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De 600 milhões só foram cobrados 60 A vida dos candidatos presidenciais aos 21 anos

OS TRUQUES DAS EMPRESAS PARA A REVOLUCIONÁRIA ANA GOMES


ESCAPAR ÀS MULTAS MILIONÁRIAS E O BEATO ANDRÉ VENTURA

www.sabado.pt N.º 872 – SEMANAL – 14 A 20 DE JANEIRO DE 2021 – €3,50 (CONT.)

ATENTADO
AO ESTADO
DE DIREITO
Pela primeira vez em democracia, o Ministério Público liderado por
Lucília Gago mandou seguir e fotografar jornalistas e vasculhou as suas
contas bancárias. A operação foi ordenada a agentes encobertos da PSP para
devassar fontes de informação. A vigilância ocorreu até à porta das redações
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Direto e Fatura Eletrónica. Sabe mais em meo.pt
Sumário 14 JANEIRO 2021
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58 64
A ESTRANHA MULTAS DE MILHÕES
TOMADA DE POSSE POR PAGAR
DE BIDEN Nos últimos 10 anos, as mul-
A pandemia já impunha tas dos principais regulado-
novas regras. A invasão res ultrapassaram os 600
ao Capitólio trouxe ou- milhões de euros. Foram
tras questões de segu- cobradas pouco mais de 10%
rança. Tudo vai ser dife-
rente. Saiba como

72
AS VANTAGENS E
DESVANTAGENS DO
ENCERRAMENTO DAS
ESCOLAS DURANTE
O CONFINAMENTO.
MUITOS DIZEM QUE
AS ESCOLAS NÃO
SÃO O PROBLEMA
D.R.

3
14 JANEIRO 2021
Sumário www.sabado.pt
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Portugal
A Semana
16 O caso Governante tem assessor
visado em caso de plágio
28 Cristiana Bastos Investigadora
alerta: “Há racismo todos os dias”

Destaque
34 Justiça MP violou a lei e mandou
vigiar jornalistas para descobrir fontes

Portugal
50 Presidenciais Ventura aos 21 anos:
um retrato surpreendente
54 Almanaque Curiosidades e segredos

46 da campanha eleitoral
54 Debates O que se passou atrás das
câmaras
MAOISTA, EX-MAOISTA, MÃE, Sociedade
ESTUDANTE: ANA GOMES AOS 21

FOTOS D.R.
76 Pandemia Tudo o que precisa de
saber sobre a terceira vaga de Covid-19
79 Vacina Visons, gatos e outros
Já tinha casado e sido mãe, já fora detida e agredida, já saíra do MRPP, já trabalhara para
animais podem ser o alvo seguinte
pagar contas, já dirigira uma faculdade: retrato da candidata enquanto jovem intensa 80 Noruega A cidade onde não se
pode nascer nem morrer
81 História A plasticina não foi sempre
Sociedade GPS um brinquedo, já serviu para limpezas
TRILHOS Desporto
ROTAS E PERCURSOS 88 Adeptos Com os estádios vazios há
PEDESTRES POR TODO mais vitórias fora de casa? Fomos ver

O PAÍS PARA DESANU- GPS


VIAR DOS DIAS DE 100 Gourmet As duas faces do Via Graça
101 Séries The Wine Show, da
CONFINAMENTO 24Kitchen, descobre os vinhos nacionais
102 Cinema Regressa Juliette Binoche
104 Música A Orquestra Bamba Social e
Tiago Nacarato homenageiam o samba
106 Livros Atlas Almirante Reis narra
a história da icónica avenida lisboeta
108 Estilo Torres Novas, os atoalhados
ecológicos e feitos para durar

82 www.sabado.pt
FOTÓGRAFOS AMADORES EUA
Figuras públicas revelam as fotos preferidas O polícia que enfrentou
que fizeram. Esta é do empresário Miguel Júdice os manifestantes
Eugene Goodman afastou-os
do Senado
Opinião
Covid-19
Portugal em oitavo
na lista de mais casos
É um dos países do mundo

32
JOSÉ
62
NUNO
90
JOÃO
114
JOÃO
mais afetados pelo vírus

PACHECO ROGEIRO PEDRO PEREIRA


PEREIRA GEORGE COUTINHO

6 Editorial 45 António José Vilela 87 Pedro Marta Santos Vídeo: Viu nuvens
8 Bastidores 53 Carlos Rodrigues Lima 99 Ângela Marques iridescentes?
15 Octávio Ribeiro

4
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Do diretor

EDITORIAL E profissional dos jornalistas da SÁBADO,

O ataque
da TVI, do Correio da Manhã, da Visão e
Pela primeira vez, em da SIC, e lança uma caça às suas fontes

à liberdade
democracia, jornalistas ou, pelo menos, àquelas que ela enten-
foram vigiados e de estarem à disposição deles. De cami-

de imprensa
fotografados pela polícia, nho, faz letra morta do vasto arsenal ju-
as suas mensagens rídico que o blinda face ao abuso de po-
vasculhadas sem cobertura der, de qualquer tipo de poder, seja qual
legal, violando o direito ao for a sua origem e latitude no mundo ci-

P
sigilo profissional, e o sigilo ela primeira vez, em democra- vilizado e democrático.
bancário levantado de cia, jornalistas foram vigiados e Para a procuradora Andrea Marques e
forma completamente ilegal fotografados pela polícia, a para a diretora do DIAP de Lisboa, Fer-
mando de uma procuradora do Minis- nanda Pego, a Constituição Portuguesa,
tério Público (MP). a Convenção Europeia dos Direitos Hu-
Pela primeira vez, em democracia, manos, a jurisprudência do Tribunal
mensagens de jornalistas foram vas- Europeu dos Direitos Humanos, o Su- i
culhadas sem qualquer cobertura legal premo Tribunal de Justiça, o Tribunal O Ministério
Público que a
e violando grosseiramente o direito ao Constitucional, a primeira emenda da esmagadora
sigilo profissional. Constituição Americana, as centenas ou maioria dos
Pela primeira vez, em democracia, o milhares de decisões inspiradas nela e magistrados
sigilo bancário de jornalistas foi levan- que influenciaram ordenamentos jurí- serve não é
este, da procu-
tado de forma completamente des- dicos de todo o mundo, o Tribunal radora Andrea
proporcional, desnecessária, inade- Constitucional alemão e a sua impor- Marques
quada e ilegal. tantíssima decisão no caso Cícero, não
Nenhum dos crimes em investigação passam de meras abstrações.
no processo titulado pela procuradora Não quiseram, sequer, ler de forma
Andrea Marques, do DIAP de Lisboa, mais cuidada as leis processuais pe-
que noticiamos nesta edição, consente nais, quanto mais a jurisprudência e
o recurso a semelhantes meios de in- doutrina de referência em relação à li-
vestigação. berdade de imprensa. Poderiam ter
O que a procuradora Andrea Mar- imediatamente percebido que era me-
ques está a fazer, com a cobertura da lhor travarem a cegueira contra quem
sua hierarquia, aproxima a ação do MP quiseram verdadeiramente visar neste
da espionagem pura e simples, através processo, desde logo o anterior diretor
da PSP, e não de uma investigação cri- nacional da Polícia Judiciária, Almeida
minal séria, democrática e escrupulo- Rodrigues, e, depois, um dos seus mais
samente respeitadora das leis proces- reputados investigadores, coordena-
suais penais em vigor. dor da Unidade Nacional de Combate
O MP que a esmagadora maioria dos à Corrupção, Pedro Fonseca, instru-
magistrados serve não é este, da pro- mentalizando os jornalistas. Não fosse
curadora Andrea Marques. É um Mi- a cegueira de um ódio pessoal ou cor-
nistério Público que se pauta por re- porativo, perceberiam que a tomada
gras de legalidade e objetividade e tem de imagens sem autorização dos pró-
um papel insubstituível na defesa de prios, no âmbito de uma investigação,
valores como a separação de poderes está circunscrita aos crimes previstos
e a igualdade dos portugueses perante no artº 1º, da Lei nº 5/2002 (criminali-
a lei. É democrático e transparente, dade organizada). E ainda que, nos ter-
prossegue a proteção de bens jurídicos mos do nº2 do art.º 6º do mesmo di-
consolidados na Constituição e na lei. ploma, tal tomada de imagens depen-
Não tomamos o todo pela parte. Mas de de autorização do juiz de instrução
esta parte, da procuradora Andrea criminal, que não existiu.
Marques, esta maçã podre que amea- O despacho da procuradora Andrea
ça o pomar, tem de ser escrutinada e Marques sobre a vigilância aos jorna-
escalpelizada até ao mais ínfimo por- listas viola o direito do jornalista à pro-
menor, pelo autoritarismo e escassa teção das fontes e ao sigilo profissio-
cultura democrática que exibe. nal, nos termos dos artigos 8º e 11º da
E
DUARTE RORIZ

Com uma facilidade aterradora, a pro-


Diretor curadora Andrea Marques desencadeia
Eduardo Dâmaso um ataque sem precedentes ao sigilo

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14 JANEIRO 2021
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Lei nº 64/2007. Para lá de que, obvia- escrever uma linha sobre isso. Passa-
mente, viola ainda o direito à intimida- -lhe pela cabeça que os jornalistas pa-
de e reserva pessoal e o direito de ima- guem em vil metal às suas fontes, ou
gem dos visados, configurando a auto- que lhes concedam qualquer vanta-
ria moral do crime de devassa da vida gem não patrimonial, mas anda ali às ção, a procuradora Andrea Marques
privada, de acordo com o que prescre- voltas, vai para três anos, atrás de cri- incorre num crime de prevaricação.
ve o artigo 192 do Código Penal. mes de violação do segredo de justiça Face a um quadro de tamanha gravi-
No plano do direito administrativo, o e falsidade de funcionário, que mesmo dade, a SÁBADO e os seus jornalistas
ato da procuradora Andrea Marques é no particular Código de Processo Pe- vão participar criminalmente contra a
um claro abuso de poder que viola o nal da procuradora Andrea Marques procuradora Andrea Marques. Vamos
dever de objetividade, previsto no art.º não devem prever o recurso a meios ainda apresentar uma participação
104 do Estatuto do Ministério Público. especiais de investigação, como as vi- disciplinar no Conselho Superior do
Por fim, o despacho de levantamen- gilâncias e a quebra do sigilo bancário. Ministério Público, pela violação do
to do sigilo bancário. Aqui é claro o ex- Perante isto, talvez fosse avisado que dever de objetividade e consequente
cesso de meios de investigação utiliza- as instâncias superiores do MP come- abuso de poder, bem como pedir que
dos face à natureza do alegado ilícito çassem a rever os processos de An- seja afastada da titularidade do inqué-
indiciado. A procuradora Andrea Mar- drea Marques e respetivos métodos de rito em causa. E vamos, claro está, de-
ques vai ficar na história da infâmia investigação aplicados. Neste campo, nunciar a atuação desta procuradora e
universal (recorrendo aqui a uma deri- as surpresas nunca são agradáveis… do Ministério Público em todas as ins-
vação estilística de Jorge Luís Borges) Em síntese, nesta questão do levanta- tâncias nacionais e internacionais,
por escrever uma coisa e fazer outra. A mento do sigilo bancário, diligência desde os órgãos de soberania nacio-
procuradora fareja um propósito de que não é nem remotamente justifica- nais ao Parlamento Europeu e Comis-
corrupção, mas não tem coragem de da pelos alegados factos em investiga- são Europeia, passando pelas organi-
zações de jornalistas.
Como ensina o professor Jónatas
Machado, da Faculdade de Direito de
Coimbra e titular de uma obra que é a
grande referência doutrinária em ma-
téria de liberdade de imprensa, a utili-
zação estratégica de ações, providên-
cias e diligências judiciais contra a im-
prensa e a intervenção dos cidadãos é
hoje um verdadeiro assédio e uma for-
ma de bullying que visam a censura.
Esses mecanismos utilizados com
propósitos inibidores e silenciadores
representam “um dos mais graves de-
safios enfrentados pela liberdade de
expressão e informação, impondo-se
aos poderes legislativo e judicial que
deles estejam plenamente conscien-
tes”, escreve Jónatas Machado. Esta é a
prova de algodão da democracia a que
vamos assistir nos próximos dias, com
a campanha presidencial em curso. O
silêncio do poder político, do poder ju-
dicial e das pessoas decentes aprovará
comportamentos como os da procu-
radora Andrea Marques e da sua supe-
riora Fernanda Pego. A sua reação de
crítica e rejeição demonstrará que ain-
da vivemos numa democracia que se
orienta por valores como aqueles que
o poeta William Blake universalizou e
foram recentemente evocados em
mais um acórdão de defesa da liber-
dade de imprensa: “Quando a impren-
sa não fala, o povo é que não fala. Não
se cala a imprensa. Cala-se o povo.” W

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Opinião 14 JANEIRO 2021
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BASTIDORES B j

Para si,
Diogo Feio viu
A partir da próxima quinta- Tino de Rans na
rua e não resistiu
-feira, 21 de janeiro, a
SÁBADO terá um site novo,
acessível a assinantes. Em
consigo a tirar uma selfie

C
tempos difíceis, a tendência aro leitor,
é para nos refugiarmos ao longo de 17 anos a SÁBADO
junto daqueles com quem sempre orientou a sua atividade
nos sentimos em segurança. para si. Arriscámos, inovámos, mudá-
Esperamos que continue a mos, sempre tendo em conta aquilo
escolher a SÁBADO como o que melhor serviria aqueles que nos
seu refúgio informativo compram: os leitores. É isso que nos
preparamos para fazer novamente. A
partir da próxima quinta-feira, dia 21,
poderá encontrar online um site intei- continue a escolher a SÁBADO como a
ramente renovado. Será um site mo- sua casa, o seu refúgio, para obter in-
derno, fresco, que privilegiará a ima- formação exclusiva, de qualidade, a
gem, facilitará a leitura e que nos irá que o habituámos ao longo dos anos.
permitir oferecer-lhe novos formatos Nós cá estaremos à sua espera, ao seu
multimédia. Através dele vamos tentar serviço e do interesse público.
complementar a edição semanal, em
papel, com a produção diária de notí- B
Jornalismo que importa
Nesta edição há muitos trabalhos que
mostram a qualidade dos jornalistas
da SÁBADO. Um deles é a investiga-
ção da Ana Taborda e do Bruno Faria
Lopes à forma como as grandes em-
presas conseguem escapar às multas
aplicadas pelos reguladores sempre
que são detetadas práticas lesivas do
consumidor – você. Para firmas com
muitos milhões disponíveis, a solução
passa por litigar nos tribunais até à
exaustão, contestando tudo aquilo que
for possível e de forma sucessiva, de
modo a adiar ao máximo o pagamen-
to das coimas, reduzir o seu valor, ou
g cias, reportagens e entrevistas exclusi- mesmo obter a sua prescrição. No fim,
Várias persona- vas. Vamos acompanhar a atualidade os lesados continuam a ser sempre os
lidades aceita-
ram partilhar nacional e internacional. Explicar-lhe mesmos: nós, consumidores.
as fotografias os assuntos mais complexos. E mantê-
que mais as -lo a par das grandes tendências cultu- B
marcaram.
Descubra de rais, lifestyle e de viagens. Uma selfie espontânea
quem é a mão No entanto, a grande mudança é que A meio da conversa com o jornalista
nesta imagem este será um site maioritariamente de Alexandre R. Malhado sobre os deba-
acesso restrito, apenas para assinantes, tes das eleições presidenciais, o candi- !
seguindo a tendência mundial de ten- dato Vitorino Silva começou a gritar: k
tar encontrar a sustentabilidade finan- “Eh eh! Olha o antigo eurodeputado
ceira junto da comunidade de leitores e Feio ou lá o que é a acenar-me. Olhe, SÁBADO
investigação
que continue a permitir-nos manter a Alexandre, para ver que não estou a
independência editorial de todos os mentir vou passar o telefone ao Antó- Faça a sua
parte.
poderes. Em tempos difíceis, a tendên- nio… Diogo… António… Diogo Feio.” E Nós tratamos
cia é para nos refugiarmos junto da- passou: “Vi o Vitorino e tinha de tirar do resto
queles que conhecemos e com quem uma selfie”, disse o centrista. A ima- Envie as suas
B denúncias para
nos sentimos em segurança. Isso apli- gem está aí para si. o nosso email:
Chefe de Redação ca-se à vida em geral e, neste caso, Boa semana. Proteja-se, a si e aos investigacao@saba-
Nuno Tiago Pinto também ao jornalismo. Esperamos que outros. W do.cofina.pt

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14 JANEIRO 2021
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A semana

AS IMAGENS
Drones
policiais
Para celebrar o primeiro
Dia da Polícia Popular
da China as autoridades
montaram um espetácu-
lo em que um total de
1.100 drones preenche-
ram os céus de Xangai
para, em conjunto, for-
marem um agente em
ação. A exibição atraiu
os olhares de muitos
curiosos que quiseram
registar a iniciativa.
FOTO YANG JIANZHENG/ VCG
VIA GETTY IMAGES

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O treino da vacina
Para ajudar na campanha de vacinação contra a Covid-19, as autoridades
holandesas recrutaram estudantes de Medicina que, após uma formação,
serão enviados para lares de terceira idade e estabelecimentos de reabilita-
ção. Na imagem, uma aluna treina a aplicação da vacina num modelo.
FOTO ROBIN VAN LONKHUIJSEN/ ANP/ AFP VIA GETTY IMAGES
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Frio Ártico trouxe neve ao Alentejo
Há 12 anos que não nevava no Alentejo, que no último fim de semana ficou
pintado de branco em várias zonas dos distritos de Évora e Portalegre
(na foto, Estremoz). A frente de frio Ártico, que lançou o caos em Madrid e
encheu de neve as zonas altas da Madeira, já dura há mais de uma semana.
FOTO NUNO VEIGA/ LUSA
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A semana

JUSTIÇA. CAIXAS DE CORREIO DE MAGISTRADOS E ADVOGADOS PODEM SAIR DO TRIBUNAL


A DECISÃO
Os ficheiros proibidos
Aníbal Pinto pediu cópia do apenso com os emails roubados pelo hacker. A juíza

C
aixas de correio eletróni- Paris Saint-Germain, Manchester
co integrais dos mais im- City, FC Porto e Benfica; de jorna-
portantes escritórios de listas; de responsáveis do Ministé-
advogados portugueses; q rio da Justiça, da Administração
de magistrados do Ministério Pú- Defesa Interna ou da Rede Nacional de
blico como o ex-diretor do Depar- Aníbal Pinto diz que no Apenso F Segurança; do universo de Isabel
tamento Central de Investigação e existem emails trocados entre dos Santos e da Igreja Universal
um inspetor da Polícia Judiciária
Ação Penal, Amadeu Guerra; de e responsáveis da Doyen do Reino de Deus.
responsáveis de clubes de futebol O conteúdo de todas estes
como o Real Madrid, AC Milan, emails, colocado no chamado

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Sobe&Desce

de Rui Pinto
autorizou – mas a Ordem dos Advogados recorreu. Por Nuno Tiago Pinto
Octávio Ribeiro
Jornalista

g
Rúben Amorim
q vez da entrega de uma cópia inte- Treinador do Sporting
Ficheiros gral dos ficheiros, a Ordem dos Discurso focado.
A defesa de Rui Pinto Advogados defende que Aníbal Cultiva um fute-
já foi consultar o Apenso F Pinto poderá consultar o apenso bol com trocas
à secretaria do tribunal, mas
não pediu cópia dos ficheiros nas instalações do tribunal, como de bola simples
já terá feito a defesa de Rui Pinto. e surpresa nos

Apenso F do processo em que Rui


488
emails
O recurso foi admitido pela juíza,
que deu às restantes partes do
processo – arguidos, MP e assis-
lançamentos
longos. Escrevo
antes do jogo da Taça,
Pinto e Aníbal Pinto estão a ser jul- Foi o número tentes – 10 dias para se pronun- onde até poderá cair no
gados, poderá em breve sair da de contas de ciarem. A data começou a contar Marítimo, mas a vitória sob
guarda do tribunal. Isto porque o correio eletróni- na passada quinta-feira. intempérie garante estofo
advogado Aníbal Pinto pediu uma co encontradas Já Aníbal Pinto compreende a de campeão.
cópia integral desse apenso e a em apenas um posição da AO uma vez que o
juíza que preside ao julgamento dos dispositivos apenso contém matéria sigilosa, g
autorizou. Motivo: o apenso foi apreendidos mas frisa: “o problema é que o Mi- Passos Coelho
identificado como prova pelo a Rui Pinto nistério Público não podia ter feito Ex-primeiro-ministro
Ministério Público e, por isso, os a acusação e juntado o Apenso F Crescem as vo-
arguidos estão no direito de lhe como prova. Os documentos não zes da Direita que
aceder para garantir a sua defesa. podem ser usados para acusar e o apontam como
É o próprio Aníbal Pinto que não para me defender.” E explica o maior elemento
confirma a decisão à SÁBADO. por que motivo quer ter acesso ao federador do es-
“Durante o julgamento dissemos conteúdo do apenso. “No meu paço não socialis-
que íamos fazer um requerimento requerimento defendo que houve ta. Continua re-
formal a pedir o apenso. A juíza provocação por parte da Judiciá- servado, dedicado à pacata
disse que não era preciso e que ria e do doutor Pedro Henriques vida de professor. Portugal
bastava pedir. Fui comprar duas [advogado e amigo de Nélio Lu- vai precisar de Passos na
pens, gastei cento e tal euros e cas] que me montaram uma ar- política ativa.
entreguei no tribunal. A Judiciária madilha com o objetivo de me
gravou as pens, mas agora estou prender em flagrante e não con-
à espera que a juíza autorize. seguiram. No processo vejo indi-
Esperava já as ter para as estudar cações da Polícia Judiciária à i
durante as férias judiciais mas não Doyen e a recomendar um jorna- Donald Trump
foi possível. Parece que houve um lista freelancer para me contactar, Presidente dos Estados Unidos
requerimento da Ordem dos Ad- que o fez, sabendo de informa- Cada vez mais
vogados e a juíza deu alguns dias ções que estavam em segredo de patéticos e peri-
para as partes se pronunciarem. Recurso justiça. Nesse apenso há comuni- gosos estes últi-
Vou saber agora no julgamento Os advogados cações entre o inspetor-chefe Ro- mos dias de
como isso está”, diz. da Doyen tam- gério Bravo e o Pedro Henriques Trump na Casa
bém pediram e outros emails e é só isso que me Branca. Depois
Uma caixa de Pandora uma cópia do interessa”, diz. da passagem de
A Ordem dos Advogados (OA), que Apenso F. Os juí- Caso a decisão seja mantida, poder para Biden, urgirá
é assistente no processo, manifes- zes autorizaram, Aníbal Pinto ficará na posse de se- apurar a responsabilidade
tou-se contra a entrega de uma mas o MP recor- gredos que o inspetor responsável de Trump no assalto ao
cópia do Apenso F uma vez que reu para o Tri- pela investigação a Rui Pinto, José Capitólio. Será o tempo
ele contém documentos sujeitos a bunal da Rela- Amador, classificou em julgamen- da Justiça.
sigilo profissional e apresentou um ção, que ainda to como uma autêntica “caixa de
recurso suspensivo da decisão. Em não decidiu Pandora”. W

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14 JANEIRO 2021
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O CASO
JUSTIÇA. O COLABORADOR DO SECRETÁRIO DE ESTADO

O assessor-plagiador
Mário Morgado contratou para o seu gabinete o jurista Jorge Gregório,
como técnico especialista. O ex-professor na Lusófona perdeu o grau
de doutor em 2012 devido a uma acusação de plágio.
Por Maria Henrique Espada

q
Mário
Morgado
O secretário de Estado
afirma que desconhecia até
agora este dado do percur-
so do colaborador que
nomeou há um ano, mas
não se pronuncia
sobre ele

PEDRO CATARINO

E
m 2012, Jorge Gregório viu a ra, sem a inerente atribuição. À época, Estado Adjunto e da Justiça (SEAJ), que
Universidade Lusófona anu- o docente explicou ao Correio da Ma- só através das perguntas da SÁBADO
lar-lhe o doutoramento, por nhã que, “se aconteceu, foi lapso”. teve conhecimento do assunto.”
suspeitas de plágio. O texto de Gregório, com alguma ligação ao PS E esclarece que ali o técnico especia-
dissertação fora entregue ao então di- – chegou a integrar o Conselho de Ju- lista nunca se disse doutorado: “O Dr.
retor do curso de Ciência Política, Fer- risdição do partido durante a liderança Jorge Gregório nunca invocou perante
nando Santos Silva – o mesmo, por si- de José Sócrates –, viria sete anos de- o SEAJ a qualidade de ‘doutor’, sendo
nal, que aprovou as polémicas equiva- pois, em 2019, a ser nomeado técnico certo que da nota curricular pelo mes-
lências na licenciatura de Miguel Rel- especialista no gabinete do atual se- mo apresentada e publicada no Diário
vas. E a mesma tese fora recusada an- cretário de Estado Adjunto e da Justi- da República, aquando da sua nomea-
tes pela Universidade Portucalense. Na ça, Mário Morgado. ção como técnico especialista, também
altura, Jorge Gregório demitiu-se do não consta que tenha, ou alguma vez
ISCAD (Instituto Superior de Ciências Governante soube pela SÁBADO tenha tido, esse grau académico.”
da Administração), de que era vice-di- Questionado sobre a nomeação, o ga- A SÁBADO questionou ainda se o
retor, na sequência do caso. binete do juiz de carreira afirmou des- SEAJ não vê inconveniente em contra-
As suspeitas de plágio prendiam-se conhecer este episódio no percurso do tar alguém com uma situação de plágio
com citações da obra Noções Gerais de seu colaborador. “A situação descrita no currículo, mas não obteve resposta
Direito, de Manuel Cavaleiro de Ferrei- nunca foi reportada ao secretário de concreta para esta questão. W

16
Para nos mantermos realmente
informados, não basta ler as letras
grandes ou passar os olhos pelos
títulos. É preciso mais, é preciso
perceber os contornos, ler toda a
história, ir até ao fundo. Só assim
conseguimos pensar por nós próprios.
E para isso, precisamos de informação
credível, independente e verdadeira.
Pense por si.

Brevemente um novo sabado.pt


14 JANEIRO 2021
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SARA CAPELO

A FIGURA Angela Merkel


Em 2021, faz 16 anos como chanceler alemã.
E não se candidatará a um quinto mandato.
Político, analista ou empresário: quem sucederá?
São três os candidatos nas eleições da CDU dias 15 e 16. E
nenhum é mulher. Armin Laschet segue a linha da chan-
celer, mas a sua gestão da Covid no estado da Renânia
O seu sucessor na CDU (e potencial próximo tem gerado críticas. Na oposição: o empresário Friedrich
chefe de governo) é escolhido dentro de dias. Merz e Norbert Röttgen, perito em política externa
Sem a “mutti” (mãezinha) a liderança da UE
fica a cargo de Emmanuel Macron

Regresso ao passado
Merz, de 65 anos, estará em vantagem,
ainda que o descrevam como “anacróni-
co”, “abrasivo” e “demasiado à direita”,
escreveu o Financial Times. Os críticos
dizem que Merz quer “arrastar a CDU de
regresso aos anos 90 e ao seu passado
conservador”. O gestor nega e recorda
que o seu lema é: com a saída de Merkel
a Alemanha pode recomeçar
Auf wiedersehen,
frau Merkel
Angela Merkel anunciou a
decisão de não se recandi-
datar a um quinto mandato
em 2018. As eleições gerais
serão no outono e o seu
sucessor na CDU – que
será escolhido este fim de
semana – posiciona-se
como o sucessor-natural
na chancelaria, em Berlim

E agora, Europa? Só resta


monsieur Macron
A sua saída é um dos princi-
pais riscos de 2021 para a
consultora Eurasia Group,
que sublinha o consenso
alcançado pela chanceler
entre os 27 para aprovação
do Fundo de Recuperação
A aliança “imperdoável” no pós-pandemia. Sem ela
Annegret Kramp-Karrenbauer seria e com Macron concentrado
a sua sucessora (valorizou-se que no plano interno, “a UE fica
fosse mulher). Mas, em 2020, con- com uma liderança fraca”
cordou com a aliança à extrema-di-
reita na Turíngia (“imperdoável”,
disse Merkel) e teve de renunciar
à liderança da CDU.
Com refugiados foi personalidade do ano da Time
Com um estilo de liderança que ela diz ter sido molda-
do na infância na RDA, chegou a chanceler em 2005
como a mädchen ou “minha menina”, dizia Helmut
Khol. Sairá aos 67 anos como a mutti, a mãezinha que
mudou com a chegada dos refugiados, em 2015.
REUTERS

18
Descubra
a economia
Para nos mantermos realmente informados, não basta
ler as letras grandes ou passar os olhos pelos títulos.
É preciso mais, é preciso perceber os contornos, ler
toda a história, ir até ao fundo. Só assim conseguimos
pensarpor nós próprios. E para isso, precisamos
de informação credível, independente e verdadeira.
Pense por si.

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14 JANEIRO 2021
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SÓNIA BENTO

INSÓLITO
! !
Vivem com 120 Mulher usou o mesmo
cobras e 70 aranhas vestido 100 dias
Um casal obcecado por Robbins-Cole, de 52 anos, uma
animais de estimação norte-americana, de Boston,
exóticos tem em casa lançou um desafio sustentável e
cerca de 120 cobras e 70 propôs-se a usar o mesmo ves-
aranhas, além de ouriços tido preto, de manga comprida
e lagartos, em Llanelli, no e pelos joelhos, durante 100
País de Gales. Entre as dias. Ela diz que não lhe custou
criaturas estão pítões bir- nada e que até a inspirou a não
maneses, albinos e de comprar roupa em 2021.
Macklot, uma tarântula
vermelha mexicana, cuja
mordida é dolorosa. !
Japão: cerejas a
milhares de euros
! 1. Uma caixa de 500 gramas
Amarrado por de cerejas vendeu-se no primeiro
calote ao tatuador grande leilão de 2021, em Yama-
Um rapaz foi embrulha- gata, no Japão, por 1 milhão de
do em papel celofane e yenes (7.869 euros).
amarrado a uma árvore, 2. As cerejas eram da variedade
com uma placa que dizia satonishiki, cultivadas na cidade
“eu odeio pagar tatua- ! de Tendo, que se orgulha de ter
gens”, em Hanói, no
Vietname, por não ter
pago as tatuagens que
Uma rotunda submarina as primeiras colheitas. Geralmen-
te, surgem na primavera, por isso
estas foram excecionais.
As ilhas Faroé, situadas no Atlântico Norte, fizeram
fez. O tatuador apanhou- 3. O preço deve-se à tecnologia.
-o e deu-lhe uma lição. história ao construir a primeira rotunda do mundo As cerejeiras crescem em vasos
debaixo de água. O arquipélago de 18 ilhas, depen- especiais e vão para uma estufa,
dente da Dinamarca, começou em 2017 a obra que onde se mantêm a 25 graus
durante o dia e a 13 graus à noite.
inclui três vias submarinas, com mais de 11 km, que
vão dar à rotunda, situada 180 metros abaixo do
mar. Tróndur Patursson foi o artista que fez a deco- !
ração, com um mural nas paredes e cores no teto, Multa para quem vai
luzes e esculturas como se fosse o fundo do mar. muito à casa de banho
Uma empresa chinesa de
O custo da obra foi de 360 milhões de euros. produtos tecnológicos foi
criticada por aplicar uma
multa de €3 a funcionários
! ! “preguiçosos”, que fazem
UMA EMPRESA DE COMIDA VEGAN ESTÁ À Criança presa por várias pausas por dia para ir
PROCURA DA PESSOA MAIS CARNÍVORA DO não levar máscara à casa de banho para fumar.
REINO UNIDO, QUE ACEITE SUBSTITUIR A O cumprimento das
medidas sanitárias che-
CARNE POR PLANTAS E VEGETAIS DURANTE gou a um extremo insólito
TRÊS MESES, A TROCO DE 55 numa pequena localidade
MIL EUROS. O PARTICI- da Argentina, quando
PANTE DEVERÁ PRO- uma miúda de 10 anos,
VAR OS PRODUTOS que saiu com uma prima,
foi detida por não ter
VEGAN E PARTILHAR máscara. A criança esteve
A SUA OPINIÃO NAS uma hora na esquadra até
REDES SOCIAIS. a mãe a ir buscar.

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Descubra
a Investigação que não vê
Para nos mantermos realmente informados,
não basta ler as letras grandes ou passar os olhos
pelos títulos. É preciso mais, é preciso perceber
os contornos, ler toda a história, ir até ao fundo.
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CARLOS TORRES

OBITUÁRIO
Hubert Auriol (1952-2021)
O Africano foi o primeiro a ganhar o objetivo de bater o recorde do milio- O PRIMEIRO pensar na viagem. De repente per-
o Paris-Dakar em motas e carros, nário Howard Hughes, que em 1938 DAKAR, EM cebi: aquilo é que foi viver”, contou
liderou uma revolta dos pilotos deu a volta ao mundo num avião de 1979, MU- em 2016, num documentário grava-
e criou a África Eco Race. Morreu hélices em 91 h e 14 min. – eles iriam DOU-LHE A do no Senegal para a BMW, a marca
a 10 de janeiro, com 68 anos fazê-lo em 88 h e 49 min. VIDA: “DE- pela qual ganhou as edições do Da-
POIS DE kar em 1981 e 1983 – foi 2º em 1984.
Nasceu na Etiópia VOLTAR, SÓ Na estreia pelos carros, em 1988,

D
epois de 15 anos ligado às Hubert Auriol tinha a alcunha de O CONSEGUIA num buggy da Kouros, desistiu na
motas, um acidente levou-o Africano, pelos seus anos de ligação ao PENSAR NA Argélia, com o motor partido. Em
a mudar-se para os carros. Dakar (esteve em 16 edições como VIAGEM” 1992, já na Mitsubishi, fez história ao
Aconteceu em 1987, no rali Paris- piloto e nove como diretor da tornar-se o primeiro a ganhar o
-Dakar. À partida para a penúltima prova), mas também por Dakar nas motas e nos carros (feito
etapa, Hubert Auriol tinha 12 minutos ter nascido, a 7 de junho só repetido por Stéphane Peter-
de avanço para o seu rival, o também de 1952, em Adis Abeba hansel e Nani Roma).
francês Cyril Neveu. Já perto do fim, – o pai dirigia a com- Em 1994, naquele que seria o
Auriol entrou em grande velocidade panhia dos caminhos seu último Dakar, obrigou os
num terreno arenoso e, ao passar en- de ferro na Etiópia. responsáveis a mudar o
tre duas árvores, não se apercebeu Quando ele tinha 11 percurso numa zona de
das raízes (tapadas pela areia), bateu- anos, voltaram para grandes dunas, que iriam
-lhes com os pés e despistou-se. Fez França – fez os seus pôr em risco os pilotos. No
os últimos 20 km em sofrimento, em estudos em ciências ano seguinte passaria a ser
especial quando punha mudanças. económicas e teve um ele o diretor da corrida – até
Ao cruzar a meta, ainda líder por 3 negócio de venda de têx- 2004. Em 2008, após a edição
minutos, atirou-se para o chão e aos teis. Ao mesmo tempo, ter sido cancelada, devido à insta-
gritos revelou: “Tenho os tornozelos entrava em provas de trial bilidade política e às ameaças terro-
partidos.” As lesões graves impedi- e motocrosse, tendo-se es- ristas (o Dakar não iria mais voltar
ram-no de alinhar na última etapa treado em 1973, com 21 anos, a África), criou a África Eco Race,
(a da consagração). Deitado ao sol, no campeonato francês de en- que ligou Marselha ao Senegal.
enquanto os médicos lhe prestavam duro, que iria vencer em 1980. Divorciado, com três filhas, Auriol
os primeiros cuidados, exclamou: No ano anterior, aos coman- estava internado no hospital
“O Cyril é o mais forte. Vou deixar as dos de uma Yamaha 500, desde novembro, com
motas.” Este episódio seria contado participou na primeira Covid-19. Morreu a 10
no livro Paris-Dakar. Une historie edição do rali Paris- de janeiro, vítima de
d’hommes, escrito com a ajuda do -Dakar (acabou em um AVC. No seu epi-
jornalista Jean-Michel Caradec’h. 7º), prova que lhe táfio deverá ficar o
Nesse ano de 1987, Auriol, ainda a iria mudar a vida. lema que sempre o
recuperar das lesões, partiu de Bour- “Foi extraordinário. acompanhou: “Se é
get com mais três pilotos a bordo de Mesmo depois de impossível, deve ser
um avião Lockheed dos anos 40, com voltar, só conseguia interessante.” W
LUIS GRAÑENA

Michael Apted O seu maior projeto, iniciado em 1941, começou a trabalhar em te-
(1941-2021) 1970 e que manteve até 2019, foi
a série televisiva Up!, em que fil-
levisão em 1963. No cinema, des-
tacou-se pelas protagonistas fe-
Celebrizado em 1980 por A mava britânicos, voltando a fazê- mininas fortes – de Sissy Spacek
Filha do Mineiro, que valeu -lo sete anos depois, verificando o em A Filha do Mineiro a Sigour-
um Óscar de Melhor Atriz a que havia mudado: “Queria que ney Weaver em Gorilas na Bruma
Sissy Spacek, também reali- lhes acontecesse coisas dramáti- ou Jodie Foster em Nell. Também
zou um James Bond e foi mes- cas, para dar filmes interessantes, fez blockbusters: 007 – O Mundo
tre do documentário. Morreu e ao mesmo tempo não queria, Não Chega (1999) e As Crónicas
a 7 de janeiro, aos 79 anos porque ficava amigo deles.” de Nárnia: A Viagem do Cami-
Nascido a 10 de fevereiro de nheiro da Alvorada (2010). W RB

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INDISCRETOS !
Justiça: €20 mil
para redes sociais
Não será por falta de investimen-
to que o Ministério não comunica
bem. Em junho, o MJ contratou
Raquel Leal, ex-chefe de gabine-
te da secretária de Estado da In-
dústria, Ana Lehman, para “con-
ceção da estratégia de comuni-
cação nas redes sociais” dos seus
serviços online. Por 19.990 euros
em 170 dias. O MJ explica que
“não se dispunha de recursos
neste domínio na área governati-
va da Justiça” e que “a prestação
de serviços já terminou”.

Vem aí almoço
dos “conspiradores”
! cia de António Costa, o escritor Fran-
RESISTÊNCIA À MESA cisco José Viegas convocou os três
Os sociais-democratas Miguel Poiares conspiradores no Twitter: “Querem !
Maduro, Paulo Rangel e Ricardo Bap-
tista Leite são os autores de uma
vir almoçar ou estão todos em cam-
panha internacional?” Os três aceita-
Meia hora
“campanha internacional contra Por- ram, conta Viegas à SÁBADO. O re- socialista na UE
tugal” – pelo menos é o que diz o pri- pasto está pois garantido, mas o agra- Os diplomatas europeus parecem
meiro-ministro, por causa das críticas vamento da pandemia, contudo, veio agradados com o estilo doce e
dos dois primeiros à interferência do atrasá-lo. “O Ricardo Baptista Lei- mais dorminhoco da presidência
Governo na nomeação do procurador te é médico e tem uma po- portuguesa do Conselho da UE.
europeu, e do último às falhas na sição sanitariamente Serviram-lhes pastéis de nata no
pandemia. Minutos depois da denún- correta”, ironiza. primeiro encontro de embaixado-
res e as reuniões já não arrancam
às 8h, como na presidência alemã
! ! Agora é às 9h30. Em tempos cha-
Constança, Portas Morgado mou-se “meia hora socialista” aos
30 minutos que o PS fazia deslizar
e a “fantochada” zangado com juiz qualquer evento seu. Agora na Eu-
A jornalista Constança Cunha e O secretário de Estado Adjunto ropa também se começa mais tar-
Sá não está feliz com as op- e da Justiça Mário Morgado an- de, mas no horário.
ções da sua antiga casa. Es- dou a trocar bocas na sua pági-
creveu no Twitter: “Quan- na de Facebook, pedindo até
do é que a TVI percebe contenção a um colega juiz
que o Paulo Portas não é menos satisfeito com o
médico, nem infecciolo- recente caso da escolha
gista e não tem prepa- do procurador europeu,
ração para ter um co- lembrando-lhe que es-
mentário semanal so- tava em funções. Só
bre vírus e vacinas?” faltou mandá-lo estar
Uma “fantochada calado. Mas quem se
semanal”. Longe vão calou foi o secretário
os tempos de O de Estado: os comen-
Independente, em que tários já não estão
Portas foi seu diretor. disponíveis...

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O CARTOON
Por Vasco Gargalo

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A semana

AS FRASES F
Christine Lagarde, presidente do Banco Central Europeu, Corriere della Sera
“As mulheres têm vários poderes que
podem ser úteis a todos. Elas têm o
poder da carteira, são as mulheres que
tomam as decisões sobre o consumo”
F F F
Marcelo Rebelo de Sousa Marques Mendes Jorge Jesus
“Penso que não era mau refletir “A solução não é os idosos “Se sinto a pressão? Não sinto
num prolongamento das saírem para ir às mesas de voto, pressão nenhuma. Os treinadores
moratórias, não pensar em mas as mesas de voto irem todos os dias têm de justificar,
mais seis meses ou mais um ano, aos idosos” mas a minha carreira não deixa
mas mais três ou quatro anos” Comentador, Diário de Notícias dúvida a ninguém”
Presidente da República, TSF Treinador do Benfica, conferência
de imprensa
F
F José Eduardo Agualusa F
Marine Le Pen “Não é minha intenção morrer, Nélson Évora
“O comportamento dos não está nos meus objetivos “A verdade é que me sinto
portugueses em França devia Escritor, Público melhor do que nunca
ser um orgulho para Portugal” e treino como um animal”
Líder da extrema-direita francesa, Atleta, Nova Gente
Diário de Notícias F
Ana Gomes
F “Trabalhei com Ramalho Eanes F
Pedro Proença e foi com ele que aprendi Ricardo Pereira
“Não queremos o dinheiro a ser Presidente “Já perdi a conta ao número
da ‘bazuca’, não precisamos da República” de zaragatoas que fiz”
de verbas a fundo perdido” Candidata à presidência Ator, Caras
Presidente da Liga Portuguesa da República, Expresso
de Futebol, Expresso
F F
Henrique Barros Fátima Lopes
“Se tudo correr “Saio [da TVI] sem um projeto
normalmente no futuro definido. Mas com a paz
sentido de as de quem aprendeu o melhor
vacinas serem caminho a seguir”
F verdadeiramente Apresentadora, Instagram
Cláudia Vieira eficazes e de não
“Desejo que esta haver nenhum
percalço, em 2022, F
pandemia se
2023, a vida passará Daniel Oliveira
evapore e não a ser muito próxima “No plano das ideias, só
deixe mais do que era antes” a direita pode travar Ventura.
sequelas ao nível Epidemiologista, Público No plano dos comportamentos,
da saúde, das só a imposição de regras
e o escrutínio o farão”
perdas e da Comentador, Twitter
economia”
Atriz, TV Mais
VITOR CHI

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F
Vanessa Kirby, atriz, Io Donna

“Não ser a
miúda mais
popular da
escola ensinou-
-me algo sobre
o poder que o
julgamento dos
outros tem sobre
nós. Talvez eu
seja estranha,
mas isso não me
incomoda”
GETTYIMAGES

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A semana

ENTREVISTA
É investigadora no Instituto de Ciências Sociais, em Lisboa. Em 2016,
ganhou uma das mais importantes bolsas do Conselho Europeu de
Investigação com um projeto sobre o racismo e as racializações.
Por Lucília Galha (texto) e Sérgio Lemos (fotos)

CRISTIANA BASTOS

“Não basta dizer


que não há raças,
porque há racismo
todos os dias”

A
ndou uma década a mari- Durante um período, há mais de 10
nar esta ideia. Leu tudo o anos, enquanto estudava aspetos de
que podia e não descan- medicina e ciência dentro de con-
sou até explorar o assun- textos de império, encontrei uns es-
to. “É que isto virava um bocado do critos curiosos de um autor racialis-
avesso o que já se sabe da nossa His- ta (e racista mesmo), que era um
tória”, diz Cristiana Bastos. “Isto” é a Registos médico de Goa. Entre esses escritos
história de várias populações, entre Através dos livros havia considerações sobre os des-
as quais também portugueses, que de pagamentos cendentes de europeus que ele en-
durante o século XIX “foram trafica- das plantações foi controu em Angola nos anos 1920.
das para servir o poder económico” possível reconsti- Fiquei curiosa sobre quem seria
– apesar de a escravatura já ter sido tuir a dinâmica aquela população e segui essa his-
abolida. E de esse contexto ter ajuda- económica e saber tória – era uma experiência de
quantas pessoas
do a consolidar o racismo, tal como da família viajavam
colonização no planalto da Huíla.
existe hoje. A antropóloga ganhou e lá trabalhavam
uma bolsa do Conselho Europeu de Foi o que ele escreveu sobre essa
Investigação para desenvolver este população que a despertou para
projeto chamado “A Cor do Trabalho: o tema?
as Vidas Racializadas dos Migrantes”. F Essa população era totalmente ma-
Em conversa via Zoom com a SÁBA- “As deirense e o que me saltou à vista
DO, a investigadora só lamenta não sociedades foi que aquelas pessoas pareciam
ter encontrado diários de bordo das são reféns de ter uma atitude mais parecida com
embarcações. Há uma explicação: uma forma a de migrantes do que com a de co-
“Como era tudo companhias priva- de pensar que lonizadores. Percebi que talvez fos-
das, elas têm direito a eliminá-los.” cristalizou se preciso uma ponte entre duas
nesse período realidades que são tratadas separa-
Como e quando surgiu a ideia das grandes damente: a realidade das migra-
deste projeto? plantações” ções e a do império.

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j Como assim?
É antropóloga e Estava a haver um fluxo para fora
coordena o grupo
Identidades, Cul- da Madeira muito forte, que preocu-
turas e Vulnerabi- pava as autoridades. Uma espécie
lidades do Institu- de roubo de gente – era nesses ter-
to de Ciências So-
ciais de Lisboa. mos que os políticos falavam –, e
Formou-se na Fa- isso não está claro na história que se
culdade de Ciên- conta habitualmente. Esse fluxo era
cias Sociais e Hu-
manas e fez dou- sobretudo para a Guiana Inglesa
toramento em [uma colónia britânica na costa nor-
Nova Iorque te da América do Sul] e, mais tarde,
para o Havai. Os portugueses esta-
vam a ser desviados para esses des-
tinos, para fazer a riqueza dos ou-
tros, e isso deixou-me curiosa.

Foi a génese para este projeto?


Sim, a minha ambição é explorar a
relação entre deslocações e recruta-
mentos em massa para o trabalho
em plantações e o processo de dife-
renciação que se transformou em
racialização. As sociedades são re-
féns de uma forma de pensar que
cristalizou nesse período das gran-
des plantações, primeiro com a es-
cravização de africanos e depois,
noutros termos, com outros grupos,
incluindo portugueses.

Que forma de pensar é essa?


De que existem categorias de pes-
soas diferentes, umas destinadas a
ser donos e outras a trabalhar para
eles. O racismo não foi inventado
nas plantações, mas esse contexto
(de monoculturas de produtos vege-
tais destinados a mercados) ajudou
a legitimar esta forma de pensar de
que há raças humanas diferentes
com funções diferentes e de que
é legítimo escravizar umas para
benefício de outras.

Mesmo depois da abolição da


escravatura?
Sim, o que estou a estudar são esses
F contextos em que, na sequência da
“A população abolição da escravatura e continua-
era totalmente ção da economia de plantação, se
madeirense e encontram outras dinâmicas de ra-
parecia ter cialização, com várias populações
uma atitude asiáticas, africanas e, entre outros,
mais de também portugueses.
migrantes
que de Qual é a distinção entre racialismo
colonizadores” e racismo? Q

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Q O racialismo é o sistema cognitivo Para o Havai, as pessoas já sabiam


e o racismo são crenças e práticas. ao que iam e os contratos davam-
O processo de racialização é o de -lhes alguns benefícios. Mas o tra-
produção de categorias raciais em balho era o mesmo e também havia
circunstâncias históricas. Por outras chicotes – o feitor estalava o chico-
palavras, o racialismo é obsoleto – te para amedrontar e há casos de
qualquer pessoa minimamente for- maus-tratos. Entrevistei descenden-
mada sabe que não existem raças tes que me contaram que os seus
biológicas –, mas o racismo man- trisavós relataram situações pareci-
tém-se vivo, enquanto crenças e das à escravatura.
atitudes herdadas de um passado.
A violência decorria do trabalho?
Porque é que os madeirenses Sim, era brutal: 12 horas, seis dias
faziam estas deslocações? por semana, ritmos imparáveis e a
No início do século XIX é, definiti- manipulação da cana-de-açúcar
vamente, proibida a escravatura nos também é muito exigente. Além dis-
lugares do império britânico, mas a so, para que a plantação funcionas-
economia de plantação continua e se, punham os vários grupos em
recruta outras fontes de trabalho. A concorrência. Havaianos, japoneses,
Madeira era uma ilha que ficava à portugueses, chineses, alemães,
mão de rotas de navegação britâni- polinésios, todos com pagamentos
cas, nos anos 1830-40. Foi relativa- diferentes e separados fisicamente.
mente exequível recrutar ali pes- Isto já no final do século XIX.
soas para fazerem o que antes fa-
ziam os escravizados africanos. g contar essa história? Qual foi a história que mais a
É a investigadora Houve historiadores a chamar a impressionou?
principal deste
As pessoas iam ao engano? projeto que en- atenção para a importância da mi- Há uma, no contexto da migração
Nalguns casos, as pessoas eram ali- volve outras seis gração. Mas o meu objetivo é olhar para o Havai: foi o naufrágio de uma
ciadas, nem sempre sabiam ao que pessoas, entre as para as pessoas e perceber que mo- família. Quando chegavam a Hono-
quais uma admi-
iam, noutros estavam simplesmente nistrativa (para tivações tinham, o que passaram lulu, ficavam de quarentena num
a fugir da fome e aceitavam qual- questões buro- durante a viagem e à chegada e posto e só depois iam para cada uma
quer situação. A única fonte dessa cráticas) como foram postos numa gaveta das ilhas, trabalhar nas plantações.
altura, anos 1840, que encontrei pa- racializada. Na Guiana diz-se que Numa dessas viagens, o mar estava
recida a um diário de bordo, narra há seis raças: brancos, ameríndios, picado, o barco grande não conse-
uma situação em que eles entram negros, indianos, portugueses e chi- gue desembarcar e as pessoas são
no barco em pele e osso, em estado neses. Os portugueses são tipifica- metidas em escaleres [pequenas
tão esquálido que a tripulação tem dos enquanto raça só porque vie- embarcações]. Há uma família em
de cuidar primeiro deles e só depois ram ocupar um lugar na produção que um dos filhos vai num barco
cuida da navegação. No final do sé- que os categorizou dessa maneira. com homens e o resto segue noutro
culo XIX, há uma comunidade por- barco. Esse filho vê toda a família
tuguesa na Guiana muito importan- Como chegou até às histórias? morrer, devorada pelas ondas. De-
te – foram mais de 30 mil para lá. Entrevistei dezenas de descenden- pois há um inquérito e eu vou escre-
tes e acompanho grupos de pesqui- ver sobre isso, é pungente.
Isto oferece um olhar diferente sa genealógica na Internet. Além
sobre a nossa História. disso, estive na Guiana e no Havai, O que se passava nas plantações
Há muitas maneiras de contar a onde fiquei três meses e meio se- tem ecos no presente?
História, nenhuma é única e verda- guidos, e consultei uma série de As fraturas sociais que o sistema de
deira. É mais fácil contar uma histó- arquivos e li milhares de fólios. plantação criou sobrevivem até hoje
ria com feitos e heróis e esquecer o como divisões. Não basta dizer que
outro lado. O que proponho é des- Lepra O projeto debruça-se sobre seis não há raças, porque há racismo to-
focar essa obsessão pelas conquis- Havia tanta no Ha- rotas de migração. Quais são as dos os dias. Não existem raças mas
tas imperiais e olhar para o que vai que uma das mais importantes? elas persistem no imaginário e, ao
realmente se passava, nomeada- ilhas tinha um le- A Guiana é a mais reveladora de rea- serem enunciadas, tornam-se reais.
mente no século XIX. O que falta prosário, chamado lidades que os portugueses geral- Veja o que aconteceu nos Estados
Kalaupapa. Olivia
fazer é contar a história que mostra Robello foi uma
mente ignoram sobre a sua história. Unidos: em 2020, nas manifestações
os portugueses mais como migran- das portuguesas As idas durante os anos 1830-40 fo- Black Lives Matter houve um enor-
tes do que como exploradores. a ir lá parar. Es- ram experiências radicais que leva- me aparato policial; já na invasão
creveu um livro ram à morte de muita gente: violên- do Capitólio por agitadores brancos,
Não houve até hoje interesse em sobre o exílio cia na plantação, febres, abusos, etc. quase não aconteceu nada. W

30
Escolhas

Vinhos
distintos
para
os jantares
Conheça
em unibanco.pt de inverno
todas Têm origem no
as vantagens Alentejo, Lisboa
para o seu
dia a dia.
e Douro e são apenas
Aproveite alguns exemplos de tin-
a oferta tos de qualidade, com
de adesão. aromas e sabores dife-
rentes, que se produ-
TAEG 15,3% zem em quase todo o
território de Portugal
continental. Destinam-
-se essencialmente aos
sabores da carne, mas
não só.
Os melhores produtos de beleza sustentáveis
Marcas de nicho, que já nas- Pequenas marcas nacionais e nomes
ceram sustentáveis, mas tam- de culto a nível internacional, desde
bém multinacionais cada vez sempre dedicados à causa da sus-
mais preocupadas com o am- tentabilidade, mas também gigantes
biente. Venha descobrir os produtos globais, onde cada passo, por muito
de beleza para cuidar de si e do planeta. pequeno que seja, tem um efeito ex-
Não há Planeta B e as nossas escolhas, ponencial.
enquanto consumidores, têm um impac- Estamos conscientes de que nem to-
to direto na sua sustentabilidade. Feliz- das as marcas mencionadas fazem
mente existem cada vez mais empresas tudo da forma mais correta, e que al-
que pensam tal como nós e procuram al- gumas fazem muito mais do que ou-
ternativas para as suas embalagens de tras, mas todos os passos dados na di-
plástico, para a origem dos ingredientes reção certa contam, porque o que fi-
utilizados ou para a importância de se- zermos agora – ou não fizermos – vai
rem naturais – e preferencialmente locais. determinar o preço a pagar no futuro.

Seis atividades que pode aprender


enquanto está em casa
Estes dias passados em recolhi-
mento podem ser uma boa oportunida-
de para enriquecer os seus conhecimentos Leia a totalidade
em áreas tão diversas como a fotografia, a destes e outros artigos
jardinagem ou o macramé… no blog do Unibanco
É verdade que existem por esse mundo fora
toneladas de cursos e workshops, mas por
estes dias a frequência presencial de aulas
está “um pouco” dificultada, por isso a solu-
ção é recorrer a cursos online para viajar, dar
largas a sonhos há muito adiados e ganhar
um novo passatempo que pode praticar
mesmo dentro de quatro paredes ou no jar-
dim (caso tenha essa sorte) de sua casa.
TAEG 15,3%. Exemplo para limite de crédito de 1.500€; prazo 12 meses; TAN 14,00%. Válido para adesões desde 1 de abril de 2020. Para mais informações contacte a Unicre – Instituição Financeira de Crédito S.A.
Opinião

A LAGARTIXA O O

E O JACARÉ O problema Quando não


Ao nível europeu os das há muita
governos perderam o
controlo da pandemia e o presidenciais coisa para
nosso não é excepção. A
maioria das pessoas sabe é não serem criticar...
isso e não se indigna muito,
daí os bons resultados nas
sondagens. Por isso, mais
um problema …fala-se mais alto. Tenho seguido
com atenção a actuação governa-
valia criar uma gestão Os debates das Presidenciais intro- mental. Não é perfeita, é errática,
da crise institucional, duziram alguma animação, alguma muitas vezes incompetente e, num
comprometendo os partidos afirmação de personalidade e estilo, caso solitário, é um erro grave. No es-
de Governo nas soluções mas fora disso quase nada. Mesmo a sencial é entre sofrível e suficiente
divisão esquerda-direita, que tão ob- menos. Mas, as críticas tem excesso
sessiva é na política portuguesa, fica
esbatida pela circunstância de o can-
didato que todos sabem vai ganhar,
ser atacado por ser de direita pelos
candidatos de esquerda e de estar
feito com a esquerda pelos candida-
tos de direita. Sobra Ventura para re-
presentar a extrema-direita, mas CDS
e PSD estão com Marcelo.
Ana Gomes e Marisa Matias têm fei-
to campanhas muito frouxas, com o
PS no Governo e mesmo com o BE a
votar contra o Orçamento, é difícil
centrar a campanha contra o PS. So-
bra-lhes Ventura, mas não chega. Por
muito que fossem eficazes contra
Ventura, isso não lhes ganha um voto
retirado a Marcelo. Há demasiadas
redes com nós ligando e separando
os candidatos, para poder haver cla-
reza. Só Ventura a tem, e mesmo as-
sim não lhe chega.
O “nosso” Tino de Rans ganha o
campeonato da popularidade, mas
fora a simpatia pessoal, as razões por
que o ganha não são brilhantes do
ponto de vista político e remetem
para o mesmo populismo de Ventura.
O candidato do PCP tem feito boa
campanha, mas tem às suas costas o
PCP, que é hoje um enorme peso.
Marcelo é Marcelo. Não tem estado
nem bem nem mal, embora o bem de
Marcelo esteja muito acima do bem
dos outros. E onde está mal, passa in-
cólume porque, ou por conveniência
ou incompetência, os outros candi-
datos não dão conta das fragilidades
da sua posição.
O Por tudo isto, não há problema e o
Professor único que há, a abstenção, vai passar
José Pacheco Pereira por ser culpa da pandemia. W SUSANA VILLAR

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de furor em relação aos pecados, percebeu que os Governos perderam O


transformando questões secundárias
– por exemplo, o confinamento de-
o controlo da pandemia, e o nosso
não é excepção. A maioria das pes- O estouro
via ser dia X ou dia Y, foi “cedo” ou
“tarde”, foi mau para os restaurantes
no Ano Novo mas bom para as famí-
soas sabe isso e não se indigna muito,
daí os bons resultados nas sonda-
gens. Por isso, mais valia criar uma
de Trump
lias no Natal, etc., – em excessos. gestão da crise institucional, compro- Não estou certo de que Trump estou-
Comparando, ao nível europeu já se metendo os partidos de Governo nas rasse de vez, mas que com os últimos
soluções encontradas, mas dando- eventos implodiu e explodiu com
-lhes poder partilhado de facto e im- bastante fragor. E que vai continuar a
pedindo as asneiras governamentais, fazer estragos, vai. À data a que es-
que se centram quase todas na má crevo este artigo, a única coisa que
relação com os privados. Isto seria o está na sua agenda é uma visita ao
ideal, mas hoje na política portuguesa muro que era suposto os mexicanos
isso é impossível, e, em bom rigor, tal pagarem e que os americanos estão a
é mais grave do que erros na condu- pagar. Se se realizar, é uma maneira
ção da pandemia. W de Trump afirmar o que considera
mais importante na sua Presidência,
o ataque aos imigrantes vindos da
América do Sul, ou seja, que a “cor”
que pretende dar ao que fez comuni-
ca integralmente com as teorias
conspirativas que levaram ao assalto
ao Capitólio. Pelos vistos aquilo que
Trump realmente lamenta é a sua
declaração conciliatória que foi obri-
gado a fazer pelos seus ajudantes nos
momentos críticos pós-invasão.
Deve-lhe ficar a remoer lá dentro, a
sua “fraqueza” em ir até ao patamar
de conceder a vitória de Biden, sem
nunca o afirmar. W

Twitter e
Facebook
Não sou especialmente favorável ao
corte das contas de Trump nas redes
sociais que ele usou com mestria. De-
via haver mecanismos rápidos e de
carácter judicial para calar o que fos-
se crime, e puni-lo, mas o carácter
discriminatório da censura de com-
panhias que viveram estes anos do
perigoso folclore de Trump e dos
seus aliados, para além de hipócrita,
é mau para as liberdades. W

Texto escrito segundo


o anterior acordo ortográfico

33
Destaque

10h13

ESPIA
EXCLUSIVO. PROCURADORAS SUSPEITAS DE ABUSO DE PODER E PRÁTICAS DE UM ESTADO AUTORITÁRIO

13h21

SEGU
13h08

FOTOGRA Operação
A equipa da PSP montou
vigilância à porta da resi-
dência do jornalista às 9h32
7h30. Também o fez à por-
ta da redação da SÁBADO

13h28

...E COM AS CONTAS BAN


Um processo por alegados crimes de segredo de justiça levou duas magistradas do MP
e lhes identificarem as fontes. A procuradora-geral da República garantiu à SÁBADO
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ADOS,
13h25

UIDOS,
15h48

AFADOS...
As mandantes
As duas magistradas do
Ministério Público trata-
ram da estratégia destina-
Os executores
Os dois oficiais dirigiram
no terreno as vigilâncias
aos jornalistas. O trabalho
da a quebrar o sigilo das foi feito pelo Núcleo de
fontes dos jornalistas Apoio Operacional da PSP
Fernanda Andrea José Leitão Rui Moura
Pêgo Marques SUPERINTENDENTE SUBINTENDENTE

E
DIRETORA DIAP LISBOA PROCURADORA PSP PSP

ntre abril e julho de SÁBADO Carlos Rodrigues Lima. A Ação Penal (DIAP) de Lisboa, a
2018, elementos operação sigilosa de elementos OS SEGUI- procuradora-geral-adjunta Fer-
das operações es- policiais à paisana consta de, pelo MENTOS nanda Pêgo, decidiu que a tentati-
peciais encobertas menos, seis polémicos relatórios POLICIAIS A va direta de devassa das fontes de
da PSP vigiaram, confidenciais que foram entregues UM JORNA- informação de jornalistas, um di-
seguiram, fotogra- a uma magistrada do Ministério LISTA VERI- reito protegido pela lei e pela
faram e tentaram Público (MP) e aos quais a SÁBA- FICARAM-SE Constituição, não deveria sequer
identificar todos os contactos pes- DO teve acesso. Andrea Marques, ENTRE ABRIL ser levada à apreciação da juíza
soais, ocasionais e profissionais do secundada pela diretora do De- E JULHO que tutela o processo que ainda
jornalista e subdiretor da revista partamento de Investigação e DE 2018 hoje visa suspeitas de crimes de Q

NCÁRIAS DEVASSADAS
a darem carta branca a agentes da PSP à paisana para seguirem jornalistas
que desconhecia tudo. E, agora, o que fará? Por António José Vilela, Nuno Tiago Pinto e Eduardo Dâmaso
35
Destaque

Q violação de segredo de justiça, “É ASSUSTA- nalistas. “É assustador que, neste


violação de segredo de funcioná- DOR QUE contexto de ataque cerrado à liber-
rio e falsidade de testemunho. HAJA UM dade de imprensa em muitas para-
A vigilância do elemento da dire- PODER JUDI- gens, haja um poder judicial a ter
ção da SÁBADO decorreu em para- CIAL A TER uma decisão dessas”, destacou Sofia
lelo com a ordem do MP dada à PSP UMA DECI- Branco, ressalvando que, apesar de
para que fosse também vigiado ou- SÃO DES- não conhecer em detalhe o caso em
tro jornalista, Henrique Machado, TAS”, DIZ A si, “o Sindicato considera que parece
então editor no jornal Correio da PRESIDENTE estar em causa um evidente abuso
Manhã e atualmente a exercer o DO SINDICA- de poder por parte de determinada
mesmo cargo na TVI. Os objetivos fi- TO DE JOR- procuradora do poder judicial. Abuso
nais foram os mesmos: a devassa do NALISTAS que gostávamos de ver esclarecido.”
trabalho de jornalista e a identifica- A SÁBADO vai apresentar quei-
ção dos contactos mantidos com xas-crime contra a procuradora An-
“agentes policiais ou do universo dos drea Marques e a diretora do DIAP
tribunais”; ou seja, com fontes de in- de Lisboa, Fernanda Pêgo, e queixas
formação. Isto foi feito antes de o MP administrativas e disciplinares na
ter qualquer tipo de indício sobre Direção Nacional da PSP, nos con-
alvos concretos ligados a forças poli- selhos superiores do MP e da Magis-
ciais ou “do universo dos tribunais”. O processo tratura e na Entidade Reguladora da
A operação de vigilância com re- já levou tam- Comunicação Social (Ver editorial).
colha de imagens dos jornalistas foi bém à apreen-
iniciada nos últimos meses do man- são de mensa- Como começou a perseguição
dato da procuradora-geral da Repú- gens de jorna- As polémicas ordens da então pro-
blica (PGR), Joana Marques Vidal. E listas da SIC e curadora adjunta da 9ª Secção do
continuou já depois de outubro de da Visão para DIAP de Lisboa foram redigidas a
2018 quando Lucília Gago tomou fontes de infor- 3 de abril de 2018 e uma cópia do
posse no cargo de PGR. Contactadas mação na Polí- documento foi “entregue em mão
por telefone e email, tanto Joana cia Judiciária ao Senhor Intendente”. No despacho
Marques Vidal como Lucília Gago do MP, assinado 24 dias depois da
declararam desconhecer as polémi- abertura do inquérito, então apenas social relacionadas com investiga-
cas diligências tomadas. A atual PGR pelo crime de violação de segredo ções relacionadas, por exemplo, com
limitou-se a lavar as mãos do as- de justiça e que não identificava ain- o juiz Rui Rangel e o Benfica, no-
sunto: “O inquérito com o NUIPC da o oficial de Polícia encarregado meadamente no caso E-Toupeira
2237/18.7T9LSB encontra-se em in- da missão, Andrea Marques não re- que então estava sob investigação e
vestigação e não está sujeito a se- feriu expressamente que os jornalis- cuja acusação até ficou concluída
gredo de justiça, pelo que é passível i tas deviam ser seguidos, fotografa- meses depois, em junho de 2018.
de consulta, sendo que a adequação Henrique dos ou alvo de outras formas de in- Neste processo, o assessor jurídico
Machado, atual
e legalidade dos atos praticados no editor da TVI, trusão na sua vida pessoal e profis- do Benfica, Paulo Gonçalves, e dois
inquérito devem ser suscitadas no foi um dos sional – até porque o tipo de crime funcionários dos tribunais foram
âmbito do mesmo.” jornalistas que estava a investigar, mandatada acusados de dezenas de crimes, en-
visados: “É um
À SÁBADO, o advogado Teixeira ataque sem diretamente pela chefe do DIAP de tre outros, de corrupção, violação de
da Mota declarou-se bastante preo- precedentes à Lisboa, não permitirá sequer este ti- segredo de justiça, segredo de fun-
cupado com a operação policial liberdade de po de devassa. Aliás, a expressão “re- cionário e de acesso indevido.
Imprensa desde
montada aos jornalistas. “Como o que vivemos em latório da vigilância” só foi usada ex- Mesmo sem o assumir logo no
Tribunal Europeu dos Direitos Hu- democracia” plicitamente no processo quando, em processo, a procuradora Andrea
manos tem repetidamente salienta- junho de 2018, a procuradora An- Marques deu realmente carta bran-
do, a proteção legal do segredo das drea Marques recebeu da PSP mais ca à PSP (e esta nunca questionou as
fontes jornalísticas é uma das prin- um dos polémicos relatos policiais. ordens através dos dois altos qua-
cipais garantias da liberdade de ex- No despacho do MP de abril ficou dros da polícia encarregados da in-
pressão e de informação em qual- apenas registado que a titular do in- vestigação e que lideravam os de-
quer país. Se as autoridades procu- quérito indicou a morada profissio- partamentos daquela polícia a quem
ram esvaziar de conteúdo essa ga- nal (a sede da Cofina) dos dois jorna- coube a tarefa) que permitia que os
rantia, através de vigilâncias poli- listas e que especificou à PSP que jornalistas fossem seguidos desde
ciais a jornalistas, violam não só fizesse as “diligências necessárias que saíam das suas casas, com a
a lei, como praticam atos pró- a alcançar tal desiderato”. Ou PSP a fotografar e a anotar tudo o
prios de um Estado autoritário.” seja, o objetivo era encontrar os que quis (ou conseguiu) dos encon-
Uma opinião partilhada pela autores das alegadas fugas de tros e contactos pessoais e profissio-
presidente do Sindicato de Jor- informação para a comunicação nais destes profissionais. A devassa

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lenta – para tentar devassar as iden-


tidades de fontes de informação de
jornalistas. Tanto Carlos Rodrigues
Lima como Henrique Machado fo-
ram nas últimas semanas constituí-
dos arguidos no processo 2237/18
(como é habitual acontecer em to-
dos os inquéritos por alegada viola-
ção de segredo de justiça), mas não
foram confrontados com as opera-
ções de vigilância. Aliás, a procura-
dora Andrea Marques nem sequer
questionou Carlos Lima sobre outra
atitude que tomou no processo: a
devassa de todas as contas bancá-
rias do jornalista, que ordenou em
setembro do ano passado, cerca de
um ano após o fim das operações da
PSP de vigilância aos jornalistas.
No despacho a procuradora usou
uma norma genérica do Regime
Geral das Instituições de Crédito e
Sociedades Financeiras (RGICSF),
artigo 79º, que prevê uma exceção
ao segredo bancário quando solici-
tado por “autoridade judiciária no
âmbito de um processo penal”,
para pedir ao Banco de Portugal
uma listagem de “todas as contas
bancárias e produtos financeiros”
foi de tal ordem que os agentes en- g de que o jornalista fosse titular
Joana Marques
Queriam escutas cobertos da polícia montaram até
Vidal (à esquer-
para, em seguida, solicitar às enti-
duas vigilâncias exteriores à sede da da) e Lucília dades bancárias “a identificação de
Propostas do MP para Cofina, uma das maiores empresas Gago garantiram todos os titulares das contas ban-
devassar fontes já existiram de comunicação social portuguesas à SÁBADO que cárias sinalizadas, fichas de assina-
não sabiam
Foi nos primeiros anos de e dona da SÁBADO, CM, CMTV, Jor- da devassa tura e extratos bancários” entre
Joana Marques Vidal à frente da nal de Negócios e Record. das fontes feita dezembro de 2017 e julho de 2018.
PGR que a magistrada manda- Numa dessas operações fotogra- pelo MP A iniciativa não seria à partida ile-
tou o procurador João Rato (é di- faram não só a saída para almoçar gal, “mas acaba por sê-lo por claro
retor do DIAP Regional do Porto do subdiretor da SÁBADO, mas excesso de meios, já que a natureza
desde 2019) para fazer uma au- também quem o acompanhava: o do ilícito indiciário e os factos não
ditoria às alegadas violações do diretor-adjunto António José Vilela, justificavam, nem remotamente, a
segredo de justiça de 2011/12. o chefe de redação Nuno Tiago diligência ordenada”, afirma à SÁ-
Rato fez então um relatório que Pinto e o editor executivo Carlos BADO o advogado Carlos Cruz. O
na prática propunha mudanças Torres. As fotos foram incluídas no especialista em processos que visam
legais para permitir medidas processo, ainda que só o diretor a comunicação social alerta que o
como escutas telefónica, bus- adjunto tenha sido identificado comportamento da magistrada do
cas nas redações, a suspensão pelo nome pela PSP no relatório – MP poderá ter violado a legislação
da atividade de jornalistas e mul- os outros dois jornalistas foram sobre proteção de fontes e sigilo
tas com muitos dígitos. Nada dis- descritos fisicamente. profissional, os direitos à intimidade,
so avançou, tendo a então minis- DEPOIS DAS imagem, reserva da vida privada e
tra da Justiça, Paula Teixeira da Ataque às contas bancárias VIGILÂNCIAS ainda o próprio estatuto do MP na
Cruz, manifestado publicamente Esta foi a primeira vez que o Minis- A PROCURA- questão do abuso de poder. Contac-
a oposição a um regime que tério Público usou este tipo de expe- DORA tada pela SÁBADO, Andrea Marques
devassava o segredo das fontes dientes intrusivos alegadamente ile- MANDOU não atendeu o telemóvel ou respon-
da comunicação social. gais – e apropriados a investigações QUEBRAR O deu às perguntas que deixámos gra-
relacionadas com crimes de tráfico SIGILO BAN- vadas no respetivo voice mail, so-
de droga e criminalidade económi- CÁRIO DO bretudo à questão porque decidiu
co-financeira ou especialmente vio- JORNALISTA mandar ou pactuar com vigilân- Q

37
Destaque

Q cias a jornalistas para lhes identi-


ficar as fontes. Quem é a procuradora que manda vigiar jornalistas?
Porque foi isso mesmo que Investigou o caso que deu origem às fugas de informação
aconteceu. Segundo os documen-
tos do processo a que a SÁBADO Foi aos 29 anos que Andrea Cristina aos desafios dos novos (e antigos) fenó-
acedeu, a tentativa de devassa das Silvestre Marques iniciou a carreira no Mi- menos criminais”. Por fim, prometeu colo-
fontes de informação de Carlos nistério Público, como procuradora-adjun- car todo o “empenho pessoal e profissio-
Rodrigues Lima começou bem ta em regime de estágio na comarca de nal” na secção.
cedo a 27 de abril de 2018. E o re- Setúbal, a 15 de setembro de 2006; dois Vista como “a protegida” da diretora do
latório da PSP é muito pormenori- anos depois de ter ingressado no Centro DIAP de Lisboa, Fernanda Pêgo, com
zado sobre o grau de vigilância a de Estudos Judiciários e de ter experi- quem almoça amiúde e despacha infor-
que foi sujeito o jornalista, confor- mentado a advocacia. Após alguns anos malmente os processos, Andrea Marques
me fica demonstrado pela “fita do pelas comarcas de Alcácer do Sal e da chegou a incompatibilizar-se com a ante-
tempo” do documento policial. Moita, em abril de 2009 assentou no rior procuradora que dirigiu a 9.ª secção
7h30 – a PSP faz deslocar o “dis- Departamento de Investigação e Ação até quase ao fim de 2018, Auristela Pereira.
positivo de vigilância” para a mora- Penal de Lisboa (DIAP), onde se mantém À SÁBADO a hoje inspetora do MP não
da do jornalista em Rio de Mouro, até hoje. quis falar sobre estas questões, mas garan-
no concelho de Sintra, “com o intui- Descrita por colegas como “ambiciosa tiu que desconhecia que, quando dirigiu
to de localizar o Carlos Lima, bem e conflituosa”, Andrea Marques, casada, Andrea Marques e outros nove procura-
como a viatura que lhe está associa- 43 anos, chegaria, em setembro de 2012, dores da secção, tenham sido ordenadas
da”, um VW Golf cujo contrato de à antiga 9.ª secção do DIAP, especializada pelo MP operações de seguimentos a jor-
aluguer de longa duração estava na investigação aos crimes económico-fi- nalistas para lhes identificar as fontes.
apenas em nome da Cofina. nanceiros, ainda liderada pela procurado- “Nem sei se isso é legal”, desabafou.
7h35 – “Localiza-se a viatura de ra Teresa Almeida, atualmente no Tribu- No processo em causa consta que, de-
matrícula 67-PR-39 estacionada nal de Contas. Nos últimos anos, pois de Andrea Marques ter recebi-
junto ao passeio (…) perto do acesso foi a titular de processos do diretamente por despacho
pedonal” à rua e ao número da por- como o “caso dos emails”, a investigação do processo
ta onde o jornalista então residia que entretanto foi evo- pela diretora do DIAP de
com a mulher e os filhos. cado pelo Departa- Lisboa, a procuradora
A equipa de vigilância policial, mento Central de In- aceitou-o dizendo que
que utilizou nesse dia vários ele- vestigação e Ação Pe- não se sentia sequer
mentos e pelo menos um carro nal, e da Operação constrangida por já ter
descaracterizado, pertencia ao Nú- Tutti-Fruti, processo participado no proces-
cleo de Apoio Operacional da PSP, aberto em 2016 so- so E-Toupeira e passar
um departamento sigiloso daquela bre suspeitas de tráfi- a investigar as alega-
polícia que tem há largos anos pe- co de influências e cor- das fugas de informa-
quenas equipas espalhadas pelos rupção em várias juntas ção deste. A informação e
comandos regionais, estando a de freguesia de Lisboa, g o processo seguiram para a
maior parte dos efetivos sediada na mas que até hoje não teve Andrea chefe direta, Auristela Pereira,
Quinta das Águas Livres, em Belas, qualquer decisão. Marques que concordou com a manu-
também no concelho de Sintra. São Quando, em 2018, o DIAP já apresentou vários livros tenção da procuradora e des-
da tia, Ana Silvestre, que
estes homens-sombra da PSP, inte- de Lisboa passou a DIAP re- chegou a trabalhar no jornal tacou-lhe até “o zelo que evi-
grados desde 2017 na Divisão de gional e a 9.ª secção desi- O Independente e é autora dencia” na análise da ques-
Investigação Criminal e Coopera- gnou-se 1.ª secção, a procu- de títulos como Segunda- tão ética. Nessa altura, Auriste-
ção Internacional (DICCI) que exe- radora teve de apresentar -feira, Sinto-te e la só não terá sabido que a
cutam as vigilâncias a alvos suspei- uma candidatura. Na carta de Apaixona-me procuradora mandara a PSP se-
tos de crimes violentos sobretudo motivação, a que a SÁBADO teve guir e fotografar jornalistas para
relacionados com assaltos ou tráfi- acesso, referiu ter tido a seu cargo “in- lhes descobrir as fontes de informação.
co de droga. quéritos complexos e volumosos, em Porque isso não constava diretamente no
Nestas missões as equipas da PSP áreas como a contratação pública, admi- processo e Auristela só terá tido acesso
estão habituadas a colocarem loca- nistração central, mercado de valores mo- uma vez ao inquérito, a 27 de abril de
lizadores e microfones, por exem- biliários” e corrupção desportiva. A procu- 2018. No fim do ano, cansada das guerras
plo, nos carros dos suspeitos, fazem radora acrescentou que a recém-criada 1.ª no DIAP de Lisboa com Andrea Marques e
acompanhamentos com filmagens e secção procurava “um lugar próprio no com a própria diretora Fernanda Pêgo,
fotografia, usam aparelhos de escuta combate ao crime económico-financeiro”, saiu para uma comissão de serviço de três
ambiental e há suspeitas de que po- num modelo que pretendia dar “resposta anos como inspetora do MP.
derão fazer localizações e intrusões
em telemóveis, conforme confiden-
ciou à SÁBADO uma fonte da PSP

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Lima a contactar” com uma mulher


com “cerca de 35 anos de idade,
caucasiana, de estatura baixa e
compleição média, cabelo liso e de
cor castanha, junto à porta lateral do
Edifício B do Campus de Justiça, em
Lisboa. Cumprimentam-se com dois
que já passou pelo departamento. jg beijos na face e dirigem-se ambos
No caso da tentativa de identifica- Nos relatórios de para o edifício (…)”
vigilância da PSP
ção de fontes do jornalista Carlos constam dezenas Aquele facto causou tal suspeita
Lima, os agentes usaram pelo me- de fotos com aos seguidores da PSP que o volta-
nos dois meios especialmente intru- jornalistas tira- ram a referir mais adiante no relató-
das à distância
sivos, o seguimento contínuo e a fil- rio, porventura para um posterior
magem/fotografia, tendo isso ficado apuramento do que estaria em cau-
registado no relatório de vigilância sa com aquele misterioso contacto à
que depois foi entregue ao Ministé- porta de um tribunal: “Importa rele-
rio Público e que não terá sido logo var o momento das 10h17 do dia 27
levado ao conhecimento de Marga- de abril de 2018, quando o Carlos
rida Gaspar, 56 anos, juíza desde se- Lima, na companhia de um INIF que
tembro de 1991 e a titular do proces- o aguardava, junto à entrada do edi-
so no Juízo de Instrução Criminal de fício.” Depois, os agentes anotaram
Lisboa. que o subdiretor da SÁBADO esteve
No entanto, a juíza teve contacto no interior do edifício do Campus da
com o processo várias vezes (por Justiça “durante 49 minutos”.
exemplo a 6 de junho), e com o No processo-crime não está ofi-
Apenso 1 onde se encontra o pri- cialmente especificado se os perse-
meiro relatório de vigilância do jor- guidores de jornalistas (PSP e MP)
nalista Carlos Lima, e nunca levan- chegaram a esclarecer a suspeita
tou qualquer objeção ao documen- que pareciam ter. Mas uma pesqui-
to. A SÁBADO não conseguiu con- sa posterior muito simples, como a
tactar a magistrada judicial e das vá- SÁBADO fez com o recurso a docu-
rias perguntas que dirigiu ao presi- mentos judiciais públicos, permitiria
dente do Conselho Superior da Ma- guns minutos em pé junto ao balcão, g também uma explicação simples: o
gistratura (CSM) recebeu apenas antes de voltar a sair, entrar no carro As buscas ao jornalista esteve naquele tribunal,
Benfica no E-
uma resposta lacónica: “O CSM, en- e arrancar em direção a Lisboa. -Toupeira foi um tendo-se encontrado à porta com a
quanto órgão de gestão e disciplina Pormenorizadamente, a equipa dos casos com advogada Inês Oliveira Silva, da
dos juízes, nunca se pronuncia sobre policial fez a descrição de todas as que o MP justifi- CCA Advogados (a enigmática INIF
cou a vigilância
questões jurisdicionais relacionadas ruas, avenidas e troços de itinerários aos jornalistas para a PSP), porque fora convocado
com processos pendentes.” complementares e autoestradas para testemunhar num processo em
percorridas pelo carro do jornalista que outros jornalistas eram suspei-
Seguidos e fotografados até estacionar, pouco depois das tos de violação de segredo de justi-
As primeiras fotos que constam no 10h da manhã, junto ao Campus de ça. Precisamente um caso que re-
relatório de abril de 2018 são do Justiça, no Parque das Nações, em sultou de uma acusação feita dois
carro do jornalista usado por Carlos Lisboa. Até o pagamento do estacio- anos antes da vigilância, em 2016,
Rodrigues Lima já em movimento, namento, a colocação do respetivo pela mesma procuradora Andrea
depois de a equipa de vigilância ticket no carro e a entrada em mais Marques. Uma acusação que visou
aguardar quase duas horas “num lo- um café na zona foram anotados no apenas jornalistas do grupo Cofina,
cal estratégico”, junto à residência relatório e fotografados pela PSP. No nomeadamente 11 repórteres e
do jornalista. documento também constam fotos membros da direção da SÁBADO
9h22 – “Visualiza-se o Carlos do jornalista a caminhar no passeio, A PROCURA- (inclusive os três jornalistas que as-
Lima a sair do prédio (…) com uma na estrada e a entrar no edifício do DORA sinam este artigo), do Correio da
mochila ao ombro, percorre o túnel Juízo Local Criminal de Lisboa. Nas ANDREA Manhã e da CMTV.
(…), dirige-se à viatura (…), abre a ba- imagens, foram acrescentadas setas MARQUES JÁ O processo acusado por Andrea
gageira e coloca a mochila no inte- vermelhas contornadas a preto a ACUSOU 11 Marques foi um dos dois inquéritos
rior. De seguida, atravessa a rua e apontar para o alvo, com a equipa JORNALIS- por alegada violação do segredo de
entra no estabelecimento de restau- de vigilância a registar um encontro TAS. ERAM justiça que decorreram praticamen-
ração”, com o relatório a identificar do jornalista com “um INIF”, um In- TODOS DA te em simultâneo e que visaram um
o nome do café, o seu local exato e a divíduo Não Identificado Feminino. EMPRESA total de quase 30 jornalistas, de to-
registar que o alvo esteve apenas al- 10h17 – “Visualiza-se o Carlos COFINA dos os órgãos de informação de Q

39
Destaque

Q âmbito nacional, que publicaram


largas dezenas de notícias sobre o
caso dos vistos gold, que envolveu
membros do Governo e organismos
do Estado como o SEF e os Registos
e Notariado. No entanto, estes dois
inquéritos tiveram caminhos dife-
rentes. A procuradora coordenadora
da então 10ª Secção do DIAP, Jose-
fina Fernandes, arquivou rapida-
mente um dos processos concluindo
que “os jornalistas subscritores das
notícias em causa [13 chegaram a
ser constituídos arguidos, como An-
tónio José Vilela e os dois jornalistas
agora espiados pelo MP, Henrique
Machado e Carlos Rodrigues Lima,
que exercia então funções no Diário
de Notícias] não deram ilegitima- constantes no relatório policial a g papel que levava na mão”.
mente conhecimento dos factos sob deslocação de Carlos Rodrigues A SÁBADO vai Na entrada do DCIAP, como acon-
fazer uma parti-
investigação, tendo, ao invés, agido Lima à sede do Departamento Cen- cipação formal tece em qualquer tribunal ou edifí-
ao abrigo do direito de informar”, tral de Investigação e Ação Penal ao órgão que cio da justiça portuguesa, há segu-
conforme refere o auto de arquiva- (DCIAP), um órgão especializado na tutela os juízes ranças que identificam e registam
sobre a interven-
mento de 9 de novembro de 2016. criminalidade mais complexa que ção de Margarida num pequeno formulário em papel
Já a então procuradora-adjunta fica na Rua Gomes Freire, em Lis- Gaspar (no DCIAP esse documento é entre-
Andrea Marques, a quem foi distri- boa, mesmo em frente à sede nacio- gue e deve ser depois assinado no
buído o outro processo na então 9ª nal da PJ. É no DCIAP, que advoga- destino com a hora de abandono
Secção do mesmo DIAP de Lisboa, dos e jornalistas consultam oficial- das instalações), onde consta o an-
deixou de fora jornalistas de outros mente processos que não estão em dar e o local onde se deve dirigir o
órgãos de informação, que chega- segredo de justiça, mesmo que visitante ou outros intervenientes
ram a ser constituídos arguidos, e alguns deles ainda estejam em nos processos. Para os jornalistas,
acusou a 2 de setembro de 2016 os investigação. e são muitos os que passam por lá
11 jornalistas da Cofina. em trabalho, o destino é sempre a
O julgamento só acabaria por Os carros dos magistrados secretaria de processos, que encer-
começar quase dois anos depois. 13h08 – “O Carlos Lima efetua/re- TODOS OS ra uma hora para almoço, entre
Precisamente a 27 de abril de 2018, cebe uma chamada telefónica, CONTACTOS as 12h30 e as 13h30. Foi já com o
quando a PSP vigiou Carlos Rodri- enquanto olha para o edifício por DO JORNA- jornalista fotografado à porta do
gues Lima a entrar no Edifício B do diversas ocasiões”. Oito minutos LISTA DCIAP que os agentes da PSP volta-
Campus de Justiça. Menos de dois depois, “o Carlos Lima entra nas CARLOS ram a anotar uma nova informação
meses depois, em junho, quando instalações do DCIAP, saindo RODRIGUES no relatório.
ainda decorria a tentativa de devas- imediatamente a observar um LIMA FORAM 13h21 – Acabara de ser detetado
sa das fontes de Lima e Machado, a ANOTADOS um “INI”, referindo-se a PSP a um
juíza Sofia Claudino absolveu todos PELA PSP Indivíduo Não Identificado “com
os jornalistas acusados por Andrea cerca de 55 anos, caucasiano, de es-
Marques, citando na sentença o juiz tatura baixa e compleição média,
conselheiro Maia Gonçalves, faleci- cabelo curto, grisalho”, que usava
do em 2010, um dos mais importan- “barba” e vestia “uma camisola de
tes penalistas portugueses e autor de cor escura e um casaco de cor cas-
uma vasta obra em matéria de Di- tanho-clara”. O sujeito foi fotografa-
reito Penal e Processo Penal. A juíza do a sair do “interior do prédio e a
escreveu que o jornalista “só pode
j cumprimentar o Carlos Lima com
O antigo juiz
ser punido pelo crime de violação conselheiro um aperto de mão”, tendo o contac-
de segredo de justiça quando se de- Santos Cabral já to sido muito breve porque o ho-
monstre que recorreu a meios ilíci- escreveu que o mem se afastou logo “em seguida”.
sigilo profissio-
tos ou fraudulentos para obter a in- nal do jornalista Numa das fotografias juntas ao
formação que veio a divulgar”. não é um privilé- relatório foi colocada mais uma
Ainda a 27 de abril de 2018, a vigi- gio, mas uma seta vermelha a indicar o momento
garantia da
lância da PSP continuou a seguir o sociedade deste aperto de mão. A PSP não
jornalista, sendo uma das anotações democrática identificou o tal INI, mas não seria

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PSP SEGUIU difícil de o fazer à posteriori, sobre-


O que diz a lei? JORNALISTA tudo depois de o relatório ter sido
As decisões de tribunais superiores e do Tribunal Europeu ATÉ ENTRAR apresentado à procuradora adjunta
NO PARQUE Andrea Marques. Afinal, tratava-se
A diligência das vigilâncias a importância do sigilo das fon- DE ESTACIO- do procurador José Ranito, magis-
aos jornalistas ordenada pela tes do jornalista e a proteção le- NAMENTO E trado que integrou a 9ª Secção do
procuradora Andrea Marques gal que estas devem ter. MONTOU DIAP de Lisboa antes de concorrer
não teve qualquer preocupa- OPERAÇÃO para o DCIAP e que ainda hoje é o
ção legal pelo sigilo das fontes Depois do período de À PORTA DA responsável pela equipa de investi-
– constitucionalmente protegi- censura e perseguição do REDAÇÃO gações dos casos BES – uma equi-
do e cuja quebra só pode ser Estado Novo, a liberdade de im- pa de que Andrea Marques chegou
ordenada por um tribunal supe- prensa foi consagrada pelo regi- a fazer parte.
rior (Relação ou Supremo) – ou me democrático pós-25 de Abril. Ainda à porta do DCIAP, os agen-
com o regime legal que regula Atualmente, encontra-se previs- tes da PSP registaram e fotografa-
a recolha de som e imagens de ta no artigo 38.º da Constituição ram outro encontro indicando que
suspeitos num processo penal. da República, cuja alínea b) do se seguira uma breve conversa com
A lei impõe que este tipo de número 2 é clara ao referir o o jornalista. Mais uma vez indicaram
diligência só pode ser utilizado “direito dos jornalistas” ao sigilo um sujeito não identificado “com
em relação a um catálogo de profissional, que está regulado cerca de 40/45 anos de idade, cau-
crimes, que vão do tráfico de no Estatuto do Jornalista. A casiano, estatura alta e compleição
droga ao contrabando, sem quebra deste sigilo nunca média”. Talvez o facto de o indiví-
nunca mencionar o crime de poderá ocorrer através de duo em causa transportar “uma mo-
violação do segredo de justiça. uma vigilância policial, mas chila de médias dimensões de cor
Mais: segundo a lei 5/2002 de só com um incidente de quebra preta e uma máquina fotográfica
11 de janeiro, a própria recolha previsto no Código do Processo com uma objetiva de grande resolu-
de imagens dos suspeitos está Penal. Diz a lei que tal situação ção” tenha chamado a atenção dos
sujeita a autorização e controlo deverá ocorrer num tribunal su- polícias. Tratava-se do repórter fo-
de um juiz de instrução, que perior, onde o jornalista poderá tográfico Tiago Miranda, antigo co-
deve escrutinar de 15 em 15 apresentar argumentos para lega de Lima quando este trabalhou
dias o resultado das diligências, manter o sigilo de fontes. no semanário Expresso.
tal como acontece com as 13h32 – “O INI afasta-se (…) e o
escutas telefónicas. Caso o tribunal superior Carlos Lima entra no edifício do
(Relação ou Supremo) entenda DCIAP.”
“O sigilo profissional do decidir pela quebra do sigilo, o Ainda de acordo com o relatório, a
jornalista é uma garantia institu- jornalista pode requerer ao juiz ida do jornalista ao DCIAP inquietou
cional. Não é um privilégio do de um julgamento, por exem- realmente os perseguidores da PSP.
jornalista, pois o que está verda- plo, para “restringir a livre E depois também a procuradora, que
deiramente no cerne é a liber- assistência do público ou cinco meses depois solicitou ao en-
dade de imprensa em sentido que a prestação do depoimen- tão diretor daquele departamento,
amplo. Consequentemente, o to decorra com exclusão da Amadeu Guerra, uma listagem com
mesmo não se desenha no âm- publicidade, ficando os interve- todas as entradas e saídas do DCIAP
bito de uma relação sinalagmá- nien- tes no ato obrigados ao relativas aquele dia. A listagem foi-
tica, assente na confiança mú- dever de segredo sobre os -lhe entregue até com os registos de
tua e no ónus profissional, mas factos relatados”. carros que estiveram na garagem do
numa relação triangular: fonte, DCIAP. No processo consta agora a
jornalista e sociedade. A prote- Nos últimos anos, o Tribu- identificação das matrículas das via-
ção da fonte, mediante o direito nal Europeu dos Direitos Huma- turas de procuradores que lidam
do jornalista ao sigilo, justifica-se nos (TEDH) tem colocado com casos bastante melindrosos e
pelo interesse público da li- grande ênfase na proteção até perigosos. Por exemplo, a viatura
berdade de informar, ele- da liberdade de imprensa, MATRÍCULAS de Rosário Teixeira, da Operação
mento considerado essencial como pilar de uma sociedade DOS CARROS Marquês, ou de Antero Taveira,
numa sociedade democráti- democrática. Isso mesmo, aliás, DOS PROCU- atualmente com o processo do hi-
ca.” Foi desta forma que, em foi sublinhado pelo juiz conse- RADORES drogénio que visa membros do Go-
2011, o juiz conselheiro Santos lheiro Gregório Silva Jesus, ROSÁRIO verno. Ou de Filomena Rosado, pro-
Cabral descreveu, num acórdão num acórdão de 2014 do Su- TEIXEIRA E curadora da área dos crimes violen-
do Supremo Tribunal de Justiça, premo Tribunal de Justiça. VÍTOR tos e ainda do procurador Vítor Ma-
MAGALHÃES galhães, ex-responsável pelos inqué-
ESTÃO NO ritos do terrorismo islâmico, da ETA
PROCESSO e do caso de Tancos. Q

41
Destaque

Q Durante a vigilância à entrada A PROCURA- Circular, pela Estrada da Luz em di- antes “com a PSP”, tendo-se “intei-
do DCIAP, a PSP lamentou-se no re- DORA reção a Sete Rios e por um desvio rado dos desenvolvimentos da dili-
latório dizendo que não conseguia ESCREVEU até ao destino final, junto ao Estádio gência ordenada”. Presume-se então
monitorizar os “movimentos do QUE SE da Luz – a sede da Cofina. que nem o tipo de operação nem o
Carlos Lima no interior das instala- TINHA REU- Os agentes da PSP anotaram que conteúdo do relatório a tenham sur-
ções”, tendo optado por montar NIDO COM A o carro entrou no “parqueamento preendido quando o recebeu.
“dispositivo de vigilância nas ime- PSP E “INTEI- subterrâneo de acesso restrito a A própria PSP informou-a no do-
diações.” E aguardaram escondidos RADO DOS funcionários/colaboradores da em- cumento que a investigação ainda
até perto das 16 horas, altura em que DESENVOL- presa”. Eram 16h08 e a PSP ainda estava numa “fase embrionária”,
o DCIAP fecha ao público. VIMENTOS” decidiu montar vigilância nas dando a entender que era necessá-
15h44 – “Visualiza-se o Carlos “imediações” da sede onde traba- rio intensificar a vigilância (o que
Lima a sair do interior do edifício do lham largas dezenas de jornalistas. aconteceu por anuência da procura-
DCIAP”, acompanhado de um ho- Se fotografou mais alguém não dora) aos “momentos e locais” que
mem que a equipa de vigilância não consta no relatório, que refere que Carlos Rodrigues Lima “frequen-
identificou, mas que descreveu de ali ficaram 22 minutos. ta/permanece, justificado por moti-
forma pormenorizada: “cerca de 16h30 – “Dá-se por terminada a vos pessoais ou por motivos estrita-
40/50 anos”, também “caucasiano” ação de vigilância.” mente profissionais”. E concluiu que
e com “cabelo curto de cor escura, isso nem seria difícil de fazer porque
que usa óculos de sol, traja calças de Vigiar até a porta da redação a equipa já tinha percebido que o
ganga de cor escura e camisa de cor Antes de receber no fim de maio de jornalista “detém rotinas diárias ti-
preta, transporta no braço direito 2018 “em mão” este documento po- das como normais a um comum ci-
um casaco de cor escura e na mão licial, a procuradora registou no pro- dadão, supostamente com vida fa-
esquerda uma mala de médias di- cesso que tinha reunido alguns dias miliar e com alguma rotina”.
mensões, de cor preta”.
A PSP fotografou-o também e jun- h
tou ao relatório imagens dos dois Lucília Gago
está à frente da
homens a saírem das instalações do Procuradoria-
DCIAP. Desta vez, o visado foi Antó- -Geral da Repú-
nio Sérgio Azenha, grande repórter blica desde o fim
do verão de
do CM. Por coincidência, os dois jor- 2018. O mandato
nalistas autorizados oficialmente é de seis anos
pelo MP a consultar o processo EDP,
um caso muito mediático sobre
eventuais crimes de corrupção que
já em 2018 não se encontrava em
segredo de justiça e que visa, entre
outros, o antigo ministro da Econo-
mia Manuel Pinho e o ex-CEO da
elétrica, António Mexia.
A equipa de vigilância até fotogra-
fou os dois jornalistas a caminha-
rem na Rua Gomes Freire enquanto
se dirigiam para o carro de Carlos
Rodrigues Lima, que estava estacio-
nado nas imediações, na Rua da Es-
cola de Medicina Veterinária. Lima
surge nas fotos com a tradicional
seta vermelha apontada e Azenha
com uma seta verde porque apa-
nhou boleia do colega para a reda-
ção. A PSP anotou no relatório que OPERAÇÃO
os dois homens entraram no carro, DE VIGILÂN-
reiniciando-se a custo a persegui- CIA DA PSP
ção automóvel. Poucos minutos de- FOI SEME-
pois, a PSP registou que tinha loca- LHANTE À
lizado a viatura dos jornalistas na FEITA A
Avenida da República, que seguia SUSPEITOS
em direção ao Campo Grande. O DE TRÁFICO
seguimento prosseguiu pela 2ª DE DROGA

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O documento da PSP teve despa- O CHEFE DAS apreendido 150 engenhos pirotéc-
cho do próprio diretor do Departa- OPERAÇÕES nicos “pertencentes aos adeptos
mento de Investigação Criminal, DE VIGILÂN- dos dois clubes”. Só três anos de-
superintendente José Bastos Leitão. CIA A JORNA- pois, em 2018, é que os emails re-
Nomeado em 2015 para aquele de- LISTAS JÁ velados pelo blogue “mercadode-
partamento especial da PSP depois FOI PORTA- benficapolvo. wordpress.com” re-
de uma comissão de serviço de três -VOZ DO velaram que no auto da PSP desse
anos como oficial de ligação do COMANDO dia ficou registado que 99% dos ar-
Ministério da Administração Inter- DE LISBOA tigos apreendidos eram das claques
na junto da Embaixada de Portugal DA PSP dos encarnados. Também se soube,
em Moçambique, Bastos Leitão é e em exclusivo pela SÁBADO, que
desde junho de 2019 diretor do o diretor de segurança do Benfica
ISCSPI, a escola que anualmente fez questão de agradecer por escri-
forma largas dezenas de oficiais da to à PSP por não dizer toda a ver-
PSP para atuarem no quadro da j dade em público. No entanto, a in-
Constituição portuguesa. O diretor nacional formação real da apreensão foi
da PSP, Magina
A proposta para dirigir o ISCSPI foi da Silva, garantiu passada ao DIAP de Lisboa, que ar-
feita pelo ex-diretor nacional da que a Polícia fez quivou tudo cerca de um mês de-
PSP, Luís Farinha, e aceite pelo atual que o jornalista seguira para as ins- aquilo que o MP pois. Sem fazer praticamente qual-
lhe ordenou no
ministro da Administração Interna talações da SÁBADO e que, quando processo quer diligência no processo – o au-
Eduardo Cabrita. Contactado por te- estava prestes a chegar e a passar tor dos dois trabalhos de investiga-
lefone pela SÁBADO, Barros Leitão junto ao Estádio da luz, “circulou em ção da SÁBADO sobre o tema foi o
remeteu as explicações para a Dire- marcha lenta a contemplar as insta- jornalista Carlos Rodrigues Lima.
ção Nacional da PSP, limitando-se a lações”. E ainda concluiu com um Contactado por telefone pela SÁ-
referir: ”O que posso dizer é que a dado: “Importa salientar que, neste BADO sobre a intervenção que
PSP não faz nada disso sem um momento, decorriam buscas nas teve na tentativa de devassa das
mandato judicial.” Mas fez. Já a DN instalações do Estádio da Luz.” fontes de jornalistas, o subinten-
da PSP respondeu por escrito sa- Rui Costa já foi promovido entre- dente Rui Costa respondeu assim:
lientando que o processo ainda hoje tanto na PSP. É hoje subintendente, “O que foi feito está fundamentado,
está “sob a alçada do Ministério Pú- mas continua, desde 2016, na Divi- mas como deve perceber não vou
blico, não tendo sido delegado na são de Investigação Criminal. An- dizer rigorosamente nada sobre as
PSP” e que executou as ordens do tes, segundo o currículo oficial, foi minhas missões operacionais.”
“despacho da procuradora-adjunta porta-voz do Comando Metropoli- Contactada também por telefone
titular do Inquérito”. Garantiu ainda tano de Lisboa (Cometlis) durante pela SÁBADO, a procuradora-geral
que foram executadas “as diligên- cerca de 2 anos e 4 meses. Foi, de adjunta Fernanda Pêgo garantiu que
cias permitidas pela moldura penal resto, este responsável que divul- já tinha recebido as perguntas en-
dos crimes em investigação”. gou publicamente, em abril de viadas pela revista para a PGR e que
Outro dos responsáveis superiores 2015, após um jogo entre o Benfica iria responder. Declarou também
da PSP, que teve intervenção na e o FC Porto, que a Polícia tinha que a procuradora Andrea Marques,
tentativa de devassa das fontes de que dirigiu diretamente na 9ª Sec-
informação dos dois jornalistas, foi o ção do DIAP e com quem mantém
então comissário Rui Costa. No pro- O processo polémico uma relação de grande proximidade
cesso-crime consta que o então Corrupção seria o crime pessoal e profissional, não tinha
chefe operacional das vigilâncias da que se queria investigar? cometido “qualquer ilegalidade” ao
PSP entregou, “em mão” à procura- mandar vigiar jornalistas. Aos 66
dora Andrea Marques, pelo menos, São na realidade dois in- anos e sendo procuradora-geral
um relatório de filmagem e segui- quéritos agregados. Mas com adjunta (topo da hierarquia do MP)
mentos do subdiretor da SÁBADO. apenas 2 volumes e mais de “ VOCÊS SE- desde 2017, precisamente o ano em
Isso aconteceu a 7 de junho de 2018. 10 anexos onde constam as GUEM-NOS que foi nomeada diretora do DIAP
Foi também o mesmo responsável operações de vigilâncias a jor- (...) E NÓS de Lisboa, Pêgo reagiu assim quan-
policial que assinou a “pesquisa téc- nalistas e os dados bancários. E NÃO PODE- do insistimos se não via nada de er-
nica/informação complementar” nem na capa do processo é dito MOS SEGUIR rado ou ilegal em ser o MP a promo-
que resultou da vigilância de 25 de que estiveram a ser investiga- JORNALIS- ver a devassa de fontes de informa-
junho ao mesmo jornalista. Rui Cos- dos crimes de corrupção, como TAS NA VIA ção com seguimentos a jornalistas.
ta frisou que Carlos Rodrigues Lima parece pelas diligências que a PÚBLICA?!”, “É tudo legal, tudo legal. Vocês se-
saíra de casa às 10h11 da manhã e procuradora mandou fazer. DIZ A PRO- guem-nos e isso é possível. Então,
que se mantivera durante sete mi- CURADORA nós não podemos seguir jornalistas
nutos no interior do carro parado a FERNANDA na via pública?! Não é nas vossas
usar o telemóvel. Escreveu depois PÊGO casas, pois não?!” W

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Destaque www.sabado.pt
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ficheiros, contendo informação com


O alvo classificação de segurança”, nomea-
damente “Segredos de Estado”, dada
do MP a troca de informação com os servi-
é um coordena- ços secretos, “segredo NATO” e “cor-
dor da PJ a respondência secreta, face às diver-
quem o MP sas entidades e parceiros com que a
apanhou a fatu- PJ troca regularmente correspondên-
h ração detalha- cia”. A juíza acabou por ordenar a
Almeida Rodri-
gues, ex-diretor da da do telemó- separação dos conteúdos.
PJ, disse à SÁBA- vel de serviço Insatisfeita com o manancial de in-
DO que ninguém formação recolhida na PJ, a procura-
o chamou a dar
qualquer explica- Declarações dora Andrea Marques partiu, em se-
ção no processo Pedro Fonseca guida, para a recolha da faturação
garantiu que detalhada, novamente, de Almeida
não conhecia Rodrigues, Saudade Nunes e Manuel
INÉDITO. MINISTÉRIO PÚBLICO FEZ OPERAÇÃO DE ARRASTO os jornalistas dos Santos. Depois de o atual diretor

AS OPERAÇÕES
que o MP lhe nacional recusar a entrega voluntá-
indicou ria, alegando motivos da reserva da
vida privada dos titulares dos tele-

DE BUSCAS À PJ
Faturação móveis, assim como a falta de um
detalhada do mandado judicial, a procuradora
telemóvel de contra-alegou: se a faturação deta-
A procuradora apreendeu caixa de mensagens do serviço do lhada estivesse na posse da operado-
antigo diretor da Polícia Judiciária. Depois, pediu coordenador ra, colocava-se a questão do sigilo
a faturação detalhada do seu telemóvel de serviço terá sido depois das telecomunicações, como está na
apanhada em posse do cliente (Polícia Judiciária),

E
busca de tal já não se coloca, perdendo o
m 2019, a procuradora ad- em latim) e as notícias da manhã arrasto aos documento esse direito ao sigilo.
junta Andrea Marques fez daquele dia já mencionavam “E-tou- computadores Luís Neves voltou a recusar a
duas buscas às instalações peira”. Ora, a lógica (implícita) da e emails da PJ entrega. Andrea Marques voltou a
da PJ, sempre acompanha- procuradora é que quem alterou o socorrer-se de Fernanda Pêgo para,
da pela diretora do DIAP de Lisboa, nome terá sido um dos autores da Telemóvel juntas, fazerem mais uma busca às
Fernanda Pêgo. Da primeira vez, foi “fuga de informação”. foi apreendido instalações da Judiciária. Recolheram
à procura de emails: do antigo diretor Saudade Nunes, diretora da UNCC, por ordem as faturações, mas o que está hoje no
nacional, Almeida Rodrigues, da di- explicou ao MP o procedimento nor- do MP processo não são estas faturações
retora da Unidade Nacional de Com- mal na altura: “Os dados para os co- detalhadas apreendidas, mas sim
bate à Corrupção, Saudade Nunes, municados são fornecidos pelo coor- Contactos a de um coordenador da PJ, Pedro
do ex-inspetor, Manuel do Santos. E denador, que depois remete ao cole- com jornalistas Fonseca, que liderou a investigação
ainda apreendeu as caixas de correio ga, Manuel dos Santos, que aprova via WhatsApp de vários processos ligados ao fute-
do secretariado da direção nacional e ou altera e depois reencaminha o foram bol e ao Benfica, como os casos dos
do gabinete de imprensa. Munidas de comunicado para a direção nacional, encontrados emails e o E-toupeira. O MP apreen-
um mandado judicial, sem especifi- para Almeida Rodrigues ou Pedro do por perita deu-lhe o telemóvel de serviço onde
car os crimes em causa, que autori- Carmo para aprovação.” do MP terá depois descoberto vários con-
zou a cópia cega das caixas de cor- Apesar de, além do antigo diretor tactos com jornalistas como Carlos
reio entre 1 de janeiro e 30 de junho nacional, o nome de Pedro do Rodrigues Lima, Isabel Horta (ex-
de 2018, as procuradoras e uma peri- Carmo, ex-diretor-nacional adjunto, -SIC) e Sílvia Caneco (Visão).
ta nomeada acabaram por copiar, a também ter sido referido nos depoi- Contactado pela SÁBADO, o coor-
12 de junho de 2019, a totalidade do mentos, a procuradora Andrea Mar- denador Pedro Fonseca recusou
conteúdo que estava nos emails. ques não o considerou até hoje sus- prestar declarações. Já o ex-diretor
O motivo da operação foi perceber peito. A “pesca de arrasto” na busca à LUÍS NEVES, da PJ, Almeida Rodrigues, que tam-
o caminho que o comunicado da PJ, à margem do autorizado pela juí- DIRETOR DA bém estará a ser investigado por An-
Polícia Judiciária de 6 de março de za de instrução, levou o atual diretor PJ, RECUSOU drea Marques no âmbito de um pro-
2018 sobre a operação E-Toupeira nacional da Judiciária, Luís Neves, a ENTREGAR A cesso relacionado com a nova sede
fez dentro da instituição. Isto porque escrever um ofício à juíza de instru- FATURAÇÃO da Judiciária, declarou: “Garanto que
vários inspetores da PJ ouvidos como ção alertando-a para o sucedido e DETALHADA estou a saber disso pela primeira vez.
testemunhas no processo afirmaram para o facto de “com elevada proba- DOS Nunca fui chamado a dar qualquer
que, quando saíram para as buscas, a bilidade, nas caixas de correio TELEMÓVEIS explicação nesse ou em qualquer
operação chama-se “Áquila” (águia apreendidas poderem estar gravados DE SERVIÇO outro processo”. W

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Opinião 14 JANEIRO 2021
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INSTANTÂNEOS
(OU QUASE)
c c c
Loucuras Jornal Você decide
A Comissão Nacional O Diário de Notícias em Sinceramente, não sei
de Eleições começou papel não é um jornal o que é mais parvo:
por pedir às juntas de a sério, não é mesmo. apontar o dedo a três
freguesia para levar Peguem nele, conspiradores contra
os idosos dos lares a comparem-no com o o País, como António
votarem. Como se Público, o Correio da Costa fez,
não existisse uma Manhã e o Jornal de ou dizer que se está
pandemia e os Notícias e confirmem o pronto para
velhotes já não que acabei de escrever. acompanhar uma
tivessem sido Para mim, é uma queixa-crime contra
aconselhados a não amostra de jornal. Costa. Como Rui
saírem no Natal. Uma amostra. Rio fez.

c c c
Ai, Pedro A resposta é... Bom ou mau
O líder parlamentar Porque é que fechar Os debates
do BE anda muito supermercados presidenciais foram
preocupado com as e restaurantes às objeto de muitas
empresas donas das 13 horas reduz a críticas de analistas
redes sociais e diz que pandemia? Já muitos disto e daquilo. Que
não aceita capatazes se questionaram sobre não serviram para
e que o povo é quem isto. Quem consegue nada, disseram alguns.
mais ordena. Um aviso: responder? E de forma Mas foram vistos por
Pedro, é o povo que a não nos tratar a todos muitos milhões de
está nas redes sociais. como tontinhos. pessoas. Pois.

c c c
Tens canudo? Camaradas Liberdade
Há quem ache que sem Confesso que cada Quando uma
isto não há mundo. vez me divirto mais a procuradora manda
Mas pior é quando o ver as análises dos fazer relatórios de
Instituto do Emprego meus camaradas vigilâncias a jornalistas
cá da terra exige jornalistas aos por exercerem as suas
licenciatura para dar debates de funções isso é
formação de estética, presidenciáveis na TV. intolerável. Que a
cozinha, costura, Em que mundo vivem procuradora-geral não
floricultura e é o que me pergunto. o diga publicamente
reparação de veículos. também o é.

O
Diretor-adjunto
António José Vilela

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21
Portugal
PRESIDENCIAIS

ONDE
ESTAVA
AOS...

...ANOS
Ana
Gomes
Aos 21 já tinha vivido quase uma vida
inteira, de militante antirregime e
revolucionária, tinha casado e tido uma
filha. Deixou o MRPP aos 21 e perdeu
quase todos os amigos. Por Bruno Faria Lopes

Militante, mãe,
revolucionária e
ex-revolucionária
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A hoje candidata presidencial Ana


Gomes fez 21 anos em 1975 e viveu o
calor político desse tempo por dentro.
Tinha traquejo. No liceu de São João
do Estoril estivera ligada ao Movimen-
to Associativo dos Estudantes do Ensi-
no Secundário de Lisboa, que contes-
tava o regime. Chegou à faculdade de-
pois de umas férias na Alemanha e de
uma viagem com o namorado pela
Europa – uma conquista pouco co-
mum para a época, que ficou a dever
ao liberalismo do pai, “socialista ferre-
nho” que lhe incutiu o gosto pela polí-
tica. Fora para Direito a pensar idea-
listicamente no advogado-herói Perry
Mason que via na popular série de te-
levisão, conta no livro Ana Gomes,
Uma Visão do Mundo, do jornalista
João Pedro Henriques. Converteu o
idealismo em militância contra o regi-
me. “Entrei em novembro de 1972
para a faculdade e logo em dezembro
liguei-me às listas do ‘Ousar Lutar,
Ousar Vencer’”, diz à SÁBADO. O
nome da lista era de uma tirada do di-
tador chinês Mao Tsé-Tung.
Naqueles anos a Faculdade de Di-
reito era um lugar perigoso para
quem se assumisse contra o regi- Q

C
om 21 anos, Ana Gomes já g
fora arrastada pelos corre- Ana Gomes, 22
anos, e o primeiro
dores da Faculdade de Di- marido, António
reito de Lisboa, aos gritos, Monteiro Cardo-
por “gorilas”; já fizera parte dos clan- so, com a filha
Joana, em 1976
destinos Comités de Luta Anti-Colo-
nial e pichado muros em Lisboa com
“Abaixo a guerra colonial”; já tinha
sido detida pela polícia e comera as FOI DETIDA
folhas de uma agenda para não À PORTA DA
revelar contactos; já fora suspensa do FACULDADE
curso de Direito por causa da mili- E COMEU
tância política; já casara com um es- AS FOLHAS
tudante com quem partilhava essa DA AGENDA
militância; já servira num restaurante PARA NÃO
à hora do jantar e trabalhara numa REVELAR OS
empresa de congelados; já se tinha CONTACTOS
deitado no chão para se proteger de
uma rajada de metralhadora no iní-
cio de uma revolução; já pertencera
à direção da faculdade e contratara h
professores; já tinha sido atirada para Aos 21, em 1975,
com o MRPP na
o chão, grávida, do alto de um ca- lapela. A militân-
mião; já fora mãe; já sentira a culpa cia tensa treinou
de quem deixara passar a militância um “espírito de
sacrifício pessoal”
à frente da filha; já tomara a decisão que vê como um
que a deixou sem amigos. bom legado

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Q me. Ana Gomes entrou um mês “Desempreguei-me para fazer aquilo


depois do assassinato a tiro, pela a tempo inteiro. Ficámos a sopas dos
PIDE, do estudante José Ribeiro dos pais e o meu marido já ganhava al-
Santos. No mesmo ano, 1972, es- gum dinheiro como advogado”, con-
trearam-se os “gorilas”, um corpo ta. Não se opôs à expulsão de profes-
de vigilantes criado pelo regime sores promovida pelo jovem em as-
para intimidar a oposição estudan- censão no partido, José Manuel Du-
til. “Precisávamos de ter coragem rão Barroso, mas teve de reparar os
moral e coragem física, tínhamos de danos. Fora eleita para a direção da
estar prontos para apanhar”, relem- faculdade: contratou professores e
bra Teresa Serra, hoje advogada na dedicou-se a funções burocráticas.
Sérvulo & Associados, que a conhe- O ambiente no MRPP era tenso e
ceu nessa altura. Com ela partilhou persecutório. Barroso, conta, era um
o ativismo nos movimentos estu- dos que a acusava de ser “mais bur-
dantis que depois do 25 de Abril se- guesa e burocrata do que revolucio-
riam o MRPP. “A Ana Gomes tinha nária”. Teve de fazer autocrítica à
essa coragem”, diz. maoista, em frente aos outros. O con-
Fora da faculdade estavam tam- beu quando conseguiu vislumbrar, g flito dentro da esquerda radical não
bém as paredes que a ativista dos um dia, a amiga lá fora. Aos 28 anos, em ajudava: já estava grávida quando foi
1982, já no Minis-
Comités de Luta Anti-Colonial picha- tério dos Negó- atirada de um camião num ataque do
va com frases contra a guerra. Teresa A febre do MRPP e a rutura cios Estrangei- Movimento da Juventude Trabalha-
Serra relembra quando em novem- Quando foi detida em 73, já Ana Go- ros. Formara-se dora, ligado ao PCP.
em Direito com
bro de 1973 foi detida com Ana Go- mes namorava com António Montei- média de 15 Foi mãe aos 21. A filha Joana nasceu
mes e um amigo, “com um lança- ro Cardoso, do mesmo núcleo de mi- em agosto de 75 e, em setembro, Ana
-granadas apontado à barriga”. Fo- litância. Iam entregar os papéis do Gomes estava de volta à faculdade.
ram libertadas no dia seguinte, não casamento a 25 de Abril de 1974, mas Teresa Serra lembra-se de pensar
sem antes Ana Gomes comer as fo- o dia revelou ter outros planos. Casa- como é que a amiga fazia tudo. “Tive
lhas de uma agenda que levava con- ram um mês depois, sem fotos, que uma estrutura familiar maravilhosa: a
sigo, para proteger os contactos. A consideravam um “tique burguês”. minha sogra, a minha cunhada e a
procuradora jubilada Aurora Rodri- “Casámos para termos liberdade de empregada que já tinha criado o meu
gues lembra à SÁBADO o “sangue fazer estas coisas [a política] e para marido e era maravilhosa, a Celeste”,
frio” da amiga quando, depois de ser isso a liberdade económica era fun- diz Ana Gomes.
arrastada aos gritos na faculdade pe- damental”, nota. Com o marido na A rotina dos seus dias aos 21 anos
los gorilas, voltou atrás para apanhar, tropa, continuou a trabalhar “porque TEVE A FILHA eram assim: saía com “Toné” de ma-
um a um, os botões arrancados ao precisava de manter a casa”. EM AGOSTO nhã da casa em Oeiras, numa Citröen
casaco. Quando Aurora foi presa em Largaria o trabalho de secretária E VOLTOU À Diane amarela comprada a presta-
Caxias, Ana Gomes acompanhou numa empresa de congelados – falar REVOLUÇÃO ções, passavam em casa dos pais
sempre a mãe da amiga, que vinha línguas deu-lhe jeito a vida inteira – EM SETEM- dele para deixar a filha e passavam
do Alentejo para as visitas – a mãe quando Garcia Pereira e outros BRO. MAS depois das nove da noite a ir buscá-
mandava-lhe as saudades da “prima MRPPs insistiram que voltasse à fa- LARGOU -la. Quando Joana ficou doente aos 6
Aninhas”, um código que só perce- culdade que disputavam com o PCP. TUDO QUAN- meses com pneumonia, a mãe rea-
DO A FILHA valiou tudo. Deixou o MRPP, de onde
FICOU tirou “uma ética de sacrifício pessoal
DOENTE e exigência”, mas que castigava com
uma “cultura totalitária”. António, de
quem se separaria três anos depois –
e de quem ficou amiga até à morte
deste em 2016 – ficou mais tempo.
“Sair foi das decisões mais corajosas
da minha vida: era romper com o
meu mundo, eram aqueles os meus
j amigos”, afirma. Não tinha sido jovem
Falar bem línguas de comprar roupa (era a mãe que lhe
deu jeito aos 21 ia “dando umas coisas”), de ir ao cine-
e mais tarde: em
1983 entrou ma, de lazer. Teve de refundar a vida
como assessora pessoal. Com 22 anos lembra-se de se
diplomática para sentir a transgredir, sem culpa bur-
a equipa do
Presidente guesa, quando começou a comprar
Ramalho Eanes roupa para si. “Soube-me bem.” W

48
21
Portugal PRESIDENCIAIS

ONDE
ESTAVA

E
AOS... m 2004, André Ventura era ANDRÉ VEN-
um universitário “sonha- TURA TINHA
dor” da Universidade Nova UMA RIVALI-
de Lisboa. Pelo menos, é DADE COM O
assim que se caracteriza num traba- COLEGA
lho intitulado Integralismo Lusitano: GONÇALO
Subsídios para uma teoria política. ALMEIDA RI-
O movimento, monárquico, de di- BEIRO, HOJE
reita radical e contornos fascistas, JUIZ CONSE-
...ANOS definia-se como nacional-sindica-
lista e a sua imagem eram os “cami-
LHEIRO

sas azuis”. “Somos a mesma geração

André
de sonhadores, agora com outros
horizontes, mas com a mesma força
e o mesmo vigor com que outrora os i

Ventura
nossos colegas ergueram, não sem Ventura admite
que “ficou muita
incómodo suor, a bandeira integra- coisa por viver”
lista”, escreveu então, sobre aquela na faculdade, mas
que considera uma “geração fantás- fez amigos.
Corava a cada palavrão e não tinha vida social. tica”. Se em 2021, André Ventura é Vários recusam
agora falar
Era contra a flat tax e aprovava a um extrovertido líder partidário de sobre ele
despenalização do aborto e da eutanásia.
Mas já simpatizava com os camisas azuis do
integralismo lusitano. Por Alexandre R. Malhado

Beato,
tímido e
progressista

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extrema-direita que se fez candida-


to a Belém, em 2004 era um tímido
universitário no curso de Direito,
que debatia com os colegas a im-
portância da social-democracia, ca-
tolicismo e… até da despenalização
do aborto.
Grandes debates aconteciam “na
palheta do bar” da faculdade, lembra
à SÁBADO Jorge Castela, colega de
André Ventura e um dos fundadores
e ideólogos do Chega, que entretanto
abandonou. “Ele achava que a so-
cial-democracia tinha resposta para
a desigualdade fiscal. Ao contrário
do que o Chega defende hoje em dia,
lembro-me de ele não concordar
na altura com a flat tax [taxa única
de IRS].” Estes convívios juntavam
Castela, Ventura, Gonçalo Almeida
Ribeiro, atual juiz conselheiro do

Tribunal Constitucional, e Luís Bar- g vezes isolado), e só quando começou


roso, filho do ex-primeiro-ministro Era na residência a ter confiança em nós é que passou
da igreja de São
Durão Barroso. Nicolau que pas- a conviver connosco.” Ventura con-
“Tínhamos conversas muito inte- sava mais tempo. firma: “Não tinha grande vida social.
ressantes. Lembro-me de ter posi- Aqui está com o Como aluno era empenhado e en-
seu colega de
ções diferentes das do Gonçalo”, casa (e hoje de tregue ao estudo, e ficou muita coisa
recorda Ventura à SÁBADO, admi- partido) Luc por viver. Ainda hoje lamento e re-
tindo que havia uma “rivalidade Mombito conheço: não vivi a universidade
saudável, nada selvática”, com o como os outros estudantes.”
atual juiz. “Éramos bastante bons
alunos e queríamos ter as melhores Copos só no pub
notas possível. Eu reconhecia que Quando não estava na faculdade, es-
ele era bom e isso dava-me força tava em São Nicolau. Era ali, na resi-
para fazer mais. Éramos alunos di- dência para estudantes, sobretudo
ferentes: eu era mais legalista, tinha da Lusofonia, da paróquia de São
mais sucessos em casos concretos Nicolau, onde vivia, que passava
e processos, e ele era melhor em “ERA TÍMIDO, também a maior parte do seu tempo.
disciplinas abstratas.” Almeida Ri- MUITO FE- “Foi lá que socializei mais e aprofun-
beiro não quis comentar: “Não creio CHADO, ÀS dei a vida religiosa”, recorda Ventu-
ter nada de significativo a dizer so- VEZES ISO- ra. “Éramos sete ou oito residentes
bre o assunto.” LADO”, CON- oriundos de todas as partes do mun-
Durante essas conversas, Castela TA O COLEGA do, desde Portugal ao Congo, pas-
lembra com humor como André E TAMBÉM sando por angolanos e cabo-verdia-
Ventura “corava a cada palavrão”. EX-MEMBRO nos, de extratos sociais diferentes.
“Olhas para o André de hoje e ele na DO CHEGA Convivíamos muito uns com os ou-
altura parecia diferente: na faculda- JORGE tros nas rotinas normais de casa e o
de era tímido, muito fechado (e às CASTELA André era sempre muito brinca- Q

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ção do aborto, a eutanásia”, assim


como a prostituição e a “descrimina-
lização das drogas leves”. “Quanto a
mim, digo que ainda bem que assim
é”, lê-se. “Não consigo dizer se era
mais ou menos progressista, mas
posso dizer que tive momento altos
e baixos de fé e durante a faculdade
vivi ambos”, descreve Ventura.
Também terá deixado esse pensa-
mento progressista nas aulas. A cate-
drática Teresa Pizarro Beleza (que
declinou comentários), foi sua pro-
Q lhão. Éramos todos amigos”, des- g fessora e chegou a escrever no seu
creve o padre Luís Marques, colega Surgiu um esque- Facebook: “Agora defende tudo ao
leto em palco du-
de casa de Ventura e atualmente rante um discurso contrário do que defendia nas mi-
pároco em Beja. de Ventura em nhas aulas.”
Era em São Nicolau que mais se Serpa: “Sabota-
gem”, diz o Chega
sentia em casa: “Fazia-me lembrar O desleixo de um bom aluno
Penafirme”, diz Ventura, referindo o André Ventura era um bom alu-
seminário onde concluíra o secun- VENTURA no, mas não era o meu melhor
dário. O padre Marques lembra as MOSTRA aluno”, lembra um docente
noites de copos no pub irlandês do ADMIRAÇÃO da Nova, responsável por uma
Cais do Sodré, O’Gilins, ou as via- PELA GERA- cadeira obrigatória. “Eu diria que ele
gens até Salamanca no Daewoo Ma- ÇÃO DO IN- estava no top 10 de melhores alunos,
tiz de Ventura: “Conversávamos e TEGRALISMO mas não top 3. Nesse pódio estava
ouvíamos muita música no pub. Em LUSITANO Gonçalo Almeida Ribeiro, um aluno
Salamanca, lembro-me de nos rir- EM TRABA- brilhante”, explica o mesmo profes-
mos muito com o filme A Vida de LHO DE UNI- sor. As notas excelentes de Ventura
Brian.” Ao contrário da descrição VERSIDADE valeram-lhe uma bolsa para estu-
dos seus colegas de faculdade, os dantes de licenciatura, para um pro-
amigos de São Nicolau “não veem jeto do professor António Hespanha
grande diferença de personalidade”. i chamado “Biblioteca Digital de
Ventura e Luc
“Era um tipo com aquele sentido de Mombito já se co- Fontes de História do Direito
humor irónico, simpático, acessível nheciam no semi- Português dos Séculos XIX e XX” –
e frontal. Se alguém que não conhe- nário de Penafir- mas correu mal.
me. Viveram jun-
cesse falasse mal do Benfica, ele era tos em Lisboa du- “O objetivo era digitalizar manuais
o primeiro a fazer conversa.” rante a faculdade feitos por professores de Direito e,
com isso, os bolseiros fazerem pe-
Os altos e baixos da fé quenos estudos”, explica a professo-
Em São Nicolau havia rotinas, refei- ra e investigadora Cristina Nogueira
ções fixas, e cada um tinha uma ta- da Silva. Ventura tinha a tarefa de
refa. E o dia começava com as lau- manuais de Direito do Estado Novo
des, a primeira oração da manhã. e, apesar de ter feito um estudo,
André Ventura costumava juntar-se não chegou a digitalizar o prometi-
– mas nem sempre. “Às vezes ia, do. “O professor Hespanha não fi-
outras vezes não, tal como a missa cou nada satisfeito. Mais tarde che-
em São Nicolau”, explica o candidato garam a um acordo de ele digitali-
apoiado pelo Chega. zar outros livros, mas nesse traba-
Que tipo de cristão era Ventura? De lho falhou. Não cumpriu”, concreti-
acordo com o texto Europa e laici- za, frisando que a relação entre
dade: que futuro, que escreveu em Hespanha e Ventura era “mera-
2004 para o Jur-nal, revista da Asso- mente académica” e que, se o pro-
ciação de Estudantes de Direito da fessor fosse vivo, não estaria feliz
Universidade Nova, parecia ser um com o percurso do aluno. “Ele era
católico progressista. Nesse texto, muito mais tímido e lembro-me de
elogiava a “sociedade civil cada vez ter conver- sas com ele normalíssi-
mais exigente quanto às liberdades mas. Nunca imaginei que iria dizer
individuais” como “a descriminaliza- tamanhas barbaridades.” W

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Crónica 14 JANEIRO 2021
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VÁ LÁ pede o levantamento do sigilo ban-


cário de um deles sem fundamentar,
ver não o diriam melhor. Mais do que
investigar um qualquer crime de vio-
À SUA VIDA nem sequer explicitar, a mínima sus-
peita de um qualquer crime de cor-
lação do segredo de justiça, este pro-
cesso pretende, isso sim, condicionar
Este processo mostra como o poder rupção. A isto chama-se cobardia e manietar todos os jornalistas que
sem escrutínio pode ser exercido de processual. acompanham a área da justiça, obri-
forma perversa e como dentro do Nestas páginas, também vai ficar a gando-os apenas a relatar o que os
próprio Estado existem estados de saber como é que uma procuradora, exotéricos comunicados da Procura-
exceção sem qualquer tipo de controlo. sem mostrar qualquer tipo de preo- doria-geral da República relatam,
No final, todos ainda acabam com um cupação legal com o sigilo profissio- terraplenando conceitos como o “in-
“Muito Bom” na avaliação nal de duas pessoas, que só pode ser teresse público” e a obrigação de
quebrado por um tribunal superior, prestar contas aos cidadãos. Se tudo
mandou uma polícia fazer vigilâncias decorresse como o espírito do pro-
e esta, obedientemente, cumpriu a cesso pretende que as coisas decor-
“determinação” sem, sequer, levan- ram, depois de em novembro de
C tar uma pequena dúvida quanto à 2014 José Sócrates ter sido detido, só

A memória
sua legalidade e conformidade cons- quatro anos mais tarde é que os cida-
titucional. Se, um dia, um qualquer dãos teriam (algum) direito a saber o

da PIDE não
procurador mandar a PSP escutar que é que se passava, com a dedução
conversas entre cliente e advogado, a da acusação. É isto que se pretende,

se apagou
polícia cumpre sem pestanejar. O ca- silenciar, quando a função da im-
minho faz-se caminhando e, ao que prensa numa sociedade democrática
parece, a Constituição não é de leitu- é, precisamente, o contrário.
ra obrigatória na PSP e parece que no A defesa de Aquilino Ribeiro expli-
NASCIDO EM OUTUBRO DE 2005 Centro de Estudos Judiciários come- cou-o no processo que foi movido ao
PARA PROTESTAR CONTRA A ça a ser olhada de soslaio. escritor no Estado Novo devido à
“REABILITAÇÃO URBANA” do O objetivo está claro no processo: é obra Quando os Lobos Uivam, consi-
antigo edifício da PIDE, na Rua Antó- preciso saber com quem os jornalis- derando que o processo, mais do que
nio Maria Cardoso, em Lisboa, num tas falam. Silva Pais ou J. Edgar Hoo- investigar e julgar pretensas ofensas à
condomínio de luxo, o movimento magistratura, pretendeu “relegar o
Não Apaguem a Memória bem pode artista à situação de simples escrevi-
ficar “descansado” que o edifício nhador de histórias” (Em Defesa de
pode ter desaparecido, mas a memó- Aquilino Ribeiro; Alfredo Caldeira e
ria das práticas da polícia política do Diana Andringa, Terramar).
regime de Salazar, ainda que li- Ainda há poucas semanas, a pro-
geiramente adormecida, vai curadora Maria José Morgado – cujo
dando sinais de vitalidade. passado na investigação criminal
Nas páginas desta edi- lhe confere uma autoridade mo-
ção, pode ler a história do ral ímpar – refletia, e bem, sobre
maior ataque em demo- os sucessivos estados de emer-
cracia a um direito fun- gência e a compressão de direi-
damental: a liberdade de tos. A procuradora alertava, no
imprensa. O mesmo Mi- fundo, para o perigo de se per-
nistério Público que, há petuar este “novo normal”
uns anos, não deu des- para lá dos tempos de exce-
canso a Jorge Silva Car- ção. A reflexão é pertinente,
valho, ex-diretor do mas convém manifestar o
Serviço de Informações mesmo tipo de preocupação
Estratégicas e Defesa com o “antigo normal”, ter-
(SIED) por ter tido acesso à reno também fértil para a ex-
faturação detalhada de um pansão de poderes sem es-
jornalista, obtendo a sua crutínio. Ninguém espere
condenação por abuso que, da história contada
de poder e acesso ilegí- esta semana pela SÁBA-
C timo, é o mesmo que, DO, haja alguém respon-
Subdiretor hoje, combina com a sabilizado. Não, muito
Carlos PSP uma vigilância a provavelmente, daqui a uns
Rodrigues dois jornalistas sem um anos até terá um “Muito Bom”
Lima despacho de um juiz e na avaliação. É normal. W

53
Portugal
P21
PRESIDENCIAIS

ELEIÇÕES. QUANTO RECEBEM OS OPERADORES


FILHA DE LOUÇÃ

2 MILHÕES E ASSESSORA
MARISA

400 MIL EUROS


Os candidatos
têm de indicar
à CNE quem é

PARA TEMPOS
o interlocutor da
candidatura para questões
de tempos de antena. Mari-
sa Matias, a candidata

DE ANTENA apoiada pelo BE, indicou


Joana Campos. Trata-se de
Joana Campos Louçã, filha
de Francisco Louçã e da
médica Ana Campos, que
trabalha há alguns anos no
esquerda.net, o portal do BE.
Os candidatos fazem campanha para transmitir em rádios
e televisões, que são pagas pelo Estado em função do espaço
ocupado. As TV levam a fatia de leão.
Por Maria Henrique Espada e Sara Capelo

Os números já foram publi- atribui 63.540,68 euros à Há uma parte destas verbas
cados em Diário da Repúbli- RDP, 211.989,69 euros à Co- (um sétimo, mais precisa- A CHEGAR-SE
ca. As televisões, pública e os mercial e 286.776,53 euros mente, já que há sete candi- PARA TINO
dois canais privados, rece- à Rádio Renascença e RFM. datos) que é desperdício: Alguns dissidentes do
bem o grosso da verba legal- Marcelo Rebelo de Sousa Chega, como o ex-líder
mente calculada para este não fará tempos de antena, da distrital de Leiria, Ro-
efeito. €82.059,7 pelo que no espaço que lhe drigo Freire, apoiam o
Este é o valor que cabe a estava atribuído apenas se candidato Vitorino Silva.
três rádios com licenças de lerá a habitual mensagem E em páginas de Face-
€1.755.494 âmbito regional, uma vez nestes casos, de que a candi- book de concelhias de
Foi o total a dividir pela RTP que a distribuição é descen- datura não forneceu conteú- Leiria apela-se direta-
(395.337 euros), SIC (783.126 tralizada. As três também dos para a emissão. Mas a mente: “Vote Vitorino
euros) e TVI (577.031 euros). irão transmitir tempos de verba correspondente é na Silva, para um Portugal
antena e receber a verba mesma paga a televisões e Melhor.” À SÁBADO,
respetiva. São a M80 rádios. A única poupança André Ventura diz que
€562.306,9 (6.348,46 euros); a TSF aqui é na produção dos di- é “uma usurpação” de
Já nas rádios com cobertura (36.348,46 euros) e o Posto tos, que implica naturalmen- ex-membros e admite
nacional, o total não chega Emissor de Radiodifusão do te despesas com meios hu- agir judicialmente.
aos 600 mil euros. A divisão Funchal (9.353,78 euros). manos e técnicos.

A CARA DO
DEBATE COM... j j
André Ventu- Ana Gomes
Nó na garganta com ra a ouvir... a ouvir...
as pedras do Tino? ...Vitorino Silva: “Eu ...Marcelo Rebelo de
Surpresa à recusa também sou candi- Sousa: “Escusa de
dato para poder dei- tentar atingir a minha
de ataques com tar os muros que honorabilidade [com
“o amigo” Salgado ? para mim são clan- a amizade com Ricar-
Asco ou simpatia? destinos que muita do Salgado]. Não vale
Houve de tudo nos gente quer erguer.” tudo em política.”
encontros nas TV

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Da rua, de casa e
de casa de amigos
j nto fofo
O momeebelo de Sousa crioo-
u
R
Marcelo a campanha eleit !
n do
suspense sitivo. Está infeta
o r-
ral. Deu p tivo. Não está! Te e
d eu n e ga m p a ta r,
E ese
e, para d mo-
ceiro test . O carrossel de e to,
não e st a v a
e, no e nta n TINO E FEIO
ídicas tev o momento
ções cov ria r SEM DISTÂNCIA
em de c aa
a vantag o e fofinho de tod ão, Ainda a suspeita de Covid
a is b on it u s, a te n ç
m vír em Marcelo não chegara à
a (não o o
campanh ções). O chamad campanha, quando Diogo
a s so-
mas as re gatinho nas rede n-
momento a roda viva de c
a Feio (CDS) e Vitorino Silva
ia is. F o i um m a n d ar se cruzaram por acaso –
c
telefonar, lica-
didatos a e expressar pub - houve foto, aqui em rigo-
g e m a re cu
mensa e rápid roso exclusivo nacional.
desejo d Repú-
mente o e n te da
ao Presid gue dentro Tino ficou em Alfama
peração se
c a . A c ampanha com amigos.
bli s.
nto
de mome

81
anos, tinha
2
foram as vezes .MAYAN , O MIGRANTE
Mário Soares, que o PCP teve O portuense apoiado pela
o candidato “confiança” IL entrou em direto na SIC
mais velho num slogan e na RTP: fundo de papel
de sempre, presidencial. Je- de parede discreto, aplique
ao concorrer rónimo de Sou- sofisticado e um quadro
em 2006. sa usou “deter- clássico. Também ficou
minação” e em casa de um amigo

1980 “confiança”,
João Ferreira
em Lisboa.

a data em tem “coragem


Retweetou o adversário que Marcelo e confiança”.
Alerta paródia: esteja atento ao que dizem os perfis entrevistou um Será augúrio?
candidato
Tiago Mayan partilhou no
Twitter um recorte do
Expresso elogioso para si,
em “anos”. Ana Gomes fez
retweet. A SÁBADO estra-
nhou, mas depois com-
presidencial:
Ramalho Eanes.
João Ferreira
2.ª
volta: só houve
VENTURA EM PARIS?
Não: é só o fundo da entra-
mas muito pouco para a preendeu: são duas con- tinha 2 anos. em 1986, Soa- da de casa em direto
IL. Dizia que ele consegui- tas-paródia. A foto da can- Marisa Matias, res vs. Freitas na RTP. O líder do Chega
ra mais em hora e meia de didata até é a de Herman 4 anos. do Amaral. tem uma foto da capital
debates do que o partido José a imitá-la. francesa na parede.

j j j
Marisa Matias João Ferreira Marcelo
a ouvir... a ouvir... a ouvir...
...André Ventura: ...André Ventura: “Eu ...Vitorino Silva:
“Marcelo com os
“Sabia que vinha sou deputado na AR,
70% tem muito
debater comigo, sou um deputado, lí-
que não ia debater der do partido e can- mais força.”
com o Rato Mickey. didato presidencial.
(...) Eu vinha prepa- Para ser líder do par-
rado para acabar tido ainda vai demo-
consigo.” rar muito para si.”

55
Portugal

1 2

3 4

TELEVISÕES. OS BASTIDORES DOS DEBATES nha direção de informação e ficou

PEDRAS NO BOLSO
decidido que só o usaria como
bomba atómica”, diz a jornalista
da SIC. “Era uma possibilidade em
desespero total.”
A hipótese de usar a técnica que

E CONVERSA MOLE
calou Donald Trump também foi
discutida na TVI. Mas a conclusão
foi a de que não resultaria por cá.
“Aqui os candidatos estão muito
O que ninguém viu: reflexões sobre cortar microfones, perto, o som entrava à mesma,
pelo microfone do que estivesse
o candidato que não cumprimentou outro e muita simpatia. a falar”, garante Pedro Mourinho,
Por Margarida Davim que optou por outra abordagem.
“Fiz a conversa quo árbitro tem an-
tes do jogo com as equipas de fute-
bol, quando sabe que há jogadores
mais arruaceiros.”
Carla Moita, que moderou o em-

M
arcelo foi o único sem crofones seria “a bomba atómica”. bate entre Ferreira e Ventura, ad-
staff, Ventura levou A ideia foi discutida dentro das te- mitiu em direto que a discussão ti-
guarda-costas, Marisa levisões depois do debate entre nha entrado “em roda livre”, mas
falou do amigo co- João Ferreira e André Ventura, mas olhando para trás diz que “não fa-
mum com Mayan, Ana Gomes fitou só esteve perto de ser usada no “NUNCA ME ria nada muito diferente”, apesar
o candidato do Chega nos olhos, confronto entre Marisa Matias e PASSOU das críticas. “Marquei muito bem a
João Ferreira recusou cumprimen- o candidato apoiado pelo Chega. PELA CABE- minha posição. Não ia entrar a falar
tá-lo, Tino fez conversa com todos. Clara de Sousa ameaçou fazê-lo, ÇA O CORTE por cima deles. Alertei as vezes
Houve muito mais nos debates do quando o tom escalou, mas con- DE MICRO- suficientes”, vinca a jornalista, que
que se viu em casa. Mas a grande fessa-se aliviada por não ter pas- FONE ATÉ acredita que o próprio Ventura
discussão nos bastidores foi mes- sado da ameaça. “Nunca me pas- ESTE ANO”, “percebeu que talvez o caminho
mo sobre como gerir quem não sou pela cabeça o corte de micro- DIZ CLARA não fosse por ali” e se moderou
respeita as regras. Desligar os mi- fone até este ano. Falei com a mi- DE SOUSA nos debates seguintes.

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“FIZ A CON- Mourinho registou “o nervosismo”. lo, num tom mais sereno do que o
VERSA DO O clima tenso não foi, porém, a do debate. Nunca a discussão políti-
ÁRBITRO regra nos bastidores. Marisa Matias, ca continuou depois do desligar dos
ANTES DO por exemplo, aproveitou para falar microfones, mas Marcelo também
JOGO” QUAN- a Tiago Mayan, que não conhecia ficou, de máscara e à distância, uns
DO HÁ AR- pessoalmente, sobre “o amigo em minutos a falar com João Ferreira.
RUACEIROS comum”, que a apoia, mas fez a O campeão destas conversas terá
NA EQUIPA, licenciatura (e amizade) com o sido Vitorino Silva, que ficou sem-
DIZ PEDRO liberal. E até perguntou a Vitorino pre a trocar mais umas ideias com
MOURINHO Silva pela filha, que há cinco anos o os adversários. O candidato, que
acompanhou no debate que juntou garante à SÁBADO não se preparar
todos os candidatos e, por engano, para os debates, levou pedras para
acabou a comer uma pizza que fora o encontro com André Ventura. E
1 comprada para a candidata, que na- Ventura “saiu com elas do estúdio”,
Carlos Daniel fez quele dia ainda não tinha tido tem- como testemunhou Carlos Daniel.
11 debates em
oito dias: “A mi- po para se alimentar. O jornalista da RTP bateu recordes
nha vida era ali- ao moderar 11 debates em oito dias,
mentar-me, ler As costelas partidas de Marisa seis dos quais com Tino. “Foi uma
e preparar per-
guntas” O tom distendido também deu mar- semana muito dura. A minha vida
gem a João Ferreira e Ana Gomes era alimentar-me, ler e preparar
2 para saber como está Marisa a recu- perguntas”, revela, explicando a
Vitorino Silva perar das costelas partidas na pré- opção “arriscada” com a ideia de
ficava sempre
mais um pouco -campanha. Fora do ar, Ventura “uniformização” para manter sem-
à conversa com ainda ficou a conversar com Marce- pre o perfil do moderador. W
os adversários

3 PUB

A SIC ponderou a
”bomba atómica”
Circuitos e distância para calar confu-
As televisões organizaram-se sões
para evitar “ajuntamentos”
4
As regras e cuidados relati- João Ferreira e
André Ventura
vos à pandemia limitaram os atropelaram-se a
Almoço-Debate com Professor António Rebelo de
contactos longe das câmaras. falar na TVI e a
As televisões tinham salas se- tradução gestual Sousa
tornou-se inviável Economista e Professor Universitário
paradas para as candidaturas
e também circuitos para evitar
que se cruzassem na caracteri-
zação. Mas ainda aconteceram
algumas conversas de circuns-
tância entre os candidatos.

No entanto, o estilo truculento Clara


que Ventura mostrou com João de Sousa disse
Ferreira em antena não marcou os a Ventura que
minutos em que os dois candidatos com dois a falar 28 de Janeiro Sheraton Lisboa Hotel & Spa
esperaram juntos para entrar no ar ao mesmo tem-
na TVI. “Antes, foi supertranquilo”, po, o intérprete "Cenários Futuros da Economia Mundial"
garante Carla Moita. No fim, Ferrei- de Língua Ges-
ra recusou o cumprimento de coto- tual Portuguesa
velo que Ventura lhe tentou dar. não conseguiria
A tensão entre Ana Gomes e André trabalhar. “Quan- Main Sponsor: Gold Sponsors: Media Partners: Partners:

Ventura já era bem notória antes do isto descam-


de as câmaras se ligarem. Os dois bar, a tradução
fitaram-se durante uns minutos para. Está deci-
antes de irem para o ar. Pedro dido”, avisou.

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Mundo

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EUA. O 46.º PRESIDENTE JURA A CONSTITUIÇÃO NO DIA 20 DE JANEIRO

BIDEN
NÃO VAI TER
S UMA
ó é possível imaginar o incó- Nacional, vindos de seis estados, em
modo do pum-pum na ma- Washington. Estes militares, que já
deira e no metal ou do bip- chegaram à capital, não estão arma-
-bip da marcha atrás dos ca- dos e têm feito o controlo do tráfego

TOMADA
miões que chegam do Capitólio. À e assistido a segurança em torno do
janela do seu quarto, do lado norte Capitólio. Também têm sido coloca-
da Casa Branca, escreveu a CNN, é das barreiras de metal com mais de
provável que Donald Trump os oiça 2 metros de altura, que foram “dese-

DE POSSE
a trabalhar na construção do palan- nhadas para serem impossíveis de
que para a tomada de posse de Joe escalar”, escreveu a AP.
Biden, o 46º Presidente dos Estados “Pode imaginar um nível de segu-
Unidos da América, a 20 de janeiro. rança como Fort Knox [o cofre que
Estão a trabalhar desde setembro. E guarda as reservas de ouro do país],

ASSIM
o derrotado – que demorou quase apenas com as pessoas que têm de
dois meses a assumir-se como tal e a lá estar”, descreveu ao Politico uma
garantir uma passagem de poder or- fonte próxima de Biden, já depois do
deira – está ali perto. A roer-se. caos no Capitólio.
Foi também por baixo deste cená- As autoridades estarão preparadas
rio, de andaimes e bancadas, que Faltarão milhares de pessoas, a parada para responder aos problemas de
passaram os apoiantes de Trump até à Casa Branca e o banquete. Até segurança que se colocam quando, a
que, a 6 de janeiro, invadiram o Ca- cada tomada de posse, se reúnem ali
pitólio, considerado o “coração da faltará o Presidente cessante. Só não cerca de 1 milhão de pessoas. Mas
democracia”. Gritaram que estavam faltarão medidas de segurança mais desta vez, com a Covid-19, não estão
a fazer uma “revolução” contra a à espera de uma multidão tão gran-
confirmação pelos senadores da apertadas, máscaras – e o vice de de. Ao contrário dos eventos anterio-
eleição de Biden. Estavam a “recu- Trump, Mike Pence. Por Sara Capelo res em que podiam convidar pessoas
perar o país”, diziam, tal como lhes quase sem limites (distribuíam até
fora pedido em mensagens vídeo e 200 mil bilhetes), desta vez os con-
no Twitter pelo próprio Trump. gressistas só podem levar um convi-
Esta invasão – que fez pelo menos dado. E até os organizadores de
cinco mortos: entre eles um polícia eventos e unidades hoteleiras refe-
que trabalhava no Capitólio desde rem que este é “um janeiro calmo”,
2008 – levou à definição de um sem o “negócio típico” para a época.
estado de emergência que se pro-
longará até dia 21 pela mayor de Instruções de fuga no bolso
Washington e à tomada de “precau- Os organizadores têm pedido aos
ções extras” na segurança do evento, apoiantes de Biden para ficarem em
que está a ser pensada pelos serviços casa e assistirem à distância. Este é
secretos e pelas agências de segu- um dos ingredientes que diferencia
rança há já um ano, diz a Associated a tomada de posse do 46º Presidente
Press. E este “já era um desafio sem dos EUA. “Não terá impacto”, come-
FOTOS REUTERS

precedentes devido à pandemia”, çou por questionar Bill Daley, que


notou o site Politico. Já estavam pre- colaborou na organização da toma-
vistos 6.200 membros da Guarda da de posse de Obama, em 2009. Q

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O quarto faltoso
Trump será o primeiro
ausente em mais de 150 anos
Três presidentes faltaram à
tomada de posse do sucessor:
John Adams (1801), John Quincy
1 Adams (1829) e Andrew Johnson
(1869).
Q “Não terá a foto de 1 milhão de
pessoas alinhadas”, mas “a aura de Biden já disse que, pessoal-
mudança estará lá”, garantiu à AP. mente, não se importa que o
Mesmo a tradicional parada militar antecessor não esteja presente.
na Pennsylvania Avenue será virtual. Apenas lamenta que, assim,
Está a ser planeada pela mesma 2 não seja possível mostrar uma
equipa que preparou a convenção “transição pacífica” de poder.
democrata que entronizou Biden ataque. Este nunca ocorreu para “alí- 1e 2
como o candidato. Para manter o vio” do novo Presidente, escreveu Ao contrário dos
Obama e dos
simbolismo do momento, entre o Obama no livro de memórias Uma Bush, desta vez o
Capitólio e a Casa Branca, o novo Terra Prometida, recentemente pu- ex-Presidente saúde. Quem assistir na plataforma
Presidente será escoltado por um blicado pela Objectiva. Trump e a pri- VIP (que deverá ficar longe dos 1.600
meira-dama não
número reduzido de representantes estarão presen- convidados habituais) terá de usar
de cada ramo das Forças Armadas. E Iguarias e champanhe barato tes na cerimónia máscara e manter a distância de se-
dificilmente terá multidões a acenar- Trump anunciou no Twitter que não 3 gurança recomendada. E chegou a
-lhe, e à primeira dama, como habi- estará presente. Mas o seu vice, Mike Todos os mo- discutir-se a hipótese de se pedir um
tualmente ocorre nesse percurso. Pence, é esperado na cerimónia. mentos simbóli- teste Covid aos que estivessem mais
Obama foi recebido apoteotica- Também o ex-presidente Republica- cos, como a para- próximos de Biden, segundo a CNN.
da, foram reduzi-
mente em 2009, mas esse momento no, George W. Bush, confirmou a dos em escala O comité organizador, que é do
poderia não ter ocorrido. Na véspera, presença. E irá acompanhar os de- Congresso, tem até um médico
a sua equipa de segurança foi avisa- mocratas Obama, Clinton, Biden e como conselheiro: David Kessler, ex-
da que os serviços secretos tinham respetivas mulheres na deposição -responsável pela FDA (a agência do
recolhido informações credíveis de de uma coroa de flores na campa do medicamento norte-americana). O
que quatro homens naturais da So- Soldado Desconhecido, no Cemitério mais difícil para este comité é equili-
mália poderiam estar a preparar um de Arlington. Esta é uma das iniciati- brar a resposta sanitária com as tra-
atentado. O plano de segurança foi vas simbólicas do novo Presidente Bíblia dições seculares. Dois exemplos: a
atualizado e Obama guardou no bol- que baseará o seu discurso no desejo Está na família Banda dos Fuzileiros, que atuou em
so uma folha com as instruções que de uma “América Unida”. Biden desde todas as tomadas de posse desde
deveria dar à multidão, caso estives- Já o democrata Jimmy Carter, de 96 1893 e foi já usa- 1801, poderá atuar? E o coro que ha-
se no palco no momento do eventual anos, ficará em casa por questões de da pelo novo bitualmente canta para o novo chefe
Presidente para do Estado? Isso, “provavelmente não
fazer os jura- é praticável”, escreveu a CNN.
mentos como Certo já é que o habitual banquete
senador (sete para 200 membros do congresso foi
vezes) e vice de cancelado. Era uma tradição desde o
Obama (duas) século XIX e tem cabido ao próprio
Presidente eleito escolher o menu.
Em 2009, Obama inspirou-se em
Abraham Lincoln e serviu um estufa-
do de frutos do mar e aves america-
DEPOIS DA nas, como pato e faisão. Oito anos
INVASÃO AO depois, Trump serviu lagosta do Mai-
CAPITÓLIO, ne e camarões da Flórida com aça-
“PODE IMA- frão, bifes de vaca Angus grelhados
GINAR UM com chocolate negro. O requinte dos
NÍVEL DE pratos principais contrastava com o
FOTOS REUTERS

SEGURANÇA champanhe que, segundo a CNN,


COMO O DE não custava mais de 13 euros. Com
3
FORT KNOX” Biden, nem esse será servido. W

60
Opinião

RELATÓRIO O entrou na conversa de alcova, a não ser

MINORITÁRIO Uns e os ao sugerir as amizades entre Marcelo e


o dono do BES. Teve alguma sorte em

Uma análise detalhada dos


presidenciáveis, sem
outros não ver explorada a sua militância de
“soldado raso” no MRPP, com porme-
nor dos delitos que este praticou sobre
desconversa. Isto é, pessoas e bens. E pessoas de bem.

A
baseada apenas nos na Gomes – Usou várias vezes, André Ventura – Acusado de aventu-
debates, que aqueceram com eficácia, o argumento da reiro em cada debate, não sofreu, no
este inverno do nosso gravitas: embaixadora habitua- entanto, grande desventura, apesar de
descontentamento. da ao perigo, às negociações extremas ser uma espécie de inimigo de estima-
Por ordem alfabética “com vários diabos”, mulher comum e ção de todos os rivais. Aliás este fenó-
respeitável, mãe e avó, que não deve meno forneceu-lhe publicidade gra-
ser desconsiderada. Pouco ou nenhum tuita. Inconscientemente ou não, era o
sentido de humor ou ironia, exceto no candidato a abater, e portanto o mais
duelo com Ventura, no qual ensaiou al- (im)popular. Confirmou-se como bom
gumas setas vernaculares, incluindo as orador, sem gaguejos nem soluços, e
histórias de cordel “pornográficas” des- não tentou imitar nenhum sotaque re-
te, ou as transformações de coelhinho gional (ao contrário das charlas de fu-
em gatarrão. Bem na denúncia de vá- tebol). O seu maior desafio foi o de ser
rios males do regime, mas diminuída levado a sério. Conseguiu triunfar. Um
por sempre ter estado ligada a um dos dos poucos que responderam a tudo o
partidos fundamentais do mesmo. Não que foi perguntado, embora tenha
acumulado imprecisões, meias-verda-
des e interpretações abusivas.
João Ferreira – O PCP já teve muito
melhor, no registo de funcionário políti-
co cumpridor e conhecedor da orto- Q

O j
Possessos
revolucionários
Assalto ao Capitólio, pela plebe de
Trump, em Washington. Cerco à AR e
à residência oficial do PM, 12 e 13 de
novembro de 1975. Em Lisboa.
Alguns dos envolvidos ficaram me-
lindrados pela comparação.
Ainda bem. Porque a equivalência é
exata, independentemente das even-
tuais “doutrinas” em causa.
Foram dois momentos de pressão
“da rua” – com larga manipulação de
forças políticas conhecidas – sobre
parlamentos que decidiam aspetos
cruciais: a feitura de uma Constituição e
a contagem final de votos presidenciais.
No fim do incidente português, os
deputados sequestrados saíram sob
apupos. Tinham sido eleitos, mas a
O
Politólogo turbamulta injuriava, cuspia e amea-
REUTERS

Nuno Rogeiro çava. Seletivamente.


nrogeiro@gmail.com A memória, claro, embaraça. W

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ciais, foi comedido, não se sabendo se por correspondência universal, face à


os desconhecia, ou se não se queria pandemia e após um ano que poderia
comprometer com uma doutrina espe- ter preparado o mecanismo.
cífica. Também foi ineficaz na marca- Marisa Matias – Não conseguindo
ção de território “à esquerda”, não con- gerar antipatia, viveu, no entanto, num
seguindo desligar-se da experiência bosque cinzento de ambiguidade. Não
centrista da “geringonça”. Mas foi sem- protestou quando Clara de Sousa, judi-
PEDRO PINA

pre respeitador e não insultuoso. ciosamente, lembrava que o Bloco é


Marcelo Rebelo de Sousa – Parecia o hoje um partido de “socialistas e so-
Barcelona a jogar em casa, sempre ciais-democratas”. Foi esmagada por
Q doxia. Não há nada mais patético do com serenidade e a sensação de não Ventura, mas manteve-se normal em
que um estalinista com telhados de vi- ter candidatos à altura. Mas nunca foi todos os outros debates. O problema,
dro, que por isso não pode atacar com nem professoral em excesso, nem porém, é que “normal” não bastava.
eficácia o gémeo nazismo, as tiranias ou condescendente, e muito menos dese- Tiago Mayan – A Iniciativa Liberal foi
outros desmandos do poder. Teve a seu legante. Mais preparado do que a con- uma das boas novidades partidárias
favor a juventude, mas perdeu-a ao não corrência nas matérias que interessa- dos últimos tempos, mas o seu candi-
sugerir um grama de mudança, trans- vam, tinha ainda a vantagem de co- dato presidencial, apesar da boa vonta-
formação ou novidade. Quanto ao que nhecer quer o mundo dos comentado- de e articulação, pareceu sempre frágil.
são exatamente os poderes presiden- res quer o universo dos comentados. E sobretudo incapaz de explicar quer a
Embora com razão quanto à iniciativa teoria quer a prática do seu grupo.
da revisão constitucional, exclusiva Vitorino Silva – Com o populismo
dos partidos, e de ter vibrado dois du- puro e duro, o perfil de homem da rua,
ros golpes em Ventura (o ter aparecido o discurso para reformados e injusti-
contra as previsões do Chega, e de o çados tomados de assalto por Ventura,
denunciar como líder de fação), ficou tinha pouco campo de manobra. Não
largamente à defesa com Ana Gomes. conseguiu libertar-se de um mero
E não explicou quer o não adiamento sentido de Casa dos Segredos polini-
das eleições, quer a ausência de voto zada. Perdão, politizada. W

O h O
O dolo eventual Mais do mesmo
(felizmente)
Donald Trump (DJT) não apoiou a vio-
lência contra os congressistas. Mais “novas músicas” de fusão, clás-
Mas convocou uma manifestação sicas e atuais, de graça na Internet,
junto ao edifício onde esses eleitos se via YouTube. Dos Focus, Live & Rare
reuniam solenemente. Broadcasts ‘70’76, magistral, os re-
E discursou perante a mesma. centes iconoclastas Son of a Bach, e
Vários vídeos mostram ainda uma muito pós-folk: Corde Oblique, com
espécie de posto de comando, arraça- The Stones of Naples, Jack O’ The
do de festa sem máscaras, em que DJT Clock, com Night Loops, (muitas in-
e o seu núcleo mais próximo dançam, fluências dos Henry Cow), Garmarna,
observam e saúdam os manifestantes. j com Foerbundet, e os desconcertan-
Claro que, depois de o assalto consu- tes turcos 21. Peron, com Tapon. No
mado, Trump chamou a Guarda Na- sinfónico elétrico, o lendário Attila
cional. E no dia seguinte, condenou os Kollar com Musical Witchcraft, os es-
desmandos. Pouco e tarde. pantosos Zomby Woof alemães, com
E há o dolo eventual: o Presidente ti- Riding on a Tear, os também teutóni-
nha a obrigação de prever o que se cos Eden, com Erwartung, ou os bra-
passaria, só pelo facto de ter promovi- sileiros Tarkus (na foto), com Ao Vivo
do o ato de massa. em Niterói. E ainda o polaco C. Nie-
Tal como os que antes incentivaram men, com o soberbo e inclassificável
os Antifa, resultando em crime des- Marionekti, a revolução em sons. W
REUTERS

controlado. W

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Dinheiro

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REGULADORES. A LITIGÂNCIA QUE ARRASTA E FAZ PRESCREVER PROCESSOS DA CONCORRÊNCIA

MULTAS DE MILHÕES?
A MAIORIA ESTÁ
POR PAGAR

P
ode a Caixa Geral de Depó- para saber o conteúdo de meros se-
sitos contestar “a origem de paradores de um processo? Ou ten-
documentos internos” do tar invalidar buscas contestando a
banco, “apreendidos nas morada, mesmo que essa morada
instalações” do próprio? E um gigan- também seja a da empresa? A res-
te como a Super Bock alegar não De mais de 600 milhões em posta é igual para todas as perguntas:
conseguir defender-se de uma multa sim, tudo isto é possível. E é assim
por não ter acesso a um conjunto de
multas, cobraram-se pouco mais que as maiores empresas do País
folhas que diziam explicitamente de 10%. As empresas litigam tudo combatem multas de vários milhões
conter “informação extraída para de euros aplicadas pela Autoridade
outros processos”? Duas erratas, em
o que podem. Muitas vezes da Concorrência (AdC) por terem le-
quatro parágrafos, permitem argu- conseguem reduzir as multas. sados os consumidores. Resultado:
mentar que “a apreensão” de um multas que ficam anos por pagar ou
processo com 642 parágrafos fica
Noutras, os casos prescrevem. que acabam mesmo por prescrever.
comprometida? E é possível pedir Por Ana Taborda e Bruno Faria Lopes Um exemplo: em setembro de Q

65
Dinheiro

Q 2019, a Autoridade da Concorrên- h


cia (AdC) impôs a segunda maior Mais de 70% das
multas da Autori-
multa de sempre de um regulador dade da Concor-
em Portugal: 225 milhões de euros a rência foram deci-
14 bancos, por alegadamente se avi- didas durante a li-
derança de Marga-
sarem uns aos outros, por email, dos rida Matos Rosa
preços que iam praticar daí a dias em
vários tipos de créditos a pessoas e
empresas. Além de ser uma das
maiores coimas esta é, seguramente,
uma das decisões mais complexas e
contestadas do regulador. Tudo co-
meçou ainda antes de haver decisão.

JOÃO MIGUEL RODRIGUES


Em vez dos 30 dias úteis previstos
para o exercício do “direito de defesa
e audição”, foram concedidos – ace-
dendo a vários pedidos das institui-
ções – 235 dias. Foram, além disso,
interpostos 26 recursos interlocutó-
rios, que geraram um total de 43 re- corde não prescreva, há margem
cursos judiciais. Este “permanente para ter dúvidas sobre se, após as de- Novos megaprocessos
escrutínio”, diz a AdC, que venceu 38 cisões dos tribunais, continuará a ser Ações populares de milhões:
dos 43 recursos, levou a que o pro- recorde ou se os bancos pagarão revolução à vista?
cesso estivesse suspenso durante apenas uma fração. A história recen-
360 dias. Mais: em 2015, quando o te mostra que esta última opção está O ano 2020 terminou com
regulador propôs aos bancos colocar longe de ser improvável. duas grandes ações judiciais de
numa sala virtual de dados toda a in- Nos últimos 10 anos, os seis regula- 400 milhões de euros lançadas
formação recolhida nas buscas que dores que responderam à SÁBADO pela associação Ius Omnibus, cria-
não fora usada para suster a acusa- aplicaram multas no valor total de da no ano passado: uma contra a
ção – para consulta dos advogados – 604,7 milhões de euros. Cobraram Mastercard, outra contra a Super
o BPI foi o único a recusar, argumen- apenas 11% deste valor, calcula a SÁ- Bock. A associação tem na calha
tando com o sigilo da sua informa- BADO com base nas respostas en- outras ações, cujos custos são
ção. Só este recurso, que gerou novos viadas. Ou seja, pouco mais de 67 financiados por fundos espe-
recursos dos outros bancos, paralisou milhões de euros. Todos os regula- cializados. Em caso de sucesso,
o processo durante mais de dois dores têm problemas na cobrança todos os consumidores podem re-
anos, explicam à SÁBADO três advo- (ver caixa na página 71), mas é o que ceber uma indemnização, median-
gados que acompanham o caso. passa as maiores multas, a Autorida- te os critérios fixados pelo tribunal.
Toda esta litigância foi queimando de da Concorrência, o mais influente
tempo num processo que arrancou nestes valores. A Concorrência apli-
em 2012, e que está longe de termi- cou entre 2019 e outubro de 2020,
nar: depois da multa, as empresas um volume recorde de multas de multa mais alta alguma vez aplicada
podem recorrer para tribunal. E neste 456,8 milhões de euros. Tem a mais a uma única empresa. A segunda, a
como em muitos outros casos, foi baixa taxa de cobrança: até agora maior coima de sempre passada pela
isso que aconteceu. O julgamento no recebeu 31,68 milhões. AdC, visa o setor do retalho: 304 mi-
Tribunal da Concorrência, Regulação Esta discrepância entre multas de- lhões de euros para seis cadeias de
e Supervisão (TCRS), em Santarém – cididas e cobradas tem uma explica- supermercados (Modelo Continente,
onde a quantidade e complexidade ção inicial: todo este bolo está ainda Pingo Doce, Auchan, Intermarché,
dos processos não tem parado de em tribunal porque as empresas re- Lidl e Cooplecnorte, dona da marca
aumentar, esgotando a capacidade correram. “Relativamente a recursos E.Leclerc) e dois fornecedores (Socie-
das salas para as audiências e levan- A PROPOSTA de decisão final com aplicação de dade Central de Cervejas e Prime-
do as juízas a avisarem para o risco PARA COLO- coimas por violação das normas da Drinks) por concertação de preços
de prescrições –, ainda não tem data CAR INFOR- concorrência temos sete processos”, ao consumidor. Pelo menos a MEO,
marcada. O prazo de prescrição ter- MAÇÃO explica a AdC. O número de proces- o Pingo Doce e o Modelo Continente
mina em 2023 e, até lá, será preciso NUMA SALA sos em fase de recurso vai subir. No já anunciaram que vão litigar.
concluir o julgamento ali e, depois, VIRTUAL PA- fim do ano passado a Concorrência
no Tribunal da Relação, para onde os ROU O PRO- decidiu mais duas multas-recorde. Litigar antes, pagar depois
bancos podem e vão recorrer a se- CESSO DA A primeira, que condena a MEO a Esta via-sacra judicial tem ocorrido,
guir. Sobra, ainda, o recurso ao Cons- BANCA POR pagar 84 milhões de euros por com- em geral, sem que as empresas ti-
titucional. E mesmo que a multa-re- DOIS ANOS binar preços com a rival Nowo, é a vessem de pagar as multas antecipa-

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aplicava”, explica a mesma fonte. E OS ÍNDICES Deutsche e UCI) estão ainda a litigar
conta a história: “Nestas situações o SÃO ÚTEIS, em tribunal o valor e o modo de pa-
recurso para o Tribunal Constitucio- ADMITE A gamento dessa caução. Entretanto,
nal é obrigatório por parte do Minis- ADC, MAS A moveram uma nova montanha de
tério Público. Por sua vez, a posição SUA AUSÊN- recursos com pedidos de nulidade
do Tribunal Constitucional não era CIA NÃO PER- processual contra a decisão da Auto-
uniforme e os recursos que eram dis- MITE ANU- ridade da Concorrência, que corre
tribuídos a uma secção do Tribunal LAR PROCES- um risco significativo de prescrever,
Constitucional eram decididos no SOS – JÁ SE admitiram à SÁBADO três advoga-
sentido da conformidade constitucio- TENTOU dos que acompanham o processo.
nal da norma e aqueles que eram Os bancos têm alegado que não está
distribuídos a outra secção eram em causa um cartel, porque não há
decididos em sentido contrário.” contactos que provem a troca de in-
Foi só no fim do ano passado, sete formações para combinar preços. Já
anos depois da entrada em vigor da a AdC defende que as provas justifi-
lei e após vários pedidos repetidos da cam a multa: “Veja-se o email (…) do
AdC, que o Tribunal Constitucional Santander, para nove concorrentes,
uniformizou a sua jurisprudência, a CGD, BCP, BES, Barclays, Monte-
“decidindo em definitivo pela con- pio, BPI, BBVA, Caixa Agrícola e BA-
damente. Quando a troika chegou a formidade constitucional da norma”, NIF, de 18 de novembro de 2011, em
Portugal em 2011, uma das leis que nota o regulador. Mas as empresas que avisa os bancos de quais os va-
quis mudar primeiro foi a da con- têm alegado que o pagamento da lores exatos de spread que o Santan-
corrência. Os prazos de prescrição multa antes do recurso lhes provoca der pretendia alterar no prazo de
foram alargados para 10 anos e as prejuízo sério, propondo em alterna- três dias”, exemplifica.
empresas passaram a ter de pagar a tiva pagar uma caução, pretensão
multa antes de recorrerem da deci- que está a ser aceite pelo Tribunal Multas que nunca se pagam
são. Mas das empresas com as 10 da Concorrência nos processos mais Além das multas que demoram a pa-
maiores multas em Portugal (ver in- recentes – a caução, negociada, é gar e das coimas que acabam por ser
fografias), a maior parte das quais tipicamente 50% do valor da multa reduzidas, também há as que nunca
posterior à entrada em vigor da nova e fica à ordem do tribunal, como se pagam. Em 2009, a AdC decidiu
lei, nenhuma pagou antes do recur- aconteceu nos casos EDP/Sonae ou multar cinco empresas de restaura-
so, confirma à SÁBADO fonte oficial no cartel das seguradoras. ção coletiva, que forneciam refeições
da AdC, que justifica o fracasso com Mesmo com a nova moldura legal, a hotéis, hospitais e casinos, por car-
um imbróglio judicial que levou as empresas podem levar tempo a tel – Eurest, Trivalor, Uniself,
anos a resolver. pagar a caução. Quinze meses de- ICA/Nordigal e Sodexo Portugal fo-
“Sucede que nos anos seguintes [à pois da multa da Concorrência, os ram condenadas a uma coima de
entrada em vigor da lei] o entendi- bancos multados (BIC, BBVA, BPI, 14,7 milhões. Na decisão do caso, que
mento do TCRS era que essa norma BCP, BES, Santander, Banif, Barclays, ficou conhecido como cartel das
era inconstitucional e, por isso, não a Caixa Agrícola, Montepio, CGD, cantinas, explica-se como funciona-
ria o acordo: se houvesse uma con-
sulta de preços, quem tinha o contra-
to, “a preferente”, apresentava sem-
pre o preço mais baixo e indicava
às concorrentes o valor que deviam
propor; se mesmo assim o cliente
decidisse contratar uma empresa
com uma proposta mais cara, essa
empresa devia compensar a outra,
“com a cessão de um ou mais con-
tratos de valor equivalente”. Em caso
de prejuízo, provocava-se a abertura
de um concurso, provocando o au-
j mento do valor do contrato.
É no Tribunal da Em 2015, o caso acabou por pres-
Concorrência,
Regulação e crever, sem lugar a qualquer paga-
Supervisão, em mento de multa. As prescrições fo-
Santarém, que as ram justificadas pela AdC com “o
RAQUEL WISE

empresas tentam
anular multas elevado grau de litigância judicial,
de milhões com múltiplos incidentes levanta- Q

67
Dinheiro

Q dos pelas cinco arguidas, tanto du- isso, qualquer elemento em relação do para tentar anular as provas dos
rante a fase administrativa como du- ao qual a arguida devesse ou tivesse reguladores. Várias decisões, de vá-
rante a fase judicial”. Nas decisões, de exercer o contraditório (...) Não rios tribunais diferentes, definem que
que tal como os restantes que a SÁ- obstante isso (...) tais elementos (...) as mensagens de correio eletrónicas,
BADO consultou, há queixas por não foram entregues à arguida (...)” desde que abertas e lidas, merecem
haver um índice no processo, pela tratamento igual aos documentos im-
falta de tempo para o analisar (alega- Quem manda nos preços? pressos (aliás cada vez mais raros). As
damente seria preciso ver 15.500 fi- Este tipo de situações não surpreen- buscas e apreensões em gabinetes de
cheiros em 20 dias, em média 775 dem Miguel Sousa Ferro, advogado trabalho (dentro de escritórios ou fá-
por dia) e até pela ausência de um especializado em concorrência, sócio bricas, portanto), também foram usa-
computador. Respostas da AdC: “Se- da Sousa Ferro & Associados. “Infeliz- das para tentar anular as provas que
ria útil que no futuro a AdC passasse mente, a advocacia de defesa em por lá se encontraram – uma empre-
a incluir índices, o que facilita a con- Portugal ainda é feita com argumen- sa de catering alegou que entrar nes-
sulta destes processos (...) Porém, tal tação ad nauseam de tudo o que se tes espaços “privados” devia ser equi-
não é uma exigência legal, pelo que pode agarrar, não interessando que o parado a “intromissão no domicílio”.
da sua ausência não pode advir um argumento seja improcedente”, afir- Mas o que escondem os gabinetes e
vício, nomeadamente de nulidade”; ma. “Entre 60% e 70% do trabalho emails que empresas como a Super
“Quanto à questão da disponibiliza- é lidar com questões processuais e, Bock querem ver retirados de pro-
ção de um computador, que aliás a quando se chega à substância, o juiz cessos de contraordenação milioná-
Autoridade nega que lhe tenha sido já está exausto”, acrescenta. Dois ad- rios? Quinta-feira, 28 de agosto de
solicitado, essa exigência não se con- vogados de defesa das empresas, ou- 2007, 17 horas: “Já estou farto desta
sidera razoável (...).” E acrescenta: a vidos sob anonimato pela SÁBADO, conversa, portanto as regras são as
arguida Eurest “chegou a solicitar e “ENTRE 60% defendem ser legítimo escrutinar a seguintes: ou o distribuidor pratica os
a obter certidão de teor em relação E 70% DO legalidade do processo conduzido por preços que nós indicamos e estamos
a folhas específicas dos autos, que se TRABALHO É quem multa, dados os erros formais a praticar, ou não há mais reposi-
considerariam prima face absoluta- LIDAR COM cometidos pelos reguladores. ções. As deste mês já eram. Lamento,
mente inúteis ou irrelevantes para a QUESTÕES Vários dos recursos levantam pro- mas ando a perder demasiado tempo
defesa, como sejam o teor e conteúdo PROCES- blemas já decididos antes por juízes com estas merdas, ou controlamos
de meros separadores (...).” E os SUAIS”, DIZ O noutros processos, como acontece os distribuidores, ou não vale a pena.
15.500 ficheiros? “Não são uma única ADVOGADO com o argumento de que os emails Todos querem vender, mas as regras
vez citados ou referidos na Nota de MIGUEL SOU- devem ser tratados como correspon- são iguais para todos, sem exceção.”
Ilicitude (...), não constituindo, por SA FERRO dência privada, quase sempre utiliza- No ano seguinte, a 12 de fevereiro:

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do as sanções de que a AdC a acusa –


corte de descontos, de fornecimento
e reposição de stocks, e até cessação
h de contratos. A Super Bock – que
A CGD teve a logo em 2019 disse ter recebido a
multa mais alta notificação com “total perplexidade”
entre as institui-
ções bancárias porque estava “certa” de que não fora

SÉRGIO LEMOS
– 82 milhões cometida “qualquer infração” – ainda
de euros não pagou a multa e apresentou, en-
tretanto, 25 pedidos de nulidade pro-
“Fica hoje definido o preço mínimo significa um dano de 52 euros por cessual na fase de recurso, antes de
para revenda pela rede de distribui- ano e de mais de 730 euros em 14 o Tribunal começar sequer a olhar
ção.” Outro ano ainda depois, em anos. Seis cêntimos seriam 4.380 eu- para a substância do caso.
2009 :“A Unicer vai iniciar uma ação ros. “Os consumidores pagaram efeti-
concertada entre os vários canais de vamente preços mais altos em resul- “Aumentar preços!! Keep going”
distribuição para subir os preços (...) a tado desta prática”, defende a AdC, Quando falamos de concertação de
partir deste momento estão proibidos que em 2019 condenou a Super Bock preços falamos, quase sempre, de
todos e quaisquer negócios com pre- a uma multa de 24 milhões de euros. custos mais altos para quem compra.
ços abaixo dos constantes na tabela Durante mais de 10 anos (entre É também essa a acusação no caso
anexa sob pena de se verificarem 2006 e 2017), diz o regulador, a em- do retalho – que já anunciou que vai
sanções (30 de março); “Não há exce- presa definiu os preços a que os seus recorrer da multa. “É exatamente
ções, a política de preços é da Unicer distribuidores vendiam cervejas, esse o objetivo. Aumentar preços!!
e não podem os distribuidores fazer o águas, cidras, vinhos e refrigerantes Keep going” [continuem], lê-se num
que bem lhes apetece” (12 de outubro a hotéis, restaurantes e cafés. No re- “A POLÍTICA dos emails citados na decisão da
de 2009). Um exemplo? Os distribui- curso, agora no Tribunal da Relação, DE PREÇOS É AdC. Os visados sabiam exatamente
dores terão sido proibidos de vender a Super Bock alega que as tabelas DA UNICER E o que estavam a fazer, acrescenta o
garrafas de Super Bock a menos de 27 de preços eram, apenas, uma “reco- NÃO PODEM regulador: “Para evitar a divulgação
cêntimos, quando havia quem esti- mendação”. E defende-se, dizendo OS DISTRI- deste email sugiro que destruam o
vesse a fazê-lo a 21 cêntimos. A título que “jamais uma certa impetuosida- BUIDORES mesmo (...) devem ter cuidado com
ilustrativo: para alguém que beba de de linguagem da visada originou FAZER O QUE toda a documentação escrita, sejam
uma garrafa por semana, um sobre- um comportamento de facto ‘subse- BEM LHES prints de emails, sejam notas de reu-
custo médio de 1 cêntimo por garrafa quente’”, garantindo não terem existi- APETECE!” niões”, escreveu outro funcionário Q

69
Dinheiro

Q de uma das empresas em causa. EM 90% DOS ser indícios fortes”, acrescenta.
A presidente do regulador, Margari- CASOS, OS Talvez por haver indícios fortes,
da Matos Rosa, garantiu à SÁBADO MULTADOS é raro as decisões serem revertidas.
que “a AdC só investiga indícios im- RECORREM; Ainda assim, vale a pena gastar di-
portantes, significativos”. Numa en- E EM 85% nheiro em bons advogados: “Desde a
trevista, que decorreu em outubro de DAS VEZES, criação do Tribunal da Concorrência,
2019, acrescentou: “Não andamos a A COIMA É Regulação e Supervisão, em 2012,
inventar casos. Também não tería- REDUZIDA cerca de 90% das decisões que apli-
mos recursos para isso, porque somos PELOS cam coima são objeto de recurso de
95. Não somos uma instituição muito TRIBUNAIS impugnação”, explica a AdC à SÁBA-
grande.” No departamento de práti- DO. Em relação “à confirmação da
cas restritivas da concorrência traba- infração, a AdC tem um vencimento
lhavam há um ano “cerca de 30” pes- de 100%. Quanto à coima, em cerca
soas, no de análise de concentrações, de 85% dos processos verifica-se a
20. “Todas estas pessoas estão a tra- redução”. Um exemplo: depois de
balhar imenso”, afirmou. condenada a pagar 9,29 milhões de
Ao contrário de reguladores como euros por práticas anticoncorren-

REUTERS
o Banco de Portugal e CMVM, que ciais, a Galp recorreu e a multa bai-
vão pedindo informações aos regula- xou para 4,09 milhões de euros, me-
dos e são menos invasivos, diz uma nos de metade do valor inicial. Em dução, continuamos a discordar pro-
fonte do setor, as buscas da AdC são causa estava o facto de a gigante do fundamente da aplicação de qual-
em tudo idênticas às do Ministério petróleo proibir a venda passiva (a quer coima. A ANF e as suas partici-
Público. “Quando entram com um pedido dos clientes) de gás engarra- padas estão firmemente convictas de
mandado de busca para tudo, fado fora do território definido para que agiram sempre no estrito cum-
apreendem documentos, emails. Vão os distribuidores, o que limitava a li- primento das leis da concorrência”,
habitualmente acompanhados pela berdade de escolha de consumidores disse, na altura, a ANF.
polícia.” Dentro da AdC, a informa- e restringia a concorrência. Há vários fatores que explicam es-
ção é vasculhada por especialistas tas reduções, diz a AdC: “Ora por en-
numa área chamada eDiscovery, Uma redução de 90% na multa tender que a infração ocorreu a título
onde trabalham os peritos em desco- No mesmo ano, a Associação Nacio- de negligência e não de dolo; ora por
brir provas judiciais em documentos nal de Farmácias conseguiu reduzir entender que o mercado afetado foi
eletrónicos, como emails (a pesquisa duas vezes uma coima por abuso de apenas o nacional e não o europeu;
faz-se por palavra-chave e só assim posição dominante: passou de 10 mi- ora por fazer uma nova ponderação
é possível analisar milhares de docu- lhões para 6,9 milhões em Santarém; dos critérios legais que determinam
mentos em tempo útil). “O prazo in- num novo recurso, no Tribunal da a medida concreta da coima.” Ainda
dicativo são 18 meses para a instru- Relação de Lisboa, a redução foi su- antes de haver o Tribunal de Santa-
ção, mais 12 para concluir a investi- perior a 90% – foi condenada a pa- rém e nova lei da concorrência, em
gação. Estamos a contar com dois gar apenas 815 mil euros. “Apesar do 2012, prescreveu aquela que, na altu-
anos e meio, em média, para os ca- extraordinário significado desta re- ra, foi noticiada como a maior multa
sos. E depois, obviamente, quanto
mais visadas há, mais difícil se torna
gerir”, acrescenta a responsável.
Muitas vezes, estas investigações
partem de informações que chegam
ao regulador. A AdC recebe cerca de
500 denúncias por ano, que são
particularmente importantes nos ca-
sos dos cartéis, “por natureza secre-
tos”, explica Matos Rosa. “É muito di-
fícil haver prova destes cartéis. Não
basta enviar um email e dizer à auto-
ridade que há alguma coisa suspeita, h
têm de nos fornecer algum tipo de Miguel Sousa
prova que nos permita averiguar se Ferro, advogado
de concorrência,
há de facto ali um comportamento aponta que as
potencialmente lesivo da concorrên- empresas litigam
BRUNO COLAÇO

cia. E se quisermos fazer buscas a usando tudo, até


argumentos
entidades precisamos de um man- que sabem ser
dato do Ministério Público. Têm de improcedentes

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j
A multa mais alta
da Concorrência
Os financeiros
– 304 milhões Banco de Portugal, CMVM e
de euros –
foi aplicada ASF esbarram na litigância
a supermercados
e fornecedores A litigância até ao fim da linha
é também um obstáculo nas mul-
tas do setor financeiro. A ASF, que
supervisiona as seguradoras, atri-
bui a cobrança de apenas 32%
das coimas entre 2010 e 2020 à
lei que vigorou até 2015. “Até 2015
prescreveram uma grande quanti-
dade de processos, pois o prazo
de prescrição de uma boa parte
das contraordenações era de ape-
nas dois anos”, explica a ASF, que
junta que “insistiu sempre na ne-
cessidade de alteração da lei”. O
de sempre a uma empresa, a então era qualificado de forma pouco habi- recurso demora em média dois
gigante Portugal Telecom, alvo de tual, sustenta a AdC, com um email anos a ser julgado, a que se junta
uma coima de mais de 53 milhões de 2 de setembro de 2016: “Relativa- mais um ano no Tribunal da Rela-
de euros por abuso de posição domi- mente a questão mafiosa, querem ção e outro no Constitucional.
nante no mercado de banda larga, que leve o nosso colega da [nome No Banco de Portugal, “quanto
esmagando as margens dos concor- cortado]?” A resposta chegou oito mi- mais grave é a contraordenação
rentes. Houve recurso, mas o caso nutos depois: “Tenho muitas dúvidas maior a probabilidade de haver
nem chegou a ser julgado – o prazo que devamos alargar o grupo.” recurso até ao Tribunal Constitu-
de prescrição já tinha passado. Toda esta litigância enfrenta dois cional”, explica um ex-dirigente,
Há, além dos tribunais, outras for- desafios, admitem os advogados. Por sob anonimato. Foi o que fez
mas de reduzir as multas. Uma de- um lado, está a tornar-se mais difícil, Ricardo Salgado, por exemplo.
las é o Programa de Clemência. Em porque o regulador tem reduzido os Recorreu até ao Constitucional na
2018, quando a AdC anunciou um erros formais nos processos. Por ou- primeira multa de 4 milhões de
cartel que envolveu 5 seguradoras e tro, a tolerância dos tribunais para euros, por gestão ruinosa antes
14 administradores, houve pelo me- multas mais altas está a aumentar. da resolução do BES em 2014.
nos uma empresa que não foi mul- Um exemplo? Em 2017, a AdC acu- Saiu dessa via com menos 300
tada – a Unidas. Porquê? Porque foi sou a Sonae e a EDP – que em 2012 mil euros de multa. Os 3,7 mi-
a primeira a denunciar e a apresen- tinham uma parceria que permitia lhões estão por pagar. Salgado
tar provas de que estas instituições aos clientes da EDP beneficiarem de recorreu das restantes multas.
combinavam os preços de seguros um crédito de 10% sobre a fatura da Na CMVM, um caso recente é o
que propunham a grandes empre- luz, que depois passava para um car- da multa à Pharol (a antiga PT) e
sas, beneficiando, por isso, de isen- tão de fidelidade nos supermercados aos gestores Henrique Granadeiro,
ção total da coima. Todas as outras Continente – de terem acordado não Zeinal Bava e Pacheco de Melo, por
empresas que, depois da primeira, competir durante dois anos nos res- causa do investimento da tesouraria
abdiquem da litigância judicial e petivos mercados. O acordo, segun- da PT na Rioforte. A multa de 3,5
paguem a multa no momento, be- do a AdC, visava sobretudo vincular milhões à saída da CMVM passou a
neficiam também de uma redução a Sonae “a não concorrer na comer- 2,2 milhões após o primeiro recurso
da multa. “No total, só cerca de 28% cialização de energia elétrica”, numa para Santarém. A juíza considerou
a 30% das nossas investigações têm fase de liberalização do setor. As as infrações graves, mas também
origem na clemência”, diz Margari- empresas recorreram da multa de que os recorrentes não agiram com
da Matos Rosa. 38,3 milhões de euros – 28,7 milhões A ASSOCIA- dolo e que as suas ações não gera-
No caso das seguradoras, que levou para a EDP e 9,6 milhões para a So- ÇÃO NACIO- ram “danos, prejuízos ou conse-
a uma multa de 54 milhões de euros, nae – e o TCRS reduziu-a em 10%. NAL DE FAR- quências”. Suspendeu a multa à
a AdC apurou que foram “agendadas Apesar da redução, a manutenção de MÁCIAS CON- Pharol por três anos e cortou nas
reuniões, almoços e pequenos-al- uma multa tão elevada é vista como SEGUIU RE- dos gestores; no caso de Bava
moços com a participação dos repre- um sinal da melhoria do regulador DUZIR UMA quase para metade.
sentantes de algumas das empresas na instrução dos processos – e, COIMA DE 10
envolvidas no acordo, desde, pelo sobretudo, do maior à-vontade MILHÕES
menos, 2009 até setembro de 2017. dos juízes em deixar passar multas PARA 815 MIL
Entre as próprias seguradoras, o tema mais avultadas. W EUROS

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Sociedade

COVID-19. HÁ 65 SURTOS EM ESTABELECIMENTOS DE ENSINO

NAS ESCOLAS
“NÃO HÁ
BOAS OPÇÕES”
Para travar contágios e diminuir o número de casos há
especialistas que defendem o encerramento. Mas muitos têm
medo do agravamento das desigualdades sociais e do impacto
na saúde mental das crianças. Por Sónia Bento e Vanda Marques

P
ortugal tinha, na última h ção de saúde pública não vê outra
sexta-feira, dia 8, 65 surtos Medir a tempera- solução. “Viver no medo e na an-
tura antes de en-
ativos em estabelecimentos trar na escola é o gústia de se poder apanhar a doença
de ensino (creches, escolas, novo normal. Diri- não é bom. Em tempos de guerra,
ensino superior), com um total de gentes escolares não se limpam armas. No confina-
defendem que
450 casos confirmados, segundo 1.º período mento, os técnicos da nossa escola
dados da Direção-Geral da Saúde. correu bem apoiaram as crianças via telefone,
Números bastante inferiores aos de mantiveram-se os contactos entre a
22 de dezembro, em que se regista- assistente social e as famílias e as
vam 72 surtos ativos, com um total refeições continuaram a ser dadas.
de 673 casos confirmados. Depois Madeira As desigualdades existem, mas a es-
da reunião com os especialistas do Governo Regio- cola nunca se fechou e a parte social
Infarmed, na terça-feira, 12, o pri- nal vai encerrar está garantida.” Célia Almeida reve-
meiro-ministro revelou que a ques- as escolas e la ainda que já estão a receber equi-
tão das escolas foi “um grande tema apenas as cre- pamentos eletrónicos. “Como fize-
de divergência entre os diferentes ches, primeiro mos a nossa própria reserva, com
especialistas”. Conheças as opiniões e segundo ciclo parcerias, temos computadores
divergentes sobre as vantagens e as têm aulas para dar.”
desvantagens de encerrar as escolas presenciais Da mesma opinião é Paulo Almei-
durante o confinamento. da, diretor do agrupamento de es-
colas Fernando Casimiro, em Rio
PORQUE Maior. “Em primeiro lugar está a
DEVEM FECHAR “EM saúde pública e neste momento,
A professora Célia Almeida não tem PRIMEIRO dado o elevado número de casos,
dúvidas: “Se colocarmos na balança LUGAR ESTÁ não seria má opção repensar o ensi-
a vida humana ou a escola, não vale A SAÚDE no não presencial durante duas ou
a pena fingir: deve-se fechar.” A di- PÚBLICA”, três semanas nem que isso nos cus-
retora do Agrupamento Escolar Pe- DIZ O tasse uma interrupção das férias da
PAULO CALADO

dro Eanes Lobato, na Amora, reco- DIRETOR Páscoa”, diz à SÁBADO. “Estamos
nhece que o impacto de um confi- PAULO numa fase em que já há muitos pro-
namento é grande, mas face à situa- ALMEIDA fessores de quarentena e infetados,

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que deixam os alunos sem aulas e


isso para a gestão da escola é pro-
blemático por falta de recursos”, ex-
plica o professor.
A questão das escolas é complexa,
defendem os especialistas, mas a
grande vantagem que apontam é
conter o número de infeções. Um
estudo da revista Nature, publicado
em outubro de 2020, dava conta de
que as crianças mais velhas trans-
mitem mais vírus do que as mais
novas. Já outro estudo, do US Cen-
ters for Disease Control and Preven-
tion, indiciava que tanto crianças
como adultos transmitem a mesma
quantidade de vírus. Durante a reu-
nião entre o Governo e o Infarmed,
Baltazar Nunes, epidemiologista do
Instituto Ricardo Jorge sublinhou
que “quanto maior for o confina-
mento, maior será a redução da
transmissão”. Daí a importância de
se fechar as escolas.
O matemático e professor do Insti-
tuto Superior Técnico, Henrique Oli-
veira, aponta que as vantagens são
claras. “Evita contactos assintomáti-
cos entre crianças e jovens que
desenvolveram o vírus de forma
assintomática e estão a contagiar Q

73
Sociedade

Q colegas, professores, mas sobretu- g


do levando os contágios de agregado ugue, id tempus
dolor. Etiam orci
para agregado familiar, sempre de magna, euismod
forma silenciosa.” E vai mais longe: eget tempus sed,
“O reacender da pandemia em se- congue id mau-
ris. Nunc gravida
tembro deu-se de forma silenciosa sem
com o fim das férias e o reabrir das
aulas. Esses efeitos não estão estuda-
dos, mas é uma hipótese fortíssima
de trabalho. Isso e o regresso de jo-
PEDRO CATARINO

vens adultos de férias, assintomáti-


cos, que depois transmitiram a
doença aos familiares mais velhos,
nos transportes, lares, ginásios, na
prática de desporto amador em pa- g não tenha a eficácia desejada.” Da ce nos alunos do secundário, em que
vilhões fechados e nas escolas. Aca- Filinto Lima, pre- mesma opinião é o virologista Pedro há mais casos de contágio e maior
sidente da Asso-
bando com funcionários dos lares e ciação Nacional Simas: um confinamento em pleno autonomia. E admito que seja em
visitas a transmitirem aos idosos dos de Diretores de é o mais eficaz. “As escolas são uma funcionamento de redução de alunos
lares e aos familiares mais idosos.” Agrupamentos e fonte de contaminação porque a nas turmas com um sistema misto,
Escolas Públicas,
Um confinamento de três semanas diz que “o pri- maior parte das crianças são assinto- para ir rodando. Uns ficam uns tem-
e apenas dos alunos mais velhos traz meiro período foi máticas.” pos em casa a ter aulas à distância e a
vantagens, como indica o médico de um sucesso” outra metade tem aulas presenciais”.
Saúde Pública e epidemiologista, Ri- PORQUE DEVEM Mário Nogueira refere ainda que “se
cardo Mexia. “A questão das escolas CONTINUAR ABERTAS tudo fechar e os professores se man-
é complexa. Dentro dos muros das O encerramento das escolas será a tiverem a trabalhar com os alunos de
escolas, onde há distanciamento e última medida a tomar pelo Gover- forma presencial, faz sentido que a
regras, não houve grandes surtos. A
questão que se coloca é mais o que
se passa fora dos muros das escolas.”
12
anos
no, por não serem locais privilegia-
dos de contágios e existem investi-
gações que o comprovam. Um estu-
vacinação tenha esta classe entre os
grupos prioritários”.
Filinto Lima, presidente da Asso-
O médico aponta que as deslocações “Os especialis- do feito pela Direção de Saúde da ciação Nacional de Diretores de
dos alunos mais velhos são contac- tas foram con- Islândia e da deCODE, uma empresa Agrupamentos e Escolas Públicas,
tos que numa época como a que vi- vergentes em de genética humana, envolveu 40 considera que para o encerramento
vemos têm de ser reduzidos. “Os que, até aos 12 mil pessoas e descobriu que as das escolas, os técnicos têm de ter
alunos mais velhos, que não preci- anos, nada justi- crianças com menos de 15 anos ti- em conta uma série de critérios:
sam que os pais fiquem em casa com fica o encerra- nham cerca de metade da probabili- “Neste primeiro período, as escolas
eles, se ficarem em confinamento mento das es- dade dos adultos de serem infetadas, estiveram à altura da pandemia em
vão ter um papel importante na re- colas”, disse An- e apenas metade da probabilidade que as regras e os funcionamentos
dução de casos, porque estamos tónio Costa dos adultos de transmitirem o vírus foram cumpridos. Foi um sucesso.”
numa situação muito difícil. Com 10 após a reunião a outras pessoas. Diz que todos preferem o ensino
mil casos diários, não é uma situação com o Infarmed Rodrigo Queiroz e Melo, diretor presencial, mas se não houver outra
para se achar que as coisas se resol- executivo da Associação de Estabele-
vem por si.” cimentos de Ensino Particular e Coo-
Leonor Faden, aluna do 11º ano perativo, explica que o balanço do
numa escola em Lisboa, compreen- primeiro período foi muito positivo e
de que se feche a escola por algumas que as escolas demonstraram ser
semanas. “Acho que se suspendes- bastante seguras: “O que aconteceu
sem as aulas agora talvez ajudasse nas escolas é que houve casos em
no controlo da pandemia, porque isolamento por transmissão fora do
haveria menor circulação de pessoas “O REACEN- espaço escolar – a criança apanhou
nos transportes públicos, já que o DER DA PAN- em família e foi detetado. Não temos
problema não é tanto nas salas de DEMIA EM notícia de se terem contagiado em
aula”, diz à SÁBADO. O médico João SETEMBRO ambiente escolar.” Para o
Júlio Cerqueira alerta que não há ne- DEU-SE DE secretário-geral da Fenprof, Mário
nhum vírus que não se propague ex- FORMA SI- Nogueira, “o encerramento das esco-
clusivamente pelos adultos, poupan- LENCIOSA las terá consequências terríveis”. O
do as crianças e reconhece que é COM O FIM dirigente sindical diz que esteve com
PAULO CALADO

uma decisão difícil. “Mais uma vez, DAS FÉRIAS E epidemiologistas que apontam quase
não há boas opções. Mas temo que O REABRIR todos para a necessidade de encerrar,
sem fechar as escolas, um lockdown DAS AULAS” “mas, a acontecer isso, que se come-

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g precisam de conviver com os pares.”


Noutros países... ugue, id tempus
dolor. Etiam orci
Mesmo estando em constante co-
Medidas consoante magna, euismod municação com os colegas, através
a situação pandémica eget tempus sed, das videochamadas, isso para a psi-
congue id mau- cóloga “não é a mesma coisa”.
ris. Nunc gravida
Reino Unido sem Outro problema que Laura Sanches
Ensino à distância refere é o aumento dos casos de
REUTERS

Escolas e universidades estarão maus-tratos: “Num hospital britânico,


neste regime pelo menos até um especialista revelava que os maus
meados de fevereiro das as regras.” Para Manuel Pereira, g tratos a crianças dispararam 1.500%
outra vantagem das aulas presenciais A psicóloga durante o confinamento. Tive mães
Laura Sanches
Alemanha é não acentuar as desigualdades so- nota angústia desesperadas que me confessaram
Sem aulas presenciais ciais: “É incontornável que nem todos nos adolescentes que bateram nos filhos pela primeira
As escolas continuam fechadas têm Internet nem equipamentos e há e teme o aumen- vez, quando precisavam de trabalhar
to da violência
desde que foi decretado pais sem capacidade para acompa- e perdiam a paciência com os miú-
o segundo confinamento, nhar os filhos. Apesar de os computa- dos.” A psicóloga nota angústia nos
a 16 de dezembro dores do secundário terem sido distri- adolescentes e defende que isso é
buídos, os do ensino básico estão em muito mau, pois uma das caracterís-
França processo. E a banda larga ainda não ticas naturais desta fase é negligen-
Escolas abertas chega a todos.” ciar os riscos, acharem que são imor-
As aulas recomeçaram no pas- Jorge Ascenção, presidente da tais. Para Laura Sanches “há muito
sado dia 4 e o ministro da Edu- Confederação Nacional das Associa- mais desvantagens em fechar as es-
cação disse que o encerramen- ções de Pais, não vê nenhuma van- colas, porque as crianças aprendem
to não se justifica tagem em encerrar as escolas, já que através da relação e não dos ecrãs,
estas “demonstraram que têm capa- aliás o excesso de ecrãs na adoles-
cidade para funcionar em segurança. cência está correlacionado com um
Além de que o agravamento da pan- 110.388 aumento das tentativas de suicídio”.
solução que não seja fechar as esco- demia deu-se num período em que casos ativos de O ex-secretário de Estado Adjunto
las também concorda que “devem as escolas estavam fechadas, portan- Covid-19, em da Educação, Jorge Pedreira, defende
ser os mais velhos a ficar em casa”. to não há uma razão objetiva para as Portugal, no dia que o ensino à distância está longe
Manuel Pereira, presidente da Asso- fechar”. Entende que o ensino à dis- 12 de janeiro. de ser o ideal. “O desejável é que as
ciação Nacional de Dirigentes Escola- tância é muito desigual, não só na Desses casos, escolas funcionem presencialmente
res, defende que continuam a existir falta de recursos mas no que é o diá- mais de 66 mil e, tanto quanto sabemos, estas não
condições para as escolas permane- logo, o contacto e a aprendizagem. são de meno- têm sido lugares de propagação da
cerem de portas abertas. “As escolas “Fiquei muito satisfeito por os sindi- res de 19 anos pandemia. Não quer dizer que não
organizaram-se muitíssimo bem no catos dos professores terem concor- haja casos, mas não há grandes sur-
primeiro período, com os planos de dado com a continuação das aulas tos. A vontade do Governo é tomar a
contingência para dar resposta, por presenciais.” Jorge Ascenção aponta decisão de fechar as escolas apenas
isso há condições para continuar a outro problema: a falta de socializa- em última instância e é de facto o
trabalhar, desde que se cumpram to- ção e o impacto que isso terá na saú- mais sensato”, diz à SÁBADO. O pro-
de mental. “Os jovens querem e pre- fessor universitário lembra que a
cisam de estar na escola e, de um suspensão das aulas terá consequên-
modo geral, têm tido responsabilida- cias graves para os pais com crianças
de no cumprimento das regras. Mas pequenas, com atividades que não
se as escolas tiverem mesmo de fe- permitem teletrabalho e que têm de
char, que se comece pelo ensino se- tomar conta delas. Jorge Pedreira –
cundário, com a possibilidade de ir “SE TUDO FE- pai de quatro filhos, três em idade
à escola tirar dúvidas e estar com os CHAR E OS escolar – também considera que se
colegas em segurança”, concluiu. PROFESSO- houver fecho das escolas e diferen-
A ausência de socialização tem RES SE MAN- ciação no interior dos graus de ensi-
sido o maior problema para os ado- TIVEREM A no, deverá ser para os alunos do se-
lescentes, afirma a psicóloga Laura TRABALHAR, cundário e do superior, se não for
Sanches, que por isso vê com “maus FAZ SENTIDO por muito tempo. “Compreenderia
j olhos” a possibilidade do encerra- QUE A VACI- que o Governo tomasse essa medida
Os médicos de Saúde
Pública alertam que o mento das escolas. “Será péssimo NAÇÃO TE- se os epidemiologistas entenderem
maior perigo é o que para as crianças. Sinto que, sobretu- NHA ESTA que é essencial para travar a pande-
se passa nas desloca- do os adolescentes têm sido os mais CLASSE EN- mia. Fora isso é de evitar.” W
ções até às escolas e
não nas salas de aula prejudicados com a pandemia por- TRE OS PRIO-
que estão numa fase da vida em que RITÁRIOS” Com Diogo Barreto

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Sociedade

COVID-19. ESPECIALISTAS PREVEEM QUE ESTA SEMANA OS CASOS DUPLIQUEM

VEM AÍ A PIOR VAGA


DA PANDEMIA
O frio ajuda a propagar o vírus, a nova variante precisa de menos tempo e de
menor proximidade para se transmitir e no Natal usaram-se menos máscaras.
Vamos demorar no mínimo sete semanas a voltar aos números que tínhamos.
Oito especialistas explicam o que se passa e o que fizemos mal. Por Vanda Marques

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O
abrandamento das restri- queira, autor do blogue científico j que já tomaram a vacina, que são
ções no Natal – numa al- que caça mitos, Scimed, sublinha Falámos com cerca de 74 mil [profissionais de saú-
matemáticos,
tura em que rondávamos ainda outro aspeto. “As pessoas ten- investigadores, de, pessoas com mais de 50 anos e
os 3 mil casos – seria sem- dem a concentrar-se mais em espa- médicos e patologias graves associadas, resi-
pre um presente envenenado. Mas ços fechados e mal ventilados. Isso virologistas para dentes e profissionais em lares e em
compreender a
desconhecia-se o real impacto de facilita a propagação de doenças nova vaga unidades de cuidados continuados,
um 24 e um 25 de dezembro pareci- respiratórias. Não é algo que seja profissionais das forças armadas,
dos com os de 2019. “A mobilidade único deste vírus. Assistimos a isto forças de segurança] apenas recebe-
foi alterada e o uso da máscara des- com praticamente todas as doenças ram a primeira toma. Será suficien-
ceu (dados do Barómetro Covid-19), respiratórias.” te? “As pessoas começam a produzir
portanto todos fomos um pouco anticorpos passadas duas semanas
mais permissivos, o que no global re- As novas variantes da de estarem vacinados. Portanto, a
sulta num aumento de casos”, expli-
ca à SÁBADO Carla Nunes, diretora
2 Covid-19 – como a do Reino
Unido e a da África do Sul –
partir dessa altura já terão alguma
proteção contra o vírus. No entanto,
da Escola Nacional de Saúde Pública. influenciam o número de casos? só alguns dias após a segunda dose
O investigador Miguel Prudêncio re- Ainda não se conhece o real impacto podemos garantir uma proteção que
força que ninguém duvidava de que da variante do Reino Unido, que já nos deixa relativamente descansa-
o abrandamento ia ter um preço. foi detetada em Portugal – até agora dos. Sem esquecer que as vacinas
“Mas não se pensou que fosse tão conhecem-se cerca de 34 casos – apenas protegem 95% das pessoas.
alto.” Henrique Oliveira concorda. mas sabe-se que é mais contagiosa. Segunda O que significa que continuarão a
Este crescimento não foi inesperado, Miguel Prudêncio, investigador do toma poderia existir casos de doença”, defende
mas excedeu “um pouco as nossas Instituto de Medicina Molecular, diz ser usada para João Júlio Cerqueira. As duas vacinas
previsões mais pessimistas”. De que não se conhecem os dados da vacinar mais aprovadas na União Europeia – a da
acordo com números do Instituto prevalência desta variante em Portu- pessoas, diz o Pfizer e da Moderna – só oferecem
Superior Técnico, “a abertura do gal para se lhe atribuir o aumento de virologista do imunidade ao fim de duas doses.
Natal pode provocar mais de 2.500 novos casos. Então o que representa Instituto de Me-
mortos se considerarmos que os esta variante? “Os vírus vão sofrendo dicina Molecu- Esta terceira vaga vai ser
efeitos se prolongam por janeiro,
fevereiro e março”.
mutações naturais. Esta variante é
mais infecciosa, quer dizer que as
lar, Pedro Simas 4 mais difícil de controlar?
Há vários especialistas que defen-
O risco pandémico nunca foi tão mutações do vírus o tornaram mais O cientista dem que ainda não saímos da segun-
alto, admite o virologista Pedro Si- capaz de invadir as células do hos- apela: “Não se da vaga, mas outros apontam para
mas. E não há como fugir ao confi- pedeiro ou de se multiplicar nas cé- viola o protocolo uma terceira. Carlos Manuel Antunes,
namento. O que a história desta pan- lulas; logo, tem vantagens competiti- da Pfizer se se va- professor e investigador da Faculda-
demia nos diz é que “quando chega- vas.” Ou seja, a variante do Reino cinar até 42 dias de de Ciências da Universidade de
ISTOCKPHOTO

mos a este nível de infetados por dia Unido “precisa de menos tempo e de depois da primei- Lisboa, defende que estamos “defini-
[10 mil], é muito difícil controlar a menor proximidade para se transmi- ra toma, por isso tivamente” numa terceira vaga e que
tendência crescente das infeções”. tir”. Algo a sublinhar é que esta va- não guardem a esta tem “características próprias,
Existem ainda mais motivos para riante não causa doença mais grave, segunda dose, maior amplitude (muito maior nú-
esta terceira vaga ser preocupante. nem provoca um agravamento de vacinem mais mero de casos por dia) e maior taxa
Temos os hospitais em risco de rutu- sintomas. Além disso, a vacina é pessoas com de aumento diário de casos, com
ra, os profissionais de saúde exaustos igualmente eficaz. uma toma, que crescimento exponencial de elevado
e novas variantes da Covid. Falámos Já sobre a variante da África do Sul, já é protetora” grau. Mais semelhante à dinâmica da
com oito especialistas para fazermos que também é mais contagiosa, co- primeira vaga de março, mas com
um retrato desta vaga. nhecem-se menos detalhes. O médi- uma incidência diária de novos ca-
co João Júlio Cerqueira adverte que sos, 15 a 20 vezes superior”.
O frio pode contribuir para se supõe “que seja mais problemáti- O especialista revela até que a pan-
1 piorar a pandemia?
A resposta é simples: sim. Bernardo
ca para as faixas etárias mais jovens
mas isso ainda está por determinar.
demia está descontrolada e vamos
demorar sete semanas até chegar
Gomes, médico de Saúde Pública da Também há maior probabilidade de aos números que tínhamos na vés-
Administração Regional de Saúde a variante de África do Sul não res- A PANDEMIA pera do Natal. “Em março-abril levá-
do Norte, alerta que o frio otimiza ponder tão bem à vacina. Teremos ESTÁ DES- mos três semanas para reduzir de
a transmissão de vírus respiratórios. que aguardar para ver”. CONTROLA- 800 para 400 casos. Agora se atin-
De que forma? “O ar mais seco ajuda DA E VAMOS girmos, por hipótese, 14 mil casos
o vírus a progredir no espaço porque A vacina já está a proteger DEMORAR 7 daqui a uma semana e depois come-
não tem obstrução de partículas, ou
seja, ajuda na preservação e na via-
3 a população?
A imunidade de grupo só se atinge
SEMANAS A
CHEGAR AOS
çarmos a diminuir, com as mesmas
medidas de março levaremos três
gem das partículas do vírus.” Por quando tivermos 70% da população NÚMEROS DE semanas para reduzir a 7 mil casos e
isso, é um fator que favorece a trans- imunizada. Aliás, ainda nem todos os ANTES DO depois mais três para reduzir a 3.500
missão. O médico João Júlio Cer- grupos de risco estão protegidos. Os NATAL casos por dia. Ou seja, sete sema- Q

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capacidade do SNS foi ultrapassada


há muitos dias, já que estamos a
adiar consultas de doentes e cirur-
gias. Se deixo de tratar os doentes
habituais e passo a mobilizar recur-
sos humanos de outras áreas para a
Medicina Interna, se começo a dei-
xar doentes para trás, quer dizer que
ultrapassámos uma linha”, acrescen-
ta o bastonário da Ordem dos Médi-
cos (OM), Miguel Guimarães.

Os hospitais estão à beira


8 do colapso?
Quando a pandemia começou, em
março, o grande receio era ter um
sistema nacional de saúde à beira

ISTOCKPHOTO
do colapso ou sob grande stress. A
análise de Carlos Manuel Antunes
indica um cenário preocupante.
“Com os atuais 10 mil novos infeta-
Q nas no total para voltar ao nível g tos muito alto. Não é uma percenta- dos que estimamos, caminhamos
das vésperas de Natal, de 3.500 ca- Segundo o gem fixa, pois depende das caracte- para que nos próximos dias possa-
barómetro
sos. Terão de ser sete semanas aper- Covid-19, rísticas dos doentes, nomeadamente mos atingir os 5 mil internamentos.”
tadas, sem desvios, sem abusos, e durante o Natal da idade e doenças prévias específi- O matemático acrescenta mais de-
sem esquemas de furar medidas. E utilizaram-se cas. Por outro lado, esta relação dire- talhes: “Duplicar de 10 mil para 20
menos máscaras
isso, dada a incerteza, é uma mera ta só não existiria se conseguíssemos mil [infetados] corresponderia, gros-
hipótese, poderá ser melhor que isso, proteger os mais vulneráveis do risco so modo, a duplicar os internamen-
mas também poderá ser pior.” acrescido – os mais idosos e/ou com tos, UCI e óbitos. E esse nível já o
É que há um dado que nos dificulta doenças. Por isso, estes números são SNS, juntamente com todos os siste-
a vida: não é de rápida resolução, resultado de um maior número de mas complementares, não consegue
mesmo com um confinamento. casos, sem se ter conseguido proteger suportar. Porque leva rapidamente
Henrique Oliveira, matemático e
professor no Instituto Superior Téc-
nico, explica melhor: “Os crescimen-
8.080
mortos
os grupos mais frágeis.”

Que números podemos ter


ao esgotamento das camas ainda
disponíveis ao nível nacional, só
com Covid.”
tos são sempre mais explosivos que
os decrescimentos, não ocorrem ao
em Portugal
por Covid-19
6 nas próximas semanas?
Carlos Manuel Antunes revela que na
Miguel Guimarães alerta para a im-
portância da gestão de crise entre
mesmo ritmo. Esse dado muito pou- desde que a próxima semana “poderemos ter en- hospitais para evitar que a situação
co divulgado é esmagador, bastam pandemia tre 630 e 650 camas de UCI ocupa- piore. Foi o que vimos quando doen-
sete dias de abertura para termos começou. das com doentes Covid. Já daqui a tes com Covid-19 foram transferidos
este número de casos a crescer, mas No mundo, duas semanas é muito mais difícil de para o Algarve e para a Covilhã.
será necessário esperar até início de são quase 2 prever, mas se chegarmos às 800 “Aproximamo-nos de uma situação
março para recuperar da crise pro- milhões não me surpreenderá.” Quanto ao em que teremos de escolher os
vocada pelo Natal. Neste tipo de sis- número de mortos: “Na próxima se- doentes a tratar. Isso acontece quan-
tema dinâmico o mais pequeno erro mana poderemos estar entre os 120 do a pressão é grande nos interna-
paga-se muito caro e muito depressa e os 130 óbitos.” Mas pior é a análise mentos e nos Cuidados Intensivos.
e as consequências arrastam-se no que revela com base na taxa média Não sei se não chegámos já a isso
tempo.” de crescimento de casos. “A dia 10 em alguns hospitais.” O bastonário
de janeiro é de 9%/dia. O que implica da OM alerta ainda para o estado de
Porque é que temos tantos que daqui a 8 dias possamos ter 20 exaustão dos profissionais de saúde
5 mortos?
A diretora da Escola Nacional de Saú-
“HAVERÁ UM
AUMENTO
mil casos diários.” e médicos, em particular. Há casos
de burnout e muitos profissionais a
de Pública, da Universidade Nova de DE MORTA- E os doentes não Covid-19, quem não foi permitido tirar férias.
Lisboa, coordenadora do Barómetro
que analisa todas as vertentes da
LIDADE QUE
PODERÁ
7 o que lhes acontece?
O matemático Henrique Oliveira re-
“É preocupante ter pessoas a traba-
lhar que não estão bem. Podem co-
pandemia, Carla Nunes aponta duas IR DE 40% vela que o excesso de mortalidade meter erros”, diz. E termina refor-
razões. “Por um lado, porque existe A 80%”, DIZ devido a outras causas aumentará. çando que é urgente apostar em
um número de casos muito elevado e HENRIQUE “Haverá um aumento de mortalida- recursos humanos. “Temos falta de
isso reflete-se num número de mor- OLIVEIRA de que poderá ir de 40% a 80%.” A capital humano.” W

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CIÊNCIA. O OUTRO COMBATE À PANDEMIA

C
oelhos, visons, gatos e outros os animais de companhia não re-

UMA VACINA
animais domésticos. A próxi- presentam um risco. “Os casos re-
ma vacina pode ser para eles. gistados foram muito pontuais, de
A Rússia está perto de completar os transmissão de humanos para o

COVID PARA
testes clínicos de uma nova vacina animal, e os animais não desenvol-
que tem como alvo os animais do- veram a doença”, diz. Em Portugal
mésticos e os visons. Nos Estados não há casos conhecidos, acres-

O SEU GATO?
Unidos, os primeiros a serem testa- centa. “A doença não está instalada
dos serão os gatos – prevê-se que a entre os animais de estimação”,
primeira vacina esteja disponível defende. Porém, apesar de o nú-
ainda este ano, em duas doses; os mero de casos ser reduzido e de os
ensaios clínicos decorrem em Nova Pode ser o próximo passo. A Rússia está quase sintomas serem moderados ou ine-
Iorque. Apesar de ainda não haver a acabar os ensaios clínicos em animais xistentes, também há uma vacina
consenso entre os especialistas sobre no horizonte. A Applied DNA
domésticos, os EUA querem testar 30 felinos. Sciences, empresa norte-america-
a necessidade de uma vacina para os
animais, a Organização Mundial de Por José Pessoa Couceiro na fabricante de testes de diagnós-
Saúde (OMS) já manifestou a tico, já indicou que vai iniciar tes-
sua preocupação sobre a tes clínicos para uma vacina a ser
transmissão do vírus entre j usada na prevenção de infeções do
animais e humanos. Ad- Gatos novo coronavírus em gatos domés-
mite, também, que há a Nos Estados Unidos ticos. O estudo pretende testar cer-
possibilidade de haver houve 54 gatos ca de 30 gatos saudáveis e estudá-
transmissão de visons diagnosticados com -los durante seis meses, para veri-
para gatos. Em no- Covid-19 – todos com ficar se desenvolvem resposta
vembro, a Dinamarca sintomas ligeiros imunitária ao vírus.
ordenou o abate de 17
milhões de visons após Grandes símios
concluir que uma estirpe partilham 96%
do vírus tinha sofrido mu- h do nosso ADN
tações e estava a propagar- Coelhos h Chimpanzés e ou-
-se para os humanos. Também podem tros grandes símios,
apanhar o vírus, como orangotangos
Os visons também morrem tal como os cães – e gorilas, têm ten-
e ficam muito doentes já há casos dência a ser suscetí-
h Que se saiba, o vison é o único veis a vírus e outras
animal a ficar gravemente doente infeções que afetam os
e a morrer com o novo coronaví- humanos (partilham pelo
rus. É também o único a ter sido menos 96% do nosso ADN).
infetado por humanos e a voltar a Por outro lado, o facto de terem
infetar humanos. Só na Dina- uma grande necessidade de com-
marca, mais de 200 pessoas fo- j portamentos sociais – vivem em
ram registadas como tendo di- Visons grupos familiares próximos –,
versas variantes do vírus com A taxa de mor- também pode ser um fator de ris-
mutações originárias nos visons. talidade por co. Antes de começar a fase três de
Também EUA, Holanda, França, Covid-19 aproxi- testes, a vacina da Moderna utili-
Espanha, Itália, Suécia, Canadá, ma-se dos 5% zou macacos-rhesus, primatas que
Grécia e Lituânia reportaram infe- foram infetados e posteriormente
ções em visons. Tal como os hu- vacinados. Estes animais tiveram
manos numa cidade, os visons vi- uma reação positiva, ficando com
vem em áreas sobrelotadas, o que menor capacidade de contágio e
facilita a transmissão do vírus. Es- SÓ NA DINA- uma resposta imunitária mais for-
tão, além disso, em permanente Vacina vai ser testada MARCA 200 te. A sua importância é tal que em
contacto com humanos. Ainda não em 30 gatos saudáveis PESSOAS setembro de 2020 foi noticiado
há propriamente um medicamen- h Jorge Cid, médico veterinário e FORAM CON- haver uma escassez de macacos-
to, mas o Departamento de Agri- Presidente da APMVEAC (Associa- TAGIADAS -rhesus. Pelo menos face à procu-
cultura americano abriu concursos ção Portuguesa de Médicos Veteri- POR MUTA- ra por parte de laboratórios para
para empresas farmacêuticas vete- nários Especialistas em Animais de ÇÕES COM testes clínicos.W
rinárias poderem estudar vacinas Companhia) revela que, para já, a ORIGEM NOS
para visons. informação que existe mostra que VISONS Editado por Ana Taborda

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HISTÓRIA. VENDERAM-SE MAIS DE 3 MIL MILHÕES DE EMBALAGENS


berta pelo filho do fundador – Joseph

DA LIMPEZA ÀS McVicker, que tomou conta da em-


presa após a morte do pai –, mudaria
o destino da empresa, da plasticina e

BRINCADEIRAS
de milhões de crianças.

McVicker Um Natal diferente


Depois de ven- No Natal de 1954, Kay Zufall, cunha-
Quando os americanos passaram a usar menos carvão der a empresa, da de McVicker, e educadora de in-
Joe reformou- fância, procurava um material barato
para aquecer as casas, a plasticina ganhou terreno entre
-se, milionário, para fazer decorações de Natal com
as crianças. E ganhou também cor e um aroma diferente: e tornou-se pa- os seus alunos. Por mero acaso leu
em vez de detergentes, amêndoa. Por José Pessoa Couceiro dre, ingressan- um artigo que referia a possibilidade
do na Faculda- de utilizar o produto da empresa Ku-
de em Harvard tol e decidiu ir à procura da plastici-
na. Não foi fácil: nessa altura, com as

C
omo é que se aqueciam as ca- vendas em queda, tornara-se já um
sas nos anos 30? Não havia bem escasso. Acabou por a conseguir
muitas alternativas além do comprar e decidiu testar os seus alu-
carvão. Problema: nessa altura, o pa-
pel de parede (do antigo, daquele que
só se podia limpar a seco) estava na
300
vezes
nos. Resultado? Foi um sucesso entre
as crianças. Estenderam-na, usaram
moldes de bolachas para fazerem
moda e a fuligem teimava em entra- Se pegássemos formas, que Kay secou no forno, pre-
nhar-se na decoração. Foi para resol- em toda a plasti- parando assim enfeites de Natal. Ad-
ver este problema – uma questão de i cina já feita e fi- mirada com os resultados, mostrou-
limpeza, portanto – que a plasticina Sal zéssemos uma -os ao cunhado, chegando até a su-
foi inventada. Na versão inicial, cria- Ao longo dos cobra, esta daria gerir um nome: Play-Doh.
da pela empresa americana Ku- anos, a plasticina a volta ao plane- O passo seguinte foi dado por McVi-
sofreu algumas
tol, bastava passá-la pelas pare- mudanças, sendo ta 300 vezes, cker, que removeu detergentes, adi-
des para que a sujidade saísse. que a certa altura diz a Hasbro cionou corantes e substituiu o cheiro
Mas, tal como muitas outras in- a quantidade de de solvente por um aroma ténue a
venções, também a plasticina pare- sal foi reduzida amêndoa. Surgia assim aquele que
cia estar condenada a não resistir a para que não viria a ser um marco da infância de
secasse tão
outras inovações. Neste caso a rapidamente muitas pessoas. A plasticina começou
duas: formas de aquecimento mais NO INÍCIO AS por ser distribuída pelas escolas da
limpas, como o gás natural, LATAS ERAM zona de Cincinnati, no estado de
o óleo e a eletricida- GRANDES E Ohio, onde a empresa estava sediada.
de, que levaram à di- VENDIAM-SE No início, as latas eram grandes, para
minuição do uso de EM ESCOLAS fornecer escolas – ninguém na em-
carvão; e um novo pa- – NINGUÉM presa acreditava que as pessoas fos-
pel de parede, que se ACREDITAVA sem comprar plasticina às lojas. Mas
podia limpar com água QUE FOSSEM foram: de acordo com a revista For-
e sabão. Só uma utilida- ÀS LOJAS tune, a marca Play-Doh já vendeu
de inesperada, desco- COMPRÁ-LAS mais de 3 mil milhões de unidades
desde a sua estreia como brinquedo
para crianças, em 1956.
Nessa altura, a criação da nova
empresa também não demorou – o
processo de fabrico e as máquinas
utilizadas eram as mesmas. Original-
mente, a plasticina só estava disponí-
vel em branco, mas em 1958 passou
a incluir amarelo, vermelho e azul e
nos anos 80 passou a ter oito cores.
A receita continua secreta, com a
Hasbro a revelar apenas que contém
água, farinha e sal. W

Editado por Ana Taborda

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Crónica www.sabado.pt
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SANTOS E...
Enquanto assenta a poeira da invasão ao Capitólio por inimigos de vampiros pedófilos e crentes
no deep state extraterrestre, talvez os analistas sobrestimem a futura capacidade de influência
O MORALISTA de Trump. Na Vanity Fair, Emily Jane Fox, com recurso a várias fontes nas trincheiras de uma
Casa Branca em esboroamento, fala de Javanka – a energética contração que designa o
Agrilhoados ao tédio, prisioneiros casal Jared/Ivanka – como o par que, em dois dias, “se tornou fonte de um cheiro que é
de sofá, esquecemo-nos de que o impossível repelir”. Jared Kushner preparava-se para fazer negócio sobre os escom-
nosso destino foi mais doce do que bros da tempestade viral. Ivanka andava a planear um radioso amanhecer po-
imaginámos. Porque a nossa cela lítico na Flórida. Agora, depois de um tweet (depressa removido) a classifi-
tem janelas largas, laptops, TV por car de “patriotas” os xamãs do QAnon que defecaram nos corredo-
cabo, streaming e takeaway res do Senado, não é só o papá que se tornou tóxico. É toda a
família. A imagem de Ivanka a ser insultada enquanto
desfila deve ser a única visão que mirra o
coração de Trump.

C saída, jamais devem ser menospre- resy (Giuseppe Capotondi), Ante-

As imagens zadas. No grande fluxo do seu movi-


mento, há as que provocam e as que
bellum (Gerard Bush, Christopher
Renz), The Nest (Sean Durkin), Ho-

que nos confortam. Nunca precisámos de to-


das tão intensamente durante tanto
neyland (Tamara Kotevska, Ljubo-
mir Stefanov);

sustentam tempo. Quando pensadas com ternu-


ra (ou fúria) e trabalhadas com talen-
to (ou génio), são elas que nos salvam.
– Por estrear em Portugal: The As-
sistant (Kitty Green), Palm Springs
(Max Barbakow), Black Bear (La-
FORAM AS IMAGENS que nos sus- Esse resgate tem sido literal. Mas não wrence Michael Levine), Never Ra-
tentaram como amas de leite em foi sempre assim quanto à consciên- rely Sometimes Always (Eliza
2020. Agrilhoados ao tédio, prisio- cia ou ao espírito? Estas foram as Hittman), Another Round (Thomas
neiros de sofá, esquecemo-nos de imagens que mais me sustiveram os Vinterberg), Rewind (Sasha Joseph
que o nosso destino foi mais doce do passos no ano que passou. Mesmo Neulinger), Time (Garrett Bradley);
que imaginámos. Porque a nossa cela quando a caminhada era sonhada e o – Streaming: Uncut Gems (Josh e
tem janelas largas, laptops, TV por ar rarefeito. Espero que vos voltem a Benny Safdie), Da 5 Bloods (Spike
cabo, streaming e takeaway. Guerra, trazer alguma luz em 2021: Lee), His House (Remi Weekes),
emergência? Só quem nunca passou – Filmes estreados em sala: J’Accu- Small Axe movies (Steve McQueen).
por uma ou experimentou a outra é se (Roman Polanski), The Wild Goo- Melhor filme do ano: I’m Thinking
que se atreve a mencionar ambas se Lake (Yi’nan Diao), The Invisible of Ending Things (Charlie Kaufman,
franzindo as sobrancelhas. Somos Man (Leigh Whannell), Portrait de la Netflix, et pour cause). W
flores de estufa, num terreno difícil e Jeune Fille en Feu (Céline Sciamma),
minado, é certo. Mas as imagens que Monos (Alejandro Landes), Ema (Pa- Texto escrito segundo
nos enfastiaram, por serem a única blo Larraín), The Burnt Orange He- o anterior acordo ortográfico

A tendência autoritá-
ria vem de longe (Sócrates; Augusto
“quem se mete com o PS leva” Santos Silva). Mas,
se nos esforçarmos na bonomia face ao recorrente incó-
modo pelo escrutínio jornalístico, a veia era mais rara em Antó-
nio Costa. Ora, no episódio da “campanha internacional contra Portu-
gal” perpetrada por esses influentes maquiavéis de Bilderberg e pesos-pesa-
dos do lobbying cabalista, Paulo Rangel e Miguel Poiares Maduro, Costa parecia
um outro Maduro no número de prestidigitação face aos “lapsos” do CV do candida-
to a procurador europeu (talvez tenha sido uma vaca voadora que lhe segredou o
script). A ministra da Justiça, que já se devia ter posto ao fresco depois de um minifestival
de contradições, reiterou tudo, acusando a ralé de “tentativa de envenenamento da vida polí-
tica”. O pior defeito de um governante é partir do princípio de que os eleitores são idiotas.
C

...PECADORES
Jornalista
Pedro Marta
Santos

81
Sociedade

PORTFÓLIO. HISTÓRIAS POR TRÁS DAS IMAGENS

FAMOSOS QUE
GOSTAM DE
FOTOGRAFAR
São autodidatas, na sua maioria. Entre as carreiras públicas,
andam de máquina a tiracolo ou disparam com telemóvel.
Por Raquel Lito, Sónia Bento, Ana Taborda e Carlos Torres

A
os 18 anos, o músico David “APRENDI Com um acervo considerável, de fo-
Fonseca recebeu dos pais QUE É tos suas e de coleção, António Barre-
uma espécie de miniestú- POSSÍVEL to captou momentos únicos de uma
dio de revelação: uma das FAZER BOAS Lisboa em pandemia. Miguel Júdice
casas de banho converteu-se em la- IMAGENS não se cansa de ir à Índia. Álbuns de
boratório. Nilton, o humorista, cres- COM UM 13 figuras públicas, que revelam à
ceu a ver as fotos do pai e do avô. TELEMÓVEL” SÁBADO os bastidores das suas fotos.

j
Miguel Tiago,
ex-deputado do PCP
“Apanhei o boi den-
tro de água, nunca
tinha visto”
h Fiz esta fotografia
em agosto de 2017, em
Covadonga, nas Astú-
rias, Espanha, que é
uma volta que faço
muitas vezes de mota.
Apanhei o boi dentro
de água, coisa que
nunca tinha visto, a
fazer um reflexo dele
próprio juntamente
com o reflexo das
montanhas. Aprendi
que é possível fazer
boas imagens com um
telemóvel.

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j
Afonso Cruz,
escritor
“O dono do café
perdeu três filhos
nesse atentado”
h A 5 de março de
2007, um bombista
suicida fez-se explodir
em Al-Mutanabbi (o
terceiro pulmão de
Bagdade, pela quanti-
dade de livrarias),
matando 38 pessoas e
ferindo mais de 100.
O dono do café
Shahbandar, que fica
numa esquina dessa
rua, perdeu três filhos
nesse atentado. Esta
foi uma das fotografias
que tirei do referido
café, em 2019, depois
da sua reconstrução.

j
Catarina Furtado,
apresentadora
“Sobrevivem 7.000
[pessoas] em condi-
ções desumanas ”
h Este é o campo de
refugiados Vathy, na moelétrica, cuja constru-
ilha grega de Samos. ção terminou em 1908 e
Construído para aco- que por 50 anos produziu
lher 650 pessoas, ali eletricidade para a região
sobrevivem hoje cerca de Lisboa e Vale do Tejo.
de 7.000 em condi- g A fotografia é tirada de
ções desumanas. Visi- Augusto Mateus, um sítio ainda mais velho,
tei-o em setembro de economista o Tejo. Ao fundo vê-se a
2019, para gravar uma “Já me tinha esqueci- Ponte e o novo Maat. Ti-
das reportagens para o do de que há dias e rei-a numa altura em que
meu programa docu- horas cheios de gente” há muitas pessoas, um
mental Príncipes do contraste grande com a
Nada (RTP). Fotografei h Através desta fotogra- pandemia. Já me tinha
estas meninas à porta fia vemos mais de 100 esquecido que há dias e
da casa de banho. anos. Há uma central ter- horas cheios de gente.

83
Sociedade

1
Miguel Júdice,
empresário
“Já fui 10 vezes
à Índia”
h Parece que o fotó-
grafo é o jogador que
segura as cartas, quan-
do na verdade estou
posicionado por trás
dele. A foto foi tirada
em março de 2016,
com a minha Canon.
Viajava sozinho. Após
um festival de música
sagrada, nos palácios
do marajá de Jodhpur,
deambulei por uma
zona árida. Já fui 10
vezes à Índia, é o país
para onde mais viajo.

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ra que o Cristo-Rei e a boa nitidez àquela alti-


ponte espreitassem por tude e com as nuvens
entre as nuvens. A natu- tão em baixo. A foto foi
reza é que decidiu, a 10 tirada com uma Canon
de novembro. A Ponte R5. Sou fã de fotografia
25 de Abril em dia de ao ponto de estar na
g nevoeiro soa a conversa primeira fila das ondas
Nilton, humorista entre um Cristo-Rei que da Nazaré desde a ma-
“Um Cristo-Rei que plana nas nuvens, com drugada e estar o dia
plana nas nuvens” a Tower Bridge de Lon- todo a tirar fotos. Não
dres. Este momento é foram poucas as vezes
h Demorei quase duas único para mim, porque que voltei a casa a meio
Exposição horas para tirar a foto: acontece uma ou duas do dia para ir buscar a
WhatsApp e uma para encontrar o vezes por ano e rara- máquina, só para tirar
Instagram são sítio certo, outra à espe- mente se consegue tão uma foto.
os meios onde
estas figuras
j públicas
Renato Godinho, costumam
ator expor as
“Vi o meu filho de imagens
9 anos a contemplar
o horizonte”
j
h Não nasci em Vila David Fonseca, músico
Nova de Milfontes, mas “Todos os dias penso
é como se tivesse nasci- em fotografia”
do. Foi a terra onde os
meus pais se conhece- h A fotografia foi de um
ram, se casaram, onde aniversário de família,
eu também casei e no verão passado. O
passo férias. No último número de convidados
verão levei a máquina, era mínimo, já que os
uma Sony A7 III. De “SOU FÃ DE presentes acendiam as
repente, às 19h, vi o FOTOGRAFIA velas. Gosto da metáfora
meu filho de 9 anos a AO PONTO que levanta: a ideia de
contemplar o horizonte. DE ESTAR comunidade, de que
Achei incrível pela NA PRIMEIRA uma tarefa é mais sim-
conjugação da luz, da FILA DAS ples se for feita pelas
textura das pedras e ONDAS DA pessoas que a rodeiam.
até da pose dele, que NAZARÉ” Todos os dias penso em
parece encenada. fotografia. Q

85
Sociedade

“LANCEI O
MEU DRONE
E LEVEI-O
ATÉ DOIS
QUILÓME-
TROS DA
COSTA PARA
CHEGAR ÀS
BALEIAS E
FAZER AS
IMAGENS”

Q
h
Nicolau von Rupp,
Livros surfista
Sendo na maio- “Vi umas baleias e
g ria autodidatas, lancei o meu drone”
Joana Vasconcelos, estes fotógra-
artista plástica fos amadores h Esta foto foi tirada
“Agora com a minha recorrem à em 2019, no Havai, logo
filha no ballet, penso literatura espe- a seguir a uma das
muitas vezes no Degas” cializada para maiores ondulações do
aprender ano em Jaws [ilha de
h Agora que a minha fi- Maui]. Estava a descan-
lha anda no ballet, penso sar na praia e vi umas
muitas vezes no Degas, baleias no horizonte.
nas tardes que ele passa- Lancei o meu drone e
va a desenhar as meni- levei-o até dois quiló-
nas do ballet. Tirei a fo- metros da costa para
tografia sem ninguém à chegar às baleias e fazer
volta, em outubro, no umas imagens incríveis.
Museu d’Orsay, Paris.

j
Mariana Pacheco, atriz
“Apanho momentos
rápidos”
h O Gatsby estava a
fazer palhaçadas. Foi
uma foto tirada à toa, em
2016. Sempre gostei de
tirar fotos, mas ganhei o
gosto nas gravações de
Bem-Vindos a Beirais
(RTP), em 2014. Foi
quando encontrei um ga-
tinho de três meses, mui-
to assustado. Acabei por
me responsabilizar por
ele. Fotografar desta for-
ma é mais imediato, apa-
nho momentos rápidos.

86
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simplicidade. Eu falhei
mil vezes, ela nunca!
Tenho milhares de foto-
grafias. Minhas e de co-
leção. Com a minha
i amiga Ângela Camila j
António Barreto, Castelo-Branco, mete- Fernando Pimenta,
sociólogo mos ombros a um tra- canoísta
“A Humanidade está balho ciclópico: organi- “A sensação era que
ali, sentada zar os arquivos e a co- me tinham cortado
nas escadas” leção! Até há 10 ou 15 a ponta dos dedos”
anos, defendia a intoca-
h “Olá, Humanidade!”, bilidade da imagem. Es- h Costumo publicar as
Rossio, Teatro D. Maria, tava errado! Convence- fotos no Instagram. Uma
2020. Era Primavera. ram-me: eu estava a ser que deu alarido [tirada
Ano de pandemia e dias reacionário. Uma foto- no dia 3 de janeiro] mos-
de confinamento. Ao grafia já é intervenção. tra a minha mão cheia de
chegar ao Rossio, surgiu Tal como a revelação e calos. Por causa do frio,
esta fachada. Obrigou a a impressão. O Pho- a sensação era que me
pensar. A Humanidade toshop é uma interven- tinham cortado a ponta
está ali, sentada nas es- ção. Se me desloco, faço dos dedos. Serve para re-
cadas. A minha primeira zoom, abro o diafragma velar o trabalho que dá a
máquina foi uma Kodak ou vou buscar a grande minha arte. Porque para
Brownie. Depois, che- angular… estou a inter- conseguirmos bons re-
guei à Leica M6, um vir! Uma fotografia é sultado, é preciso muito
prodígio de qualidade e sempre uma criação. esforço e sacrifício. W

937
O plano
é aquilo, Oratori
Matrimonii ad-
quireret opti-
mus gulosus ru-
res, ut tremulus
zothecas ag-
nascor suis

FUSCE FER-
MENTUM
COMMODO
LIBERO VEL
LOBORTIS.
MORBI GRA-
VIDA POSUE-
RE MALE-
1 1
SUADA. 1 3
MORBI FAU

87
Desporto

PANDEMIA. SPORTING, FC PORTO, BENFICA E SP. BRAGA NÃO ESTÃO A PERDER MAIS PONTOS EM CASA

OS ADEPTOS AJUDAM A
Em Espanha, Inglaterra e Alemanha, parece que sim, mas em Portugal, desde a Covid-19, até há ma

E
m dezembro de 1984, o Real
Madrid perdeu 3-0 na Bél- Na Liga
gica, contra o Anderlecht, portuguesa, esta
para a Taça UEFA. Antes do época há 44%
jogo da segunda mão, perguntaram de vitórias em
a Valdano se iria ser difícil dar a volta: casa e 30% fora.
“Não. O rival vai sofrer do medo cé- A média dos úl-
nico do Santiago Bernabéu.” O argen- timos 10 anos
tino, que até marcou dois golos, não foi 45% e 30%. A
se enganou: num estádio lotado e em falta de público
ebulição, os merengues venceram não influenciou
por 6-1 (aos 15 minutos já estava 2-0).
Será que esse medo que os adver-
sários tinham de “realizar uma péssi-
ma exibição e cair no ridículo peran-
te a multidão”, como disse Valdano,
terminou com a pandemia e os está-
3%
França
dios vazios ou com lotações residuais? Esta época há um
Fomos ver, no campeonato portu- grande equilíbrio
guês e nas quatro principais ligas eu- entre a percenta-
ropeias, se tem havido mais vitórias gem de vitórias
fora. Em Espanha, Inglaterra e Ale- em casa (39%)
manha (onde havia uma maior taxa de e fora (36%).
ocupação nos estádios), nota-se essa Em 2019/20 foi
tendência (a percentagem de triunfos de 48%-27%
forasteiros cresceu 6% em Espanha
e Inglaterra e 4% na Alemanha). Em
Itália, as vitórias fora mantêm-se
iguais (104 antes e 104 após a Covid). BARCELONA
Já em Portugal, aumentaram os triun- E BOR. DORT-
fos caseiros: mais nove do que nos MUND SÃO
mesmos jogos antes da pandemia. AS EQUIPAS
Jorge Jesus tinha dito, em novem- COM MAIS
bro, que “as grandes equipas são as PONTOS PER-
mais prejudicadas por não haver DIDOS EM
adeptos, é um fator psicológico ne- CASA NA ERA
gativo”. Mas os dados desmentem- COVID-19
-no. A SÁBADO analisou os resulta-
dos de 28 grandes equipas de 10
campeonatos europeus e verificou
que, desde o início da pandemia,
só seis somam prestações bem
piores em casa (Barcelona, Borussia
Dortmund, Juventus, Manchester
United, PSG e Liverpool). Depois,
há 15 que estão melhor e sete que
tiveram resultados semelhantes
com e sem público. W

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A GANHAR OS JOGOS?
is vitórias caseiras. E a maioria dos grandes clubes não se ressente dos estádios vazios. Por Carlos Torres

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Opinião

CORAÇÃO, O Saía quase sempre carregado de

CABEÇA E Letra Livre sacos de plástico cheios de livros,


alguns fora de todas as lógicas, como
os dois volumes das Noções de Salsi-
ESTÔMAGO A MAIORIA DAS PESSOAS, mais
do que abandonar os seus vícios,
charia, de J. Póvoas Janeiro (Livraria
Luso-Espanhola, colecção Biblioteca
Por causa da espantosa substitui-os por outros. O ex-fuma- Rural); Ano Bom para Anões, um
acumulação de papelada dor converte-se num comilão. O ex- mistério de Carter Brown, da Galeria
impressa, fiquei a dever -alcoólico num fumador empederni- Panorama (série Confidencial), “im-
dinheiro, menti à família, do ou dependente de ansiolíticos e presso em papel especial, anti-refle-
à namorada, aos amigos. comprimidos para dormir. O gordo xo, opaco e de cor, preparado cienti-
Perdi trabalhos, a amada em vegetariano ou adepto da acu- ficamente para a leitura nocturna”; A
deixou-me, incapaz de lidar punctura. O heroinómano em joga- Toxicidade Incontestável das Águas
com a desordem e a dor compulsivo de póquer online. O do Gerez, por A. Rita-Martins, profes-
desarrumação da livralhada difícil é viver sem um vício. sor da Escola Colonial, antigo assis-
Pela minha parte, não sou excepção. tente da Faculdade de Medicina; A
Com uma pequena diferença: desde a Natação torna-se um flagelo tal
primeira hora, mantive-me sempre como se pratica, de József Torok
fiel ao mesmo vício. Estreei-me logo (professor de natação, director da
na infância, aos 8 ou 9 anos, no perío- piscina do Estoril-Sol); ou Um Negro
do iniciático que é abrir-se para a vida, no País das Loiras, novela adulta de
em que a nossa personalidade é ainda Hernâni Anjos, “o escritor necessário
informe (quanto mais cedo adquiri- para a obra necessária”, de que ainda
mos certos hábitos, maior a probabili- vos falarei aqui um dia.
dade de desenvolvermos um vício). Mas também coisas criteriosas,
Em se provando uma vez, não mais como Textos Malditos, de Luiz Pa-
se pode largar. No início, consumia checo (edições Afrodite), este com
duas ou três vezes por semana, de- uma amável dedicatória do autor:
pois, comecei a levantar-me todos os “Para o Dinis Machado, aquele maior!
dias com a necessidade imperativa Luiz Pacheco, 11/IV/78”; Apresenta-
de obter mais produto. Passei a viver ção do Rosto, de Herberto Helder,
sob a lei do mesmo vício: comprar li- com capa de Espiga Pinto (Editora
vros. Tornei-me uma espécie de tér- Ulisseia); ou Viagem ao Fim da Noite,
mita devoradora de jornais, revistas, de Louis-Ferdinand Céline, traduzido
folhetos, edições populares a baixo por Aníbal Fernandes, eloquentíssi-
preço, separatas, catálogos, etc. mo conversador, um dos mais distin-
Por causa da espantosa acumula- tamente informados em literatura.
ção de papelada impressa, fiquei a Tudo isto vem a propósito de uma
dever dinheiro, menti à família, à na- referência esdrúxula de Alberto Man-
morada, aos amigos. Perdi trabalhos, guel, na revista do Expresso (8/1/21), à
a amada deixou-me, incapaz de lidar Livraria Letra Livre. Diz o erudito ar-
com a desordem e a desarrumação gentino, sobre o Largo Doutor Antó-
da livralhada. nio de Sousa Macedo, para onde con-
A primeira livraria que frequentei foi fluem a Rua do Poço dos Negros e a
a Galileu, na Avenida Valbom de Cas-
cais, ao lado dos Gelados Santini. Pro-
gressivamente, alarguei os meus hori-
zontes à Avenida de Roma (Livraria
Barata) e ao Bairro Alto. A Livraria Ba-
rateira e o Óscar Pereira (amigo de
Luiz Pacheco, que vendia as edições
Contraponto), no rés-do-chão da Aca-
demia de Amadores de Música, ambas
na Rua Nova Trindade Coelho; a Loja
das Coleções, na Rua da Misericórdia;
o Mundo dos Livros e o Vilela, estes
O nas Escadinhas do Duque; e a Livraria
Escritor e sociólogo Antiga do Carmo tornaram-se cami-
João Pedro George nhos frequentemente trilhados.

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Rua dos Poiais de São Bento, que esgotados, fora de circulação, rarida-
aquela praça continuasse mais uns des bibliográficas, livros novos de edi-
metros e subisse pela Calçada do toras independentes, algumas já desa-
Combro, “teria a honra de ser a mo- parecidas (como a Fenda, a Hiena ou a
rada da Letra Livre, uma livraria elo- & Etc.), outras mais recentes (Averno,
giada por Carlos Drummond de An- Língua Morta, Maldoror, etc.).
drade e outras luminárias livrescas Fundada em 2006 por Carlos Ber-
do século passado”. nardo, Eduardo de Sousa e Eugénia
A Letra Livre, surgida há pouco mais Gomes (a que posteriormente se jun-
de 10 anos, é a livraria que me desper- tou Andreia Baleias), era impossível
ta recordações dessa época de esplen- que Carlos Drummond de Andrade,
dor adolescente, em que gastava as que morreu em… 1987, conhecesse a
solas dos sapatos a percorrer as estan- Letra Livre. Terá entrado em muitas
tes dos alfarrabistas do Bairro Alto. É outras livrarias e com um poder de
uma livraria diametralmente oposta evocação nostálgica tão forte, mas
ao espírito do tempo, à pressão homo- nunca, por certo, na Letra Livre.
geneizadora da turistificação, do alo- É um lapso sem importância, se bem
jamento local, das Guest Houses, dos que estranho num “erudito”. Há pio-
Coffee Labs, das Bakerys, dos Brunchs, res. Este, porém, forneceu-me um
em que tudo é igual em todos os lados, pretexto para uma visão passadista de
independentemente das cidades. Lisboa e da minha juventude, quando
Ali, no calcanhar da Calçada do me tornei amo e escravo dos livros.
Combro, só se vende livros. Usados, O sentimento de que se está a per-
der uma certa experiência de Lis-
boa fica atenuado sabendo-se que
ainda há livrarias como a Letra Li-
vre. Que nos permitem suspender a
imagem de uma cidade cada vez
mais pensada e construída pelos
fundos de investimento e por autar-
cas como Fernando Medina, que
ainda há dias foi convidado por Du-
rão Barroso para participar na reu-
nião anual do sinistro Clube Bilder-
berg, que reúne líderes políticos,
empresários, corporações multina-
cionais. Gente que tem força sufi-
ciente para escolher e demitir pre-
sidentes, iniciar uma guerra ou fa-
zer aumentar o preço do petróleo.
É de Drummond de Andrade este
excerto, retirado de Roteiro dos Se-
bos do Rio de Janeiro, que se adequa
perfeitamente à Letra Livre: “O sebo
[alfarrabista no Brasil] é a verdadeira
democracia (…). Saio deles com um
pacote de novidades velhas e a sen-
sação de que visitei, não um cemité-
rio de papel, mas o território livre do
espírito, contra o qual não prevalece-
rá nenhuma forma de opressão.”
A mim parece-me que graças a sa-
las de chuto como a Letra Livre, onde
gasto acima das minhas possibilida-
des, ainda se consegue respirar em
Lisboa. W

MISS INÊS Texto escrito segundo


o anterior acordo ortográfico

91
CAMPANHA DE INVERNO
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A SÁBADO
EM SUA CASA

Porque a chegada dos dias mais frios convida à leitura


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de Lisboa que renasceu
dividido em dois p. 100

Cinema
Perfil: Juliette Binoche, de
atriz de culto ao Manual
da Boa Esposa p. 102

Música

CAMINHAR
Orquestra Bamba Espe-
cial – do disco de estreia
a Tiago Nacarato p. 104

CONTRA Estilo
A segunda vida da marca

A NEURA
histórica de atoalhados
Torres Novas p. 108

DE INVERNO
O tempo frio não tem de ser
sinónimo de depressão. Para a
combater, sugerimos-lhe trilhos
e programas que provam que
quem anda sua tristeza espanta

MAURICIO ABREU

93
Tema

SEGUIR O
TRILHO DO
BEM-ESTAR
“A CAMINHADA MAIS DIFÍCIL João criou, em 2014, o projeto “Caminhar pos- internacional, intervém, sempre
é a do sofá até à porta de casa”, Walking Mentorship, que junta sibilita desace- em caminhadas na natureza,
costuma dizer, em jeito de pro- a mentoria e o autodesenvolvi- lerar. O stress em pessoa, por telefone ou
vocação, João Perre Viana, mento ao contacto com a natu- através de vídeos que o mento-
para quem andar é muito mais reza. Quem o contrata não pro-
fica em casa. rado vê durante os percursos.
do que um exercício físico: “É cura um guia para caminhadas
E isto é grátis”, “São pequenas mudanças de
fundamental para reduzir o (esses, o leitor encontrará na realça João vida, mas às vezes precisamos
stress e aumentar a motivação, pág. 98); procura, sim, ganhar Perre Viana, de alguém que nos dê um pe-
a memória, a concentração perspetiva sobre a sua vida e da Walking queno empurrão.”
e o humor”, nota. projetar o futuro ideal – e per- Mentorship Depois, há o lado terapêutico,
ceber como lá chegar. É aí que do andar por andar, respirar ar
o gestor, com quase duas déca- puro e pensar em nada mais.
das de experiência em mentoria “Caminhar oferece-me a possi-
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Os seus
2.351 m de PICO, AÇORES
altura fazem O grupo central das ilhas dos
do Pico a Açores reserva algumas das
montanha
mais alta de caminhadas mais bonitas do
Portugal Atlântico, desde passear entre
caldeiras de vulcões na ilha
do Faial, passando pelas céle-
bres fajãs de São Jorge, à in-
contornável – porque a sua
presença a olho nu se impõe
das outras ilhas – montanha
do Pico, a mais alta de Portu-
gal, com 2.351 m de altura.
Subir até ao topo, ao Piqui-
nho, e descer é coisa para le-
var sete horas. E se subir é
moroso, saiba que a parte
mais dura da caminhada é a
descida. Pode tentá-lo sozi-
nho, mapas e guias online não
faltam, mas se não tiver expe-
riência em montanha, acon-
selha-se a companhia de um
profissional (pág. 98).
Mais próximo do nível do
mar – logo, com menos subi-
das e descidas –, há trilhos
que passam por piscinas na-
turais e praias, mas o desta-
que vai para as icónicas vi-
nhas plantadas em chão de
lava e encurraladas por muros
A pandemia, o trabalhar de casa, de pedras negras que as pro-
o isolamento e agora também o frio tegem do vento e do sal.
do inverno: não admira que ande-
mos com a neura. Para dar cabo
dela, calce algo confortável e siga
as nossas sugestões de caminhadas
e passeios na natureza.
Por Markus Almeida

SERRA DA GARDUNHA,
bilidade de desacelerar e de me JOÃO FUNDÃO
reconectar comigo e com as PERRE VIANA Na primavera, limpe a vista – e a
pessoas à minha volta. Eu até Trabalhou nos EUA, cabeça – com uma caminhada en-
posso andar depressa de início, pelo teletrabalho. “Nesta situa- Bélgica, Cazaquis- tre os socalcos brancos que orna-
mas garanto que ao fim de uma ção, é importante tomar em tão, Ucrânia, Ango- mentam a serra da Gardunha, no
hora vou desacelerar. O stress mãos decisões que têm impacto la e Moçambique Fundão. O fenómeno regista-se
fica em casa. E isto é grátis, é a na nossa vida”, realça, con- antes de criar a sempre entre março e abril, quan-
mãe natureza a dar-nos”, conta cluindo: “Se nos permitem sair Walking Mentor- do milhares de cerejeiras em flor
João, que tem encontrado pes- para apanhar ar, então porque ship. Programas transformam um passeio pelos tri-
soas exaustas, com síndrome de é que não vamos?” Aceite, pois, disponíveis no site lhos da Gardunha numa experiên-
burnout e problemas de saúde estas sugestões de percursos www.walking cia memorável – e muito “instagra-
mental, causados pela pande- pedestres, passeios e caminha- mentorship.com. mável”. É um dos mais belos cená-
mia, pelos confinamentos e das, e ponha a neura a andar. W rios naturais do País.

95
Tema

Q TAPADA DA AJUDA, LISBOA


A Tapada da Ajuda entrou em
2021 com novidades verdejan-
tes, pedestres e cicláveis. Ao
todo, são 100 hectares delas.
Depois de obras em 2020, a
“nova” tapada foi inaugurada a
5 de janeiro com novos trilhos e
a renovação dos que já existiam
(para percorrer a pé ou de bici-
cleta) e que agora ligam as qua-
tro entradas da tapada, além de
ligarem a Ajuda a Alcântara e ao
Parque Florestal do Monsanto.

VILA FRANCA
DE XIRA
O Parque Linear Ribeirinho do
Estuário do Tejo, entre Póvoa
de Santa Iria e Alverca do Ri-
batejo, foi inaugurado em
2013, com projeto do ateliê de
BUÇACO, PENACOVA arquitetura paisagista Topia-
São 10 km de trilhos e cami- ris, e, desde então, pelo que
nhos pedestres pelo meio da proporciona, já conquistou
serra do Buçaco que levam a prémios internacionais como
conhecer de perto os seus moi- o American Architecture Prize
nhos típicos e as formas tradi- e WAN Landscape Award. E o
cionais de agricultura, ligadas que proporciona é a possibili-
aos cereais e ao milho – o seu dade de perder (ou ganhar)
nome, não por acaso, é Rota umas horas sem preocupa-
dos Moinhos do Buçaco. O tri- ções ao ar livre, a percorrer os
lho está sinalizado e começa Há 6 km de seus trilhos pedonais (e ciclá-
na localidade de Portela de trilhos entre veis), ao longo de 6 km, desde
Oliveira, em Penacova, onde Póvoa de Forte da Casa até Alverca do
Santa Iria BAIXO GUADIANA,
também termina. e Alverca Ribatejo, no que costumava
ALGARVE ser uma antiga zona industrial
Desde 2015 que a Grande Rota de depósitos de areia.
PICO RUIVO, MADEIRA do Guadiana liga os três conce- O ponto de partida é a zona
Com uma proposta de mais de lhos que abarcam o Baixo Gua- da Praia dos Pescadores
5 km de caminhada (2,8 km de diana Algarvio, perfazendo um (Forte da Casa), onde infraes-
ida e o mesmo de volta), o trilho total de 152 km, de Monte Gor- truturas como o parque in-
da Vereda do Pico Ruivo é, ainda do a Mértola. Pode percorrer a fantil, o skatepark, o Centro
assim, o mais curto entre os extensão que desejar deste ca- de Interpretação do Ambien-
principais percursos pedestres da minho ou, então, optar por uma te e da Paisagem, o Observa-
Madeira. Dá acesso ao seu cume das dezenas de pequenas rotas tório de Aves e um café-bar
mais alto, o Pico Ruivo, mas sem – muitas delas ligadas a temas permitem que o interesse do
grandes subidas: começa na naturais ou históricos – em Cas- passeio se prolongue para lá
Achada do Teixeira, já acima dos tro Marim, Alcoutim ou Vila Real da caminhada.
1.800 m de altitude, e permite de Santo António.
desfrutar da paisagem de altitu-
de ao longo de todo o percurso.

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LINHAS DE TORRES,
SOBRAL DE MONTE
CHAVES
Os 80 km de percursos pedestres
O QUE
AGRAÇO
É João Perre Viana, da Walking
do concelho de Chaves repartem-
-se entre seis rotas de pequena e
LEVAR NA
Mentorship, que o diz: “É mes- média dimensão (de 9,6 km a MOCHILA
mo à saída de Lisboa mas a 17,4 km). Os trilhos e caminhos
maioria dos lisboetas não sabe rurais permitem descobrir o patri-
que um passeio de um dia aqui mónio cultural e natural da região
se pode transformar no ponto SERRA DA ESTRELA – a passar sobre o Tâmega, a ca-
alto do seu ano”..João refere-se As possibilidades nesta zona minhar sobre linhas de comboio, a
à Rota das Linhas de Torres Ve- são virtualmente intermináveis: visitar a Casa-Museu João Vieira, FRUTOS SECOS
dras, com sede em Sobral de para uma caminhada curta (2,5 igrejas ou santuários e a conhecer Têm muitas calorias, mas
Monte Agraço, e que se estende km) a partir de Manteigas, opte antigas rotas do contrabando, vias ocupam pouco espaço. Perfeito
de Alhandra em direção ao pela Rota do Poço do Inferno, romanas e moinhos.
Atlântico, com pequenos percur- ladeada de beleza natural, e se
sos pedestres na Serra do So- procurar maior esforço combine-
corro e da Acheira. -a com a Rota do Javali, para um
total de 14 km de memoráveis
paisagens da serra. Mas prepa-
re-se: o trilho pode ser acidenta- MAPA/GPS
do e o tempo agreste. Smartphone e mapa topográfi-
co de onde vai caminhar podem
ser bons aliados dos passeios

BARROCAL, CASTELO BRANCO


A menos de um quilómetro do o mirante de São Martinho
centro de Castelo Branco, assumem papel de destaque
abriu, em novembro de 2020, no Parque do Barrocal.
um parque com miradouros, Visitas guiadas estão previs- ÁGUA
diversas formações geológicas tas começarem em breve. Até Não se morre à sede a caminhar
para onde quer que se olhe, lá, resta aproveitar de forma em Portugal, mas vá prevenido
trilhos naturais, passadiços livre os 40 hectares de nature-
desenhados pelo ateliê Topia- za deste parque urbano que,
ris, um observatório de aves e em agosto, ainda antes de
SESIMBRA um parque infantil. É um con- abrir, já estava nomeado na
Menos exploradas do que as vite a caminhar, mas também categoria de Melhor Paisagem
da vizinha Arrábida, as encos- a parar para contemplar a pai- Urbana nos World Architectu-
tas entre Sesimbra e o Cabo sagem granítica do Barrocal, re News Awards – e acabaria CASACO IMPERMEÁVEL
Espichel são férteis em praias do campo e da cidade. mesmo por levar o “ouro”. O tempo é imprevisível. Evite
secretas e panorâmicas maravi- O Túnel do Lagarto, o uma molha a meio do caminho
lhosas. Descubra-as numa ca- Observatório dos Abelharucos,
minhada de cinco horas por tri- o Círculo do Domo e a ponte
lhos desde o Porto de Abrigo de suspensa que convida a visitar
Sesimbra em direção à Praia do
Ribeiro do Cavalo e da Praia da
Cova da Mijona. Se descer até
às praias, lembre-se de que, no BOTAS
regresso, é sempre a subir... O calçado mais adequado: apoia
tornozelos e calcanhares

O Parque
Natural do
Barrocal é a
nova atração ÓCULOS DE SOL E CHAPÉU
de Castelo Cuidado com as insolações,
Branco o tempo cinzento engana

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+
Q Os Passadiços
do Paiva
integram o
portfólio da
Strike Tours
GUIAS
NA COMPANHIA
DE QUEM SABE
Para andar com a máscara ou
mantendo a distância, mas
acompanhado – sem atalhos

PEDRO MARTINS
CAMINHAR DURANTE uma
hora ou duas, rodeado de na-
tureza, a respirar o ar impolu-
to da serra, pode levar alguém
a perder-se facilmente em
pensamentos. Também pode viagens aos Açores ou aos
levá-lo a perder-se de verda- Alpes e expedições – com “E”
A agência
de. Para o evitar, prepare as Caminhando grande – até ao Nepal. Per-
suas caminhadas com espe- organiza cursos pensados para levar
cialistas em atividades ao ar caminhadas, cães de companhia, fotografar
JOÃO MORGADO

livre, como os que se seguem. por exemplo, cogumelos em Sintra, ver arte
Com sede em Viana do Cas- pelos trilhos urbana em Lisboa ou cami-
de Sesimbra
telo, a Descubra Minho é uma nhar pelos passadiços da ria
empresa de ecoturismo que de Aveiro em noite de Lua
organiza caminhadas, pas- sias do Cabo Espichel (24/1, cheia são algumas das suas
seios de bicicleta e, até, pas- 9h30-15h30) ou em Sesimbra, sugestões mais originais.
seios de burro. Se uma aven- um percurso linear de 8 km, entre a praia do Ribeiro do Por falar em Lua, há uma
tura de oito dias e 85 km a pé que se faz em menos de três Cavalo e a da Cova da Mijona empresa que se especializou
pelos trilhos do Parque Nacio- horas. Pode fazê-lo sozinho, (23/1, 9h30-15h). em caminhadas pela calada da
nal da Peneda-Gerês se reve- mas se preferir a companhia Também a agência Green- noite mas que, apesar de se
lar demasiado ambiciosa para de quem conhece o traçado Trekkers tem um calendário chamar Trilhos Nocturnos,
as suas pernas, tem boa alter- como a palma da própria mão, preenchido com percursos pe- também opera de dia, e um
nativa: uma caminhada de seis a Strike Tours (agência dedi- destres que vão de inofensivas pouco por todo o País. Janeiro
horas, que se estende por 12 cada às expedições, trekkings caminhadas de um dia a expe- é mês de parar, mas a partir de
km pela serra Amarela (que e férias na neve) tem previstos dições de um fim de semana, fevereiro os fins de semana
pertence ao mesmo parque três passeios de dia inteiro na trarão um novo conceito da
nacional), com pausas ao lon- primavera: a 21 de março, 17 Trilhos Nocturnos. Chama-se
go do trilho para interpretação de abril e 8 de maio. Sintra Mística e, em vez de te-
da fauna e flora. Todos os fins de semana a Todos os fins de rem um guia, os participantes
Os Passadiços do Paiva, no agência Caminhando organiza semana a agên- orientar-se-ão seguindo um
concelho de Arouca e distrito uma dezena de percursos cia Caminhan- trilho de leds. Haverá indica-
de Aveiro, dispensam apre- perto de Lisboa e, por vezes, ções para, a certa altura, por
sentações, tantos são os “Ós- pelas próprias ruas da capital.
do organiza exemplo, se desligar as luzes e
cares do Turismo” com que já Por exemplo, caminhadas nas uma dezena de escutar os mochos, e, no fim,
foram distinguidos (quatro). É escarpas da Praia Grande, percursos perto chá e bolo para aquecer. W
Ursa e Adraga (17/1, 9h30-15h); de Lisboa e, às
do Guincho à Grota (23/1, vezes, até pelas
9h30-14h), entre praias e falé- ruas da capital
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opinião
Bom gosto, mau feitio

A TROCA
POR TROCA
ÂNGELA MARQUES

U
em bicos de pés até ao carro. cheguei). Só havia uma solu-
Ocasionalmente culpar-se- ção: dividir o mal pelas aldeias.
-iam pelo exagero, com aque- Numa aldeia vizinha metafóri-
le “tu sabes como é que ela é”, ca, uma amiga comportou-se
que eu ouvia como se fosse À VEZ, MÃE como uma amiga, como de-
plateia no Parque Mayer e não
peão num quintal do Ribatejo. E TIA DIRIAM monstra o diálogo que se se-
gue: “Amiga”, disse eu. “Diz-
Aos poucos, aquela compota QUE NÃO ERA -me”, disse ela. “Limões e tan-
de Natal transformava-se no
mercado biológico do Campo NADA DE gerinas, interessam-te?”, per-
guntei. “Sempre”, respondeu.
Pequeno e eu, sentindo-me ESPECIAL Não vou mentir: naquele mo-
ma abóbora que nasceu para
bater recordes, um bouquet de
com sorte, sentia-me também
assoberbada. ENQUANTO mento senti que se lhe estivesse
a perguntar se queria assaltar
espinafres de fazer estalar a Já em casa, sem pressão nem CARREGAVAM um banco comigo no fim da
guerra civil no Instagram
(influencers defensores dos
culpa, admiti: por mais que
quisesse, não teria como dar CAMIÕES frase ela já estaria a limpar as
armas. No dia seguinte, limões
smothies detox de um lado, conta daquele recado (ainda DE FRUTA EM e tangerinas foram entregues.
nutricionistas promotores de
sopas e saladas do outro) e um
ponderei fazer picles de limão,
o que diz quase tudo sobre o
BICOS DE PÉS Conversa puxa conversa e a
minha amiga tinha presentes
saco XXL cheio de limões e estado de ansiedade a que ATÉ AO CARRO de Natal para redistribuir.
tangerinas – a 4 de janeiro de “Tenho aqui isto, queres?”, per-
2021, foi com estas peças que a guntou-me. “Quero”, respondi-
minha família (que visitei de -lhe. Com ela de fruta na mão
longe, de máscara e de manei- e comigo de cachecol no saco,
ra a que possa continuar a visi- chegámos a uma conclusão: na
tá-la em anos vindouros) me amizade como em tudo, a troca
propôs que, antes de iniciar a por troca pode salvar o dia. W
viagem de volta, eu jogasse um
bom e velho Tetris no porta-
-bagagens do meu carro.
Mãe e tia tinham tudo en-
saiado: à vez, diriam que não
era nada de especial enquanto
carregavam camiões de fruta

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A vista
de ambas
as salas
mostra
o Tejo, o
Castelo de
São Jorge
e a Baixa

O menu de
degustação
foca-se nos
produtos
do mar

UM CLÁSSICO
À PROCURA
DA ESTRELA
Aos 32 anos, o Via Graça, em Lisboa, dividiu-se em dois: ceram simplesmente porque O Via Graça, na
o piso de baixo mantém-se tradicional, o de cima é um “estava aqui sentado a olhar lá R. Damasceno
fine dining a namorar o Guia Michelin. Por Catarina Moura para fora”, diz o chef – e o que
via era o mais romântico lado
Monteiro, tem
de Lisboa. Lá estão os ovos ver- agora dois res-
des (de codorniz, com espuma taurantes, um
de ervas e caviar), um salmone- com os pratos
LÁ EM CIMA está o fine dining, leme. “Tenho uma meta de dois te com amêijoas, percebes e de sempre, o ou-
cá em baixo, a comida de con- anos para ir à procura de uma berbigão, um prato de bacalhau tro com menus
forto. João Bandeira encheu-se estrela, mas sem stress, com com creme de amêndoa e outro de degustação
de coragem e transformou o calma”, avisa João Bandeira. de lombos de carabineiro (com
histórico lisboeta Via Graça em Alguns dos pratos do 9b nas- a cabeça ao lado, para que não
dois restaurantes. Uma sala é se desperdice a melhor parte). os clientes queriam os pratos
para cozinha portuguesa a pre- O leite- Ao menu que cativa os clientes costumeiros: “As pessoas cha-
ceito, característica da casa; a -creme do mais conservadores, juntam-se teavam-se comigo e eu demorei
outra para um fine dining inspi- Via Graça ideias disruptivas (pelo menos, a entender.” Atinou quando per-
rado pelo produto nacional, o no fine dining português), como cebeu que um restaurante onde
9b, casa portuguesa atualizada. a pré-sobremesa que se lambe os clientes começaram a ir aos
O dono do restaurante funda- diretamente do prato: o leite 40 anos e hoje levam os netos é
do em 1988 investiu cerca de 1 creme da avó de Spalk. intemporal. “Eu hei de morrer e
milhão de euros em obras. Pou- No andar de baixo, mantêm- o Via Graça vai continuar aqui”,
cos clientes habituais sabiam -se os pratos tradicionais, para conclui.
que o Via Graça tinha, afinal, partilhar, com os ajustes do Já ultrapassou a crise de 2008
dois andares. No de cima nas- novo chef: há bacalhau à Brás, e agora saiu renovado de uma
ceu a novidade: o 9b by Via bochechas de porco, polvo e pandemia. Tudo indica que este
Graça, um sofisticado fine di- empada de caça. Quando pôs as histórico da Graça, de vista
ning com Guilherme Spalk ao mãos nesta carta, ainda em privilegiada, quer futuro. W
2018, antes de o restaurante fe-
char para obras, Guilherme pas-
sou por tempos difíceis, porque

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Séries www.sabado.pt
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O VINHO PORTUGUÊS DÁ SHOW


A mais famosa série de vinhos do mundo veio a Portugal filmar a nova temporada, que acaba de estrear no 24 Kitchen.
Falámos com o especialista à frente do programa, Joe Fattorini, fascinado com o que encontrou. Por André Santos

O ambiente da
série é descon-
traído: Charlotte
Wilde, Matthew
OS SETE EPISÓDIOS da terceira Good e Dominic
temporada do The Wine Show West a provar
foram filmados exclusivamente vinhos na vinha
no nosso país e carregam dife-
rentes sabores, aromas e tradi-
ções dos vinhos nacionais de
norte a sul, com passagem por
Madeira e Açores. A aventura é
acompanhada pelos apresenta-
dores Matthew Goode, Matthew
Rhys e James Purefoy, cobertos
pela sabedoria dos especialistas
em vinhos Joe Fattorini e Char-
lotte Wilde e por Jaega Wise,
uma produtora de cerveja britâ-
nica. Estreada a 2 de janeiro no
canal 24 Kitchen, a temporada
tem ainda convidados, como o
ator Dominic West, o McNulty
de The Wire, e o escritor Noah
Solloway, de The Affair. “Muitos restau-
Ao telefone, o sempre entu- rantes gosta-
siasta Joe Fattorini começa por vam de ter vi-
explicar que sempre que come- nho verde na
ça a rodagem de uma nova carta, mas quei-
temporada lê muito sobre a his-
tória dos sítios que vai visitar:
xam-se das gar-
“Aprendi muito sobre a influên- rafas altas, que
cia global que Portugal teve e o não cabem nos
impacto extraordinário na cul- frigoríficos”,
tura de certos países.” Mas va- alerta Fattorini
mos aos vinhos: “Há uma diver- JOE FATTORINI, DE VENDEDOR A ESTRELA DE TV
sidade extraordinária. Há uns
mais atlânticos e outros mais É divertido, entusiasta e cia muito, por ser uma boa “Por exemplo, o vinho verde.
próximos do estilo italiano. À adora contar uma boa histó- forma de “dar a conhecer Muitos restaurantes gostavam
volta de Setúbal estão a fazer ria sobre um vinho. Também grandes vinhos às pessoas”. de o ter na carta, mas queixam-
vinhos muito interessantes.” gosta de ouvir – e de beber, Mas há outras, como ser -se das garrafas altas, que não
Ao longo da conversa, há claro. Com 51 anos bem vi- uma das principais caras da cabem nos frigoríficos.”
ideias recorrentes, das histórias vidos, Joe Fattorini especia- série The Wine Show, que Além disso, é preciso uma
ligadas ao vinho da Madeira, lizou-se na área comerciali- nos últimos anos o tornou narrativa: “Para muitas pessoas,
famoso em Inglaterra e nos Es- zando vinho para bares, res- um dos principais rostos da o vinho português não tem si-
tados Unidos, e muito fascínio taurantes e hotéis – que área na cultura popular gnificado. Precisam de conhe-
pela diversidade. Especialista ainda o faz –, algo que apre- mundial. cer o País, mas também a sua
na matéria – e muito viajado –, comida e os vinhos, e levarem
Fattorini vai deixando dicas so- essa memória para casa, com
bre modos de popularizar os vi- histórias que possam ser revivi-
nhos nacionais no estrangeiro: das à mesa.” W

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YARA NARDI/REUTERS
Cinema

O CHARME ETERNO
fez da jovem Juliette Binoche
uma estrela no seu país.
A adaptação do romance A

DE JULIETTE BINOCHE
Insustentável Leveza do Ser, de
Milan Kundera, o seu primeiro
filme em língua inglesa, em que
contracenou com Daniel Day-
Assinalando o seu retorno às salas de cinema portu- Binoche passou a adolescência -Lewis, foi outro dos destaques
guesas em Manual da Boa Esposa, traçamos o percur- em companhias de teatro inde- de início de carreira, começan-
so de uma das mais talentosas atrizes da sua geração. pendentes e a fazer pequenos do então a evidenciar-se um
Por Pedro Henrique Miranda papéis televisivos até ser notada padrão de personagem para Bi-
pelo influente realizador Jean- noche, o de musa ingénua for-
-Luc Godard, o primeiro de çada a lidar com situações ad-
uma série de autores consagra- versas com apatia e indiferença
É A FIGURA que conquistou to- Com uma das dos com quem trabalharia, – padrão de que faria por se
dos os públicos: com uma das carreiras mais quando estava prestes a com- libertar nas décadas seguintes.
carreiras mais invejáveis das úl- pletar 20 anos. Aos 21, contra- Antes, contudo, ainda inter-
timas décadas, era tão idolatra-
invejáveis do ci- cenou com Jean-Louis Trintig- pretou o papel paradigmático
da no auge da fama que a críti- nema moderno, nant em Rendez-vous, o que desta fase: em Azul (1993), a pri-
ca chegou a questionar se a sua Juliette Binoche meira parte da Trilogia das Co-
aparência não estaria a sobre- é conhecida tan-
por-se às suas capacidades per- to pelos filmes
formativas. Hoje com 56 anos e de culto como
mais de 60 longas metragens pela participa-
no currículo, a longevidade do ção em grandes
sucesso de “La Binoche”, como produções de Na
lhe chamam nos media france-
ses, provou que não era só da
Hollywood comédia
Manual da
beleza que lhe vinha o charme. Boa Espo-
Nem sempre foi esse o caso, sa, inter-
preta “uma
no entanto. Com uma paixão professora
precoce pela ribalta (ambos os de donas
pais eram atores e cineastas), de casa”

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CRÍTICA
Em Azul,
abertura da
SEREIAS
Trilogia das EM BERLIM
Cores do po- UNDINE
laco Krzysztof
Kieslowski, k O maior cineasta ale-
foi particular- mão da atualidade regressa
mente depois de Em Trânsito, breve
memorável fresco intimista que ressoava
os fantasmas da Europa con-
temporânea através de uma
história de amor na França
ocupada da Segunda Guerra.
Em A O par protagonista está tam-
Insustentável bém de volta, nesta adapta-
Leveza ção livre do mito clássico de
do Ser,
adaptação Ondina, a criatura aquática de
do romance, forma humana, com Undine
contracena (Paula Beer), uma historiadora
Com 56 anos com Daniel freelancer especializada em
e 37 de car- Day-Lewis
reira, Juliette História Arquitetónica de Ber-
Binoche já lim (a cidade de Petzold), que,
integrou mais -se a Ralph Fiennes (depois de ao ser traída pelo namorado,
de 60 longas
metragens
O Monte dos Vendavais), e, em Focando-se se sente impelida a matá-lo,
2000, dois papéis que defini- cada vez mais acabando por conhecer Chris-
riam os anos subsequentes: o na comédia, o toph (Franz Rogowski), um
res de Krzysztof Kieslowski, desafiante e experimental Códi- mergulhador industrial, com
personificou o ideal da “Liber- go Desconhecido, de Michael
seu mais recen- consequências trágicas mas
dade” como uma mulher que Haneke, e a bem mais acessível te filme, Manual submersas em magia.
decide viver com espontanei- comédia romântica Chocolate, da Boa Esposa, Há um elemento sobrenatu-
dade para superar o trauma da ao lado do Johnny Depp, uma debruça-se so- ral pouco comum ao realiza-
morte da família num trágico substancial quebra com o tom bre o feminismo dor mas, após a extraordinária
acidente. A aclamada perfor- dos projetos a que se associara e a mudança de trilogia em torno de Nina Hoss
mance rendeu-lhe o estrelato até àquele momento. mentalidade (Jerichow, Bárbara e Phoenix),
internacional definitivo e o pri- Este revezamento entre gran- em relação às mantêm-se a capacidade cé-
meiro de muitos prémios, o des blockbusters e produções donas de casa nica de fazer colidir a História
César para Melhor Atriz. de autor manteve-se presente, com os destinos individuais, o
Seguir-se-ia o Óscar de Me- grosso modo, no resto da sua impulso melodramático com
lhor Atriz Secundária por O Pa- carreira. Voltou a filmar com o pano de fundo político, a tex-
ciente Inglês (1996), drama de Haneke em Caché – Nada a filmes de outros cineastas de tura das cores (verdes-esme-
época em que voltou a juntar- Esconder, de 2006, e entrou em culto, como Abel Ferrara (Ma- ralda, azuis de água doce, ver-
ria), Olivier Assayas (Tempos de melhos mortíferos) com a ver-
Verão), David Cronenberg (Cos- tigem de Bach. A primeira es-
mopolis) ou Claire Denis (High treia importante de 2021. W
O Paciente
Inglês rendeu Life), integrando, em simultâ- PEDRO MARTA SANTOS
a Juliette neo, comédias românticas
Binoche o seu como Jet Lag (2002), com Jean
único Óscar, Reno, ou O Amor e a Vida Real
de Melhor Atriz (2007), com Steve Carell. É nes-
Secundária
te registo que nos chega agora
Manual da Boa Esposa, obra
francesa em que interpreta uma
(ainda jovem) viúva que come-
ça a questionar os valores da
escola que sempre dirigiu com
TTTTS
o marido, e onde, como de cos- DE CHRISTIAN PETZOLD
tume, promete deslumbrar. W Ale./Fra. • Drama • M/12 • 91min
Com Paula Beer
e Franz Rogowski

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Música

A ORQUESTRA
DOS SAMBAS
DE BOLSO
Bamba Social é nome de grupo e fenómeno das noites
do Porto, que em 2020 se estreou em disco de originais
com a voz de Tiago Nacarato. Agora lança Samba de Bol-
so, tributo aos clássicos que o inspirou. Por Filipa Teixeira

NÃO SÃO ASSIM tão longín-


quas as memórias de um gru-
po de seis bambas (no Brasil,
gíria para rapazes valentes), da Música, em 2018, ou para
que, de cavaquinho, violão e escudar Marcelo D2 na sua
percussão às costas, começa- passagem por Portugal, no
ram a espalhar a palavra do mesmo ano. Dessa ligação
samba pelas noites do Porto. surgiu uma música, Cadê
A casa-mãe, que abençoou o Cascais, que entrou no pri-
D.R.

projeto, foi o extinto bar meiro álbum de originais da


Baixaria, lugar boémio em que banda, Na Fé, lançado em ver para figuras como a com- banda”, confirma Tiago Na-
os corpos se acotovelavam a 2020 (€10). positora e cantora brasileira carato, intérprete convidado
dançar numa autêntica caixa “Foi um orgulho incrível”, Teresa Cristina ou gravar nos do disco e ex-concorrente do
de fósforos, polvilhada de mú- diz Pedro Pinheiro, um dos estúdios de Caetano Veloso, The Voice que, nos Bamba
sica e com cheiro a bebida no membros fundadores dos no Rio de Janeiro. Social, se reencontrou com
ar, onde muitos casais se co- Bamba Social, sublinhando o Assim, neste crescendo da as suas raízes brasileiras.
nheceram ao som de canções “quão gratificante foi” escre- formação e de mediatismo, os “Passei por uma fase de
de Dona Ivone Lara, Zeca Pa- seis temas do novo Samba de renegação musical, porque o
godinho, Adoniran Barbosa e Bolso parecem surgir quase meu pai é músico brasileiro,
de outros mestres sambistas Na Fé, lançado em contraciclo, como se o ál- a minha mãe também é bra-
que os luso-brasileiros Bamba em 2020, foi o bum sussurrasse as saudades sileira, e então estava mais
Social trouxeram para este primeiro álbum do grupo por aqueles aperta- na cena do rock. Depois, uma
lado do Atlântico. de originais da dos palcos da Invicta que os namorada minha levou-me a
De 2012 para cá a formação Orquestra Bam- consagraram no início da uma festa dos Bamba, no Bai-
foi crescendo e até ganhou o ba Social e inte- década. “Este disco vai ao en- xaria, e aí fez-se uma luzinha.
prefixo de Orquestra, ao jun- contro daquilo que as pessoas Essa festa mudou tudo”,
tar 17 músicos em palco, que
grou parcerias estavam habituadas a ouvir e, recorda Tiago.
esgotaram por duas vezes a com Marcelo ao mesmo tempo, faz um tri- Desde então, Nacarato foi
sala Suggia, a maior da Casa D2, Teresa buto ao que fez crescer a dando voz a muitos sambas
Cristina, Tiago referenciais dos Bamba So-
Nacarato, André cial, como os clássicos que
Indiana e outros agora foram repescados para

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de bolso deste “senhor musi-


cal centenário, mas ainda
cheio de amor para dar”. En-
tre filmagens de estúdio a
acompanhar a banda sonora,
surgem pequenos separado-
res com narrações de Luca
Argel (também ele um “bam-
ba”) e Pedro Pinheiro, que se
sobrepõem a imagens a preto
e branco de um Brasil dos
anos 1930, intercaladas com
elementos espaciais, a suge-
rir, por graça, que o samba
nasceu antes do Big Bang:
“Essa ideia deriva da des-
O Jardim das compensação natural das
Delícias, de coisas”, explica Nacarato: “Se
Marie Choui- existe felicidade, também
nard, repro-
duz em palco existe tristeza, e o samba vem
cenas do da tristeza.” Uma tristeza –
quadro em prossegue – “surgida da
tríptico de precariedade social, que
Hieronymous na atualidade continua a
acentuar desigualdades”.
É por isso que Pedro e Tiago
defendem que o samba, hoje,
mantém, na sua intenção, a
Tiago Naca- mesma importância e resi-
rato (à fren- liência que tinha na sua gé-
te, de gra- nese: “Quisemos pôr compo-
vata) com sições dos anos 70 a fazer
a Orquestra sentido no século XXI, daí ha-
Bamba So-
cial, no Ma- ver uma mensagem muito
jestic Café, forte na narração do filme.”
no Porto Depois de terem esgotado
três datas em 48 horas no
clube Hot Five, no Porto, os
O novo Bamba Social estão a fazer
trabalho, Samba tudo para se meterem à es-
integrar Samba de Bolso. No- de Bolso, é trada com os seus sambas de
mes de compositores como apresentado bolso, “que permitem concer-
Ismael Silva, Noel Rosa, Can- num formato tos em modo pocket show” e
deia, Cartola, Paulo César Pi- audiovisual, também com o seu Na Fé, de
nheiro, João Nogueira, Caeta- originais, com a formação
no Veloso e Gilberto Gil (lem-
aliando ao mais alargada. Porém, por
brando que o samba é tão ca- SAMBA álbum o causa da pandemia, ainda há
rioca como baiano) dialogam
DE BOLSO
Streaming grátis
lançamento algumas incertezas. Para já
com a atualidade através de • Vídeo: YouTube da de uma curta está confirmado um concerto,
um filme que o grupo lançou, Orquestra Bamba
Social
metragem a 3 de abril, no Teatro Sá da
em simultâneo com o álbum, Bandeira, no Porto, e uma vi-
no seu canal de YouTube. sita ao Reino Unido, no fim
“Tivemos uma discussão in- até para nos adaptarmos aos do ano – sempre com Naca-
terna. Pareceu-nos que lançar tempos que correm”. rato, agora também com co-
um disco hoje, principalmente O diálogo entre música e ração de “bamba” a bater ao
com músicas de outros, não imagem surge no formato de ritmo do samba. W
fazia assim tanta mossa artís- uma pequena narrativa da
tica. Então, achámos muito história do samba, funcio-
interessante fazer um vídeo, nando quase como um guia

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ESTA AVENIDA É UM MUNDO


Ao longo do século XX foi crescendo, ligando a Baixa da cidade à Lisboa que crescia. Atlas Almirante Reis conta
essa história, relacionando-a com o seu presente multicultural, voltado para o futuro. Por André Santos

As fotos de
Paulo Catrica
ilustram o
livro, mostran-
do lugares
emblemáticos

À volta da bor da iniciativa privada e sem-


avenida, nas-
ceram bairros pre de uma forma tímida. É o
distintos – lado pobre da cidade, não é o
“o lado pobre lado nobre, com grandes obras,
da cidade” grandes edifícios.”
O investimento privado e a
O “ATLAS” no título não é ino- sobre este eixo de Lisboa”. As- costela comercial da Almirante
cente. As coordenadoras deste sim nasceu o projeto deste Atlas “Não teve gran- Reis são temas que lançam
projeto-livro, Filipa Ramalhete, Almirante Reis, que não é um des projetos de várias ideias sobre a atualidade
Margarida Tavares da Concei- livro académico, mas uma obra da avenida. Percorrê-la, da Bai-
ção e Inês Lobo, quiseram estu- acessível e curiosa.
obras públicas, xa ao Areeiro, é sentir uma evo-
dar a Avenida Almirante Reis, A ideia germinou de muitas foi sempre uma lução do século XX: vai-se
mapeá-la, sim. Contudo, a conversas: “O que fica de fora avenida que se avançando no tempo ao longo
intenção passou também por quando se sai desta ideia do foi expandindo da sua extensão.
integrar a História no presente, bairro? Que zonas de Lisboa, ao sabor da ini- Mas não só: a Almirante Reis
combinando o desenvolvimen- que não são Baixa, fazem parte ciativa privada, também narra a ligação entre o
to da avenida com o de Lisboa. das linhas estruturais da cida- de forma tímida” passado e o constante presen-
Assim nasceu um livro a várias de? Era frequente a resposta ser te-futuro de Lisboa, na forma
mãos, com textos de diversos como não termina na Pç. Fran-
autores e diferentes análises so- a Almirante Reis.” A avenida é, cisco Sá Carneiro, percecionan-
bre uma das mais importantes e na verdade, uma linha que liga do-se aí uma extensão natural
estruturantes artérias da cidade. a cidade velha (a Baixa) àquela até ao aeroporto, através da Av.
Em 2016, as coordenadoras que se foi expandindo a partir Almirante Gago Coutinho.
organizaram uma conferência das artérias principais/centrais Além disso, é a avenida de
com convidados que tinham (Av. Liberdade e suas exten- Lisboa que representa a multi-
estudos, ou estavam a iniciá- sões). À sua volta, bairros com culturalidade – em Arroios, vi-
-los, sobre a Avenida Almirante características próprias foram vem 92 nacionalidades – e al-
Reis. Filipa Ramalhete diz à SÁ- crescendo e transformando-se guns dos negócios do futuro.
BADO que a ideia, ao chamar ao longo do tempo. As fotos de Paulo Catrica
esses investigadores, passava O que surpreende no livro são ilustram bem alguns dos mui-
por ter visões “pluridisciplinares ATLAS as suas peculiaridades: “Não tos lugares emblemáticos da
ALMIRANTE teve grandes projetos de obras avenida e os ótimos mapas
REIS
• Ed. Tinta da China públicas, foi sempre uma aveni- carregam o simbolismo do
€32 da que se foi expandindo ao sa- “Atlas” do título. W

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HUAWEI
MATEPAD T8
provador
Lojas
Media Markt,
Worten, Fnac
• €99 (Preço
médio)

O LOW-COST
QUE FAZ
QUASE TUDO
O Huawei MatePad T8 é
um tablet de 8 polegadas
com um preço acessível,
bateria que dura e dura,
mas sem apps da Google.

COMECEMOS PELO problema instalar a maioria das apps dis-


evidente para todos os que poníveis para Android – ou
compraram um produto versões web delas. É quase a
Huawei lançado em 2020, mesma coisa, mas só quase.
mas talvez menos visível para Essa é a grande limitação do
quem já venha utilizando um MatePad T8 que, mesmo assim,
telemóvel desta mesma marca continua a ser uma boa solução
chinesa: a ausência de apps pelo que só os novos Huawei gadgets mais premium – até abaixo de €100 para quem pro-
da Google, consequência de foram afetados. ao momento em que quis ins- cura um gadget para ver filmes,
Trump ter colocado a Huawei Ora, vem isto a propósito talar algumas apps que já usa- para os filhos pequenos se en-
numa lista de empresas com do Huawei MatePad T8, um va no smartphone de 2019. treterem ou para ler um ebook,
as quais as americanas não “grande” tablet de 8 polegadas Não há Google Play Store e com uma bateria capaz de
poderiam ter negócios. que foi lançado abaixo de mas há alternativas, como a aguentar um dia inteiro de
A decisão, de maio de 2019, €100 e que se revelou uma Huawei Appgallery (com ver- utilização intensa. W
não acarretou retroativos, surpresa agradável desde que sões Huawei de algumas apps) MARKUS ALMEIDA TEXTO
saiu da caixa – pela qualidade ou o Petal Search, que cria um
do ecrã, pelo design e pelo to- interface que contorna o blo-
que metálico condizente com queio americano permitindo

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Estilo

PORTUGUESAS AINDA HÁ quem entre num


fanqueiro à procura de toalhas
como aquelas que tinha no

E PARA DURAR
seu enxoval: resistentes e du-
radouras. Provavelmente, es-
ses atoalhados comprados há
20 anos (ou mais) são Torres
As toalhas Torres Novas, clássicas nos lares portugueses, estão de volta, animadas Novas, a marca dos anos 70
por uma geração mais nova. Ecológicas, prometem décadas de uso. Por Catarina Moura que faliu em 2011 e deixou
muitos sem resposta quando
procuravam por toalhas no
comércio tradicional. A Torres
Novas está agora de volta,
reanimada pela geração mais
nova da família, com preocu-
pações ecológicas e a prome-
ter toalhas que assegurem en-
xovais nas próximas décadas.
Quando pegou na marca
falida do tio-avô Adolfo de
Lima Mayer, Nuno Vasconcel-
los e Sá não tinha noção de
que esta marca era tão queri-
da pelos portugueses. “Percebi
que não era só eu que toda a
vida tive estas toalhas em casa
e que não havia muito além da
Torres Novas [no segmento
dos atoalhados]. Mesmo que
muitos não a reconhecessem
[pelo nome], usavam os
nossos produtos, e muitos
perguntavam pela marca nos
nossos revendedores do co-
mércio tradicional e não sa-
biam que já não existia”, conta
o sócio que agora se juntou a
Inês Vaz Pinto e Miguel Cas-
tel-Branco para trazer a Tor-
res Novas de volta ao mercado
hoteleiro e do grande público.
Os três passaram os dois pri-
meiros anos a perceber como

“Muitos pergun-
tavam pela mar-
ca nos nossos
revendedores
do comércio
tradicional e
Os atoalha-
dos Torres
não sabiam que
Novas re- já não existia”,
gressaram diz Nuno Vas-
ao grande
público
concellos e Sá
no fim
de 2020

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funciona o mundo dos atoa-


lhados, já que vêm de áreas
muito diferentes – Inês, da co-
municação, Nuno e Miguel, da
gestão de marcas. O plano foi
relançarem-se em 2019 com
os clientes da hotelaria. Foi a
pandemia e o fecho de hotéis
que precipitou a venda direta
ao público e a retoma dos con-
tactos com as lojas especiali-
zadas que vendiam Torres No-
vas. “Agora vejo que devíamos Todas as
toalhas
ter chegado ao grande público são 100%
mais cedo. A Torres Novas é algodão e
um nome muito querido”. produzidas
A crise financeira de 2008 em
fez com que muitos clientes Portugal
não pagassem os seus créditos
e a marca abriu falência em
2011. “É natural que muita cientes desse problema, mas Os modelos A construção das toalhas é
gente não tenha dado conta. não é um campo em que os re- do passado são essencial para a sua durabili-
Se a Zara ou a Ikea falirem, sultados sejam óbvios. Não é para já a maior dade e, nesse campo, os três
damos por isso, porque ven- claro que o algodão orgânico inspiração, mas novos sócios juntaram pessoas
dem produtos que se estragam tenha um melhor impacto am- o futuro traz que trabalharam na Torres
rapidamente e precisamos de biental – precisa de mais água Novas na sua era dourada
voltar a comprar. A falência de e não dá fibras tão compridas,
novos designs, para serem conselheiros. Em-
uma marca que se compra de portanto as toalhas não duram cores e bora a fábrica original já não
10 em 10 anos é mais difícil tanto”, explica Nuno. produtos funcione, os atoalhados são
notar”, diz Nuno. produzidos em fábricas que já
A durabilidade destas toalhas A Luxus no passado tinham sido par-
também faz parte de uma é a linha ceiras da Torres Novas e que
mentalidade ecológica que os intermédia adaptam a sua produção aos
da Torres
novos impulsionadores da Novas padrões da marca.
marca trazem consigo – sem- Os modelos do passado são
pre com Adolfo, hoje com mais para já a maior inspiração, à
de 80 anos, como maior guia. venda no site da marca e em
Tal como qualquer produto, lojas especializadas (a lista
um atoalhado com uma longa está disponível também onli-
vida útil não produz tanto lixo ne), mas “o futuro trará novos
e a isto junta-se a confeção designs, cores e produtos”,
100% algodão das novas toa- assegura Nuno.
lhas e tapetes de casa de ba- Se a Torres Novas é sinóni-
nho. Não há qualquer friso ou mo de conforto e qualidade
fantasia colorida feita em po- associado ao banho, o próxi-
liéster. “Isto dificulta alguns mo passo é investir em cole-
passos da produção”, explica ções de roupões ou até de chi-
Nuno Vasconcellos e Sá, mas nelos – um esforço redobrado,
garante que, nas sucessivas la- já que isto implica a constru-
vagens, por exemplo, não haja ção de modelos para vários
libertação de microplásticos tamanhos e números, mas
para as águas. que se revela imprescindível
Se por um lado o algodão é num momento em que estar
completamente biodegradável, bem em casa é um luxo. W
por outro, o seu cultivo tem um
grande impacto ambiental, pela
quantidade de água que impli-
ca e pela exaustão dos solos,
por exemplo. “Estamos cons-

109
Opinião
Passatempo

por Inspector Fidalgo

SETE DE ESPADAS SECC


EM 1947, O SETE DE ES- tusiasmo pela boa li-
PADAS INICIOU UMA teratura de mistério e
LONGA CARREIRA aventura.
de seccionista policiário, verdadei- Quando fui até ao nosso
ramente a sua melhor faceta, apesar diretor para lhe levar a
de ser um excelente produtor, como ideia desta secção, confesso
vimos na semana passada, e um que fui a medo, mas encon-
bom solucionista. trei nele um Amigo, que des-
Foi no Jornal de Sintra de 12 de janei- de logo aceitou e acarinhou
ro, chamava-se “Mistério e Aventura” esta resolução, dizendo-nos:
e assumia-se como “secção policial — De vez em quando, sair
orientada por Sete de Espadas”. fora do sistema rotineiro tam-
O seu primeiro texto, de apresenta- bém sabe bem…
ção, dizia claramente ao que vinha: O facto de nos apresentarem
“Leitores e caros colegas: como orientadores desta secção
O nosso meio é pequeno e refratário não significa um maior mereci-
a empreendimentos desta natureza. mento, simplesmente — era preciso
Estou certo de que não faltará quem se alguém fazê-lo!...
erga da sua cátedra para nos atirar Confiamos, pois, na benevolência
com a já tão conhecida e velha frase: dos nossos leitores e na amizade dos
Literatura de cordel… meus camaradas.
Estes catedráticos es- Tentaremos agradar e
quecem-se, todavia, de
que a literatura de emo-
k cá os esperamos neste
cantinho — que é de todos.
ção e a resolução de pro- MÉDICOS, Sete de Espadas”
blemas policiais são dois ADVOGADOS, Mas antes, em 1946,
dos grandes recreios do ENGENHEIROS, uma publicação brasilei-
espírito. Estadistas de E MUITAS OU- ra, Policial em Revista,
todo o mundo, afadiga- TRAS PERSONA- trazia à estampa um tra-
dos pelo vertiginoso GENS DE CATE- balho de um leitor portu-
atropelo dos aconteci- GORIA SOCIAL guês, assim apresentado
mentos internacionais, CONFESSAM A pelo redator:
buscam um pouco de SUA SIMPATIA “Veio-nos de Portugal,
tranquilidade no exercí- PELA BOA há algum tempo, uma co-
cio cerebral que lhes ofe- LITERATURA laboração de Manuel José
rece a leitura dos grandes DE MISTÉRIO Lattas, residente em
romances policiais e a E AVENTURA Agualva-Cacém. Se tem
resolução dos grandes boa memória devem lem-
problemas. Médicos, advogados, en- brar daquele bem feito trabalho intitu-
genheiros, senhoras da melhor so- lado ‘Chesterton ou Wallace?’, que deu
ciedade, estudantes, cientistas e início em nossas colunas a uma polé-
muitas outras personagens de cate- mica do nosso colaborador A.B.. Hoje
goria social, não se envergonham de inserimos novo trabalho do Amigo
confessar a sua simpatia e o seu en- Português.” W

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CIONISTA DESDE 1947


Por Manuel José Lattas

VANTAGENS DA LÚCIFER INTERVEIO


NA HISTÓRIA
LITERATURA DE FICÇÃO Como prometido na passada semana, aqui fica
a solução dada pelo Sete de Espadas ao seu
problema, com que se sagrou campeão nacio-
PROCURANDO BONS AU- e de toda a espécie de especialistas nal, em 1958:
TORES, CUJAS TRADUÇÕES não podia deixar de ser observante e a) O assassino foi Flamínio.
são bem cuidadas, eu posso encon- exigente; e para satisfazer este Argos b) Lerroux não podia ser: tão nervoso e desajei-
trar entre as suas personagens to- de olhos inexoráveis tornou-se ne- tado nos gestos (tombara uma jarra ao narrar o
dos os tipos do dia a dia da vida, cessário um extremo cuidado na seu caso passional) não podia ter praticado um
verdadeiramente retratados, abso- construção e apresentação da histó- crime que não deixou rasto.
lutamente reais e ligados por ria. Um erro ou deslize podia deitar c) Bernard também não: a ponta do charuto
aquele fio que assenta em bases de abaixo ou invalidar a solução. Cada fora trincada, e o capitalista havia quatro dias que
pura dedução lógica e me encami- nova conquista da ciência criou res- extraíra os dentes incisivos. Ilibado.
nham para a resolução final de um ponsabilidades novas. A história poli- Logo, foi Flamínio. Como?... O “Mefistófoles” ao
problema que me atrai e seduz. cial manobra hoje todos os lados da zangar-se com Bernard e, dois dias após, com o
Lendo-os, eu encarno, um a um, to- ciência, da arte e da lei. banqueiro, quis, de um tiro, matar dois coelhos.
das as suas personagens e posso sen- E por tudo isto e pelo muito que fica De índole cruel, inteligente e terrivelmente pláci-
tir amor, paixão, desilusão, ódio, ciú- por dizer, eu não tenho medo de me do, recorrendo às suas habilidades de faquir, fácil
me, cinismo, abnegação, justiça e confessar um defensor da literatura lhe foi furtar um dos famosos charutos do capita-
toda a gama de sentimentos que nós policial, que já não faz encolher desde- lista; depois, mercê de um plano lucidamente ela-
mortais temos cá dentro, calcados nhosamente os ombros senão a uma borado, assassinou rancorosamente o banqueiro,
bem no fundo do nosso íntimo, mais meia dúzia de senhores muito sérios e não deixando o mínimo vestígio – a não ser o
ou menos em estado latente. superiores a estas coisas, tudo o que “Dounia”, que, mais tarde ou mais cedo, após la-
Além do magnífico e salutar exercí- seja realmente vivo e do nosso tempo. boriosas pesquisas, havia de meter o Bernard
cio cerebral, eu vou encontrar sem- Entre os mestres do género, sem numa prisão. Tudo parecia infalível.
pre, nas páginas da literatura policial, margem para discussão, está coloca- Desgraçadamente, o “italiano” ignorava – a sua
uma figura que me domina e que me da a criadora da figura extraordinária inteligência não podia adverti-lo disso… – o per-
prende, quer esteja encarnada num do detetive amador Sir Edward Palli- calço dentário que quatro dias antes sucedera
inspetor de polícia, num advogado ser, morador no nº 9 de Queen An- ao capitalista.
ou num detetive particular, mas que ne’s Close, um beco sem saída — Lúcifer interviera na história…
é, acima de tudo, um magnífico pala- Agatha Christie! Estas são as provas essenciais. Mas há porme-
dino da justiça e da moral, cumpridor Prefiro, porém, Oppenheim! nores secundários facilmente percetíveis. Por
da lei, que a lei é muitas vezes sofis- Mais romancista! Os seus livros são exemplo, Lerroux havia dois anos que não entra-
ma, e um lutador enérgico contra o sempre histórias bem delineadas e va em casa de Bernard; Flamínio apenas oito
Universo cheio de mentiras idealista bem dosadas. Ele não tem necessida- dias – por conseguinte, só este tinha possibilida-
e onde o mal impera. de de forçar; não procura as histórias de de furtar o famoso “Dounia”. Lerroux era o que
Confesso que leio livros policiais e de rabo torcido e também não tem mais odiava o banqueiro e perdia a serenidade
isso não me assusta nem me diminui. necessidade de puxar muitos cordeli- ao vê-lo; e o seu rancor a Bernard, datando de
A crescente expansão do romance nhos para a movimentação das suas dois anos, era labareda infernal!
policial trouxe as suas obrigações e personagens. Ali tudo é natural e lógi- Ora, um homem assim violento, que em tão
deveres; um vastíssimo público, co. Nada de aventuras rocamboles- longo espaço de tempo não buscou oportunida-
composto de homens das leis e de cas, nem plataformas especiais. de para revindicta, é porque não tem feitio para
ciência, de médicos, de engenheiros Simples! Humano! Leal! W assassino… W

111
Do leitor leitores@sabado.cofina.pt

A voz de Portugal
tras áreas, vai estar sempre à frente dos
nossos olhos, que o queiram “visitar”
por vários lugares onde ele se “sentou”
com arte e magia, saída de dentro da
pedra difícil, mas tão macia quanto o
som de um Stradivarius. Ele sim, mere-
ce o nosso aplauso”. (...).

L
Vítor Colaço Santos
São João das Lampas

O debate da peixeirada
O anunciado debate na TVI24, entre
João Ferreira e André Ventura, não
aconteceu. Houve uma peixeirada que
o inquinou. A moderadora nada
moderou! O que esteve lá a fazer? A in-
tervenção inicial de Ventura foi escuta-
da por Ferreira. Quando este iniciou a
sua intervenção foi logo sucessiva e in-
L corretamente interrompido. A modera-
Francisco Barros dora, coitada, não teve pulso, engenho
Monte Estoril e autoridade (e tinha-a na plenitude),
Depois de Amália, ficámos sem a voz do fado. Carlos do Carmo, que até um para que houvesse urbanidade e edu-
dia pensou que iria correr mundo numa outra profissão, veio para o fado e cação política por parte do candidato
ficou! Amava a sua cidade de Lisboa e foi “embaixador” de Portugal pelo antissistema democrático Ventura.
mundo fora, merecendo todas as homenagens prestadas na despedida, e Este, quase não deixou o interlocutor
o lugar dele é no Panteão, ao lado da diva Amália. Ficará para sempre na expor quaisquer ideias. Quando o ar-
memória de quem gosta de fado e da boa música portuguesa, pois... por gumentário é medíocre não se deixa
morrer uma andorinha, não acaba a primavera! falar o adversário político... com a
inexplicável complacência da jornalis-
ta. Temos poucas dúvidas em afirmar
que esta lastimosa peixeirada também
L L afastará as pessoas do ato eleitoral –
Emanuel Caetano Joaquim Moura fazendo subir a abstenção! Acresce
Ermesinde Penafiel que todos os candidatos apelam para
Assalto ao Capitólio Partiu o verdadeiro artista que haja uma corrida maciça às urnas,
mas cada vez estão mais divorciados
Donald Trump parece aquela cárie Morreu João Cutileiro, um encantador do pulsar do povo...
que obriga à desvitalização de um escultor que afinava o mármore como
dente em vez da sua extração. Quando se fosse uma guitarra ou um violino.
parece que finalmente vai deixar de Escultor polémico, trabalhador, mas a
doer, volta aquela “moedeira” irritan- pedra que ele tocava a escopro e mar-
Correção
te, sinal de que ainda existem bacté- telo não se confundia com cordas vi- Na edição passada escrevemos
rias. A invasão dos seus apoiantes ao brantes e tão enaltecidas por quem que a plataforma de crowdfunding
Capitólio, símbolo do idealismo de- nem um sopro em flauta se fez ouvir, GoFundMe cobra 10% do montante
mocrático americano, ao tentar impe- ver, ou marcar presença num verso angariado a título de comissão. Na
dir a ratificação dos votos das eleições simples, até aos dias gelados que hoje verdade, o valor mais correto é 7,55%
presidenciais que deram a vitória a Joe se fazem sentir. (...). Cutileiro teve azar (mais 0,25 euros por doação): a plata-
Biden e a consequente transição do em nascer e viver fora da capital dos forma cobra uma comissão de 5% aos
poder, é a prova de que eleger um po- lobbys e dos oportunistas e terá direito organizadores, a que se somam 2,55%
pulista demagogo e insidioso é perigo- a honras mais simples e sem espetáculo (mais 0,25 euros) de tarifas de transa-
so. Só lamento que as autoridades po- com câmaras a cobrir em ângulo pouco ção por cada doação. Se for usado
liciais, sempre tão nervosas no gatilho aberto. Vamos ver quantos dos alfaci- um cartão fora do espaço económico
para outras ocasiões, tenham deixado nhas lhe vão prestar homenagem na europeu, soma-se mais uma taxa de
conspurcar um local que conta a His- hora de ele ir a enterrar, com ou sem a 1,5%, ultrapassando assim os 9%.
tória dos Estados Unidos e dos seus presença do senhor de Belém e das sel-
Presidentes. fies. João Cutileiro, intelectual em ou-

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Conselho de Administração Paulo Fernandes (Presidente),


João Borges de Oliveira, Luís Santana e Alda Delgado
Diretora Geral de Marketing Isabel Rodrigues
Diretor Geral Comercial Luís Ferreira
Diretora Administrativa e Financeira Alda Delgado
Diretor-Geral Editorial Octávio Ribeiro
Diretores-Gerais Editoriais Adjuntos Armando Esteves Pereira e Alfredo Leite
Diretor do Departamento Gráfico Pedro Freire
Diretor de Circulação João Ferreira de Almeida ,
Directora de Assinaturas e Reader Revenue Rita Serrano
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Infografia Rúben Sarmento da Natura para um 2021
Tratamento de Imagem João Cruz e Nuno Marques
Ilustração Miss Inês, Luis Grañena, Susana Villar, Vasco Gargalo especial. Vestido: €29,95.
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Filipe Lamelas, João Cortesão, Miguel Baltazar e Tiago R. Santos em dias mais confortáveis, a
Estatuto editorial (Leia na íntegra em www.sabado.pt)
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SA (100%) Tel. 214 345 400
N.º Registo ERC 124436 Distribuição loção suave com aroma de alfazema
N.º ISSN 0872-8402 VASP – Distribuidora
Depósito Legal 210999/04 de Publicações, Lda. restaura a barreira natural da pele e
Tiragem média no mês de Junho MLP: Media Logistics
65 mil exemplares Park Quinta do Grajal – Venda Seca, melhora a condição da pele seca e
2739-511 Agualva, Cacém
sensível em apenas duas semanas.

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Crónica 14 JANEIRO 2021
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CUIDADOS a França a servir de carro-vassoura.


Culpa de quem?
utilizadores. Se fossem, e tendo em
conta a beleza dos pensamentos que
INTENSIVOS Sim, da burocracia e da incompe-
tência de vários Estados-membros.
por lá são medrados a um ritmo infer-
nal, o Twitter, o Facebook e tutti quan-
Eu ainda me lembro dos tempos pré- Mas a revista Spectator dedica um ar- ti não durariam um dia, uma hora, um
-bacalhau cozido, em que o número de tigo ao assunto e oferece números minuto. O volume das indemnizações
infectados e mortos era ridiculamente complementares: o orçamento para a em tribunal levaria à falência todo esse
baixo. Como se passa de uma situação vacinação no Reino Unido (tradução: olimpo de Silicon Valley.
totalmente sob controlo para esta 66 milhões de pessoas) era de 13 mil Claro que, para invocar a famosa
desgraça sem remédio? milhões de euros. A União Europeia, secção 230 da Communications De-
com 448 milhões de almas, reservou cency Act (1996), as grandes platafor-
inicialmente 2 mil milhões. Alguém se mas podem filtrar “em boa fé” con-
espanta com a evidente escassez de teúdos extremos. Como, por exem-
vacinas, que já leva o Presidente Mar- plo, pornografia infantil ou planos
celo a chutar para meados de 2022 a terroristas. Mas as coisas mudam de
imunização geral da pátria? figura quando o Twitter, por exem-
Estamos como sempre estivemos: plo, decide banir as loucuras de
C entregues aos humores do bicho. Trump – mas não, por exemplo, as

Vitórias SERÁ QUE A INTERNET vai sobre-


exortações genocidas do aiatola ira-
niano contra Israel. Como justificar

de Pirro viver como a conhecemos depois de o


Twitter ter banido Donald Trump do
essas duplicidades?
Não faço ideia: por mim, e excep-
palco? Na cabeça superficial dos in- tuando os casos aberrantes acima cita-
NO MOMENTO EM QUE ESTE arti- dignados, sem dúvida: depois do sel- dos, o melhor era não vestir o traje de
go for publicado, o País já estará nova- vático assalto ao Capitólio, o que o director de jornal. Porque não é possí-
mente recolhido. Nós merecemos. O Twitter fez foi serviço público. Quem vel ser director de jornal sem a respon-
Governo, do alto da sua imensa bon- precisa daqueles textículos que enlou- sabilidade civil e penal associada.
dade, tolerou que os portugueses fos- quecem várias cabeças inflamadas? O gesto temerário do Twitter contra
sem comer o bacalhau cozido a casa Eu precisava, confesso: prefiro sa- Trump pode ser uma vitória progres-
uns dos outros. Resultado? Explosão ber o que o Donald pensa ou faz às sista momentânea. Mas é uma vitória
de mortes e um sistema nacional de claras do que este silêncio imposto, de Pirro, que convidará Washington a
saúde a rebentar pelas costuras. unilateralmente imposto, por uma repensar o modelo do negócio. Re-
Curioso. Eu ainda me lembro dos empresa tecnológica que detém um publicanos e democratas, aliás, estão
tempos pré-bacalhau cozido, em que poder quase absoluto na comunica- irmanados nesse desígnio, há vários
o número de infectados e mortos era ção contemporânea. anos, ainda que por motivos distintos.
ridiculamente baixo. A 13 de Dezem- Mas o gesto do sr. Jack Dorsey, pa- Só nunca esperaram que a corda para
bro, se a memória não me falha, foram trão e xerpa da empresa, oferece um o enforcamento fosse fornecida pelo
98 vítimas mortais. Como se passa de problema adicional: o Twitter e as ou- próprio enforcado. W
uma situação totalmente sob controlo tras plataformas apresentam-se, pre-
para esta desgraça sem remédio? cisamente, como plataformas. Não são Texto escrito segundo
Um antipatriota, daqueles que o dr. responsáveis pelo conteúdo dos seus o anterior acordo ortográfico
Costa gosta de denunciar em directo,
diria que o problema é mais antigo. E
que a repetida incapacidade para
testar, isolar e tratar dos infectados
com todos os recursos disponíveis,
públicos ou privados, só podia acabar
como acabou. O bacalhau foi apenas
a estocada final.
Verdade que nem tudo é culpa da
nossa raça: a União Europeia, que não
foi exemplar no início da pandemia,
podia ter aproveitado este momento
para se redimir com as vacinas.
Azar: Israel vacina em quantidade;
C o Reino Unido também; até os Esta-
Politólogo, escritor dos Unidos lá vão despachando o ser-
PAULO CUNHA

João Pereira viço. Mas a Europa, arrastando os pés,


Coutinho tem números que envergonham, com

114
Não se trata de um dispositivo médico. Não nos responsabilizamos pela sua utilização incorreta. Consulte as instruções que se encontram na embalagem. Imagem não contratual. Pressupõe aaquisição da revista. Oferta válida na compra da TV Guia de 14 de janeiro.

Juntamos o cuidado
à informação.
..
A TV GUIA e a KARCHER oferecem, no dia 14 de Janeiro,
viseiras a todos os leitores.
A viseira é para uso pessoal/individual e não para fins médicos.

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Cuidar de nós é cuidar dos outros.

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