta.
Sensibilidade indireta pode ser demonstrada colocando-se o paciente deitado de lado e
aplicando-se força contra o ilíaco lateralmente. Tanto a pesquisa de sensibilidade direta como
indireta são manobras insensíveis, ajudando muito pouco na separação da dor lombar de origem
em sacroilíacas daquelas originárias em outros pontos.
A coluna cervical deve ter sua mobilidade examinada, incluindo-se flexo-extensão,
rotação e inclinação lateral. Os processos espinhosos de C2 a C7 devem ser palpados.Em
pacientes com suspeita de doença radicular, deve-se utilizar a manobra de Spurling, na qual a
cabeça é inclinada para o lado dos sintomas, aplicando-se uma pressão no topo. Se, com a
pressão aplicada, existir reprodução ou agravamento de uma cervicobraquialgia, diz se que a
manobra é positiva. Pacientes com queixas referentes à coluna cervical devem ter exame
neurológico de membros superiores e inferiores para que a avaliação seja completa.
A coluna torácica é responsável pelos movimentos de rotação do corpo os quais devem
ser testados. A mobilidade costovertebral pode ser avaliada medindo-se a circunferência do
tórax em inspiração e expiração (a diferença em jovens é de 5 a 6 cm).
Os movimentos da coluna lombar são de flexão e extensão. Uma boa observação de
mobilidade do segmento lombar é feita pedindo-se para que o paciente se incline para a frente,
como se tentasse tocar o solo, mantendo os joelhos retos. O que ocorre normalmente é um
apagamento e posterior reversão da lordose lombar. A manobra de Lasègue serve para testar a
existência de pinçamento da raiz nervosa ao nível da coluna lombar. Nesta manobra procede-se
ao levantamento de uma das pernas estando o paciente deitado. Se houver pinçamento,
aparece dor no membro testado provocada pelo estiramento da raiz nervosa pinçada. Um teste
positivo tem o seu valor aumentado quando a dor é agravada pela dorsiflexão do tornozelo ou
aliviada pela flexão do joelho, o que também é chamado de contra-manobra de Lasègue.
O teste de Schober é uma medida da flexibilidade lombar. Duas marcas são feitas
verticalmente a partir do bordo superior do sacro, separadas pela distância de 10 cm. O paciente
é instruído para inclinar-se para a frente sem flexionar os joelhos. A distância entre as duas
54
marcas, que inicialmente era de 10 cm, alonga-se para 15 ou 16 cm. (Diz-se que o paciente tem
um índice de Schober de 10/15 ou 10/16). Se o paciente tiver um defeito de flexão esta distância
estará encurtada. Assim como na coluna cervical, o exame da coluna lombar só será completo
quando a avaliação neurológica de membros inferiores for feita. Esta última auxilia em muito na
localização da raiz nervosa pinçada.
Se a queixa for axial, separe as síndromes por localização: cervical, dorsal e lombar.
Queixas cervicais podem ser divididas em cervicalgias, cervicobraquialgias e dor predominante
no ombro mas com irradiação cervical. Suas causas estão lá no capitulo 27. Dor na coluna
dorsal é interpretada como dorsalgia e na região lombar é dividida em lombalgia e
lombociatalgia. A lombalgia, por sua vez, deve ser separada em mecânica e inflamatória.
Tente exercitar estas diferenciações e você vai ver que vale a pena. No quadro abaixo
uma divisão das principais síndromes.
56
AR- Mão com desvio ulnar Vasculite periungueal Raynaud grave e isquemia
Lúpus eritematoso sistêmico digital - Esclerodermia
3- exame das metacarpofalangianas: Primeiro peça ao paciente para dobrar os dedos e observe
as reentrâncias e saliencias formadas. Quando existe edema, as reentrâncias estão obliteradas.
Depois faça uma pressão sobre todas as metacarpofalangianas de uma só vez à procura de dor
(squeeze test). Se o paciente tiver dor, examine cada metacarpofalangiana individualmente nos
mesmo moldes das interfalangianas.
1- MANOBRA DE FINKELSTEIN
2- MANOBRAS PARA TUNEL DO CARPO - Podem ser feitas a manobras de Tinel e Phalen .
Na manobra de Tinel é feita percussão sobre a porção ventral do punho ( sobre o retináculo dos
flexores) e o paciente deve referir dor parestesicas nos três dedos médios (às vezes, também
no polegar, mas nunca no dedo mínimo). Na manobra de Phallen o paciente faz uma flexão
forçada dos punhos por 1 minuto. A resposta é a mesma.
EXAME DO COTOVELO
1- Na inspeção podem ser vistos: desalinhamentos, nódulos reumatoides (são comuns sobre a
ulna) e bursites olecranianas.
3- Palpe os epicôndilos mediais e laterais. Se houver dor no epicôndilo medial o paciente terá
cotovelo de golfista; se no lateral, de tenista.
EXAME DO OMBRO
4- Manobras para o ombro: existe um número muito grande de manobras para essa articulação.
Serão demonstradas aqui apenas duas: a do arco, para tendinite do supra espinhoso e/ou bursite
subacromial e a de Yergason para tendinite do bíceps.
Na manobra do arco pede-se ao paciente para realizar um arco de 180º com o braço. Dor entre
60º e 120º significam tendinite do músculo supra espinhoso ou bursite subacromial.
Na manobra de Yergason, pede-se para o paciente, com o cotovelo fletido, fazer uma prono-
supinação do antebraço contra resistência do examinador. Se houver tendinite do bíceps aparece
dor no local do tendão do referido músculo.
Manobra de Yergason
Manobra do arco
63
EXAME DA COXOFEMURAL
EXAME DO JOELHO
1:Inspeção: observe desalinhamentos, aumentos de volume anteriores e posteriores (edema
da articulação ou bursites pré-patelar, ou ainda, cisto de Baker)
2- Palpação: sinta a temperatura do joelho. Lembre que o joelho tem uma temperatura inferior a
do resto do corpo (como nariz de cachorro). Se a temperatura estiver igual, já é sinal de artrite.
Depois procure por edema fazendo uma pressão sobre a patela. Em casos de edema ela bate
na estrutura óssea psoterior e sobe novamente como uma pedra de gelo (sinal da tecla). Você
também pode fazer pressão num dos lados do joelho para acumular o liquido do outro e fazer
uma expressão com o dorso da mão a procura de visualização de uma onda liquida.
EXAME DO TORNOZELO
Calos nas solas dos pés por causa de Diferença de crescimento de dedos em
metatarsianos caidos pacientes com artrite idiopática da infância
68
2- a palpação das metatarsofalaginas é feita com um aperto sobre todas elas juntas. Caso o
paciente tenha dor, a palpação individual, de cada articulação deverá ser feita
EXAME DA COLUNA
4- Manobra de Spurling
EXAME DA TÊMPORO-MANDIBULARv
No manejo de um paciente com qualquer tipo de artrite não infecciosa, na primeira linha
de medicação a ser usada, está o anti-inflamatório não hormonal (AINH). Atualmente existe um
número muito grande de anti-inflamatórios não hormonais e, acredita-se que, em termos de
eficácia anti-inflamatória, as doses se equivalem. Assim, teoricamente, se alguém tomar um
grupo de pacientes com doenças de gravidade equiparável e fornecer-lhes AINHs em doses
comparáveis, a mesma porcentagem deles deverá ter uma boa resposta. Entretanto, no dia a
dia, não é bem esta a impressão clínica. Nota-se, comumente, que a resposta de um indivíduo
frente certa droga é variável. Alguns têm resposta na primeira semana. Outros, usando a mesma
droga, na mesma dose, só irão responder dentro de 3 a 4 semanas. Outros, ainda, nunca
responderão. Esta variabilidade individual na resposta está provavelmente relacionada com o
tempo de meia vida, dose, tipo de metabolismo, mecanismo de ação, assim como, toxicidade
da droga em questão.
Ao escolher um desses medicamentos o médico deve sempre observar algumas
“regrinhas de ouro” que ajudam o paciente a aderir melhor ao tratamento. Aqui vão elas:
1- Deve-se incluir, sempre, na anamnese, informações sobre o uso de drogas anteriores e uma
cuidadosa história de reações a drogas. Assim, evita-se a prescrição dos anti-inflamatórios que
tenham causado efeitos colaterais importantes ou tenham sido motivo de falha em tratamento.
2- Deve-se escolher sempre o anti-inflamatório com uma meia vida apropriada ao caso que se
vai tratar. A importância da meia vida da droga é que ela determina com que frequência esta
droga deve ser utilizada. Ora, o número de vezes por dia que uma pessoa deve ingerir
medicamentos pode ser de importância no sucesso do tratamento. Existem estudos que
mostram que, indivíduos que tomam medicamento uma ou duas vezes por dia, o fazem mais
regularmente do que aqueles que têm uma prescrição para quatro vezes ou mais ao dia. Não se
pode esquecer de que, não é raro o fato de o paciente precisar usar remédios para outras
doenças associadas, como por exemplo, para diabetes, insuficiência cardíaca etc. Aliás, este é
um fato até bem frequente nas pessoas idosas com osteoartrite, por ex. Assim, quanto mais
simples for o esquema posológico, maior a garantia de que o paciente adere a ele.
Por outro lado, medicamentos de meia-vida longa, levam muito mais tempo para atingir
o nível sanguíneo terapêutico e não são boa escolha quanto o processo inflamatório é muito
grande, com bastante dor, na qual o paciente, não pode “se dar ao luxo” de esperar vários dias
pelo seu efeito total. Exemplos bem comuns deste tipo de situação são as crises agudas de gota
e de bursites. Nestas últimas situações é melhor optar por um medicamento de meia vida curta,
que, embora tenha que ser tomado mais frequentemente, com certeza agirá mais rápido.
bem mais tempo para aparecer, de tal maneira que é de bom esperar algum período de tempo
antes de considerar uma droga insatisfatória.
FARMACOCINÉTICA
Todas estas drogas possuem uma absorção boa e relativamente rápida. O uso
concomitante com a alimentação prejudica um pouco a sua absorção, mas, por outro lado,
diminui consideravelmente a toxicidade gástrica, de maneira que, vale a pena mandar tomar
estes medicamentos junto com as refeições. A neutralização do suco gástrico, com aumento do
seu pH (ex.: uso de antiácidos) torna os AINHs mais hidrossolúveis e, por isso, diminui sua
absorção pela mucosa gástrica.
A maioria destes medicamentos circula fortemente ligada a proteínas plasmáticas,
existindo apenas uma pequena fração livre. É esta porção livre que corresponde à porção
farmacologicamente ativa. A parte livre e a parte ligada com a albumina estão em constante
equilíbrio. Assim que a porção livre é metabolizada, a albumina libera algumas das moléculas de
AINH para manter o nível plasmático constante, funcionando como um verdadeiro reservatório
da droga. É importante saber isto para entender a ocorrência de interação medicamentosa que
pode acontecer quando se faz uso concomitante de outra droga que também se ligue
fortemente à albumina. Esta segunda droga, por ocupar o espaço de ligação com a albumina,
fará com que a porção livre do AINH aumente, seja rapidamente metabolizada e eliminada, di-
minuindo o efeito dele esperado. Esta é uma justificativa para que se evite usar uma associação
de anti-inflamatórios entre si.
O fato de existir um maior aporte sanguíneo em pontos de inflamação, concentra a
droga aonde ela é mais necessária. Além disso, o baixo pH do local inflamado, dissocia a droga
74
da albumina, aumentando a sua penetração celular.Os AINHs são metabolizados pelo fígado e
os metabólitos (já inativos) são eliminados pelo rim.
A meia vida dos AINHs varia bastante, mas, de uma maneira geral, eles podem ser
divididos em AINHs de meia vida curta (menos que 6 horas) e longa (mais do que 6 horas). É a
meia vida da droga que determina o número de tomadas e o tempo que a droga leva para atingir
o pico de ação como já foi comentado. Os AINHs de meia vida longa acumulam-se no plasma de
maneira significante quando administrados em longo prazo. Por outro lado, demoram em atingir
um plateau de concentração, a menos que se dê uma dose de ataque. Isto decorre do fato de
que a 1/2 vida de concentração é igual à 1/2 vida de eliminação, e, atinge-se 90% do valor do
plateau após um tempo de mais ou menos 3 meias vidas. Assim, a fenilbutazona leva 10 dias
para atingir o seu plateau, enquanto que, o naproxeno leva 2 dias. Portanto, quando alguém
quer um efeito rápido da droga, para tratar, por exemplo, uma crise aguda de gota, que é uma
situação de muita dor e inflamação, e, sobre a qual se quer ter uma ação pronta, deve utilizar
um anti-inflamatório de ação curta. Caso o anti-inflamatório escolhido seja o de 1/2 vida longa,
deve-se fazer uma dose de ataque, supra-farmacológica.
Em pacientes idosos deve-se preferir AINHs de meia vida curta, como por exemplo, o
ibuprofeno, dadas as dificuldades de metabolismo próprias da idade. É importante salientar que
a 1/2 vida da aspirina é dose dependente. Isto acontece, em dose baixa, porque o nível do ácido
acetilssalicílico aumenta de acordo com a taxa de administração. Em doses altas, entretanto,
existe um aumento desproporcional do nível sérico, uma vez que os sistemas enzimáticos
envolvidos no seu catabolismo se tornam saturados.
MECANISMOS DE AÇÃO
Uma longa lista de mecanismos de ação tem sido sugerida. Nela se incluem efeitos em
virtualmente todos os fenômenos conhecidos que ocorrem durante o processo de inflamação.
Os principais mecanismos propostos são:
dias. Quanto aos demais AINHs, à medida que a droga é excretada e a sua ligação com a ciclo-
oxigenase é desfeita, a função plaquetária retorna ao normal.
A inibição da COX-2 não modifica apenas o processo inflamatório. Esta enzima atua,
também, no processo imune específico porque é importante para a elaboração de citocinas
como IL-2, TNF- e γ INF, as quais agem nos estágios iniciais da ativação do linfócito T. A indústria
farmacêutica tem trabalhado para desenvolver anti-inflamatórios que bloqueiam apenas, ou
pelo menos principalmente, a COX-2. Assim, procura-se diminuir um número razoável dos
efeitos colaterais. Exemplos destas drogas são os coxibes (celecoxibe, etorecoxibe valdecoxibe,
lumiracoxibe etc). Realmente, os efeitos gástricos indesejáveis melhoram muito com estes
medicamentos. Infelizmente muitos deles aumentam a chance de um evento coronariano, o que
acaba não sendo vantagem para o paciente.
Originalmente pensou-se que os AINHs não tinham efeito na via lipo-oxigenase, a qual
leva à formação de leucotrienos e lipoxinas, que também são mediadores do processo
inflamatório. Embora não se tenha conseguido provar que os AINHs ajam na via das lipo-
oxigenases existem alguns experimentos que apontam para esta possibilidade.
Ação sobre a função dos neutrófilos - Os neutrófilos, como já foi estudado, são figurinhas
essenciais no processo inflamatório. Além de gerarem prostaglandinas e leucotrienos durante o
processo de fagocitose, agem liberando enzimas lisossômicas, como p.ex, colagenases,
elastases, catepsina, etc, que são capazes de destruir não só o elemento invasor, mas, também
tecidos subjacentes. Estas enzimas degradam o colágeno e possivelmente até o osso pe-
riarticular. Em somatória a tudo isto, os PMNs liberam radicais superóxido que são altamente
destrutivos para o osso e cartilagem. Os AINHs se inserem dentro da membrana dos neutrófilos
e por um processo físico-químico perturbam as interações dele com o meio externo, interações
essas que são fundamentais para a sua função. Além disto, tem sido descrito que eles causam
uma diminuição na produção de L-selectina, uma molécula de adesão que faz a aderência do
neutrófilo à célula endotelial e assim auxilia na sua chegada ao local de inflamação.
76
Inibição de fatores de transcrição dependentes do NFB. Um dos elementos que são inibidos
aqui é a sintetase do óxido nítrico. Esta enzima produz oxido nítrico em altas quantias e este,
por sua vez, é responsável por aumento do processo inflamatório (faz vasodilatação, aumento
de permeabilidade vascular, etc.)
Atuação sobre a apoptose celular. A apoptose celular (ou morte celular programada) é inibida
pelas prostaglandinas e esta inibição favorece o aparecimento de tumores. Os AINHs, ao
inibirem as prostaglandinas, teriam um efeito de restauração da apoptose, livrando o organismo
destas células anômalas. Existem alguns estudos mostrando que certos AINHs (principalmente
AAS e sulindaco) atuam diminuindo o tamanho de pólipos intestinais em casos de polipose
familiar (que é uma situação que precede o câncer colo-retal).
EFEITOS COLATERAIS
GASTRINTESTINAIS - A maioria dos AINHs (na verdade, todos eles, com exceção dos salicilatos
não acetilados) é tóxica para o aparelho gastrintestinal. As manifestações mais comuns são
dispepsia, azia, náuseas, vômitos, diarréia e constipação. Se algumas formas deste grupo de
fármacos são mais seguras que outras, é assunto debatido. O problema é que existem muitos
estudos que não podem ser comparados entre si pelo alto número de variáveis em jogo (seleção
de pacientes, administração da droga, critérios para toxicidade etc...).
Como a doença péptica pelo AINH é, sob muitos aspectos, diferente da doença péptica
clássica, cunhou-se o termo GASTROPATIA POR AINH para designá-la. Quando se compara a
gastropatia por AINH com a doença péptica clássica, nota-se que ela é mais comum em mulheres
que nos homens e que tende a promover lesões mais antrais e pré-pilóricas. Fatores
contribuintes para seu desenvolvimento são: o uso de cigarro, álcool, administração
concomitante de outras drogas (principalmente corticoides, mas também, inibidores de re-
captação da serotonina e anticoagulantes), doenças debilitantes e idade avançada.
QUADRO 4.2 - DIFERENÇAS ENTRE GASTROPATIA POR AINH E DOENÇA PÉPTICA CLÁSSICA
GASTROPATIA P/AINH DOENÇA PÉPTICA CLÁSSICA
Antral, prépilórica Duodenal
Mulheres/velhas Homens /jovens
Tto com citoproteção Tto c/supressão da formação e neutralização de ácidos
Assim como na doença clássica, existe uma falta completa de correlação entre as
queixas apresentadas pelo paciente e as evidências endoscópicas de lesão.
Preste atenção neste aspecto!!!
Pode-se ter erosões graves ou mesmo perfuração e hemorragia, sem queixas gástricas
anteriores, enquanto que, outros pacientes com desconforto importante, têm endoscopia
normal.
QUADRO 4.3 - SITUAÇÕES NAS QUAIS A PRESCRIÇÃO DE AINHs DEVE SER ACOMPANHADA DE
PROFILAXIA DE GASTROPATIA
Hx de evento gastrintestinal prévio;
Usuários acima de 60 anos;
Dosagem alta de AINHs (↑ de 2 X o normal);
Uso concomitante de glicocorticoides e anticoagulantes.
Os AINHs, mesmo quando não utilizados por via oral, podem causar inibição da ciclo-
oxigenase, gástrica, uma vez que chegam na mucosa gástrica pela via sanguínea, produzindo
erosões. É claro que, quando usados pela via oral, este efeito é maior, por se fazer tanto
localmente como por via parenteral. Se a presença do H. pylori aumenta, ou não, o risco de
gastropatia num paciente que usa AINH é fato debatido. Os estudos feitos têm muita dificuldade
em separar as melhorias trazidas pela erradicação do H. pylori daquelas causadas pela proteção
trazida pelo uso de inibidores de bomba de prótons (que são usadas no tratamento desta
infecção).
Como as prostaglandinas também influenciam na função do trato gastrintestinal
inferior, o uso de AINH pode trazer diarreia, constipação, dor abdominal em cólica e
sangramento de divertículos pré-existentes. Estreitamentos esofagianos têm sido descritos.
Para se evitar isto, deve se pedir que o paciente tome o comprimido com bastante água e que
não se deite imediatamente após a ingestão do mesmo. Lesões intestinais são mais comuns em
AINHs com circulação êntero-hepática. Eles causam um aumento da permeabilidade na mucosa
intestinal e facilitam o supercrescimento bacteriano. Em intestino grosso, existe uma lesão típica
da lesão de AINH, no qual se forma um estreitamento da luz intestinal, em formato de
diafragma, que pode ser causa de obstrução intestinal. Na realidade, ulcerações podem ser
vistas em todas as porções do aparelho gastrintestinal, da boca ao ânus. Em vista disso, existe a
sugestão de que o termo gastropatia por anti-inflamatório seja trocado por outro, mais amplo,
como gastroenteropatia pelo AINH.
Por último, embora os AINHs possam ser causa de sangue oculto positivo nas fezes, este
achado não deve ser atribuído só ao uso da droga. Caso isto aconteça o médico pode não
procurar outras causas, e perderá, assim, a chance de detectar outras formas de lesão. Não é
porque alguém faz uso de AINH que fica isento de ter, por exemplo, um câncer de intestino ...
É na procura de minimizar os efeitos gástricos dos AINH assim, como os outros efeitos
colaterais dependentes da inibição de prostaglandinas, que se desenvolveu um tipo de
inflamatório que inibe seletivamente a COX-2, deixando intacta a COX-1, a qual continuaria a
desempenhar a sua função de elaborar prostaglandinas protetoras do aparelho gastrintestinal.
Embora os inibidores de COX-2 realmente sejam menos agressivos para a mucosa gástrica, não
se deve esquecer que a COX-2 é importante para a regeneração de tecidos que já estão lesados
e que úlceras pépticas previamente existentes não cicatrizam com a mesma facilidade na
vigência do uso destes medicamentos.
79
FIGURA 4.2- Vasculite de pequenos vasos por uso de diclofenaco. A lesão em pernas(
segunda figura) é clássica de púrpura palpável.
81
SISTEMA NERVOSO CENTRAL - A toxicidade dos AINHs para o lado do SNC passa
frequentemente despercebida, particularmente no idoso. Neste grupo etário, o início de
qualquer disfunção cognitiva não explicada requer a retirada da droga, pelo menos
temporariamente. A indometacina, por ter um núcleo indólico lembrando a serotonina, causa
reações de S.N.C. particularmente frequentes, tais como cefaleia, tonturas, sonolência e
ocasionalmente psicose. Outra reação bem conhecida é a meningite asséptica causada pelo
ibuprofeno ou tolmectin em pacientes com LES ou doença mista do tecido conjuntivo.
Vários AINHs pode ser encontrados em forma de cremes, géis, sprays etc... Dependendo
da molécula e do meio de diluição, a penetração da droga por via cutânea pode ser extensa.
Todavia, na maioria das vezes, as concentrações plasmáticas tendem a ser bem mais baixas do
que aquelas atingidas com uso oral, embora concentrações sinoviais possam ser similares nas
duas situações. Vários estudos têm demonstrado que esta forma de aplicação é efetiva no alívio
dos sintomas de pacientes com osteoartrite. Desta maneira, em situações com poucos sítios
anatômicos envolvidos e de baixo componente inflamatório, esta é uma opção de tratamento.
INTERAÇÃO MEDICAMENTOSA
Nenhum anti-inflamatório não hormonal é aprovado para uso em gravidez, desde que
os estudos a respeito de sua segurança nesta situação são impossíveis. O efeito sobre vasos
pulmonares do feto é objeto de preocupação e casos de fechamento precoce do ducto arterioso
com hipodesenvolvimento das extremidades inferiores têm sido descritos, assim como casos de
hipertensão pulmonar. Se tiver que ser usado, a mãe deve estar ciente dos riscos; seu uso deve
limitar-se ao 3º trimestre da gravidez e descontinuado algumas semanas antes da data prevista
para o parto porque estas drogas inibem o trabalho de parto e trazem risco de hemorragia tanto
para a mãe como para o feto. Todos estes efeitos são dependentes da inibição de
prostaglandinas. Todavia, estes medicamentos não são indispensáveis. Então, por que usá-los
na gravidez? Efeitos analgésicos podem ser obtidos de drogas mais seguras como o paracetamol.
Se a ação anti-inflamatória for necessária pode-se utilizar glicocorticoides - como será visto mais
tarde.
Referências:
Bakowski V, et al. COX-2 inhibition: not too hot, not too cold. Perhaps just right? J Rheumatol 2001; 27:2734-7.
Hocheberg MC. NSAIDs: patterns of usage and side effects. Hosp Prac 1989, 24:167-74
Lanza, FL. A guideline for the treatment and prevention of NSAID-induced ulcers. Members of the Ad Hoc Committee on Practice
Parameters of the American College of Gastroenterology. Am J Gastroenterol. 1998; 93 :2037-46.
Moore RA. Topical nonsteroidal antiinflamatory drugs are effective in osteoartritis of the knee. J Rheumatol 2004, 31:1893-5.
83
Capítulo 5- Glicocorticoides
METABOLISMO
Quando estas drogas são administradas por via oral, a absorção é feita em jejuno
superior. Grande parte da mesma circula ligada a proteínas plasmáticas que são a albumina e a
transcortina (que é uma -globulina). O resto circula livre, sendo que esta porção livre que
difunde para os tecidos e é responsável pelo efeito biológico da droga. A proporção com que
84
cada corticoide se liga a transcortina varia. Assim, com o cortisol, só 10% da droga está livre para
se difundir, ao passo que com a dexametasona, esta ligação quase não existe, o que explicaria
em parte a grande potência da dexametasona em comparação com o cortisol. Além da
transcortina, os corticoides se ligam à albumina como já foi mencionado. Existindo menos
albumina para se ligar à droga, a taxa livre aumenta. Alguns estudos mostram que, quando a
albumina baixa de 2,5 mg%, os efeitos colaterais da droga dobram. Não se esqueça de que é a
parte livre, a responsável não só pelos efeitos farmacológicos como, também, pelos efeitos
colaterais. Pacientes com hipoalbuminemia devem, portanto, receber uma dose menor de
corticoide.A metabolização deste tipo de droga é feita através do fígado por uma conjugação
irreversível com o ácido glicurônico. As enzimas de conjugação estão sujeitas a indução por
drogas como fenitoína, barbitúricos, rifampicina etc. A excreção é feita pelo rim. O clearance
dos corticoides está diminuído em pacientes com hipotireoidismo.
INTERAÇÃO MEDICAMENTOSA
Existem consideráveis evidências de um número de drogas, que têm efeito sobre a ação
do corticoide. Como já foi dito, muitas drogas, por estimular a proliferação do retículo
endoplasmático hepático, o qual produz enzimas microssomiais hepáticas, acabam acelerando
a degradação metabólica da droga e diminuem a sua resposta. Estrógenos (p.ex. os usados nos
anticoncepcionais) aumentam a concentração total de prednisolona (tanto a livre quanto a
ligada à proteína) por diminuir o seu clearance e a afinidade da albumina e transcortina pela
droga.
Dentre os componentes que têm a sua síntese reduzida pelos glicocorticoides estão
várias citocinas como a IL-1, IL-2, IL-4, IL-6, INF- e o TNF-. A inibição de síntese do TNF- é
extremamente sensível à ação do glicocorticoide, ou seja, ocorre quando pequenas doses são
utilizadas ou, até mesmo, quando acontece um pequeno aumento do nível sérico devido às
variações fisiológicas vistas durante o ritmo circadiano de secreção de cortisol endógeno.
Terapeuticamente esta inibição do TNF- é descrita, inclusive, após uso de glicocorticoide intra
articular. É a inibição sobre a formação de TNF- que explica, pelo menos parcialmente, as
alterações na expressão de certas moléculas de adesão. Já a IL-6 é mais resistente à supressão
e é o rebote na sua produção durante a retirada do corticoide que parece ser o componente
responsável pela clínica vista na chamada síndrome da retirada do corticoide e em casos de
insuficiência suprarrenal. (Veja esta síndrome mais adiante em efeitos colaterais dos
glicocorticoides).
A ação do corticoide sobre a IL-6 diminui a formação dos reagentes de fase aguda e,
portanto, diminui a VHS e proteína C reativa do paciente que o utiliza.
Resumindo: a ação genômica dos glicocorticoides pode ser feita diretamente sobre o
DNA ou em nível de pré-transcrição genética (NF-B) ou, ainda, em nível de pós-transcrição.
Estas ações se fazem sentir aumentando ou diminuindo o produto da transcrição genética.
Mecanismos de ação não genômica mediada por receptor - Pelo que já foi dito anteriormente,
sabe-se que este mecanismo exige doses mais altas de glicocorticoides e que seus efeitos
aparecem mais rapidamente do que os efeitos genômicos, uma vez que não requerem a síntese
de novas proteínas. Levam de segundos a 2 minutos para serem sentidos. Aparecem com a
ligação dos glicocorticoides em receptores de membrana que são receptores diferentes dos
intracitoplasmáticos já comentados anteriormente.
Entre os efeitos mediados por este mecanismo pode-se citar: o feedback negativo ao
ACTH, supressão da prolactina, efeitos sobre estabilização de membranas, efeitos
cardiovasculares e de comportamento, indução de apoptose e, possivelmente, a ação anti-
anafilática dos glicococorticoides.
Mecanismos de ação não genômica mediada por ações físico-químicas - Este mecanismo de
ação exige doses muito altas de glicocorticoide (como as usadas em pulsoterapia) e é o que
aparece mais rapidamente. É responsável por uma diminuição no transporte de sódio e de cálcio
através da membrana citoplasmática, o que explica uma queda no consumo de ATP e uma
87
diminuição do cálcio citosólico. A ação dos glicocorticoides sobre a membrana interna das
mitocôndrias justifica um aumento de sua permeabilidade aos prótons, com consequente
distúrbio no processo de fosforilação oxidativa. Este tipo de mecanismo pode ser explicado
pela dissolução do próprio glicocorticoide nas membranas celulares alterando as suas
propriedades físico-químicas e a atividade das proteínas ligadas a elas. Acredita-se que os
esteroides se encaixam entre as duas camadas fosfolipídicas da membrana celular graças a sua
lipofilia e polaridade.
É interessante lembrar que o cálcio intracitoplasmático é essencial para proporcionar e
manter ativação linfocitária. Assim sendo, este mecanismo pode explicar o sucesso obtido com
as chamadas terapias de pulso utilizadas para tratamento de doenças imunologicamente
mediadas nas quais se somam, mais tarde, os efeitos genômicos que prolongam e completam a
ação terapêutica destes medicamentos.
O esclarecimento destas formas de ação dos glicocorticoides permite uma interpretação
correta das modalidades de uso deste medicamento. Assim, ao se administrar uma dose mais
alta do medicamento não se pode supor que exista apenas um aumento quantitativo do seu
efeito terapêutico, e sim, uma contribuição qualitativa adicional.
A potência de um dado corticoide varia de acordo com (a) potência biológica intrínseca
da droga; (B)- duração de ação da droga. Deve-se, aqui, separar a duração de ação da droga do
tempo de meia vida plasmática. Isto porque é notório o fato de que o corticoide, mesmo depois
de desaparecer da circulação entra na célula e, ligado ao receptor, continua a agir.
No quadro 5.1 veja a lista dos mais usados, sua potência e equivalência de doses.
EFEITOS DA DROGA
Linfócitos: A linfocitopenia induzida no homem pelo uso do corticoide parece ser o resultado
(pelo menos parcialmente) de uma redistribuição temporária dos linfócitos para fora do
compartimento intravascular, os quais ficam armazenados em tecidos linfocitários.
Mostrou-se que os glicocorticoides agem principalmente sobre os linfócitos T re-
circulantes tendo bem menos efeito sobre os linfócitos B. Como o corticoide causa esta redis-
tribuição não é bem sabido, mas estas alterações parecem se dever a alterações produzidas na
produção e expressão de moléculas de adesão da superfície das células linfoides.
Monócitos: Os glicocorticoides produzem profunda depleção dos monócitos no sangue
periférico. Esta monocitopenia parece se dever a alterações produzidas na redistribuição das
células (semelhante ao que acontece com os linfócitos, só que os monócitos são mais sensíveis).
Neutrófilos: Os corticoides produzem neutrofilia através do aumento da liberação dos PMNs da
medula óssea e redução de sua migração para fora dos vasos. Os esteroides inibem a capacidade
dos PMNs se marginalizarem e aderirem à parede do vaso (e isto é um pré-requisito para que
migrem para os tecidos). Isto faz com que o neutrófilo não tenha acesso ao local da inflamação.
Eosinófilos: Eosinopenia induzida por corticoide parece se dever ao mesmo mecanismo de
redistribuição para fora do compartimento intravascular, semelhante ao descrito para os
linfócitos.
A diminuição do acúmulo de neutrófilos associada à diminuição de monócitos no local
da inflamação é o principal mecanismo responsável pela ação anti-inflamatória dos
glicocorticoides.
100000
10000
1000
Células/mm3
100
10
1
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11
EFEITOS SOBRE A FUNÇÃO LEUCOCITÁRIA - Além de agir sobre o trânsito dos leucócitos os glico-
corticoides têm efeito sobre o desempenho do leucócito. Alguns exemplos são:
-supressão das respostas cutâneas de hipersensibilidade retardada, por diminuição do
recrutamento dos macrófagos necessários à expressão da hipersensibilidade. Isto aparece 14
dias após o início do uso da droga e desaparece mais ou menos seis dias depois da retirada da
droga.
- os glicocorticoides antagonizam o efeito do MIF (migration inhibition factor) nos
macrófagos por impedir que estes mediadores solúveis recrutem células necessárias à resposta
imunitária celular.
EFEITOS COLATERAIS
sendo mais rápida em crianças. A retirada do corticoide quando a doença básica o permite, deve
ser feita lenta e gradualmente e com, frequentes reavaliações do paciente.
Não se deve confundir casos de insuficiência suprarrenal com a chamada síndrome da
retirada do corticoide, na qual o paciente apresenta mialgias, artralgias, náuseas, anorexia,
hipotensão postural e letargia. Os níveis séricos de glicocorticoides são normais. Esta síndrome
em muito contribui para a dependência psicológica da droga. O horário de administração do
glicocorticoide influi no grau resultante de atrofia de suprarrenal, a despeito da dose. O ACTH
tem um ritmo de secreção diário que é o seguinte: a secreção começa em torno de 1-2 horas da
manhã e faz pico em torno das 6 da manhã, baixando a seguir durante toda a tarde e noite para
níveis bem baixos. Sincronizando-se a administração do corticoide exógeno com o ciclo natural
a gente expõe os tecidos do paciente a estes agentes nos "períodos normais do dia". Não se
sabe porque, mas isto reduz em muito os efeitos do tratamento sobre o eixo hipotálamo
hipofisário.
B
C
A D
E G
F
FIGURA 5.6 - Efeitos colaterais dos glicocorticoides. (A) supressão do crescimento; (B)
catarata; (C) pele fina e friável; (D) obesidade central e estrias; (E) Herpes Zoster; (F) Necrose
óssea asséptica do quadril; (G) Giba cervical.
91
REGIMES TERAPÊUTICOS
Se bem que o corticoide seja temido (e com razão) pelos seus efeitos colaterais, não resta
dúvida de que ele tem sido também uma verdadeira "tábua de salvação" para muitos pacientes
com doenças graves.
REGIME DE DOSE ALTA DIÁRIA - Diz-se, arbitrariamente, que a dose é alta quando ultrapassa
0,2 mg/Kg/dia de prednisona ou equivalente. Aqui, os efeitos colaterais são importantes, com
aumento de susceptibilidade do paciente a certas infecções (estafilococos, gram negativos,
tuberculose, listeriose e estrongiloidíase disseminada). Em situações que se deseja obter efeito
anti-inflamatório máximo deve-se parcelar a dose em tomadas a cada 6 horas (embora neste
esquema o risco de supressão de suprarrenal é maior).
REGIME EM DOSE BAIXA DIÁRIA - É quando a dose é menor que 0,2 mg/kg/dia de prednisona
ou equivalente. Nesta situação os testes de hipersensibilidade retardada permanecem intactos
(especialmente se a dose total está abaixo de 5 mg/dia de prednisona), assim como, o risco de
supressão de supra renal é bem menor. Geralmente este esquema é usado para tratamento de
sinovite quando os AINHs não são suficientes, ou quando apresentam efeitos indesejados,
principalmente os gástricos.
excluir infecção sempre que uma articulação for infiltrada. Quando se procede à infiltração com
corticoides, existe o risco de que ocorra uma reação inflamatória precipitada por cristais de
corticoide, a qual pode ser tratada com compressas de gelo e com anti-inflamatórios não
hormonais. Outra preocupação é a ocorrência de uma artrite séptica secundária, a qual é mais
comum em pacientes com artrite reumatoide do que os com osteoartrite. A incidência de sepsis
secundária é baixa. Nos casos em que isto acontece, a infecção tende a se manifestar de maneira
subaguda, aparecendo em semanas até 2-3 meses pós-injeção. Um efeito colateral
relativamente comum é a queixa de sensação de flush facial que aparece em até 10% dos
pacientes que fazem injeções em joelhos por causa de osteoartrite e que tende a recorrer
quando o procedimento é repetido.
USO DO CORTICOIDE EM PACIENTE PEDIÁTRICO - Os efeitos mais graves em crianças são su-
pressão do crescimento e desenvolvimento de cataratas. Este medicamento só deve ser
utilizado em crianças quando não existe outra terapêutica alternativa e, sempre que a doença
básica o permita, deve-se passar para regime em dias alternados.
USO DO CORTICOIDE EM PACIENTES GRÁVIDAS - Deve ser utilizado com cuidado se a paciente
tem tendência para retenção hídrica ou eclâmpsia. Um número de experimentos em animais
mostra que a droga é teratogênica. Entretanto, os seres humanos possuem uma enzima
placentária (a 11 dehidrogenase) que inativa grande parte da droga durante a passagem pela
placenta. Assim sendo, o feto recebe apenas 10% da dose administrada à mãe. Isto não acontece
com a betametasona e com a dexametasona, as quais atingem o feto em altas proporções. Por
isso, em situações em que o bebê necessita tratamento com corticoide (para acelerar maturação
pulmonar em casos de prematuridade ou risco de bloqueio cardíaco congênito em lúpus
neonatal) deve-se preferir estes dois últimos compostos. Existem autores que preferem o uso
da betametasona sobre o da dexametasona porque foram descritos alguns casos de
leucomalácia periventricular com esta última droga. Todavia outros negam esta ocorrência.
Referências:
Buttgereit F et al. A new hypothesis of modular glucocorticoid actions. Arthritis Rheum 1998; 41:761 -67.
Derijk R et al. Exercise and circadian rhytm-induced variations in plasma cortisol differentially regulate interleukin-
1beta (IL-1 beta), IL-6 and tumor necrosis factor-alpha (TNF-alpha) production in humans: high sensitivity of TNF
alpha and resistance of IL-6. J.Clin Endocrinol Metab 1997; 82: 2182-91.
Doherty,M. Intra articular corticosteroid injection for OA. In Klippel JH, Dieppe PA. Rheumatology, vol.2, Mosby,
London, 1997, section 8, p:12-3.
Kirwan JR. The effect of glucocorticoids on joint destruction in rheumatoid arthritis. The Arthritis and Rheumatism
Council Low-Dose Glucocorticoid Study Group. N Engl J Med 1995; 333:142-6.
White,R. Preoperative evaluation of patients with rheumatoid Aathritis. Semin Arthritis Rheum 1985 ;14 :287-99.
93
Antimaláricos : Fazem parte deste grupo, a cloroquina e a hidroxicloroquina. Esses são, talvez,
os medicamentos mais fáceis de serem utilizados por serem os menos tóxicos e, também, os de
menor custo. De maneira geral, considera-se a hidroxicloroquina menos tóxica que a cloroquina
e, portanto, deve ser esta a forma preferida de administração.
Os antimaláricos, além de serem utilizados para o tratamento da artrite reumatoide, são
talvez muito mais úteis no tratamento do lúpus. Também são usados na síndrome do anticorpo
antifosfolípide, nas manifestações cutâneas da dermatomiosite e na síndrome de Sjögren.
Experimentalmente têm sido utilizadas no tratamento da osteoartrite. Além de atuar nas
doenças reumáticas, estas drogas diminuem o nível de lipídeos circulantes e agem como
antiagregantes plaquetárias. Seu uso é muito importante no tratamento do lúpus, onde tem
sido verificado que este medicamento evita os surtos agudos da doença e aumenta a sobrevida
dos pacientes. Nesta doença, os antimaláricos NÃO devem ser suspensos durante a gravidez;
acredita-se inclusive, que eles diminuam o risco de bloqueio cardíaco em filhos de mães com
lúpus e presença do anticorpo anti-Ro, que desenvolvem lúpus neonatal.
94
Como pode ser visto na tabela acima, muitos dos efeitos colaterais, principalmente os
gastrintestinais podem se confundir com os de anti-inflamatórios não hormonais. Estes efeitos
são menores quando se usa a hidroxicloroquina ao invés da cloroquina. Das lesões cutâneas
possíveis é importante ressaltar a descrição de piora de lesões de psoríase, o que contra indica
o uso destes medicamentos na artrite psoriásica. Já a fraqueza muscular pode ser confundida
com a fraqueza por miosite pela doença básica ou com miopatia por corticoide. Estudos
eletromiográficos em pacientes com miopatia pela cloroquina mostram um misto de miopatia
com alterações neuropáticas. A fraqueza aparece principalmente em porção proximal de
extremidades inferiores, mas pode progredir para extremidades superiores. As enzimas
musculares são normais e a biópsia muscular mostra alterações vacuolares. Reverte com a
retirada do medicamento. Uma síndrome tipo miastenia, inclusive com ptose palpebral,
também tem sido descrita e responde à retirada do medicamento.
De todos os efeitos colaterais, os mais preocupantes são os oculares. Depósitos em
córnea, fazendo a chamada córnea verticilata, não são raros, ocorrendo na maioria dos
pacientes que fazem uso da cloroquina e, em menor grau, daqueles que se utilizam da
hidroxicloroquina. Revertem com retirada da droga ou mesmo com uma diminuição de sua
dosagem. Estes não são graves. Já a retinopatia é bem mais grave porque é irreversível e porque
pode promover uma perda importante da capacidade visual. A droga se acumula em células
pigmentares da retina e promove lesão destrutiva em cones e bastonetes. Assim sendo todo
paciente em uso de antimaláricos deve usar preferencialmente a hidroxicloroquina e deve ser
acompanhado por um oftalmologista, independentemente de apresentar ou não sintomas. Os
achados precoces de uma retinopatia por cloroquina incluem alterações pigmentares perto da
mácula e perda do reflexo da fóvea. Quando a lesão está plenamente estabelecida forma-se um
halo pigmentar em volta da mácula, conferindo-lhe um aspecto de olho de búfalo; o disco ótico
fica pálido e as arteríolas mostram constrição segmentar.
As doses recomendadas são as de 5,0 mg/Kg/dia de hidroxicloroquina e 3,0mg/kg/dia
de cloroquina.
Não existe consenso quanto à frequência do exame oftalmológico nestes pacientes.
Alguns anos atrás se recomendava a realização de um exame oftalmológico semestral. Todavia,
esta conduta parece não ser custo-efetiva. O American Academy of Ophthalmology recomenda
que seja feita uma avaliação inicial (antes de ou logo após começar o medicamento). A partir dai
são indicadas avaliações dali a 5 anos e, depois disso, todos os pacientes devem ter um
acompanhamento mínimo de uma vez ao ano. Estas regras nãos e aplicam a pacientes idosos,
com disfunção renal e hepática, e olho único. Nestes casos o acompoanhamento mínimo é
anual. O tamoxifeno- uma droga usada no tratamento do câncer de mama aumenta a chance
de um antimalárico fazer retinopatia.
Por último, existem relatos de casos de ingestão de antimaláricos em altas doses com
intenção suicida, causando óbitos pelas complicações cardíacas.
A B C
FIGURA 6.1- Efeitos colaterais dos antimaláricos (A)- hiperpigmentação de mucosa;
(B)- hiperpigmentação de pele (C)- retinopatia em olho de búfalo.
96
Metotrexate - O metotrexate (MTX) é um antagonista do ácido fólico que interfere com a síntese
da timidina e, consequentemente, com a síntese do DNA. Desta maneira ele promove a morte
de células que se proliferam muito rápido (e esta é a razão do seu uso em psoríase e em câncer).
Isto o torna, também, uma droga imunodepressora. Todavia este último efeito é sútil no caso
de seu uso em artrite reumatoide, uma vez que a dosagem utilizada para tratamento desta
doença é bem baixa. Acredita-se, portanto, que seu efeito em artrite reumatoide não se deva às
suas propriedades antiproliferativas e, sim, aos seus efeitos inibidores em mediadores da
inflamação e de inibição de trânsito de leucócitos. Esta última propriedade aparece porque esta
droga promove a liberação de adenosina que é uma substância sabidamente inibidora da
migração dos leucócitos. Em várias doenças em que ele é usado existe uma melhora bem mais
rápida do que com uso de outras drogas (em 3 a 6 semanas) e quando suspenso, a recidiva da
doença também acontece logo.
Apesar do aparecimento de muitos medicamentos novos para tratamento da artrite
reumatoide, o metotrexate ainda é considerado como droga “padrão-ouro” no tratamento
dessa doença. Além da artrite reumatoide, ele é usado em artrite psoriásica, lúpus, polimiosites,
manifestações periféricas das espondiloartrites etc.
Na prática diária, o que se faz é começar com 7,5 mg a 10 mg/ semana e, aumentar a
dose rapidamente até um máximo de 20-25 mg/semana conforme a necessidade. Em
polimiosites refratárias tem sido usado até 50-60mg/ semana. Nestes casos prefere-se a via
subcutânea. O fato de se administrar esta droga em pequenos pulsos semanais diminui, em
muito, os seus efeitos colaterais. Este esquema de uso semanal, usado em reumatologia, é
“emprestado” da dermatologia, que utiliza esta droga para o tratamento da psoríase. O fato se
escolher o intervalo de uma vez por semana, está baseado em estudos de turnover de células
da pele e não tem, portanto, porque ser observado de maneira rígida no caso de tratamento de
pacientes reumáticos.
A rota de administração da droga pode influir nos resultados do tratamento já que a
administração subcutânea ou intramuscular confere níveis mais altos do medicamento,
principalmente quando se usam doses mais elevadas. Assim, quando um paciente responde
apenas parcialmente ao tratamento pela via oral, a mudança de via de administração pode
ajudar a chegar aos efeitos desejados.
Os efeitos colaterais advindos de seu uso são:
Intolerância gastrintestinal: encontrada logo após o uso. São encontrados vômitos,
náusea, estomatites, distúrbios transitórios da função hepática e diarréia. Acontece em
torno de 10% dos pacientes, e, nem todos necessitam suspender o tratamento. As
náuseas e vômitos ocorrem no primeiro dia após o uso; as estomatites podem aparecer
até 5 dias após.
Complicações hematológicas: são raras nas doses usadas em reumatologia. Constam de
leucopenias, anemia e trombocitopenia que aparecem em torno de 3% dos usuários.
Pacientes com função renal diminuída, idosos ou, ainda pessoas que usem
trimetroprim-sulfametoxazol concomitante, têm um risco maior de desenvolver
mielotoxicidade. Antes que um paciente venha a desenvolver anemia pelo uso de MTX,
o hemograma mostra o aparecimento de megaloblastose. Lembre-se de que esta droga
é antifólica.
Toxicidade hepática: é um dos problemas clínicos mais importantes dos associados à
terapêutica com metotrexate. Interessantemente parece ser mais comum quando este
medicamento é usado para tratamento de psoríase. O que acontece nesta situação é
um processo de fibrose hepática que nem sempre se traduz por alterações de provas de
função hepática. Pode aparecer em pacientes que sempre tiveram níveis normais de
transaminases, assim como, pode não ser visto naqueles que tiveram um aumento
transitório destas enzimas. Pacientes com diabetes, obesos, doença hepática prévia ou
alcoólatras estão mais sujeitos a desenvolver a hepatotoxicidade e estas situações se
97
Azatioprina - É um medicamento que interfere com a síntese do DNA por suprimir a síntese de
purina. A azatioprina é, na verdade, uma pró-droga, que, após passagem pelo fígado, se
transforma em 6 mercaptopurina. Esta, por sua vez, é transformada pela xantina oxidase em
ácido 6 tio-inosínico. É importante saber isto, uma vez que, este fato explica porque o uso
concomitante de alopurinol ou febuxostate (inibidores da xantina oxidase) potencializam a
capacidade de imunossupressão da azatioprina. Portanto, NUNCA USE ESSA ASSOCIAÇÃO!
Tem um efeito sobre a resposta imune por inibir a replicação dos linfócitos efetores. É
usado por via oral. É uma droga bem tolerada embora, às vezes, o paciente possa ter náuseas e
vômitos. Casos raros de pancreatite e hepatite têm sido descritos e regridem com a retirada do
medicamento. Reações de hipersensibilidade são infrequentes e se manifestam como febre e
rash cutâneo.
Existe a descrição de indução de neoplasias de linha linfoide (principalmente
intracerebrais), relatados principalmente em casos de uso em transplante renal.
Esta é uma droga pouco usada no tratamento da artrite reumatoide. É mais indicada na
manutenção de indução de glomerulonefrite lúpica, no tratamento de manifestações
hematológicas do lupus. Uma das suas grandes indicações é como poupadora de uso de
corticoide em indivíduos que têm recidiva da doença quando a dose deste medicamento é
abaixada. Apesar de ser imunossupressora, ela tem sido usada em mulheres grávidas com
segurança, o que é uma das suas grandes vantagens.
Ciclosporina - A ciclosporina é uma droga que, inicialmente, foi usada para evitar rejeição em
pacientes transplantados renais, mas que tem sido utilizada com sucesso em um grande número
de doenças auto-imunes. Ela age na expansão clonal dos linfócitos e influencia tanto a
imunidade humoral como a celular, mas tem um efeito bem maior na celular. Não é mielotóxica,
não influi na quimiotaxia e nem no processo de fagocitose dos leucócitos. Isto traz a vantagem
de não ocasionar riscos especiais de infecção, a não ser pelo vírus de Epstein-Barr. Por outro
lado, é uma droga nefrotóxica e hepatotóxica. Como é nefrotóxica deve-se evitar que seja usada
de maneira concomitante com AINH. Outros efeitos colaterais são tremores, hipertrofia
gengival, hipercolesterolemia, hiperuricemia e hipomagnesemia e hirsutismo. Para que se evite
a sua nefrotoxicidade recomenda-se o acompanhamento de níveis séricos da mesma. Tem sido
usada em artrite reumatoide, em casos isolados de polimiosite refratária ao corticoide e casos
de nefrite lúpica.
Micofenolato de mofetila - Este é um medicamento muito mais usado em pacientes com lúpus
do que com artrite reumatoide principalmente para as suas manifestações mais graves. Atua
inibindo enzima inosina monofosfato dehidrogenase. Desta maneira impede a proliferação
tanto de linfócito T e B, a maturação de células dendríticas e o aporte de monócitos ao ponto
de inflamação, induzindo imunotolerância.
Os efeitos colaterais mais comuns são náusea, vômitos, diarreia e cólicas abdominais.
Leucopenia é rara.
Bloqueadores do fator de necrose tumoral alfa - Este bloqueio pode ser conseguido através de
uso de anticorpos monoclonais contra o TNF-α (infliximabe, adalimumabe, certolizumabe e
golimumabe) ou, ainda, através do fornecimento de receptores solúveis para esta citocina, os
quais competem com os receptores celulares pelo TNF-α circulante (etanercepte).
Para entender como estes medicamentos funcionam é interessante revisar um
pouquinho a estrutura e função do TNF-α. Lembra que ela é uma das principais citocinas pró-
inflamatórias? Ela atua tanto no sistema imunológico específico como o inespecífico: ativa
linfócitos B, T e macrófagos, aumenta outras citocinas pró-inflamatórias como a IL-1, a IL-6 e a
IL-8, aumenta o recrutamento de neutrófilos no local da inflamação por influir na síntese de
moléculas de adesão e aumenta a atividade destes neutrófilos por incrementar a produção de
100
Anti células B - Os medicamentos anti células B disponíveis para uso atualmente são o
rituximabe e o anti BlysS ou belimumabe.
O rituximabe é um anticorpo monoclonal, anti CD-20 que atua depletando os linfócitos
B. É usado para tratamento de artrite reumatoide soropositiva e, ocasionalmente, para
manifestações graves do lúpus, na dermatomiosite e em poliangeite com granulomatose.
Apesar de atuar contra linfócitos B, o rituximabe não causa diminuição importante dos níveis
séricos de imunoglobulina (a não ser de IgM), uma vez que os plasmócitos não têm o CD-20.
Além disso, as células precursoras do linfócito também não têm este marcador; isso permite a
re população destas células, o que acontece em 6-9 meses. Veja a figura 6.4.
É uma droga bem tolerada embora possa causar reações infusionais e de reativação de
casos de hepatite. Tem sido descrito, também, o aparecimento de infecção pelo vírus JC - que
causa uma doença desmielinizante progressiva multifocal.
O anti BlysS ou belimumabe é uma droga que atua contra o BlysS/BAFF que é o fator de
crescimento de célula B indicado no tratamento do lúpus eritematoso sistêmico, principalmente
como um economizador de corticoide.
Anti interleucina 1 - Os inibidores de IL-1 têm um impacto menor do que o dos outros biológicos
no tratamento da artrite reumatoide, mas eles desempenham um papel crucial no tratamento
das doenças auto inflamatórias. Um desses inibidores é o Anakinra que é um receptor inibitório
para aIL-1 (IL-1Ra). Outro é o Canakinumabe que é um anticorpo contra a própria IL-1.
Tofacitinibe -` É um inibidor das Janus kinases, mais precisamente das Janus kinase 3 (JAK-3),
que são os componentes intermediários entre o receptor da interleucina e o núcleo. Assim ele
intercepta a informação dada pelas citocinas que ocasionariam aumento da sobrevida de
linfócitos, sua proliferação e diferenciação. Tem a vantagem e ser de uso oral e está indicado
102
para o tratamento da artrite reumatoide. Tem como efeitos colaterais alterações hematológicas,
de enzimas hepáticas e de colesterol.
Gama globulina - A gama globulina tem sido utilizada classicamente em situações nas quais se
necessita conferir imunidade passiva a um paciente. Entretanto, tem se verificado que as suas
ações podem ir muito além disso. Ela tem um efeito imunomodulador em várias doenças
autoimunes nas quais se incluem a doença de Kawasaki, as miosites inflamatórias idiopáticas,
lúpus eritematosos sistêmico, AR do adulto e juvenil e vasculites sistêmicas. Acredita-se que o
seu efeito imunomodulador se deva a:
bloqueio de receptores Fc de macrófagos e células endoteliais;
clearence de possíveis agentes infecciosos eventualmente envolvidos na etiologia
destas doenças
supressão da síntese de anticorpos;
inibição da produção e liberação de citocinas;
inibição da ativação de células T por super-antígenos;
redução da expressão de moléculas de adesão;
neutralização de auto-anticorpos por anticorpos anti-idiotípicos;
regulação da ação das células T e B pelos anticorpos anti-idiotípicos;
inibição da ligação com o complemento e sua consequente ativação.
A administração da gama globulina endovenosa é feita em doses mensais de 1-2
mg/kg/dia por 2 dias. É muito bem tolerada e relativamente segura. Os efeitos colaterais
possíveis estão resumidos no quadro 6.3.
Aferese terapêutica - Aferese é uma palavra que vem do grego e quer dizer retirar. Uma aferese
terapêutica nada mais é do que a retirada de algum elemento do paciente. Os elementos que
podem ser retirados são plasma (plasmaferese), linfócitos (linfaferese) ou ambos. A ideia atrás
de se fazer uma plasmaferese é que, retirando-se o plasma do paciente, saem junto anticorpos
e complexos imunes potencialmente patogênicos. Veja bem: este é um processo mecânico!
Plasmaferese tem sido indicada em um bom grupo de doenças do tecido conjuntivo e outras
vasculites. Entretanto existe o problema de uma formação de anticorpos de “rebote”. Na
linfaferese o que se faz é retirar linfócitos potencialmente responsáveis pela etiologia de uma
doença.
O papel exato deste tipo de tratamento não está determinado. Existem descrições
isoladas de que ela é benéfica a curto prazo para pacientes com artrite reumatoide e lúpus. A
103
sua grande indicação está em “ganhar tempo” em situações graves até que outros
medicamentos funcionem.
Irradiação nodal ou total - A irradiação total ou nodal do paciente tem um efeito imunoterápico
e é utilizada em situações de “desespero de causa”, em pacientes com artrite reumatoide, lúpus
e polimiosites refratárias. Ela promove uma depleção seletiva de linfócitos T CD4+ que aparece
em 5-8 semanas após a irradiação e persiste por 1-3 anos.
Alopurinol - O alopurinol é uma droga que diminui o nível sérico de ácido úrico por bloquear a
enzima xantina dehidrogenase que é importante para a sua formação. No organismo o
alopurinol é transformado em oxipurinol que também é uma droga farmacologicamente ativa e
que, por ter uma meia vida bem longa, responde pela maior parte da ação desta droga. O
oxipurinol age da mesma maneira que o alopurinol, bloqueando a mesma enzima.
O uso do alopurinol leva a um acúmulo de xantina no organismo que é o local onde o
metabolismo do ácido úrico é sustado.
Esta droga é bem absorvida por via oral e a excreção da forma oxidada, o oxipurinol, se
faz, principalmente pelos rins. Assim se o paciente é portador de insuficiência renal esta droga
deve ser ajustada, de acordo com o clearence do paciente.
Quando um paciente recebe alopurinol, o seu ácido úrico baixa em 24-48h e após 3 a 6
meses de normouricemia pode-se reduzir a frequência dos ataques de gota; os tofos resolvem
em 6 a 12 meses após. Quando a droga é retirada, em poucos dias os níveis de ácido úrico
retornam a níveis pré-tratamento. Isto torna claro que este tipo de tratamento deve ser
continuado por um tempo indefinido.
Os principais efeitos colaterais deste tipo de medicamento são:
Precipitar ataques agudos de gota - costuma acontecer quando o paciente inicia o
tratamento. Nesta situação pode-se usar colchicina para profilaxia.
Cálculos de xantina: o fato de o alopurinol sustar o metabolismo do ácido úrico, leva ao
acúmulo de xantina que é a substância onde o metabolismo fica suspenso. Sendo
insolúvel, a xantina pode se precipitar no rim, formando cálculos.
Reações de hipersensibilidade: o paciente observa intolerância gastrintestinal, rashes
cutâneos (ocasionalmente epidermólise bolhosa), alopecia, supressão de medula óssea,
hepatite, vasculites e formação de granulomas semelhantes à sarcoides. A soma de
qualquer dos tipos de manifestação de hipersensibilidade chega a acometer 20% dos
pacientes. Os efeitos tóxicos são mais frequentes em pacientes que usam diuréticos ou
que têm insuficiência renal. Já a incidência de rashs cutâneos aumenta quando o
paciente usa simultaneamente a ampicilina. As reações alérgicas podem ser
minimizadas se o paciente iniciar o tratamento com uma dose menor (p.ex 100mg/dia)
aumentando a mesma gradativamente até níveis terapêuticos.
Atenção! Não use esta medicação com azatioprina ou 6 mercaptopurina. Os efeitos colaterais
sobre a medula se potencializam...
Rasburicase - É uma versão recombinante da enzima urato oxidase, que existe em mamíferos
mas não no ser humano e que transforma o ácido úrico em alantoína. Tem sido usada para
diminuir o risco de insuficiência renal aguda por hiperuricemia em adultos submetidos a
105
Drogas uricosúricas - Estas são drogas que baixam o nível do ácido úrico no sangue por aumentar
a sua excreção renal. Pertencem a este grupo: o probenecide, a benzobromarona e o lesinurade
(este ultimo ainda inexistente no Brasil). Este tipo de medicamento deve ser administrado com
uma dieta rica em líquido para que se evite o risco de formação de cálculos. Às vezes pode ser
desejável a alcalinização da urina, o que é feito com bicarbonato ou acetazolamida. Outros
efeitos colaterais possíveis são: rashs cutâneos, intolerância gastrintestinal e precipitação de
ataque agudo de gota. Mais raramente são vistos casos de hepatotoxicidade e anemia
hemolítica.
As drogas uricosúricas atuam, de maneira geral, nos túbulos proximais interferindo com a
reabsorção do acido úrico do filtrado urinário para o sangue. A grande maioria delas interfere
com a ação de um transportador de ácido úrico conhecido como URAT1 embora existam outros
transportadores que também possam ser inibidos. Para localizar a atuação de cada droga em
cada um destes transportadores veja a figura baixo (Figura 6.5).
Pacientes com insuficiência renal são resistentes a este tipo de medicamento. Quando
o clearence cai para 20-30 ml/min, estas drogas se tornam ineficazes. O probenecide interfere
com o metabolismo de vários antibióticos (penicilina, ampicilina, algumas cefalosporinas e
rifampicina) além de potencializar a ação anticoagulante da heparina.
Existem outros medicamentos que têm como “ efeito colateral” baixar o ácido úrico.
Eles são interessantes na escolha de tratamento de comorbidades que se associam à gota como
hipertensão e dislipemia. Entram neste grupo: losartana, nifedipina, fenofibrato e atorvastatina.
Por oturo lado, diuréticos como os tiazidicos ajudam a reter o ácido úrico.
ostras. Existe a sugestão de que este medicamento pode ter um efeito modesto na redução do
ritmo de estreitamento da cartilagem embora estudos posteriores tenham lançado dúvida sobre
este efeito. Tem ação analgésica depois de uso por tempo prolongado.
Diacereina - Este medicamento é um derivado da reína, a qual é uma substância que tem
propriedades analgésicas e anti-inflamatórias. Ele inibe a produção de IL-1 e estimula a produção
de prostaglandina E2. Tem um efeito modesto no alívio da dor de osteoartrite mas o seu
potencial em retardar a evolução da osteoartrite ainda está por ser provado. Seu principal efeito
colateral é diarreia.
Dor é um sintoma que, assim como um resfriado comum, todos nós esperamos vir a ter
algum dia. Apesar disto, esta é uma palavra que, quase universalmente, acarreta medo.
Promover analgesia é uma das tarefas fundamentais e mais gratificantes de todo profissional de
saúde. A dor crônica altera a qualidade de vida de uma pessoa e de quem está ao seu redor,
causa alterações no sono e gera ansiedade e depressão.
De uma maneira bastante simplista, pode-se dizer que a dor é, em geral, sentida na
periferia através de receptores (chamados de receptores nociceptivos) e transmitida por
terminações nervosas até o corno posterior da medula. Esta transmissão pode ser feita por
fibras mielinizadas (tipo Aδ) ou não mielinizadas (tipo C) que nada mais são do que axônios dos
neurônios do gânglio da raiz dorsal.
Do corno posterior da medula elas vão, pelo trato espinotalâmico ao tálamo
contralateral que por sua vez projeta estes estimulo na córtex cerebral para a sua interpretação.
Do tronco cerebral partem estímulos descendentes para inibir a via de transmissão da dor. Esta
inibição é feita por liberação de serotonina, noradrenalina e opioides endógenos.
A passagem do estimulo doloroso de um neurônio a outro é feito por
neurotransmissores. São transmissores excitatórios o glutamato e o aspartato enquanto o ácido
gama-aminobutírico (GABA), a glicina e a taurina são neurotransmissores inibidores. Saber isto
ajuda alocalizar o pontode atuação dos vários analgésicos
107
FIGURA 6.7– Escala visual analógica (EVA) usada na medida de dimensão de dor.
Referências:
Davies K, Won P. Immunization in rheumatic diseases of childhood: an audit of the clinical practice of British Pediatric Rheumatology
Group members and a review of the evidence. Rheumatology 2002; 41:937-41.
Edwards JC, Szczepanski L, Szechinski J, et al. Efficacy of B-cell-targeted therapy with rituximab in patients with rheumatoid arthritis.
N Engl J Med 2004; 350:2572-81.
Edwards JCW, Leandro MJ, Cambridge G. B lymphocyte depletion therapy with rituximab in rheumatoid arthritis: targeting of CD20
Curr Dir Autoimmun. 2005; 8: 175-92.
Firestein GS, Zvaifler NJ. Anticytokine therapy in rheumatoid arthritis. N Engl J Med 1997; 337(3):195-197.
Fox R. Mechanism of action of leflunomide in rheumatoid arthritis. J Rheumatol 1998; 25(53): 20-26.
Hyrich KL, Watson KD, Dixon WG, Silman AJ, Symmons DPM. Pregnancy experience in women with rheumatic diseases exposed to
biologic agents? Results from BSR Biologics register. Arthritis Rheum. 2006; 54:2701-2
Jaffe IA. New approaches to the management of rheumatoid arthritis. J Rheumatol 1992; 19(S-36):2-8.
Kremer JM, Alarcon GS, Lightfot RW et al. Methotrexate for rheumatoid arthritis. Suggested guidelines for monitoring liver toxicity.
American College of Rheumatology. Arthritis & Rheum 1994; 37: 316 -28.
Moreland LW, Baumgartner SW, Schiff MH, Tindall E, Fleichmann RM Wavwr AL, Ettlinger R, Cohen S, Koopman W, Mohler K, Wiemar
M, Blosch C. Treatment of rheumatoid arthritis with a recombinant human tumor necrosis factor receptor (p75)-Fc fusion protein.
N Engl J Med 1997; 337(3):141-147.
Towheed, TE, Maxwell, L, Anastassiades, TP et al. Glucosamine therapy for treating osteo-arthritis. Cochrane Database Syst Rev
2005; CD002946.
Wolfe F, Marmor MF. Rates and predictors of hydroxychloroquine retinal toxicity in pa-tients with rheumatoid arthritis and systemic
lupus erythematosus. Arthritis Care Res (Hoboken). 2010; 62 (6):775-84.
110
FATORES REUMATOIDES
Setenta a 80% dos pacientes com AR têm fator reumatoide positivo detectado pelo
látex, em casos de doença bem estabelecida. Todavia, este teste só é positivo na metade dos
pacientes à apresentação, o que dificulta o diagnóstico desta doença nas formas iniciais. O
restante dos pacientes são chamados de soronegativos. Destes, alguns poucos têm fator
reumatoide tipo IgG na ausência do fator reumatoide IgM. Outros tornam-se soropositivos em
testes posteriores.
Os pacientes soronegativos têm em geral uma doença articular mais branda e raramente
desenvolvem manifestações extra-articulares. Já seropositividade guarda relação, ainda que
imperfeita, do título do fator reumatoide com o grau de gravidade da doença articular e extra-
articular. Existe uma correlação positiva entre a ocorrência de artrite reumatoide soropositiva
com HLA DR4.
Embora o fator reumatoide acabe sendo mais um produto da doença do que sua causa
existem evidências de que estes anticorpos contribuem para danificar as articulações, vasos, e
111
estruturas envolvidas na artrite reumatoide. Eles formam complexos imunes que fixam
complemento e desencadeiam o processo inflamatório. A principal fonte de fator reumatoide
em pacientes com AR parece ser a sinóvia (sendo uma pequena porção elaborada por células
mononucleares do sangue). Pode, também, ser produzido localmente, em outros pontos de
inflamação como pleura, pericárdio etc. Alguns complexos imunes se difundem e são transpor-
tados pela corrente sanguínea sendo removidos pelo S.R.E. Quando esta taxa excede a
capacidade de remoção do S.R.E., os complexos imunes se depositam nos vasos ativando
complemento e produzindo vasculite.
A presença do fator reumatoide tipo IgG tem implicações mais sérias que a presença do IgM,
estando a sua presença relacionada com a ocorrência de vasculite.
Duas síndromes resultam diretamente da presença do fator reumatoide:
- síndrome de hiperviscosidade: em pacientes com altas taxas de FR IgG formando complexos
autoagregados;
- crioglobulinemia mista: síndrome de vasculite de pequenos vasos secundária a fatores reu-
matoides de todas as classes embora o FR IgM seja principal.
O anticorpo mais contra proteínas citrulinadas mais comum é o anti-CCP (peptídio cíclico
citrulinado). Este é pesquisado por ELISA. Neste teste são identificadas anticorpos contra
proteínas (filagrinas) contendo um resíduo modificado de arginina (que foi citrulinada).
Proteínas citrulinadas têm sido encontradas em pessoas com AR. Pacientes com AR parecem ter
polimorfismo para genes que determinam a presença da enzima que faz esta citrulinação.
A pesquisa do anti -CCP é um teste mais específico para a artrite reumatoide do que o
fator reumatoide. Sua sensibilidade está estimada em 74.0% e a especificidade em 94.5%.
Assim como o fator reumatoide, seu aparecimento está ligado com uma doença mais erosiva e
grave. A procura deste auto-anticorpo é particularmente útil em pessoas que começam com
queixas poliarticulares, mas cujo quadro clínico é indefinido.
d). ALDOLASE: A aldolase não é considerada uma enzima muito específica por estar presente
em uma grande variedade de tecidos. Além disso, o seu nível não se correlaciona bem com a
atividade da doença.
e). CREATINA: a creatina não é uma enzima. Como já foi visto anteriormente, é um produto de
síntese hepática que, transportada pela circulação até o músculo serve para a formação da
creatina-fosfato, a qual é uma fonte de reserva de energia para a atividade muscular. Dentro do
músculo, a creatina dá origem a creatinina. Esta é liberada na circulação e filtrada pelo glomé-
rulo. Por causa desta filtração glomerular, a dosagem de creatinina é usada como um índice de
função renal. Pelo que foi acima exposto, pode-se entender que o nível sérico e a excreção total
urinária da creatinina num indivíduo depende da sua massa musculareda filtração pelo rim.
Em situações em que existe atrofia muscular importante, a transformação de creatina
em creatinina também está reduzida, ocasionando uma diminuição do nível sanguíneo desta
última. Preste bem atenção nisto!!! A dosagem de creatinina sérica num indivíduo com doença
muscular deixa de refletir a sua excreção renal e, portanto, nesta situação, este teste NÃO é um
bom índice da função renal.
ela esquelética ou cardíaca. São causas de mioglobina elevada no sangue e na urina: miopatias,
exercício vigoroso, injeções intramusculares, convulsões, choque e certas toxinas. A depuração
renal da mioglobina é muito rápida de tal maneira que esta elevação é transitória. Em situações
de injúria muscular extensa como em politraumatizados e em queimaduras, as grandes
quantidades de mioglobina liberadas na corrente sanguínea podem danificar o rim do indivíduo.
A mioglobina é convertida em hematina, a qual é tóxica para os túbulos renais.
AUTO-ANTICORPOS INTRACELULARES
Existem alguns padrões básicos de fluorescência que podem ser reconhecidos, os quais
sugerem diferentes tipos de anticorpos subjacentes. Estes padrões básicos serão aqui descritos.
Todavia é bom saber que existe classificações bem mais completas como, por exemplo, a que
faz parte do Consenso Brasileiro do FAN.
A B
C D
FIGURA 7.3- Alguns padrões do FAN (A)- Homogêneo; (B) Pontilhado grosso; (C) Nucleolar;
(D)-Centromérico
Figura cedida pelo Prof Renato Nisihara
Pessoas saudáveis ou com doenças não reumáticas podem vir a ter um teste positivo.
Doenças hepáticas, neoplasias, malária, endocardite bacteriana subaguda, lepra etc... são
exemplos de algumas doenças que podem vir a dar um teste positivo, embora, nestes casos o
título costume ser mais baixo. Não se pode esquecer, também, que pacientes predispostos a
uma doença reumática podem ter um teste positivo muitos anos antes da doença se manifestar
por completo. Assim, o valor diagnóstico da determinação de um auto-anticorpo depende da
apresentação clínica do paciente. O teste de imunofluorescência não detecta auto-anticorpos
“mais externos” como os antifosfolipideos, nem anticorpos contra membrana de eritrócitos, de
116
plaquetas ou de linfócitos, vistos em muitas doenças reumáticas como o lúpus. Nestes casos
serão necessários outros testes que não serão discutidos aqui.
embora a sua sensibilidade dependa do estado de atividade da doença. Se a doença estiver ativa
chega a ser positivo em 90% dos casos; se a doença estiver em remissão, esta positividade cai
para 30%. Isto mostra uma das grandes utilidades deste teste: a monitorização da atividade dos
pacientes com poliangeite com granulomatose. O ANCA-p (p=perinuclear), também chamado
de MPO-ANCA, está dirigido, p. ex, contra a mieloperoxidase, uma enzima que desempenha
um papel importante na geração de radicais de oxigênio livre. Tem sido descrito em uma grande
variedade de doenças auto-imunes como vasculite de Churg-Strauss, poliarterite microscópica,
Síndrome de Goodpasture, retocolite ulcerativa, colangite esclerosante, e glomerulonefrite
crescêntica pauci-imune.
O teste de imunofluorescência indireta revela apenas se um paciente tem um ANCA-c
ou ANCA-p. O substrato contra o qual eles e dirige (se mieloperoxidade ou proteína-3 etc...) é
testado pelo ELISA.
ANTICORPOS ANTI-ESTREPTOCÓCICOS
Existe um grande número de evidências que estabelecem o fato de que a febre reumática
ocorre como uma sequela de uma infecção por estreptococo do grupo A de Lancefield. As evi-
dências mais óbvias são:
-associação epidemiológica entre M.R. e a infecção estreptocócica;
-a dramática redução na incidência dos ataques primários e secundários com o
tratamento e profilaxia das estreptococcias pela penicilina.
Apesar disto um grande número de pacientes negam sintomas antecedentes de faringite
(30% deles). Nestes, entretanto, testes para a detecção de anticorpo anti-estreptocócico de-
monstrarão que houve estimulação antigênica, embora sem os sintomas clínicos de infecção.
Existem várias técnicas para medir a resposta à grande variedade de antígenos estreptocócicos,
mas para propósitos clínicos, são mais utilizadas a dosagem da ASO (anti-estreptolisina O) e da
anti-DNAse B.
Antiestreptolisina o (ASO) - O aumento deste título é quase uma prova específica de infecção
estreptocócica com uma única exceção conhecida: a toxina teta do Clostridium welchii, que
reage cruzado com a ASO.
Não existe um título "normal" de ASO: os valores encontrados em uma população dependem
da idade, época do ano e localização geográfica. Em uma população entre 1 e 3 anos o título é,
em geral, em torno de 50 UI/ml; entre 8 a 12 anos atinge um pico de 200 a 300 UI/ml. Seguindo-
se à infecção estreptocócica, 80 a 90% dos pacientes não tratados mostram um aumento da
ASO.
Anti DNAse B -é o teste mais sensível para detecção de estreptococcias de pele.
119
A concentração de ácido úrico varia com idade e sexo do paciente. Crianças de ambos
os sexos normalmente têm uma concentração em torno de 3 a 4 mg%. Na adolescência, os ho-
mens mostram um aumento de 1 a 2 mg% nesta concentração, o qual é mantido durante toda
a sua vida. Com as mulheres isto não acontece; este aumento só é visto após a menopausa. Em
adultos, níveis de urato correlacionam com o peso do corpo, altura, creatinina sérica (que, por
sua vez, reflete a massa muscular), pressão arterial e ingesta de álcool. Um valor acima de 7.0
mg% é considerado anormal.
Embora, de maneira geral, a ocorrência de artrite gotosa correlacione com a magnitude
da hiperuricemia, nem todo paciente hiperuricêmico tem gota e, existem pacientes com crises
agudas de gota que nunca tiveram hiperuricemia demonstrável.
Referências:
Barland P et al. Selection and use of laboratory tests in the rheumatic diseases. Am J Med. 1996; 100 (2A):16S-23S.
Bohlmeyer TJ et al . Evaluation of laboratory tests as a guide to diagnosis and therapy of myositis. Rheum Dis Clin North Am. 1994;
20:845-56.
Massa M et al. Anti-double-stranded DNA, antihistone and antinucleosome IgG reactivities in children with systemic lupus
erythematosus. Clin Exp Rheumatol 1994; 12:219-25.
McGuire J et al. Aggressive drug therapy for rheumatoid arthritis. Hosp Pract 1993, 45-52
Mimori T. Clinical Significance of anti CCP antibodies in Rheumatoid arthritis. Int Med 2005; 44(11): 1122-26.
\Reichlin M. Measurement and clinical significance of antinuclear antibodies. In Rose B (ed) Uptodate.com, versão 14.2, capturado
em www. uptodate.com.
Saag KG et al. Cigarette smoking and rheumatoid arthritis severity, Ann Rheum Dis, 56:463-369, 1997.
von Muhlen CA et al. Autoantibodies in the diagnosis of systemic rheumatic diseases. Semin Arthritis Rheum. 1995; 24: 323-58.
Whitnack E et al.Antiestreptococcal antibodies in the diagnosis of rheumatic fever. In Cohen AS (ed). Laboratory diagnostic
procedures in the rheumatic diseases. Grunne & Stratton, Inc 1985, 273:292.
122
Embora este capítulo esteja localizado no meio das noções básicas em reumatologia,
talvez seja melhor que, primeiro, você estude cada doença e depois volte aqui, localizando o
achado radiológico de cada uma delas. A finalidade deste pequeno texto é a de dar uma noção
dos principais achados radiológicos em reumatologia. Se sabidos podem resolver muitos dos
problemas do dia a dia. Vamos rever o que acontece em cada uma das doenças ao envolver o
segmento apendicular e axial do esqueleto. Entretanto antes disso seria bom deixar bem claro
o significado de certos termos comumente utilizados nesta situação, tais como:
Espaço interarticular: é o espaço visto entre duas articulações. Sua altura representa a grossura
da cartilagem que não aparece ao RX. Portanto quando este espaço está reduzido significa que
a cartilagem está afilada por algum motivo.
Osteófito: é um esporão ósseo que aparece nas margens da articulação afetada por osteoartrite
e representa uma tentativa de regeneração da cartilagem que acaba se ossificando. Aparece
tanto na osteoartrite primária como na secundária. É conhecido vulgarmente como bico de
papagaio.
Erosão: é um “buraquinho” escavado no osso. Significa que existe uma doença inflamatória na
qual a membrana sinovial proliferou muito e invadiu o osso. Aparece por primeiro nas margens
da cápsula articular porque ali o osso não tem cartilagem estando em contato bem direto com
a membrana sinovial. Se o processo inflamatório for muito grave afeta todo o osso e cartilagem
e acaba resultando em destruição da cartilagem e, mais tarde, em uma ancilose óssea. É um
achado típico da artrite reumatoide.
Em casos de gota, o tofo pode cair na articulação e deixar uma lesão radiologicamente
semelhante a da erosão. No entanto, o tofo aparece tanto em região articular como não articular
e como não se origina da sinovial costuma deixar a parede externa do local de erosão mais ou
menos intacta. Quando afeta os dois lados de uma articulação forma cavitações em espelho.
Outro dado usado para separar gota de artrite reumatoide é a de que na artrite
reumatoide existe muito mais lesão de cartilagem e, portanto, o espaço interarticular está muito
mais afilado do que na gota.
C
FIGURA 8.3- (A) Principais diferenças entre artrite reumatoide e gota; (B) Artrite
reumatóide (C)- gota
Condrocalcinose: é o termo usado para dizer que existe depósito de cálcio em cartilagem. É visto
em casos de doença por depósito de pirofosfato de cálcio embora possa aparecer em casos de
deposição de alguns outros cristais como os de hidroxiapatita. Aparece mais em cartilagens
fibrosa e hialina, mas pode aparecer na membrana sinovial e cápsula articular.
Sindesmofitose: é um achado típico das espondiloartrites e resulta da ossificação da parte
externa do ânulo fibroso do disco intervertebral.
B
A
C
FIGURA 8.4- (A)- Condrocalcinose; (B)- Diferença osteófito e sindesmófito; (C)- Sindesmófito
124
A
B
C
FIGURA 8.5 – Mapa articular (A) Artrite reumatoide; (B) Osteoartrite (C) Artrite psoriásica.
A B C
D F
E
FIGURA 8.7 – Achados na artrite reumatodie: (A) osteoporose justa articular; (B) e (D) e (E) Erosões;
(C) Fusão dos ossos do carpo; (F) Destruição grave dos ossos do cotovelo.
A B C
D E F
FIGURA 8.8 - (A) e (B) e (C) Osteoartrite (OA) de mãos; (D) e (E) OA de joelho; (F) OA de
coxofemoral.
A B
FIGURA 8.9 - (A) Condrocalcinose de meniscos; (B) Condrocalcinose do ligamento
triangular do punho.
127
ARTRITE PSORIÁSICA - A artrite psoriásica pode ter tanto o envolvimento periférico como o
axial. Na forma periférica, como já visto, esta é uma das poucas entidades que envolve as
inerfalanganas distais (a outra seria osteoartrite). A artrite psoriasica pode tomar um caráter
bastante agressico com reabsorção importante de extremidades ósseas. A lesão chamada de
pencil and cup é descrita nas mãos e é considerada característica dessa doença. Nesta forma de
lesão existe um afilamento da interfalangiana proximal (pencil) e um alargamento da base da
interfalangiana distal (cup).
A B
FIGURA 8.10: Artrite psoriatica: Em (A) imagem em pencil and cup ( flecha); (b)
reabsorção de interfalagianas distais.
GOTA - A kesão típica da gota - erosão com o bordo externo parcialmente íntegro (também
chamadode borda over hanging) - pode aparecer em qualquer das articulações afetadas sendo
mais comuns em extremidades dos membros. Depósito de cálcio pode ocorrer nos tofos gotosos
causando um aumento de densidade de partes moles.
A
B
FIGURA 8:11: Gota: (A) flechas mostrando lesões em saca bocados com o bordo externo
parcialmente íntegro; (B) – Erosões e aumento de densidade de partes moles por tofos com
cálcio.
128
A B
A B
A B
C D
E F
G H
FIGURA 8.14- Espondiloartrite. (A) até (D) sindesmofitose. (B) e (C) com quadratura vertebral;
(E)-Fusão de sacroiliacas; (F) TAC- sacriliíte bilateral ; (G)- sequela de inflamação em canto
superior das vertebras (cantos brilhantes). (H) RMN com sacroileite bilateral e edema ósseo.
131
Diz-se que existe subluxação atlanto-axial quando a distância entre o arco anterior do
atlas e a superfície anterior do processo odontoide é maior do que 2,5 mm para a mulher e 3,0
mm para o homem, vistas ao RX lateral. Erosões no dente do axis não são raras
A B
FIGURA 8.15- (A) - Localização da medida entre arco atlas e dente do axis para julgar
luxação; (B)- Posição normal do dente em radiografia transoral.
O ultrassom é um exame barato, sem irradiação e que, portanto, pode ser repetido
quantas vezes for necessário. Infelizmente é operador dependente. Mostra sinovites, erosões,
osteofitos e é muito interessante para tendões, bursas, etc... permite ainda, a identificação de
cristais; em casos de artropatia por ácido úrico (gota) ele exibe um achado carcateristico na
sinovial chamado de sinal do duplo contorno.
A B
FIGURA 8:17 - Imagens de ultrassom A - sinovite, erosão e power doppler positivo
(inflamação); B - sinal do duplo contorno de gota.
Imagens: Gentileza do Dr Leonardo Schmidt.
Diminuição de densidade óssea pode ser suspeitada pelo RX, mas como a densidade
mineral sofre muita influência da penetração dos raios, este não é um bom teste para o seu
diagnóstico. Um RX até pode mostrar fraturas e estriamento vertical de ossos esponjosos (já
que as trabéculas horizontais são reabsorvidas com mais facilidade por não suportarem peso).
Todavia estes são achados tardios e não devem ser valorizados para diagnóstico A
densitometria pelo DEXA é uma melhor opção como será discutido no capítulo de osteoporose.
133
Se o paciente teve uma cirurgia recente ou ficou acamado por qualquer outro motivo, o
diagnóstico sugerido é o de gota, principalmente se este indivíduo também for do sexo
masculino, obeso, hipertenso e/ou diabético. Nos gotosos pode existir, também, história de
cálculo renal ou de episódios de monoartrite anterior de um padrão clínico bem semelhante.
Uso de anticoagulantes e histórias de sangramentos anteriores podem ser de ajuda no
diagnóstico de hemartrose. A história de um acidente, certas formas de trabalho braçal, prática
de algum tipo de esporte e de crises convulsivas recentes podem auxiliar no diagnóstico de um
processo traumático. Uretrite blenorrágica não tratada ou tratada de maneira inadequada pode
levar ao diagnóstico de artrite séptica por gonococos. Na mulher este aspecto passa muitas
vezes desapercebido, mas deve ser sempre lembrado se a monoartrite aparece em uma mulher
grávida, na qual existe uma propensão para a disseminação desta infecção. Dados que
corroboram para esta possibilidade são a ocorrência de tenossinovites e o aparecimento de
lesões de pele típicas. Outras portas de entrada, para outros tipos de agentes microbianos que
não o gonococos, podem ajudar levantar suspeita de processo infeccioso, como por exemplo,
uso de drogas injetáveis, feridas infectadas em indivíduos imunodeprimidos como diabéticos,
usuários de drogas imunossupressoras, portadores de insuficiência renal, alcoólatras, pacientes
com SIDA etc. Febre e leucocitose são dados que ajudam a pensar na hipótese de infecção, mas,
às vezes, em pacientes com gota estes dados também podem ser encontrados. O envolvimento
de grandes articulações como coxo-femurais e joelhos é comum em pacientes com artrite
séptica embora pacientes que usam drogas endovenosas possam ter envolvimento de
articulações pouco comuns como a esternoclavicular. O uso de corticoide, principalmente em
pacientes lúpicos ou história de alcoolismo pode ajudar a pensar em uma necrose óssea
avascular. Pacientes com artrite psoriásica, em geral, têm manifestações cutâneas ou ungueais
da psoríase. Pacientes com espondilite podem contar dor lombar ou história de uveíte. Os com
artrite reativa podem ter história de conjuntivite, uretrite, diarréia ou rash cutâneo.
A despeito de o fato de que a história e exame físico poderem fornecer dados quanto a
possível etiologia da monoartrite em questão, uma vez que sempre existe o risco de se tratar de
um processo séptico a punção e análise do líquido sinovial é mandatória.
TODO PACIENTE COM MONOARTRITE, ATÉ PROVA EM CONTRÁRIO, DEVE SER PUNCIO-
NADO PARA ANÁLISE DO LÍQUIDO SINOVIAL!!!
Esta análise, além demonstrar possíveis artrites séptica, faz diagnóstico imediato de
hemartroses. Além disso, a presença de cristais de ácido úrico ou de pirofosfato de cálcio dão
os diagnósticos de gota e de pseudogota.
Uma investigação mais sofisticada pode ser necessária nos casos mais difíceis com uso
de cintilografia óssea, tomografia computadorizada e ressonância magnética.
No fluxograma da figura 9.1 encontram-se de maneira bem resumida, os possíveis
diagnósticos diferenciais em um paciente com queixa monoarticular aguda.
A grande maioria dos pacientes consegue um esclarecimento diagnóstico de maneira
relativamente rápida. Daqueles que permanecem com monoartrite de etiologia obscura, uma
parte acaba tendo regressão espontânea. Provavelmente eram casos de artrite viral ou
situações devidas a traumatismos não reconhecidos. Outra porção, no entanto, permanece
sintomática, evoluindo para uma monoartrite crônica e obrigando o médico, muitas vezes a
realizar biópsia de sinovial, no sentindo de verificar a possibilidade de existência de tumor,
tuberculose ou infecções fúngicas. A biópsia sinovial é importante para excluir tuberculose, uma
135
vez que a pesquisa de bacilo álcool-ácido resistente no líquido tem baixa positividade (menos
que 20%).
Referências
A seguir tentaremos discutir como a resposta a cada um destes pontos pode ser de auxílio
no esclarecimento do diagnóstico.
A ORIGEM DA DOR :
SINTOMAS ASSOCIADOS:
Como muitas das doenças reumáticas são doenças sistêmicas, outros aparelhos e
sistemas podem estar afetados e, a maneira pela qual isto acontece pode ajudar no diagnóstico.
Um rash na face, em borboleta, na face, torna óbvio o diagnóstico de lúpus. Febre e sopro
138
1. Certifique-se de que a dor é articular. Caso positivo passe para o ítem seguinte.
2. Separe casos de artralgias de casos de artrite. Rigidez matinal maior do que meia
hora, dor com predominância noturna, achados de edema, rubor, dor e calor sugerem
artrite.
ARTRITES ARTRALGIA
Procure o PADRÃO DA ARTRITE Procure EPIDEMIOLOGIA DIAGNÓSTI Artralgia de
SINAIS/SINTOMAS CO doença
ASSOCIADOS sistêmica
poliartrite migratória não cardite, coreia, nódulos, crianças e jovens M.R.
deformante, autolimitada, + em eritema marginatum lúpus
grandes articulações
poliartrite, aditiva, simétrica, + mais comum nódulos mulheres jovens e A.R.
fibromialgia
em mãos deformante, meia idade
oligoartrite assimétrica, + em Sacroileite bilateral, homens jovens E. A.
MM.II., muita entesopatia uveíte, SJögren
oligoartrite assimétrica, + em conjuntivite, uretrite homens jovens Artrite processos
MM.II., muita entesopatia reativa mecânicos
poliartrite, não deformante, mais comum lesões mulheres jovens e LES
migratória ou aditiva cutâneas (rash em de meia idade Psicogênica
butterfly, lesões discoides
etc.). Procure também
sinais de lesão renal,
cardíaca, pulmonar,
hematológico e de SNC
oligoartrite assimétrica, fugaz miosite,heliótropo, mulheres jovens, Dermatomi
pápulas de Gottron meia idade osite
oligoartrite assimétrica não Raynaud, esclerodactilia mulheres jovens e Escleroder
deformante meia idade ma
poliartrite crônica e deformante, tofos, cálculos renais; homens c/ Gota
precedida de história de longa obesidade e hipertensão diabetes, obesos,
duração de episódios de hipertensos; mu-
monoartrite e oligoartrite lheres na pós
menopausa
poliartrite aguda migratória febre, história de uretrite jovens; mais na Artrite
seguida de monoartrite ( + em anterior, pápula única em mulher grávida séptica por
joelho e punho) base eritematosa gonococos.
Referências:
Mazière B,et al . The hip. In Klippel JH, Dieppe PA. (eds) Rheumatology, Mosby, London 1998, p.S4 - 10.1:10-8
140
EPIDEMIOLOGIA E PATOGÊNESE
Agentes infecciosos - A procura de um agente infeccioso para a AR vem de longa data. Esta
procura tornou-se mais intensa quando se estabeleceu um agente infeccioso definitivo para a
Doença de Lyme que tem um envolvimento articular com padrão semelhante ao da AR.
Vários agentes infecciosos têm sido propostos tais como os vírus linfotrópicos para
células T-tipo 1, vírus da rubéola, citomegalovírus, herpes vírus e micoplasmas etc... , mas para
nenhum deles se conseguiu suporte científico que comprovasse esta hipótese.
O vírus de Epstein Barr (causador da mononucleose infecciosa) tem sido ligado a AR, por
causa do fato de que 80% dos pacientes com AR têm anticorpos circulantes contra este vírus, e,
pelo fato do vírus ser um ativador policlonal de célula B levando a uma superprodução de
imunoglobulinas (inclusive de fator reumatoide). Recentemente, o interesse neste vírus
aumentou quando se descobriu que a proteína viral gp-110 tinha exatamente a mesma
sequência de aminoácidos do epítope comum. Diante disto, uma hipótese lógica seria a de que
o vírus de Epstein Barr desencadeasse a doença através do mecanismo de mimetismo molecular.
O interesse pelas micobactérias também tem se acentuado recentemente devido ao
fato de se observar que elas expressam proteínas "heat-shock" (HSP) ou proteínas do choque
térmico. Micobactérias têm múltiplos antígenos HSP, os quais são muito semelhantes aos HSP
humanos. Isto tem levado à idéia de que estes antígenos possam estar implicados em doenças
autoimunes por processo de mimetismo molecular.
141
B quando estimulados fabricam os fatores reumatoides que formam complexos imunes capazes
de ativar complemento, e consequentemente aumentar a permeabilidade vascular e promover
acúmulo de células tais como polimorfonucleares. Estas últimas, ao ingerir os complexos
imunes, causam liberação de enzimas hidrolíticas, radicais de oxigênio livres e ácido aracdônico
(o qual será metabolizado a prostaglandinas e leucotrienos). Estes elementos respondem por
grande parte da inflamação da AR.
ANATOMIA PATOLÓGICA
CLÍNICA
Um achado comum é a rigidez matinal. Enquanto alguns autores acreditam que essa
rigidez pode ser causada pelo acúmulo de líquido na articulação durante um período de repouso,
outros atribuem-na à liberação noturna de citocinas pró-inflamatórias.
A mão na AR está quase sempre envolvida. Na fase inicial é característico o achado de
edema em interfalangianas proximais (dando ao dedo aspecto de fuso) e metacarpo falangianas.
Com o evoluir da doença aparecem outras deformidades, tais como os dedos em botoeira e em
pescoço de cisne. Para relembrar a descrição destas deformidades, volte ao capítulo de exame
físico. As articulações metacarpofalangianas tendem a ficar luxadas e a se desviar para o lado.
Lembre-se de que a mão funciona, às vezes como um instrumento de apreensão dotado de em
grau relativamente alto de força, outras vezes como um delicado instrumento de precisão.
Anatomicamente pode ser notado que a mão desempenha as funções mais delicadas com a sua
porção radial, onde está o polegar e o indicador. Já a porção ulnar é a que mais participa e
fornece suporte em situações em que se exige força. Isto explica, parcialmente, porque, na
artrite reumatoide, o desvio se faz em direção ulnar.
C
A B
D E F
FIGURA 11.1- (A)- Forma inicial da artrite reumatoide; (B) desvio ulnar; (C) e (D) dedos em pescoço de cisne; (E)
dedo em botoeira; (F) polegar em Z.
Edema dorsal dos punhos é comum e a proliferação local da sinóvia pode ocasionar
ruptura do 5º e 6º tendões extensores dos dedos os quais ficam caídos, o que é conhecido como
sín-drome da cabeça da ulna ou "caput ulnae". Outro achado em mão de paciente com AR é o
da síndrome do túnel do carpo, causada pela compressão do nervo mediano por edema e
proliferação da sinóvia da articulação do punho.
Tenossinovites são comuns, principalmente de tendões flexores dos dedos ocasionando
atrito à mobilização (percebido pela palpação) e edema localizado entre as articulações
interfalangianas ou na superfície volar das falanges. Tenossinovite do abdutor longo ou do
extensor curto do polegar é responsável pelo aparecimento da síndrome de De Quervain. Não
raramente nódulos reumatoides se assentam sobre os tendões, travando os dedos em flexão,
com dor (dedos em gatilho).
144
Fica fácil de entender que, todas estas deformidades, associadas à diminuição de força
muscular ocasionadas pela dor e por atrofia muscular, em muito contribuem para a perda de
função da articulação.
O cotovelo é comumente afetado nesta doença. O que se encontra é uma epicondilite
ou artrite. O sinal mais encontrado de que existe (ou existiu) artrite do cotovelo é a perda de
extensão total da articulação, nem sempre percebida pelo paciente.
O envolvimento do ombro não se restringe à sinóvia da articulação glenoumeral, mas
também às bursas e tendões que se encontram nesta região com tendinites, bursites e até
ruptura do manguito rodador do ombro.
As articulações têmporo-mandibulares estão envolvidas na AR e pode ocorrer, em casos
mais avançados, ancilose da mesma ou reabsorção dos côndilos mandibulares.
As articulações cricoaritenoides são pequenas articulações sinoviais que têm a função
de rodar as cordas vocais para modular a voz. Quando acometidas na AR causam rouquidão,
sensação de tensão na garganta que aumenta ao tossir e ao deglutir. Podem se imobilizar em
adução causando dificuldade respiratória, o que é uma situação de emergência.
O quadril é uma articulação que está mais envolvida na forma infantil do que na de
adulto. Não se esqueça de que, dor no aspecto lateral da coxa pode se dever à bursite
trocantérica, ao invés de sinovite. Não esqueça também de que um paciente com problemas
no quadril pode se queixar de dor no joelho (dor referida).
O joelho demonstra facilmente coleções líquidas. Quando afetado, a atrofia da
musculatura do quadríceps ocorre precocemente (até em 1 semana). Outra manifestação é a
perda de extensão completa, que se não corrigida a tempo pode levar à contratura em flexão
(ocorre em pacientes que têm o costume de colocar almofadas sob o joelho afetado). Coleção
líquida no espaço articular pode ocasionar protrusão na porção posterior do com-partimento
articular, formando o cisto de Baker. Este nada mais é do que uma "hérnia" da sinovial, na qual
o líquido entra, mas não pode sair, graças a uma válvula que permite a passagem de líquido em
um único sentido. Este cisto pode se romper e o líquido nele contido pode dissecar a
musculatura da panturrilha, causando dor e reação inflamatória num processo que cria muita
confusão com tromboflebite.
A B
FIGURA 11.2 – Artrite Reumatoide. (A) Artrite de joelho (B) cisto de Baker (RMN)
O envolvimento do tornozelo é mais raro que o de joelho e aparece nas formas mais
sérias da doença. Erosões dos ligamentos desta articulação resultam em incongruência articular
que pode evoluir para deformidades do pé em pronação ou eversão. O tendão de Aquiles é local
para processo inflamatório e para assentamento de nódulos reumatoides. Pode, inclusive,
romper.
O pé, cujo envolvimento é comum, se alarga por um aumento do ângulo entre os
metatarsianos. Formam-se deformidades tipo hallux valgus e subluxação plantar da cabeça dos
metatarsianos, os quais provocam o aparecimento de bursas adventícias e calosidades ao se
145
C
B
FIGURA 11.3- Artrite reumatoide. (A) Queda de metatarsianos com dedo em martelo. (B) desvio medial da
segunda falange;hallux valgus (C) dedo em martelo
A B C
FIGURA 11.5. Luxação de coluna cervical em artrite reumatoide. (A) Desenho esquemático da posição do dente
do atlas; (b) RX mostrando aumento do espaço entre arco anterior do atlas e dente; (c) luxação superior grave.
A B D
FIGURA 11.6 - Nódulos reumatoides de diferentes tamanhos e em diferentes locais
tecido escleral (lesão esta que lembra o nódulo reumatoide). Isto causa uma hérnia da coroide
– o que confere um aspecto escuro à lesão. É denominada de escleromalácia perforans. Apesar
de um aspecto bastante preocupante (e do nome) a perfuração do globo ocular com perda do
seu conteúdo é muito rara.
O olho pode estar envolvido na Síndrome de Sjögren secundária ou cerato conjuntivite
seca, que é uma síndrome associada a AR. Nestes casos vê-se secura do globo ocular por perda
da formação de lágrimas ocasionada por uma disfunção lacrimal secundária a infiltração
linfocitária da glândula. A córnea se resseca e se torna facilmente sujeita a traumas e infecções.
Outras glândulas exócrinas estão envolvidas nesta síndrome: salivar, pâncreas etc..
A B C
FIGURA 11.7- Manifestações oculares da artrite reumatoide (A) escleromalácia (a porção escura é a uvea que
pode ser vista proque a esclera ficou muito fina) ; (b) esclerite necrotizante ; (c) episclerite.
Outros achados no pulmão do paciente com AR são:- (a)-fibroses intersticiais difusas, as quais
causam dispnéia de esforço, tosse com pouca expectoração, e com o decorrer do tempo pode
levar à insuficiência cardíaca direita; (b)- vasculite de vasos pulmonares.
A B
FIGURA 11.8 - Pneumonite intersticial (A) incipiente (vidro fosco) (B) forma mais grave com
faveolamento
normocítica, e a sua magnitude está claramente relacionado ao grau de atividade da AR, embora
a hemoglobina dificilmente esteja abaixo de 10g/ml a menos que existam outras causas
associadas. A capacidade de transporte do ferro está baixa (se fosse deficiência de ferro, estaria
alta). Não se deve esquecer que o uso crônico de AINHs pode ser causa de perda sanguínea
gastrintestinal, o que por sua vez causa anemia ferropriva. Eosinofilia tem sido descrita em
pacientes com doença articular grave, soropositiva, com vasculite e pleurite.
Síndrome de FELTY é o nome dado à associação entre AR + esplenomegalia + leucopenia
(principalmente granulocitopenia). Estes pacientes têm uma incidência maior de nódulos
reumatoides, úlceras de perna, infecções e manifestações extra-articulares da doença como
vasculites, neuropatia periférica etc... O fator reumatoide é positivo em altos títulos; o FAN
também é positivo, e pode existir crioglobulinemia. A leucopenia, nesta situação, é um
fenômeno periférico. A medula óssea está hiperplásica. O que ocorre é uma somatória de
fatores tais como: aumento na marginalização dos leucócitos, presença de anticorpos
antinucleares tipo específico (contra núcleo de granulócito) e esplenomegalia com
hiperesplenismo. Dois terços deste pacientes são mulheres. Caso você tenha um interesse maior
neste assunto, leia o texto complementar sobre S. de Felty.
VASCULITE REUMATOIDE- Vários tipos de lesão vascular podem ocorrer e têm sido
reconhecidas como aspecto cardinal da doença. Podem ocasionar, p.ex., obliteração da artéria
digital, obliteração em vasos que suprem pele e órgãos internos como artérias coronarianas,
vasos mesentéricos e vasa nervorum trazendo lesões isquêmicas agudas e subagudas nestes
locais. As manifestações clínicas se traduzem por achados extra-articulares da AR já descritos
anteriormente e por lesões de pele como úlceras de perna de difícil cicatrização, micro infartos
de leito ungueal, bordos de unha e polpa digital etc....
Pacientes com vasculite têm doença de longa duração, com doença mais grave e pouco
controlda, com maior número de nódulos subcutâneos, presença de fator antinuclear,
diminuição de complemento sérico e pior prognóstico. Só que, ao contrário do que acontece
com os nódulos reumatoides, que têm uma evolução bem paralela com o grau de atividade
articular da doença, a vasculite tende a aparecer nos períodos de quiescência da mesma.
Com o advento de novos medicamentos e melhor controle da doença, as vasculties
estão se tornandoraras em AR.
A B
FIGURA 11.9- Manifestações de vasculite em AR (A) Úlcera de perna; (B) Isquemia de dígitos.
150
LINFADENOPATIA- Ocorre mais no sexo masculino e seu desenvolvimento não guarda relação
com a atividade da doença básica.
AMILOIDOSE- É, na realidade, uma doença associada e não uma manifestação da AR. O termo
amiloidose vem do fato de que, nesta doença existe depósito de uma glicoproteína filamentosa
em tecido conjuntivo, que se cora de maneira semelhante ao amido, com uso do corante
vermelho do Congo. No caso da amiloidose associada a AR diz-se que a mesma é uma amiloidose
secundária. (Existem várias doenças associadas com amiloidose secundária além da AR como
tuberculose, bronquiectasias, osteomielites etc... Estas doenças têm em comum uma
estimulação crônica do sistema imune.) Esta glicoproteína pode se depositar em vários locais;
os achados mais comuns são em rins (causando proteinúria), fígado e baço (com hepato-
esplenomegalia), intestinos (causando síndrome de má-absorção) e língua (macroglossia).
O diagnóstico é feito através de biópsia gengival ou retal ou por análise de adipócitos
aspirados de tecido subcutâneo de abdome.
EXAMES COMPLEMENTARES
PESQUISA DO FATOR REUMATOIDE - Pode ser feita através da prova do látex ou do Waaler
Rose. Este último está em desuso. A prova do látex é positiva em 80% dos pacientes com AR.
Além disso, várias outras doenças tais como hepatite crônica ativa, lepra, tuberculose,
endocardite bacteriana e mononucleose infecciosa também podem cursar com presença de
fator reumatoide. Para relembrar o valor destas provas, leia a parte de laboratório em
reumatologia. Um aspecto, no entanto, deve ser salientado: o fato de que, no início dos
sintomas, muitos pacientes que virão a ser soropositivos, apresentam-se com este teste
negativo. Só metade dos pacientes tem látex positivo na primeira consulta. É pois, de bom
alvitre, quando a suspeita clínica aponta para o diagnóstico de AR e o paciente é fator
reumatoide negativo, que este teste seja repetido dentro de alguns meses.
ANTICORPOS ANTI-CCP - São anticorpos dirigidos contra proteínas citrulinadas como a filagrina
e sua forma circular (peptídeo cítrico citrulinado). Têm alta especificidade para AR (em torno de
90%) e parecem identificar os pacientes com doença mais grave. A sensibilidade varia de 33 a
87,2% dependo do tipo do teste usado e do padrão genético da população estudada.
A primeira delas é que a janela de oportunidade está mais para uma fenda do que para
uma janela propriamente dita, ou seja, este período inicial, sugerido inicialmente como de 2
anos, passou a ser considerado de meses (3 meses). Como é que um paciente chega tão cedo a
um médico - seja ele de clinica geral ou reumatologista? Lembre-se que, embora muitos
reumáticos no Brasil tenham convênio ou possam ter um médico particular, a grande maioria
ainda é dependente do tratamento oferecido pelo SUS, o qual é notório pela sua lentidão...
O segundo problema é: mesmo que o paciente chegue bem cedo ao médico, qual
profissional consegue fazer diagnóstico assim tão precoce e, na dúvida, tem coragem para iniciar
um imunossupressor? Cá entre nós, quando uma paciente fecha quatro dos famosos critérios
classificatórios para AR do Colégio Americano de Reumatologia, ela nem precisa mais destes
critérios... A doença está bem estabelecida e é obvia. Portanto, esqueça os critérios de 1987. O
problema está ali, no comecinho.
Os testes de laboratório que usamos não nos ajudam: a presença de fator reumatoide
não é necessária nem suficiente para o diagnóstico de AR e tem um índice de positividade bem
mais baixo no começo da doença. O anti-CCP é mais especifico, mas não tão sensível quanto
gostaríamos e escapa ao alcance de pacientes do sistema único de saúde. Além disso, muitas
pacientes se queixam de inchaço articular, mas ele nem sempre é assim tão óbvio ao exame
físico, principalmente se o paciente for um pouco mais rechonchudo....
Numa tentativa de auxiliar no diagnóstico precoce construiu-se um questionário com
pontuações (conhecidos como novos critérios de classificação da AR) , que consta a seguir:
Bem, obter uma pontuação alta é uma coisa. Decidir-se pelo tratamento, é outra. Aí é
que entra o famoso “bom senso” que fazem de um médico, um bom clínico...
PROGNÓSTICO
A doença articular que começa de maneira aguda e explosiva tende a ter uma evolução
melhor do que aquela de início insidioso. Outros fatores que influem no prognóstico são:
soropositividade, presença de nódulos reumatoide, sexo feminino e a presença do antígeno de
histocompatibilidade HLA DR B1, principalmente se o paciente for homozigoto.
O grau de disfunção de um paciente pode ser avaliado pela classificação funcional
global que está no quadro 11.4.
Embora se torne evidente que o maior problema da artrite reumatoide é dor e invalidez
resultante do envolvimento articular, a sobrevida de um paciente com AR é mais curta quando
comparada com a da população normal. As causas para diminuição de sobrevida são: infecções,
com-plicações sistêmicas da doença (tais como vasculites, pulmão reumatoide, sub-luxação de
coluna cervical e amiloidose), e complicações secundárias ao tratamento. Outra explicação para
a diminuição de sobrevida é a de que o processo inflamatório contínuo da AR atua como uma
fator de aterogênese acelerada, aumentado o risco de infartos do miocárdio e de doenças
vasculares isquêmicas.
Em um estudo canadense feito por MITCHELL e cols, a sobrevida de um paciente com
AR estaria diminuída em 4 anos para pacientes do sexo masculino e em 10 anos para pacientes
femininos quando comparadas com as da população normal, embora existam outros estudos
que demonstrem uma mortalidade maior para pacientes do sexo masculino. Outra publicação,
mais preocupante mostra que a mortalidade de uma AR severa (com mais do que 30 articulações
envolvidas) está associada com uma sobrevida <50% em 5 anos, sendo comparável com a de
uma doença coronariana de 3 vasos ou de um linfoma de Hodgkin estadio IV .
TRATAMENTO
sobre a sua doença com intuito não só de esclarecê-lo sobre as suas possibilidades de
tratamento como, também, de fornecer e reforçar instruções de proteção às articulações e de
ajudá-lo a fazer as mudanças necessárias ao seu novo modo de vida. O suporte emocional neste
tipo de doença, dadas as suas consequências sobre o dia a dia do paciente, é fundamental. É
fácil de entender que, uma doença como esta tem um impacto sócio econômico bastante grande
sobre a vida do indivíduo e que se acompanhe de um grau razoável de ansiedade, depressão,
diminuição da auto-estima e perda da motivação. Estas alterações psíquicas ajudam não só a
prejudicar a qualidade de vida do paciente como, também, impedem uma boa colaboração do
mesmo, no que concerne ao tratamento. Nesta situação, o melhor remédio, ainda é o próprio
médico. O interesse e o apoio que um médico atencioso dispensa ao paciente são elementos
insubstituíveis. É claro que, em situações mais acentuadas, nada impede que o profissional faça
uso da farmacoterapia dirigida para a alteração psíquica verificada.
Algumas medidas gerais devem ensinadas ao paciente. É fato sabido que o repouso
melhora a dor. No entanto, são bem conhecidos os efeitos do descondicionamento físico e
deterioração de nutrição da cartilagem que o mesmo promove. O segredo está em achar um
balanceamento correto entre repouso nas fases mais agudas seguido de exercícios adequados,
assim que o paciente melhore. Estes exercícios estão destinados a manter o trofismo muscular
e a evitar deformidades pelo desuso. Ao realizar estes exercícios é importante que o paciente
aprenda a respeitar a dor como um sinal de admoestação de que o uso da articulação está sendo
indevido. Além disso, estes exercícios, assim como a execução das atividades diárias, não devem
se acompanhar de suporte de peso.
O uso de aplicação de calor local é útil para aliviar a dor em casos em que a inflamação
é moderada ou suave. Articulações muito inflamadas toleram mal o calor. Nestes casos pode-se
fazer uso de compressas frias. Só que, antes de recomendá-las, tenha certeza de que o paciente
não é portador de S. de Raynaud, nem de crioglobulinemia...
Outro ponto que merece atenção por parte do médico é a instrução dirigida para
proteção articular. Afinal da contas, todo mundo concorda que é sempre melhor prevenir que
remediar. Agora, veja bem!... Esta doença tem uma predileção toda especial pelas mãos. Além
disto, afeta mais as mulheres, muitas das quais fazem uso excessivo desta parte do corpo, ao
realizar tarefas domésticas. Assim sendo, vale a pena “perder“ um pouco de tempo e instruir
estes pacientes para que “desdobrem” os pesos a serem sustentados. Um exemplo. Ao invés de
erguer uma chaleira cheia de água, para passar o café, pode-se ensinar estas pacientes a usar
uma concha ou uma xícara para passar este café, em pequenas porções. Ao invés de puxar uma
panela cheia de batatas para fora do fogão, que tal pedir a ela que retire cada batata com auxílio
de um garfo, para depois puxar a panela?... Torcer roupas é prejudicial para o punho: vamos
usar a maquina de lavar ou pendurar roupas sem torcer...
O movimento de pinça força muito os tendões, músculos e articulações da mão, como
os usados para segurar uma faca, uma caneta, o cabo de xícaras ou agulha de crochê. Para evitá-
lo, todos os objetos devem ter cabos largos, leves e macios (de preferência, de plástico). Deve-
se recomenar o uso de xícaras com duas asinhas ou uso das duas mãos para segurá-las apoiando-
as com a palma da mão.
Agulhas de crochê, canetas e facas e colheres de pau podem receber uma espuma
enroladinha no cabo ou um involucro com durepox e assim ficarão mais largas e mais fáceis de
segurar. Facas e tesouras devem estar bem afiadas para evitar para evitar que se tenha que
fazer força ao usá-las.
Em países mais desenvolvidos existe um grande número de adaptações a serem
utilizadas por estes pacientes e que podemser compradas. Ensine seu paciente a “ surfar na
internet” e descobrir algumas que ache que podem lhe ajudar...
A lém disso, uma terapeuta ocupacional pode auxiliar na prevenção de deformidades
das mãos com uso de talas moldadas individualmente para cada paciente e para cada tipo de
deformidade como mostradas na Figura 11.12.
156
A
B
C
FIGURA 11.12- Órteses para pacientes reumáticos: (A) órtese para dedo em botoeira; (B)
anel para deformidade em pescoço de cisne; (C) órtese para desvio ulnar.
Fotos - Gentileza da terapeuta ocupacional Bruna Caires
O pescoço também merece uma atenção especial. É claro que é inadequado carregar
pesos como pacotes e sacolas, mas, se isto não pode ser evitado, o paciente deve sempre
aproximar o peso do corpo, carrregando-o abraçado. Pacientes com muita dor nesta região
podem se beneficiar do uso de um colar cervical flexível. Este deve ser usado de maneira
intermitente e não continua para evitar enfraquecimento dos músculos da região. Se houver
instabilidade cervical (luxação atlas-axis) pode-se fazer uso de um colar rígido ou de medidas
cirúrgicas, dependendo de uma análise individual do caso. Pacientes com instabilidade cervical,
ao se utilizarem de veículos motorizados, não devem fazer uso de cintos de segurança e sim de
um colar cervical, para evitar que alguma freada brusca cause movimentos indesejáveis a este
nível (tipo chicote), com consequente lesão medular. Para isso você vai ter que dar um atestado
ao paciente para que ele não seja multado pelo departamento de trânsito. Estes pacientes
devem, também, sempre fazer uso de cadeiras e sofás que permitam um adequado suporte da
cabeça. Além disto, é importante evitar a posição de curvatura anterior da cabeça, o que tende
a comprimir a medula. Por isso, travesseiros não devem ser muito altos, nem muito baixos.
Quando o paciente se deita de lado, o travesseiro deve ocupar um espaço igual ao da altura do
ombro. Se ele se deita em decúbito dorsal, o travesseiro deve apenas preencher a lordose
fisiológica desta parte da coluna.
Quando as articulações de mm ii estão envolvidas, visto que elas suportam o peso do
indivíduo, é necessário que se faça uso de medidas que ajudem a “descarrregar” este peso ou
seja, de bengalas, muletas ou até de cadeira de rodas. Infelizmente o uso deste tipo de medida
auxiliar é visto com muito preconceito pelos nossos pacientes, e são poucos os que aderem a
ele. A prescrição da bengala para um paciente com AR deve levar em conta o fato de que este
157
paciente tem muitas articulações envolvidas e que, a transferência de suporte de um local para
outro pode poupar uma articulação e prejudicar outra. Assim, o uso de uma bengala comum
embora ajude a tirar peso de articulações de membros inferiores pode prejudicar a mão e
punhos do paciente. As bengalas canadenses por terem um apoio no antebraço são melhores
nesta situação. Deve-se também reforçar que a “pega” da bengala deve ficar na altura do quadril
do paciente com o cotovelo flexionado a 15-20º. Bengalas muito altas ou muito baixas podem
ser prejudiciais a tornozelos e coluna respectivamente. Bengalas e muletas devem ser usadas
no lado contrario ao de queixas do paciente.
Pacientes com envolvimento de mm. ii. sentem-se bem ao se utilizar de cadeiras com
pernas mais altas do que o normal e que tenham um assento com uma profundidade
equivalente ao comprimento das coxas. Estas cadeiras devem ter um bom suporte para as costas
e devem estar adequadas à altura da mesa. Se forem altas demais, prejudicam as costas e o
pescoço; se muito baixas, os braços estão sujeitos a um esforço aumentado. Camas um pouco
mais elevadas, assim como toaletes mais altas do que aquelas que normalmente usamos,
também costumam ser apreciadas porque facilitam o esforço de levantar o corpo.
Uma atenção especial ao treinamento do quadríceps deve ser dispensada ao artrítico
que tenha envolvimento do joelho. Se você não puder contar com o auxílio de um fisioterapeuta,
ensine a paciente, em posição deitada, a fazer contrações isométricas deste grupo de músculos.
Ficar deitado e elevar a perna afetada até mais ou menos 35º , por tempo mais ou menos
prolongado, também ajuda a treinar o quadríceps. Pode-se sofisticar este exercício usando uma
faixa elástica que ofereça um pouco de rexistência à elevação. No caso de envolvimento de
joelhos, nunca permita que o paciente coloque uma almofada sob esta articulação, um costume
bastante comum em nosso meio. Isto tende a promover contraturas em flexão. Peça, também,
ao paciente que evite ficar ajoelhado ao realizar suas tarefas domésticas.
Um ponto a ser atendido é o uso de sapatos adequados. Lembre-se de que, quando você
usa um sapato com saltos muito altos, o seu peso tende a ser sustentado pela parte da frente
do pé, o que pode prejudicar pacientes com metatarsianos caídos ou que tenham envolvimento
artrítico deste local. Além disso, saltos muito altos causam instabilidade no tornozelo. Por outro
lado, se o sapato não tiver salto algum, o peso todo tende a cair sobre as articulações do
tornozelo. O mais prudente é, então, adotar medidas intermediárias, recomendando ao
paciente que se utilize de saltos grossos de 2,5-3 cm numa tentativa de distribuir melhor o peso.
O sapato deve ser estável, com uma sola que não permita movimento de torção e que tenha um
solado grosso o suficiente para impedir o impacto da sola do pé com o chão durante a marcha.
Deve ter um bom contraforte e uma frente bem ampla e quadrada para melhor acomodar os
dedos. É melhor ainda, se este puder dispor de um sistema de abertura anterior, com cordões
ou velcros, que permita uma regulagem do tamanho de acordo com o grau de edema que o
paciente porventura venha a ter.
Se o paciente tiver metatarsianos caídos, ele pode se beneficiar de uma palmilha com
barra anterior. Se existir deformidades da articulação do tornozelo em varus ou valgus, o uso de
palmilhas adequadas que preencham o canto do tornozelo, externo ou interno
respectivamente, também pode ser feito.
Nas paginas que se seguem existem algumas figuras mostrando maneiras certas e
erradas de suporte de peso e de postura.
158
Agora vamos passar ao manejo medicamentoso do paciente com AR, o qual se baseia
no uso de AINHs, analgésicos, corticoides e nas chamadas modificadoras de doença.
ANTI INFLAMATÓRIOS NÃO HORMONAIS - O primeiro passo para o tratamento é dada com o
uso destas drogas. A farmacologia das mesmas já foi estudada anteriormente e por isto não será
revista aqui. Esta medicação pode ser usada de maneira intermitente (naqueles com doença que
evolui com remissões completas) ou de maneira continuada. Qualquer dos AINHs pode ser
utilizado e, antes de se considerar que a droga é insuficiente ou inefetiva, deve se estar certo de
que o paciente está fazendo uso da mesma em dose correta e pelo tempo adequado. Todavia,
o médico que as prescreve deve estar ciente de que esta é uma forma de tratamento dirigida
apenas para a sintomatologia do paciente e que estes medicamentos são apenas coadjuvantes
no tratamento. De maneira nenhuma devem substituir o uso de drogas modificadoras de
doença.
mostram insuficientes (abordagem step up). Existem outras formas de combinações, mas estas
são as mais usadas.
O uso da chamada terapia biológica vem revolucionando o tratamento da AR e sendo
fonte de esperança para doentes com doença grave. Agentes anti TNF-alfa (como etanercepte,
infliximabe, golimumabe, certolizumabe e adalimumabe), inibidores de coestimulação (CTLA4
ou abatacepte), anti IL-6 e anti CD-20 (rituximabe), devido ao seu alto custo, são indicados em
casos em que as terapias anteriores falharam.
O tofacitinibe è uma nova opção que pode ser usada antes ou depois da terapia
biológica.
Para maiores detalhes sobre a maneira de usar estes medicamentos, volte lá em no
capítulo de outros medicamentos em reumatologia.
Pequenas tofacitinibe
moléculas
Referências:
Alessandri, C. et al. The role of anti-cyclic cytrullinate antibodies testing in rheumatoid arthritis. Clinic Rev Allerg Immunol, v. 34, p.
45-9, 2008.
Aletaha, D. et al. 2010 Rheumatoid arthritis classification criteria. Arthritis Rheum, v. 62, n. 9, p. 2569-81, 2010.
Blackburn, WD. Management of Osteoarthritis and Rheumatoid Arthritis: Prospects and Possibilities. Am J Med, 1996; 100: 24S-30S.
Farragher TM et al. Association of HLA–DRB1 gene with premature death, particularly from cardiovascular disease, in patients with
rheumatoid arthritis and inflammatory polyarthritis. Arthritis Rheum. 2008; 58: 359-69.
Harris Jr E, Rheumatoid Arthritis: The Clinical Spectrum, In Kelley WN, Ruddy S, Harris Jr ED, Sledge CB (eds). Textbook of
Rheumatology, 5th Ed. W.B.Saunders Co, Philadelphia. 1985, p.919.
Harris JR E. Rheumatoid Arthritis: Pathophysiology and Implications for Therapy. N Engl J Med 1990; 322:1277-89.
Landewé RB. The benefits of early treatment in rheumatoid arthritis: confounding by indication, and the issue of timing [Editorial].
Arthritis Rheum. 2003; 48:1-5.
Lau Cs et al. Effects of fish oil supplementation on non-steroidal anti-inflammatory drug requirement in patients with mild
rheumatoid arthritis-a double-blind placebo controlled study. Br J Rheumatol. 1993;32: 982-9.
Lee AN et al. Rheumatoid factor and anti-CCP antibodies in rheumatoid arthritis: a review. Clin Lab Sci. 2008; 21:15-18
Lee DM et al. Rheumatoid Arthritis. Lancet. 2001; 358:903-11.
Mimori T. Clinical significance of anti CCP antibodies in rheumatoid arthritis. Int Med 2005; 44: 1122-6.
Panayi GS. Hormonal control of rheumatoid inflammation. Br Med Bull 1995 51: 462-71.
Rojas-Villarraga A et al. Familial disease, the HLA-DRB1 shared epitope and anti-CCP antibodies influence time at appearance of
substantial joint damage in rheumatoid arthritis. J Autoimmun. 2009; 32:64-9.
Rosenstein E, et al. Felty’s and Pseudo-Felty’s Syndromes. Semin Arthritis Rheum 1991; 21129-42.
Snowden N et al.Immunology of systemic rheumatoid disease. Br Med Bull 1995; 51: 437-48.
T Albani, S. et al .Etiology and pathogenesis of rheumatoid arthritis. In: Koopman, W. J. Arthritis and allied conditions. A textbook of
rheumatology. 13. ed., Baltimore: Williams & Wilkins, 1997, p. 979-92.
Van Doornum S, Jennings GL, Wicks IP. Reducing the cardiovascular disease burden in rheumatoid arthritis. Med J Aust 2006; 184:
287-90.
164
PATOGÊNESE
PREDISPOSIÇÃO GENÉTICA- Esta fica clara quando se nota a alta concordância de incidência da
doença mais em gêmeos monozigóticos do que em dizigóticos. A concordância em gêmeos
homozigóticos chega a 67% . De resto, o que se vê é uma ocorrência de história familiar em 10-
12% dos casos , embora um número muito maior de parentes apresente sinais de um distúrbio
imunológico incompleto, como por ex.: fator reumatoide positivo, anticorpos anti-cardiolipina
e anti-histonas positivos, diminuição de função de célula T supressora etc...
Vários genes determinantes de HLA classe II e III aumentam o risco relativo de se adquirir
o LES tais como: HLA DR2, HLA DR3, e alelos nulos para frações do complemento (por exemplo:
C4, C2 e C1q)É interessante notar, também, que uma deficiência adquirida dos fatores de
complemento, como é o caso que se vê no edema angioneurótico hereditário (no qual a
deficiência de C1q esterase causa um consumo excessivo dos demais elementos do comple-
mento) também está associada a uma maior ocorrência de lúpus.
Como uma deficiência de complemento poderia explicar uma predisposição para lúpus?
Acredita-se que a deficiência do complemento ocasione a persistência de determinados agentes
infecciosos de tal maneira que estes causem uma estimulação imunológica prolongada. Uma
falha na remoção de restos celulares apoptóticos e complexos imunes formados é outra
explicação.
Além dos genes do HLA e dos ligados ao complemento, outros genes implicados são os
de receptores de porção Fc de imunoglobulinas, de várias interleucinas, de moléculas
sinalizadoras intracelulares etc. Calcula-se que de 4 a 8 genes são necessários para predispor
uma pessoa a desenvolver lúpus.
INFECÇÕES VIRAIS - Vários vírus têm sido implicados como possíveis agentes etiológicos, mas
nada ainda pode ser provado. Fosfolipídeos de parede celular de bactéria podem agir como
ativadores policlonais de célula B ou levar à formação de anticorpos que reagem cruzado com o
esqueleto de ribose-fosfato do DNA. Descrições de partículas semelhantes a herpes virus ou
mixovírus têm sido feitas em rim, pele e linfócitos periféricos de pacientes lúpicos e dadas como
suporte para esta hipótese. Existe, no entanto, quem acredite que tais partículas são, na
realidade produto de necrose intracelular.
Uma ideia existente valoriza os HERVs - (Human Endogenous Retro Virus) que é um
material genético de retrovírus incorporado ao genoma humano. Este material resultou de
infeções em nossos antepassados e que aumentou com o decorrer das gerações sendo
transmitido geneticamente. Os HERVs podem se tornar ativos fazendo com que uma pessoa
tenha o equivalente a uma infecção viral sem ter encontrado “pessoalmente” com o vírus. Isso
pode estimular o sistema imune como se fosse uma infecção verdadeira. É comum observar que
um paciente com lúpus frequentemente sofre surtos de agudização da doença após infecções.
PAPEL DOS HORMÔNIOS SEXUAIS - Hormônios sexuais contribuem para a patogênese do LES.
Em geral, os estrógenos aumentam e a testosterona diminui a resposta de anticorpos. Homens
e mulheres com LES têm um aumento da hidroxilação de estrógenos e estrona, o que produz
uma estimulação estrogênica prolongada. Os estrógenos estimulam células CD8, CD4 , células
B, macrófagos e aumentam a expressão de HLAs e moléculas de adesão endotelial.
exposição à luz ultravioleta não se limita ao aparecimento ou piora das lesões de pele na área
exposta, mas, também, se vê ativação da doença sistêmica.
Exposição a certas drogas (hidralazina, procainamida, clorpromazina e vários anticon-
vulsivantes) está claramente associada à ocorrência de uma doença similar ao LES e estas drogas
parecem funcionar como haptenos, levando à formação de anticorpos. Uso de tabaco e inalação
de sílica também atuam como elementos predisponentes à doença.
Curiosamente o consumo de brotos de alfafa, com alto teor do aminoácido L-cana-
vanina, o qual pode influir na imunorregulação, tem sido reconhecido como um fator associado
à ocorrência de LES.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
totalmente inespecíficos e não ajudam a fazer este diagnóstico. Em 60% dos casos de
apresentação da doença existem queixas articulares; 20% têm queixas de pele.
Na criança, a doença debuta com um número maior de casos de envolvimento renal,
Coombs positivo, hipocomplementemia e trombocitopenia. Nelas, as queixas articulares e as de
sistema nervoso central são mais raras. No velho, a doença tende a ter um início mais vago que
lembra, às vezes, a polimialgia reumática ou artrite reumatoide. Nesta idade as manifestações
neuropsiquiátricas, fotossensibilidade, úlceras, lesões discoides e Raynaud são as mais comuns.
O líquido sinovial dos pacientes com artrite lúpica é do tipo inflamatório com glicose
normal; o FAN pode ser positivo em baixos títulos. Existem casos de coexistência de artrite
reumatoide e lúpus, numa forma mista de doença. Esta é denominada de rupus.
Tendinites, inclusive com casos de ruptura de tendão têm sido descritos, sendo estes
últimos mais comuns em pacientes tratados com corticoide.
Nódulos subcutâneos têm sido vistos nas proximidades de articulações das mãos e em
superfície extensora do antebraço. A histologia é diferente da do nódulo reumatoide e sempre
que presente deve-se fazer diagnóstico diferencial com paniculite ou lúpus profundus.
Necrose óssea com clínica ocorre em 4 a 11% dos lúpicos; a maior parte associada à
corticoterapia. Os locais mais afetados são plateau tibial, cabeça de fêmur e de úmero. Necroses
assintomáticas parecem ser bem mais comuns do que isto.
Outros achados, bem mais raros, incluem a ocorrência de condrite envolvendo
cartilagens do nariz e dos pavilhões auriculares, e calcinose.
Para o lado dos músculos, a queixa mais comum é de mialgia que aparece em 40 a 50% dos
casos. A miosite acontece mais raramente, em 5 a 11% dos casos e comporta-se como uma
miosite clássica, semelhante à vista em casos de polimiosite. Tem preferência pela musculatura
proximal, promove aumento de enzimas, alterações eletromiográficas etc. Não se deve
esquecer que estes pacientes recebem frequentemente corticoide e antimaláricos os quais
168
podem ser causa de miopatia. Mialgias com EMG e CPK normais respondem bem ao uso de
AINH. Já a miosite requer o uso de corticoide em altas doses (pelo menos 1 mg/Kg/dia de
prednisona ou equivalente).
O lúpus cutâneo subagudo (SCLE) pode ocorrer em associação com LES clássico e está
associado coma presença dos anticorpos anti-Ro (SS-A) e anti-La (SS-B). Existe, também, uma
associação desta forma da doença com HLA DR3 e HLA B8 e com deficiência de complemento
(no caso, C2). As lesões cutâneas são extensas, simétricas, não deixam cicatriz e são altamente
169
FIGURA 12.2- Lesões cutâneas circinadas de lúpus cutâneo subagudo (anti Ro positivo)
envolvidos. Hiperpigmentação, às vezes, está presente, mas com o decorrer do tempo é mais
comum aparecer despigmentação central e atrofia. Cicatrizes deprimidas, teleangiectasias e
despigmentação permanente podem trazer problemas sérios do ponto de vista cosmético.
A B
C D
E F
FIGURA 12.3- Lesões de lúpus discoide ativas (A) , (B) e (D); cicatriciais (C), (E) e (F).
171
Quando a disseminação da doença ocorre, ela se faz presente, em geral, dentro dos 2 a 3
primeiros anos após o aparecimento das lesões discoides.
1. -paniculite do lúpus eritematoso (lúpus profundus) que aparecem como lesões nodulares
bem definidas subcutâneas que, ao curar, deixam uma área deprimida central;
2. - lesões bolhosas que aparecem quando o processo inflamatório agudo é muito importante.
Estão associadas com aparecimento de lesão renal.
3. – perniose lúpica que aparece como placas infiltradas que se agravam com exposição ao frio.
(Obs- não confunda perniose lupica com lúpus pérnio que é uma lesãode pele caracteristica
de sarcoidose e não de lúpus).
4.
A B
FIGURA 12.4 – Lúpus eritematosos sistêmico- lesões bolhosas (A) e paniculite lupica (B).
Além das lesões específicas, outros achados são possíveis em pele de um paciente com
doença sistêmica. Lesões agudas como pápulas avermelhadas simulando alergias são comuns.
Lesões vasculíticas podem aparecer sob a forma de púrpura palpável, hemorragias em estilhaço
subungueais, lesões vasculíticas nos bordos ungueais, dilatação de capilares e eritema na base
das unhas, urticárias, etc.
173
A B
C D
E F
FIGURA 12.5- Lesões inespecíficas do Lúpus: (A) rash máculo-papular agudo, (B) lesões de
vasculite tipo púrpura palpavel, (C) e (D) Vasculites de cantos de unhas e nodular ( 2º dedo
em C). Fazer diferencial com endocardite bacteriana. (E) Vasculite de dedos; (F)- Urticária-
vasculite.
grandes, profundas e dolorosas. Estas úlceras aparecem e se fecham com grande rapidez à
medida que a doença é controlada, mas tendem a recorrer em futuros surtos de agudização em
pacientes nos quais estiveram presentes no surto inicial.
B
A
D
C
FIGURA 12.6- A e C- Livedo reticular; B e D- Lesões de mucosas em paciente com lupus
FIGURA 12.8- Alopecia difusa e em placa (esta última com lúpus discoide).
A B C
FIGURA 12.9- A e B- Raynaud; C -Úlcera de perna com características de pioderma
gangrenoso.
A coreia e o balismo são raros. A coreia tem sido descrita em pacientes grávidas ou
precipitada pelo uso de anticoncepcionais orais e parece não guardar relação com a atividade
da doença. Sua presença tem sido associada, também, à dos anticorpos antifosfolipideos.
Cefaleia pode aparecer isoladamente, isto é, sem associação com outras manifestações
do S.N.C. e responde a aumento na dose do corticoide. Cefaleia é, no entanto, um achado muito
inespecífico. Deve-se desconfiar de que existe uma causa orgânica para a mesma, quando o
paciente apresenta, junto, convulsões, alterações de personalidade, ou quando aparece em
alguém que não tinha previamente este sintoma.
Neurite periférica pode aparecer como neuropatia isolada ou múltipla. Envolvimento de
nervos cranianos é comumente transitórios e respondem a corticoide.
Convulsões podem preceder o quadro completo do lúpus. São tratadas com corticoides
e anticonvulsivantes.
Depressão, psicoses incluindo uma síndrome esquizofrenia-like são frequentes.
Aparentemente são as manifestações de SNC mais comuns em pacientes lúpicos podendo
aparecer anos antes das outras manifestações desta doença. Estados psicóticos podem se dever
tanto à doença como ao uso do corticoide e não existe correlação entre o grau de alteração
psiquiátrica observada e a dose do corticoide. Nestes pacientes é importante observar, também,
se eles não estão fazendo uso de qualquer outra droga que possa ter efeito psicoativo, como é
o caso dos -bloqueadores, cimetidine, digoxina, AINHs , tranquilizantes ou antidepressivos.
Obviamente, muitas das manifestações psiquiátricas podem resultar de depressão ou
ansiedade em quem tem uma doença crônica grave, o que é perfeitamente compreensível.
Em um paciente com manifestações do sistema nervoso central, a punção lombar é
mandatória para se excluir uma infecção associada. O líquor de pacientes com lúpus pode
apresentar pleocitose, e proteínas aumentadas. A glicose é normal. Estudos sorológicos e de
complemento têm pouco valor no diagnóstico. Tomografia computadorizada parece ter pouco
valor sendo positiva em pacientes com sinais neurológicos focais, e praticamente sem validade
nos casos de envolvimento difuso. Não se deve esquecer que a maioria dos pacientes tratados
com corticoide apresenta atrofia cerebral. Existe a associaçãode fenômenos psicóticos com os
anticorpos anti P ribossomal - (P=psicose) cujos títulos parecem flutuar de acordo com os
achados neuropsiquiátricos.
MANIFESTAÇÕES OCULARES – Conjuntivite e episclerite podem aparecer, mas não têm maior
significado clínico. Corpúsculos citoides e infiltrados brancos aparecem nos pacientes
agudamente doentes, podendo estar associados com vasculite retiniana e com a presença do
anticorpo anticardiolipina. Isto explica porque é raro o achado de alterações retinianas em
pacientes ambulatoriais. Corpúsculos citoides são resultado do dano endotelial aos capilares
com aumento de permeabilidade que permite o escape de plasma e hemácias para dentro das
fibras nervosas.
ACHADOS LABORATORIAIS
PROVAS DE ATIVIDADE INFLAMATÓRIA - A VHS é um guia pobre para a atividade do lúpus, uma
vez que pode persistir alta por anos ou meses em pacientes com doença quiescente. Mesmo
assim, é melhor que a proteina C. reativa.
FATOR ANTINUCLEAR- É o teste padrão para triagem em lúpus. Quase todos os pacientes
lúpicos têm FAN positivo. O problema é que estes auto-anticorpos também são encontrados em
uma grande variedade de outras situações incluindo idade avançada, uso de certas drogas,
infecções como lepra lepromatosa ou endocardite bacteriana, artrite reumatoide e outras
180
doenças auto-imunes, hepatite crônica ativa e cirrose biliar primária. Como os testes mais
modernos são muito sensíveis, estes achados estão sendo bem frequentes e trazem muitos
problemas para a sua interpretação. Um teste positivo isolado, sem contexto clínico, não tem
valor. Na realidade um teste repetidamente negativo é muito mais útil, porque praticamente
afasta o diagnóstico de LES.
ANTI DNA - Anticorpos contra ds-DNA são quase únicos de pacientes com lúpus, o que não
acontece com os ss-DNA que são encontrados em uma grande variedade de doenças
reumáticas. Como já foi mencionado anteriormente, existe uma correlação entre o achado deste
anticorpo e a presença de lesão renal.
ANTICORPOS CONTRA ENA (extractable nuclear antigens)- Sob este título estão vários
autoanticorpos como anti RNP, anti-Sm, anti-Ro (SS-A), anti-La (SS-B). Salvo o anticorpo anti-Sm
que é altamente específico para a doença, os outros não são exclusividade do lúpus.
Anticorpos anti-RNP são vistos em pacientes com vasculite urticariforme
hipocomplementêmica, em paciente com lúpus e hipertensão pulmonar e parecem
correlacionar de maneira negativa com doença renal significante.
O anticorpo anti-Ro é visto em pacientes com Síndrome de Sjögren, em pacientes com
lúpus clássico, lúpus cutâneo subagudo e deficiência de C2. O sistema anticorpo anti Ro (SS-A)
tem uma habilidade especial para iniciar injúria cutânea e isto explica sua relação com
fotossensibilidade. Este sistema também atravessa a barreira placentária em mulheres grávidas,
sendo responsável pelo lúpus neonatal aonde se vê fotossensibilidade (enquanto durar o
anticorpo circulante) e bloqueio cardíaco congênito (permanente).
FATOR REUMATOIDE - Está presente em mais da metade dos pacientes embora em títulos bem
menores dos que os de pacientes com artrite reumatoide.
CRITÉRIOS DE CLASSIFICAÇÃO
Estes critérios são, muitas vezes, considerados como essenciais para que se possa
estabelecer um diagnóstico definitivo. Isso não é bem verdade. É possível admitir-se um
diagnóstico de lúpus em um paciente que não os preencha, como por exemplo, em alguém em
que a doença se manifeste como febre de origem desconhecida. O valor destes critérios está no
181
4. ÚLCERAS ORAIS: ulceração de nasofaringe ou oral. Deve ser observada pelo médico.
5. ARTRITE: não erosiva, envolvendo duas ou mais articulações periféricas com sinais
flogísticos.
6. SEROSITE: PLEURITE: história bem típica ou atrito pleural escutado pelo médico ou
evidências de derrame pleural; PERICARDITE: documentada pelo ECG, atrito ou
evidência de coleção líquida.
7. DESORDEM RENAL: PROTEINÚRIA persistente maior que 0,5g/dia ou mais que +++ se
a quantificação não for feita; CILÍNDROS CELULARES: de hemácias, granulares,
tubulares os mistos.
8. DESORDEM NEUROLÓGICA: CONVULSÕES: na ausência de desordens metabólicas
(tais como uremia, acidose ou desiquilíbrio hidro-eletrolítico) ou drogas que possam
causá-las; PSICOSE: na ausência de droga ou desordem metabólica que possam ser os
responsáveis pelo sintoma.
9. DESORDENS HEMATOLÓGICAS ANEMIA HEMOLÍTICA: com reticulocitose;
LEUCOPENIA: menos que 4.000/mm3 no total, em duas ou mais ocasiões;
LINFOPENIA: menos que 1.500/mm3, em duas ou mais ocasiões; TROMBOCITOPENIA:
menos que 100.000/mm3, na ausência de droga que possa ser a causa.
10.DESORDENS IMUNOLÓGICAS: ANTI DNA positivo, ANTI Sm positivo OU PRESENÇA DE
ANTICORPOS ANTIFOSFOLIPIDEOS (diagnosticados por achados positivos de
anticorpos anticardiolipina, lúpus anticoagulante ou falso teste positivo para lues por
mais de 6 meses com FTA -ABS normal).
11. FAN POSITIVO: na ausência de uso das chamadas drogas indutoras de lúpus
CRITÉRIOS CLÍNICOS
1) Lesões cutâneas agudas: rash em borboleta, lesões bolhosas, necrolise epidérmica
tóxica, rash maculopapular, rash fotossensível na ausência de dermatomiosite OU lesões
cutâneas de lúpus subagudo.
2) Lesões cutâneas crônicas: rash discoide localizado ou generalizado, lúpus
hipertrófico, paniculite lúpica, lúpus de mucosa, lúpus túmido, perniose, overlap de lúpus
discoide/líquen plano.
3) Úlceras orais (palato, bucal, língua e nasal) na ausência de infecção, Behçet, artrite
reativa ou ingestão de alimentos ácidos.
4) Alopecia não cicatricial – na ausência de alopecia areata, androgênica ou ↓de ferro.
5) Sinovite- ≥2 articulações OU artralgia de 2 ou + com 30 minutos de rigidez matinal.
6) Serosite (pleural ou pericárdica - dor típica que durou mais de 1 dia, derrame ou atrito
ou ainda pericardite por ECG)
7) Renal – relação proteína/creatinina na urina ou proteinuria de 24h acima de
500mg/dia ou cilindros hemáticos
8) Neurológico: convulsões, psicose, mononeurite múltipla na ausência de outras causas
conhecidas, mielite , neuropatia periférica ou craniana na ausência de vasculite e de diabetes,
estado confusional ( na ausência de uremia, exposição a tóxicos e infecções)
9) Anemia hemolítica
10) Leucopenia (4.000/mm3 pelo menos 1 vez na ausência de S. de Felty, medicamentos
e hipertensão portal) OU linfopenia (1.000 pelo menos 1 vez na ausência de corticoides,
drogas e infecções.
11) Trombocitopenia (menos que 100.00/mm3 pelo menos 1 vez) na ausência de drogas,
hipertensão portal e purpura trombocitopênica trombótica.
CRITÉRIOS IMUNOLÓGICOS
1) FAN positivo
2) Anti ds DNA (se por ELISA, pelo menos 2 vezes o valor normal)
3) Anti Sm
4) Anticorpos antifosfolípides – (ACLs, LAC e B2GPI. Podem ser do tipo IGM, IgG e IgA.)
ou falso VDRL.
5) Complementos baixos: C3, C4 e/ou CH50.
6) Coombs direto positivo na ausência de anemia hemolítica.
O diagnostico é feito com 4 critérios sendo pelo menos 1 clínico e 1 imunológico. No caso de biópsia de rim positiva com FAN ou
anti dsDNA o diagnóstico também é aceito.
TRATAMENTO
MEDIDAS GERAIS - Educação do paciente e suporte psicológico são muito importantes em uma
doença crônica de prognóstico grave, que perturba as realizações de atividades diárias e que
pode ser causa de incapacitação e diminuição da sobrevida.
Os pacientes devem ser ensinados a evitar a luz solar ou outras formas de exposição à
luz ultravioleta através de um vestuário adequado, uso de filtros e evitando exposição intensa
ao sol.
A gravidez deve ser evitada nos períodos de atividade da doença ou quando se faz uso
de certas drogas imunossupressoras.
183
CORTICOIDE -É essencial notar que o diagnóstico de lúpus não é igual a tratamento obrigatório
com corticoide. Indivíduos com artrite e lesões de pele safam-se muito bem só com AINH ou
com cloroquina. Em lesões de pele pode-se utilizar o corticoide tópico.
O corticoide via oral ou parenteral pode ser usado das seguintes maneiras:
1) em doses até 10 mg/dia de prednisona ou equivalente: para artrite, lesões de pele e serosites
que não responderam ao tratamento anterior.
2) em doses altas ou 1 mg/Kg/dia de prednisona ou equivalente: em pacientes com
manifestações mais graves (anemia hemolítica, trombocitopenia, envolvimento de S.N.C.,
lesões renais e serosites grandes). O corticoide pode ser utilizado como droga isolada para
o tratamento da glomerulonefrite membranosa, e associado a ciclofosfamida ou outro
imunossupressor em casos de glomerulonefrite proliferativa difusa e focal.
3) como terapia de pulso: em pacientes com envolvimento de SNC, doença renal ativa e com
trombocitopenia enquanto se faz a esplenectomia. De maneira geral, o pulso do corticoide é
usado para “ganhar tempo” enquanto se estabelecem outras formas de tratamento.
Assim que possível estas drogas devem ser retiradas e substituídas por “
economizadores” de corticodie por casua de seus efeitos colaterais.
Ciclosporina tem sido utilizada em casos de pacientes com citopenias severas que contra
indiquem o uso de outras drogas imunossupressoras e em alguns pacientes com lesão renal,
principalmente, classe 5.
O mofetil micofenolato, por causa de sua boa tolerabilidade vem sendo usado cada vez
mais nas manifestações graves no lugar da ciclofosfamida podendo ser uma opção na indução
de remissão das glomerulonefrites.
O metotrexate tem se mostrado útil no tratamento das manifestações articulares mais
rebeldes, vasculites cutâneas e, mesmo para as serosites.
OUTROS CUIDADOS – O uso de drogas como inibidores de ECA e de seus receptores podem
ser usados no combate à proteinuria. Pacientes com lúpus, assim como os de artrite reumatoide
estão sujeitos a aterogenese acelerada. Tratamento de dislipidemias,sedentarismo, tabagismo,
hipertensão arterial e obesidade devem ser feitos com rigor.
Pacientes em uso de corticoide devem receber cálcio e vitamina D para prevenir
osteoporose. Existe que recomende que um nível sérico de vitamina D nestes pacientes deve
ser em torno de pelo menos 40 ng/mL já que esta vitamina possui propriedades
imunomodulatorias benéficas neste contexto. Lembre que um paciente de LES usa protetor
solar de maneira rotineira o que prejudica a sua síntese. Acompanhamento com densitometria
óssea podeser necessário.
Outro cuidado a ser tomado é com infecções, as quais são comuns, seja pela doença
básica ou pela terapêutica que o paciente usa. Antibiótico profilático é advogado antes de
procedimentos dentários, genito-urinários e outros procedimentos cirúrgicos invasivos. Vacina
anti-pneumocócicas e contra influenza estão indicadas. Uso do Bactrin ® profilático para evitar
a infecção pelo P. jirovechii deve ser feito em usuários de ciclofosfamida e MMF ou, ainda,
naqueles com linfopenia grave.
Outras doenças autoimunes podem aparecer nestes pacientes, principalmente as de
tireoide. Testes para disfunção tireoidiana devem ser solicitados quando houver esta suspeita.
Finalmente, pacientes com lúpus têm uma maior prevalência de certos tumores,
principalmente se ele tiver feito uso de ciclofosfamida. Nas mulheres, o exame preventivo de
185
colo de útero deve ser feito anualmente uma vez que este é um dos tumores cuja prevalência
está aumentada. Se possível utilizara vacina contra HPV.
Para recomendações sobre gravidez e uso de anticoncepcional – vá até o capitulo de
Gravidez em doenças reumáticas.
PROGNÓSTICO
O termo lúpus induzido por droga é usado para designar as situações nas quais o
indivíduo desenvolve sinais e sintomas lúpus like após a exposição a determinado medicamento.
Tipicamente, estes desaparecem quando o medicamento é removido. Assim, o diagnóstico de
lúpus induzido por droga requer uma identificação temporal entre a administração da droga e
aparecimento da síndrome clínica (ou do FAN positivo). A indução desta síndrome por um
fármaco pode levar semanas, meses e até anos para aparecer. A soro reatividade (no caso, FAN
+) é o primeiro elemento a surgir e o último a se extinguir quando o agressor é suspenso.
Muitos agentes têm sido implicados na gênese desta síndrome. Os mais comuns são os
anti-arrítmicos e anti-hipertensivos (especialmente a hidralazina e os -bloqueadores), anti-
convulsivantes e a isoniazida. No quadro 12.9 estão listadas algumas destas drogas.
Resumindo, pode se depreender que existam dois elementos básicos predisponentes a esta
situação, um genético e outro dependente da droga em si.
O diagnóstico do lúpus induzido por droga nem sempre é fácil. Primeiro, pela predominância
de sintomas músculo-esqueléticos, os quais facilmente podem ser atribuídos a outra causa.
Segundo, pela polifarmácia que ocorre, em geral em idosos que são os elementos mais sujeitos
a desenvolver este tipo de síndrome.
Apesar de estarmos conscientes da ocorrência do lúpus induzido por drogas, não existem
elementos para se sugerir que estes medicamentos não devam ser utilizados, nem para que o
achado de um FAN + deva ser causa da retirada dos mesmos. A baixa probabilidade de que um
indivíduo venha a ter sintomas e a benignidade dos mesmos permitem que se corra o risco da
administração deste tipo de fármaco. Além disso, se o paciente vier a ter sintomas, estes
regridem prontamente com a retirada da droga ou respondem a baixas doses de corticoides ou
a antI-inflamatórios não hormonais.
Referências:
Boackle SA. Advances in lupus genetics. Curr Opin Rheumatol. 2013; 25: 561-8.
Cervera R et al. Morbidity and mortality in systemic lupus erythematosus during a 5-year period. A multicenter
prospective study of 1.000 patients. European Working Party on Systemic Lupus Erythematosus. Medicine 1999; 78:
167–75.
Cervera R et al. Systemic lupus erythematosus: pathogenesis, clinical manifestations and diagnosis. In Bijlsma JWJ
(ed) Eular Compendium on Rheumatic Diseases, 2009, BMJ Publishing Group, Italy, p.257-68.
Gilliam JN et al.Distinctive cutaneous subsets in the spectrum of lupus erythematosus. J Am Acad Dermatol 1981; 4
:471-5.
Hochberg MC. Updating the American College of Rheumatology revised criteria for the classification of systemic lupus
erythematosus [letter]. Arthritis Rheum 1997; 40: 1725.
Jurencák R, Fritzler M, Tyrrell P, Hiraki L, Benseler S, Silverman E. Autoantibodies in pediatric systemic lupus
erythematosus: ethnic grouping, cluster analysis, and clinical correlations. J Rheumatol 2009; 36: 416-21
Lutz CA et al. Antibodies to spliceosomal components. In Wallace DJ. Hahn BH (Eds) Dubois’ Lupus Erythematosus.
Lippincott. Williams & Wilkins. Philadelphia. 2007. p.500-13.
Petri M et al. Derivation and Validation of the Systemic Lupus International Collaborating Clinics Classification Criteria
for Systemic Lupus Erythematosus. Arthritis & Rheumatism 2012; 64:2677–86.
Weening J et al. The classification of glomerulonephritis in systemic lupus erythematosus. Kidney Int 2004; 65: 521–
30.
189
Capítulo 13 - Esclerodermia
EPIDEMIOLOGIA
Comparada com outras doenças do tecido conjuntivo é uma doença relativamente rara
(acontece em 1-2/100.000 pessoas) o que dificulta avaliações de tratamento e elucidações
patogenéticas. A incidência homem/mulher é de 1/3, favorecendo ainda mais o sexo feminino
nos pacientes não brancos. A idade média de início da doença é aos 30-50 anos, sendo que a
doença costuma ser mais grave em homens e em pacientes idosos.
PATOGÊNESE
AUTOANTICORPOS NA ESCLERODERMIA
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
A B
C D
FIGURA 13.1- Esclerodermia achados da mão (A)- fase precoce ; (B, C e D) fase esclerótica.
192
A B
C D
FIGURA 13.2-Fascies esclerodérmico; (A) perda da expressão facial, (B) telangiectasias em
palma da mão (C) e (D) teleangiectasias em face
Em alguns pacientes (não todos) o envolvimento de pele entra para uma fase tardia, de
3 a 15 anos após a fase clássica. A pele fica mais pregueável e mais macia, mas a epiderme
permanece atrófica e sem anexos.
194
ALTERAÇÕES VASCULARES PERIFÉRICAS- Mais do que 95% dos pacientes têm síndrome de
Raynaud, sendo esta incidência maior do que em qualquer outra doença do tecido conjuntivo.
Nos pacientes com a forma limitada da doença, o Raynaud tende a preceder por muitos anos o
aparecimento do restante da clínica levantando sempre a pergunta: qual dos pacientes com
Raynaud virá a desenvolver esclerodermia?
B
A
D
C
E F
FIGURA 13.5- Raynaud e suas consequências;(A) fase pálida; (B) fase cianóticas; (C) úlcera
estelar na polpa digital-3odedo; (D) e (E) – isquemia; (F)- acro-osteólise.
limita à circulação periférica, mas também inclui vasos de órgãos internos como o rim, coração
e pulmões.
A B
C D
FIGURA 13.6 (A)- (B) Contratura da articulação por esclerose da pele ; (C) Acro-osteólise;
(D) Calcinose.
196
A B
FIGURA 13.7- (A)- Imagem em vidro fosco; (b) Fibrose e bronquiectasias de tração.
197
manometria do esôfago (este último mais sensível). A patogênese deste tipo de lesão não é bem
fluxo sanguíneo (primeiro de maneira intermitente, depois de maneira fixa).
A acalásia, por promover regurgitação e trazer a possibilidade de aspiração de conteúdo
esofágico (em pequenas quantias, porém de maneira constante) tem sido implicada na piora
das lesões pulmonares da esclerodermia.
Intestino delgado: o que se vê aqui é hipomotilidade. Consequentemente a isto pode-se
encontrar clínica de má-absorção e de pseudo obstrução. Distúrbios de motilidade causam
dilatação de 3ª e 4ª porção do duodeno e lentificação do tempo de trânsito. Síndrome de má
absorção aparece em parte alguns pacientes e é causada por superpopulação bacteriana em um
intestino hipotônico. Estas bactérias desdobram os sais biliares. A má absorção leva a um
aumento da excreção de gordura nas fezes, perda de peso, desnutrição, diminuição de absorção
de vitaminas lipossolúveis.
As outras manifestações são síndrome de pseudo-obstrução (que também ocorre em
intestino grosso), pneumatose cistoide intestinal (a superpopulação bacteriana produz gás que
aumenta a pressão do lume e disseca as paredes do intestino), volvo, impactação de material
fecal e formação de úlceras estercorais com eventual perfuração.
O mecanismo de produção da hipomotilidade em intestino delgado é, provavelmente,
semelhante ao do esôfago.
Colon: a diminuição da motilidade leva à formação de divertículos de boca larga na borda anti-
mesentérica, que são típicos da doença. Estes divertículos contém as 3 camadas da parede
intestinal, mas a muscular está atrófica. São achados mais raros e de uma fase mais tardia da
doença. Nunca ocorrem sem envolvimento do esôfago.
Na maioria das vezes são assintomáticos existindo apenas a queixa de constipação
crônica por diminuição da motilidade. Só dão clínica quando infectam ou sangram.
A B C
FIGURA 13.7- (A) Microstomia; (b) acalasia de esôfago; (c) divertículos de boca larga no
colon.
Pacientes com a forma localizada da esclerodermia têm uma maior incidência de cirrose
biliar primária e Síndrome de Sjögren. Além disso, as manifestações esclerodérmicas podem
fazer parte de uma síndrome mista do tecido conjuntivo
O prognóstico na esclerodermia depende claramente do padrão de órgãos envolvidos.
Pacientes com forma limitada têm uma sobrevida de 90% em 5 anos; os com doença difusa em
torno de 70-80% neste mesmo período. Os pacientes com a forma difusa de esclerodermia que
irão desenvolver envolvimento visceral grave (principalmente cardíaco e renal) o fazem dentro
dos primeiros anos de doença. Assim, a observação cuidadosa do paciente nos primeiros anos
após o diagnóstico revela quais são os pacientes com mau prognóstico.
CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS
Cerca de 10% dos pacientes com esclerodermia têm apenas envolvimento visceral, sem
acometimento cutâneo. Este é um subgrupo pouco estudado da doença. O diagnóstico é feito
com base em achados de envolvimentos viscerais tais como hipomotilidade de esôfago,
Raynaud, doença intersticial pulmonar etc e pela presença dos autoanticorpos. O padrão de
envolvimento visceral tende para o da forma limitada da esclerodermia.
A ESCLERODERMIA SÓ DE PELE
A B
C D
E F
FIGURA 13.8- Formas localizadas de esclerodermia: (A) golpe de sabre; (B) e (C)- formas
lineares, (D) formas de morfea em placas; (E) e (F)- morfea generalizada.
202
TRATAMENTO DA ESCLERODERMIA
Não existe uma droga ou combinação delas que tenha provado ser de valor ou que seja
completamente aceita como capaz de sustar a doença. Isto decorre da precariedade dos co-
nhecimentos sobre a patogênese da doença. Desta maneira resta ao médico tratar cada uma
das manifestações apresentadas pelo paciente.
TRATAMENTO DA CALCINOSE- A calcinose pode ser tratada com excisão cirúrgica simples
desde que a pele das redondezas esteja intacta e não esteja infiltrada com cálcio, o que
prejudicaria a cicatrização. Em situações em que ocorreu a ulceração de pele e formação de
fístula, a cirurgia deve ser evitada. Quando existe uma reação inflamatória estéril, por depósito
de cristais de hidroxiapatita, pode-se utilizar a colchicina com bom resultado. Outro grupo de
drogas passível de utilização é o dos varfarínicos em doses baixas, diatiazen (bloqueador de
canal de cálcio), bisfosfonados e tiossulfato de sódio.
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
FISIOPATOLOGIA
EPIDEMIOLOGIA
Cerca de 60 a 90% dos pacientes com Raynaud são mulheres; estas têm mais
comumente o Raynaud primário e o secundário que está associado com doenças do tecido
conjuntivo. Homens com Raynaud geralmente são de idade mais avançada e têm uma incidência
mais alta de arterosclerose. Certas ocupações aumentam o risco de desenvolver esta doença
como é o caso de lenhadores e mineradores usando equipamento vibratório.
DOENÇAS ASSOCIADAS
principalmente quando feita em injeções em bolo. Uma isquemia suficiente para causar
ulceração ou gangrena, sugere a presença de uma doença arterial subjacente. Ela nunca
acontece em situações só de vasoespasmo.
ABORDAGEM CLÍNICA
A abordagem do paciente deve começar por uma descrição detalhada dos sintomas do
paciente: a descrição clássica é trifásica: palidez (pela vasoconstrição e diminuição súbita do
fluxo arterial), cianose (as veias se relaxam mais rapidamente que as artérias e o sangue é
dessaturado). No terceiro estágio, o que se vê é eritema e vasodilatação secundária. Esta
alteração trifásica ocorre em 2/3 dos pacientes, nos outros os achados são incompletos. A
palidez é condição sine qua non para o diagnóstico. Ela deve envolver a área toda e não ser
salpicada; além disso, deve se estender até pelo menos a articulação interfalangiana distal.
O paciente costuma se queixar de formigamentos, queimação e amortecimento na área
afetada. O início é, em geral, abrupto e segue stress psíquico ou exposição ao frio. Os dedos da
mão são mais frequentemente envolvidos sendo raro o acometimento do polegar. Os membros
inferiores, lobos de orelha e pontas do nariz podem estar acometidas. Se os sintomas do
paciente são bilaterais e simétricos, com envolvimento de múltiplos dígitos, existe uma maior
chance de que o Raynaud seja primário. Se for assimétrico e envolver poucos dígitos deve se
pensar mais no Raynaud secundário. Quando a isquemia é prolongada ou intensa podem ocorrer
áreas de isquemia que resultam em cicatrizes estelares vistas nas pontas dos dedos. A
ocorrência de necrose é um fator que ajuda a pensar no Raynaud secundário.
Ao se obter a história deve-se enfatizar através da anamnese dirigida, a procura dos
sinais e sintomas que sugiram uma doença do tecido conjuntivo como fotossensibilidade, lesões
de pele, telangiectasias, artrite, etc; hobbies, esportes e medicações. Histórias de angina ou de
claudicação intermitente sugerem arteriosclerose obliterante e a de tromboflebite migratória
sugere tromboangeíte obliterante.
O exame físico deve incluir exame dos pulsos periféricos e manobras para a síndrome
do desfiladeiro.
EXAMES COMPLEMENTARES
isquemia unilateral com o fim de diagnosticar uma possível obstrução orgânica potencialmente
corrigível pela cirurgia. O laboratório no diagnóstico de fenômeno de Raynaud só é parcialmente
bem sucedido. Uma história bem documentada ainda é insubstituível.
A procura de uma doença subjacente em um paciente com Raynaud é feito através da
seguinte bateria de testes: hemograma, VHS, perfil bioquímico, FAN, látex, parcial de urina e RX
de mãos. Se o diagnóstico de esclerodermia é suspeitado pode-se proceder a provas de função
respiratória e estudo da motilidade do esôfago. A esclerodermia dá FAN positivo em mais de
90% dos casos quando se utiliza extrato de células humanas para esta pesquisa. Testes adicionais
são pedidos em casos selecionados e incluem: eletroforese de proteínas, dosagem de
complemento, VDRL, pesquisa de anti DNA e do ENA, antígeno de hepatite B e anticorpo
anticentrômero, crioproteínas e crioaglutininas. RX de tórax pode ser necessário para se verificar
a possibilidade de costela cervical e a eletromiografia pode ser útil no diagnóstico de síndromes
compartimentais.
A capilaroscopia periungueal é um
teste fácil de ser executado e que fornece
dados úteis quando se suspeita de uma doença
do colágeno subjacente, principalmente a
esclerodermia.
Esta técnica, originalmente descrita para
uso de biomicroscópio (veja figura ao lado)
pode ser confortavelmente executada com um
oftalmoscópio comum. Uma gota de óleo
mineral é colocada na prega ungueal e o
oftalmoscópio é colocado em 40 dioptrias (+),
resultando em um aumento de 10 vezes. O
instrumento é colocado perto, mas sem tocar
FIGURA 13.9 - Capilaroscopia no óleo. Em indivíduos normais os capilares são
periungueal com biomicroscopio vistos como alças regulares, finas, correndo
perpendicularmente à base da unha.
A B
C
D
E F
G H
FIGURA 13.9 – Capilaroscopia periungueal: (A)-Desenho esquemático dos achados, (B)-
capilar normal, (C)- Aspecto macroscópico sugestivo de padrão SD . Em fotos de (D) até
(H)- detalhes de achados capilaroscópicos de padrão SD com capilares extasiados e
áreas avasculares.
Fotos F ,G e H - gentileza do Dr Leonardo Schmidt.
210
limitadas pelo uso parenteral (em geral, endovenoso). Preparações orais estão em estudo e não
são encontradas no país.
SIMPATECTOMIA - Simpatectomia torácica pode ser seguida por uma melhora parcial, em geral
transitória. Este procedimento pode ser substituído por infiltração do simpático cervical com
anestésico local em dias alternados por 1-2 semanas. Outra técnica proposta é a simpatectomia
digital acompanhada de "descascamento" da adventícia das artérias digitais.
É uma doença que afeta homens e mulheres adultos com uma maior incidência entre
terceira e sexta décadas. Cursa com alterações cutâneas que lembram a esclerodermia, eosinofi-
lia, V.H.S. alto e hipergamaglobulinemia. Na metade dos casos se segue à realização de um
exercício físico intenso.
Embora a fasciíte eosinofílica seja considerada por muitos como uma variante da es-
clerodermia, isto não é bem aceito por todos os autores. Sua etiologia é desconhecida. Tem-se
postulado o papel de fatores humorais e celulares autoimunes, inferidos de sua associação com
outras doenças sabidamente de autoimunidade (S. de Sjögren, tireoidites e vitiligo), da
existência de imunorreagentes em fáscia e de hipergamaglobulinemia, assim como, pela
ocorrência de fasciíte eosinofílica como manifestação da doença graft x host. Mais
recentemente tem se tentado implicar a Borrelia burgdosferi na etiologia desta patologia.
Não guarda relação significante conhecida com qualquer tipo de HLA.
São pacientes que se apresentam com dor, rigidez e edema na porção distal das
extremidades associadas a fenômenos gerais como mal-estar, fraqueza, febre e alterações de
peso. O que se vê precocemente é edema e irregularidade na pele, a qual fica com aspecto
semelhante à casca de laranja, podendo ou não ser pregueada. As alterações de pele podem ser
vistas em qualquer região do corpo mas são mais comuns em pernas, braços, mãos e pés.
Outras alterações cutâneas incluem: eritema, urticária, bolhas, alopécia, vitiligo, hiper e
hipopigmentação e a própria morféia. As manifestações extra-cutâneas incluem:
Articulares:- artralgias, artrites, síndrome do túnel carpiano. Contraturas costumam ser
proeminentes. Miosites são comuns e refletem extensão do processo inflamatório da fáscia.
Viscerais:- são mais raros. Consistem em disfunção esofagiana, anormalidades ventilatórias
restritivas (por envolvimento da fáscia do tronco) e derrame pericárdico.
Ao contrário do que é observado nos pacientes com esclerodermia típica, a ocorrência do
fenômeno de Raynaud, de telangiectasias e de ulcerações dos dedos é rara.
Por outro lado, existe uma associação da fasciíte eosinofílica com Síndrome de Sjögren, vitiligo
e tireoidites que incidem com uma maior frequência nestes pacientes.
Mais recentemente vem se descrevendo uma associação intrigante da fasciíte eosinofílica com
doenças hematológicas como anemia aplástica, trombocitopenias, anemia hemolítica,
leucemias e doenças linfoproliferativas. Nestes casos o prognóstico torna-se reservado. A
trombocitopenia ocorre pela formação de anticorpos anti plaquetários. Nos casos de anemia
aplástica acredita-se que exista uma alteração no microambiente da medula óssea ou a
ocorrência de uma imunoglobulina G que inibe o crescimento da célula matriz da linha eritroide
212
e dos granulócitos. Não se tem boa explicação para a transformação maligna observada em
alguns casos.
Eosinofilia periférica é um achado marcante nestes pacientes, mas pode ser transitório.
Pode-se ter hipergamaglobulinemia e aumento da V.H.S. Nem sempre existe uma correlação
clínica entre a VHS, eosinofilia e atividade clínica da doença.
O diagnóstico é feito por biópsia que inclua pele, gordura, fáscia e músculo. Os achados
mais marcantes são inflamação, edema, espessamento e esclerose da fáscia. O infiltrado
inflamatório contém linfócitos, histiócitos, células plasmáticas e eosinófilos. A distribuição dos
eosinófilos pode ser focal e está relacionada com a eosinofilia periférica. Em músculo, vê-se
miosite focal. Derme e epiderme são normais. À imunofluorescência são encontrados depósitos
de IgG e complemento na fáscia e junção dermo-epidérmica.
O tratamento é feito com prednisona, 40 a 60 mg/dia com resposta variável. Em casos
rebeldes pode-se usar cloroquina. Embora a literatura tenha enfatizado a natureza benigna
desta doença isto não é verdade para os casos associados com alterações hematológicas.
Referências:
Feghali-Bostwick, C et al. Analysis of systemic sclerosis in twins reveals low concordance for disease and high
concordance for the presence of antinuclear antibodies. Arthritis & Rheum 2003; 48:1956-63.
Hummers L et al. Scleroderma. In Imboden J, Hellmann DB, Stone JH (eds) Current Rheumatology Diagnosis &
Treatment 2004, Mac Graw Hill , N. York, p.189-97.
Kelley WN et al. Textbook of Rheumatology. Connective Tissue Diseases Characterized by Fibrosis. Scleroderma. 5 ed.
Philadelphia: W.B. Saunders Company; 1997;p. 1133-62.
Lawrence RC et al. Estimates of the prevalence of arthritis and selected musculoeskeletal disorders in the United
States. Arthritis & Rheum 1998; 41:778-99.
Owens GR, et al .Systemic sclerosis secondary to occupational exposure. Am J Med 1988; 85: 114-6.
Poormoghim H et al. Systemic sclerosis sine scleroderma: demographic, clinical, and serologic features and survival
in forty-eight patients. Arthritis Rheum 2000; 43: 444-51.
Silman AJ et al. Epidemiology of systemic sclerosis. Curr Opin Rheumatol 1996; 8: 585-9.
Wells AU. High-resolution computed tomography and scleroderma lung disease. Rheumatology. 2008; 47: 59–61.
214
Sindrome de Sjögren (SS) é uma doença crônica com destruição auto-imune das
glândulas exócrinas, principalmente a lacrimal e a salivar, resultando em querato-conjuntivite
seca e xerostomia. Originalmente foi descrita como uma tríade de olho seco, boca seca e artrite
reumatoide. Atualmente sabe-se que outras doenças do tecido conjuntivo podem estar
presentes no lugar da artrite reumatoide e que o complexo "sicca" também pode existir como
uma entidade primária, sem estar associado à outras doenças. Reserva-se para este último caso
o nome de Síndrome de Sjögren primária, enquanto que, nos casos associados a outras doenças
do tecido conjuntivo a denominação passa a ser Síndrome de Sjögren secundária.
Em alguns pacientes a doença evolui para uma desordem proliferativa generalizada,
pseudo-linfoma ou mesmo neoplasias linfóides.
EPIDEMIOLOGIA
Assim como a grande maioria das doenças do tecido conjuntivo a síndrome de Sjögren
tem uma predileção por mulheres de meia idade e idosas. A idade média de diagnóstico está em
torno de 50 anos. A doença primária, embora não seja rara, é menos comum do que a síndrome
de Sjögren acompanhada de doença do tecido conjuntivo.
Acomete todas as raças e existem raros casos descritos em crianças. A forma primária está
associada com uma maior incidência dos antígenos de histocompatibilidade HLA-DR-3, DR-5 e
DQ A1.
ASPECTOS CLÍNICOS
uma camada interna: onde uma lâmina aquosa e rica em lisozima, elaborada pelas glândulas
lacrimais se funde com uma lâmina mucoide formada pelas glândulas lacrimais e pelas células
calificiformes da conjuntiva. A parte mucoide tem um componente hidrofílico, que se liga a
água da lágrima e outro hidrofóbico que se liga ao epitélio corneano.
A camada aquosa contém proteínas, albumina e lisozima. Ela serve para diminuir a tensão
superficial e assim permitir a continuidade na película lacrimal. Desta maneira ela provê uma
superfície lisa e homogênea que ajuda a manter a integridade das células da conjuntiva e córnea.
Em sua ausência estas células passam a se queratinizar e tomar características semelhantes às
da pele.
Na síndrome de Sjögren, o grande prejuízo está na formação do componente aquoso da
lágrima, tornando-a hiperosmolar. Forma-se um excesso de muco que não consegue se espalhar
adequadamente pela superfície e que forma filamentos, os quais se prendem na córnea
ocasionando edema e hiperemia de conjuntiva e até dos bordos palpebrais. Com o tempo
ocorrem ulcerações na córnea, que curam com vascularização e cicatrização com perda da
transparência, perfuração etc. Além disso, existe um maior número de infecções secundárias
locais.
A B
D
C
FIGURA 14.1- Síndrome de Sjögren (A)- aumento de parótida; (B) olho seco (exame à lâmpada de fenda) e (C) e (D)
vasculite e pequenos vasos (púrpura palpável)
erosiva. Raynaud aparece numa minoria de casos. Púrpuras não trombocitopênicas podem
resultar de hipergamaglobulinemia. Vasculites aparecem em ¼ dos pacientes com a síndrome
primária e se manifestam, em geral, como púrpura palpável em pele de membros inferiores. Às
vezes, os episódios de vasculites podem ser mais graves, estando daí, em geral, associados à
crioglobulinemia, com febre, rash cutâneo e infarto intestinal. O envolvimento vasculítico tem
um caráter episódico. Uma variedade de manifestações neurológicas tem sido descrita em
pacientes com Sjögren, tais como, polineuropatias, mononeurite multiplex e envolvimento de
S.N.C. o qual pode ser focal ou difuso.
Existe um aumento da prevalência de tireoidite de Hashimoto em pacientes com SS.
Outros achados são os de hepatomegalia, hepatite crônica ativa, cirrose biliar primária e doença
celíaca.
A incidência de linfoma está aumentada nestes pacientes; a maioria deles pertence à
linhagem de célula B. Proliferação monoclonal de células B pode levar à macroglobulinemia de
Waldeström, mieloma e gamapatias monoclonais por IgG e IgA. Esta transformação maligna
parece ser mais comum em pacientes com crioglobulinemia.
Sinais que apontam para uma transformação maligna são: linfadenopatia generalizada e
esplenomegalia. Pseudo-linfoma é um termo cunhado para designar um estágio intermediário
entre linfoproliferação benigna e maligna, o qual se apresenta com linfadenopatia generalizada,
nódulos pulmonares e/ou aumento das glândulas parótidas. Esta forma sobrevém em torno de
10% dos pacientes com a Síndrome de Sjögren. Exames físicos e sorológicos periódicos podem
ajudar a detectar precocemente um processo maligno.
As manifestações clínicas da SS estão resumidas no quadro 14.1.
O FAN é positivo em 80 a 90% dos casos. Os padrões nucleares que parecem ter certo
grau de especificidade para esta síndrome são os salpicados e nucleolares. O padrão salpicado
corresponde à presença dos anticorpos anti Ro/SS-A ou anti La/SS-B. Anti Ro e anti La foi a deno-
minação usada para descrever estes anticorpos quando reagiam contra antígenos
citoplasmáticos. Anti SS-A e anti SS-B são os mesmos anticorpos, dirigidos para os mesmos
antígenos só que, agora, localizados no núcleo. Para se explicar esta localização dupla dos
antígenos acredita-se que estes anticorpos estejam dirigidos contra complexos proteína-
ribonucleares envolvidos no transporte e modificação pós transcripcional do mRNA. Estes,
dependendo do estadio do ciclo celular, podem estar localizados no citoplasma.
Além dos anticorpos antinucleares está presente, nesta síndrome, uma grande variedade
de outros anticorpos não órgão-específicos tais como anticorpo anti-receptor de insulina, anti-
mitocôndria e anti-músculo liso e outros, órgão-específicos. como por ex: anti-tireoide, contra
218
DIAGNÓSTICO
De maneira semelhante ao que acontece com outras doenças reumáticas, aqui também
existem critérios que auxiliam na classificação para diagnóstico. Na realidade, existem vários
grupos de critérios. Abaixo encontra-se a lista dos critérios do ACR/EULAR. São necessários ≥4
pontos para o diagnóstico. O paciente deve ter pelo menos 1 critério de inclusão e não ter os de exclusão.
TRATAMENTO
sintomas e aumentar o fluxo de saliva endógena. Aplicações de flúor ajudam a prevenir cáries.
O paciente deve ser instruído para ser meticuloso com a sua higiene oral. Infecções por cândida
e parotidites supurativas requerem o uso de nistatina e antibióticos apropriados. A pilocarpina
(um agonista muscarínico) aumenta a secreção aquosa em pacientes que têm uma função
glandular residual. Infelizmente seu uso é limitado pelos efeitos colaterais como retenção
urinária, cólicas abdominais e sudorese.
Secura nasal deve ser tratada com instilação de gotas de soro fisiológico. Deve-se evitar o
uso de lubrificantes contendo material oleoso uma vez que eles podem levar à pneumonia
lipoídica por aspiração. Secura de pele e vaginal são tratadas com lubrificantes tópicos.
No grupo das drogas modificadoras de doenças usadas em SS se incluem: cloroquina e
hidroxicloroquina, ciclosporina, metotrexate, inibidores de TNF- e rituximabe, mofetil
micofenolato e azatioprina. Destes, o rituximabe é o que parece ser mais eficiente.A maioria dos
casos de vasculite, por ser episódica, não requer uso de citostáticos, embora pacientes com
formas graves possam ter benefício do uso de ciclofosfamida.
Por último, o médico deve ter em mente que, determinados medicamentos tais como os
de quadro 14.4 tendem a agravar a sensação de secura de mucosa, e que, em pacientes com
Síndrome de Sjögren, o seu uso deve estar limitado ao que for estritamente necessário.
A doença por IgG4 é uma entidade descrita recentemente na qual foi possível englobar
várias entidades que, anteriormente, acreditava-se não estarem relacionadas entre si.
Caracteriza-se por infiltração de vários órgãos por plasmócitos IgG4 positivos causando aumento
de volume dos órgãos e por fibrose (a qual tem um aspecto histológico característico chamado
de estoriforme). Por fibrose estoriforme entende-se aquela com caracteristicas semelhantes à
de uma roda de carroça. Concentrações séricas de IgG4 podem ou não estar aumentadas.
Incluíram-se, nesta síndrome: pancreatites autoimunes, aumento de glândulas
exócrinas (salivares e lacrimais e chamadas anteriormente de síndrome de Mikulicz), nefrite
intersticial, doença orbitária que pode causar proptose e fibrose retroperitoneal além de outras
manifestações menos comuns. A doença de Mikulicz era, até algum tempo atrás, erroneamente
considerada uma variante da síndrome de Sjögren.
Acomete predominantemente homens de meia idade a idosos. Sua etiologia é
desconhecida. O diagnóstico é feito pelos achados histopatológicos característicos e valores
séricos aumentados de IgG4. No tratamento estão os corticoides, azatioprina, mofetil
micofenolato e rituximabe.
Referências:
Fox R et al. Pathogenesis of Sjögren’s syndrome. In Rose N. Uptodate.com. Capturado em www.uptodate.com em setembro de
2014.
Kassan, SS et al. Increased risk of lymphoma in sicca syndrome. Ann Intern Med 1978; 89:888-92.
Talal N. What is Sjögren syndrome and why is it important? J Rheumatol 2000; 27 S-61:1-3.
Voulgarelis, M and the members of the European concerted action on Sjögren's syndrome. Malignant lymphoma in primary Sjögren's
syndrome. Arthritis Rheum 1999; 42:1765-72.
220
Todas as doenças que cursam com inflamação de músculo podem ser chamadas de
miosites. Entretanto, tradicionalmente, os termos polimiosite e dermatomiosite têm sido
aplicados para um grupo de entidades associadas a distúrbios imunológicos, que
frequentemente acompanham outras doenças do tecido conjuntivo e neoplasias. Estas formas
deveriam, talvez, ser incorporadas mais apropriadamente sob o título de miopatias
inflamatórias idiopáticas.
No quadro 15.1, uma classificação das miosites idiopáticas.
EPIDEMIOLOGIA
Estas doenças são raras. Calcula-se que existam 0,5 a 8 casos por ano para cada 1 milhão
de pessoas. Afeta predominantemente as mulheres, numa relação de 2:1, com exceção da
miosite por corpúsculo de inclusão, que é mais comum nos homens.Embora possa ocorrer em
qualquer idade existe uma distribuição bimodal com picos em crianças (5 a 15 anos) e adultos
em torno de 50-60 anos. A forma associada a neoplasia e a com corpúsculos de inclusão é mais
comum após os 50 anos.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
alcançar prateleiras altas ou pentear os cabelos. Em estágios avançados, o paciente pode, até
mesmo, ter dificuldades para levantar a cabeça do travesseiro, engolir e mastigar. Um dado
interessante é o de que estes pacientes praticamente nunca apresentam envolvimento de
musculatura ocular, o que é importante para fazer diagnóstico diferencial com miastenia gravis.
Sintomas que acompanham a fraqueza muscular são mialgias e atrofias musculares. A
apresentação de mialgia isolada, isto é, sem fraqueza muscular é rara e deve induzir o clínico a
pensar em outras possibilidades diagnósticas. Contraturas não são comuns no início da doença,
mas tendem a se desenvolver com o passar dos anos. Flutuações espontâneas no grau de
fraqueza podem ocorrer. O envolvimento cardíaco é relativamente comum (cerca de metade
dos pacientes). Afinal das contas este órgão é rico em musculatura estriada... Este envolvimento
vai desde alterações eletrocardiográficas assintomáticas até arritmias importantes e
miocardiopatias dilatadas graves, capazes de ocasionar a morte. Não é demais lembrar que
frações de CK-mb não predizem o envolvimento cardíaco porque o músculo esquelético em
regeneração também libera esta enzima (numa espécie de repetição do padrão fetal de
produção de fibras novas). A pesquisa de troponina-1 (que é exclusivamente cardíaca) pode
ajudar na separação.
O envolvimento do esôfago é outra manifestação comum. Disfagia alta aparece devido
à fraqueza dos músculos da hipofaringe. Regurgitação e aspiração não são raras. Por vezes,
disfagia em pacientes com polimiosite pode se dever à disfunção dos músculos cricofaringeanos
sendo, neste caso, tratável com miotomia. Outros achados para o lado do aparelho
gastrintestinal são os de retardo no esvaziamento gástrico.
A artrite, na maioria das vezes, não é um problema maior; costuma ser discreta. O
líquido sinovial encontrado neste pacientes é do tipo inflamatório não infeccioso.
O aparelho respiratório pode estar envolvido de diferentes maneiras: pela fraqueza da
musculatura da parede torácica e do diafragma causando insuficiência de ventilação; por
vasculopatia ocasionando hipertensão pulmonar (com prognóstico bastante grave) e por doença
intersticial (pneumonite intersticial, bronquiolite obliterante etc.)
O envolvimento renal, também não é um problema maior nestes pacientes.
Glomerulonefrite leve tem sido descrita. Pacientes com rabdomiólise e mioglobinúria podem
desenvolver insuficiência renal aguda.
Outros achados incluem fenômeno de Raynaud, amiloidose, pneumatose cistóide
intestinal e vasculites cutâneas ou viscerais.
A seguir será dada atenção aos principais aspectos diferenciais entre as miopatias
inflamatórias.
Os sintomas apresentados por este grupo de pacientes são os descritos acima. Estes se
instalam de maneira insidiosa e, geralmente, já estão presentes de 3 a 6 meses quando o
paciente procura o médico. Mais raramente pode existir uma apresentação aguda com
mioglobinúria, fraqueza respiratória ou fraqueza dos músculos bulbares com disfonia e disfagia.
DERMATOMIOSITE DO ADULTO
Além dos sintomas acima descritos, este grupo de pacientes apresenta manifestações
de pele. A proporção do grau de envolvimento da pele não guarda relação com o grau de
envolvimento muscular, ou seja, um paciente pode ter muita lesão de pele e pouca
manifestação muscular e vice e versa. Além disso, nem sempre existe coincidência temporal de
aparecimento entre os dois tipos de achados clínicos. Assim, o rash pode preceder a miosite em
até um ano ou, aparecer simultâneamente.
222
As lesões mais típicas desta afecção são: o heliótropo - um eritema violáceo sobre as
pálpabras, que lembra a cor de uma flor dos Alpes que leva o mesmo nome, e, as pápulas de
Gottron - uma erupção vermelha, violácea, às vezes descamativa, sobre as articulações,
principalmente nas interfalangianas. A distribuição sobre as interfalangianas poupando a pele
sobre as falanges é muito característica desta doença, ao contrário do que acontece no lúpus,
no qual o envolvimento é mais da região das falanges economizando a área articular. Além disto,
pode-se encontrar um rash eritematoso, fotossensível, nas bochechas e dorso do nariz muito
parecido com o rah em borboleta do lúpus, só que, na dematomiosite o sulco nasolabial não é
poupado. Outros avhados são eritema na frente e costas do peito (sinal do xale), superfícies
extensoras dos cotovelos e joelhos, e região maleolar. As lesões agudas são de um vermelho-
brilhante e se tornam, mais tarde, violáceas. O paciente pode notar um discreto prurido. A pele
fica atrófica, mas se o rash for florido pode existir um pouco de edema e dor local. Não é raro
uma descamação leve e que a pele tome aspecto seborreico. As dobras ungueais apresentam
descoloração linear eritematosas que mais tarde se tornam amarronadas. Linhas horizontais
escuras e de aspecto “sujo” podem aparecer no aspecto lateral e palmar das mãos e dedos, o
que costuma ser chamado de “mãos de maquinista”. Vê-se, ainda, ulcerações da pele, n’outras
vezes, calcificações em pele e tecidos subcutâneos (calcinose), livedo reticularis, infartos digitais
e púrpura vascular. Fotossensibilidade também é um achado desta doença.
O fenômeno de Raynaud parece ser mais comum nesta forma de envolvimento. Chama-
se dermatomiosite amiotrófica ou dematomiosite sine miosite à situação clínica em que o
paciente tem apenas as manifestações cutâneas sem as musculares.
DERMATOMIOSITE DA CRIANÇA
Esta forma afeta indivíduos mais velhos e a fraqueza muscular pode ser focal, distal e
assimétrica. Esta forma pode ser bem mais insidiosa. A CK sérica tende a estar discretamente
aumentada, e, em alguns casos é totalmente normal. O diagnóstico é definido basicamente pela
anatomia patológica, a qual mostra inclusões celulares vacuolares, bem delimitadas e com uma
orla de material basofílico. As fibras musculares contêm depósitos de amilóide -(A4). Esta
forma costuma ser refrataria ao tratamento.
223
A B
C D
E
FIGURA 15.1- DERMATOMIOSITE: (A) e (B) E (C) Heliótropo; (D) Mãos de mecânico;
(E)- Fotossensibilidade (F)- Sinal do xale.
224
B C
D E
FIGURA 15.2- (A), (B), (C) e (D) – Pápulas de Gottron; (E) calcinose.
Pode existir uma associação entre miosite e outras doenças reumáticas. Esta associação mais
comum é com esclerodermia. Na tabela 15.2, a seguir, existe uma lista dessas doenças.
225
EXAMES COMPLEMENTARES
típica para cada um destes anticorpos vem sendo denominada de Síndrome das antissintetases.
Veja quais são estes anticorpos na tabela seguinte:
perfeitamente normal. Não se deve biopsiar um local onde foi feita a eletromiografia porque a
inserção do eletrodo, por si só, produz alterações inflamatórias. Atualmente vem se utilizando
a ressonância magnética como uma forma de selecionar o músculo a ser biopsiado. Este teste
permite identificar músculos com um maior teor de água (inflamados) e para eles é que se dirige
a coleta do material.
BIÓPSIA DE PELE. O exame histológico de pele pode muitas vezes ser indistinguível daqueles dos
de LES.
RESSONÂNCIA MAGNÉTICA: A ressonância magnética de musculatura estriada é uma maneira
não invasiva de estudar os músculos. Em casos de miosite, ela mostra edema, fibrose e
calcificação. Este teste é muito bom no sentido de guiar a biópsia mostrando qual a área afetada
e evitando erros na obtenção da amostra.
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Deve-se, também, prestar bem atenção ao tipo de fraqueza encontrada porque ela pode
servir de pista para o diagnóstico diferencial. Veja, no quadro 15.7, algumas delas:
Por último é bom reforçar que desordens do equilíbrio eletrolítico causam comumente
sintomas de fraqueza muscular, alguns deles, inclusive acompanhados por dor muscular. No
quadro 15.8, estão os principais.
228
É sempre importante pensar na possibilidade de uma miopatia induzida por drogas, uma
vez que muitos delas podem estar relacionados com esta forma de sintomas. Aliás, existem
muitos medicamentos utilizados na própria reumatologia, responsáveis pelo aparecimento
deste tipo de sintoma, o qual pode facilmente ser atribuído, de maneira errônea, à doença
básica que indicou o seu uso. São alguns exemplos:- os corticoides, a penicilamina, colchicina,
cloroquina e hidroxicloroquina. Outras drogas implicadas nesta síndrome podem ser vistas no
quadro 15.9.
A miopatia induzida por corticoide acontece tanto com o uso oral quanto com o
injetável. Pacientes que usam a droga em altas doses e por mais tempo têm mais chances de
desenvolver este tipo de complicação. A biópsia do músculo é de pouca ajuda no diagnóstico,
embora seja útil saber que, nestes casos, não existe processo inflamatório (ao contrártio das
miosites). A EMG mostra um potencial baixo, traçados polifásicos e sinais de denervação. Não
existe um marcador bioquímico desta forma de miopatia. As enzimas musculares séricas estão
normais, embora a creatina urinária esteja aumentada, o que pode ser utilizado para
monitorizar a situação.
A cloroquina e a hidroxicloroquina são neurotoxinas que podem afetar tanto o músculo
esquelético quanto o cardíaco. A mesma distribuição é vista com o álcool.
O AZT, uma das drogas mais utilizadas no tratamento da SIDA, causa miopatia
dependendo da dose usada. É importante diferenciar esta situação da miopatia causada pelo
próprio virus da SIDA. Estudos com microscopia eletrônica mostram mitocondrias gigantes nos
casos de toxicidade pelo AZT, o que não existe em casos de infecções pelo HIV.
No caso das estatinas pode aparecer um tipo especial de miopatia: a miopatia
necrotizante que pode persistir após a retirada da droga e é mediada por fenômenos
autoimunes (contra a proteína da HMG coenzima A redutase).Esta não é a forma mais comum
de miopatia por estatina e, felizmente, é rara.
Finalmente, certas drogas injetáveis como clorpromazina, paraldeído,
cloroquina, opiáceos e antibióticos, podem induzir o aparecimento de uma miopatia no local da
injeção.
TRATAMENTO
TRATAMENTO DA MIOSITE
Corticoides são os agentes farmacológicos recomendados para a maioria dos pacientes
com polimiosite. Pode-se começar com uma dose de 40 a 60 mg/dia de prednisona ou
equivalente em doses divididas. Em crianças pequenas pode-se utilizar a dose de 1-2 mg/Kg/dia.
Estas doses altas são utilizadas até que a CK caia para nível normal (o que habitualmente leva
de 4 a 8 semanas). Após isso, o corticoide é passado para uma dose única pela manhã e
229
diminuído lentamente (por exemplo, 1/4 da dose pré-existente, por mês) desde que a CK
permaneça normal. Pode-se tentar um esquema de dias alternados, na tentativa de se reduzir a
toxicidade da droga embora alguns autores contestem esta forma de tratamento.
Após 4 a 6 meses, em geral, atinge-se a dose de manutenção de 5 a 10 mg/dia ou 10 a 20 mg/
dias alternados. Uma terapêutica mais prolongada pode ser necessária para controlar a doença
e não se deve descontinuar este medicamento até que toda a atividade da doença esteja
totalmente suprimida por pelo menos um ano.
Se ocorrerem evidências clínicas de recorrência, a dose da prednisona é novamente
levantada até que se atinja novo controle da doença.
É bem evidente que, melhora da força muscular só aparece depois de várias semanas
ou meses que a CK retornou ao normal. Entretanto, pode ocorrer miopatia por corticoide e isto
retarda a resposta clínica. Felizmente este tipo de miopatia responde sempre à redução da dose
do medicamento. Às vezes, pode ser interessante repor potássio, uma vez que o corticoide induz
hipocalemia e isto por si só é causa de fraqueza muscular.
Durante o processo inflamatório agudo, as atividades físicas se limitam ao tolerado pelo
paciente. Nesta fase pode se programar um tratamento fisioterápico com exercícios,
principalmente passivos para prevenção de contraturas. Quando a doença entra em remissão,
um programa de exercícios para melhorar a força muscular está indicado. Entretanto, se o
médico quiser optar por uma terapêutica física mais agressiva é bom saber que esta, mesmo em
fase de miosite ativa, NÃO leva a uma piora clínica nem à aumento da CK.
Suplementação oral de cálcio e vitamina D também é útil na tentativa de se evitar a
osteopenia induzida pelo corticoide.
Embora a maioria dos pacientes responda a corticoide, em torno de 25% dos casos, esta
medicação não é totalmente efetiva . Os pacientes com maior possibilidade de resposta são
aqueles que recebem um tratamento precoce (antes de 3 meses do início dos sintomas).
Pacientes com dermatomiosite respondem melhor ao corticoide do que os com polimiosite. Os
pacientes com corpúsculos de inclusão são tipicamente refratários a esta terapêutica. Pacientes
que anticorpos anti Mi-2 respondem melhor do que os portadores de antisintetases e anti SRP.
Pacientes refratários ao corticoide são tratados com terapêutica imunossupressiva, com
resultados variáveis. A maior experiência é com o metotrexate. O metotrexate parece ser
particularmente útil em pacientes masculinos e anti-sintetase positivos. Prednisona em doses
intermediárias ou baixas podem ser continuadas nestes pacientes, mas deve se tirar efeito
máximo dos efeitos economizadores de corticoide desta droga. Um problema que pode
aparecer no paciente em uso de metotrexate é a ocorrência de fibrose pulmonar intersticial
pelo uso da droga , que pode ser confundida com a fibrose da própria doença. Outras drogas
utilizadas são: azatioprina, ciclofosfamida, agentes bloqueadores de TNF-, mofetil
micofenolato e ciclosporina A. O uso do rituximabe parece ser útil em casos refratários. Outra
forma de tratamento utilizada é a gamaglobulina EV.
A miosite com corpúsculos de inclusão é tipicamente resistente ao tratamento. Nestes
casos costuma-se fazer uma tentativa de tratamento com esteroides por 3 meses. Caso o
paciente não responda, o tratamento é suspenso, para que assim se evitem os efeitos colaterais
deste tipo de medicamentos sem os correspondentes efeitos benéficos sobre a patologia básica.
Existem descrições de casos isolados em que se usou gama globulina para estes pacientes e a
houve melhora substancial do quadro clínico.
Referencias
Oddis CV. Therapy of inflammatory myopathy. Rheum Dis Clin North Am. 1994; 20: 899-918.
Richardson, JB et al. Dermatomyositis and malignancy. Med Clin North Am 1989; 73:1211-20
Stockton, D et alRisk of cancer in patients with dermatomyositis or polymyositis, and follow-up implications: a Scottish
population-based cohort study. Br J Cancer 2001; 85:41-5.
Wortmann RL Polimyositis and dermatomyositis In Imboden J, Hellmann DB, Stone JH (eds). Current Rheumatology:
diagnosis & treatment. Mc Graw Hill, N. York 2004, p. 209-14.
Wortmann RL. Inflamatory and metabolic diseases of muscle. In Klipel JH, Crofford LJ, Stone JH, Weyand CM (eds).
Primer on the rheumatic diseases. Arthritis Foundation, Atlanta, 2001, p.369-76.
Wortmann RL. Inflammatory Diseases of Muscle, In Kelley WN, Ruddy S, Harris Jr E, Sledge CB. Textbook of
Rheumatology, W. B. Saunders Co, Philadelphia, vol,2, 1993, p.1177-206.
231
EPIDEMIOLOGIA
É uma doença menos comum do que o lúpus, mas mais comum que a esclerodermia e a
polimiosite e dermatomiosite. Afeta 16 mulheres para 1 homem. Casos que se iniciam em
crianças e também no indivíduo já bem idoso têm sido descritos.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
MANIFESTAÇÕES RENAIS - Não é comum que exista doença renal severa neste tipo de paciente.
O achado mais comum é o de glomerulonefrite membranosa com conseqüente síndrome
nefrótica.
O anticorpo anti RNP, como já foi mencionado antes, é condição ”sine qua non” para o
diagnóstico desta forma de colagenose. Sua presença deve ser em altos títulos. É interessante
frisar que, se bem que a presença deste anticorpo é necessária para o diagnóstico, esta não é a
única doença em que ele aparece, sendo detectado em uma grande variedade de colagenoses.
Este anticorpo produz FAN positivo do padrão salpicado, de maneira tal que, o FAN convencional
é um bom teste de triagem para esta doença.
Anticorpos anti-RNP, também chamados anti-U1RNP estão dirigidos contra pequenos RNAs
do núcleo ou small nuclear RNA- sn RNA. O U se refere ao alto teor de uridina do RNA contra o
233
qual o anticorpo se dirige. Estes U1-RNAs parecem ser importantes para fazer a remoção de
íntrons do RNA pré-mensageiro.
PROGNÓSTICO
Parece que estes pacientes, por serem portadores dos anticorpos anti-RNP, estão de
alguma maneira protegidos das manifestações renais e neurológicas graves. Entretanto sempre
existe o risco de outro tipo de manifestação grave como hipertensão pulmonar e miocardites.
Assim, o prognóstico da doença é ditado pelo grau de envolvimento de órgãos mais nobres.
TRATAMENTO
Referências
Alarcon-Segovia D, Cardiel MH. Comparison between 3 diagnostic criteria for mixed connective tissue disease. Study of 593
patients. J Rheumatol 1989; 16:328.
Benne RM, Mixed connective tissue disease and other overlap syndromes. In Kelley WN, Ruddy S, Harris Jr E, Sledge CB (eds).
Textbook of Rheumatology, WB Saunders Co, Philadelphia, 1985; p.1065-78.
234
FISIOPATOLOGIA
CLÍNICA
múltipla verdadeira. Alguns autores se referem a este tipo de envolvimento como esclerose
lupoide.
A B C
FIGURA 17.1- Síndrome do Anticorpo Antifosfolípide: (A) Lesão isquêmica com infarto
cerebral à E; (B)- Obstrução da artéria renal à E. (C )- Trombo intracardíaco à
ecocardiografia.
OUTROS- Existem casos descritos em que têm sido vistos múltiplos pontos de necrose óssea
asséptica. Uma publicação, muito interessante, mostra a ocorrência de anticorpos
anticardiolipina em casos de febre reumática aguda. O fato de lesões valvulares (endocardite
verrucosa) e coréia, no lúpus, estarem associadas a este anticorpo, motivou a sua procura em
pacientes portadores de moléstia reumática, na qual estes dois tipos de achados estão listados
como pertencentes ao grupo dos critérios maiores de Jones. 80% dos pacientes estudados
tinham este anticorpo e este fenômeno estava relacionado à atividade da doença. Estes achados
não puderam ser reproduzidos por outros autores.
Manifestações hematológicas incluem plaquetopenia e anemia hemolítica.
238
A B
C D
E
F
FIGURA 17.2- Síndrome do anticorpo antifosfolipide: (A) Livedo reticularis ; (B)
Livedo com úlcera; (C), (E), (F) - Necrose de dígitos; (D)- Obstrução da veia central
da retina.
239
Todos os pacientes lúpicos devem passar por esta pesquisa, pelo menos uma vez na
vida, uma vez que sua presença muda, em muito, o prognóstico.
SAF SORONEGATIVA- Esta é uma entidade debatida. Este termo é usado para denominar
pacientes com tromboses arteriais e/ou venosas nos quais não é possível demonstrar a
presença dos anticorpos antifosfolipides que são medidos rotineiramente. Lembre que
anticardiolipinas, anticoagulante lúpico e beta-2 GPI são apenas os “membros mais famosos de
uma vasta família de antifosfolipides” , podendo, portanto existir vários deles que passam
despercebidos. Alguns destes pacientes têm um VDRL falso positivo.
DIAGNÓSTICO
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Deve ser feito com todas as outras causas de tromboses venosas como deficiências de
proteína C, proteína S e antitrombina III, resistência ao fator 5 de Leiden (proteína C ativada),
policitemia vera, disfibrinogenemia, hemoglobinúria paroxística noturna, uso de
anticoncepcionais e doença de Behçet. Em pacientes com oclusão arterial, o diagnóstico
diferencial inclui diabetes mellitus, hiperlipemias, homocistinúria, doença de Berger e anemia
de células falciformes.
A síndrome dos anticorpos antifosfolípide é responsável só por uma pequena parte das
morbidades gestacionais.
TRATAMENTO
anticoagulação deve ser mantida durante o puerpério para evitar que a mãe sofra alguma
trombose. Entretanto, se a mãe já teve um episódio de trombose anterior, então a
anticoagulação durante a gestação deve ser completa e mantida após a mesma. Na gravidez é
importante monitorizar contagem de plaquetas e possível ocorrência de osteoporose que são
efeitos colaterais da heparina.
Os antimaláricos também são usados uma vez que têm efeito antiagregante de plaquetas.
Afastar situações que colaboram para aparecimento de tromboses também é fundamental
como evitar o fumo, imobilização, uso de anticoncepcionais e correção de dislipidemias,
homocisteinemia e hipertensão.
Até o momento não existem evidências de que os anticoagulantes modernos possam
ser utilizados em síndrome do anticorpo antifosfolípide .
Referências:
Bermas BL et al. Diagnosis of the antiphospholipid syndrome.In Up todate.com, capturado em novembro 2015.
Figuroa F, et al. Anticardiolipin antibodies in acute rheumatic fever.J Rheumatol. 1992; 19:1175-80.
Love PE,et al. Antiphospholipid antibodies : anticardiolipin and lupus anticoagulant in SLE and non-SLE disorders.
Prevalence and clinical significance. Ann Intern Med. 1990 ;112:682-98.
Merill J. The antiphospholipid syndrome. Pathogenesis and inplications for systemic lúpus erythematosus. In Lahita
R, Systemic Lupus erythematosus, 4th Ed, Elsevier, Amserdan, 2004; p. 1161-1184.
Petri M. Antiphospholipid antibody syndrome . In Imboden J, Hellman DB, Stone JH ( eds). Current rheumatology;
diagnosis and treatment. McGraw Hill, New York, 2004, p.179-188.
Petri M. The clinical syndrome associated with antiphospholipid antibodies. J Rheumat 1992, 19:505-7.
Ruiz-Irastorza G. et al.. Antiphospholipid syndrome. Lancet 2010; 376:1498.
Schur, PH. Genetics of systemic lupus erythematosus. Lupus 1995; 4:425.
242
Se, pelo lado materno, não existe muita concordância entre os pesquisadores sobre o que
acontece; pelo lado da criança, as coisas são bem diferentes. Todos concordam que existe um
aumento na ocorrência de abortamentos, partos prematuros, natimortos e recém-nascidos de
baixo peso.
Pacientes com lúpus e portadoras de anticorpos antifosfolípides têm uma taxa mais alta
de abortamento, uma vez que múltiplas tromboses causadas por este anticorpo afetam a
circulação placentária. A pesquisa destes anticorpos é mandatória nas pacientes com lúpus e
grávidas.
Outro problema que existe é quando a mãe é portadora do anticorpo anti Ro/SS-A.
Nestes casos, a criança corre o risco de nascer com lúpus neonatal e/ou bloqueio cardíaco (BAV)
congênito. No lúpus neonatal a criança apresenta rash cutâneo fotossensível. Manifestações
viscerais são raras. Trombocitopenia pode aparecer e, segundo alguns autores, é indicação para
cesárea, para que se evite o risco de hemorragia intracraniana durante o esforço do trabalho de
parto. Via de regra, a síndrome desaparece no primeiro ano de vida, à medida que os anticorpos
da mãe são metabolizados, mas existem uns poucos casos em que estas crianças, quando
adolescentes, desenvolveram lúpus. O bloqueio cardíaco congênito é manifestação mais grave
desta síndrome e pode ser uma situação permanente.
Fetos de mães com LES e portadoras de anti Ro/SS-A devem ser acompanhadas com
ecocardiografia a partir do 2º trimestre da gravidez, e, se a criança apresentar sinais de que pode
estar desenvolvendo lesão cardíaca, deve-se tratar a mãe com altas doses de dexametazona ou
betametasona. Estas formas de corticoide são capazes de atravessar a barreira placentária. Com
este tratamento pretende-se sustar o processo inflamatório local, impedindo-se, assim, o
desenvolvimento deste tipo de lesão. Aparentemente a causa do bloqueio cardíaco é uma
miocardite. Este anticorpo tem, também, um potencial arritmogênico por interferir, de alguma
maneira, com transporte de cálcio e reduzir a fase de repolarização cardíaca.
Embora a síndrome do lúpus neonatal tenha sido descrito largamente como se devendo
ao anticorpo anti-Ro/SS-A, aparentemente o anticorpo anti-La/SS-B também pode estar
implicado em sua gênese. Existem raros casos associados com o anti-U1RNP.
Nem toda mãe que tem o anticorpo anti-Ro/SS-A ou anti- La/SS-B gera filhos com lúpus
neonatal. Ele aparece em menos de 25% das mães que os tem. Parece existir uma predisposição
dos tecidos fetais a esta complicação, o que explica porque uma mãe, que teve um filho com
BAV, pode, numa gestação subsequente, ter outro filho normal. Um terço das crianças com
bloqueio cardíaco congênito morrem antes dos 3 anos de idade. O aparecimento do lúpus
neonatal não está relacionado com a gravidade do lúpus materno.
É bom que fique bem claro que a síndrome do lúpus neonatal está associada com a
presença destes anticorpos e não com a doença básica da mãe, podendo, portanto, aparecer
em casos de mães não lúpicas que tenham este anticorpo por causa de uma outra doença, como
p.ex., síndrome de Sjögren. Não é raro que o diagnóstico saia “às avessas”. Primeiro descobre-
se o bloqueio cardíaco na criança e depois, a presença do anticorpo materno, em uma mulher
assintomática.
As lesões cutâneas do lúpus neonatal são fotossensíveis e estas crianças não devem ser
submetidas a tratamentos com luz ultravioleta para tratamento de icterícia neonatal.
Frequentemente são confundidas com infecções fúngicas pelo seu aspecto circinado. Podem
curar deixando pequenas telangiectasias.
Um problema especial na paciente grávida com lúpus e que merece atenção é o da
paciente com envolvimento renal. Considera-se uma gravidez contra-indicada em pacientes com
síndrome nefrótica, creatinina acima de 2,0 mg% ou com padrão de glomerulonefrite prolifera-
tiva difusa à biópsia.
É desnecessário enfatizar os efeitos maléficos da hipertensão sobre a gravidez. Em casos
de envolvimento lúpico renal que aparece durante a gestação, pode ser extremamente difícil
fazer a diferenciação com pré-eclâmpsia, principalmente em casos com envolvimento do
sistema nervoso central com convulsões. Além disso, pré-eclâmpsia é muito mais comum na
244
paciente lúpica, numa incidência de até 32%. Por outro lado, um tratamento muito agressivo
da hipertensão materna pode causar trazer dano ao feto por diminuição no fluxo sanguíneo
placentário.
As contraidicações da gravidez no LES podem ser vistas na tabela 18.1
POLIMIOSITE - São poucos os relatos desta doença em associação com gravidez, mas, nestes
casos, o prognóstico parece estar mais relacionado com eventuais disfunções de órgãos,
principalmente com fraqueza de músculos respiratórios. Existem casos descritos de mães
portadoras de doença inativa, em geral, que tiveram dermato ou polimiosite infantil, nas quais
aconteceu uma reativação da doença, mas que não chega a afetar o feto.
Em casos de doença de aparecimento em idade adulta, que estejam ativas durante a
gravidez, a sobrevida do feto está reduzida, com uma alta taxa de abortamentos e de mortes
perinatais.
sempre é aplicável ao ser humano. Além disso, é difícil separar os efeitos da droga sobre o feto
dos efeitos da doença que levaram à sua indicação.
insuficiência suprarrenal na criança, exceto quando doses muito altas são usadas ou quando
estes dois últimos preparados são utilizados. Existem obstetras que preferem o uso da
betametazona à dexametazona porque foram descritos alguns casos isolados de leucomalácia
periventricular com esta última, embora isto não seja de consenso.
O uso de terapia de pulso não tem sido adequadamente estudado durante a gravidez,
embora existam alguns relatos de que a criança apresenta redução de movimentos,
transitoriamente, durante o seu uso. Quando usada, é de bom alvitre monitorar o recém-
nascido para infecções e supressão de supra-renal, embora tais eventos sejam considerados
raros.
Corticoides causam osteoporose e, como a demanda de cálcio na gravidez está aumentada,
é necessário atender a sua reposição e a de vitamina D. Além disto, se as parturientes
necessitarem de cesárea ou o trabalho de parto for prolongado, deve-se proceder à
suplementação de corticoide como as feitas para situação de estresse.
METOTREXATE (MTX) - O MTX é uma droga considerada teratogênica a partir de estudos feitos
principalmente em animais. Em humanos existem casos descritos de malformação dos ossos
cranianos, fenda palatina, anencefalia, hidrocefalia e meningomielocele. Desta maneira é
fundamental que as mulheres em idade fértil que estão recebendo metotrexate recebam
orientações para uso adequado de anticoncepcionais. Se a mulher pretende engravidar após o
seu uso é adequado que a interrupção do medicamento aconteça 3-4 meses antes da
concepção.
Referências
Buyon JP,et al. Neonatal lupus: basic research and clinical perspectives. Rheum Dis Clin North Am. 2005; 31 (2):299-
313.
Buyon JP et al. Neonatal lupus: basic research and clinical perspectives. Rheum Dis Clin North Am. 2005;31:299-313.
Da-Costa T et al. Systemic Lupus Erythematosus and Pregnancy Acta Med Port 2012;25:448-53.
Del Ross T et al. Treatment of 139 pregnancies in antiphospholipid-positive women not fulfilling criteria for
antiphospholipid syndrome: a retrospective study. J Rheumatol. 2013; 40: 425-9.
Doria A et al. Challenges of lupus pregnancies. Rheumatology (Oxford). 2008; 47 Suppl 3: iii9-12.
Lateef A,et al. Managing lupus patients during pregnancy. Best Pract Res Clin Rheumatol. 2013;27:435-47.
Lockshin MD. Anticoagulation in management of antiphospholipid antibody syndrome in pregnancy. Clin Lab Med.
2013; 33:367-76.
Mok C C, et al. Pregnancy in systemic lupus erythematosus. Postgrad Med J 2001;77 (905) :157–165.
Ostensen M, et al Pathogenesis of pregnancy complications in systemic lupus erythematosus. Curr Opin Rheumatol.
2013; 25:591-6.
Peart E,et al. Systemic lupus erythematosus and pregnancy outcomes: an update and review of the literature. Curr
Opin Rheumatol. 2014; 26:118-23.
Ruiz-Irastorza G et al. Lupus and pregnancy: ten questions and some answers. Lupus. 2008; 17:416-20.
Sammaritano LR. Therapy insight: guidelines for selection of contraception in women with rheumatic diseases. Nat
Clin Pract Rheumatol. 2007; 3: 273-81.
Stanhope TJ et al.Obstetric nephrology: lupus and lupus nephritis in pregnancy. Clin J Am Soc Nephrol. 2012; 7:2089-
99.
Vázquez-Del Mercado M et al. Molecular mechanisms in normal pregnancy and rheumatic diseases. Clin Exp
Rheumatol. 2006; 24:707-12.
249
AS PRINCIPAIS VASCULITES
A B
C
FIGURA 19.1 Arterite de Takayassu: (A) em aorta e vasos renais; (B) e (C) obstrução da
subclávia ; em (B) arteriografia e (C) pelo ultrassom.
ARTERITE TEMPORAL (ou de células gigantes)- Esta forma de vasculite de grandes vasos
acomete pessoas idosas. Sua apresentação mais característica é cefaléia rebelde causada por
envolvimento da artéria temporal, a qual se apresenta espessada, tortuosa, sensível e sem
pulso. Envolvimento dos vasos que nutrem o olho pode ser causa de cegueira irreversível. O
advento da cegueira pode surpreender o paciente e o médico, aparecendo sem pródromos.
Outros sintomas incluem febre e claudicação da mandíbula e da língua, necrose de tecidos
irrigados pelos vasos afetados. Apesar de o nome desta doença ser arterite temporal esta
doença afeta vasos de grande calibre em todo o organismo. Não é raro que muitos destes
apcietnes venham a desenvolver aneurismas de aorta anos mais tarde.
Em um grande número de casos, o paciente cursa com polimialgia reumática associada,
que é uma síndrome clínica caracterizada por rigidez e dor em musculatura de dorso e porção
proximal das extremidades. Esta pode se fazer acompanhar de sinovite, a qual é mais comum
em joelhos e articulações esternoclaviculares.
B
A
FIGURA 19.2 Arterite temporal (A) necrose couro cabeludo (B) nutrição do nervo ótico
251
POLIARTERITE NODOSA (PAN) - Antigamente também era chamada de periarterite nodosa, mas
teve seu nome mudado para poliarterite nodosa (PAN) quando se detectou envolvimento das 3
camadas da artéria. Esta é uma vasculite exclusivamente arterial. O termo "nodosa" deve-se ao
fato de que o processo inflamatório vascular leva a formação de nódulos, os quais podem ser
palpados.
Tem um espectro clínico variável, indo de uma doença limitada até uma forma agressiva
e fulminante. Pode aparecer associada a outras doenças como artrite reumatoide, síndrome de
Sjögren, leucemia das células cabeludas e, ainda, crioglobulinemia mista. Ocorre em qualquer
idade, mas sua maior incidência está na faixa dos 40-60 anos com uma ligeira preponderância
para o sexo masculino (relação 2:1 entre homem e mulher).
O envolvimento renal na PAN clássica acontece em vasos médios (artérias interlobares)
e, por poupar os vasos de pequeno calibre, não causa glomerulonefrite. Assim sendo, não se
espera encontrar cilindros hemáticos no parcial de urina, embora hematúria e proteinúria
possam ser achadas. Hipertensão renovascular é encontrada comumente. A angiografia mostra
pequenos aneurismas e infartos renais. Os sintomas músculo-esqueléticos constam de artralgias
e artrites oligoarticulares e não deformantes. As manifestações cutâneas mais comuns são:
alterações isquêmicas de dígitos, ulcerações, púrpura palpável e livedo reticularis. Para o lado
do sistema nervoso, o achado mais freqüente é de mononeurite multiplex tanto em membros
inferiores como superiores. Mais raramente ocorrem convulsões e hemiparesias. As
manifestações intra-abdominais resultam do envolvimento de vasos que podem causar infarto
mesentérico, infarto de vesícula biliar etc. O envolvimento hepático é mais um achado de
autópsia que raramente tem tradução clínica, exceto nos casos associados com presença do
antígeno de hepatite B. A associação com esta infecção vem declinando graças ao uso
disseminado da vacinação contra hepatite B. Caracteristicamente a PAN não afeta os pulmões.
A B C
Figura 19.3 - PAN- (A)- livedo reticularis; (B) aneurismas renais; (C)-histologia mostrando
envolvimento de vasos de médio calibre
A PAN é, na sua grande maioria, uma doença grave e segue um curso agudo. A maioria
dos pacientes morre no primeiro ano da doença se não for tratado. As mortes precoces
decorrem da vasculite. As mortes mais tardias tendem a serem causadas pelo tratamento como
infecções ou por complicações tipo AVC e IAM. Todavia existe uma forma limitada à pele,
benigna e que está associada com infecções estreptocócicas.
Antes de ir adiante, revise, no quadro 19.2, a lista das principais características da PAN.
252
DOENÇA DE KAWASAKI- É uma doença que afeta predominantemente crianças abaixo dos 5
anos, sendo que a maioria dos casos é descrita entre japoneses. Nos aspectos clínicos mais
característicos se incluem febre, aumento de linfonodos, congestão conjuntival e de outras
mucosas como a oral e faríngea e rash eritematoso envolvendo face e tronco. Este rash pode
ser morbiliforme ou em placas. Mais raramente toma características escarlatiniformes. Dura em
media duas semanas e é seguido por uma descamação fina. A língua fica avermelhada e cheia
de pequenas elevações; toma um aspecto semelhante ao de um morango Acompanha-se de
artrite não deformante, pauciarticular ou edema difuso em mãos e pés, de cor amarronada. As
anormalidades cardiacas são numerosas e variadas. Nelas se incluem as pericardites, as
miocardites e lesões coronarianas. Pode existir a formação de aneurismas da artéria
coronariana, os quais, às vezes, se rompem. Achados menos típicos são os de pneumonites,
pleurites, meningite asséptica, hepatomegalia, uveítes etc... A doença é, em geral, autolimitada
e subside em 4 a 6 semanas. Crianças com Kawasaki têm uma tendência para apresentar maior
risco de arteriosclerose coronariana quando adultos.
A Doença de Kawasaki se comporta, em muitos aspectos como uma infecção,
principalmente em sua fase inicial. Apresenta-se com rash cutâneo, linfadenomegalia, febre alta
etc... Entretanto existem evidências para que nela ocorram, também fenômenos de auto-
imunidade, como artrite e vasculite etc. A impressão existente é que ela se situe no limiar entre
estes dois tipos de doenças. Organismos candidatos a agentes desencadeantessão o
estreptococo, o estafilococo, retrovirus e vírus de Epstein Barr, cândida e espécies de ricketsia.
A B
C D
E F
G H
FIGURA 19.5 - Poliangeite com Granulomatose: (A) até (D) Nariz em sela; (B) notar fístula
de seio etmoidal; (E)escleromalacia; (F) estenose de glote; (G) e (H)- vasculite de pele.
255
A B C
FIGURA 19.5- Lesões de púrpura palpável em casos de vasculite por IgA
DOENÇA DE BEHÇET - Esta é uma vasculite que afeta vasos de todos os calibres tanto arteriais
como venosos. Está associada com HLA B-51 e é mais comum em pessoas de raça turca ou
asiática. As manifestações clínicas são muito variadas; as mais características são as ulcerações
orais e genitais, as lesões cutâneas e as manifestações oculares. As lesões cutâneas tomam
aspecto de eritema nodoso e lesões acneiformes. Existe no Behçet, uma reação cutânea típica,
chamada patergia que consta da formação de uma pústula no local em que houve trauma
mecânico (como escarificação com agulha). Embora bem característica da doença, nem todos
os pacientes a apresentam. No olho é mais comum a uveite (panuveite, ou seja, uveite que é
tanto anterior quanto posterior) que pode ser bilateral e recidivante. A exudação inflamatória
importante em casos de uveite anterior pode levar ao acúmulo de pus na câmara anterior, o que
é conhecido como hipopion.
A B C
FIGURA 19.6 – Doença de Behçet: (A) úlceras orais; (B)- úlceras escrotais; (c) hipópio.
ABORDAGEM DIAGNÓSTICA
Quando suspeitar de que um paciente é portador de uma vasculite? Esta suspeita deve ser
levantada quando:
a) existe uma doença multissistêmica;
b) quando existe glomerulonefrite ativa;
c) quando existe sinal de isquemia em paciente jovem;
d) quando existe púrpura palpável;
e) quando existe mononeurite multiplex.
Uma vez levantada a suspeita clínica existe uma gama de exames, dos mais corriqueiros
e inespecíficos aos mais invasivos, visando, não só o diagnóstico da doença mas, também, a
realização de um verdadeiro inventário do grau de envolvimento dos diversos sistemas.
EXAMES LABORATORIAIS
DIAGNÓSTICO DE TECIDO - O local escolhido para biópsia deve ser o que mostre evidência de
doença ativa e no qual a retirada de tecidos traga menos riscos para o paciente. É importante
258
também que se obtenha amostragem adequada (um bom pedaço), uma vez que o envolvimento
do vaso pode ser segmentar, sendo por isso, inadequado o uso de biópsias de agulha. Os locais
mais comumente biopsiados são: pele, músculo, nervos, pulmões e rins.
A biópsia de pele tem valor no diagnóstico de vasculite de pequenos vasos.
Leucocitoclastose é um termo utilizado para designar o achado à microscopia, de fragmentos de
núcleo de célula e este achado não tem significado especial arpa dfiagnóstico. O estudo por
imunofluorescência pode revelar depósito de IgA em casos de Síndrome de Henoch Schönlein.
Outra possibilidade é o achado de granulomas nos casos de vasculites ANCA associadas.
A biópsia de rim costuma dar o tipo de glomerulonefrite que domina o quadro, o que
sem dúvida é importante para o prognóstico do paciente, mas não diz, necessariamente, o tipo
de vasculite que está causando a doença. Por exemplo, pode dizer se o paciente tem uma
glomerulonefrite focal ou uma proliferativa, mas não pode dizer se é causada ou não por uma
poliangeite com granulomatose ou por poliangeite microscópica etc..
A biópsia de pulmão costuma dar alto índice de positividade quando a biópsia é feita a
céu aberto, embora existam alguns casos descritos, de biopsia transbrônquica mostrando
material adequado para o diagnóstico.
Os achados anátomo patológicos estão na dependência do tipo de vasculite encontrada.
Assim sendo, veja um resumo deles no quadro 19.7.
ABORDAGEM TERAPÊUTICA
Não se deve esquecer que, frente a uma situação individual, o mais importante nem
sempre é o diagnóstico específico da doença, ou seja, o nome da mesma. Caso o diagnóstico
259
não seja possível, deve tentar identificar o tipo de vaso envolvido e o grau de envolvimento dos
diferentes órgãos. Isto é ressaltado aqui porque, muitas vezes, enquanto o médico se demora
procurando o diagnóstico, o paciente, que em geral é um paciente grave, vai a óbito. O
tratamento em linhas gerais, é feito de acordo com o grupo e que o paciente se situa. Assim:
TRATAMENTO DAS VASCULITES DE GRANDES VASOS - É feito, em primeira linha, com corticoide
em altas doses, ou seja, 1 mg/Kg/dia de prednisona ou equivalente. A retirada da droga deve
ser feita de maneira gradual e lenta, acompanhando-se a VHS. Em casos de arterite temporal
com perda visual recente, pode-se tentar o uso de pulsoterapia com corticoide. Metotrexate
pode ser usado como economizador de corticoide. O uso de AAS em doses baixas parece auxiliar
a evitar as complicações em arterite temporal e anti IL-6 vem sendo testada em Takayasu.A
arterite temporal costuma ser uma doença auto-limitada e a grande maioria dos pacientes
consegue suspender o tratamento em 2 anos. Isto não acontece com o Takayasu que segue um
curso crônico.Biologicos v~em sendo estudados. Anti IL-6 se mostrou ptomissora em casos e
arterite temporal.
TRATAMENTO De VASCULITE POR IgA - Estas são doenças que nem sempre requerem a interfe-
rência do médico. Nestes casos, a clínica regride em 1 a 3 semanas. Em situações mais rebeldes
pode-se utilizar corticoide em doses baixas, colchicina ou dapsona. Em pacientes que
aparentemente têm doença exclusivamente de pele é importante o acompanhamento do
paciente para ver se existe o aparecimento de doença sistêmica. Reserva-se o uso de corticoide
e imunossupressores para situações em que existam repercussões sistêmicas ou para quando a
doença incide em adultos. Nestes últimos, a doença costuma ser mais grave.
Lembra que a polimialgia reumática é aquela entidade clínica que costuma aparecer
junto com a arterite temporal? Pois ela também pode aparecer sozinha. A epidemiologia dos
casos isolados é a mesma da arterite, ou seja, prefere pessoas idosas de ambos os sexos.
Estes pacientes se queixam de rigidez nas cinturas pélvicas e escapulares e isto causa
dificuldade para erguer os braços ou para se levantar de uma cadeira. Embora a rigidez seja a
queixa principal, também pode existir dor. O envolvimento é bilateral e simétrico. As porções
distais das extremidades não estão afetadas. Ressonância magnética dos locais sintomáticos
tem demonstrado uma associação de tendinites e sinovite no local. As enzimas musculares são
normais embora possa existir sensação de fraqueza de músculos por causa da dor. A VHS está
alta, mas não esqueça que este achado é inespecífico.
O tratamento é feito com corticoides em doses baixas (10 a 20 mg/dia de prednisona ou
equivalente) por, em média, 2 anos.
O grande problema aqui é saber qual o paciente que tem arterite temporal associada ou
não. Não existe consenso na literatura se esta investigação deve ser feita de rotina. Todavia o
clinico deve se manter alerta para queixas e sinais que apontem neste sentido.
Referências:
Burns JC, et al. Infliximab treatment for refractory Kawasaki syndrome. J Pediatr 2005; 146: 662-7.
Newburger JW, et al. The treatment of Kawasaki syndrome with intravenous gamma globulin. N Engl J Med 1986;
315:341-7.
Patrignelli R, etal. Henoch-Schönlein purpura: a multisystem disease also seen in adults. Postgrad Med 1995, 97: 123-
4.
261
Mas, para que o médico possa usufruir deste dado, é fundamental a realização de um
diagnóstico diferencial cuidadoso entre dor lombar inflamatória e mecânica. Os principais
pontos de diferenciação estão listados no quadro 20.3.
ETIOPATOGENIA
São vários os fatores que parecem contribuir para o aparecimento deste grupo de
doenças. São eles:
Não é todo mundo que tem o B27 que irá desenvolver espondiloartrite. Aliás, ela
acontece em uma minoria deles (cerca de 13,6%). O HLA-B27 tem cerca de 31 subtipos e só
alguns deles estão associados com as espondiloartrites.
O HLA-B27 é um antígeno de histocompatibilidade da classe 1, existente em todas as
células nucleadas do organismo e responsável pela apresentação de antígenos aos linfócitos T-
CD8+ Quando um elemento estranho adentra o citosol, ele é degradado pelo proteossomo em
pequenos epítopes antigênicos que são encaminhados ao sistema reticulo endoplasmático (RE)
sendo anexados a uma molécula de HLA I. Um HLA I é formado por uma cadeia α (alfa) com três
domínios: α 1, α2 e α3, e uma molécula de beta2 microglobulina (β2M); o antígeno deve se
encaixar numa fenda entre aos domínios alfa 2 e 3. Figura 20.2 A.
A montagem do antígeno no topo da fenda é feita pela tapasina e as enzimas ERAP
(aminopeptidases endoplasmáticas) funcionam como ”tesourinhas”, que recortam os peptídeos
antigênicos para que eles se encaixem adequadamente na fenda. O conjunto tridimensional
assim formado (cadeia α, β2M e antígeno) é transportado até a superfície celular onde será feita
a sua apresentação à célula T CD8+. Figura 20.2B.
A B
FIGURA 20.2 (A)- Estrutura do HLA B27; (B) montagem do epítope na fenda do HLA-B27.
264
Teoria do estresse do SRE por defeito na dobradura das proteínas. O HLA-B27, ao formar os
domínios α1, 2 e 3 tem a peculiaridade de se dobrar de maneira muito lenta, o que favorece o
aparecimento de erros de dobradura (ou misfolding). O acúmulo de moléculas mal dobradas
causa estresse no reticulo endotelial e ativação do NFκB com indução de proteínas pró-
inflamatórias como a IL-23, que, por sua vez, induz a polarização das células T-CD4+ em Th17.
Ocorre também a produção de interferons tipo 1 que favorecem a sobrevida dos macrófagos,
principalmente se os receptores toll like 3 e 4 forem ativados. Figura 20.3B.
B
FIGURA 20.3 - (A)- Formação de Homodímeros; (B) Teoria do misfolding
265
Embora estas doenças tenham forte associação com o HLA-B27, há que se reconhecer
que, para que um indivíduo tenha uma espondiloartrites, o HLA-B27 não é indispensável. Caso
contrário, como se poderia explicar a ocorrência desta forma de doença em quem é negativo
para este antígeno de histocompatibilidade? Indivíduos com espondiloartrite e que são HLA-B27
negativos geralmente não pertencem à população branca e têm formas secundárias da doença
(tais como sacroiliíte psoriásica ou enteropática).
PAPEL DOS AGENTES MICROBIANOS - Existe uma associação intrigante entre flora microbiana
e as espondiloartrites. As artrites das doenças inflamatórias intestinais e a ocorrência de
infecções precedendo aparecimento da artrite reativa são exemplos bem conhecidos dessa
interação3. Microinflamações em mucosa intestinal de pacientes com espôndilo são
encontradas em indivíduos assintomáticos do ponto de vista gastrintestinal. Além disso, animais
criados em ambientes estéreis não desenvolvem espondiloartrites, fato este que é revertido
quando colocados em ambientes contaminados. Estudos recentes demonstram que a interação
microbiota intestinal-hospedeiro é fundamental para manutenção da homeostase imunológica.
Bactérias comensais como B.fragillis induzem a formação de células T reguladoras e produção
de IL-10 favorecendo a tolerância imunológica. Alterações na flora intestinal (ou disbiose), com
crescimento de espécies prejudiciais como as de bactérias filamentosas segmentadas ou certos
lactobacillus, favorecem a expansão local de células pró-inflamatórias (Th1 e Th17), as quais
migram para compartimentos periféricos, ativando células B, macrófagos, osteoclastos,
citocinas e moléculas de adesão que, por sua vez, subsidiam o processo inflamatório. Dessa
maneira uma interação disfuncional entre microbiota intestinal-sistema imune pode favorece o
início (ou perpetuação) das espondiloartrites.
Na artrite reativa, também chamada síndrome de Reiter, por definição existe um agente
infeccioso que precipita o processo, geralmente oriundo do trato gastrintestinal ou genito-
urinário. Os organismos de origem gastrintestinal mais comumente implicados são Salmonella,
Shigella, e Yersínia e neste caso a artrite reativa leva o nome de pós-disentérica ou epidêmica.
Agentes de origem em trato genito-urinário incluem a Chlamydia trachomatis e talvez o
Ureoplasma e nesta última situação, ela passa a se chamar de pós-venérea ou endêmica. É
importante frisar que, estes micro-organismos não são cultivados das articulações de indivíduos
com artrite reativa, ou seja, a artrite é reativa e não séptica!
No caso da artropatia psoriásica, a flora da placa de psoríase de pele, principalmente o
estreptococo do grupo A, parece estar implicada na etiopatogenia da doença. Outros pontos
possíveis de estimulação antigênica seriam as infecções de unhas por fungos ou mesmo por
bactérias, que são ocorrências secundárias comuns nos pacientes com envolvimento ungueal da
psoríase. Estimulação por bactérias de aparelho gastrintestinal tem sido advogada nos casos em
que as manifestações articulares precedem as cutâneas. A psoríase está associada com
alterações funcionais do aparelho gastrintestinal, embora não se tenha conseguido provar a
existência de anormalidades na flora intestinal destes indivíduos. No entanto, niveis séricos de
IgA e complexos imunes contendo IgA parecem ser mais comum em pacientes com
manifestações articulares do que em pacientes com manifestações exclusivamente de pele.
Trauma parece desempenhar, também, um papel importante no caso da artrite
psoriásica. Acro-osteólise tem sido descrita após trauma local.
No caso da artrite relacionada às doenças inflamatórias do intestino (doença de Crohn
e retocolite ulcerativa inespecífica) a ocorrência de artrite está relacionada ao sítio anatômico
de envolvimento do intestino, em grau maior do que com o diagnóstico específico de Crohn ou
de retocolite. O envolvimento do colon resulta em maior incidência de artrite. A razão para isto
é especulativa e talvez esteja relacionada com o grau de população bacteriana em cada um
destes segmentos do intestino. No jejuno existe uma concentração de micro-organismo de 104
por ml de fluido intestinal; esta concentração aumenta a medida que se progride distalmente.
266
Além disso, a proporção de bactérias anaeróbias aumenta e estes elementos são a população
predominante no colon onde pode-se chegar a ter uma proporção de pelo menos 1 bactéria
aeróbica para 5.000 anaeróbicas. Como no caso da retocolite ulcerativa o processo inflamatório
intestinal se restringe ao colon, a colectomia total é curativa para artrite.
EIXO INTERLEUCINAS 23/17 - Vários estudos documentam uma ativação do eixo IL-23/IL-17 em
pacientes com espondiloartrites tanto em sangue periférico como nos tecidos afetados. A IL-23,
cuja produção pode ser estimulada por situações de estresse de RE, é reconhecida como
essencial para a proliferação e diferenciação de células Th17. Consistentemente observa-se em
sangue periférico aumento de células CD4 Th17, as quais elaboram IL-22 e TNF-α. Muitos dos
genes implicados na predisposição para espondiloartrites como CARD9, STAT3, IL12B etc, estão
associados com produção de IL-23. Além disso, aumento de células produtoras de IL-17
ostentando receptores KIR, promove ligação entre a presença dessa citocina e do (HLA 27)2.
Em tecidos periféricos, a expressão da IL-17 está associada com aumento de produção
principalmente por células do sistema imune inato; em mucosa intestinal e medula óssea,
documenta-se aumento da IL-23. Por último, em tecidos afetados de animais experimentais
como êntesis, úvea e raiz da aorta, um tipo especial de célula tem sido encontrado: IL-23R+,
RORγt CD4-,CD8- capaz de produzir IL-17, IL-6 e IL-22. Esta última citocina parece estar
implicada nas alterações osteoproliferativas das espondiloartrites.
Referências
Ambarus C et al. Pathogenesis of spondyloarthritis: autoimmune or autoinflammatory? Curr Opin Rheumatol 2012;
24: 351-8.
Asquith M, et al. The role of the gut and microbes in the pathogenesis of spondyloarthritis. Best Prac Res Clin
Rheumatol 2014; 28: 687-702.
Brown M. Breakthroughs in genetic studies of ankylosing spondylitis. Rheumatology 2008;47:132-7.
Chatzikyriakidou A et al. What is the role of HLA B27 in spondyloarthropathies. Autoimmune Rev 2011; 10: 464-8.
McHugh K et al. The link between HLA-B27 and SpA- new ideas on an old problem. Rheumatology 2012; 51: 1529-
39.
Melis L, et al. Immunopathogenesis of spondyloarthritis: which cells drive the disease? Arthritis Res Ther 2009, 11:
233-9.
Sheehan N. HLA-B27: what is new? Rheumatology 2010;49:621-31.
Smith JA et al. The interleukin 23/interleukin 17 axis in spondyloarthritis pathogenesis. Arthritis Rheum 2014; 66: 231-
41.
267
CLÍNICA
do pescoço. Se houver contratura dos quadris, os joelhos se flexionam para compensar. Esta
postura típica é chamada de postura espondilítica ou posição de esquiador.
O suporte de peso favorece a inflamação em locais de êntesis.
A B C
FIGURA 21.1 (A)- Hábito espondilítico; (B) tendinite de tendão de aquiles; (C)- Esporão de calcâneo.
SINTOMAS OCULARES - Uveítes ocorrem em ¼ dos pacientes durante algum tempo de sua
doença podendo até preceder as manifestações articulares. A ocorrência de uveíte se
correlaciona de maneira positiva com o HLA-B27 e com doença articular periférica. Não
demonstra correlação com atividade da doença vertebral. Os episódios são, em geral, auto-
limitados. A ocorrência isolada de uveíte pode ser considerada uma forma frustra da doença.
Outro achado ocular menos comum é o de conjuntivite.
A B
FIGURA 21.2- Manifestaçôes extra articular da E.A. (A) Traves fibroticas em ápice; (b) PKs
em câmara anterior por uveite.
OUTRAS- Tem se descrito um aumento de otite média crônica em pacientes com EA que se
acredita possa pertencer ao quadro de manifestações extra-articulares desta doença.
A B
FIGURA 21.3: (A)- Coluna em bambu (sindesmofitose confluente); (B)-Fusão das
sacroiliacas em doença avançada.
271
A B
D E
G
F
FIGURA 21.2- Imagens na espondilite anquilosante: (A) sacroiliite (TAC); (B) sacroiliite
(RMN) (C)-Fusão C1 e C2 (dente do atlas com arco do axis); (D)- Osteoartrite secundária de
coxofemoral; (E) Espondilite (flecha larga-sinal de Anderson; flecha estreita-sinal de
Romanus); (F)- Coluna cervical em bambu; (G) sacroiliite (TAC).
272
Osteitis condensans ilii é uma anomalia radiológica típica de mulheres multíparas aonde
se vê esclerose exclusivamente no lado ilíaco da articulação. Pode ser causa de confusão com
sacroiliíte. Não pertence ao quadro de espondilite.
DIAGNÓSTICO
TRATAMENTO
Não existe um tratamento definitivo para a espondilite. As metas principais são educar
e conscientizar o paciente de sua participação em um programa de exercícios, a fim de que o
paciente possa manter uma postura funcional e preservar os movimentos. O uso do fumo deve
ser banido.
A maioria dos pacientes requer anti-inflamatórios não hormonais para o controle da dor
e para conseguir dar conta do programa de exercícios. Os anti-inflamatórios não hormonais são
os únicos medicamentos que conseguem retardar a formação de sindesmófitos e, assim
modificar a doença. A não respostada dor ao AINH é um sinal de mau prognóstico.
Alguns estudos têm mostrado bons resultados com o uso de sulfassalazina na dose de 2
a 3 g/dia em pacientes com artropatia periférica. O mesmo acontece com metotrexato.
273
Referências:
Bergfelt L et al. Ankylosing spondylitis: an important cause of severe disturbances of the cardiac conduction system.
Prevalence among 223 pacemaker-treated men. Am J Med 1982; 73:187-91.
Gorman JD. Spondyloarthropathies. In Imboden J, Hellmann DB, Stone JH. (eds) Current rheumatology: diagnosis and
treatment. Mc Graw Hill, New York, 2004, p.157-69.
Yu TD et al Diagnosis and differential diagnosis of ankylosing spondylitis in adults. In Rose B. Uptodate.com. Capturado
em www.uptodate.com em outubro de 2014.
274
ASPECTOS CLÍNICOS
B
A
C D
E F
G
H
I J
FIGURA 22.1 -Psoríase ungueal; placas de psoríase. Em F- forma guttata.
Fotos E-H- gentileza Dra Juliana Simioni
276
A B
FIGURA 22.2: (A)- Entesopatia de tendão de Aquiles; (B) Múltiplas dactilites.
TRATAMENTO
A B C
D E
G H
QUADRO 22.3 - Artrite psoriásica: (A) pencil and cup; (B) reabsorção de falanges; (C) lesão
no 5º dedo dactilite; (D) mão - forma mutilante; (E) dactilite em RMN;(F) lesão pencil and
cup – 3º metatarsiano; (G)-dactilite-ultrassom; (H) entesopatias em tornozelo (Aquiles e
calcâneo).
Referências
Boumpas DT, et al.Psoriatic arthritis. In Klipell JH, Crofford LJ, Stone JH, Weyand CM (eds). Primer on Rheumatic
diseases, Arthritis Foundation, Atlanta, 2001, p.233-8.
Ritchlin, CT. Pathogenesis of psoriatic arthritis. Curr Opin Rheumatol 2005; 17:406-12.
Williamson, L, et al. Extended report: nail disease in psoriatic arthritis clinically important, potentially treatable and
often overlooked. Rheumatology 2004; 43:790-4
279
ARTRITE REATIVA
A artrite reativa foi descrita em 1916 como uma associação de artrite não purulenta,
uretrite estéril e inflamação ocular ( conjuntivite) que aparece após uma infecção
(gastrintestinal ou venérea). A tríade clássica se expandiu para incluir a balanite e algumas lesões
típicas de pele como o queratoderma blenorrágico. Ela reparte com a espondilite alguns
elementos em comum, tais como manifestações articulares e extra-articulares, preferências
demográficas e genéticas. No entanto, ela se separa da espondilite pela sua tendência para
desenvolver artrite predominantemente periférica e pelas manifestações cutâneas que lhe são
peculiares. Semelhantemente a espondilite, acomete principalmente indivíduos jovens do sexo
masculino. Aliás, mais precisamente, na doença de início pós-diarréia, a relação entre os sexos
é mais ou menos a mesma, de 1:1; enquanto que, na de início pós-venéreo, o sexo masculino
está fortemente favorecido, numa proporção de 9:1. Têm sido documentados casos, também,
em crianças de até 5 anos de idade.
Embora a tríade clássica é o que facilita o reconhecimento clínico da doença, as formas
incompletas são mais encontradiças do que as clássicas. Alguns estudos em populações de
militares sugere que a artrite reativa é a causa mais comum de artrite inflamatória periférica
em adultos jovens.
Dor lombar é comum em artrite reativa, mas só parte dos pacientes têm evidência
radiológica de sacroiliíte. É importante deixar bem claro que, apesar da artrite reativa estar
classificada entre as espondiloartrites, o achado de sacroiliíte não é uma condição obrigatória
para seu diagnóstico. Envolvimento de coluna, acima das sacroilíacas, é raro. Entretanto alguns
pacientes, com doença persistente, podem chegar a desenvolver uma fusão completa de coluna.
Manifestações cutâneas ocorrem na metade dos pacientes e incluem queratoderma
blenorrágico, balanite circinata, úlceras orais e alterações ungueais. O queratoderma
blenorrágico é uma lesão pápulo-escamosa que aparece frequentemente em solas das mãos e
plantas dos pés. Estas lesões são clinicamente e histologicamente indistinguíveis da forma
pustular da psoríase. O rash é, em geral, limitado e transitório, entretanto uma forma
disseminada psoriasiforme pode dominar o quadro clínico. A balanite circinata caracteriza-se
pela formação de úlceras rasas, não dolorosas, serpiginosas que circundam o meato urinário.
Elas se iniciam como vesículas que se tornam hiperqueratóticas e se rompem. No homem
circuncidado elas formam placas com escamas secas semelhantes as da queratodermia
blenorrágica. As úlceras orais são rasas, indolores, serpiginosas e ocorrem em palato duro ou na
língua. Alterações ungueais incluem descoloração amarelada ou branca com espessamento e
tendência para descolamento do leito ungueal. Estas anormalidades são muito parecidas com
infecções micóticas, podendo até ter inflamações periungueais que lembram paroníquias.
A B C
FIGURA 23.1 . Artrite reativa - (A) Ceratopatia blenorrágica;(B) Dactilite; (C) Uveíte.
TRATAMENTO - A artrite reativa pode-se apresentar como casos muito fáceis de manejar e em
outras situações, extremamente difícil. Normalmente os mesmos agentes efetivos na
espondilite anquilosante têm sucesso no tratamento da artrite reativa.
Assim, o tratamento de escolha inicial é o anti-inflamatório não hormonal. Infelizmente
quando a artrite é grave pouco benefício é obtido deste tipo de agente. Azatioprina e
metotrexate têm sido utilizados em pacientes mais afetados. Não existe lugar para o uso de
corticoides sistêmicos e antimaláricos. Entesopatias e artrites isoladas podem se beneficiar de
infiltrações de corticoide local.
282
PROGNÓSTICO - O curso da artrite reativa não é previsível. A maioria dos pacientes experimenta
um único episódio que dura de 4 a 12 meses. Aproximadamente 1/3 destes pacientes tem uma
recrudescência após vários anos livres de sintomas. Alguns pacientes progridem para uma forma
periférica crônica ou para espondilite progressiva. Incapacidade resulta de dores nos pés,
deformidades e cegueira. É muito raro que artrite reativa seja causa de morte do paciente. Estes
raros casos são motivados por alterações cardíacas ou amiloidose.
A B
FIGURA 23.2 (a) Eritema nodoso; (b) pioderma gangrenoso.
Achados do líquido sinovial são compatíveis com um líquido inflamatório não infeccioso.
A análise de biópsia sinovial tem sido feita em poucos casos, mas tem-se descrito o achado de
granulomas em pacientes com doença de Crohn, e, nestes casos a artrite parece tomar um
caráter mais erosivo. O fator reumatoide é, por definição, negativo e no caso desta forma de
artrite não existe associação com o antígeno HLA B27. O tratamento médico ou cirúrgico para a
doença inflamatória intestinal controla a artrite periférica. Em casos de ataques agudos pode se
utilizar os AINHs. O uso dos corticoides está indicado para controlar os sintomas gastrintestinais
e outros sintomas sistêmicos da doença; dificilmente o seu uso está indicado para tratamento
isolado das manifestações articulares. A forma de espondilite ocorre em até ¼ dos pacientes
com doença inflamatória intestinal e tem uma evolução bastante semelhante à da espondilite
anquilosante. Metade destes pacientes são HLA-B27. O curso da espondilite é totalmente
independente do curso da DII. Homens e mulheres estão afetados na mesma proporção.
Sacroiliíte assintomática, detectada por RX, tem sido verificada em 1/4 dos pacientes com
Doença de Crohn. Quando se usam técnicas mais sensíveis para detecção de sacroiliíte esta
porcentagem pode ser mais alta, mas esta "doença" não evolui necessariamente para uma
espondilite clássica. Os achados radiológicos são semelhantes aos da espondilite anquilosante
com alterações bilaterais e simétricas em articulações sacroilíacas, sindesmofitose vertical,
erosão apofisária e fusão óssea. O tratamento é semelhante ao da espondilite anquilosante.
Outras complicações das DII de cunho reumático são:
• baqueteamento digital (principalmente em pacientes com Crohn com envolvimento de
intestino delgado);
• amiloidose (também mais no Crohn);
• osteomalácia e osteoporose (resultante da malabsorção e inatividade e/ou tratamento
com corticoide);
• artrites sépticas secundárias a fístulas e abscessos do psoas. São encontradas em
pacientes com Crohn e acometem principalmente o quadril.
Os pacientes com espondiloartrites que não se encaixam bem dentro de um dos grupos
já estudados são designados como portadores de espondiloartrites indiferenciadas e formam
um grupo grande de pacientes, talvez até, os mais comuns. O tratamento é feito de maneira
semelhante ao das demais. O prognóstico e o grau de resposta a tratamento ainda estão sendo
estudados. Existem outras doenças, menos comuns, que podem se enquadrar no grupo da
espondiloartrites. Entre elas está a espondiloartrite associada à pustulose palmo-plantar. Nesta
doença é comum o envolvimento de articulações da parede anterior do tórax (esterno-clavicular
e manúbrio-esternal) e o aparecimento de sacroiliíte, espondilite e espondilodiscite. Doença
articular periférica é do tipo oligoarticular, não erosiva. As lesões de pele têm curso variável e
284
tendem a aparecer dentro dos 2 primeiros anos da doença articular. Não existe associação com
HLA B27.
Sacroiliíte também é detectada entre os achados músculo-esqueléticos que
acompanham a acne conglobata e a hidradenite supurativa. Acne conglobata é uma forma grave
da acne vulgar com inflamação que se estende mais profundamente até a derme e cobrindo
uma maior extensão da pele. A cura é feita com processo cicatricial importante. O início dos
sintomas músculo esqueléticos coincide com exacerbação das lesões de acne, e tende a ocorrer
mais em pacientes de raça negra. Estes sintomas constam de sacroiliíte, artrite periférica do
tipo oligoarticular. Esta últimas afetam principalmente articulações de membros inferiores mas
cursam, também, com envolvimento da articulação esterno-clavicular. É interessante notar que,
nos sintomas músculo esqueléticos que acompanham a acne fulminante (uma forma ainda mais
grave de acne), não se inclui a sacroiliíte e sim lesões osteolíticas em esterno, clavícula, ossos
longos e ílio.
A Doença de Whipple é uma doença multissistêmica rara que cursa com síndrome
disabsortiva (diarréia, esteatorréia e perda de peso). Artrite, nesta enfermidade, pode ser
migratória ou aditiva e simétrica. Alguns casos têm sido associados com sacroiliíte em pacientes
HLA-B27 positivos. É causada por um actinomiceto chamado Tropheryma whippelii e o
tratamento é feito com antibióticos (tetraciclinas).
Por último, pacientes com insuficiência renal e hemodiálise tendem a desenvolver uma
forma destrutiva de espondiloartropatia não inflamatória e não relacionada à presença do HLA-
B27. Ela parece resultar de hiperparatireoidismo secundário, depósitos de hidroxiapatita e
amiloidose por beta-2 microglobulina.
Referências:
Arnett FC. Seronegative Spondyloarthropathies: reactive arthritis and enteropathic arthritis. In Klipell JH, Crofford
LJ, Stone JH, Weyand CM (eds), Primer on rheumatic diseases, Arthritis Foundation, Atlanta, 2001, p.245-250.
Laasila K,et al.Antibiotic treatment and long term prognosis of reactive arthritis. Ann Rheum Dis 2003; 62: 655-8
Scarpa R et al. The arthritis of ulcerative colitis: clinical and genetic aspects. J Rheumatol 1992; 19: 373-7.
285
Muitas observações têm ligado a presença dos cristais com doença articular e
periarticular; os primeiros a serem identificados foram os cristais de urato de sódio. A partir daí,
outros foram sendo estudados e, atualmente, existe uma grande variedade deles implicados
neste tipo de doença. No quadro 24.1, uma lista de alguns destes cristais.
Se não resta dúvida da associação de artropatia com cristais, existe muita discussão em
torno de como isto ocorre. Nosso corpo é dotado de sistemas que favorecem a formação de
cristais, onde isto é desejável, (como no caso dos ossos e dos dentes) e de sistemas que
impedem a sua formação, onde isto não seria benéfico. Áreas de alto risco, como urina e saliva,
são dotadas, inclusive, de proteínas especiais inibidoras da formação de cristais. Estes inibidores
impedem não só a sua deposição nos tecidos articulares, mas, também, diminuem a resposta
inflamatória quando porventura eles "descamam" para dentro do líquido sinovial. Cada cristal
tem o seu inibidor específico.
A ocorrência da formação de cristais em um local considerado inapropriado estaria da
dependência, basicamente, de dois fatores:
concentração muito alta do soluto sobrepujando as capacidades das proteínas inibidoras;
anomalia local no tecido, impedindo a ação dos inibidores naturais. Um exemplo típico da
ação deste segundo fator é o aparecimento de lesões calcificadas em tecidos tuberculosos.
Um aumento de concentração de cristais favorecendo sua deposição articular ficou bem
documentado no caso da gota. Demonstrou-se que, quando a concentração de ácido úrico sobe
para 9,0 mg%, o risco de gota em pacientes do sexo masculino chega a 90%. Já um excesso de
casos de doença de pirofosfato de cálcio é visto em pacientes com hiperparatireoidismo, onde
se encontra um aumento de níveis séricos de cálcio. Um aumento desta forma de artropatia por
cristal é vista também em casos de insuficiência renal, possivelmente relacionado a uma
concentração aumentada do produto entre cálcio e fósforo ou ao hiperparatireoidismo
secundário.
Foi mencionado que, qualquer situação que danifique a cartilagem, favorece a deposi-
ção de cristais pelo segundo mecanismo. Isto fica bem patente principalmente quando se analisa
a doença por depósito de pirofosfato de cálcio e suas associações. Ora, se por um lado uma
cartilagem danificada é ninho para depósito de cristais, pelo outro, os cristais, gerando um
processo inflamatório, acabam promovendo um maior dano articular, num verdadeiro processo
de retro alimentação.
Uma vez dentro da articulação, o cristal interage com vários elementos existentes no
local, que se ligam à sua superfície, tais como IgG, lisosima, albumina etc.... É importante
salientar-se que a ligação do cristal com IgG ocorre na porção Fab desta, deixando a porção Fc
livre para interagir com qualquer célula ou outro elemento que tenha receptor para Fc, como
por exemplo, fagócitos e complemento. IgGs catiônicas se ligam, de preferência, a cristais
aniônicos como os de uratos, pirofosfatos de cálcio e hidroxiapatita, e vice e versa. A seguir, o
cristal é ingerido por polimorfonucleares e a sua superfície pontiaguda promove ruptura das
membranas do fagolissosomo, ocasionando liberação de enzimas líticas para dentro da célula,
a qual morre. A célula morta libera enzimas em tecidos circunvizinhos e o cristal volta ao espaço
286
Além do que já foi mencionado, isolou-se uma glicoproteina dos neutrófilos com
propriedades quimiotáticas. Quando esta é liberada, ocorre afluxo de outros polimorfonu-
cleares, que irão repetir todo o processo já mencionado, perpetuando e amplificando ainda mais
o processo inflamatório. A produção desta glicoproteína é suprimida pela colchicina, daí o seu
papel benéfico no tratamento destas situações.
O papel dos neutrófilos na inflamação das artrites por cristal está comprovado
experimentalmente em animais. Demonstra-se que é possível impedir que ocorra inflamação
por cristais de urato tornando-se estes animais neutropênicos pelo uso de vimblastina.
Entretanto, em humanos tem sido descrito casos contundentes de gota e pseudogota em
situações nas quais poucos polimorfonucleares estavam presentes. Isto chama a atenção para
o fato de que, talvez outras células, além dos PMNs, podem estar envolvidas no processo. Aliás,
a fagocitose de cristais de urato por plaquetas tem sido identificada embora não se saiba com
que magnitude isto contribui para com a totalidade do processo inflamatório.
A morte celular ocorre em 10 a 15 minutos após a fusão da fagossomo contendo o cristal
com os lisossomos.
As enzimas liberadas pelo neutrófilo têm atividade máxima em pH neutro ou ácido e são
capazes de digerir componentes do tecido conjuntivo. Além do extravazamento de enzimas
existe liberação de radicais de oxigênio livre os quais também são dotados de alto poder
destrutivo.
De maneira geral, todos os cristais parecem agir da mesma maneira, com diferenças
mais de ordem quantitativa do que qualitativa. A lise das membranas pelo cristal de monourato
de sódio é aumentada pela presença de andrógenos e reduzida pela incorporação de estrógenos
como o 17 estradiol. Esta interferência hormonal talvez ajude a explicar a predileção da artrite
gotosa pelo sexo masculino.
A ativação do complemento tem papel de destaque na inflamação produzida em casos
de artrite por cristal. Os cristais sozinhos são capazes de ativar tanto a via clássica quanto a via
alternativa do complemento. Já os cristais ligados à imunoglobulina ativam o complemento via
287
clássica, por ligação com as suas porções Fc. Além disto, existem evidências de ativação do fator
de Hageman gerando calicreína e cininas.
Quanto aos padrões articulares, de uma maneira geral, aquilo que é causado pelo
depósito de cristais se repete, independente do tipo de cristal em questão. Este pode tomar
dois aspectos básicos, um de artrite aguda autolimitada e outro de depósito crônico com
tendências mais destrutivas. A gota tende a preferir as articulações localizadas de maneira
centrífuga e a doença por depósito de pirofosfato de cálcio tende a se situar mais
centripetamente.
Depósitos de urato, de oxalato e de hidroxiapatita acontecem de maneira sistêmica. Já
o depósito de pirofosfato de cálcio ocorre exclusivamente em articulações. As características
principais, assim como detalhes de aspectos clínicos serão fornecidos ao se estudar cada uma
das doenças por cristal.
GOTA
EPIDEMIOLOGIA - A concentração normal do ácido úrico varia com a idade e com o sexo.
Crianças de ambos os sexos têm uma concentração de urato entre 3 a 4 mg/ 100 ml. Com a
adolescência, o ácido úrico sérico nos indivíduos do sexo masculino aumenta de 1 a 2 mg/ 100
ml, o que é mantido durante toda a vida. Nas mulheres este aumento só vai acontecer quando
sobrevém a menopausa. Isto se deve a ação dos hormônios estrogênicos que promovem uma
excreção renal aumentada do ácido úrico.
Considera-se que um indivíduo adulto tem ácido úrico normal quando o mesmo está
abaixo de 7 mg/100 ml. O nível de ácido úrico sérico de uma pessoa se correlaciona com vários
elementos tais como; creatinina sérica, peso corporal e altura (e portanto, com superfície
corporal), pressão arterial, ingesta de álcool, fatores raciais, etc. Uma observação curiosa é a da
ocorrência de níveis de uratos mais elevados em indivíduos de grande inteligência, capacidade
de liderança, com bom humor, dados aos prazeres da vida e, também, de um nível sócio
econômico alto. (Daí a gota ter recebido a denominação de doença dos reis).
Um estudo americano mostra que hiperuricemia é um achado frequente, presente em
2 a 18% daquela população. No entanto, nesta mesma população, só 0,13 a 0,37 % tinham gota
verdadeira. A ocorrência ou não de clínica deve-se não só ao grau de hiperuricemia, mas,
também, ao tempo pelo qual ela se mantém.
Pelo que foi exposto pode se depreender que gota é uma doença de homens adultos,
raramente afetando mulher e, mais raramente ainda, crianças pré-puberais. É incomum antes
da 3ª década e tem seu pico de incidência em torno dos 50 anos.
288
Hiperuricemia assintomática - É o estágio no qual o ácido úrico está elevado, mas ainda não
apareceram os fenômenos articulares, tofos ou cálculos urinários. Nos homens com
hiperuricemia, esta começa na puberdade e termina quando o indivíduo tem o primeiro ataque
de artrite ou litíase urinária. A tendência para o desenvolvimento da artrite gotosa, como já foi
mencionado, depende da magnitude da elevação do ácido úrico e do tempo de sua persistência.
A tendência para aparecimento da urolitíase depende do grau de excreção do ácido úrico. Em
média, um ataque de gota aparece após 20 a 30 anos de hiperuricemia mantida e, em 10 a 40%
dos casos existe uma história prévia de cálculo urinário
Artrite gotosa aguda - A maneira mais típica da gota se manifestar é através de uma crise de
artrite aguda, inicialmente monoarticular, extremamente dolorosa. Em 50% dos casos o
primeiro ataque ocorre na 1ªmetatarsofalangiana (podagra). Outras articulações também
podem ser o local do ataque inicial, tais como, tornozelos, joelhos, punhos, dedos e cotovelos.
Como se vê, as articulações preferidas são as mais distais (mais frias), principalmente as de
membros inferiores. Em casos raros a doença pode se manifestar como poliarticular.
O processo inflamatório é, em geral, intenso simulando trauma ou um processo
piogênico. Na maioria das vezes ocorre sem sinais premonitórios. Tipicamente, estes ataques
ocorrem à noite. O indivíduo vai deitar-se bem e acorda de madrugada com uma dor
insuportável, no hállux, a qual pode se acompanhar de calafrios e febre. A dor é tão intensa que
a vítima não suporta nem o peso das cobertas sobre a articulação afetada.
Estes ataques podem ser precedidos por eventos precipitantes tais como trauma local,
ingestão de álcool e certas drogas, excesso alimentar, cirurgias ou outras situações agudas, uso
de tratamento com RX ou com proteínas estranhas, hemorragias etc.
Os ataques mais precoces desaparecem em 3 a 10 dias, mesmo sem tratamento. Após
a melhora, a pele sobre a articulação afetada descama e o indivíduo entra em um período
totalmente livre de sintomas até o próximo ataque. Esta acalmia pode durar de meses a anos,
mas que na grande maioria dos casos, o ataque se repete dentro de seis meses a dois anos.
Alguns indivíduos nunca têm um segundo ataque.
À medida que a doença evolui, os ataques tendem a se repetir cada vez mais
precocemente, a serem mais prolongados e a envolver um número crescente de articulações. A
evolução natural é para uma doença poliarticular e com ataques tão prolongados que a
articulação nunca fica totalmente livre de sintomas (fase de gota tofácea crônica).
A preferência marcante da gota pelas articulações periféricas pode estar relacionada,
pelo menos parcialmente, com as suas temperaturas que são mais baixas. Isto acontece porque
a solubilidade do cristal de ácido é diretamente proporcional à temperatura. Por exemplo: a
37°C o limite de solubilidade do ácido úrico é 6,5 mg%. Se a temperatura baixar para 30 °C, ele
se precipita em concentração de 4,5 mg%. Ora, a temperatura intra-articular de um joelho é de
33° C e a de um tornozelo, de 29° C...
Outra observação interessante é a de que a difusão da água na membrana sinovial é
mais rápida do que a do ácido úrico. Isto promove transitoriamente concentrações altas do
cristal, o que favorece a sua precipitação. A articulação metatarsofalangiana, que está sujeita a
microtraumas durante o seu uso, está frequentemente edemaciada e, este líquido dilui o ácido
úrico nela contido. Quando o indivíduo repousa, a água é reabsorvida mais rapidamente que o
ácido úrico, e a alta concentração do cristal causa um ataque agudo de artrite. Isto explica
porque muitas das crises agudas de gota acontecem de madrugada.
289
A B
C D
FIGURA 24.2-GOTA-(A) Artrite de joelho (B) Artrite de 1ª tarsometatarsiana (podagra); (C)
Bursite pré-patelar; (D)- Bursite olecraniana.
Gota intercrítica - Corresponde aos intervalos entre as crises agudas de gota, nas quais os
pacientes não têm sintomas. Desaparecem à medida que o processo evolui para a fase crônica.
O diagnóstico de gota nesta situação é difícil e se baseia da história passada de artrite. Aspiração
do líquido sinovial, nesta circunstância, pode demonstrar o achado de cristais de monourato de
sódio extracelular (o que também aparece em casos de insuficiência renal crônica sem gota).
Gota tofácea crônica - Se o paciente não é tratado e a taxa de produção de ácido úrico excede
a de excreção, obviamente o pool de ácido úrico aumenta. Cristais se depositam em cartilagem,
membranas sinoviais, tendões e em tecidos moles, formando nodulações indolores chamadas
tofos. O local mais clássico, embora não o mais comum, de aparecimento destes tofos é na hélice
290
e na ante-hélice da cartilagem auricular. Outros locais onde são encontrados são: sobre tendões
(principalmente o de Aquiles), superfície ulnar do antebraço, formando dilatações saculares na
bursa olecraniana e outros pontos de pressão. Qualquer articulação pode ser afetada (até
mesmo as da coluna). As preferidas são as de membros inferiores.
Os tofos, se muito proeminentes, podem afetar a mobilidade da articulação
contribuindo para a perda de função da mesma. Às vezes, pode ser difícil a diferenciação entre
tofos e nódulos reumatoides, principalmente porque a forma poliarticular da gota pode simular
a artrite reumatoide. A histopatologia de um tofo mostra um granuloma de corpo estranho
circundando um centro de cristais de urato. O processo inflamatório é do tipo mononuclear,
com células gigantes. A cápsula fibrosa costuma ser bem proeminente.
microscópio com luz polarizada. Nesta situação pode ocorrer infecção secundária. Estas
nodulações só desaparecem se a hiperuricemia for tratada. Não existe involução espontânea.
Tanto os fatores sistêmicos (p.ex, hiperuricemia) quanto os locais (principalmente de
trauma crônico) são importantes para a determinação da formação e localização do tofo, mas
estes depósitos podem ser encontrados em órgãos internos, como por exemplo, em miocárdio,
válvula mitral, em sistema de condução cardíaco, tecidos do olho e laringe.
É interessante notar que, à medida que a doença se torna crônica e tofácea, os ataques
articulares agudos são mais raros e mais suaves, podendo vir a desaparecer totalmente.
B C
A
FIGURA 24.5 – (A) Tofo gotoso drenando material semelhante à “pasta de dente” rico em
cristais como os da figura (B)- Cristal de ácido úrico (c)- tofo- aspecto macroscópico
Nefropatia - Pacientes com gota podem manifestar envolvimento renal sob 2 formas: a litíase
urinária e a doença parenquimatosa. Urolitíase ocorre duas vezes mais comumente em
pacientes com gota secundária do que primária. A formação de cálculos é paralela ao grau de
acidez da urina, à concentração de ácido úrico no sangue e, naturalmente, à sua concentração
urinária. Uma excreção de 300 mg/dia de ácido úrico tem uma prevalência de cálculos de 11%;
uma excreção de 1.100 mg/dia de ácido úrico urinário aumenta esta mesma prevalência para
50%. Cálculos de ácido úrico são normalmente radioluscentes, pequenos e arredondados. No
entanto, eles podem servir de núcleo para a deposição de outro tipo de cristal como p. ex, os
contendo cálcio, o que acaba por levar à formação de cálculos radiopacos.
Aumentos bruscos no nível do ácido úrico, como os que são vistos em pacientes com
leucemia e linfomas submetidos à quimioterapia ou radioterapia, pode ocasionar um depósito
maciço deste cristal em túbulos causando oligúria e insuficiência renal. Mais raramente esta
situação é encontrada em pacientes com gota e acentuada produção de purina, após exercício
extenuante em indivíduos sem condicionamento físico e após crises epilépticas. Estas situações
além de aumentarem a produção de ácido úrico estão associadas com acidose, o que reduz a
solubilidade do ácido úrico. O uso do alopurinol e de hidratação adequada pode prevenir isto,
principalmente nos casos previsíveis, como os associados com quimioterapia e radioterapia.
É bom lembrar, também, que contrastes de RX têm um efeito uricosúrico substancial,
podendo precipitar a formação de cálculos. Uma boa hidratação ajuda a prevenir este efeito
indesejável.
Na doença parenquimatosa, ambos os rins são pequenos e igualmente afetados. A
cortical fica reduzida e cicatrizes podem ser visualizadas através da cápsula. Exame histológico
mostra, na doença parenquimatosa, cristais de urato de sódio localizados em interstício de
medula, papilas e pirâmides. Como nos tofos, eles estão circundados por um infiltrado de células
gigantes. Alterações de nefrosclerose e de doença hipertensiva podem ser achadas. Uma
292
DOENÇAS ASSOCIADAS - Existe um grande número de situações associadas com gota. São elas:
Hipertensão - Está presente em torno de um quarto à metade dos pacientes com gota clássica.
A incidência de hipertensão severa ou moderada não parece estar relacionada com o tempo de
duração da gota, mas a incidência de hipertensão moderada é maior nos pacientes com gota de
início na 2ª década. Hipertensão moderada é, também, mais comum nos indivíduos com
obesidade do que nos sem. O uso de diuréticos retentores de ácido úrico para tratamento de
hipertensão pode ser um agravante da hiperuricemia destes indivíduos.
Obesidade- É uma associação reconhecida de longa data. Fica fácil compreender esta associação
quando se reconhece que a uricemia é proporcional à superfície corporal.
Diabetes mellitus - A associação de diabetes com hiperuricemia (2-50%) é bem mais comum do
que com a gota clínica (0.1- 9%).Quando se estuda a população com gota, encontra-se uma
tolerância anormal à glicose em 7-74%. Talvez a obesidade seja um elemento predisponente
comum às duas situações.
Outras- Necrose óssea, principalmente em cabeça de fêmur, tem sido encontrada com maior
frequência em pacientes com gota. Em alguns casos esta associação tem sido atribuída a um
alcoolismo concomitante, n’outras à anormalidades do metabolismo das lipoproteinas
(hiperlipoproteinemias tipo 2 e 4) causando embolismo gorduroso com necrose óssea.
Associações negativas - Parece existir uma associação negativa entre gota e outras doenças
reumáticas tais como artrite reumatoide, lúpus e amiloidose. Talvez isto possa ser o reflexo da
disparidade quanto ao sexo e idade de população afetada em cada uma dessas doenças.
Excreção reduzida - A grande maioria dos pacientes com hiperuricemia ou gota (em torno de
90% mostram uma deficiência na excreção do ácido úrico. A excreção de uratos depende da
filtração glomerular, e de reabsorção e posterior secreção do ácido úrico pelos túbulos. O ácido
úrico é completamente filtrado no glomérulo e reabsorvido em túbulo proximal (reabsorção
pré-secretória). A secreção ocorre em um segmento posterior do túbulo proximal com
consequente reabsorção parcial em porção distal do túbulo proximal (reabsorção pós-
secretória). Alguma reabsorção existe também em ramo ascendente da alça de Henle e tubos
coletores.
Teoricamente uma excreção alterada de ácido úrico pode ocorrer por diminuição na
filtração glomerular, um aumento na reabsorção e por diminuição na secreção tubular.
Diminuição da filtração do ácido úrico é o mecanismo responsável pela hiperuricemia da
insuficiência renal; gota clínica é rara nesta situação. Na doença policística e na nefropatia por
chumbo existe diminuição na secreção do ácido úrico. O uso de diuréticos é uma causa
importante de hiperuricemia secundária de origem renal. A depleção de volume induzida pelo
diurético leva um aumento na reabsorção do ácido úrico pelo túbulo, assim como, à uma
diminuição na sua filtração glomerular. Existe, também, uma diminuição na secreção tubular.
Outras drogas que levam a hiperuricemia por mecanismos renais são: aspirina em dose
baixa, pirazinamida, ácido nicotínico, etambutol e etanol.
Depleção de volume também está implicada na gênese da hiperuricemia em pacientes
com insuficiência suprarrenal e com diabetes insipidus nefrogênica. Outro mecanismo de
retenção renal de ácido úrico é o de inibição competitiva da secreção de ácido úrico por ácidos
orgânicos (que competem com o ácido úrico porque se utilizam do mesmo mecanismo para
secreção). São exemplos deste tipo de situação: cetose alcoólica, cetoacidose diabética, acidose
láctica, jejum prolongado etc. Hiperparatireoidismo, pseudohipoparatireoidismo e
hipotireoidismo causam hiperuricemia de origem renal embora o mecanismo exato não esteja
claro.
Apesar de se conhecerem todas as causas de hipoexcreção renal, acima expostas, na
grande maioria dos pacientes, não se consegue implicar um único mecanismo ou defeito
genético na sua gênese.
Patogênese da artrite gotosa aguda - O que leva um indivíduo a desenvolver artrite gotosa
depois de, em média, 30 anos de hiperuricemia ainda não está bem conhecido. Acredita-se que
295
suporta muito mais quilos de peso/cm2 do que qualquer outra articulação do corpo. O trauma
ajudaria os microtofos a "desfolhar" alguns cristais para dentro da articulação.
Uma tendência para a precipitação de cristais em temperaturas mais baixas explica o
aparecimento das crises agudas à noite (pelo resfriamento da articulação com o repouso) e a
tendência da doença para afetar as porções mais periféricas tais como juntas dos pés e lóbulos
de orelha. O calor gerado pelo processo inflamatório pode ajudar no aumento de solubilidade
do cristal e na autolimitação do processo. Mudanças bruscas dos níveis séricos de urato
precedem a crise aguda de gota. Isto faz com que elas apareçam precocemente no curso do
tratamento com drogas hipouricemiantes ou mesmo após o uso de outras drogas que modificam
o nível sérico dos uratos tais como: tiazídicos, fursemida e ácido etacrínico.
Tratamento da crise aguda - A crise aguda deve ser tratada com agentes anti-nflamatórios tais
como colchicina e AINHs. Tratamento com colchicina é feito com a administração de 0,5 mgde
8/8h. É um tratamento efetivo, desde que instituído precocemente. 75% dos pacientes
melhoram em 12 horas, se o tratamento for iniciado em até 12 horas após o início do ataque
agudo. Se for dado nas primeiras horas, a resposta é ainda melhor. Entretanto, muitos pacientes
são incapazes de toleraromedicamento que pode causar efeitos colaterais gastrintestinais (dor
em cólica, diarréia, náusea e vômito)
AINHs são efetivos no controle da doença ativa. Estas drogas são, em geral, utilizadas
dentro de sua dosagem máxima e somente pelo período em que perduram os sintomas. Para
melhorar a resposta terapêutica, o paciente deve ser instruído a utilizar a droga assim que sinta
os pródromos da doença.
297
FIGURA 24.7- Achados de imagem em paciente com gota. Erosões com borda
“overhanging”ou borda parcialmente íntegra. Depósito de cálcio sobre os tofos.
Profilaxia do ataque agudo - Uma vez resolvido o episódio agudo, uma série de medidas podem
ser tomadas para prevenir a recorrência do mesmo:
redução de peso do paciente obeso;
evitar fatores precipitantes tais como consumo de álcool e dieta rica em purinas;
uso profilático de colchicina ou AINHs diário;
uso de medicação hipouricemiante.
298
Quanto mais baixo o ácido úrico sérico mais facilmente os tofos são reabsorvidos.
As drogas uricosúricas agem, em geral, por uma interferência com a reabsorção tubular
do ácido úrico filtrado. As principais drogas são a narcaricina e o probenecide. Estas drogas são
relativamente efetivas e a maioria das falhas resulta da pobre aderência ao tratamento por parte
do paciente, uso concomitante de aspirina e função renal prejudicada. Aspirina, em qualquer
dose, bloqueia o efeito uricosúrico do probenecide e da sulfinpirazolona. Estes dois agentes
começam a perder sua efetividade quando a depuração de creatinina cai abaixo de 80 ml/min e
são totalmente ineficazes abaixo de 30 ml/min.
O início gradual da terapêutica uricosúrica é utilizado na tentativa de se evitar a
formação de cálculos renais. Outras medidas preventivas neste sentido são manter uma
hidratação adequada e a urina alcalinizada através do uso de bicarbonato ou de acetazolamida.
O candidato ideal para o uso de uricosúricos está abaixo dos 60 anos, com função renal normal,
sem história de cálculos renais e com excreção renal de ácido úrico abaixo de 700 mg/dia.
O lesinurade é um novo medicamento uricosurico bastante potente mas ainda não
disponível no Barsil. Outras drogas com efeitos uricosúricos são os inibidores do receptor da
enzima de conversão de angiotensina (losartam) e o fenofibrato (droga usada para tratamento
de dislipidemias). Estas não são usadas primáriamenre para tratar gota, mas podem ser úteis e
auxiliar a diminuir o ácido úrico quando usadas para tratar comorbidades como hipertensão e
hipertrigliceridemia.
A hiperuricemia também pode ser controlada pelo uso de alopurinol que é um inibidor
da síntese de ácido úrico. O alopurinol inibe a enzima xantina oxidase que catalisa a oxidação de
hipoxantina para xantina e de xantina para ácido úrico. O alopurinol tem uma vida média só de
2-3 horas mas é metabolizado para oxipurinol, que também é inibidor da xantina oxidase, o qual,
299
por sua vez, tem meia vida de 18-30 horas. Na maioria dos pacientes 300 mg é uma dose efetiva,
a qual pode ser administrada em uma única dose/dia graças à meia vida prolongada do seu
metabólito. Uma vez que o oxipurinol é excretado pelo rim, a toxicidade da droga aumenta em
pacientes com insuficiência renal, devendo ser reduzida pela metade em pacientes com
disfunção significante deste órgão. Efeitos colaterais do alopurinol incluem: náuseas, necrólise
tóxica da epiderme, alopecia, supressão de medula óssea, hepatite, icterícia e vasculite. A
incidência de efeitos colaterais chega a ser em torno de 20%, mas só 5% dos pacientes chegam
a necessitar que a droga seja suspensa. A síndrome de hipersensibilidade ao alopurinol que é
uma reação imunológica à droga e que se caracteriza por febre, eosinofilia, leucocitose,
alterações em função renal e uma grande variedade de rashes cutâneos (eritema multiforme,
rashes máculo-papulares, epidermólise bolhosa tóxica e rash exfoliativo), leva à morte em 27,5%
dos casos. Pacientes com insuficiência renal ou em uso de diuréticos parecem estar predispostos
à ocorrência destes efeitos colaterais. A introdução gradativa deste medicamento, em doses a
partir de 100mg/dia com aumento subsequente parece ajudar a evitar a hipersensibilidade.
É importante ressaltar algumas interações de drogas envolvendo o alopurinol. Ele
prolonga a meia vida da mercaptopurina e azatioprina e aumenta a toxicidade da ciclofosfamida.
Embora a frequência de efeitos colaterais seja mais ou menos similar para pacientes usando
drogas uricosúricas ou alopurinol, as reações tóxicas à este último costumam ser mais graves.
Por isso quando se torna necessário baixar o nível sérico do ácido úrico deve se dar preferência
aos uricosúricos. Quando o paciente está excretando grandes quantidades de ácido úrico, ou
seja, tem o risco de desenvolver cálculos, então a preferência é dada ao alopurinol. Indicações
para o uso de alopurinol, portanto, incluem: aumento de excreção de ácido úrico urinário;
nefrolitíase por ácido úrico; prejuízo de função renal com clearence abaixo de 80 ml; gota
tofácea; gota não controlada pelo uso de uricosúricos ou intolerância ao uso de uricosúricos.
Alopurinol e drogas uricosúricas podem ser usadas simultaneamente em casos
especiais. Esta combinação não exige alteração na dose de qualquer dos medicamentos e os
efeitos terapêuticos se somam.
Uma vez que a artrite gotosa aguda pode ocorrer toda vez que existem flutuações nos
níveis de ácido úrico, o início da terapêutica hipouricemiante pode precipitar crises de gota
aguda. Por esta razão é prudente começar com colchicina profilática antes do início da
terapêutica hipouricemiante e continuar até que o ácido úrico sérico esteja em níveis normais
e, em pacientes tofáceos, até que aos tofos estejam resolvidos. Existe quem recomende um
período de espera de 15 a 21 dias entre a resolução de uma crise aguda e a instituição do
tratamento hipouricemiante.
Existem outras medicações para tratamento da gota,: a uricase e febuxostate. A
primeira é uma enzima que transforma ácido úrico (que é um composto insolúvel) em alantoína
(que é um composto solúvel) e que existe normalmente em mamíferos menos desenvolvidos
que o homem. O febuxostate é outro inibidor da síntese de ácido úrico (também inibe a xantina
oxidase), já existe para ser utilizado em nosso meio, todavia seu custo ainda é alto.
Medidas dietéticas - Muita atenção tem sido prestada à dieta dos pacientes com gota. Restrição
do uso de álcool é, com certeza, benéfica, uma vez que, na situação aguda, a hiperlactacidemia
aumenta o ácido úrico por interferência com excreção renal. Cronicamente, o álcool leva à um
aumento na produção das purinas. O vinho e a cerveja parecem ter um teor mais alto de purina
que os outros tipos de bebida. Os demais alimentos podem ser classificados em:
com alto teor em purina: frutos do mar, vísceras de animais (fígado, coração, rins, etc...),
carne de aves como faisão, peru e pombos , extratos de carne, fermento etc...
com um moderado teor de purina: aspargos, carne de gado, de coelho, galinha e de
porco, caldos de carne, presunto, lentilhas, feijão, ervilhas, espinafre, cogumelos etc...
300
com teor insignificante de purina: café, sucos, chocolate, chá, margarina e manteiga,
pão, cereais e seus produtos, queijos, ovos, frutas de todos os tipos, leite e seus
produtos, vegetais (exceto os constantes na lista anterior) e castanhas.
Restrição dietética rígida de purinas é importante para os pacientes com gota grave,
tofácea e/ou com insuficiência renal, mas a maioria dos pacientes gotosos não se beneficiam
de muito rigor na dieta. Uma dieta com redução moderada no teor de purina reduz o ácido úrico
sérico em até 1 mg%. A proibição do uso de álcool parece ser uma medida mais razoável, uma
vez que esta precaução poderá diminuir a concentração de ácido úrico sérico em até 3 mg%. Na
prática, no entanto, é algo muito difícil de ser conseguido. É natural que, restrições dietéticas
impostas por doenças associadas tais como diabetes, hipertensão e obesidade, devam obedecer
aos padrões próprios do tratamento destas doenças.
Deve-se desconfiar da existência de uma doença subjacente toda vez que a DDPCa
aparecer em um indivíduo com menos que 50 anos. Já no indivíduo mais idoso esta
concomitância é rara e, por isso, não vale a pena ficar procurando uma eventual doença
associada escondida. Existem, também, formas hereditárias da DDPCa, cujo mecanismo
permanece desconhecido. Outra situação que é encontrada comumente com a DDPCa é a
osteoartrite. Se isto é causa, consequencia ou simplesmente coincidência de doenças que
incidem numa mesma faixa etária, é questão de discussão.
O local inicial de depósito do cristal de pirofosfato de Ca é, provavelmente, a cartilagem
articular. Articulações contendo fibrocartilagem são as preferidas. Os ninhos iniciais aparecem
302
CLÍNICA - As formas clínicas da doença por depósito de pirofosfato de cálcio podem ser
classificadas em :
a) pseudo-gota;
b) pseudo-artrite reumatóide;
c) pseudo-osteoartrite com ataques agudos superimpostos;
d) pseudo-osteoartrite sem ataques agudos;
e) formas pseudo-tabéticas;
f) formas assintomáticas.
A forma de pseudo-gota acomete predominantemente homens e os ataques podem se
seguir a situações de estresse agudo como, por exemplo, uma cirurgia, trauma ou doença grave.
Cursa com ataques agudos ou subagudos, autolimitados em 1 a 28 dias, que podem ser tão
intensos quanto os de gota. Entre as crises o paciente é assintomático. Na crise, ou uma única
articulação está afetada (e, na metade dos casos, é o joelho) ou a inflamação pode ser mais
patente numa articulação-mãe, espalhando-se, a partir daí, para as articulações-filhas. Em 10%
dos casos existe envolvimento da primeira carpometacarpiana como na podagra. As crises não
deixam deformidade ou apenas deformidades leves. Pode ocorrer febrícula e aparecer
leucocitose. Muitos pacientes apresentam pequenas crises subclínicas (chamadas de petite)
entre as crises graves, as quais se traduzem por uma mera rigidez transitória e dolorimento
articular. Esta forma de pseudogota pode ter, em torno de 20% dos casos, hiperuricemia. Em
5% dos casos, existe gota verdadeira superimposta, a qual provavelmente é uma doença
subjacente, que está predispondo ao depósito do pirofosfato de cálcio.
Na forma de pseudoartrite reumatoide existe envolvimento de múltiplas articulações
com alguma rigidez matinal. As crises de artrite vão de um até vários meses. Em torno de 10%
destes pacientes têm látex positivo em baixos títulos, o que pode auxiliar a promover confusão
no diagnóstico. Podem existir deformidades as quais, diferentemente da artrite reumatoide
legítima são, em geral, por contraturas em flexão. Os punhos, metacarpofalangianas, cotovelos,
ombros e joelhos estão envolvidos de maneira mais assimétrica do que na AR. É uma forma mais
rara.
303
DIAGNÓSTICO - O diagnóstico pode ser feito por análise do líquido sinovial ou por estudos
radiológicos. O líquido sinovial, nestes casos, é do tipo inflamatório com glicose normal. A
presença do cristal na análise ao microscópio com luz polarizada confirma o diagnóstico. Os
cristais de pirofosfato são romboédricos e com birrefringência fracamente positiva. Estes cristais
são encontrados intracelularmente ou formando grumos. A análise radiológica pode ajudar no
diagnóstico com 2 tipos de achados: (a) o de condrocalcinose; (b)-achados semelhantes aos de
osteoartrite ou de destruição pseudo-tabética. A condrocalcinose é visualizada como
calcificações formando linhas delicadas, porém bem definidas, que ficam paralelas à superfície
do osso subcondral quando o depósito acontece em cartilagem hialina. Se o depósito é em
fibrocartilagem o aspecto é mais granular. Os locais onde são encontrados com maior
frequência são: ligamento triangular do punho, meniscos do joelho e sínfise púbica. Portanto,
na suspeita da doença por depósito de pirofosfato de cálcio, o conjunto de radiografias a ser
pedido (e que tem a maior chance de mostrar condrocalcinose) é o de punhos, joelhos e sínfise
púbica.
A B
FIGURA 24.8 - Achados radiológicos de doença por depósito de pirofosfato de cálcio: (A)
condrocalcinose de menisco; (b) osteófitos “ganchosos” nas metacarpofalangianas.
Podem aparecer também calcificações em disco intervertebral, mas estas, por serem
muito tênues, são difíceis de serem demonstradas pelas técnicas radiológicas comuns. Quando
estas calcificações aparecem com muita facilidade, ou seja, são bastante densas, deve-se
levantar a suspeita de ocronose. Calcificações também são vistas em sinóvia, cápsula articular,
304
inserção de tendões e bursas. Se a calcificação acontece em tendões, tende a ser mais linear e
mais extensa do que as causadas por hidroxiapatita.
No segundo grupo de manifestação radiológica estão os achados semelhantes aos de
osteoartrite e de pseudotabes. Os achados semelhantes aos de osteoartrite apenas diferem dos
de osteoartrite primária nos seguintes pontos: (a)- envolvimento de ossos do carpo, cotovelos
e articulações metacarpofalangianas que são locais raramente atingidos pela osteoartrite
primária; (b)- uma ocorrência muito grande de cistos subcondrais, de osteoartrite patelofemoral
e fraturas do osso trabecular. As fraturas são consequências dor enrijecimento da cartilagem
pelo mineral; (c)- aparecimento de uns osteófitos peculiares, em gancho, em os-sos
metacarpianos. Além disto, é comum que os achados sejam graves, chegando a simular os de
juntas neuropáticas (pseudotabes).
TRATAMENTO - Os ataques agudos são tratados com aspiração do líquido sinovial e corticoides
intra-articulares. A simples retirada dos cristais pela aspiração do líquido sinovial é benéfica (por
remoção da glicoproteina liberada pelos neutrófilos que, por ser quimiotática para outros
neutrófilos, faz a amplificação do processo inflamatório). Pode-se utilizar anti-inflamatórios não
hormonais e colchicina, nos mesmos moldes da gota. Pacientes com alterações pseudo-
tabéticas podem se beneficiar de prótese articular.
Hidroxiapatita de cálcio é o mineral encontrado nos ossos e nos dentes. Este material se
acumula em tecidos danificados (calcificação distrófica) e, em tecidos moles, em situações de
hipercalcemia, hiperparatireoidismo e insuficiência renal, quando o produto cálcio x fósforo está
aumentado (calcificação chamada de metastática). Além disto, este cristal pode se depositar em
tendões e bursas em locais submetidos a estresse mecânico repetitivo. Este cristal é achado em
praticamente todas as articulações afetas por osteoartrite e acredita-se que ele seja oriundo do
osso exposto ou de tecido sinovial metaplásico.
Nas articulações encontramos, basicamente, 2 tipos de comprometimento: um agudo e
outro crônico. O comprometimento do tipo agudo, geralmente acontece em locais já afetados
por osteoartrite, quando este cristal pode se desprender das superfícies ósseas expostas (por
ex: nos nódulos de Heberden que passam a ser nódulos "quentes"). O outro tipo, crônico e
destrutivo, cursa com depósitos maciços em tecidos articulares e periarticulares. É esta
deposição nas estruturas periarticulares que causa uma frouxidão nos elementos de suporte,
permitindo a instabilidade e a deformidade. A forma crônica é particularmente comum em
joelhos e ombros. No ombro pode tomar o aspecto de uma artrite bastante destrutiva associada
à destruição do manguito rodador e que recebe o nome especial de ombro de Milwaukee.
O diagnóstico é sugerido por achados radiológicos de calcificação intra e/ou
periarticular, com ou sem erosões, associados a achados de osteoartrite. Quando acontecem
em tecidos moles, estas calcificações tendem a ser mais densas e mais globulares que as de
pirofosfato de cálcio. O líquido sinovial mostra uma contagem variável de leucócitos (menos do
que 1.000/mm3 nos casos mais indolentes até contagens características de um líquido
inflamatório nos casos mais agudos). Nos casos de artropatia destrutiva o líquido pode ser
hemorrágico.
O diagnóstico definitivo depende da identificação do cristal em líquido sinovial o qual é
visto à microscopia ótica, em grumos fagocitados por células mononucleares Entretanto, a
identificação completa só pode ser feita pela microscopia eletrônica ou através de difração por
305
RX. Quando existem depósitos de hidroxiapatita muito extensos é interessante analisar níveis
de cálcio e fósforo, a procura de um distúrbio metabólico associado.
O tratamento é inespecífico. Os ataques de sinovite aguda tendem a ser autolimitados
e respondem a uso de AINHs e/ou infiltração local de glicocorticoides. Em pacientes com doença
crônica, o tratamento é mais difícil.
Aumento da produção de ácido oxálico pode ser vistos em oxalose primária que é uma
doença metabólica congênita ou, mais comumente, em casos secundários. São causas de
oxalose secundárias:
• deficiência na excreção:- como é o caso de pacientes com insuficiência renal crônica
recebendo suplementos de ácido ascórbico. Neste caso, o ácido ascórbico se metaboliza em
oxalato o qual é removido de maneira incompleta pela diálise.
• por um aumento na absorção, o que é visto em pacientes com ressecção intestinal ou
em casos de doença inflamatória do intestino,
• dieta muito rica em oxalatos. Alimentos ricos em oxalatos são o ruibarbo e aqueles
contendo ácido ascórbico e etilenoglicol.
Estes cristais se depositam em vários órgãos e tecidos e também nas articulações. Nas
articulações têm sido encontrados na cartilagem, na sinóvia e em tecidos periarticulares, de
onde podem se desprender e causar sinovite aguda. É típica a ocorrência de artrite aguda
simétrica de articulações interfalangianas e metacarpofalangianas com ou sem tenossinovite,
associada a calcificação vascular e a depósitos miliares nos dedos. Outros pacientes podem ter
artrite aguda ou crônica de grandes articulações. Análise do líquido sinovial demonstra um
líquido do tipo não inflamatório com predominância de células do tipo mononuclear ou
polimorfonucleares. O cristal tem um formato bipiramidal e forte birrefringência positiva.
Tratamento é feito com AINHs, colchicina e corticoides intra-articulares.
A deposição em outros tecidos pode ser causa de miocardiopatia, bloqueios cardíacos,
calcificação em pele, calcificação vascular (o que pode resultar em tromboses graves), depósitos
em córnea e retina.
Referências:
Becker, MA, et al. Febuxostat, a novel nonpurine selective inhibitor of xanthine oxidase: a twenty-eight-day,
multicenter, phase II, randomized, double-blind, placebo-controlled, dose-response clinical trial examining safety
and efficacy in patients with gout. Arthritis Rheum 2005; 52:916-23.
Bomalaski, JS, et al. Phase I study of uricase fourmulated with polyethylene glycole (Uricase PEG 20) (abstract).
Arthritis Rheum 2002; 46:S141.
Edwards LN. Gout: clinical amd laboratory features. In Klipell JH, Crofford LJ, Stone JH, Weyand CM (eds). Primer on
the rheumatic diseases. Arthritis Foundation 2001, Atlanta, p.313-9.
Feher, MD, et al. Fenofibrate enhances urate reduction in men treated with allopurinol for hyperuricaemia and
gout. Rheumatology 2003; 42:321-5.
Mawson, AR et al. . Gout and vitamin A intoxication: is there a connection? Semin Arthritis Rheum 1991; 20:297-
304.
Wurzner G, et al. Comparative effects of losartan and irbesartan on serum uric acid in hypertensive patients with
hyperuricaemia and gout. J Hypertens 2001; 19:1855.
306
Artrite Séptica: invasão bacteriana no espaço da articulação
ARTRITE GONOCÓCICA
Esta é, sem dúvida, a forma mais comum de artrite séptica. Como já foi mencionado,
esta é uma doença que afeta predominantemente jovens (< de 40 anos) com uma tendência
para envolver mais as mulheres (4X mais do que em homens) porque nelas o local da infecção
primária passa despercebido não sendo tratado. Em adição à infecção genital, não se deve
esquecer que reto e orofaringe podem servir de focos primários para a disseminação deste
microorganismo e é importante que, em casos suspeitos, seja feita cultura de material destes
locais.
Um aspecto interessante é a tendência que a infecção genital tem para se disseminar,
na mulher, quando adquirida durante o período pós-menstrual ou durante a gravidez. A razão
para isto não é bem conhecida, mas acredita-se que tenha alguma coisa a ver com alterações de
pH das secreções vaginais. No quadro 25.1 encontram-se alguns fatores de risco para
disseminação da infecção gonocócica.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS - Sintomas gerais tais como febre, mal-estar, calafrios etc podem,
ou não, estar presentes. Classicamente, a artrite por gonococos tem uma fase inicial, na qual ela
se comporta como uma poliartrite migratória, para depois escolher uma articulação e nela se
fixar como uma monoartrite. Nesta fase de monoartrite as articulações preferidas são o joelho
e o punho, embora qualquer articulação (incluindo-se a temporo-mandibular) possa estar
envolvida. Tenossinovite é um achado comum e pode ser o aspecto dominante da clínica,
afetando comumente tendões das mãos, pés e o de Achiles. O líquido sinovial é do tipo séptico
só que, mesmo em circunstâncias ótimas, dá cultura positiva em menos da metade dos casos.
Lesões de pele costumam aparecer em 2/3 dos pacientes e poupam a face. Ordina-
riamente são do tipo máculo-papulares, mas podem tomar aspectos variados tais como bolhas
hemorrágicas, vesiculas, pústulas e áreas necróticas. Podem tomar aspecto de eritema nodoso,
vasculites ou eritema multiforme. Existe um tipo de lesão que é considerada quase
patognomônica da gonococcia generalizada (só a meningococcemia apresenta lesão
308
semelhante). Ela aparece como uma lesão vésico-pustular ou uma pápula hemorrágica sobre
uma base eritematosa. Esta forma de lesão tende a ser dolorida e a se distribuir nas partes distais
das extremidades. Nem sempre o paciente está ciente de sua presença, daí ser necessário um
exame sistemático da pele, uma vez que o seu achado é de grande ajuda para o diagnóstico.
Histologicamente falando, é uma forma de vasculite de pequenos vasos, do tipo
leucocitoclástica, envolvendo pele e subcutâneo. Bacterioscopia do material pode demonstrar
a presença do gonococo embora só muito raramente a cultura do material seja positiva.
Mais raramente um paciente pode ter lesões de pele sem envolvimento articular.
É claro que, se o paciente tem uma gonococcemia disseminada, podem aparecer sinais
de envolvimento de outros órgãos, sendo mais sérios os casos de endocardite, meningite e
miocardite. Envolvimento hepático (peri hepatite) resultante da disseminação pélvica da doença
ou da disseminação hematogênica (síndrome de Fitz-Hugh-Curtis) pode causar a presença de
atrito sobre a projeção do fígado e sinais de hepatite. Os sinais e sintomas mais comuns da
gonococcemia generalizada estão listados no quadro 25.2.
Baseados em alguns estudos clínicos tem se descrito duas formas (ou fases)
aparentemente distintas de artrite por gonococos:
1. - uma forma bacterêmica com febre, calafrios, poliartralgias ou poliartrites sem derrame
significativo, tenosinovites e hemocultura positiva;
2. outra forma de artrite séptica com monoartrite, geralmente com derrame avantajado, mas
com hemocultura negativa. Nesta fase a cultura do líquido sinovial pode vir a ser positiva.
Se estas duas formas são doenças diferentes ou fases de uma mesma doença é um
assunto a ser pensado, mas é verdadeira a observação de que nunca se obtém hemocultura e
cultura de líquido sinovial simultaneamente positivas.
DIAGNÓSTICO - O diagnóstico é feito pela clínica e pode ser confirmado pela análise do líquido
sinovial. Este mostra uma contagem celular alta (>100.000 leuc/mm3), com predomínio de
PMNs, glicose baixa e bacterioscopia positiva para diplococos gram negativos.
Como já foi observado anteriormente, o achado de cultura positiva para gonococos no
líquido sinovial é mais difícil. Se o paciente já está recebendo antibióticos e a situação está
parcialmente tratada até a contagem celular pode estar diminuída. Culturas dos locais de porta
de entrada devem ser realizadas (secreção uretral ou vaginal, de faringe ou de reto) além de
hemocultura.
O gonococo exige um meio rico em CO2, em umidade e com pH ótimo. Usa-se, em geral,
meio de Thayer-Martin ou ágar chocolate. Estudos sorológicos não conseguem distinguir uma
infecção recente de uma antiga.
A associação artrite-dermatite em alguém com sintomas genito-urinários exige que se
faça um diagnóstico diferencial da artrite gonocócica com artrite reativa. No quadro 24.3 estão
alguns dos principais aspectos diferenciais entre estas duas entidades.
309
A maioria dos pacientes com artrite séptica não gonocócica apresenta-se com sintomas
de início abrupto de edema, eritema e dor em uma articulação. As articulações mais afetadas
são as que sustentam peso, em membros inferiores. Destas, a mais comum é o joelho. Não é
habitual o aparecimento de artrite poliarticular, mas quando esta ocorre sugere uma infecção
estreptocócica. Febre é comum, embora possa ser de pequena monta ou até mesmo ausente.
O diagnóstico é feito pela análise do líquido sinovial e a identificação da bactéria
causadora pode ser feita, seja por cultura, seja por bacterioscopia. Toda vez que existe suspeita
de artrite séptica, mesmo que ela seja mínima, a articulação deve ser puncionada. Não existe
contraindicação para punção de uma articulação, embora se deva evitar punção através de uma
área de pele infectada. O líquido deve ser enviado imediatamente para o laboratório para
cultura ou, se isto não é possível, o material pode ser inoculado em meios de hemocultura. Isto
aumenta a chance de positividade, mas também, de falsos positivos oriundos de micro-
organismos contaminantes de pele. Metade destes pacientes têm hemoculturas positivas.
Outros exames de auxílio são: bacterioscopia, contagem de leucócitos e dosagem de glicose.
Valores de leucócitos acima de 50.000/mm3 com pelo menos 80% de Neutrófilos
polimorfonucleares (PMNs) e uma dosagem de glicose abaixo de 50% do valor da glicose
plasmática são altamente sugestivos de artrite
310
bacteriana. As culturas são positivas em pelo menos 90% dos casos de artrites não gonocócias
enquanto o gram é efetivo em apenas 50 % deles.
As radiografias são de pouco auxílio no diagnóstico inicial de artrite séptica, mas são
úteis para o acompanhamento evolutivo. Em uma semana pode-se visualizar osteoporose. Em
duas semanas, dependendo da virulência da bactéria em questão, pode-se ver diminuição do
espaço interarticular e erosões marginais. Uma osteomielite secundária pode causar periostite
e um aspecto em "comido de traça" a partir de duas semanas. A formação de gás intra-articular
sugere a presença de um organismo anaeróbico ou de Escherichia coli. A cintilografia pode ser
útil no diagnóstico, principalmente quando articulações profundas estão afetadas, as quais não
são acessíveis a um exame físico mais rigoroso, como é o caso do quadril. Existem 2 tipos de
radioisótopos usados para esta forma de cintilografia: o Tecnécio (fosfato de Tc) e Gálio (citrato
de Ga). O Gálio se concentra onde existe exudação de células inflamatórias e proteínas séricas.
Já o tecnécio está mais relacionado com o fluxo sanguíneo. Ambos são positivos em situações
em que existe inflamação, embora exista quem considere que a cintilografia pelo Gálio é mais
específica para os processos inflamatórios do tipo infeccioso. Sua grande colaboração advém do
fato de que não existe artrite séptica com cintilografia negativa. A cintilografia pode ser
particularmente útil nas fases iniciais da doença, quando o RX é negativo. A tomografia também
pode ser de valia na análise de articulações como quadril e articulações do esqueleto axial, e
seus achados são mais precoces dos que os de RX. A ressonância magnética é uma arma bastante
útil na determinação de envolvimento de tecidos moles e serve para demonstrar envolvimento
de articulações de acesso difícil como as sacro-ilíacas, por exemplo.
Dos germes que causam artrite séptica não gonocócica em adultos, os mais comuns são
os gram-positivos, principalmente o Staphylococcus aureus e o pneumococo.
Na criança com menos de dois anos de idade, os germes mais encontradiços são: H.
influenzae, S.Aureus e bacilos gram-negativos aeróbicos. Já, na criança mais velha e nos
adolescentes, o predomínio é de estafilococos e estreptococos hemolíticos.
Como esta é uma doença que tende a incidir em indivíduos imunodeprimidos, o tipo de
doença básica em questão, pode favorecer a ocorrência de infecção por um determinado
microorganismo. Assim, o diagnóstico de fundo pode ajudar a levantar a suspeita a respeito do
possível agente etiológico. A seguir, o quadro 25.4, com os agentes mais comumente
encontrados nas diferentes situações.
à infecção. Como já foi comentado, o uso de corticoide intrarticular pode servir de porta de
entrada para uma infecção, embora este acontecimento seja bastante raro, desde que a
assepsia seja adequada.
A terapêutica de uma artrite supurativa começa pela escolha do antibiótico mais
adequado para cada situação, o qual deve ser administrado via parenteral para garantir uma
concentração sinovial adequada. A escolha é baseada nos achados de bacterioscopia e mais
tarde confirmada por cultura e antibiograma. Em casos em que isto não é possível, deve-se levar
em conta a probabilidade de um determinado micro-organismo ser o agente causal naquela
dada situação. Não se deve fazer uso de antibióticos intra-articulares uma vez que isto, além
de desnecessário, pode trazer risco de sinovite química. O antibiótico inicial pode ser escolhido
empiricamente de acordo o micro-organismo mais comum no sítio que serve de origem para a
infecção. Esta opção deve ser analisada novamente após obtenção de resultados de cultura e
antibiograma. Estes medicamentos são mantidos por um período mínimo de seis semanas.
Além do uso de antibióticos, deve-se proceder a uma drenagem adequada da arti-
culação, com intuito de diminuir a pressão local e a ação das enzimas sobre a cartilagem. A
drenagem com agulha é tão efetiva quanto drenagem cirúrgica, e pode ser feita até 2 vezes por
dia, em casos em que o material purulento se acumula com muita rapidez. Se não for possível a
drenagem com agulha, como é o caso de articulações que são inacessíveis a esta técnica (quadril,
sacroilíaca e, talvez, o ombro) ou, em casos de um líquido sinovial muito viscoso, que forme
focos septados, ou ainda, em casos de persistência da sinovite por mais do que sete dias, deve-
se proceder à drenagem cirúrgica.
Todos concordam que nos casos de artrite séptica do quadril, a drenagem cirúrgica deve
ser pronta e eficiente. A drenagem com agulha desta articulação é de técnica difícil. Além disso,
existem outros fatores que influem na indicação cirúrgica. São eles:
1. o fato de que a metáfise do fêmur está dentro da articulação (isto acontece em um grau
menor com o ombro também). Na grande maioria dos ossos a inserção da cápsula articular
é junto com a epífise, formando assim uma barreira que impede que o material purulento se
espalhe para o restante do osso. Isto explica porque é raro que apareça osteomielite como
consequência de artrite séptica, a não ser em crianças pequenas, nas quais esta barreira não
funciona, porque nesta idade, existem vasos sanguíneos da metáfise que vão até a epífise.
Depois de um ano de vida, estes vasos metafisários e epifisários se separam e o disco de
cartilagem fica avascular formando um obstáculo mecânico que previne a contaminação.
Esta proteção acaba sendo ineficiente no caso do quadril e do ombro, uma vez que, nestas
articulações, a cápsula articular vai até a metáfise.
2. o suprimento sanguíneo da cabeça femoral chega até ela envolto em um retináculo muito
frágil. Ele é incapaz de proteger os vasos contra acesso direto de bactérias ou mesmo contra
os efeitos restritivos causados pelo aumento de pressão intracapsular.
A infecção em quadril do recém-nascido é particularmente problemática. Quando não
drenada dentro de cinco dias, as complicações são muitas, tais como, deslocamento da cabeça
femoral, osteomielite com perda de mobilidade local e encurtamento do membro.
Artrite séptica de quadril , com exceção das por infecção gonocica, é emergência cirúrgica!
Não é raro o desenvolvimento de uma serosite estéril após o controle da infecção. Isto
pode ser interpretado pelo médico como uma recrudescência do processo infeccioso que muitas
vezes reinstitui a terapêutica antibiótica, o que é inapropriado. A ocorrência dessa sinovite não
guarda associação com o grau de gravidade da infecção nem com o estado prévio da articulação
envolvida.
312
A B
FIGURA 25. 1- (a) Artrite séptica de coxofemoral (anaeróbio); (b) espondilodiscite
por S. aureus
BURSITES SÉPTICAS – As bursas estão sujeitas a infecções, as quais são, em geral, bacterianas.
As bursas olecraniana, pré-patelar e infra-patelar são as mais acometidas por serem superficiais
e se situarem em locais de atrito e sujeitos a traumas. As infecções são adquiridas comumente
por penetração percutânea (e daí, em geral, o agente patogênico pertence a flora normal de
pele) ou por contiguidade, sendo mais comum que aconteça por extensão de um processo de
celulite. Casos secundários a bacteremia são mais raros. Situações que promovam traumatismos
repetitivos sobre a bursa podem ser consideradas como fatores de risco. Um exemplo disto é o
do indivíduo que fica muito sentado e apoia os braços sobre os cotovelos, durante sessões de
hemodiálise - o qual pode adquirir bursite olecraniana infectada, que é conhecido por cotovelo
de diálise. Pacientes com doenças sistêmicas como diabetes, alcoolismo, artrite reumatoide e
gota estão predispostos a este tipo de patologia. O micro-organismo mais comumente
encontrado é o S. Aureus. Outros são o estrepto -hemolítico e o S. epidermidis, e bem
raramente, os gram-negativos e anaeróbios.
O exame físico mostra um processo inflamatório local. Celulite de tecidos próximos é
comum e pode obscurer uma bursite subjacente. O contrário também é verdadeiro. Existem
situações de processo inflamatório de tecidos moles que se fazem acompanhar de aumento de
volume da bursa, sem que a mesma esteja infectada. Trata-se de uma efusão “simpática” .
Nestes casos é importante a análise do líquido. Entretanto é fundamental que o médico tenha
em mente que a análise do líquido infectado de uma bursa nem sempre mostra uma contagem
alta de células como as de uma artrite séptica. É que bursas reagem bem menos intensamente
que a sinovial articular e, portanto, este exame não deve excluir o diagnóstico em casos em que
existe a suspeita clínica. Nem ao menos um aspecto “purulento” pode garantir que se trata de
uma bursite séptica, uma vez que, os cristais de urato, quando abundantes, podem dar este
aspecto. A dosagem de glicose pode auxiliar (é baixa) e existe um acúmulo de ácido láctico. O
exame pelo Gram pode ser negativo em casos de poucas bactérias. O exame que tem mais
chances de dar o diagnóstico é a cultura do material.
Por causa das possíveis relações anatômicas entre as bursas e a articulação subjacente
é importante determinar se existe solução de contiguidade entre elas. Caso exista artrite, o
tratamento deve ser mais prolongado do que em casos de bursite simples. Para este estudo
pode-se utilizar RX com contraste ou com ar. Outras modalidades que podem ser empregadas
são: o ultrassom, a tomografia computadorizada e a ressonância magnética.
O tratamento é feito com antibióticos, de acordo com a análise do líquido obtido. Em
casos em que isto não é possível, a primeira escolha deve ser dirigida contra S.aureus que é o
agente mais comum. A este tratamento associa-se a aspiração do material da bursa a cada 1-
3dias. A duração do tratamento depende das condições clínicas subjacentes do paciente. Em
geral, em 7 dias o líquido da bursa está esterilizado. É interessante manter o antibiótico até mais
ou menos uns cinco dias após a esterilização. As indicações para tratamento cirúrgico são
313
dificuldades de acesso para aspiração com agulha, necessidade de remover corpo estranho,
doença refratária e recorrente.
TUBERCULOSE
Não é raro que a tuberculose seja causa de infecção músculo esquelética. Esta forma de
envolvimento responde por 1 a 5% de todos os casos de tuberculose. Destes, a metade tem RX
de tórax negativo embora os testes cutâneos costumem ser positivos, a menos que exista
imunodepressão. Acredita-se que a tuberculose articular seja causada por reativação de um foco
latente. A tuberculose pode afetar coluna, ossos longos e articulações, bursas e tendões etc,
mas as duas modalidades principais são o envolvimento da coluna (ou Mal de Pott) e a artrite
tuberculosa periférica.
A tuberculose de coluna afeta indivíduos jovens e ocorre principalmente em coluna
torácica média (maior incidência em T-10). Esta localização está motivada pelo aporte da
infecção de um foco gênito-urinário. As alterações mais precoces são vistas no bordo anterior
da vértebra e no disco, e, à medida que estas progridem, causam estreitamento discal e colapso
anterior do corpo vertebral, promovendo o aparecimento da gibosidade característica dessa
314
A B
FIGURA 25.2- Tuberculose óssea; (a) Mal de Pott ; (b) espina ventosa.
BRUCELOSE
A brucelose é uma infecção causada por bactérias do gênero Brucella, que são
cocobacilos gram negativos não encapsulados, com capacidade de sobreviver e crescer dentro
de um macrófago normal. A infecção é adquirida através do leite ou pela ingestão de tecidos
animais contaminados (gados bovino, caprino e suíno).
Envolvimento osteo-articular pode ser visto com todas as espécies de brucela,
principalmente com a Brucella melitensis. Este aparece na forma de artrite periférica, sacroiliíte,
envolvimento de coluna, bursites etc.
A forma de envolvimento periférico é a mais comum. Esta pode ser monoarticular ou
poliarticular. O envolvimento monoarticular cursa, em geral, com culturas positivas e tem seu
prognóstico diretamente relacionado com o uso do antibiótico adequado. É um envolvimento
315
tipicamente infeccioso. O envolvimento poliarticular é mais raro e tende a ser do "tipo reativo"
com culturas negativas. Neste caso, o prognóstico independente do uso de antibióticos. Este
padrão poliarticular pode envolver poucas articulações (pauciarticular) ou tomar um aspecto
semelhante ao da artrite reumatoide. A análise do líquido sinovial não consegue fazer uma
distinção entre estes dois tipos de envolvimento. Ambos cursam com um líquido do tipo
inflamatório, com contagens de células que vão de 300 a 49.000/mm3, com predominância para
mononucleares e glicose acima de 40 mg/dl. Uma cultura positiva favorece o diagnóstico de
artrite infecciosa.
A segunda forma, em ordem de frequência é a sacroiliíte, a qual é, em geral, unilateral
e tende a aparecer nas formas crônicas de infecção.A espondilite, que é o tipo de envolvimento
mais raro, tende a afetar indivíduos mais velhos. Envolve, em ordem de frequência, a coluna
lombar, depois a torácica e raramente a cervical. Os achados radiológicos da espondilite são
típicos: erosão na margem ântero-superior do corpo vertebral e estreitamento do espaço discal.
Um aspecto importante para diferenciar brucelose de tuberculose é a tendência para um reparo
precoce, levando à formação de osteófitos em "bico de papagaio". Estas lesões líticas associadas
ao aspecto reparativo blástico é sugestivo de brucelose. Dor persistente agravada pelo repouso
é um sintoma importante. Febre está ausente. Na forma espondilítica as hemoculturas e
evidências sorológicas de infecção podem ser negativas.
No quadro 25.5, um esquema das principais formas de envolvimento osteoarticular da
brucelose.
HANSENÍASE
Esta é uma doença bastante comum nos países tropicais e subtropicais, causada pelo
Mycobacterium leprae, cujas manifestações clínicas mais proeminentes são cutâneas e
neurológicas. Além disso, a lepra tem frequentemente manifestações articulares, as quais
chegam a afetar 3/4 dos pacientes, embora nem sempre sejam devidamente apreciadas. Muitas
dessas manifestações não podem ser consideradas como um resultado de infecção direta do
micro-organismo na articulação e, sim, de fenômenos imunológicos relacionados.
316
- artrite não relacionada ao eritema nodoso. É uma artrite mais persistente, simétrica e
progressiva, não relacionada às manifestações reacionais. Muitas vezes é causa de confusão
com artrite reumatoide. Não responde ao tratamento com talidomida e tem uma resposta
moderada ao uso de AINHs. O tratamento da doença básica resolve este tipo de sintoma.
- síndrome das mãos inchadas (suculentas). É um processo inflamatório que não está
confinado só às estruturas de dentro da articulação. Existe uma inflamação granulomatosa
em tecido subcutâneo. A pele fica edemaciada, com edema depressível, que pode ir até a
metade do antebraço. Às vezes os pés também podem ficar inchados. Aparece mais em
surtos reacionais.
- FAN e fator reumatoide positivos. É bem sabido que a lepra, principalmente a forma
virchowiana, pode cursar com estes exames positivos. Um estudo, feito no México, mostrou
uma série de 32 pacientes com a forma lepromatosa e encontrou uma taxa de positividade
para o fator reumatoide de 18,7%. FAN positivo tem sido descrito de 0 a 30% dos pacientes.
O padrão de imunofluorescência não é consistente, e, o título costuma ser baixo. Testes
para anti-DNA, anti-histonas, anti-centrômero, anti- SS-A e SS-B, anti-Sm e anti-
ribonucleoproteinas têm sido negativos. Aliás, é bom saber que, existe quem afirme que a
positividade do FAN e do fator reumatoide guarda correlação com as manifestações
reumáticas apresentadas pelo paciente, embora existam também os que façam afirmações
contrárias. A taxa de positividade do FAN parece correlacionar mais com a duração da
doença, idade do paciente e números de surtos reacionais.
317
A B
C D
D
FIGURA 25.3- Mal de Hansen (A) e (B) articulação de Charcot; (C) mão suculenta; (D) e (E)
vasculite. Em (D) observa-se obstrução da artéria fibular.
ARTRITES VIRAIS
Na sua grande maioria as doenças virais causam sintomas articulares de curta duração,
auto limitados e que não deixam sequelas. Queixas reumáticas podem aparecer em quase todas
as formas de infecções virais. Estas artrites virais não têm um padrão típico. No quadro 24.6
318
estão listados os vírus que mais comumente causam sintomas reumáticos e o padrão de
envolvimento articular mais comum em cada uma destas infecções.
As manifestações articulares de uma doença viral podem ser causadas pela infecção viral
da sinóvia, pela formação de complexos imunes ou pela alteração da estrutura self por um virus
que se misture com o DNA do hospedeiro com consequente desenvolvimento de
autoimunidade.
O tratamento é sintomático. Pacientes com hepatite devem evitar os AINH por causa de
sua potencial hepatotoxicidade; a aspirina deve ser evitada na varicela e na caxumba por causa
do risco de Síndrome de Reye.
ARTRITE DA SIDA - Existe um tipo de envolvimento articular que se acredita seja causado pela
presença direta do vírus na articulação, da mesma maneira que acontece em outras doenças
virais como rubéola e hepatite. Trata-se de uma oligoartrite, bastante dolorosa, mas que
responde ao uso de AINHs e corticoides intra-articulares ou VO (embora exista uma tendência a
se evitar este último pelo risco de imunodepressão). Duram, em média, 1- 6 semanas.
Sinovite é evidente clinicamente e pode ser documentada por biópsia de sinóvia onde
se vê um infiltrado de células mononucleares. O líquido sinovial mostra uma contagem de
células baixa, ou seja, é um líquido sinovial não inflamatório: 50 a 2.600 células /mm, na sua
maioria mononucleares. Glicose sinovial é normal. O vírus tem sido obtido por cultura do líquido
sinovial.
POLIARTRITE SIMÉTRICA AGUDA - Tem se descrito, também, em paciente com SIDA, uma
poliartrite simétrica aguda com envolvimento predominante das mãos, látex (FR) negativo.
Chegam, às vezes, a preencher os critérios para A.R., embora se acredite que não pertençam a
esta doença, sendo uma entidade em separado e relacionada com a SIDA. Aliás, tem se de-
monstrado uma correlação inversa entre AR e a SIDA, visto que pacientes com A.R. têm
hiperfunção das células CD4+.
ARTRITES INFECCIOSAS - Não deixa de ser uma associação óbvia. Existem 2 grupos de micro-
organismos mais e encontrados: os piogênicos (Staphylococcus aureus, Hemophilus, Salmonela
etc.) e os oportunistas; fungos (Criptococos, Sporotrichium Shenkii, micobactérias atípicas etc.)
O primeiro grupo é mais comum em pacientes que, além de SIDA têm o hábito de utilizar drogas
EV, o que serve como porta de entrada. Estes indivíduos mostram uma tendência para fazer
artrite infecciosa em locais pouco comuns, tais como articulação sacrilíaca, esterno-clavicular,
discos vertebrais, etc. Além de artrite infecciosa são descritos casos de osteomielite e bursites
infecciosas. A artrite infecciosa deve entrar no diagnóstico diferencial de hemartrose de
hemofílicos HIV +, com a qual, pode coexistir. Outra complicação infecciosa é a ocorrência de
piomiosites com abscessos únicos ou múltiplos.
ESPONDILOARTRITES - A associação da artrite reativa e da artrite psoriásica com SIDA tem sido
bem descrita.
Artrite reativa- Aparece em um indivíduo jovem, em geral homem, que sofreu uma infecção
intestinal ou venérea e que, depois de algum tempo, por um mecanismo imunológico que
acontece em indivíduos portadores do HLA-B27, desenvolve artrite, uretrite e conjuntivite. A
320
artrite costuma ser oligoarticular, assimétrica, com tendência para envolver membros
inferiores. Pode envolver esqueleto axial, com sacroiliíte e espondilite. O envolvimento de
dedos, é responsável por dactilites ou “dedos em salsicha”. Nesta síndrome não são raras
algumas manifestações mucocutâneas tais como: erupções pápuloescamosas que envolvem
tipicamente sola de mãos e pés e que se denominam queratodermia blenorrágica; a balanite
circinata, que aparece ao redor do meato urinário, além de úlceras de boca e manifestações de
distrofia ungueal. Em que aspectos a artrite reativa do paciente com SIDA é diferente do
paciente sem esta infecção?
O primeiro elemento que chama a atenção,é uma entesopatia muito mais abundante do
que na forma primária, com tendência para afetar os pés, a ponto de impedir que o indivíduo
deambule ou o faça pisando nas partes externas do pé (Pé da SIDA).
O segundo aspecto é uma tendência para aparecer dactilites múltiplas (geralmente isto é
escasso na artrite reativa comum).
O envolvimento de esqueleto axial é mínimo, contrastando com envolvimento articular
periférico exuberante e severo, as quais evoluem com erosões, osteólise e destruição da
articulação.
As manifestações mucocutâneas são variadas e vão desde nenhuma até formas severas da
queratodermia. Estes pacientes podem, também, apresentar manifestações cutâneas
próprias da SIDA como seborréia , sarcoma de Kaposi etc...
O tratamento com AINHs costuma dar resposta pobre, e, o uso do corticoide em dose baixa
também. O uso de corticoide em altas doses deve ser evitado por razões óbvias. Mais
importante, o uso de citostáticos do grupo do metotrexate e da azatioprina costuma
apressar a imunodepressão. É interessante notar que a ciclosporina é bem tolerada nestes
pacientes assim como a sulfassalazina.
Artrite psoriásica- A artrite psoriásica pode se apresentar sob várias formas: com envolvimento
de esqueleto axial, como oligoartrite, como poliartrite, com envolvimento de interfalangianas
distais ou mesmo como uma artrite mutilante. A psoríase tende a parecer junto, antes ou, mais
raramente, depois do que a artrite. Esta é mais comum em pacientes que tenham o
envolvimento ungueal da psoríase, a onicodistrofia e unhas em dedal. O mesmo que acontece
no paciente HIV+ com artrite reativa , acontece com a artrite psoriásica. Aparece não só uma
amplificação da doença reumática como das manifestações de pele. Aliás não é incomum que
pacientes aidéticos tenham só a psoríase, sem artrite, fora do controle. Quanto às manifestações
osteoarticulares, vê-se muita entesopatia, artrite mutilante e dactilites múltiplas. Sua ocorrência
também tem um prognóstico negativo .
VASCULITES- Vasculites sistêmicas têm sido reconhecidas em pacientes com SIDA. Têm sido
descrito casos de PAN, angeíte de hipersensibilidade, angeíte de sistema nervoso central,
granulomatose linfomatoide etc. Acredita-se que as vasculites sejam causadas por: -
-ataque direto do vaso pelo vírus HIV;
-depósitos de complexo imune. Seja em resposta ao próprio HIV ou outras infecções, cujo
aparecimento foi por ele propiciado.
Quando o diagnóstico de uma vasculite é feito em um paciente com HIV é fundamental
que seja feito um bom diagnóstico diferencial com infecções que podem simular estes quadros
tais como infecções por herpesvirus, toxoplasmose e por P. carinii.
Referências:
Chavez-Legaspi M, et al.Study of rheumatic manifestations and serologic abnormalities in patients with lepromatous
leprosy. J Rheumatol 1985; 12: 738-41.
Goldenberg,D. Gonococal arthritis. In Spinoza L, Arnett F Goldenberg DL, Alarcon GS (eds) Infections in the Rheumatic
Diseases, Grune & Stratton, Orlando, 1988, p.43-52.
Miller RA, et al. The limited Spectrum of ANA in Leprosy. J Rheumatol 1987; 14:108-10.
Schitliff ME, et al. Acute septic arthritis. Clin Microbiol Rew. 2002; 15:527-44.
Shirtliff ME et al. Acute septic arthritis. Clin Microbiol Rev 2002;15:527-44.
Siegel LB,et al. Viral infection as cause of arthritis. Am Fam Physician 1996, 54: 2009-15 .
Zimmermann B, et al. Septic Bursitis. Semin Arthritis Rheum 1995, 24:391-410.
322
A grande importância da dor lombar advém da sua alta incidência. Em torno de 80% de
nós experimentará dor nas costas alguma vez na vida. Muitas dessas queixas são autolimitadas,
embora demonstrem um alto índice de recorrência. A gravidade do ataque inicial e a idade do
início dos sintomas são alguns dos elementos que ajudam a predizer quais são os indivíduos
predispostos a ter problemas recidivantes.É exatamente por causa desta sua alta frequência e,
também, por causa de a maioria dos casos de dor lombar piorar com stress mecânico, que este
tipo de sintoma é uma das causas mais comuns de afastamento do trabalho, com consequente
diminuição de produção e aumento de ônus para entidades seguradoras.
A B
FIGURA 26.1 COLUNA VERTEBRAL - (a) Unidades da coluna; B- dissipação do peso pelo
disco intervertebral
323
B
A
FIGURA 26.2 – (A) Curvaturas da coluna vertebral; (b) Posição dos ligamentos anterior e posterior.
Existem alguns fatores que influem nesta postura, como por exemplo:
324
Anomalias congênitas - Uma das anomalias congênitas mais comuns é a falha na fusão das
lâminas do arco neural (espina bífida). Pode ser acompanhada de hipertricose ou
hiperpigmentação na área sacral. Esta anomalia NÃO é causa de dor lombar e é tão frequente
que quase pode ser considerada como uma variante anatômica normal. Outras anomalias da
coluna lombar são: tropismo facetário, sacrilização da 5ª vértebra lombar e lumbalização de S1.
Tropismo facetário é a assimetria do alinhamento das articulações facetárias de uma
vértebra. Por exemplo: uma faceta se encontra no plano sagital enquanto outra está no plano
coronal. Embora alguns autores considerem o tropismo facetário como importante clinicamente
por ser causa de um aumento no stress rotatório, para outros é considerado como causa pouco
provável de dor lombar. Hemivértebras favorecem o aparecimento de desalinhamentos.
A lumbalização da primeira vértebra sacral aumenta o braço da alavanca da coluna lombar
e pode aumentar o stress sobre a coluna lombo-sacra. Em contraste, a sacrilização da 5ª
325
vértebra lombar, desde que toda a vértebra fique incorporada ao sacro, dificilmente é causa de
sintoma. Se a sacrilização for unilateral (Síndrome de Bertolotti) existe aumento de stress que
favorece a herniação do disco logo acima da sacrilização unilateral.
Síndrome de Baastrup ocorre quando os processos espinhosos são longos e largos e se
superpõem uns aos outros formando uma neoartrose, com desgaste nos bordos, osteosclerose
e formação de cistos. Isto é causa de dor lombar. Esta condição também tem sido reconhecida
em veterinária, em cavalos que não suportam a colocação de selas!!!
Espondilolise é um defeito provavelmente causado por trauma em um segmento
congenitamente anormal da pars interarticularis em vértebras de região lombar. O defeito é
melhor visualizado em projeções oblíquas do RX ou por tomografia computadorizada. Um
trauma maior sobre o local ou traumas menores repetidos podem promover o deslizamento
anterior do corpo vertebral, pedículos e facetas articulares superiores. À esta alteração dá-se o
nome de espondilolistese. A espondilolistese acontece mais frequentemente em L5-S1 e, ocasio-
nalmente, em L4-L5. Os sintomas são proporcionais ao grau de deslize anterior. O paciente se
queixa de dor lombar que se irradia para as nádegas. Pode existir limitação de movimento e um
grau variável de alterações neurológicas indicativas de radiculopatia pode ser encontrado.
A B
C D
FIGURA 26.3 - (a e b) Espondilolise com listese; (C) e (D) RX mostrando defeitos
congênitos-(C) -Hemivértebra; (D)- malformação de L5.
326
Afecções traumáticas das costas - Trauma é a causa mais frequente de dor lombar aguda. Em
traumas pode ocorrer fratura e deslocamento dos segmentos vertebrais. Testes de mobilidade
e manipulações forçadas devem ser evitadas. O pescoço não deve ser fletido e nem se deve
permitir que o paciente fique sentado até que o diagnóstico tenha sido feito corretamente (com
RX, tomografia etc). Isto tem a finalidade de evitar um aumento do dano, principalmente para a
medula.
Fraturas vertebrais ocorrem em quedas de alturas, violências e acidentes de automóvel.
O colapso vertebral se faz em cunha, aumentando a flexão da coluna. Quando o elemento
precipitante é mínimo, suspeita-se de que a estrutura óssea esteja enfraquecida por um
processo patológico, como p. ex., osteoporose, osteomalácia, mieloma múltiplo,
hiperparatireoidismo e carcinoma metastático. Fraturas de processos transversos associam-se,
quase sempre, com processos traumáticos em músculos paravertebrais, principalmente o psoas.
É frequente a ocorrência de hemorragia retroperitoneal significante (podendo inclusive causar
choque hipovolêmico). O diagnóstico é feito por tomografia computadorizada ou ressonância
magnética.
Lumbago é um termo usado para descrever dor lombar sem relacioná-la claramente a
uma lesão anatômica conhecida. Associa-se comumente a quedas, desacelerações súbitas como
as que se vêem em acidentes automobilísticos, e, também, com o levantamento de objetos
muito pesados. Ocasionalmente esta síndrome tem um caráter mais crônico, sugerindo um
componente de doença discal associado. A sintomatologia apresentada é a de dor lombar aguda
com postura alterada pelo espasmo muscular. A dor se limita à porção lombar baixa, alivia com
o repouso e melhora, com ou sem tratamento, em poucos dias.
A hérnia de disco consiste no extravasamento do material nuclear do disco (núcleo
pulposo) para dentro do anel fibroso. Nos casos mais graves o núcleo pode protruir através do
anel e ficar como um fragmento livre em canal vertebral. A causa é, em geral, traumática, mas,
em muitos casos, não existe uma história de um trauma específico ligado ao seu aparecimento.
Degeneração do ligamento longitudinal posterior e do ânulo fibroso, (que não são raros em
indivíduo de meia idade e no velho), ocorrem de maneira silente. Um espirro, uma tosse ou
qualquer outro movimento trivial pode levar o núcleo a prolapsar, empurrando o ânulo enfra-
quecido posteriormente. O local mais comum é entre L5-S1 e, em ordem decrescente, L4-L5, L4-
L3, L2-L3. O paciente apresenta as seguintes queixas: dor lombar, postura anormal (escoliose
reflexa) e limitação da mobilidade da coluna (principalmente flexão anterior). O envolvimento
nervoso é indicado pela irradiação radicular e por alterações sensoriais (parestesias, hiper ou
hipoestesia) no trajeto envolvido, fasciculações e espasmos musculares e diminuição de reflexos
tendinosos. Anormalidades motoras (fraqueza e atrofia muscular) também podem ocorrer, mas
não são tão proeminentes. Como a hérnia de disco é mais comum entre L5-S1; L4-L5; as raízes
mais frequentemente envolvidas são a primeira sacral e a quinta lombar. (Observe que o disco
prolapsado comprime a raiz que emerge no disco imediatamente abaixo!)
As lesões da 5ª raiz lombar produzem dor na região do quadril, virilha, coxa póstero-lateral
e panturrilha lateral ao maléolo externo, dorso do pé, 2º e 3º dedos. Parestesias podem ser
sentidas em todo o trajeto ou só na sua porção distal. Fraqueza, se presente, envolve o extensor
do hallux e mais raramente o do pé. É difícil para o paciente caminhar sobre os calcanhares.
Reflexos raramente estão alterados.
Na lesão de S1, a dor é sentida no meio da região glútea, posterior da coxa e da perna,
região plantar e do 4º e 5º dedos. Fraqueza, se presente, envolve flexores do pé e dedos. O
paciente tem dificuldade para caminhar na ponta dos pés. O reflexo aquileu está ausente ou
diminuído.
As lesões da 4ª raiz lombar são mais raras. Causam diminuição do reflexo patelar e dor na
parte anterior da coxa e joelho, com perda sensorial correspondente.
No quadro 26.1 foram colocadas as características principais das radiculopatias lombares
mais comuns.
327
espaço superior, pode-se pedir ao paciente que proceda à flexão do tronco, estando em pé.
Nesta posição o movimento será maior em L2-L3, menor em L3-L4 e nulo em L4-L5-S1. Na
contramanobra de Lasègue, a flexão do joelho em um paciente com dor ao estender a perna,
causa alívio da mesma. Outro teste que pode ser acrescentado ao Lasègue, é a manobra de
dorsiflexão forçada do pé, na altura do tornozelo, quando for atingida a extensão indolor do
teste do levantamento da perna estendida. A flexão causa dor no trajeto do nervo ciático. Uma
terceira maneira diferente de se executar o Lasègue é fazê-lo com o paciente sentado, com as
pernas pendentes. O paciente senta-se na borda da mesa defronte ao examinador e o teste
consiste em estender a perna do paciente, abaixo do joelho, uma de cada vez. O examinador
deve observar reações de dor. Todo exame físico de um paciente com dor lombar deve incluir o
exame neurológico de mm.ii.
B C
A
D
FIGURA 25.4 – Lasègue (A), contra manobra de Lasègue (B) e suas variantes (C e D)
A B
FIGURA 25.5. Doença discal (a) herniação; (b) fenômeno do vacuum
Outras causas de dor lombar com irradiação ciática - Compressão de uma ou mais raízes
nervosas não resulta somente de doença discogênica. Pode resultar de osteófitos que façam,
329
em graus variáveis, estenose do canal intervertebral. Hipertrofia das facetas apofisárias é outra
causa.
A estenose do canal medular pode ser vista na osteoartrite está mais comumente
relacionada à excrescências ósseas (osteófitos) que comprimam as raízes da cauda equina. Além
da osteoartrite, a estenose de canal medular pode ser vista em doença de Paget, anomalias
congênitas de forma e volume do canal. Em estenose do canal vertebral, o paciente se queixa
de dor lombar bilateral, com distribuição ciática, a qual é mais é severa quando o paciente fica
em pé ou caminha e é aliviada pelo repouso (dor do tipo de claudicação). Veja, no quadro 26.2,
alguns dados que separam a dor da estenose do canal daquela causada por doença discal.
A síndrome da faceta é causada pela hipertrofia de uma faceta apofisária e produz dor
com irradiação ciática unilateral, embora esta irradiação nunca passe para baixo do joelho.
A aracnoidite adesiva lombar com radiculopatia é uma entidade a ser considerada em
pacientes que já fizeram cirurgia em coluna lombar, mielografias, ou já sofreram infecções ou
hemorragia subaracnoide. Existe dor lombar e radicular com deficiências motores e sensoriais
de leves a moderados.
Dor lombar de origem visceral - Doença pélvica, abdominal e de vísceras torácicas podem dar
dor nas costas. Como via de regra, a doença pélvica causa dor na região sacral; doença
abdominal alta ou torácica baixa causa dor lombar com um "centro" em torno de T8-L2; dor
abdominal baixa causa dor lombar em torno de L2-L4. Caracteristicamente este tipo de dor não
se acompanha de rigidez e não se altera com os movimentos.
Doenças abdominais altas ou torácicas baixas como úlcera péptica e tumores de
estômago causam mais comumente dor epigástrica, mas se a parede posterior do órgão for
envolvida e, particularmente se existe extensão retroperitoneal, a dor pode ser sentida na
"coluna". A dor das costas pode ser central ou mais intensa em um dos lados. Se vier junto com
a dor epigástrica e for muito intensa pode dar a sensação de circundar o corpo. As características
da dor lembram as do órgão primariamente afetado. Por exemplo, no caso do estômago, ela
aparece 2 horas após as refeições, alivia-se com antiácidos, etc... Doenças do pâncreas (úlcera
péptica terebrante, pancreatite, cistos, tumores) podem dar dor nas costas. Esta é mais intensa
à direita se a cabeça do pâncreas estiver envolvida, e, à esquerda se a cauda estiver implicada.
Doenças de estruturas retroperitoneais (linfomas e sarcomas, etc...) podem dar dor
lombar com uma tendência para irradiar para abdome inferior e face anterior da coxa. Aneu-
risma de aorta abdominal causa dor lombar alta ou baixa, dependendo da localização da lesão.
Dor súbita, em paciente recebendo anticoagulante, pode ser causada por hemorragia retroperi-
toneal.
Doença abdominal baixa, como aquelas causadas por doença inflamatória intestinal ou
tumores de cólon promove aparecimento de dor na parte inferior do abdome, púbis e região
lombar média. Lesões em cólon transverso causam dor ao nível de L2-L3, porção central ou à
esquerda. Lesões de sigmoide causam dor na região sacral.
Dor sacral em doença pélvica pode se dever à endometriose ou carcinoma do útero que
invadam ligamento útero sacral. Má posição do útero pode ocasionar tração neste ligamento,
principalmente quando a paciente fica em pé por muito tempo. Envolvimento de plexos
330
nervosos (o que acontece geralmente por infiltração carcinomatosa) também pode dar dor sa-
cral, a qual tende a ser pior à noite. No homem, prostatite crônica e carcinoma de próstata com
metástases são causas de dor sacral ou lombar.
Artrites como causa de dor lombar - Osteoartrite é o tipo mais comum de envolvimento
artrítico da coluna lombar, com dor do tipo mecânico e limitação da mobilidade. A severidade
dos achados radiológicos não guarda relação com a clínica que o paciente apresenta. Assim, um
paciente com muitas alterações radiológicas pode ser assintomático e outro, com alterações
radiológicas mínimas, pode ter muita dor. Osteoartrite da coluna pode ocasionar dor por
compressão radicular. A espondilite anquilosante é causa de dor lombar do tipo inflamatório em
indivíduos jovens. Tem início insidioso e rigidez matinal associada. Manifestações articulares
periféricas estão presentes. Com o tempo aparece limitação de mobilidade importante.
331
LABORATÓRIO - Alguns testes como hemograma, VHS, cálcio, fósforo, fosfatase ácida e alcalina,
eletroforese de proteínas e parcial de urina ajudam a apontar doenças específicas que possam
ser causa da dor lombar. A solicitação destes exames deve ser orientada pelos dados obtidos
pela anamnese e exame físico.
RX SIMPLES - As chances de se descobrir a causa da dor lombar em um RX simples é baixa e a
irradiação a que o paciente é submetido para a obtenção deste exame é relativamente alta
(cerca de 15 vezes a de um RX de tórax). Existem estudos em que se demonstra que o custo e
riscos do RX simples em bases rotineiras NÃO justifica o pouco benefício que se obtém dele. No
entanto, ele pode ter valor quando existe a suspeita clínica de doenças tais como tumores,
infecções, espondilolistese, etc... Em doença discal, o que pode ser encontrado é gás
intranuclear resultante de fissuras no anel fibroso e núcleo pulposo (fenômeno de vacuum).
Quando ocorre falha estrutural, aparece estreitamento do espaço discal e esclerose reativa do
corpo vertebral. Como resultado de elevação periosteal e outros elementos irritantes formam-
se osteófitos.
Para se compreender bem o papel do RX nas doenças degenerativas deve-se conhecer
o conceito de segmento motor criado por SCHMORL e JUNGHANS para designar o conjunto de
junta apofisária e disco, incluindo todos os tecidos de suporte. Este conceito é importante para
se entender que, alterações que frequentemente começam no disco (levando à rigidez do
segmento e perda de altura do espaço discal) acabam subsequentemente por produzir um stress
anormal nas juntas apofisárias, levando-as a desenvolver osteoartrite. Demonstração
radiológica de juntas apofisárias não é fácil porque geralmente só um dos seus planos é tan-
gencial ao feixe de RX. Osteófitos desta articulação não só diminuem a sua mobilidade, mas,
também podem crescer para dentro do canal medular, estenosando-o e comprimindo o seu
conteúdo.
É comum o achado de degeneração discal ao RX em pacientes sem sintomatologia, assim
como, em um paciente com sintomatologia discal e alterações ao RX, este último nem sempre
é um bom guia para a localização topográfica do problema. Preste atenção dobrada nisto!!!
O achado de degeneração discal ao RX não implica que o disco é a causa da dor lombar.
Outros elementos que podem ser vistos ao RX são os defeitos congênitos, a espondilolise
e a espondilolistese. O defeito radiológico na pars interarticularis é evidente na projeção lateral
e, a separação com ou sem deslocamento, pode se tornar mais evidente quando o RX é feito
com o tronco em flexão. Nas projeções oblíquas tem se descrito, classicamente, a espondilolise
como um "colar no cachorrinho de Scotty". O cachorrinho de Scotty é formado por processo
transverso (cabeça), processo articular superior (orelhas), processo articular inferior (perna da
frente), processo espinho e lâmina (corpo). Na espondilolistese o cachorrinho de Scotty aparece
decapitado. O grau de gravidade da espondilolistese é medida pelo grau de deslocamento, para
frente, em relação ao sacro. Num RX lateral, o sacro é arbitrariamente dividido em 4/4. Graus
de 1 a 4 são usados para representar a posição da vértebra deslocada em relação à esta divisão.
Para diagnóstico de estenose medular são necessários exames mais sofisticados que um
RX simples, mas pode-se suspeitar desta síndrome quando o canal medular da região lombar
mede menos que 15 mm.
Outro achado possível no RX simples é o de lesões metastáticas. As lesões metastáticas
de câncer de mama podem ser osteolíticas ou osteoblásticas; as de pulmão, tireoide e rim e as
lesões de mieloma múltiplo costumam ser puramente osteolíticas. Carcinoma de próstata
332
produz mais comumente lesões osteoblásticas. Quando uma lesão tumoral se torna visível ao
RX, 25 a 30% do conteúdo ósseo foi substituído por tecido tumoral. Isto deixa bem evidente que,
estes pacientes podem ter dor nas costas, muito antes do aparecimento radiológico das lesões.
Achados radiológicos na espondilite e nas doenças metabólicas serão discutidos juntos
com os textos referentes a estas patologias
Não se recomenda a realização de RX de coluna lombar em todo paciente com dor
lombar. Existe um grande número de pacientes que se apresenta com lombalgia e não se
consegue identificar a estrutura anatômica lesada. Aliás isto acontece na maioria das vezes.
Veja bem... de todas as dores nas costas, em 85% dos casos não se consegue fazer um
diagnóstico etiopatológico definido. Hérnias de disco causam de 4 -5% dos problemas, estenoses
de canal medular respondem por outro tanto; dor visceral irradiada é responsável por cerca de
1% dos casos. A grande maioria das dores nas costas é considerada idiopática, na qual fatores
individuais e ambientais se mesclam em diferentes proporções. E eles não são poucos. Segundo,
Leboeuf e cols existem pelo menos 55 fatores próprios do indivíduo e, pelo menos outros 24
relacionados a trabalho que estão implicados em dor nas costas.
Já sabemos que exames de imagem dificilmente solucionam o diagnóstico de dor nas
costas quando a clínica não aponta para uma determinada etiopatogenia. Entretanto, não se
deve esquecer que eles carregam um potencial de iatrogênese importante. Como já foi
assinalado, um grande número de pessoas assintomáticas possuem sinais radiológicos de hérnia
de disco e de estenose de canal ao RX. Se isto é achado em alguém com sintomas, tende-se a
rotular o paciente como portador de uma patologia mais séria. Assim, excesso de investigação
sempre acarreta no risco de excesso de tratamento...Os exames de imagens devem ser
reservados para pacientes com lombalgia idiopatica que, após 6 semanas de tratamento
permanecem sintomáticos. Entretanto apesar de cientes do problema acima, muitos médicos
ainda solicitam exames radiológicos. Segundo Espeland e cols, 25 a 50% dos RX solicitados na
América, Grã Bretanha e Noruega são totalmente desnecessários e 35% dos internistas na
Alemanha solicitam RX de coluna lombar rotineiramente em casos de lombalgia. Parte desta
“conduta paradoxal” advém do medo – por parte do médico- de deixar passar um diagnóstico
mais grave; outra parte vem de pressão do próprio paciente neste sentido. Este mesmo autor,
ao estudar a avaliação de necessidade de RX do ponto de vista do paciente, notou, ao entrevistar
99 pacientes, que 72% deles consideravam este exame muito importante, principalmente se o
paciente era do sexo masculino, se eram pacientes referidos inapropriadamente a um
especialista ou se percebiam os seus sintomas álgicos como inalterados ou apresentando piora.
Quando os pacientes foram interrogados sobre o porquê desta importância, as razões
apresentadas foram: (a) - necessidade de suporte emocional (ou seja, de quem acredite que ele
tem razão para ter dor); (b)- preocupação com o diagnóstico (principalmente naqueles com
história familiar de câncer, doença reumática ou trauma); (c)- necessidade de “colocar um nome
na doença”; (d)- ansiedade; (e)- acreditar que o RX é mais importante do que o exame físico-
principalmente quando o paciente escutou opiniões diferentes de mais de um médico; (f)-
alguém lhe disse que era importante e (g)- acreditar que o resultado do RX vai trazer mudanças
de ordem prática como mudança no tratamento ou aposentadoria.
No sentido de facilitar este tipo de decisão pelo médico, a Agency for Health
Policy and Research divulgou os chamados sinais de alerta ou “red flags” mostrando em que
situações, o RX de coluna deve ser solicitado já na primeira consulta . Estas situações estão
resumidas no quadro 26.3.
CINTILOGRAFIA ÓSSEA - Serve para definir a origem da dor nas costas em certas situações tais
como, tumores e infecções.
SUSPEITA DE FRATURA
História de trauma maior;
História de trauma menor em idosos ou c/osteoporose.
SUSPEITA DE TUMOR OU INFECÇÃO
Aparecimento da dor em pessoas com mais do que 50anos;
História pregressa de câncer;
Dor noturna;
Sintomas constitucionais como febre, perda de peso etc...
Infecções bacterianas recentes ou uso de drogas EV;
Imunossupressão.
PACIENTES COM SINTOMAS DE SÍNDROME DA CAUDA EQUINA
Anestesia em sela;
Disfunção de esfíncter;
Deficit neurológico de membros inferiores.
RESSONÂNCIA MAGNÉTICA - Este teste tem uma série de vantagens quando comparado com
outras técnicas de radiologia. Ele mostra o comprimento todo do canal medular e pode separar
as imagens ósseas das produzidas por tecidos moles sem necessidade de contraste. Não deve
ser utilizado em pessoas com marca-passos nem com clipes em vasos ou abdominais. Clipes
tendem a migrar e marca-passos podem ficar desregularizados. Da mesma maneira que
acontece com a tomografia, achados de lesão discal na ressonância magnética só têm valor
quando correlacionam com a clínica.
Não existe dúvida alguma que, em dor lombar, o aspecto preventivo é muito importante.
Existiriam menos queixas de dor lombar se a maioria das pessoas mantivesse os músculos do
tronco em boa forma, o que pode ser feito através da natação, andando de bicicleta,
caminhando ou correndo. Um programa de redução de peso e exercícios regulares para forta-
lecer a musculatura abdominal e para-espinhal é o suficiente para os que têm sintomas discretos
ou simplesmente, um desconforto na região lombar. O horário ideal para os exercícios é pela
manhã, quando as costas estão mais rígidas pela inatividade da noite.
Colchões apropriados e cadeiras com suporte adequado ajudam a manter a postura
correta. Viagens longas de carro ou avião, que não permitem mudanças frequentes de posição,
trazem problemas para o disco e para a estrutura ligamentar. Levantamento de pesos com o
334
tronco em flexão deve ser evitado. Atividades extenuantes, sem condicionamento prévio e sem
aquecimento, também são causa de problema para o disco e ligamentos.
Lesão ligamentar e muscular ou prolapsos discais pequenos são, em geral, autolimitados,
respondendo a medidas simples em pouco tempo.
O repouso já foi muito valorizado no tratamento da lombalgia. Todavia repouso completo
prolongado deve ser evitado, para não se permitir que ocorra o descondicionamento dos
músculos das costas e para não criar problemas de ordem psicológica, que dão ao paciente a
sensação de que está inválido. Coletes também não devem ser usados de maneira constante
para não causar descondicionamento muscular.
A terapia física (como termoterapia e/ou massagens) tem valor como relaxante muscular
e analgésico. Além disso, pelo fato de incluir o ato físico de contacto direto com o paciente, tem
um efeito psicológico bastante positivo.
As manipulações são bastante comuns em nosso meio (“colocação da coluna no lugar...”)
e consistem na realização de alguns movimentos bruscos que frequentemente trazem alívio
imediato da dor. Só que esta melhora é bastante efêmera.
Analgésicos (puros ou anti-inflamatórios) podem ser utilizados liberalmente nos primeiros
dias. Pode-se associar o uso de relaxantes musculares. Após o período agudo permite-se que o
paciente assuma gradualmente as suas atividades. Aí, a educação postural e exercícios para
aumentar a força e tonicidade dos músculos abdominais e para espinhais são desejáveis. Os
exercícios físicos além de melhorarem a força muscular, melhoram a nutrição das cartilagens
articulares, inclusive as dos discos intervertebrais: melhoram a oxigenação dos músculos, assim
como as funções respiratórias e cardiovasculares. Os exercícios aeróbicos parecem aumentar
também o nível sérico das endorfinas, aumentando a capacidade de tolerância à dor.
Cerca de 50% dos pacientes com hérnia de disco melhoram em uma semana, 80% em
duas semanas, 90% em 2 meses, a despeito do tratamento utilizado. Dos restantes, um pequeno
número pode ser considerado como candidato ao tratamento cirúrgico.
O tratamento cirúrgico mais comumente utilizado é a hemilaminectomia com retirada do
disco envolvido; artrodese é feita se existe instabilidade, em geral, em casos em que existe uma
anomalia congênita como, por exemplo, espondilolistese. Este tipo de cirurgia só deve ser
indicado quando se têm objetivos claramente definidos, ou seja, um reconhecimento completo
do problema subjacente. Indicações absolutas são: protrusão maciça central posterior causando
síndrome de compressão da cauda equina (com paralisia de esfíncter de bexiga e reto), e
ocorrência de danos neurológicos progressivos a despeito de tratamento conservador. As
indicações relativas de cirurgia são mais difíceis de definir. Nela estão: a dor tipo ciático
persistente (a despeito de tratamento conservador adequado) e os ataques recorrentes, muito
frequentes, que interfiram com a vida normal do paciente.Dor lombar isolada, sem evidência de
compressão de raiz nervosa, é insuficiente para indicar discectomia.
Quemonucleólise é um tratamento alternativo à cirurgia, que consiste na injeção de
papaína dentro do núcleo pulposo do disco herniado. Outras técnicas utilizadas são as de
infiltração com corticoides intratecal e epidural ou ainda infiltração intradiscal e do manguito da
raiz nervosa, com resultados variáveis.
Referências:
quando o pescoço faz a rotação lateral, occipital e atlas se comportam como uma peça única.
Entre C1 e C2 ocorre a maior movimentação de toda a coluna, sendo possível uma rotação de
90º. (50% da rotação total do pescoço acontece entre C1 e C2 antes que seja notada rotação de
C2-C7). Entre atlas e áxis é possível alguma flexão e extensão. Como a faceta inferior de C1 é
plana e a superior de C2 é convexa, flexão e extensão acontecem neste nível, de maneira
semelhante ao movimento de uma gangorra.
A coluna cervical como um todo tem uma curva lordótica com convexidade anterior de
C1 a C7. Acima de C1 há uma angulação aguda que permite que a cabeça fique no plano
horizontal.
Os movimentos do pescoço adaptam-no à sua função de sustentar a cabeça e permitir o
funcionamento dos órgãos do sentido nela contidos. A sua mobilidade total é uma somatória de
todos os movimentos segmentares, sendo que a maior parte dela acontece entre o crânio e C3.
Abaixo de C2 a movimentação depende da elasticidade dos ligamentos e do grau de
compressibilidade dos discos. C7 tem o comportamento de uma vértebra torácica. Os
movimentos ântero-posteriores puros são possíveis na coluna cervical; já a flexão lateral e
rotação nunca ocorrem de maneira isolada abaixo de C2.
ETIOLOGIA
Torcicolo (ou “pescoço duro”) - É uma escoliose da coluna cervical associada à dor e
incapacidade. Na criança, o torcicolo pode ser causado por trauma, infecções de garganta,
faringe ou adenite cervical. No adulto, pode ser causado por infecções virais, uso de drogas,
distensão muscular, problemas psicológicos, ou por uma subluxação traumática apofisária
unilateral. O torcicolo psicogênico é um espasmo habitual, um "tique" psiconeurótico, que
expressa um conflito emocional. A etiologia emocional é sugerida por achados bizarros à história
e ao exame físico com queixas desproporcionais aos achados de exame físico.
A subluxação ou pinçamento unilateral de uma faceta acontece quando, em posição de
flexão, extensão ou rotação completa, as articulações, que já estão quase subluxadas, se
excedem nos limites do movimento normal.
Neuralgia occipital - Causa dor e parestesia na base do crânio e algumas vezes em todo o couro
cabeludo. Deve-se à irritação do nervo occipital, em geral resultante de trauma ou de doença
degenerativa da articulação atlanto-axial. A dor pode ser desencadeada por distensão muscular
causada por tarefas realizadas com os braços hiperextendidos acima da cabeça e pela palpação
local.
O tratamento é feito com infiltrações nos pontos dolorosos, instruções para dormir em
posição apropriada e exercícios para fortalecimento dos músculos eretores da espinha.
normal. Tratamento é feito com infiltração local, com correção da posição de dormir e evitando
posições que promovam a hiperextensão da coluna.
A B
FIGURA 27.2- Cervicalgia (A)- neuralgia occipital; (B) bursite de C7.
Artrites - As que envolvem região cervical são: artrite reumatoide (principalmente atlas-axis),
artrite reumatoide juvenil e as espondiloartropatias soronegativas.
Outras doenças mais raras - Outras doenças encontradas neste local são neoplasias (primárias
ou metastáticas), doença de Paget, osteomielite (tuberculose, estafilococos), meningite etc...
DOENÇAS QUE CAUSAM DOR NO PESCOÇO E NO OMBRO COM OU SEM IRRADIAÇÃO PARA O
BRAÇO
Doença discal - A dor de origem discal é geralmente radicular e varia de uma sensação profunda
e penosa até uma dor aguda superimposta. A irritação da raiz sensitiva produz uma dor do tipo
choque elétrico ou fulgurante ou, ainda, parestesias que são sentidas mais nas extremidades. A
irritação da raiz motora causa uma dor descrita como mais proximal, em ombro e axila
semelhante a uma sensação desagradável, vaga e profunda. Para que elemento irritante cause
dor a um nervo é necessário que exerça pressão variável sobre o mesmo. Portanto, se a pressão
é constante não haverá dor, ou se esta existir, não persistirá. (Este é um conceito sobre dor que
fornece um princípio útil para se usar no tratamento).
Quando o disco se degenera, os corpos vertebrais se aproximam promovendo, também,
a aproximação das articulações de Von Luschka. Em consequência da irritação e fricção cons-
tante, elas se convertem em local de formação de osteófitos, os quais podem invadir o canal
medular, estreitando-o. A aproximação das unidades anteriores acarreta, inevitavelmente, na
aproximação das articulações posteriores, com pressão e lesão da cartilagem articular e
desenvolvimento de alterações osteoartríticas neste local.
Espondilose é um termo reservado para descrever alterações degenerativas de uma
articulação vertebral resultante de degeneração discal. Osteófitos aparecem predominante-
mente nos ápices das concavidades das curvas fisiológicas da coluna, ou seja, em C4-5, C5-6; T8
e L3-4. Osteófitos anteriores ocorrem mais frequentemente na coluna torácica, ao passo que,
osteófitos posteriores são mais comuns na coluna cervical e lombar. Esta distribuição se explica
com o conceito de que a pressão é sempre maior no lado côncavo da curva.
A habilidade de um paciente descrever sua dor pode auxiliar o médico na localização do
problema, como já foi visto anteriormente. Além de dor o paciente pode apresentar queixas de
parestesias, limitação da mobilidade do pescoço, fraqueza, cefaléia, pseudo-angina pectoris e
dos distúrbios simpáticos como borramento visual, lacrimejamento de um ou ambos os olhos,
alterações de equilíbrio. Distúrbios da marcha, alterações auditivas com ou sem tinitus podem
340
resultar de insuficiência das artérias vertebrais que podem ser comprimidas pelas estruturas
cervicais. Disfagia pode resultar de osteófitos que crescem anteriormente e comprimem o
esôfago, de anormalidades em C7 e de alterações simpáticas. Até sintomas bizarros que podem
passar como "funcionais ou psiconeuróticos" como falta de ar (C3 a C5 inervam musculatura
respiratória), palpitações e taquicardia associadas com hiperextensão do pescoço (C4 inerva
diafragma e pericárdio), síncopes, perda abrupta do sentido de propriocepção (insuficiência da
circulação posterior) etc, são encontrados. Na figura 27.3 B alguns dos principais dermátomos
inervados por ramos cervicais.
O exame do paciente deve incluir pesquisa da mobilidade da coluna cervical. A manobra de
Spurling, (compressão do topo da cabeça em pacientes sentados em uma superfície dura) leva
ao fechamento dos forames, com reprodução dos sintomas. Quando a manobra de Spurling é
positiva, a suspensão do paciente pela cabeça alivia os sintomas. Deve-se, também, proceder ao
exame neurológico completo, incluindo exame dos pares cranianos assim como exame
minucioso de partes moles do pescoço, à procura de adenopatias que possam apontar para uma
doença sistêmica.
B C
FIGURA 27.3 (a) Manobra de Spurling; (b) Dermátomos inervados por ramos cervicais; (c)
Espondilose ao RX.
Distrofia simpático-reflexa - Esta é uma doença que prima pelas numerosas denominações:
causalgia, atrofia de SUDECK ou de SUDECK-LERICH, síndrome ombro-mão, distrofia simpático-
reflexa e, a mais moderna, síndrome de dor regional complexa (CRPS). Esta última é a mais
usada.
É uma síndrome dolorosa de extremidades (mais comumente, de membro superior) as-
sociada a disfunção do sistema nervoso simpático. É relativamente comum e está associada a
doenças traumáticas locais (p. ex.: fratura de Colles, lesão de nervos periféricos), doenças
músculo esqueléticas (p. ex.: espondilose cervical), doenças viscerais (p.ex: doença coronariana
isquêmica, varicela, carcinomas), desordens do SNC ou da medula (p.ex: hemiplegias), choques
elétricos, mergulhos, estresse emocional e uso de certas drogas (antituberculosos e
anticonvulsivantes). A denominação de CRPS tipo 1 é reservada para as situações em que esta
síndrome aparece depois de um evento clínico e não tem uma lesão nervosa definida; já a CRPS
tipo 2 é reservada para aqueles com lesão nervosa definida (em geral, secundária a traumas ou
cirurgias).
Afeta ambos os sexos, aparece mais comumente após os 50 anos e não tem preferência
pelo lado dominante do corpo. Estes pacientes têm tendência para apresentarem
hipertrigliceridemia e distonias neurovegetativas.
Ombro e mão são os locais mais afetados. Clinicamente o paciente se apresenta com
dor, rigidez, alterações vasomotoras, hiperestesia, anodinia e impotência funcional. Anodinia é
a sensação de dor ao simples toque da pele. No caso da síndrome envolvendo ombro e mão tem
se observado 3 estágios bem distintos da doença:
(1)- fase aguda: nela existe aumento de fluxo sanguíneo com aumento de temperatura da pele
e intolerância ao calor. Unhas e pelos crescem de maneira acelerada. O membro fica
edemaciado, avermelhado e impotente. Dura, em geral de 3 a 6 meses.
(2)-fase distrófica: resolução do edema. Ao contrário da fase anterior, a dor piora com frio. Existe
uma diminuição do fluxo sanguíneo e da temperatura. A pele fica pálida e cianótica; o cresci-
mento das unhas e dos pelos diminui. Estruturas cutâneas e subcutâneas atrofiam. Ao RX
observa-se uma osteoporose salpicada e desmineralização epifisária periarticular. Comumente
o paciente exibe alterações emocionais associadas com a proteção da parte afetada.
(3)-fase atrófica: as alterações de sensibilidade e vasomotoras desaparecem e as alterações
tróficas ficam mais evidentes e, em geral, são irreversíveis.
342
Nem sempre os três estágios são bem distintos. A duração é variável, podendo se arrastar
por anos.
O diagnóstico é feito pela clínica, achados radiológicos típicos (de osteoporose no local
envolvido) e cintilografia (que mostra acúmulo de substâncias radioativas no membro afetado).
O tratamento inclui uma grande variedade de possibilidades terapêuticas; nenhuma delas é
realmente efetiva. Utilizam-se bloqueios simpáticos únicos ou em série, simpatectomia, uso de
bloqueadores e/ou corticoides em altas doses por um curto período de tempo. Outras drogas
que podem ser utilizadas são os bisfosfonatos e a calcitonina, gabapentina, pregabalina,
clonidina, antidepressivos além de terapia física. Mobilização precoce em pacientes com I.A.M.
ou A.V.C. é a melhor medida preventiva em indivíduos com tendência para desenvolver esta
síndrome. Em pacientes com fratura de Colles, o uso de vitamina C parece ajudar a evitar o
aparecimento desta entidade.
FIGURA 27.4- Edema de mão unilateral e difuso- em síndrome de dor regional complexa.
Periartrite do ombro - Sob este nome genérico existe um grande número de patologias: a
bursite subacromial, tendinites, capsulite adesiva, ruptura do manguito rodador do ombro etc...
Estas patologias são frequentemente denominadas de ombro doloroso.
Antes de estudarmos as patologias do ombro, convém rever alguns aspectos relevantes da
anatomia dessa região.
A articulação glenoumeral é uma articulação sinovial com marcada discrepância entre a
área de superfície da curvatura da cavidade glenoide e a face da cabeça do úmero. Em outras
palavras, é uma articulação "rasa"; só uma pequena porção da cabeça do úmero está em contato
com a cavidade glenoide. A cápsula articular tem paredes finas e é bastante frouxa; o seu
retesamento com o braço pendente previne o seu deslocamento para baixo e, a sua frouxidão
permite o movimento de deslize da articulação escapulo umeral. O tendão da cabeça longa do
músculo bíceps adentra na cápsula, mas não penetra na cavidade sinovial, ou seja, é
intracapsular e extra sinovial.
Chama-se manguito rodador do ombro ou bainha músculo tendínea ao conjunto dos
músculos supra-espinhoso, infra-espinhoso, redondo menor e subescapular. (A ação rotatória
destes músculos se faz em torno de um ponto situado no centro da cabeça do úmero. Não é a
rotação de sua diáfise!). Há uma abertura na porção anterior deste manguito rodador entre o
supra-espinhoso e o subescapular através do qual passa o bíceps, sua bainha e uma invaginação
da cápsula sinovial. Esta abertura é reforçada pelo ligamento córaco-umeral e o ligamento
transverso do úmero. No tendão do manguito rodador do ombro existe uma zona crítica, que é
o ponto de maior força de extensão, na qual ocorrem lacerações com facilidade.
343
B
A
Figura 27.6 (A) Sinal do arco; (B) manobra de Yergason
A B
FIGURA 27.7- (A) Sinal de Popeye ( ruptura do tendão do bíceps) ; (B)- Calcificação na
projeção do supra espinhoso
Artrite glenoumeral - É causada por qualquer das doenças reumáticas que afetem ombro como,
por exemplo: AR, EA, artrite séptica etc...
Tumores do ombro.
Dor visceral referida - São vistas em casos de infarto do miocárdio, aneurisma de aorta,
colescistites e outras situações que façam irritação do músculo diafragma.
Referências
Anderson BC. Office Orthopedics for Primary Care: Diagnosis, 3rd, WB Saunders, Philadelphia 2005.
Johnson TR. The shoulder. In: Essentials of Musculoskeletal Care, Snider RK. (Ed), American Academy of Orthopaedic
Surgeons, Rosemont 1997.
346
MEMBRO SUPERIOR
Dedo em gatilho - É uma tumefação fusiforme do tendão flexor superficial quando este passa
sobre a cabeça de um metacarpiano. Em geral esta tumefação se acompanha de uma constrição
na bainha tendinosa que resulta em bloqueio do dedo em flexão (como em posição de "apertar
o gatilho"). Não é raro que, para que o paciente possa estender o dedo, ele precise do auxílio da
outra mão, o que geralmente acarreta um estalido com dor. A etiologia é variada. É mais comum
em pacientes diabéticos e nos que executam tarefas repetitivas com as mãos fechadas como
por ex.: jogar cartas, leitura prolongada com virada rápida de páginas, cavalgar segurando as
rédeas etc... Além disso, pode estar associada com outras patologias como AR, osteoartrite,
ocronose e contratura de Dupuytren. O tratamento é feito com restrição das atividades
repetitivas, fisioterapia e infiltração local com corticoide e anestésicos. Em casos rebeldes pode-
se indicar cirurgia.
durante tarefas que exijam flexão com aplicação de força. Cirurgia pode ser feita nos casos
avançados com comprometimento funcional importante, mas, infelizmente, a taxa de
recorrência é alta. Existe uma associação interessante da contratura de Dupuytren com
pequenas “almofadinhas” de tecido adiposo sobre as interfalangianas proximais (Garrod’s
pads), as quais têm etiologia desconhecida. A contratura de Dupuytren pode ser vista, também
em membros inferiores.
A B
Figura 28.2- (A)- Contratura de Dupuytren; (B)- tenossinovite de De Quervain
Cotovelo de tenista - Este termo serve para designar dor e hipersensibilidade na região do
epicôndilo lateral do cotovelo. O paciente apresenta queixas de dor quando segura objetos ou
faz o movimento de supinação do braço. Não é raro que se queixe que derruba facilmente
objetos mais pesados porque a "mão está mais fraca" Ao exame físico vê-se dor à palpação do
epicôndilo lateral e diminuição da força do aperto de mão. É uma doença ocupacional
envolvendo carpinteiros, jardineiros, dentistas etc... Não é raro que estes mesmos pacientes
apresentem, também, tendinites do ombro e lombalgia de origem miofascial. Esta afecção tem
este nome por ser comum em jogadores de tênis novatos que seguram a raquete com muita
força nas cortadas realizadas com o braço dominante (novatos dão cortadas da maneira errada,
com o cotovelo apontado para a rede. Bons jogadores não têm este problema...)
O tratamento é feito com reconhecimento e afastamento dos fatores agravantes, uso
de ataduras de apoio durante as tarefas que exijam esforço. Anti-inflamatórios não hormonais
e analgésicos resolvem muito pouco, mas infiltração local com corticoide resolve a maioria dos
348
Bursite olecraniana – A inflamação da bursa olecraniana que ocupa a face posterior do cotovelo.
Pode ser causada por gota, artrite reumatoide, sepsis ou traumatismos. Bursite traumática pode
resultar de pressão no local, quando o cotovelo é firmado contra uma área dura. (É chamado
vulgarmente de cotovelo de "fofoqueira" que finca o cotovelo nas bordas da janela para
conversar com as vizinhas...) Nos casos suspeitos de bursite por cristal ou por infecção deve-se
proceder à punção e análise do líquido sinovial. O tratamento está na dependência da causa. Em
processos traumáticos o paciente deve ser informado de que os cotovelos devem ser mantidos
fora dos braços de cadeiras e poltronas. Pode-se considerar o uso de protetores de borracha.
Infiltração local com corticoides pode ser necessária (mas deve-se garantir antes, de que não se
trata de um processo séptico). Em casos selecionados pode se proceder à excisão cirúrgica da
bursa.
Periartrite do ombro – Este grupo de doenças encontra-se descrito junto com ombro doloroso,
constante no capítulo de cervicobraquialgia (capítulo 27).
(A) (B)
FIGURA 28.3 – (A) Epicondilites lateral e medial do cotovelo. (B) -Bursite olecraniana
TÓRAX
MEMBROS INFERIORES
Bursite trocantérica - A bursa trocantérica profunda situa-se entre o tendão do músculo glúteo
maior e a proeminência póstero-lateral do trocânter maior. Existe também uma bursa mais
superficial situada diretamente sobre o trocânter maior. Ambas podem se inflamar, provocando
349
dor que é caracteristicamente pior à noite, que se acentua com exercício e quando o paciente
cruza as pernas. Por causa da dor local, o paciente se queixa de que não consegue se deitar
sobre o lado afetado. Esta situação, em geral, se sobrepõe a outras patologias de região lombar
e membro inferior que causem distensão da musculatura regional ou provoquem micro traumas
na região. O diagnóstico é feito pelo achado de dor local à palpação. A flexão e extensão do
quadril estão livres de dor, mas esta aparece ao se fazer a rotação externa combinada com
abdução. O tratamento consiste na infiltração local com corticoides, evitar a pressão sobre o
local e a realização de exercício para alongamento da musculatura dos glúteos (Ex: encostar o
joelho no peito).
A B C
FIGURA 28.4 (A) Buriste trocantérica; (B) bursite pré patelar; (C) bursite anserina.
Fasciíte plantar - É uma das causas mais comuns de dor no pé. A fáscia profunda (aponeurose
plantar) consiste em um tecido espesso, branco perolado, com fibras longitudinais intimamente
ligadas à pele. A porção central é mais espessa e se prende ao processo medial da tuberosidade
do calcâneo; distalmente se divide em 5 faixas: uma para cada dedo do pé. O sintoma é de dor
na região do pé, pior ao iniciar a deambulação. Ao exame físico existe dor localizada, o que é a
chave para o diagnóstico. O examinador promove dorsiflexão dos pododáctilos com uma mão,
mantendo a fáscia tensa e, ao mesmo tempo, com o indicador palpa ao longo do comprimento
desta, delimitando os pontos dolorosos.
A agressão à fáscia costuma acontecer após saltos, períodos prolongados em pé, em
pacientes com pé plano ou obesos. É comum em bailarinos e ginastas de exercícios aeróbicos.
Na metade dos casos existe esporão do calcâneo associado (nada mais é que uma ossificação
350
da fáscia no seu ponto de inserção no calcâneo). Podem existir situações em que há uma doença
reumática subjacente como A.R., espondilite, gota etc... O tratamento inclui o uso de sapatos
apropriados com suporte para o arco plantar e palmilhas; infiltração local com corticoides e
anestésicos.
Hallux valgus- È uma deformidade bastante comum no pé. Sua característica é desvio medial da
cabeça do primeiro metatarsiano e desvio lateral do hallux. Por causa desta alteração, o
segundo pododáctilo é forçado dorsalmente podendo se tornar um dedo em martelo. Esta
condição é encontrada em povos civilizados que usam sapatos com bicos afilados. É mais comum
em mulheres. A bursa sobre a proeminência óssea medial pode se infectar secundariamente ou
se inflamar por compressão causada por sapatos mal ajustados. O tratamento consiste no uso
de sapatos adequados, órteses e, eventualmente, quando os sintomas são muitos, há indicação
cirúrgica.
Dedo em martelo - É uma desordem adquirida que resulta, em geral, da pressão de sapatos
rígidos ou de um hallux valgus já existente. Mais raramente é congênita. Consiste na fixação em
flexão plantar da interfalangiana proximal geralmente acompanhada de dorsiflexão da
metatarsofalangiana e da interfalangiana distal. A deformidade é, em geral, bilateral, e o dedo
mais envolvido é o segundo.
A B C
FIGURA 28.4 – (A) Esporão de calcâneo e calcificação da inserção do tendão de Acchilles; (B)- Hállux
valgus; (C) Hállux valgus e dedo em martelo.
A
B
FIGURA 28.6 Manobras para síndrome do desfiladeiro (A)-Adson (B) mãos ao alto.
Síndrome do túnel carpiano - Ocorre quando existe compressão do nervo mediano ao nível do
punho. Os achados mais comuns são parestesias (formigamento com queimação) matinais na
distribuição do nervo mediano. O paciente acorda e eleva ou sacode a mão, na tentativa de
recuperar a sensibilidade. Os sintomas podem ser apenas sensoriais ou podem incluir
incoordenação motora. O comprometimento motor costuma trazer maiores dificuldades para
execução dos movimentos mais delicados, como os de pinça, e os usados para escrever ou
segurar objetos pequenos. Os sintomas costumam ser piores pela manhã ou após movimentos
em que se faça uso repetitivo dos punhos, como p. ex., dirigir, tricotar ou andar de bicicleta por
um tempo prolongado. O mais comum é que o paciente se queixe de parestesias nos três dedos
médios da mão (na realidade no 2º, 3º e metade interna do 4º dedo). Atrofia tenar é um achado
mais tardio Algumas vezes os sintomas podem ser referidos no antebraço e até no braço, devido
à possibilidade de existência de algumas fibras recorrentes do nervo mediano, que após passar
pelo túnel do carpo, voltam em direção ao antebraço.
A B
FIGURA 28.7 - Síndrome do túnel do carpo - (A)- distribuição das parestesias (B) atrofia tenar em
caso avançado.
Esta condição pode ser uni ou bilateral. A bilateralidade é mais frequente, embora nem
sempre o paciente se queixe disto, podendo ser um achado de eletromiografia. Quando
353
unilateral existe uma tendência para se localizar no lado dominante. No quadro 28.1, as causas
mais comuns de síndrome do túnel carpiano.
Algumas manobras ajudam a fazer o diagnóstico, embora não sejam muito sensíveis As
mais usadas são a manobra de Tinel e a manobra de Phalen. O teste de Tinel consiste na
ocorrência de formigamento sem dor, após o examinador dar pancadinhas na superfície flexora
do punho. A manobra de Phalen consiste em pedir ao paciente que encoste o dorso das mãos
com a ponta dos dedos apontadas para baixo e o punho flexionado ao máximo, por 60 segundos.
Um teste positivo consiste no aparecimento de parestesias ao longo do trajeto do mediano. A
eletromiografia é um teste bem mais sensível e infiltrações locais podem ser usadas como teste
terapêutico. O ultrassom com medida da área do nervo mediano é um exame rápido e fácil de
ser realizado.
O tratamento se resume em medidas conservadoras como uso de talas nos punhos,
abstinência de atividades agravantes, uso de AINHs e diuréticos e infiltração local com
corticoides e anestésicos. Em casos de falência do tratamento clínico ou em casos mais severos,
com atrofia da musculatura da região tenar, está indicado o tratamento cirúrgico.
Síndrome do túnel do tarso - Resulta do encarceramento do nervo tibial posterior quando este
passa pelo retináculo flexor na face medial do tornozelo. Sob este mesmo retináculo, além do
nervo tibial posterior, estão os tendões dos flexores longos dos dedos e do flexor longo do
hallux, vasos e os nervos plantares medial e lateral. A queixa do paciente é de dor em
queimação, parestesias e formigamento da superfície plantar e da porção distal dos pés,
principalmente no dorso do 2, 3 e 4pododáctilos e ocasionalmente no calcanhar. Mais
raramente a dor pode se irradiar para a panturrilha. Esta compressão pode ser causada por
traumatismos, A.R. ou outras patologias inflamatórias, tumores, fratura ou luxação do calcâneo,
talus ou maléolo medial. O teste de Tinel, no qual o nervo é percutido com o martelo, reproduz
as queixas do paciente. Confirmação diagnóstica é obtida pela eletromiografia. O tratamento
354
A B C
FIGURA 28.8 (A) Meralgia parestésica; (B) Síndrome do túnel do tarso; ( C) Neurinoma de Morton.
Referências:
Bonde JP et al. Understanding work related musculoskeletal pain: does repetitive work cause stress symptoms. Occup Environ
Med 2005; 62:41-8.
Rempel DM, et al. Work-related cumulative trauma disorders of the upper extremity. JAMA 1992; 267:838-42.
356
Capítulo 29 - Fibromialgia
CLÍNICA
A queixa mais comum no paciente com fibromialgia é a de: “dói tudo!”. Todavia, no início
ela pode começar por alguma área anatômica mais localizada criando diferentes formas de
apresentação. Estas estão resumidas abaixo:
Apresentação articular - Estes pacientes se apresentam com dor articular primária e podem
mesmo ter artralgias ao exame físico. Comumente têm sensação subjetiva de edema, principal-
mente em mãos, joelhos, com piora pela manhã. Edema de joelhos é frequentemente referido
como restrito à face medial da articulação, infrapatelar ou peripatelar. Quando o paciente refere
ter edema, o médico suspeita freqüentemente de doença inflamatória, criando confusão dia-
gnóstica. A maioria destes pacientes tem também, dor lombar. Ao exame físico são encontrados
pontos gatilhos e nunca se vê sinovite verdadeira.
Apresentação miálgica - Um grupo menor de pacientes se apresenta com dor muscular, tanto
em musculatura proximal como distal de extremidades superiores e inferiores. O diagnóstico
diferencial aqui é com polimiosite e polimialgia reumática. Estudos eletromiográficos e enzimas
musculares são normais. À interrogação aparecem dores em outras áreas músculo-esqueléticas.
EXAME FÍSICO
Uma questão que se impõe é a sobre o grau de pressão a ser aplicado quando se
pesquisam os pontos sensíveis. Sugere-se que a força de aplicação seja em torno de 4 Kg, ou
seja, o suficiente para deixar branca a metade do leito ungueal de quem aplica o teste. O número
de pontos sensíveis presentes costuma ser maior nas mulheres, naqueles que têm depressão e
naqueles que têm distúrbios do sono e não se correlaciona com o grau de dor generalizada. A
quantidade de pontos sensíveis que um paciente com fibromialgia apresenta já foi considerado
importante para se fazer diagnóstico dessa doença. Todavia, observou-se que certo número de
pacientes não possui ou possui apenas poucos pontos sensíveis, o que gerou certa
“desvalorização” desse achado.
358
DIAGNÓSTICO
IDG ou índice de dor generalizada: Assinalar as áreas onde o paciente sentiu dor na última semana. O
resultado será a soma do número de áreas. Cada local vale um ponto.
Mandíbula E Braço D Quadril E Perna E Abdome
Mandíbula D Braço E Quadril D Perna D Dorso
Ombro D Antebraço D Coxa E Cervical
Ombro E Antebraço E Coxa D Tórax
Na realidade, a fibromialgia pode coexistir com outras doenças sendo conhecida neste
caso como fibromialgia secundária. Nesta situação, os exames laboratoriais podem apontar para
a doença associada. A síndrome da fadiga crônica se assemelha, em muito, a fibromialgia. Estes
pacientes, caracteristicamente, têm uma infecção viral aguda seguida de debilidade e fadiga
após exercícios. Cursa com mialgias, distúrbios do sono, febrícula, adenopatias e faringite.
Embora se aceite que a síndrome da fadiga crônica tem uma etiologia viral, isto nunca ficou
provado.
PATOGÊNESE
Até o momento não existe uma explicação satisfatória para a etiologia da fibromialgia.
Alguns pontos conhecidos são:
359
Predisposição genética- Parentes de primeiro grau de pacientes com fibromialgia têm 8,5 vezes
mais chances de ter esta doença. Genes candidatos a explicar esta predisposição são o de
transportador da serotonina, genes da catecolamina metiltransferase (associados com dor e
com depressão) etc.
TRATAMENTO
O termo dor miofascial é usado para designar pontos altamente dolorosos à pressão em músculo
ou em fáscia que, quando estimulados, dão origem à dor referida. O paciente pode apresentar
queixas de dificuldade de movimentos gerada pela dor. É uma entidade clínica muito comum,
às vezes designada erroneamente como espasmo muscular.
Diferentemente da fibromialgia, a dor miofascial afeta só uma região do organismo e,
no local de maior sensibilidade pode-se palpar um nódulo endurecido. Como a pressão do
nódulo desencadeia a dor referida, este é chamado de ponto gatilho. Pontos gatilhos parecem
resultar de traumas locais (às vezes, microtraumas repetitivos) ou de descondicionamento
muscular por uma vida sedentária.
O tratamento pode ser feito com infiltrações locais com anestésicos (não é necessário
usar corticoide).
No quadro abaixo, as principais diferenças entre fibromialgia e dor miofascial.
Referências
Arnold LM, Hudson JI, Hess EV et al. Family study of fibromyalgia. Arthritis Rheum 2004; 50:944-52.
Gracely RH, et al. Functional magnetic resonance imaging evidence of augmented pain processing in fibromyalgia. Arthritis Rheum
2002; 46:1333-43
McCall-Hosenfeld JS, et al. Growth hormone and insulin-like growth factor-1 concentrations in women with fibromyalgia. J
Rheumatol 2003; 30:809-14.
McLean SA, et al. Momentary relationship between cortisol secretion and symptoms in patients with fibromyalgia. Arthritis Rheum
2005; 52:3660-9.
362
EPIDEMIOLOGIA
PATOFISIOLOGIA
É importante reconhecer que, o aspecto final do processo de osteoartrite que afeta uma
articulação não depende do processo que desencadeia o evento. Por outro lado, uma vez
iniciada a doença, ela pode evoluir até destruição da articulação, pode parar em qualquer ponto
do processo evolutivo ou mesmo, em situações raras, pode reverter.
O achado inicial mais evidente é na cartilagem articular embora, com odecorrer dot
empoe sta doença possa ser considerada como uma doença da articulação toda. A matriz
demonstra perda em conteúdo de proteoglicano, os quais têm sua capacidade de agregação
alterada e um aumento no teor de água. As cadeias de sulfato de condroitina estão encurtadas
e a composição dos glicosaminoglicanos é anormal. O condrócito, que normalmente é uma
célula amitótica, divide-se para formar clones celulares. Estas células aumentam a sua produção
de colágeno tipo II e de proteoglicanos, numa tentativa de reparar o processo destrutivo da
363
FATORES GENÉTICOS - Dos componentes genéticos estudados, mutações no gene para o Col-2
A1 (da cadeia alfa-1 do colágeno tipo 2) em algumas famílias está associado ao aparecimento
de osteoartrite primária. Pelo estudo de gêmeos monozigóticos, sabe-se que outros genes com
certeza estão envolvidos, mas estes ainda não estão corretamente identificados
Os nódulos de Heberden (osteoartrite das interfalangianas distais) são transmitidos via
autossômica recessiva no homem e dominante na mulher. A osteoartrite primária do quadril é
mais frequentemente bilateral do que seria esperado se ocorresse ao acaso e, também, mais
comum em parentes de pacientes com OA primária do quadril do que em controles.
Além disto, existem algumas desordens metabólicas, geneticamente determinadas, que
favorecem a ocorrência de artrose secundária, tais como: alcaptonúria, doença de Wilson,
hemocromatose etc...
outro lado etc. O aumento no peso corporal também está associado a um aumento no
aparecimento da osteoartrite de articulações, principalmente joelhos. A associação com
osteoartrite de quadril não é muito evidente.
CLÍNICA
Os sinais e sintomas são geralmente localizados. Tipicamente afeta uma única ou poucas
juntas. Dor, no início da doença, acontece após o uso e é aliviada pelo repouso. Com o evoluir
ela aparece com um uso mínimo e até mesmo sem ele. É descrita como uma dor surda e
profunda sobre a articulação afetada. Como a cartilagem é uma estrutura desprovida de raízes
nervosas, a dor provavelmente se origina em outras estruturas articulares e periarticulares. Em
alguns pacientes, pode se dever ao estiramento de terminações nervosas existentes no
periósteo que cobre os osteófitos. Em outros, parece se dever a fraturas de estresse que
ocorrem na região subcondral ou hipertensão intramedular causada por trabéculas hipertróficas
subcondrais que alteram o fluxo sanguíneo. Espasmo muscular e instabilidade articular
causando estiramento da cápsula articular são outras causas de dor.
Rigidez na junta envolvida, de manhã ou após períodos de imobilidade, também é
comum, mas, geralmente, é de curta duração (menos do que 20 minutos).
Sinovite é outro achado que pode ser causa de dor. Pode se dever à fagocitose de
fragmentos de cartilagem e de osso oriundos da superfície óssea ou da liberação de
macromoléculas da cartilagem (glicosaminoglicanos, proteoglicanos). Outra causa para si-novite
é a concomitância de artrite por cristal, em geral, por pirofosfato de cálcio ou hidroxiapatita.
Perda de mobilidade aparece à medida que os tecidos da articulação reagem se
hipertrofiando.Perda de congruência da cartilagem leva à instabilidade articular.
O exame físico revela sensibilidade local, aumento de partes moles ou hipertrofia óssea.
Crepitação (ou sensação de atrito de osso contra osso) é um achado característico.
Pode ou não existir derrame articular, e, quando este está presente é, em geral, de pequeno
volume.
A palpação pode demonstrar aumento de temperatura local. Desuso por dor pode ser
causa de atrofia muscular periarticular. Em casos avançados, deformidades grosseiras,
hipertrofia óssea, subluxação e perda da mobilidade articular podem dominar o quadro.
A impressão mais comum que se tem é a de que a osteoartrite seja uma doença de
evolução progressiva e inexorável, mas, existem casos documentados nos quais a doença se
366
estabiliza ou até mesmo regride. As articulações mais comumente envolvidas são as que
suportam peso, ou aquelas repetitivamente utilizadas tais como, mãos (interfalangianas
proximais e distais), 1ª metacarpo-falangiana, coluna, quadris, joelhos e 1ª tarsometatarsiana.
A B
C D
E F
FIGURA 30-1 Osteoartrite de mãos.(A), (B) e (C)- nódulos de Henerden e Bouchard. (D)
Cisto sobre nódulo de Heberden (E)- Hot nodes (F) – Rizoartrose (quadratura da mão).
367
FIGURA 30.3 – DISH- Osteofitose ( pelo menos 4 espaços) com manutenção da altura do
disco.
368
Existe uma ossificação dos ligamentos, principalmente do ligamento espinal anterior, dando
uma aparência de "vela derretida" na porção anterior dos corpos vertebrais. O local mais
envolvido é a coluna torácica baixa. Para que se possa fazer o diagnóstico de DISH é necessário
o envolvimento de 4 ou mais vértebras. Os espaços discais estão bem preservados. Esta
síndrome afeta mais homens e incide em indivíduos de meia idade e velhos. Os pacientes são
comumente assintomáticos e o diagnóstico acaba sendo um achado radiológico. Esta tendência
para ossificação pode ser observada em locais extra espinais, como por exemplo, em ligamentos
ilio-lombares e sacro-tuberoso e inserção de ligamentos em processo olecraniano, calcâneo,
trocanter etc. Parece ser mais uma causa de confusão com osteoartrite do que uma variante
verdadeira, uma vez que não existe degeneração em cartilagem.
PÉS - Osteoartrite da 1ª tarsometatarsiana é bem frequente (joanete) e pode ser agravada pelo
uso de sapatos apertados. É comum a formação de uma bursa adventícia no lado medial da
articulação, a qual pode inflamar e causar dor.
EXAMES DE IMAGEM
USO DA CINTILOGRAFIA - O uso da cintilografia (Tc99) não parece ser muito útil para o
diagnóstico de osteoartrite. O que ela mostra são articulações inflamadas, independentemente
de sua etiologia. Além disto, como este método não mostra a anatomia da articulação, não serve
como acompanhamento evolutivo do processo. Serve para diagnosticar o envolvimento de
certas articulações antes do que elas apresentem clínica.
ULTRASSOM - Embora este teste possa visualizar a cartilagem articular e fornecer dados
quanto à sua integridade, nem todas as superfícies podem ser exploradas.
ARTROSCOPIA - É sem dúvida o teste mais sensível para medir anormalidades da cartilagem. O
problema é que, muitas vezes um líquido sinovial opaco pode obscurecer a visão. Além disto, é
uma técnica invasiva que, embora bem tolerada, sempre enfrenta certo grau de resistência pelo
paciente.
MANEJO DO PACIENTE
MEDIDAS CONSERVADORAS
Manejo da dor - A dor da osteoartrite é gradativa. Inicialmente aparece aos esforços e mais
tarde, até mesmo em repouso. Geralmente existem períodos de dor e de remissão.
O padrão da dor é quem dita o tratamento. Se o suporte de peso ocasiona os sintomas, deve-se
modificar os hábitos do paciente, de maneira que, o suporte de peso seja reduzido. Pode-se
procurar produzir um balanceamento entre atividades e repouso que possa ser aceitável ao
paciente. Uma dona de casa, por exemplo, pode ser encorajada a manter suas atividades desde
que repouse por alguns períodos durante o dia. Excessos tais como sacolas pesadas ao se fazer
compras e viagens, devem ser evitados. Redução de peso de pacientes obesos também é
desejável, embora esta seja uma meta difícil de ser atingida.
Frequentemente é necessário adaptar o ambiente em que o paciente vive para um novo
estilo de vida. Assim, o colchão deve ser firme: não se deve permitir que o paciente coloque
travesseiros ou almofadas sob os joelhos para descanso, o que piora a fraqueza do quadríceps
e favorece contraturas em flexão. As cadeiras e toaletes devem ter seus assentos mais altos do
que as habituais (em média 12 cm) e com braços para facilitar o ato de se sentar e se levantar.
Quando existe dor em joelho ou quadril, o uso de bengalas pode ser útil no alívio da dor. Em
casos de envolvimento unilateral, a bengala deve ser usada no lado contralateral ao envolvido.
A altura da mesma deve ir até o nível do trocanter maior; deve ser larga e dotada de pontas de
borracha não deslizáveis. A parte mais difícil no uso da bengala é a aceitação por parte do
paciente. Usar bengalas pode ter sido elegante e até um sinal de distinção no passado. Hoje em
dia, no entanto, traduz incapacidade. Se existe envolvimento bilateral, o uso de duas bengalas
ou de muletas ou mesmo de um "andador" (apoio com rodas) pode ser benéfico.
Exercícios - Repouso e proteção da articulação devem ser completados com exercícios, com
objetivo de manter a mobilidade e evitar a fraqueza e a instabilidade articular.
Muitos dos pacientes com osteoartrite, pela sua idade avançada, aprendem devagar e
esquecem fácil, por isso os exercícios devem ser simples, de fácil execução. Devem ser feitos por
10 minutos, duas vezes por dia. Os primeiros exercícios para osteoartrite de joelho são
isométricos envolvendo o quadríceps e os músculos glúteos. Contrai-se o músculo e pede-se
para o paciente mantê-lo contraído enquanto conta até cinco. Repetir o exercício 10 vezes. O
segundo exercício é o do levantamento da perna estendida, com o joelho em extensão, até mais
ou menos 45º, também feito 10 vezes envolvendo, alternadamente, ambos os lados. O
quadríceps mantém-se contraído. Se o paciente faz estes exercícios de maneira satisfatória,
então recebe uma tarefa adicional. Para o joelho, um exercício adicional de fortalecimento
muscular, deve ser feito com o paciente sentado à beira do leito com os joelhos fletidos. Cada
joelho é então estendido completamente, de maneira alternada. Pode se adaptar um pequeno
peso no tornozelo, o qual é aumentado gradativamente-.
371
Uso do calor e do frio- Aplicações de calor ou de compressas frias têm por finalidade trazer
analgesia e relaxamento muscular. A termoterapia superficial pode ser aplicada através de
compressas quentes, um banho bem quente, uso de luz ultravioleta ou do forno de Bier. No caso
das mãos, pode ser feita a simples imersão em água quente por 10 minutos, 2 vezes por dia. Já
as aplicações de calor profundo podem ser feitas através de ultrassom, ondas curtas e
microondas. Compressas frias são aplicadas por 10-15 minutos, através de uma bolsa de gelo e
tem efeito principalmente analgésico. Tanto as aplicações de calor como de frio podem ser feitas
antes dos exercícios, facilitando a sua realização.
TERAPÊUTICA MEDICAMENTOSA
INDICAÇÕES CIRÚRGICAS
Troca de uma articulação (colocação de próteses) é reservada par casos com
osteoartrite avançada, nos quais a terapêutica conservadora é ineficaz.
Indicações para prótese total de joelho ou quadril são as seguintes:
• - dor que interfere com o sono;
• - maiores dificuldades ou incapacidade em exercer atividades diárias;
• - uma redução não aceitável da capacidade de andar, usar escadas ou trabalhar.
Antes da intervenção cirúrgica, o paciente deve estar bem informado acerca da
necessidade de fisioterapia pré e pós-operatória, assim como acerca da dor pós-operatória (que
leva de 6 a 8 semanas para desaparecer no quadril e, 10 a 12 semanas para desaparecer em caso
de joelho).O uso de próteses com superfície porosa que permitam o crescimento do osso, de
maneira a fazer uma fixação biológica, tem diminuído os casos de falha da prótese por
afrouxamento da mesma. Artroplastia pode aliviar a dor e melhorar a mobilidade. Osteotomia
é um tratamento cirúrgico mais conservador destinado a eliminar uma sobrecarga anormal de
peso através da correção do alinhamento da articulação. Em pacientes com osteoartrite do
quadril ou do joelho pode trazer alívio da dor. O seu grande benefício é visto em casos não muito
avançados. Remoção artroscópica de fragmentos soltos pode aliviar a dor e prevenir o
"travamento" da articulação. Lavagem da articulação com solução de ringer lactato com a
finalidade de eliminar restos de cartilagem, fibrina, etc, pode trazer alívio por alguns meses em
pacientes refratários a outro tipo de tratamento. Condroplastia (ou artroplastia por abrasão) é
um tratamento que tem ganhado popularidade, embora não existam estudos controlados para
provar a sua eficácia. Consiste na remoção da cartilagem que recobre o osso na expectativa que
se forme uma nova cartilagem. Infelizmente, o tecido fibrocartilaginoso que se forma é um
tecido de qualidade inferior ao da cartilagem hialina que normalmente existe, principalmente
em suas capacidade de suportar forças compressivas e outras formas de stress.
Transplante de condrócito autólogo tem sido feito em casos de osteoartrite de joelho
com bons resultados.
Referências:
Gelber AC. Osteoarthritis . In Imbodem J, Helmann DB, Stone JH (eds). Current rheumatology : diagnosis and treatment. Mac Graw
Hill, New York, 2004. p.309-13.
Zhang Y, et al. Replacement therapy and worsening of radiographic osteoarthritis; the Framingham Study. Arthritis & Rheum
1999;42:397-405.
373
Uma doença óssea metabólica pode ser definida como uma desordem esquelética na qual
o processo patológico é generalizado. Osteopenia é um termo genérico sob o qual se englobam
todas as doenças associadas à perda de osso mineralizado, sem definir o processo responsável
pelo fato. Três formas diferentes de doença óssea metabólica se apresentam como osteopenia:
a osteoporose, a osteomalácia ( ou raquitismo na criança) , a osteíte fibrosa.
Diz se que existe osteoporose quando existe diminuição global da massa óssea. Neste
caso, o osso existente está adequadamente mineralizado. Osteomalácia é uma osteopenia
resultante da mineralização inadequada do osso. Osteíte fibrosa, que é a doença óssea encon-
trada no hiperparatireoidismo, se caracteriza por um aumento na reabsorção osteoclástica do
osso com proliferação de tecido fibroso. A osteoporose é, sem dúvida, a mais comum das três.
O esqueleto não tem somente a função de suporte. Além de ser responsável pela
sustentação estrutural, ele é um importante reservatório de cálcio e bicarbonato e pode ser
chamado a suprir a falta destes elementos em estados de deficiência. Caso esta demanda supere
a capacidade de reserva do osso, a perda exagerada destes componentes pode resultar em
prejuízo da sua estrutura.
Grosseiramente falando, o osso está composto de uma porção externa densa, a cortical,
a qual delimita as cavidades medulares, e pelo osso trabecular, o qual se acomoda dentro do
espaço medular junto com tecido hematopoiético e células de gordura.
O osso cortical é relativamente denso e compreende 85% da massa óssea total; os outros
15 % ficam por conta do osso trabecular. A proporção entre estes dois tipos de ossos varia
conforme a localização do osso. Assim, os ossos do esqueleto apendicular contém alta pro-
porção de osso cortical; já os do esqueleto axial, são ricos em osso trabecular.
A superfície cortical externa está envolta pelo periósteo, um tecido conjuntivo com
potencial osteogênico. A cavidade medular está revestida pelo endósteo (incluindo os canais
que penetram no córtex). O endósteo está em contacto direto com a superfície óssea sendo
frequentemente difícil fazer a sua separação da matriz óssea não mineralizada.
O osso mineralizado está composto por pequenas unidades chamadas de unidades
estruturais ósseas, que representam o produto final de uma área de remodelamento. Entre duas
unidades fica a linha cimentante.
A
FIGURA 31.1 - (A) – Controle do osteoclasto pelo osteoblasto (B)- reabsorção óssea pelo
osteoclasto.
Os ossos constituídos principalmente por osso esponjoso (p. ex: vértebras) são os que se
tornam mais frágeis e, portanto, fraturam com maior facilidade.
São muitos os fatores que influem na perda de massa óssea. Entre eles sabe-se que, na
menopausa, existe um aumento da reabsorção osteoclástica ocasionada pela diminuição dos
níveis de estrógenos e que, com a idade, existe hipofunção do osteoblasto.
Nos capítulos que se seguem, serão estudadas, individualmente, cada uma das
osteopenias e, também, a osteodistrofia renal, que é a doença óssea que aparece nos indivíduos
com insuficiência renal e que se constitui num processo misto de diferentes formas de
osteopenia.
Existem certos métodos bioquímicos que ajudam a avaliar como está acontecendo o
remodelamento ósseo. Estes métodos podem ser divididos em dois grupos principais: os que
avaliam a formação do osso (ou seja, atividade osteoblástica) e os que avaliam a reabsorção do
mesmo (atividade osteoclástica). Estes métodos vêm sendo desenvolvidos com intuito de
permitir um estudo mais adequado do que está acontecendo em pacientes predispostos a
osteoporose antes mesmo que a mesma se estabeleça clinicamente.
Os principais marcadores biológicos de turnover ósseo estão no quadro 31.1
b) osteocalcina (BGP ou proteina óssea Gla): é uma vitamina óssea não colágena cuja síntese é
dependente de vitamina K. Representa 1-2% das proteínas totais do osso. Sua síntese é feita
pelo osteoblasto e está aumentada quando tem estímulo pelo hormônio do crescimento,
vitamina D e fluor. O PTH inibe a sua síntese. Os níveis séricos da osteocalcina variam com a
hora do dia; sua secreção tem uma variação nictemeral sendo maior as 5:30 da manhã e
diminuindo no decorrer do dia. Está aumentada na mulher pós-menopausa como uma
expressão do aumento do turnover ósseo. Aumenta também em lesões óssea blásticas, doença
de Paget etc. Como é metabolizada e excretada pelo rim encontra-se aumentada em casos de
insuficiência renal.
A despeito de sua síntese depender de vitamina K não existem relatos de alterações de
alterações do metabolismo mineral em pacientes fazendo uso de anticoagulantes orais.
377
OSTEOPOROSE
diferenças são mais o reflexo de diferenças de massa óssea do que de velocidade de destruição.
Esta última costuma ser praticamente constante em todos os grupos raciais. Estima-se (a partir
de estudos com gêmeos) que a hereditariedade é responsável por 70-80% da variação
interindividual no pico de massa óssea em ambos os sexos. Isto fica bem claro a quando se nota
a ocorrência familiar de fraturas de colo de fêmur. Todavia os genes que determinam a massa
óssea, a geometria do osso e a sua resistência ainda não foram identificados.
Nutrição - Um suprimento adequado de cálcio é tão importante para manter uma massa óssea
máxima como para alcançá-la. O organismo regula a concentração sérica de cálcio com bastante
precisão. O cálcio extracelular ionizado representa 1% da reserva. Esta é a fração
metabolicamente ativa, tendo uma importância crítica em vários processos metabólicos vitais
tais como reações enzimáticas, comunicação intercelular, transmissão neuronal e neuro-
muscular, contrações musculares, coagulação, etc. O sistema endócrino PTH-vitamina D asse-
gura a concentração desta forma de cálcio dentro de limites estreitos. Se a ingesta de cálcio é
pobre, o organismo usa de suas reservas ósseas acionando a produção do PTH e aumenta a
absorção deste íon através de um aumento na produção de vitamina D ativa (1,25 (OH)2 vit.D3).
A absorção do cálcio depende, na parte proximal do intestino, de vitamina D e na parte mais
distal do mesmo, do gradiente de concentração do cálcio. Nossa principal fonte de cálcio é o
leite. Um copo de leite desnatado proporciona de 250 a 300 mg do elemento. Para um adulto
jovem, o aporte recomendado é de 750 a 1.000 mg/dia. Nas gestantes e mulheres com mais do
que 50 anos o suprimento recomendado é de 1.500 mg/dia. As necessidades do idoso
aumentam porque a absorção de cálcio dependente de vitamina D torna-se menos eficaz com a
idade.
Outro componente importante da dieta é a vitamina D, que é transformada em um
hormônio ativo a 1,25(OH)2 D3. Cerca de metade das nossas necessidades de vit.D provém da
dieta e o restante, de uma reação endógena estimulada pelos raios ultravioletas na pele. A
adição de um grupo OH em C25 ocorre no fígado e a de outro OH em C1 é feita pelo rim de tal
maneira que a disfunção destes dois órgãos pode prejudicar a formação adequada do hormônio
ativo. Tem-se descrito uma diminuição dos níveis séricos de vitamina D ativa em indivíduos
velhos. A razão para isto é especulada e algumas delas seriam: diminuição da ingesta (dieta
inadequada), diminuição de exposição à luz solar e metabolismo renal deficiente. O suprimento
alimentar diário recomendado de vitamina D é de 400 U.I. para adultos jovens. Para idosos são
recomendados 800 U.I./dia. Quantidades maiores podem provocar hipercalcemia.
Desnutrição proteica é outro elemento encontrado em pacientes para osteoporose, as
vezes, associado com alcoolismo. Um excesso de álcool é, por si só, um fator prejudicial. Ele
atua inibindo a ação do osteoblasto. Por outro lado, um excesso de proteínas também parece
trazer um balanço negativo de cálcio. Isto parece depender do fato de que a dieta hiperproteica
causa acidose, que seria tamponada com material retirado do osso. Além disso, a acidose tem
também um efeito estimulatório sobre o osteoclasto.
Bebidas contendo cola são ricas em fosfatos que se ligam ao cálcio e impedem a sua
absorção. Dietas ricas em sódio aumentam a excreção urinária do cálcio.
Atividade física - A atividade diária de suporte do peso do próprio corpo é essencial para a saúde
do esqueleto. É, talvez, o principal fator exógeno que altera o desenvolvimento e
remodelamento ósseo. Assim, a massa óssea acaba sendo diretamente proporcional à massa de
musculatura esquelética. Uma pessoa sedentária, portanto, tem um risco muito maior de se
tornar osteoporótica que outra que pratique exercícios que envolvam o suporte do próprio
peso. Parece que o aumento da carga mecânica, por algum mecanismo ainda desconhecido,
estimula os osteoblastos a depositar mais osso durante o processo de remodelamento do que a
quantia que foi reabsorvida pelos osteoclastos. Uma situação bem ilustrativa disto é a
ocorrência de osteoporose em astronautas pela redução do campo gravitacional , apesar dos
379
mesmos terem uma atividade física intensa. Imobilização (por paralisia ou uso de gessos),
repouso prolongado no leito são causas de perda de massa óssea.
Fatores hormonais- A osteoporose tem sido ligada já desde há longo tempo com a menopausa.
A fase de perda óssea rápida pós-menopausa é revertida pelo uso de estrógenos. Receptores
para estrógeno foram identificados em células ósseas. A dinâmica do metabolismo dos
estrógenos tem recebido uma atenção considerável ultimamente. No fígado humano o estradiol
é oxidado, via citocromo microssomial P 450, para a forma de estrona. A estrona pode seguir
duas vias metabólicas: na primeira, ela é hidroxilada irreversivelmente em C2 e perde a sua
atividade biológica. Na segunda ela é hidroxilada em posição C16 e cria metabólitos ativos.
Qualquer perturbação no sistema enzimático P450 que aumente a produção de hidroxilação em
C2, causa declínio nos efeitos biológicos dos estrógenos, e, vice e versa. Fatores que diminuam
a hidroxilação em C2 levam à maior formação de metabólitos ativos. Dietas ricas em gordura
estão associadas com uma diminuição na hidroxilação em C2 e aumento da hidroxilação em C16
. O fumo estimula a hidroxilação em C e diminui a bioviabilidade dos estrógenos. Calcula-se
2
que o uso de 10 a 15 cigarros por dia, por pelo menos 5 anos, está associado à uma perda óssea
mais rápida e à diminuição de 1,75 anos na idade média da menopausa. O uso crônico de
fenobarbital é outro elemento que aumenta a degradação hepática dos estrógenos.
Outros fatores- A ingesta de café parece estar associada com maior perda de massa óssea. A
cafeína tem efeitos hipercalciúricos. Já a ocorrência de múltiplas gestações e aleitamento parece
exercer um efeito protetor. A obesidade também é considerada um fator de proteção.
CLASSIFICAÇÃO
Osteoporose induzida por drogas - A heparina estimula os efeitos do PTH e acelera a reabsorção
osteoclástica do osso. Isto é dificilmente causa de osteoporose nos pacientes tratados com
heparina para doença tromboembólica, uma vez que o seu uso é por tempo limitado. Também
já foi assinalado que o metotrexate (que tem efeitos calciúricos) pode promover osteopenia.
Outras drogas implicadas são: o glicocorticoide, os anticonvulsivantes, tetraciclina e a
isoniazida. Os anticonvulsivantes ativam o sistema de citocromo P450, o qual está envolvido no
metabolismo da vitamina D, causando deficiência da mesma. Já o uso de diuréticos tiazídicos
tem sido considerado benéfico, uma vez que estes compostos diminuem a calciúria. Existe a
observação de que, indivíduos idosos, em uso de tiazídicos para tratamento de hipertensão
arterial, têm incidência de fraturas de quadril 1/3 menor do que indivíduos que não o utilizavam.
Osteoporose pelo alcoolismo - São múltiplos os fatores que ocasionam a ocorrência de osteopo-
rose no alcoólatra. O álcool está frequentemente associado com doença hepática crônica, a qual
prejudica o metabolismo de vitamina D. Além disso, é causa de doença pancreática, que, por
promover má absorção, acaba por prejudicar a absorção de cálcio. Tem se observado, também,
que a ingestão aguda de álcool tem um efeito hipocalcêmico em animais, embora no homem o
significado deste achado seja desconhecido. Some-se a tudo isso o fato de que o álcool tem um
efeito tóxico direto no osteoblasto, prejudicando sua função. Outros fatores sugeridos como
coadjuvantes seriam um aumento nos níveis de cortisol após a ingesta do álcool, um
metabolismo prejudicado deste hormônio pelo fígado e deficiência de testosterona levando à
um hipogonadismo.
382
Osteoporose das corredoras de maratona e das atletas de elite - Embora esteja bem claro de
que exercício em pequenas quantias é benéfico para a manutenção da massa óssea, paradoxal-
mente, o exercício físico em alta escala está associado com indução de amenorreia ou de ciclos
anovulatórios e, consequentemente, com a ocorrência de osteoporose. O mecanismo não é
claro. Parece que os exercícios (e também as dietas) muito rigorosos estão associados com um
prejuízo no padrão de liberação dos hormônios indutores de formação de gonadotrofinas pelo
hipotálamo. A diminuição de amplitude e de frequência de liberação destes hormônios acaba
por ocasionar a cessação dos ciclos menstruais e diminuição dos níveis de estradiol circulantes.
As alterações osteoporóticas que aparecem nestas mulheres estão relacionadas com a duração
da amenorreia. Um estudo feito por RIGGS et al. mostrou que a densidade óssea de um grupo
de atletas amenorreicas, com idade média de 25 anos, era equivalente ao de não atletas com
51 anos. Calcula-se que 3 a 10% das mulheres que correm maratonas e que 30 a 50% das atletas
de elite estão em amenorreia.
Pacientes com anorexia nervosa e com hiperprolactinemia, situações estas associadas a
anovulação, sofrem de alterações semelhantes na massa óssea.
Osteoporose da gravidez - Um pequeno número de pacientes tem sido descrito com uma forma
de osteoporose durante a gravidez. Este tipo de osteopenia tende a ser transitório e limitado ao
período de gravidez, não recorrendo necessariamente em outras gestações.
Osteoporose da doença hepática crônica - Doença hepática crônica pode estar associada à
osteoporose e a causa disto é multifatorial. O metabolismo de vit.D está prejudicado nestes
pacientes (prejuízo da 25 hidroxilação). Além disto, se houver obstrução biliar, a absorção da
vitamina D que é lipossolúvel, não é feita adequadamente. Outros fatores que podem se associar
são a insuficiência pancreática (outra causa para má absorção) e o alcoolismo.
QUADRO CLÍNICO
Dor - É uma das queixas mais características, principalmente em coluna vertebral. A dor pode,
ou não, estar associada com as alterações radiológicas da doença. Quando existem fraturas
compressivas (totais ou parciais) a origem da dor é óbvia, mas nem sempre isto acontece.
Acredita-se que nesta outra situação a dor se deva a microfraturas de osso trabecular. Espasmo
muscular é um fator contribuinte para a dor nas costas. A dor não é comum em outros locais,
embora a osteoporose seja um processo generalizado.
O curso evolutivo do processo doloroso é variável. Em alguns pacientes após um ataque
agudo de poucas semanas podem existir longos períodos de alívio. A dor por si só pode ser causa
de imobilização, o que agrava a osteoporose.
Fraturas - Ocorrem com trauma mínimo. As fraturas vertebrais são comumente compressivas e
aparecem inicialmente em região média do tórax. Causam dor de início brusco que se intensifica
quando o paciente está em pé, tosse, espirra ou defeca e que se alivia com o repouso. A
mobilidade da coluna está muito limitada.
Fraturas da porção proximal do fêmur são mais sérias e suas complicações diminuem não
só a qualidade, mas também o tempo de vida do paciente. Acontecem quando o paciente cai
para trás e são mais comuns nos pacientes que têm uma coxa mais comprida. Fraturas de
extremidade distal do antebraço são mais raras e acontecem quando o paciente cai para frente,
com a mão estendida.
Existe a observação de que se o paciente sofre uma fratura ele tem um risco maior de
desenvolver novas fraturas. Este risco é tanto maior quanto mais precocemente as primeiras
fraturas aparecerem. Embora uma baixa massa óssea pareça ser a explicação mais óbvia para
esta “repetição” de fraturas, existem outros fatores que influem como: imobilização (causando
mais osteoporose) e alteração na distribuição de peso, promovidas pelas possíveis
deformidades.
Vale a pena prestar atenção no fato de que existem fatores hereditários na
determinação de uma maior ou menor massa óssea em determinados locais. Desta maneira a
história familiar de fratura pode ser considerada como um fator de risco para a mesma. Uma
história materna de fratura do quadril aumenta em duas vezes o risco de fratura osteoporótica.
Deformidades - Fraturas da coluna vertebral seguem uma sequência específica de eventos que
acaba por levar a deformidades características. As fraturas compressivas ocorrem inicialmente
em região torácica média levando a um aumento da cifose e dando ao paciente o aspecto de
"corcunda". Isto é associado à perda de altura.
À medida que o processo progride e aparecem mais fraturas, o abdome fica
proeminente. Se existirem fraturas em vértebras lombares inferiores, a caixa torácica pode vir a
se apoiar nos ossos da pelve.
INVESTIGAÇÃO LABORATORIAL
Pacientes com osteoporose primária não têm alterações nos níveis séricos de cálcio e
fósforo ( e nisto contrasta com osteomalácia e osteíte fibrosa). A dosagem de cálcio urinário e
da proteína óssea Gla (osteocalcina) no soro serve para separar uma osteoporose de alto
turnover, daquela de uma de baixo turnover, mas, no entanto, não se chegou a um acordo
quanto à utilidade prática deste teste.
Em casos suspeitos de osteoporose secundária os exames solicitados são os dirigidos para
diagnóstico da doença básica.
ESTUDOS RADIOLÓGICOS
vertebral). Para que ocorram alterações na luscência do osso aproximadamente 30% do tecido
ósseo deve ter sido perdido. A variabilidade de fatores técnicos e o conteúdo de tecidos moles
sobre a região podem tornar difícil a valorização deste dado. Em casos severos, alterações
típicas em vértebras mostram uma luscência maior no centro da vértebra quando comparada
com as placas subcondrais das margens, as quais ficam mais densas.
As alterações vistas em osso trabecular se devem ao fato de que o processo reabsortivo
é maior em trabéculas do osso horizontal do que vertical. A acentuação relativa destas
trabéculas verticais dá ao osso uma aparência estriada que, em vértebras, simula hemangioma.
Esta discrepância de reabsorção está relacionada aos efeitos biomecânicos e bioelétricos do
suporte de peso. (Isto não acontece na osteomalácia, servindo como um elemento de
diferenciação).
As alterações de forma de corpo vertebral devem ser distinguidas das variações normais
do contorno vertebral assim como de exames tecnicamente impróprios.
A B
C D
FIGURA 31.4 - (A), (C) e (D) - Fratura vertebral ; (B)- nódulo de Schmorl
Outros achados que sugerem osteoporose são: vértebra em cunha (com redução de altura
no bordo anterior, mas não no posterior), vértebra bicôncava ou "vértebra de peixe" (com
385
redução de altura na porção central produzindo uma concavidade exagerada) e fraturas com-
pressivas.
As vértebras de peixe resultam da pressão dos discos intervertebrais superior e inferior
sobre uma estrutura óssea enfraquecida. Numa situação mais avançada, o núcleo pulposo pode
até penetrar no interior da vértebra formando os nódulos de Schmorl.
As fraturas vertebrais por compressão podem ser classificadas em 3 tipos:
por compressão central, bicôncava,
compressão cuneiforme anterior (frequente na forma pós menopausa) em níveis dorsal médio
e lombar superior),
por compressão transversal simétrica, produzindo um aspecto em "bolacha". Esta última,
quando aparece sem outros sinais de osteoporose, deve levantar suspeita para uma patologia
distinta, como por exemplo, doença metastática. Fratura isolada acima de T4 é outro aspecto
chamativo para doença maligna.
Densitometria por rx de energia dupla (DEXA) - É o método mais utilizado atualmente, como
rotina, para a medição de massa óssea. Este exame pode ser repetido com frequência
permitindo um acompanhamento do paciente, uma vez que tem alta sensibilidade. A irradiação
recebida é mínima. Mede a massa óssea em coluna lombar e fêmur.
Densitometria por ultrassom - Esta técnica baseia-se na atenuação que um feixe de ultrassom
sofre ao atravessar uma estrutura óssea e, na mudança de sua velocidade de transmissão
através desta estrutura. Na prática, analisa-se a densidade do calcâneo.
O ultrassom quantitativo além de ser uma técnica de baixo custo, mostra bem quando
existe osteoporose, e a resposta a tratamento. Entretanto a sua correlação com a quantidade
de massa óssea é modesta. Isto acontece porque esta técnica mede algo a mais como a
elasticidade e geometria das trabéculas que, aliás, também são elementos importantes na
determinação do risco de fratura.
386
Tomografia computadorizada quantitativa (QTC) - Neste teste obtém-se uma visão seccionada
da coluna vertebral que permite a medição do osso trabecular. O grande problema com este
tipo de teste é que o resultado pode ser obscurecido pela presença de tecido subcutâneo e de
gordura intramedular, esta última muito comum na população idosa. A exposição à radiação é
relativamente alta e a aceitação pelo paciente não é muito boa pelo desconforto gerado durante
a realização do exame.
TRATAMENTO
A meta do tratamento da osteoporose é evitar fraturas. Não resta dúvida que, em oste-
oporose, o melhor tratamento é o preventivo. Os fatores a serem atendidos são basicamente os
pertencentes a 2 grupos:- manutenção da massa óssea; correção das causas de queda ou de
outros elementos predisponentes a fraturas.
Para se manter uma massa óssea adequada são necessários: alcançar a densidade óssea
máxima geneticamente possível antes da maturidade. É feito com suprimento de cálcio e
atividade física adequados e redução dos fatores de risco tal como fumo e álcool. Deve-se
prosseguir durante a idade adulta com estes hábitos benéficos para manter a massa óssea
obtida , e , aumentar a ingesta de cálcio com o passar dos anos.
Os múltiplos fatores que influem na construção e manutenção da massa óssea são os que
determinam, em última instância, qual o paciente com risco de desenvolver osteoporose. O
protótipo da pessoa com maiores probabilidades de ter osteoporose tipo 1 é a mulher branca,
de pequena estatura, sedentária, fumante, nulípara, na pós-menopausa e com história de
deficiência de cálcio na dieta durante toda a vida.
e não é bem absorvido em pacientes que também fazem uso de inibidores de receptor H2 de
histamina ou de bomba de proton. Para estes últimos o melhor é utilizar o citrato ou o lactato
de cálcio. O uso do citrato de cálcio é também a forma recomendada para os que têm problemas
com cálculos urinários. A formação de cálculos, hipercalciúria e hipercalcemia são raros na
osteoporose tipo 1 sintomática. No entanto, todos os pacientes que recebem suplemento de
cálcio devem ser aconselhados a manter um volume urinário alto. É interessante notar que a
reposição de cálcio é mais efetiva se for feita à noite porque isto impede o aumento noturno do
PTH.
Os suplementos de vitamina D são essenciais em pessoas com deficiências da vitamina.
Além disso, a sua reposição ajuda a normalizar a absorção de cálcio que está prejudicada na
osteoporose tipo 2. O uso rotineiro não deve ultrapassar 800 U.I.diárias. O calcitriol (1-25 di-
hidroxivitamina D) tem sido proposto recentemente, para o tratamento da osteoporose, na
dose de 0,25 g duas vezes ao dia. Seu efeito parece ser benéfico naquelas pessoas com doença
moderada. Como o seu uso pode causar hipercalcemia e hipercalciúria a prescrição deste tipo
de medicamento deve ser acompanhada periodicamente pela dosagem de cálcio, fósforo e
fosfatase alcalina no soro.
Calcitonina - O uso da calcitonina está indicado em casos de perda óssea rápida. Isto pode ser
sugerido pelo início agudo de sintomas, pelo aumento no cálcio urinário e excreção de hi-
droxiprolina. A calcitonina age principalmente nos osteoclastos, os quais têm receptores para
este hormônio, diminuindo a reabsorção óssea. Seus efeitos são rápidos. Em 10 minutos verifica-
se que, in vitro, os osteoclastos perdem a sua borda serrilhada, a qual é um sinal de ativação. As
dificuldades da administração da calcitonina são: o seu alto custo e a necessidade de aplicação
parenteral (subcutânea ou intramuscular). O uso intranasal (sob forma de spray) vem sendo
utilizado cada vez mais frequentemente. As doses preconizadas são de 50 a 100 U/dia.
Embora seu uso seja aparentemente benéfico, a maioria dos estudos tem um pequeno
tempo de observação (até 18 meses). Questiona-se este benefício em longo prazo. Existem
dados que mostram que, após 30 meses de uso, a calcitonina não difere, em nada, do uso de
cálcio isolado. Esta terapêutica é bem tolerada, sem efeitos colaterais a longo termo. Náuseas
transitórias e sensação de "flush" facial têm sido descritos após as injeções e são mais comuns
em mulheres que em homens.
Um aspecto interessante (e oportuno) é o efeito analgésico deste tipo de medicamento,
o qual parece ser independente de sua ação sobre o osso. Por isto este medicamento é uma
ótima escolha em casos de osteoporose com fraturas muito dolorosas.
Denosumabe - É um biológico que inibe o RANK –L que é um ativador do osteoclasto. Seu uso é
endovenoso e semestral.
Outras medidas - Os exercícios devem ser encorajados neste grupo de pacientes principalmente
os com suporte do peso e exercidos contra resistência. Dificilmente eles são capazes de
aumentar a massa óssea após os 35 anos, mas, no entanto, são fundamentais para a
manutenção da já existente. São aconselhados os exercícios aeróbicos e a bicicleta ergométrica
389
com resistência crescente. Caminhar é menos eficiente que atividades com resistência, mas com
certeza é mais efetivo que o sedentarismo. Hidroginástica e natação são relativamente
ineficazes para prevenir a perda óssea, mas são úteis para fortalecimento da musculatura e,
portanto, reduzem risco de quedas e fraturas.
Nunca é demais enfatizar os cuidados preventivos em relação às quedas. Pessoas idosas
têm os reflexos mais lentos além de, frequentemente, se usarem medicamentos com ação
sedativa e/ou hipotensora, os quais podem causar tonturas. Sempre é bom recomendar o uso
de uma barra de apoio no box do banheiro, evitar tapetes soltos, brinquedos espalhados e
assoalhos muito lisos. Uma lâmpada de cabeceira sempre acesa à noite evita batidas e quedas
durante as idas noturnas ao banheiro. O uso de calções acolchoados reduz o número de fraturas
de quadril.
OSTEOPOROSE MASCULINA
Enquanto a osteoporose na mulher tem sido objeto de cuidadosa atenção por parte dos
clínicos e pesquisadores, a osteoporose masculina tem sido relegada a um segundo plano, só
passando a receber alguma forma de atenção nos últimos anos. Embora a taxa de fraturas na
mulher seja mais alta do que a do homem, isto não significa que osteoporose masculina não seja
causa importante de morbidade e mortalidade masculinas.
Algumas diferenças na fisiopatologia da osteoporose do homem e da mulher procuram
explicar as diferentes taxas de fraturas entre os sexos. São elas:
1- os homens têm ossos maiores porque crescem mais do que as mulheres;
2- os homens perdem menos osso durante o processo de envelhecimento;
3- os homens não têm um equivalente distinto à menopausa feminina;
4-os homens caem menos que as mulheres;
5- os homens vivem menos que as mulheres e por isso não têm tempo de sofrer fraturas.
Os ossos masculinos são maiores que os femininos porque os homens têm um período
de crescimento pré-puberal pelo menos dois anos mais longo do que os das mulheres e o seu
391
estirão de crescimento durante o período puberal é maior. Assim sendo, o diâmetro do osso
masculino é maior do que o do feminino A taxa de fratura é inversamente proporcional ao
diâmetro de um osso tubular. Quando a densitometria é feita pelo DEXA ou por emissão de
fotons duplos, a densidade óssea masculina também aparece como sendo maior do que a
feminina. Entretanto este é um achado falso porque estes testes não corrigem o seu valor final
para a profundidade do osso e, este sendo maior é, também, mais profundo.
Quanto à quantidade de perda óssea perdida durante o envelhecimento, vê-se que, o
homem realmente perde menos osso cortical do que a mulher. Isto acontece porque a mulher
tem uma maior reabsorção endocortical e o homem tem uma maior aposição óssea
subperiosteal durante o processo de remodelamento. No que concerne ao osso trabecular a
diferença é principalmente qualitativa. Na mulher a estrutura trabecular se rompe pela criação
de grandes lacunas de reabsorção osteoclástica. No homem existe um afilamento da estrutura
trabecular sem perda da continuidade das mesmas. A perda da estrutura tridimensional das
trabéculas favorece a ocorrência de fraturas por achatamento como as vistas nas vértebras.
Embora os homens não tenham um equivalente distinto à menopausa feminina com a
sua perda óssea acelerada, eles sofrem alterações importantes no nível dos hormônios
relacionados com a idade. Calcula-se que cerca da metade dos homens acima dos 50 anos
tenham níveis baixos de testosterona. Isto se deve à diminuição de função das células de Leydig
e também, à diminuição de produção do LH pela hipófise. Assim sendo, os hormônios sexuais
podem estar relacionados, no homem, com o que seria considerado “perda óssea relacionada à
idade”.
A maneira pela qual a diminuição dos níveis de andrógenos se relaciona com a
diminuição de massa óssea não está esclarecida. Acredita-se que a testosterona se transforme,
parcialmente, em estrógenos e estes possam intermediar sua ação em massa óssea. Outra
explicação é a de que a falta de testosterona perturbe o funcionamento do eixo GH-ILGF-1. O
ILGF-1 (ou fator de crescimento semelhante à insulina –1) é um fator de crescimento elaborado
em resposta a vários estímulos, principalmente o GH (hormônio do crescimento). No osso, este
ILGF-1 teria a ação de aumentar a replicação dos osteoblastos e aumentar a transcrição genética
dos genes produtores de colágeno. Indivíduos com níveis baixos de testosterona têm declínio
de ambos os hormônios e a resposta de GH aos exercícios está diminuída.A concentração de
estrógenos no homem está associada com uma maior densidade óssea e a sua redução em
homens idosos pode ser causa de perda de massa óssea. O estrógeno parece comandar a
reabsorção óssea que aparece com a idade enquanto tanto a testosterona quanto o estrógeno
são importantes na obtenção do pico de massa óssea no sexo masculino.
A maioria dos pacientes masculinos com osteoporose tem uma causa identificável para
a sua doença. Veja na tabela 31.5 as causa mais comuns de osteoporose no homem.
OSTEOMALÁCIA
PATOGÊNESE - Para que ocorra a mineralização é necessário que existam cálcio e fosfato em
níveis séricos suficientes. Outras condições fundamentais são: funções de metabolismo e
transporte dos osteoblastos e dos condrócitos intactas; matriz colágena adequada; ocorrência
de fosforilação ou outras modificações nos componentes da matriz e um nível baixo de
inibidores da mineralização tais como pirofosfatos e agregados de proteoglicanos. No início da
osteomalácia, o osteoblasto produz uma quantidade normal de matriz osteoide, mas se esta não
se calcifica, a produção de osteoide também diminui. Os ossos tornam se incapazes de suportar
o stress mecânico habitual e tendem a se curvar (osteoamalácia= osso mole).
Embora se tenha certeza de que a vitamina D é essencial para que ocorra a mineralização,
não se sabe exatamente como é que isto ocorre. Pacientes com osteomalácia, aos quais se
administra parenteralmente quantidades suficientes de cálcio e fósforo, têm uma mineralização
irregular, não homogênea diferente da que ocorre com o fornecimento de vitamina D. Isto
sugere que esta vitamina, não só tem um papel no fornecimento dos íons necessários, mas,
também, no processo de mineralização em si. Esta vitamina também parece ser necessária para
a diferenciação dos osteoclastos a partir da célula tronco. Vitaminas D2 e D3 são ingeridas com
os alimentos. A vitamina D3 pode ser sintetizada na pele, a partir de 7 dihidrocolesterol, o qual
é ativado pela luz ultravioleta. Estes compostos não são hormonalmente ativos, mas a conversão
hepática destes para 25 OH colecalciferol (25OH vit. D), produz um metabólito capaz de au-
mentar a absorção intestinal de cálcio. No rim, esta 25 OH vit.D é transformada em 1,25 (OH)2
vit.D ou calcitriol, que é a forma mais ativa da vitamina. Níveis altos de PTH promovem a
formação de 1,25 (OH)2 vit. D.
Insuficiência dos metabólitos ativos de vit.D levam a um nível sérico de cálcio baixo, o que
estimula a formação de PTH, que, por sua vez, tenta aumentar o nível retirando cálcio do osso.
Este aumento de PTH sérico acaba por promover um aumento de excreção renal de fosfatos, o
que, por seu turno, promove hipofosfatemia. Quando a concentração de fosfatos cai abaixo de
um nível crítico a mineralização fica inibida.
A depleção de fosfatos é, por si, só outra causa de osteomalácia e isto é visto em pacientes
que consomem grandes quantidades de antiácidos não absorvíveis ou em pacientes com perda
de fosfatos pela urina (em geral por defeitos de reabsorção tubular). Nestes pacientes não
393
ETIOLOGIA- Como já foi visto anteriormente existem duas causas principais para a osteomalácia.
São elas: (A)- falta de vitamina D; (B)- níveis baixos de fosfato. As causas de ambas as situações
estão reunidas, de maneira sumária, abaixo:
Desnutrição- Alguns dos alimentos mais ricos em vit. D estão listados abaixo, no quadro 31.6.
Má absorção - A vitamina D é lipossolúvel sendo pouco absorvida em situações que cursam com
esteatorréia, como p.ex., insuficiência pancreática, doença hepática colestática, pós-
gastrectomia, doenças da parede intestinal como doença celíaca, enterite regional e síndrome
do intestino curto.
Desordens tubulares com deficiência de fosfato: Existe uma grande variedade de desordens
tubulares do túbulo renal proximal. É o chamado raquitismo resistente à vitamina D. Pode estar
ligado ao cromossoma X.
QUADRO CLÍNICO
interessante feito na Suíça mostrou que, mulheres de um asilo e com sintomas de deficiência de
vitamina D, tinham, muitas vezes o diagnóstico de dores de origem psicossomática. Estas
desapareceram com a reposição da vitamina.
DIAGNÓSTICO
Aspectos radiológicos - Os aspectos radiológicos mais característicos são vistos ao nível da placa
epifisária. Esta placa aumenta em espessura, fica abaulada e mal definida em sua borda
metafisária (devido à deficiência de mineralização do local). O osso trabecular é anormal
aparecendo "borrado", semelhante ao aspecto de vidro moído. As diáfises estão finas e
arqueadas. Um aspecto bastante típico é o aparecimento das chamadas zonas radioluscentes
de Looser, que ocorrem frequentemente nos locais de penetração de uma artéria no osso, e
resultam do stress mecânico proveniente da pulsação destes vasos.
Pacientes com desordens tubulares que causam hipofosfatemia podem apresentar um
aumento ao invés de diminuição na densidade óssea.
TRATAMENTO
OSTEÍTE FIBROSA
Os sintomas mais encontrados são os de dor óssea e muscular, dor articular, fraqueza,
fraturas, rigidez matinal e sinovites induzidas por depósito de pirofosfato de cálcio. Sintomas
de hipercalcemia (náuseas, vômitos, poliúria, alterações mentais, cólica renal, etc.) estão
presentes dependendo da causa.
A B
C D
FIGURA 31.6. Hiperparatireodismo. (A) Aspecto do crânio em sal e pimenta. (b) Coluna em
rugger jersey, (c) Condrocalcinose; (d) Tumor ósseo marrom.
397
OSTEODISTROFIA RENAL
EPIDEMIOLOGIA
É difícil saber a prevalência exata desta doença uma vez que muitos pacientes são
assintomáticos e não recebem o diagnóstico. Calcula-se que aconteça em 5% das pessoas acima
dos 55 anos (estes dados são da Inglaterra onde a doença parece ser um pouco mais comum).
A prevalência aumenta com a idade. É rara em pessoas de cor negra e de raça asiática.
398
CLÍNICA
Esta enfermidade afeta mais os ossos do esqueleto axial. Os locais preferidos são pelve,
coluna e fêmur. Envolvimentos da tíbia e do crânio também são comuns. Muitas vezes a doença
é assintomática e seu diagnóstico é feito por achados radiológicos em estudos feitos por outros
motivos.
Pacientes com doença sintomática queixam-se de dor, deformidades e alterações
neurológicas. A dor tem várias origens. Pode resultar da hipervascularização local (podendo
estar associada à sensação de calor local), distorção do periósteo pelo osso espessado e fraturas.
Dor nas costas é uma queixa frequente. É causada por aumento de volume das vértebras, perda
da lordose lombar fisiológica, alterações de marcha pela doença em outros locais e por
compressões radiculares. As deformidades são assimétricas. Ossos longos como fêmur e tíbia
ficam curvados causando desalinhamentos nas pernas. Ossos da mandíbula ou da região frontal
também se tornam maiores. A lesão neurológica mais comum é a surdez neurossensorial
causada por compressão do 8º par craniano ou por disfunção coclear secundária a alterações
pagéticas no osso temporal. Envolvimento da base craniana pode causar hidrocefalia ou
compressão na região do tronco encefálico.
Fraturas podem complicar com sangramento excessivo porque o osso é hipervascular. A
hipervascularidade pode ser causa de síndromes hiperdinâmicas e de roubo vascular.
Degeneração neoplásica é outra complicação encontrada; é rara aparecendo em menos de 1%
dos casos.
DIAGNÓSTICO
É feito pelos aspectos radiológicos que são típicos. Encontra-se uma mistura de áreas
líticas e esclerose. Áreas líticas em aspecto de chama de vela em ossos longos são características.
O osso fica espessado e aumenta de volume. Radiografias auxiliam, também, na detecção de
fraturas.
Cintilografia óssea é útil para a determinação de todos os locais envolvidos, mas não é útil
para o diagnóstico da doença.
Do ponto de vista bioquímico encontra-se um aumento da fosfatase alcalina a qual deve
ser acompanhada para análise da efetividade do tratamento. Medidas de reabsorção óssea
399
TRATAMENTO
Referências:
Canalis E, et al. Glucocorticoid-induced osteoporosis: pathophysiology and therapy. Osteoporos Int 2007; 18:1319-28.
de Torrente de la Jará G,et al. Female asylum seekers with musculoskeletal pain: the importance of diagnosis and treatment of
hypovitaminosis D. BMC Fam Pract. 2006 Jan 23; 7: 4.
Fuller K, et al. TRANCE is necessary and sufficient for osteoblast-mediated activation of bone resorption in osteoclasts. J Exp Med
1998; 188: 997-1001
Imboden JB. Medications. In Imbodem J, Hellmann DB, Stone JH (eds). In Current Rheumatology diagnosis and treatment, New York,
2004, pp.423-51.
Lukert BP, Raisz LG. Glucocorticoid induced osteoporosis. Rheum Dis Clin North Am, 1994, 20 :629-50.
Lukert BP. Osteoporosis - a review and update. Arch. Phys. Med Rehabil 1982, 63: 480-7.
McClun MR, et al. Denosumab in postmenopausal women with low bone mineral density. N Engl J Med 2006; 354:821-31.
Moe S, et al. Definition, evaluation, and classification of renal osteodystrophy: a position statement from Kidney Disease: Improving
Global Outcomes (KDIGO). Kidney Int 2006; 69:1945-53
Simonet WS, et al. Osteoprotegerin: a novel secreted protein involved in the regulation of bone density. Cell 1997; 89:309-19
400
EPIDEMIOLOGIA
Está comprovada associação entre infecções de vias aéreas superiores por estreptococo
β-hemolítico do grupo A e a Moléstia Reumática. A faringite e a infecção cutânea (impetigo) são
as formas mais comuns de infecção causada pelo estreptococo A em seres humanos. A infecção
da faringe está implicada com a ocorrência da MR; a infecção de faringe e de pele, com a
glomerulonefrite pós-estreptocócica.
Embora prevalência de portadores de estreptococos em orofaringe não seja muito diferente
em população de países economicamente desenvolvidos e de países em desenvolvimento, a
febre reumática incide muito mais nestes últimos. Fatores tais como más condições de higiene
e alimentação, moradias nas quais vários indivíduos vivem muito próximos uns dos outros
(permitindo uma transmissão interpessoal do micro-organismo) são decisivos na interação
hóspede-parasita. Essas condições, além de facilitar a exposição do indivíduo ao micro-
organismo em questão, permitem que ocorra uma maior sensibilização do hóspede aos
produtos do estreptococo A, fatores estes que parecem guardar relação indireta com a
ocorrência de Moléstia Reumática. Existem, também, vários componentes genéticos que
favorecem o aparecimento da doença em determinadas populações.
Acredita-se que só 3% dos pacientes com infecções estreptocócicas graves e que 0,1%
dos com infecção suave desenvolvem MR.
A MR não tem predisposição racial ou étnica. Embora não incida preferente em nenhum
dos dois sexos, existem certas manifestações que, inexplicavelmente, tendem a ocorrer mais em
um sexo do que em outro. Assim, a coreia aparece igualmente em meninos e meninas pré-
puberais mas esta manifestações está ausente no adulto do sexo masculino e exagerada durante
a gravidez. Outro exemplo disto é a ocorrência mais frequente de estenose mitral na mulher e
lesões aórticas no homem.
CLÍNICA
Como já foi dito anteriormente, a febre reumática cursa sempre com uma infecção
estreptocócica antecedente embora 1/3 dos pacientes não se apercebam disto. Entre o início
dos sintomas da faringite e os da febre reumática existe sempre um período de latência de, em
média, 3 semanas (raramente mais do que 5 semanas ou menos do que uma). Este período
latente não encurta com os ataques reumáticos recorrentes e neste lapso de tempo não existem
evidências clínicas ou laboratoriais de inflamação ativa. O paciente típico é criança ou adulto
jovem (entre 5 a 15 anos) sendo raro que tenha menos do que 2 anos de idade. É, também,
difícil que um paciente venha a ter um surto após os 15 anos a menos que já tenha tido outros
surtos anteriores. As chamadas manifestações maiores da MR são : artrite, cardite, nódulos
subcutâneos, eritema marginatum e coreia.
401
A artrite é o sintoma mais comum. Aparece em cerca de 3/4 dos pacientes. Sua
frequência aumenta com a idade, sendo, muitas vezes, a única manifestação em adultos.
Envolve grandes articulações sendo os joelhos e os tornozelos as mais comprometidas e os
quadris as menos afetadas. Envolvimento de pequenas articulações também é menos comum ;
o da coluna, mais raro ainda. No ataque clássico, várias articulações são afetadas em uma rápida
sucessão de envolvimentos - cada uma por um pequeno período de tempo - resultando numa
poliartrite migratória. Cada articulação fica afetada por mais ou menos uma semana até que os
sintomas comecem a diminuir espontaneamente, e o ciclo de envolvimento de todas as
articulações autolimita-se, em geral, em 2 a 3 semanas, no máximo 6 semanas. A artrite
acompanha-se frequentemente de febre. A lesão articular da MR não cursa com dano articular
permanente, com exceção do chamado reumatismo de Jaccoud. Esta condição é secundária a
uma fibrose periarticular e não a uma sinovite verdadeira e causa deformidade nas articulações
metacarpofalangianas. Para que a artrite seja aceita como um dos critérios diagnóstico da MR
deve envolver pelo menos duas articulações. Às vezes, o paciente apresenta formas atípicas de
envolvimento articular, poliartralgias migratórias ou não, que podem passar despercebidas;
nem sempre não são devidamente valorizadas sendo interpretadas pela população como
"dores de crescimento".
A cardite é mais comum em crianças (75-90%) e rara em adultos (15%).É
caracteristicamente uma pancardite, ou seja, envolve todas as camadas do coração (endo, mio
e pericárdio). Na sua forma mais severa pode levar à morte por insuficiência cardíaca, mas, na
maioria das vezes, é menos intensa e o aspecto dominante do quadro clínico é a ocorrência de
fibrose valvular. A despeito de suas consequências, que são bastante graves, a cardite reumática
aguda nem sempre causa sintomas. Assim sendo, não é raro que seja diagnosticada através de
achados de exame físico ou muitos anos depois, quando o paciente vem a desenvolver sintomas
e sinais de um envolvimento crônico do coração, sem se lembrar de ter tido um ataque
reumático prévio. Quando a cardite se manifesta existe, geralmente, uma taquicardia
desproporcional à febre, ritmo de galope ou os sons cardíacos podem assumir um timbre
especial, semelhante ao do coração fetal, em "tic-tac" (ritmo embriocárdico). Ocasionalmente
aparecem arritmias, bloqueios, extrassístoles, atrito pericárdico e alterações
eletrocardiográficas. Aumento do intervalo PR ocorre com igual frequência na poliartrite com
ou sem cardite. Um diagnóstico definitivo de cardite é feito quando existe um ou mais dos
seguintes itens: (A)- aparecimento (ou alteração de caráter) de um sopro orgânico; (B)-aumento
do tamanho do coração; (C)-sinais de insuficiência cardíaca congestiva; (D)-pericardite
diagnosticada pela presença de atrito pericárdico ou por derrame demonstrado à
ecocardiografia. Cardite reumática significante quase sempre está associada à presença de
sopros. O sopro mais comum é o sopro de regurgitação mitral (sistólico mitral) causada por
inflamação e edema de válvula. Outro sopro característico de cardite aguda é o sopro de Carey
Coombs: - que é um sopro mesodiastólico mitral de baixa frequência. Sopros diastólicos aórticos
são menos frequentes na forma aguda da doença.
Os nódulos reumáticos não são patognomônicos da doença porque podem ocorrer em
outras patologias (Ex. AR, LES). Estão associados com cardite grave e raramente aparecem como
manifestação isolada da doença. São redondos, firmes, indolores, móveis, de 0,5 a 2,0 cm.
Localizam-se em proeminências ósseas e sobre tendões, principalmente em superfícies
extensoras das mãos e pés. Podem aparecer, também, sobre corpos vertebrais, punhos, joelhos
e couro cabeludo. Têm tendência para serem menores, mais discretos e menos persistentes do
que os nódulos de artrite reumatoide. Desaparecem em 1 a 2 semanas. O aparecimento de
nódulos é raro em pacientes de clima mais quente; não são vistos em adultos.
Eritema marginatum é a manifestação menos comum da moléstia reumática. Como a
coreia não está relacionado à lesões histológicas típicas, e, embora apareça precocemente no
curso clínico da doença pode persistir por um período longo, mesmo quando outras
manifestações e sinais clínicos da inflamação ativa já desapareceram, não sofrendo influência
de medicação anti-inflamatória. São lesões em anel, róseo-brilhantes que vão se disseminando
402
serpiginosamente pela pele, sem prurido e sem dor. Não apresenta áreas de induração, nem de
elevação, desaparecendo completamente à digito compressão. Têm caráter evanescente.
Localizam-se mais em tronco e partes proximais das extremidades, poupando face. Raramente
se estendem além dos cotovelos e joelhos. Os pacientes que apresentam o eritema marginatum
costimam ter cardite associada. Este tipo de lesão de pele não é exclusivo da MR; aparece
também em casos de septicemia, glomerulonefrites e reações alérgicas a drogas.
Já a coreia de Sydenham, também chamada de coreia minor, ou, popularmente, de
Dança de São Vito é uma desordem do sistema nervoso central caracterizada por movimentos
irregulares, sem propósito, abruptos e acompanhados de fraqueza e instabilidade emocional.
É uma manifestação tardia da MR e, geralmente, quando ela aparece, as outras manifestações
de caráter agudo já desapareceram. Se o paciente tem só a coreia, sem os outros sintomas, diz-
se que o paciente tem uma coreia pura. Como já comentado antes, a coreia na infância afeta
crianças de ambos os sexos; após a adolescência parece ser apanágio do sexo feminino.
Sua frequência tem declinado nos últimos anos quando comparada com a artrite e cardite e a
razão para isto é desconhecida. Os movimentos da coreia são abruptos e erráticos
desaparecendo durante o sono. Estes movimentos involuntários afetam todos os músculos do
corp, mas em mãos, pés e face estes se tornam mais aparentes. A expressão facial muda
constantemente; a língua quando protusa lembra um "saco de vermes" indo para dentro e para
fora, contribuindo para a fala coreiforme típica, em stacatto e explosiva. A escrita fica
prejudicada e torna-se impossível de ser lida. O paciente é incapaz de manter contração tetânica
o que é demonstrado pedindo-se para o paciente prender as mãos do examinador. Isto
promove o aparecimento de contrações espasmódicas repetitivas e pronação exagerada, o que
tem sido descrito como Sinal da Ordenha. Ocasionalmente, a coreia afeta só a metade do corpo.
A fraqueza ocasiona perda da capacidade de segurar objeto e causa quedas frequentes; quando
exagerada pode lembrar quadros de paralisia. Labilidade emocional e alterações de
personalidade prenunciam o início da coreia. Não são raros surtos de raiva, crises de choro,
comportamento inapropriado com hipertividade e falta de cooperação. Ao exame físico,
além dos sinais que já foram mencionados, pode-se ver um reflexo patelar do tipo pendular.
Quando o paciente tenta erguer os braços sobre a cabeça ocorre pronação dos mesmos
(Sinal do Pronador).O EEG mostra ondas anormais, lentas. A crise da coreia pode durar de 1
semana a 2 anos mas, em média, desaparece em torno de 15 semanas. Dificilmente a coreia é
vista junto com a artrite e geralmente coexiste com casos prévios e/ou concomitantes de
cardite. As provas de atividade inflamatória e mesmo os títulos de anticorpos anti-
estreptocóciccos estão normais. Isto se explica pelo longo período de latência desta
manifestação, que pode ser de até 6 meses após a ocorrência da estreptococcia.
São manifestações menos comuns (a)- febre: a temperatura está aumentada (38.5 a
40º C) em quase todos os surtos reumáticos; (b)- dor abdominal: ocorre no início ou um pouco
antes do surto. Lembra a dor associada a outras condições em que há inflamação mesentérica
microvascular aguda, tais como sepsis, choque anafilático, reações transfusionais etc; (c)
epistaxes: no passado epistaxes eram registradas com grande frequência em pacientes com
cardite. No entanto, os relatos atuais referem um declínio muito significativo em sua incidência;
(d) pneumonite reumática: pode aparecer junto com casos de cardite grave e deve ser
diferenciada das manifestações de insuficiência cardíaca esquerda.
ACHADOS LABORATORIAIS
O diagnóstico da febre reumática não pode ser estabelecido por testes laboratoriais,
mas estes podem ser úteis de duas maneiras: (A)-demonstração de que houve uma infecção
estreptocócica prévia; (B)- documentação da presença ou persistência de um processo
inflamatório. Na demonstração de uma infecção estreptocócica prévia, as culturas de
orofaringe são normalmente negativas.
403
DIAGNÓSTICO
O diagnóstico da febre reumática nem sempre é bem claro e, por isso, o médico muitas
vezes se depara com um problema, uma vez que é importante o reconhecimento do primeiro
surto para que se possa prescrever a profilaxia secundária subsequente. Talvez seja esta a causa
de um excesso deste diagnóstico, muito comum em nosso meio. Uma situação muito
encontrada é a administração prematura de corticoides e anti-inflamatórios antes mesmo de
que os sinais e sintomas tenham se tornados inequívocos. Como ainda não dispomos de um
agente curativo, não adianta ter pressa em suprimir as manifestações da doença antes do seu
diagnóstico de certeza. Baixo, os critérios usados para o diagnóstico de FR.
São exceções para uso dos critérios e, nas quais pode ser feito o diagnóstico
presuntivo de FR as seguintes situações : (A) - paciente com coreia como manifestação
única. Esses pacientes devem ter ecocardiograma feito para verificar possível presença de
404
cardite. (B)- cardite indolente após infecção estreptococica; (c) febre reumática recorrente:
neste caso pode ser difícil fazer diagnóstico de cardite aguda num coração já doente.
CURSO E PROGNÓSTICO
O curso clínico da febre reumática é variável, mas, em geral, existe uma sequência
característica das manifestações maiores bem como uma duração previsível. A maioria dos
surtos começa com sintomas articulares. A cardite, quando ocorre, acontece na fase inicial do
surto, dentro das primeiras semanas. A última manifestação a aparecer é a coreia, estando os
nódulos subcutâneos em uma faixa intermediária. A média de duração de um surto
normalmente não ultrapassa três meses, mas quando uma cardite grave está presente, a
atividade reumática pode persistir por 6 meses ou mais. Em surtos subsequentes, o padrão da
M.R. tende a se repetir. Assim, se o paciente teve cardite no primeiro surto, com certeza, terá
cardite nos próximos.
A idade de início da doença e gravidade da cardite influencia na sua cronicidade.
Crianças com menos do que 3 anos de idade que desenvolvem MR geralmente têm cardite.
PATOGÊNESE
TRATAMENTO
recomendado, mas o seu uso deve ser cauteloso em crianças por causa de seus efeitos
colaterais.
Após o surto inicial o paciente deve ser mantido em profilaxia secundária. Profilaxia
secundária é um termo utilizado para descrever a proteção contra recorrências reumáticas por
profilaxia anti-estreptocócica contínua. A forma mais eficaz e preconizada pela American Heart
Association é o uso de injeções intramusculares de penicilina benzatina (de acordo com o peso)
a cada 3 semanas. Profilaxia oral tem sido recomendada com pen-V oral ou sulfadiazina. Em
pacientes alérgicos à penicilina a droga de eleição é a eritromicina.
Quanto mais novo é o paciente, maiores são as chances de recidiva. Depois da
puberdade, a frequência de recidiva diminui com a idade. A maioria das recidivas ocorrem
dentro de 5 anos a partir do ataque inicial e são mais comuns em pacientes com cardite. Diante
destes fatos, a OMS recomenda que, todo paciente com M.R. sem cardite deve receber
tratamento profilático por pelo menos 5 anos após o ataque inicial e no mínimo até que
complete 21 anos.
Já nos pacientes com doença cardíaca a profilaxia deve se estender até, pelo menos os
40 anos de idade. Naqueles com cardiopatia reumática crônica tem se apregoado o seu uso por
períodos bem mais prolongados, até durante a vida toda. Não se deve esquecer que pacientes
que foram submetidos à cirurgia de troca de válvula continuam expostos a recidivas da doença
e devem continuar recebendo profilaxia secundária.
Referências
Casey, JR et al. Higher dosages of azithromycin are more effective in treatment of group A streptococcal
tonsillopharyngitis. Clin Infect Dis 2005; 40:1748-55.
Gewitz MH, et al. Revision of the Jones Criteria for the diagnosis of acute rheumatic fever in the era of Doppler
echocardiography: A scientific statement from the American Heart Association. Circulation 2015; 131:1806 -18.
Paradise JL et al. Efficacy of tonsillectomy for recurrent throat infection in severely affected children. Results of
parallel randomized and nonrandomized clinical trials. N Engl J Med 1984; 310:674-83
406
QUADRO CLÍNICO
FORMA SISTÊMICA - Esta forma era denominada de doença de Still e este nome continua sendo
usado comumente na prática. Nestes casos, nem sempre existe artrite na forma inicial da
doença, o que complica o diagnóstico. Tipicamente o paciente apresenta febre alta (diária,
vespertina ou com dois picos no dia). Durante os picos febris, a criança parece gravemente
enferma. Supreendentemente, assim que a temperatura baixa, ela se comporta como se não
estivesse doente. A febre desta doença é intermitente e se faz acompanhar de um rash
cutâneo. O rash é formado por pequenas máculas de 2 a 5 mm de diâmetro, rosa-salmão e é
visto mais comumente em tronco, porção proximal das extremidades e em áreas submetidas à
pressão. As máculas são rodeadas por um pequeno halo de palidez. Quando a lesão é muito
grande, também existe uma área de palidez central. Este rash tem um aspecto evanescente e
migratório; lembra urticária, mas não é pruriginoso. Seu aparecimento pode ser precipitado por
estresse e por banhos quentes. Embora seja uma manifestação típica da forma de início
sistêmica, esta lesão de pele pode ser vista, com menor frequência, nos casos de início
poliarticular. É a combinação de febre com o rash que permite o diagnóstico nos casos em que
não aparece a artrite. A forma de início sistêmico pode se acompanhar de hepato-
esplenomegalia, linfadenomegalia, pericardite e outras serosites. Não é raro que muitas vezes,
esta forma de doença se apresente como uma febre de origem desconhecida. Esta forma pode
ter um curso monocíclico, policíclico ou permanente. Nesta última situação podem aparecer
deformidades articulares importantes.
407
FORMA POLIARTICULAR - A AIJ é considerada como poliarticular quando, em seu início, afeta
mais do que 4 articulações. Embora possa ter um início agudo, esta forma tem, mais
comumente, um curso indolente, envolvendo grandes articulações como os joelhos, punhos,
cotovelos e tornozelos, e também, as pequenas articulações das mãos. Crianças não costumam
se queixar de dor sobre as articulações afetadas. É mais comum que se note dificuldades na
marcha, irritabilidade e posturas de defesa. O envolvimento da mão guarda semelhança com o
envolvimento da artrite reumatoide do adulto, embora, em crianças, seja mais comum o
envolvimento das interfalangianas distais e o desvio seja mais radial do que ulnar. Envolvimento
da coluna cervical é habitual com perda da mobilidade neste local. O envolvimento da têmporo-
mandibular é outro achado bem comum e ocasiona uma limitação na abertura da boca e
micrognatia.
A B
FIGURA 33.1- AIJ poliarticular (A) deformidades de mãos; (B) Osteoartrite secundária de
quadril.
FORMA OLIGOARTICULAR - Diz-se que uma criança com AIJ tem a forma oligoarticular quando
quatro ou menos articulações estão envolvidas. É a forma mais frequente sendo observada em
aproximadamente 40-50% dos casos. Nestes casos, os joelhos, os tornozelos e os punhos são os
locais preferidos, e a artrite tende a ser assimétrica. A coluna cervical e as pequenas articulações
das mãos são pouco afetadas. Não existem manifestações sistêmicas, exceto, a uveíte crônica
não granulomatosa. A uveíte tende a aparecer em meninas que têm início da doença antes dos
quatro anos de idade e que tem FAN positivo. Seu início é insidioso, assintomático podendo ser
causa de perda importante da acuidade visual, antes que o médico ou os pais da criança se
408
FORMA DE ARTRITE ASSOCIADA À ENTESITE - Afeta crianças do sexo masculino e com mais de
8 anos. Caracteriza-se por artrite periférica e múltiplas entesopatias tendo forte associação com
HLA-B27. Como se vê é uma espondiloartrite juvenil. Como na doença de adulto pode cursar
com uveite anterior do tipo agudo a qual é sintomática. Cursa com olho vermelho e dor local.
DIAGNÓSTICO
O diagnóstico da AIJ pode ser difícil, uma vez que as suas formas de
apresentação são proteiformes e não existem achados laboratoriais específicos. Os achados
clínicos são fundamentais não só para o diagnóstico da doença, como dos seus subtipos.
Desta maneira é fundamental afastar outras doenças que podem simular a AIJ. Veja no
quadro 33.3 as principais.
As provas laboratoriais são de pouca valia para o diagnóstico em si, embora testes como
o FAN e o fator reumatoide possam ajudar a indentificar determinados subgrupos. O FAN é
positivo em cerca de 40% das crianças com AIJ em geral. Nas meninas com iridocilite crônica e
com doença de início pauciarticular, esta positividade chega a 65-85%, e nisto está seu grande
valor, ou seja, em ajudar a predizer quais são as crianças com maior risco de desenvolver esta
complicação. A maioria destes anticorpos parece ser dirigida contra antígenos histonas tipo H1-
H3. É o anticorpo contra histona H3 que correlaciona de perto com a ocorrência de
iridociclite.(2)
Já o fator reumatoide (IgM), é positivo em menos do que 4 % das crianças, quando a
doença se inicia. Como já foi visto anteriormente, ele tende a estar presente em meninas mais
409
velhas, com doença articular grave e nódulos reumatoides. Esta taxa de positividade tende a
aumentar com a duração da doença. Os anticorpos anti-CCP tendem a serem negativos na AIJ,
exceto na forma poliarticular e fator reumatoide positiva, onde aparecem em baixa
porcentagem
As provas de atividade inflamatória refletem a intensidade do processo, em questão.
Outros achados são os de anemia de doença crônica, leucocitose e aumento do número de
plaquetas, os quais são mais comuns no tipo poliarticular e no sistêmico. Nos casos de início
sistêmico, a leucocitose pode ser bastante proeminente chegando a contagens de 30 a 50.000
leucócitos/mm3, com predomínio de polimorfonucleares, criando grandes confusões de
diagnóstico diferencial com doenças infecciosas.
O líquido sinovial é tipicamente um líquido inflamatório não infeccioso.
TRATAMENTO
ANTI-INFLAMATÓRIOS NÃO HORMONAIS- Podem ser usados são: tolmectin (25mg/ kg/dia,
divididos em 4 doses), naproxeno (15 mg /kg/dia, divididos em duas doses), ibuprofeno (35
mg/kg/dia, divididos em 4 vezes por dia), indometacina (2-4 mg/kg/dia, divididos em 3 doses);
piroxican (0,3 mg/kg/dia, dose única diária)
.
GLICOCORTICOIDES- São úteis no tratamento de formas mais resistentes e, são usados em geral,
em combinação com drogas remissivas com anti-inflamatórios não hormonais. Prednisona é a
droga mais utilizada, em doses que variam de 0.1 a 1 mg/kg/dia dependendo da gravidade das
manifestações. Assim que seja possível esta droga deve ser diminuída ou retirada.
Crianças podem desenvolver aspectos cushingoides (obesidade centrípeta, acne, hirsutismo,
estrias etc.) com doses baixas. Isto cria problemas de sentimentos de inferioridade e depressão
por causa de distorção da imagem corporal, principalmente nos adolescentes. Um problema
mais sério ainda é o retardo do crescimento; uma dose de 5mg/dia de prednisona é suficiente
para produzir este efeito colateral. Quando o uso do corticoide é inevitável deve-se dar
preferência à terapêutica em dias alternados. O uso concomitante de hormônio do crescimento
parece contrabalançar o retardo do crescimento induzido por esta droga. Formas terapêuticas
em pulso podem ser utilizadas e a dose é, nestes casos, de 10-30mg/ pulso de
metilprednisolona. O uso criterioso de corticoide intra-articular pode ser útil em casos de poucas
articulações afetadas.
O tratamento de uveíte também requer glicocorticoides, além de midriáticos. Este tipo
de atendimento deve ser feito com acompanhamento do oftalmologista.
Doença de Still do adulto nada mais é do que a Doença de Still que incide em pessoas
com mais do que 16 anos de idade. É uma patologia relativamente rara, mas que vem sendo
reconhecida com mais frequência ultimamente. O seu diagnóstico é baseado em achados
clínicos uma vez que esta patologia não apresenta nenhum marcador sorológico. O laboratório
apenas mostra leucocitose com neutrofilia o que é bastante inespecífico. FAN e FR são
negativos. Por causa desta natureza pouco específica do quadro clínico e de achados
laboratoriais o diagnóstico pode ser difícil. Não é raro que estes pacientes se apresentem como
febre de origem desconhecida. As manifestações mais comuns são as de febre, artralgias e
artrite (em geral em joelhos, punhos e tornozelos), rash típico (rosa salmão) serosites, alterações
de provas de função hepática, dor abdominal, paralisias de nervos cranianos e coagulopatias.
Um achado interessante é o de que estes pacientes apresentam ferritina em níveis bastante
elevados (mais do que quatro vezes o normal) .
O prognóstico destes pacientes é geralmente bom. Embora muitos tenham dor e
disfunção física estes achados costumam ser de intensidade inferior ao de outras patologias
reumáticas.
A incidência do lúpus na criança está estimada em 0,6 casos em 100.000. É raro que esta
doença tenha inicio antes dos 4 anos. A partir dos 9 anos, ela se torna progressivamente mais
comum é comum que a sua incidência esteja associada à uma história familiar de doenças dos
tecido conjuntivo, à deficiência de IgA e de complemento, principalmente da fração C2.
É comum que a doença se apresente, na maioria das crianças, com sinais constitucionais
como febre, mal estar e perda de peso. A gama de outras manifestações é muito grande e está
resumida no quadro 34.1.
A maneira pela qual a doença se apresenta tende a se repetir nos surtos sucessivos, e,
quando uma doença renal séria irá se estabelecer, ela tende a aparecer nos dois primeiros anos
de doença.
411
Esta doença na criança, assim como a do adulto, se caracteriza por períodos de remissão
e de exacerbação. A gravidade da mesma é altamente variável dependendo do tipo de
manifestação clínica predominante. Apesar desta variabilidade, estima-se que, de uma maneira
geral, que 85% das crianças sobrevivem 10 anos. Lesões renais sérias são mais comuns em
crianças do que em adultos.
DERMATOMIOSITE JUVENIL
É uma doença relativamente rara, aparecendo em cerca de 0.3-0,4 pacientes novos por
100.000. A idade de maior incidência está em torno de 4 a 10 anos, sendo ligeiramente mais
comum em meninas do que em meninos. As manifestações clínicas mais importantes estão
listadas no quadro 34.2.
412
Da tabela acima, pode se depreender que algumas manifestações, tais como calcinose
e hemorragia gastrintestinal são mais comuns na criança do que no adulto.
O laboratório demonstra alteração de enzimas musculares, as quais são acompanhadas
durante o tratamento. Provas de atividade inflamatória estão elevadas durante as fases agudas.
Anticorpos anti PM-1 tem sido demonstrados em uma minoria de crianças (5). Hematúria
microcópica pode representar uma glomerulonefrite.
B C
A D
FIGURA 34.2- Dermatomiosite juvenil: (A) Deficit de crescimento. Atrofia muscular; (B)
Heliótropo; (C) e (D) Gotron.
ESCLERODERMIA DA CRIANÇA
Apesar de ser de incidência rara na criança, a esclerodermia pode aparecer nesta faixa
etária tanto na forma de doença difusa, limitada (ou forma CREST) ou localizada (só de pele).
Tem um pico de incidência na faixa etária pré-adolescente, sendo mais comum em mulheres. As
manifestações clínicas mais comuns na criança, estão no quadro 34.3. Achados laboratoriais e
anátomo-patológicos são transponíveis da doença do adulto. O tratamento, da mesma maneira,
é feito dependendo da manifestação em questão.
A B
FIGURA 34.3 - Esclerodermia juvenil. (A)- Calcinose; (B)-Fascies com perda de
expressão.
VASCULITES NECROTIZANTES
Referências:
Dewint P, et al. Effect of age on prevalence of anticitrullinated protein/peptide antibodies in polyarticular juvenile
idiopathic arthritis. Rheumatology 2006; 45: 204-8.4
Melo-Gomes JA. Problems related to systemic glucocorticoid theraphy in children. J Rheumatol 1993; 20:S-35-9.
Southwod TR et al. Antinuclear antibodies and juvenile chronic arthritis (JCA): search for espefic autoantibody
associated with JCA. Ann Rheum Dis 1991; 50:595-8.
Taranta A. JRA and red herrings. Hosp Pract 1988, 23:129-32.
415
À medida que se toma contato com as doenças reumáticas nota-se que um grande
número delas se faz acompanhar de manifestações oculares. Esta associação é de certa forma
intrigante, uma vez que em muitas destas situações, não se encontra uma explicação satisfatória
para esta interrelação. Analogias entre os tecidos articulares e os tecidos oculares têm sido
procuradas e, ninguém pode negar que existe certa semelhança entre uma membrana sinovial,
altamente vascularizada, cercando uma cartilagem totalmente avascular, com a coroide e retina,
que são tecidos bem vascularizados, cercando o cristalino e o humor vítreo, que são avasculares.
Tanto o líquido sinovial quanto o humor vítreo contém ácido hialurônico. O paciente raramente
associa seus problemas oculares aos reumáticos, sendo necessário que o médico, que está
ciente desta possibilidade, as procure para que possa existir uma detecção precoce e uma
orientação adequada quanto à terapêutica.
A ideia aqui é listar as patologias reumáticas mais corriqueiras com os respectivos
envolvimentos oculares. Entretanto, antes de entrar no assunto em questão, vamos rever
rapidamente alguns conceitos básicos de anatomia da região, para melhor entender o que
acontece.
O olho está formado por três túnicas concêntricas: a esclera, a coroide e a
retina. A esclera é a camada mais externa, fibrosa responsável pelo arcabouço do olho. Confere
a coloração esbranquiçada e define a sua forma globosa. Na porção central da esclera existe
uma abertura à qual se ajusta a córnea, que é uma calota transparente e de curvatura um pouco
mais acentuada que a do restante do olho. Posteriormente, a esclera tem mais um orifício que
dá passagem ao nervo ótico. A túnica média é a úvea, que por sua vez se compõe de coroide,
corpo ciliar e íris. Tem este nome (úvea, do grego = uva) pela sua semelhança com um grão de
uva rosa descascado, graças ao seu rico conteúdo de vasos. Numa estrutura relativamente
avascular, como é o olho, é esta estrutura que se responsabiliza pelo fornecimento de
nutrientes. Além disto, ela é responsável pelo controle do tamanho pupilar (por contração ou
relaxamento da íris) e pela acomodação do cristalino (pelo ligamento suspensor da lente que se
inserem nos processos ciliares). A coroide é pigmentada para impedir a reflexão interna da luz.
A retina é a túnica nervosa do olho, onde acontece a percepção das imagens. Na sua parte mais
anterior ela se torna mais delgada e cega. A zona limítrofe entre porção cega ou visual é
chamada de ora serrata.
nome impressionante traz poucos sintomas e raramente é causa de perfuração ocular, embora
isto seja possível.
Pacientes com AR podem ainda ter a ceratites. A ceratite ulcerativa periférica aparece
como uma ulcera rasa no bordo da córnea. Esta é uma manifestação grave.
A B
C D
E F
FIGURA 34.2- (A) Esclerite nodular; (C)- Esclerite necrotizante; (B) e (D) Escleromalácia; (E)-
ceratite ulcerativa perifética (PUK)
Fotos-Gentileza Dr Marcelo Gehlen
O tratamento tanto das esclerites como das ceratites requer uso de corticoide tópico
associado à terapêutica anti-inflamatória sistêmica (AINH ou corticoide). Em casos mais graves
tem se utilizado de citostáticos incluindo metotrexate, azatioprina e até ciclofosfamida ou
imunobiológicos. É importante lembrar que o seu achado significa descontrole da doença básica
e, que, o seu achado é indicação para alteração no tratamento da artrite reumatoide em si. Nas
formas necrotizantes pode ser necessária a realização de enxertos e nelas o corticoide deve ser
419
utilizado com muito cuidado, uma vez que tem efeitos adversos sobre o processo de
cicatrização.
Os achados de queratoconjuntivite seca são descritos sob o título de Síndrome de
Sjögren. A síndrome de Sjögren da artrite reumatoide difere da Síndrome de Sjögren primária
por ter um curso mais brando e um aparecimento mais tardio.
Como a uveíte da AIJ pode ser assintomática, toda criança com este diagnóstico deve ser
avaliada periodicamente por um oftalmologista.
A atividade da uveíte e da artrite não tem curso paralelo sugerindo que, embora ambas
tenham um mesmo fator causal, têm mecanismos diferentes de início e recorrência de sintomas.
A AIJ tende a desaparecer no indivíduo adulto; a uveíte tende a persistir.
A queratopatia em banda é um achado altamente sugestivo de sequela da iridociclite
da ARJ embora não seja específico. Decorre da deposição de cálcio na cápsula de Bowman.
Forma uma opacidade totalmente avascular, que se inicia nas posições de 3 e de 9 horas,
paralimbal e depois, pode se estender através da córnea em forma de faixa, na posição da fissura
421
A B
D
C
FIGURA 34.4. (A)- Uveite- exame com lâmpada de fenda mostrando PKs; (B) irregularidade
da íris por sinéquias (C) ceratopatia em faixa ; (E)- edema macular cistoide ao exame por OCT
(tomografia de coerência ótica).
A
B
Figura 34.5 - Vasculite retinina por LES - (A) achados de fundoscopia; (B) achados de
exame por angiofluoresceina.
Síndrome de Sjögren secundária é outro achado do lúpus. Sua ocorrência é mais comum
nos indivíduos que têm artropatia do tipo deformante (forma de reumatismo de Jaccoud).
Conjuntivites e episclerites aparecem em 15% dos pacientes.
OUTRAS VASCULITES - Envolvimento ocular pode ser visto em pacientes com poliarterite
nodosa, granulomatose com poliangetie e arterite temporal e síndrome de Behçet.
A PAN pode envolver praticamente qualquer tecido ocular. Conjuntivite, episclerite
nodular, escleroqueratite necrotizante, uveítes, retinopatia (por hipertensão e por vasculite de
vasos retinianos), oclusão da artéria central da retina têm sido descritos. Além disto, tem se
notado a associação de PAN com síndrome de Cogan: queratite intersticial não luética associada
à lesão do 8 nervo craniano ocasionando surdez e vertigens.
Na granulomatose com poliangeite, o processo inflamatório de vias aéreas superiores
pode se estender para tecidos oculares ocasionando proptose, edema de pálpebra, queratite
por exposição, perda visual, perda da mobilidade do globo ocular, atrofia de nervo óptico etc.
Além disso vêem-se: obstrução do ducto naso-lacrimal, episclerites, esclerites, uveítes,
retinopatia (hipertensiva ou não), oclusão da artéria central da retina etc.
Na doença de Behçet, o envolvimento ocular aparece mais comumente na forma de
uma uveite bilateral que envolve tanto a porção anterior quanto posterior da úvea. O
envolvimento da parte anterior pode levar à formação de hipópio, que nada mais é do que um
acúmulo de células inflamatórias na câmara anterior.
424
A B
C D
E F
FIGURA 34.8 – (A)- Behçet- hipópio ou pus na câmara anterior secundário a uveite anterior; (B) -
Sequela de uveite em Behçet com irregularidade pupilar por sinéquias (C) – Behçet: exame com
angiofluoresceina mostrando vascultie; de olho; (D) Granulomatose com poliangeite- vasculite ao
exame com angiofluoresceína; (E)- Granulomatose com poliangeite – Vasculite de fundo (F) –
Granulomatose com poliangeite – esclerite.
Na arterite temporal, existe lesão ocular em 50% dos pacientes e esta manifestação está
entre as complicações mais sérias desta doença. Não é raro que o paciente se apresente ao
oftalmologista com perda súbita de visão, sem ter tido nenhum sinal premonitário.
Frequentemente os dois olhos estão envolvidos. O envolvimento do segundo olho ocorre de um
dia até algumas semanas depois do envolvimento do primeiro, por vasculite de artéria oftálmica
425
ou da central da retina ou, ainda, de artérias ciliares. O achado mais comum é o de uma neurite
ótica isquêmica mostrando um disco óptico pálido e elevado; pequenas hemorragias podem ser
vistas. Se a isquemia acontece mais posteriormente (neurite isquêmica retrobulbar) o fundo de
olho pode ser normal. Se existe oclusão da artéria central da retina, o que é mais raro, o achado
é de infarto da retina.A arterite temporal pode ter sinais exclusivamente oculares, sem sintomas
sistemicos, o que tem sido chamado por alguns, de arterite temporal oculta.
ESPONDILOARTRITES - A uveíte não granulomatosa anterior aparece em até 50% dos pacientes
com espondilite anquilosante, dependendo de como o estudo desta situação é feito e qual a
população estudada. O envolvimento ocular não está relacionado à gravidade da doença
articular e é mais frequente em pacientes com envolvimento articular periférico. A associação
da uveíte com HLA-B27 é considerada como uma forma frustra desta doença, mesmo em casos
em que a patologia articular não seja aparente.
A maioria das uveítes dos pacientes com EA é aguda, cursando com fotofobia, dor e
vermelhidão local. Pode regredir sem sequelas ou levar à formação de sinéquias e cataratas.
Tende a ser recorrente.
Na artrite reativa, além da ocorrência de uveíte, pode aparecer a conjuntivite que faz parte
da tríade clássica. É possível que a conjuntivite seja discreta e passe despercebida. A secreção é
estéril. A uveíte da artrite reativa é vista nos indivíduos com sacroiliíte, que são os com maiores
chances de portarem o HLA -B27.
FIGURA 34.9 – Uveite anterior (A) PKs à lâmpada de fenda; (B)- irregularidade pupilar.
DROGAS ANTI-REUMÁTICAS E DOENÇA OCULAR - Além das doenças reumáticas, por si só,
serem consideradas um fator de risco para o envolvimento ocular, muitas das drogas usadas
pelo reumatologista podem trazer dano ao olho.
corticoide. Esta falha poderia surgir de um mau funcionamento da bomba de Na,K -ATPase ou
alterações de permeabilidade de membrana;
c) adição não enzimática de pequenas moléculas às proteínas locais formando adutos proteicos;
d) efeitos do corticoide mediados por receptores ;
e) comportamento celular anômalo levando ao acúmulo de células epiteliais indiferenciadas no
polo posterior da lente. Normalmente estas células são encontradas na porção anterior.
A ocorrência de cataratas em usuários de corticoide é uma dos poucos efeitos colaterais
que não desaparece quando a droga é usada em dias alternados.
O tratamento mais efetivo ainda é a remoção cirúrgica da lente opacificada, embora
alguns autores tenham demonstrado, em animais, que o uso de antioxidantes diminui a
incidência e gravidade das cataratas induzidas pelos glicocorticoides.
Já o glaucoma tem sido associado com uso local do corticoide (colírios e infiltrações) e,
a capacidade de alguém desenvolver ou não esta complicação parece ser transmitida como
traço recessivo autossômico. Certos corticoides tópicos como fluorometalona têm sido
associados com taxas menores de indução de glaucoma. O mecanismo pelo qual o corticoide
induz o glaucoma não está bem esclarecido. Sabe-se, no entanto, que ele está associado a uma
maior produção de proteínas locais induzidas pelo corticoide, proteínas estas que influem no
tamanho dos poros dos vasos do canal de Schlemm (e, consequentemente, no seu grau de
permeabilidade) diminuindo a reabsorção do humor aquoso. Uma destas proteínas foi
identificada como ZO-1, responsável por aumento da resistência para celular.
A B
FIGURA 34.10- (A) Catarata por glicocorticoide (capsular posterior); (B) Retinopatia em
olho de búfalo À angiofluoresceina ( efeito colateral de antimalárico).
Referências:
Anonymous. Guidelines for ophthalmologic examinations in children with juvenile rheumatoid arthritis. Pediatrics 1993; 92:295–6
Black RL et al. Posterior capsular cataracts induced by corticosteroid in patients with rheumatoid arthritis. JAMA 1960;174:150-5.
Rosenberg, AM. Uveitis associated with juvenile rheumatoid arthritis. Semin Arthritis Rheum 1987; 16:158-73.
Underwood JL et al. Glucocorticoids regulate transendotelial fuid flow resistance and formations of intercellular junctions. Am J
Physiol Cell Physiol 1999, 227: C-330-42.
428
Como já ficou óbvio do estudo anteriormente feito, muitas das doenças reumáticas não
envolvem somente o sistema músculo esquelético. São doenças sistêmicas com envolvimento
de vários órgãos e aparelhos. Lesões de pele são bastante comuns e, por serem de fácil acesso
ao exame, o seu achado é valioso e ajuda no diagnóstico. Basta saber quais as patologias que
têm manifestações de pele e o que esperar de cada uma delas.
ARTRITE REUMATOIDE - O nódulo reumatoide é achado em até 20% dos casos e aparece
geralmente em doenças seropositivas (e mais graves). São nódulos subcutâneos que,
comumente, se situam nos locais de trauma ou de pressão. Têm tamanhos variáveis e são de
consistência elástica. As vasculites também aparecem nos pacientes com A.R. e podem afetar
tanto artérias como veias de diferentes tamanhos. O envolvimento arterial pode se manifestar
sob vários aspectos: gangrena digital, úlceras cutâneas, infartos em pregas ungueais, etc... O
envolvimento venoso pode se apresentar como púrpura palpável (venulite necrotizante
cutânea), as quais são mais comuns em extremidades inferiores ou regiões pendentes do corpo.
As vasculites são um achado de doença severa, nodular e erosiva.
Outros achados são: Raynaud, pioderma gangrenoso e eritema palmar.
A B
FIGURA 35.1 Nódulos reumatoide (A) em cotovelo; (B ) sobre tendão de Acchilles
ARTRITE IDIOPÁTICA JUVENIL - As lesões de pele são vistas na forma sistêmica e as vezes na
forma poliarticular desta doença. Nunca são encontradas na forma oligoarticular. É um rash
discreto, eritematoso (rosa salmão), visto no tronco, extremidades proximais ou áreas de
pressão. É, caracteristicamente, evanescente, acompanhando os períodos de febre. Têm
tendência para migrar. Cada mácula é circundada por um halo de palidez e as lesões pequenas
têm no centro uma área mais clara. Às vezes, lembra urticária, mas nunca é pruriginoso.
LUPUS ERITEMATOSO SISTEMICO - Algum tipo de manifestação cutânea ocorre em 85% dos
pacientes no lúpus, em algum tempo de sua doença. A lesão mais característica é o eritema em
asa de borboleta (butterfly rash). Esta é uma lesão ligeiramente eritematosa, localizada nas
regiões malares e no dorso do nariz. O rash é notado frequentemente após exposição ao sol,
embora este fato não seja obrigatório. Pode ter aspecto evanescente, acentuando-se com o uso
do álcool e com nervosismo. Cura sem cicatriz.
429
A segunda lesão mais característica é um rash eritemato-papular que lembra alergia por
droga e que ocorre após exposição ao sol. São lesões pruriginosas e que aparecem em qualquer
parte do corpo, mas são mais comuns em pele da região acima da cintura.
Lúpus eritematoso discoide (ou LED) é outro tipo de lesão cutânea encontrada no lúpus.
Aqui deve se ter um pouco de cuidado com o termo lúpus discoide uma vez que este serve,
também, para designar a doença de pele isolada. Dos pacientes que aparecem só com a doença
de pele, 10% desenvolverão lúpus sistêmico, o que em geral acontece dentro dos 2 primeiros
anos da doença (se bem que existam casos extremos de sistematização até 25 anos após o
aparecimento do lúpus discoide). O restante permanece só com a doença de pele, isolada, como
num espectro mais benigno da doença.
A lesão discoide típica começa por uma ou mais pápulas bem definidas, em áreas
malares, em borboleta ou em couro cabeludo, orelhas e região superior dos braços e peito. Aos
poucos ela aumenta, tomando um aspecto maduro que consta de pápulas bem definidas e
placas em tom eritematoso brilhante, edema e elevação da área central. As vezes, a área central
fica atrófica e deprimida, ao passo que os bordos ficam vermelhos e brilhantes. Os limites da
lesão são irregulares, mas bem definidos. A medida que a fase aguda subside formam-se
descamações foliculares, com acúmulo de queratina nos folículos formando ver-dadeiras rolhas.
A cura se processa com cicatrização deixando a pele atrófica e branca circundada por bordos
hiperpigmentados. O aspecto final pode ser bem desfigurante. A evolução da lesão discoide
segue, portanto, 3 estágios: eritema, hiperqueratose, atrofia. Pode ocorrer o desenvolvimento
de carcinoma epidermoide sobre cicatrizes de lesões discoides .
Quando um paciente recebe o diagnóstico de lúpus discoide o médico sempre se
pergunta se o seu paciente permanecerá tendo uma doença puramente de pele ou irá desen-
volver a forma sistêmica. Embora não existam regras bem definidas para esta separação alguns
dados podem ser de valia:
1. Se o sexo do paciente é masculino as chances de sistematização são menores. A relação de
incidência mulher/ homem para o LED é de 2:1 enquanto que no LES é de 9:1.
2. Quando o paciente tende a ter só o LED, as lesões de pele são uniformes do tipo placas com
atrofia, formação de cicatriz e alterações na pigmentação, não existindo associação com outro
tipo de lesão. Se o paciente tem lúpus sistêmico, as lesões são variáveis: em 15% dos casos existe
placas tipo discoide, mas, além delas existe eritema difuso, lesões palmares, eritema
periungueal ou telangiectasias, vasculites e ulceras de boca.
3. Nos pacientes com lúpus discoide puro o "lupus band test", ou seja, a pesquisa de
imunoglobulinas na junção dermo epidérmica feita por imunofluorescência de tecidos obtidos
para biópsia, é negativa em pele que não apresenta lesão macroscópica (90% dos casos). Já nos
pacientes com lúpus sistêmico existe este depósito mesmo em pele considerada sadia ( em 60%
dos casos) .
4. O F.A.N. nos pacientes com lúpus discoide é negativo ou positivo em baixos títulos. Nos
pacientes com doença sistêmica é positivo, geralmente em altos títulos.
5. A pesquisa de anticorpos anti DNA em pacientes com doença discoide só é positiva muito
raramente e, neste caso trata-se do anti DNA de cadeia simples. O achado de anti DNA de cadeia
dupla aponta para o di-agnóstico de doença sistêmica.
6.Sintomas sistêmicos são raros em lúpus discoide puro e bem comuns no sistêmico.
Existe uma forma intermediária de lúpus que fica entre o discoide puro e o sistêmico que
se chama de lúpus eritematoso cutâneo subagudo (LECS) com lesões de pele extensas
simétricas. Estes pacientes têm dores articulares, febre, mialgias, mas não chegam a preencher
os critérios para um lúpus sistêmico. Manifestações mais graves como lesões de sistema nervoso
central e nefropatia raramente ocorrem. Sua ocorrência está relacionada com a presença do
HLA DR3 e a presença dos anticorpos anti Ro e anti La. Existem duas lesões de pele típicas do
LECS: uma psoriasiforme e outra anular. Ambas ocorrem mais em áreas expostas a sol.
430
A B
C D
E F
G H
FIGURA 35.2 – LÚPUS. (A) e (B)- Rash em butterfly; (C) e (D)- Lúpus cutâneo subagudo; (E)
e (F)- Lúpus discoide (G) Alopecia por LED; (H) Vasculite.
431
A B
C D
FIGURA 35.3- LÚPUS ERITEMATOSO: (A) Rash inespecífico; (B)-Livedo reticularis; (C) lupus
bolhoso; (C) urticaria vasculite
Outros achados dermatológicos no lúpus são: livedo reticularis, lesões vasculíticas, alo-
pécia (em placas ou difusa), úlceras em mucosas (mais comuns em palato mole e duro, podendo
aparecer também em septo nasal, assintomáticas), fotossensibilidade, Raynaud, episódios de
urticária e edema angioneurótico. Para ajudar a fixar, veja o quadro 35.1.
inflamatório cede, passam a ter uma coloração mais violácea com alguma descama-ção.
Algumas vezes o rash é pruriginoso.
Outros achados são hiperemia de pregas ungueais, fotossensibilidade, alterações de
pigmentação e calcinose, esta última bem mais frequente na criança.
A
B
C D
Figura 35.4 – DERMATOMIOSITE: (A) Heliotropo; (b) Gotron; (c) e (d) Calcinose.
• Na fase clássica, a pele que era mais "fofa" substitui-se por um infiltrado duro e aderente
a planos profundos, que impede a livre movimentação de articulações e tendões. A pele fica
seca e friável. Ocorre perda de sulcos, atrofia de anexos e diminuição da sudorese. É comum
encontrar-se áreas de hiperpigmentação (só em pele, nunca em mucosas) e de
hipopigmentação. A face toma um aspecto característico, inexpressivo, com diminuição da rima
bucal e proeminência dos dentes. Se esta fase se manifesta só em tegumento da região dos
dedos diz-se que o paciente tem esclerodactilia.
433
• Na fase tardia, que aparece de 3 a 15 anos após a clássica, o que se vê é uma involução
do processo . A pele fica mais macia e pregueável.
Na doença sistêmica estas alterações são frequentemente generalizadas, mas se não o
forem existe sempre uma tendência para que as mãos e face estejam envolvidas.
Existe uma variante da forma sistêmica da doença que se chama esclerodermia limitada ou
CREST (C= calcinose, R= Raynaud, E=esofago, S=sclerodactyly, T= teleangiectasia). Estes
pacientes apresentam caracteristicamente o anticorpo anticentrômero. Neles o fenômeno de
Raynaud precede o aparecimento de lesões de pele por muito tempo.
É uma forma da doença de evolução mais arrastada, que tende a apresentar como
manifestações sistêmicas a hipertensão pulmonar primária e a se associar com S. de Sjögren e
com cirrose biliar primária.
Existem casos descritos de pacientes com esta forma que acabaram por desenvolver a
forma sistêmica completa com o decorrer dos anos.
A B
C D
FIGURA 35.5- ESCLERODERMIA - (a) Esclerodactilia; (B) Afilamento das polpas digitais por Raynaud; (C)
Esclerodactilia ealteraçãode pigmentação; (D) esclerodactilia e perda de digitos por Raynaud.
434
A B
C D
E
F
G H
Figura 35.6 – ESCLERODERMIA – (A) Úlcera digital; (B), (C) e (D)- Telangiectasias; (E) e (F)
Calcinose ; (G)- Fascies esclerodermico com rágades periorais; (H)- cicatriz estelar.
435
Na doença isolada de pele a forma mais encontradiça é a morfea que consiste em placas
isoladas, de cor marfim com um bordo mais violáceo. Pode aparecer formando pequenos pontos
(morfea guttata) ou em placas maiores (morfea em placas). Estas formas dificilmente têm
repercussões maiores a menos que envolvam a face (pelas consequências cosméticas) ou que
tomam um aspecto generalizado. Outra forma de esclerodemia só de pele é a esclerodermia
linear, a qual é mais comum em crianças. Forma-se uma faixa de esclerose que envolve uma ou
mais extremidades ou região frontoparietal (esta última recebe o nome de esclerodermia em
golpe de sabre e pode se associar com hemiatrofia de face). Esta banda pode comprimir feixe
vásculo nervoso do local e causar diminuição do trofismo da região afetada.Outros achados são:
telengiectasias (de pele e mucosas), calcinose e alterações de pigmentação e o Raynaud. Para
não criar confusão, guarde bem o esquema 42.2, com as formas mais comuns da esclerodermia.
A B
D
C
FIGURA 35.7- ESCLERODERMIA LOCALIZADA: (A) Linear; (B) Golpe de sabre; (C) e (D)
morfea em placas.
acentuam com aplicação de calor e desaparecem com a compressão. Não causam prurido. São
evanescentes e mais comuns em pacientes com cardite. Não respondem ao tratamento da
doença.
Na moléstia reumática pode se encontrar, ainda, nódulos subcutâneos do tamanho de uma
ervilha, não dolorosos e situados sobre proeminências ósseas. A pele não adere ao nódulo.
A B
C D
E F
G H
FIGURA 35.9: (A) Ceratoderma blenorrágico ( Artrite reativa); (B) Psoriase guttata; (C) e (D)
Alterações ungueais-psoriase; (E)- Psoriase eritrodermica; (F) e (G) Eritema nodoso (Chron);(H)
Pioderma gangrenoso (retocolite ulcerativa);
Na artrite psoriásica aparece, naturalmente, a psoríase de pele, que são lesões em forma
de pápulas e placas eritematosas e com escamas prateadas. As lesões são bem delimitadas e a
remoção das escamas pode levar a um sangramento puntiforme que reflete ruptura do topo do
438
vaso sanguíneo da superfície das papilas dérmicas. A psoríase pode envolver qualquer
região do corpo, mas o faz mais comumente em cotovelos, joelhos, região lombo sacra e
genitália. Em couro cabeludo as escamas podem simular caspas. Existem casos descritos de
artrite psoriásica em que a única lesão de pele demonstrável estava em cicatriz umbilical. O grau
de extensão da lesão é variável podendo aparecer de maneira salpicada (psoríase guttata) ou
generalizada, em uma forma eritrodérmica. As lesões tendem a se reproduzir em pontos de
trauma (e isto se chama de reação de Koebner). As unhas estão comumente envolvidas e
mostram alterações tipo acúmulo da material queratótico ou unhas em dedal (com muitas
depressões puntiformes). Só 5% dos pacientes com psoríase de pele têm doença articular,
existindo uma maior incidência naqueles com alterações ungueais (existem alterações ungueais
em 85% dos pacientes com psoríase de pele e artrite, mas só em 30% dos com psoríase de pele
pura).
Referências:
Dubois et al, Lupus Erythematosus, Lea & Febinger 1987, pp.312.
Soter,N. Cutaneous Manifestations of Rheumatic Disease, In KELLEY et al., Textbook of Rheumatology, W.B, Saunders,
Co, 1985, pp.534
439