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Produção textual e expressão oral

Apresentação
A produção textual envolve uma série de conhecimentos e usos adequados dos elementos
linguísticos. Além disso, um texto não se baseia apenas no aspecto escrito, mas também na
oralidade. Nesse sentido, para produzir um texto que seja informativo, coerente e que cumpra a
função de comunicar, é preciso conhecer todos os elementos linguísticos, bem como as
modalidades da língua: fala e escrita.

Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai identificar como ocorre a produção textual nas
modalidades escrita e da oralidade, bem como os elementos que são essenciais para sua
construção, incluindo coesão, coerência, clareza e adequação à norma culta. Além disso, vai refletir
também sobre a importância e o papel da oralidade no processo sociocomunicativo.

Bons estudos.

Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

• Identificar a produção de textos orais e escritos no processo sociocomunicativo.


• Produzir textos relacionados ao cotidiano com clareza, concisão e adequação à norma culta.
• Reconhecer a oralidade como forma de comunicação e as técnicas de apresentação e
expressão oral.
Desafio
A oralidade é uma habilidade humana intrínseca, mas pode ser desenvolvida como ferramenta
estratégica em qualquer organização, pois atua como um meio de compartilhar conhecimento e
estabelecer relacionamentos dialógicos.

Para que a oralidade seja utilizada de maneira efetiva, é preciso que o ato comunicativo da fala
aconteça de maneira clara, objetiva e envolvente. Essas habilidades podem ser desenvolvidas com
técnicas específicas e conhecimento aprofundado dos elementos linguísticos que compõem a
língua, além do conhecimento das diferenças entre as modalidades de fala e escrita.

No âmbito organizacional, é comum a utilização de discursos como forma de comunicação entre


lideranças e colaboradores. Entendendo a importância do discurso, considere o seguinte cenário:
O texto apresentado é uma descrição literal da fala; por isso, você, como profissional de
comunicação da empresa, identificou alguns problemas e também vícios de linguagem, como
cacofonia, ambiguidade, redundância, repetição e pleonasmos.

Diante disso, seu Desafio é reescrever o discurso do CEO, respeitando os elementos linguísticos,
como coesão, coerência, concisão, clareza e adequação à norma culta, e eliminando os vícios de
linguagem.
Infográfico
A produção de um texto é um processo que requer o domínio e o conhecimento dos elementos
linguísticos fundamentais, como coesão, coerência, clareza e concisão. Sem a aplicação adequada
desses elementos, um texto pode assumir a característica de um aglomerado de palavras ou
sentenças que não comunicam nada.

Neste Infográfico, você vai conhecer, detalhadamente, os elementos indispensáveis para uma boa
produção textual.

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Conteúdo do livro
A produção textual é um processo que agrega um conjunto de teorias linguísticas da enunciação
aplicadas às modalidades escrita e falada. A língua é um fenômeno social, uma forma de interação
social entre os indivíduos, portanto, precisa ser compreendida em uma complexidade e
abrangência.

O primeiro aspecto é considerar que a língua atua em duas modalidades distintas: a escrita e a fala.
E, para a produção textual acontecer, é preciso compreender essas especificidades e os elementos
linguísticos que afetam sua construção.

No capítulo Produção textual e expressão oral, da obra Redação aplicada à comunicação, você vai
aprofundar seus conhecimentos sobre o processo de produção textual no âmbito escrito e da
oralidade, identificando como ele resulta em um processo sociocomunicativo. Além disso, também
vai refletir sobre a importância da oralidade e dos elementos linguísticos que auxiliam na
organização e na compreensão textual.

Boa leitura.
REDAÇÃO
APLICADA À
COMUNICAÇÃO

Juliane do Rocio Juski


Produção textual e
expressão oral
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Identificar a produção de textos orais e escritos no processo


sociocomunicativo.
 Produzir textos relacionados ao cotidiano com clareza, concisão e
adequação à norma culta.
 Reconhecer a oralidade como forma de comunicação e as técnicas
de apresentação e expressão oral.

Introdução
A produção de um texto envolve muito mais do que um aglomerado de
palavras ou sentenças. Para que a produção textual ganhe sentido e seja
passível de interpretação por parte dos leitores, é preciso que o autor
se utilize de elementos fundamentais em sua produção, como coesão,
coerência, clareza e concisão. Além disso, é imprescindível que conheça
as diferentes modalidades da língua, a fala e a escrita, e os detalhes que
diferenciam essas modalidades, para, assim, fazer construções textuais
nos mais diferentes gêneros textuais.
Neste capítulo, você vai estudar as principais diferenças entre a pro-
dução de textos orais e escritos que compõem o processo socioco-
municativo e vai observar quais são os principais elementos de uma
produção textual. Além disso, você vai poder refletir sobre a importância
da oralidade como forma de comunicação.

1 Produção textual: oralidade e escrita


Os textos se apresentam de diferentes formas e podem ser escritos ou narrados
de forma oral. O conceito de produção textual se refere a um conjunto de teorias
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linguísticas da enunciação, que qualificam a língua como um fenômeno social,


ou seja, uma forma de interação social entre os indivíduos. Nesse sentido, ao
se produzir um texto, é necessário considerar o significado daquilo que será
expresso em palavras. Além disso, é preciso considerar o motivo daquela men-
sagem, o modo como ela será transmitida e o contexto em que será recebida.
O texto, portanto, é o resultado de um processo comunicativo, em que os
atores sociais interagem por meio da linguagem. Nesses momentos de interação,
os sujeitos compreendem, concordam, discordam, interrogam e comparti-
lham significados com seus interlocutores. Mas, afinal, o que é linguagem?
Segundo Pugliese (2010), a linguagem pode ser definida como o meio pelo
qual os indivíduos transmitem, recebem e reconfiguram os conhecimentos e
a sabedoria que são necessários para o desenvolvimento de suas atividades
pessoais e profissionais.
De acordo com McLuhan (1974, p. 97 apud PUGLIESE, 2010, documento
on-line), a linguagem está envolvida em todos os atos, objetos e ações da
inteligência humana. “A linguagem é para a inteligência o que a roda é para
os pés, pois lhe permite deslocar-se de uma coisa à outra com desenvoltura
e rapidez, envolvendo-se cada vez menos. A linguagem projeta e amplia o
homem, mas também divide as suas faculdades”. A linguagem atua, portanto,
como o alicerce da cultura humana e o instrumento para as suas manifestações
e o seu desenvolvimento.
Faraco e Tezza (2016, p. 9) revelam ainda que a língua está presente em todas
as atividades humanas, desde nas suas atividades diárias e corriqueiras até
nos discursos e nas produções literárias. “É pela linguagem, afinal, que somos
indivíduos únicos: somos o que somos depois de um processo de conquista da
nossa palavra, afirmada no meio de milhares de outras palavras e com elas
compostas”. No entanto, conforme estabelecem os autores (2016), a língua é
composta pelas modalidades falada e escrita, ou seja, a linguagem inclui as
expressões orais e textuais. “Na verdade, a realidade primeira da língua é a
fala, tanto na história como na nossa história pessoal. Isto é, a escrita surgiu
depois, e fundamentada na realidade da fala” (FARACO; TEZZA, 2016, p. 9).

Língua falada
Uma confusão bastante comum é associar língua apenas à modalidade escrita.
Conforme estabelecem Faraco e Tezza (2016, p. 104), é preciso lembrar que
a língua utiliza dois meios de comunicação bem distintos, a fala e a escrita,
sendo que a fala antecedeu a escrita.
Produção textual e expressão oral 3

A cultura letrada, em geral, tem uma forte tendência a confundir língua com
representação gráfica da língua (escrita). Por força da tradição escolar e da
própria ideia de autoridade que emana da escrita, parece-nos mesmo que a
‘verdadeira língua’ é a escrita, sendo a fala uma espécie de subproduto dela,
de menor importância e sem nenhum prestígio.

Muitas vezes, esse preconceito em relação à língua falada ignora as carac-


terísticas, as peculiaridades e a espontaneidade da oralidade. A língua falada
abrange um processo comunicativo complexo em sua totalidade, pois exige
uma emissão e uma recepção recíprocas. Além disso, a oralidade é composta
pelo tom de voz, por gestos e mímicas, incluindo fisionomias. Todas essas
características formam o conjunto do processo comunicativo, que ocorre no
momento de se dar sentido ao que está sendo falado. Na língua escrita, esses
elementos não aparecem.
Faraco e Tezza (2016) destacam que a língua escrita é fundamentada na
realidade da fala. A oralidade possui tamanha importância que não apenas
precedeu a escrita, mas serviu de base para a construção dela. Os autores nos
auxiliam nessa compreensão, apresentando alguns exemplos para análise.

1. Eu conheço eles dês que a gente era colega de colégio.


2. Eu o conheço desde o tempo em que éramos colegas de colégio.
3. O sinhô vai armoçá gorinha memo? Não faiz mar, nóis vorta despois.
4. O senhor vai aumoçá nesse momento? Não faz mau, nós voltamos depois.
5. Vós poderíeis dizer, excelência, que estou equivocado.
6. Você podia dizê, cara, que eu errei.
7. Comprei um pacótchi di lêitchi.
8. Comprei um pacote de leite.
9. Mas tu quiria u quê?
10. Porém, tu querias o quê? (FARACO; TEZZA, 2016, p. 8–9)

Os exemplos apresentados pelos autores demonstram as diferenças de ordem


gráfica entre a escrita e a fala. É interessante notar que, mesmo saltando aos
olhos as grafias erradas e os erros gramaticais, é possível compreender perfei-
tamente que as frases de duas em duas possuem os mesmos significados, ora se
apresentando de maneira extremamente formal e culta, como nos enunciados
5 e 10, ora apresentando uma linguagem informal, como nos enunciados 6
e 9. Já nos enunciados 3 e 7, é possível assimilar que as frases em destaque
revelam sotaques, ou seja, variedades linguísticas com características regionais.
É exatamente a variedade e a diversidade linguística que Faraco e Tezza
(2016) consideram como características espetaculares da língua, em especial,
da oralidade. “Esta é a palavra-chave para qualquer compreensão da língua, o
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ponto de partida de nosso estudo: a variedade” (FARACO; TEZZA, 2016, p.


10). Para os autores, a língua é um conjunto de variedades, de diferenças e de
nuances que são construídas por meio da oralidade. A língua falada é o espectro
da linguagem que mais proporciona diferenciação e múltiplas perspectivas de
variantes; afinal, o sotaque, por exemplo, só é percebido por meio da fala — a
escrita não evidencia suas diferenças. Além disso, de acordo com os autores
supracitados (2016), a escrita, por conta de sua tradição e orientação escolar,
constrói um imaginário como se a língua fosse, na realidade, homogênea, fixa
e uniforme, quando ela é exatamente oposta a isso, pois é mutável, adaptável
e heterogênea.
Os autores (FARACO; TEZZA, 2016) ainda fazem uma reflexão sobre
as variantes linguísticas de um mesmo indivíduo. Ou seja, qualquer sujeito
letrado, quando está em um ambiente acadêmico, por exemplo, utiliza-se de
uma variante linguística mais próxima da língua culta, da língua formal (no
sentido de formalizada, normatizada). O mesmo indivíduo, se está em uma roda
de conversas com amigos, adotará outra postura linguística, mais despojada,
mais livre. Desse modo, é possível confirmar a adaptabilidade linguística do
sujeito; dependendo do contexto no qual ele está inserido, ele se apropria e
ressignifica a língua de uma forma distinta.
Para tratar das variantes linguísticas, Faraco e Tezza (2016) as classificam
em quatro tipos básicos.

1. Diferenças sintáticas: referem-se àquelas diferenças que decorrem da


ordem das palavras na fala (ele me disse × ele disse-me) ou de diferen-
tes modos de se realizar a concordância verbal (p. ex.: tu querias × tu
queria, ou nós estávamos × nós estava).
2. Diferenças morfológicas: referem-se àquelas variantes que decorrem
da forma da palavra, tomada individualmente (p. ex.: vamos × vamo).
3. Diferenças lexicais: referem-se aos diferentes nomes dados a um mesmo
objeto (p. ex.: pandorga × pipa × raia × papagaio).
4. Diferenças fonéticas: referem-se às pronúncias diferentes da mesma
unidade sonora, sem distinção de significado (p. ex.: porta, com erre
aspirado de um carioca × porta, com erre de um mineiro).

Essas variedades linguísticas são resultado de uma série de fatores que


influenciam a língua. Faraco e Tezza (2016, p. 12) destacam os fatores re-
gionais, ou seja, as características fonéticas que estabelecem os sotaques
regionalizados. “A região determina mais diretamente a pronúncia, mas tam-
bém pode diferenciar pelo vocabulário (mandioca x macaxeira) e pela sintaxe
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(Diga-me, em Portugal × Me diga, no Brasil)”. Já os fatores sociais indicam o


nível social do falante, a sua escolaridade e a sua relação com a escrita. “Aqui
as distinções tocam diretamente algumas formas da língua reproduzidas
pela escola e sustentadas pela escrita, como pontos de concordância verbal
(nós vamos × nóis vai) ou emprego de termos estigmatizados” (FARACO;
TEZZA, 2016, p. 12). Há também os fatores contextuais, ou seja, a situação
da fala que envolve um conjunto de circunstâncias que cercam o momento do
enunciado. “O mesmo falante empregará variedades diferentes da linguagem
dependendo de onde ele está, em uma sala de aula, no campo de futebol, em
casa, ou até da pessoa ou pessoas com quem ele está falando” (FARACO;
TEZZA, 2016, p. 12).
Correia (2013) complementa esses fatores apresentados por Faraco e Tezza
(2016) e aponta que as diversidades da língua ocorrem também por interferência
dos fatores culturais, que se referem tanto ao grau de escolarização como à
formação cultural do falante. Há também o fator profissional, ou seja, “[…] o
exercício de algumas atividades requer o domínio de certas formas de língua
chamadas línguas técnicas” (CORREIA, 2013, documento on-line). Isso inclui
a utilização de termos específicos, isto é, um vocabulário de uso restrito aos
profissionais que pertencem àquela área de atuação. Os fatores naturais, como
idade e sexo, segundo Correia (2013), também interferem na utilização da
língua falada. “Uma criança não utiliza a língua da mesma maneira que um
adulto, daí falar-se em linguagem infantil e linguagem adulta” (CORREIA,
2013, documento on-line).
Portanto, a fala é definida como a utilização da língua pelos indivíduos em
seus enunciados de fala. E, apesar de ser um ato individual, seu significado
é compartilhado e construído coletivamente, como reflexo de uma vivência
cultural e histórica entre os sujeitos que pertencem à mesma sociedade e
compartilham a mesma língua.
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É importante compreender a diferença entre língua, signo e fala. A língua se refere


ao conjunto de sinais que são compartilhados entre os indivíduos, como forma de
estabelecer comunicação; ela pode ser observada em duas modalidades: oral e es-
crita. Já o signo é um elemento representativo, que possui duas partes indissolúveis:
significado e significante. Ou seja, o signo é o elemento base para a construção de
uma linguagem. Por fim, a escrita é um conjunto de sinais baseado em palavras, que
obedecem a regras gramaticais, enquanto a fala é o uso que o indivíduo faz da língua,
caracterizado pela criatividade, flexibilidade e liberdade de expressão.

Língua escrita
Outra manifestação da língua abordada por Faraco e Tezza (2016) é a sua
representação gráfica, ou língua escrita. Os autores esclarecem que a tendência
de considerar linguagem apenas a modalidade escrita é parte do contexto
sociohistórico da humanidade. Ou seja, “[…] ao longo dos séculos, nós nos
transformamos numa civilização grafocêntricas, que tem no poder da palavra
escrita um elemento fundamental para sua sobrevivência e continuidade”
(FARACO; TEZZA, 2016, p. 105). Com o surgimento da escrita, o modelo de
sociedade se transformou radicalmente, e, devido à sua importância história,
a escrita passou a ser compreendida como língua, diminuindo a importância
da oralidade.
Faraco e Tezza (2016) revelam alguns aspectos importantes dessa temática.
Segundo os autores, não é apenas a linguagem escrita que vai caracterizar a
complexidade das sociedades e de suas relações. Para exemplificar isso, os
autores trazem dois fatos importantes, descritos a seguir.

1. Mesmo na atualidade, observando-se a realidade brasileira, por exemplo,


é possível verificar que temos no nosso país um número enorme de
analfabetos e semianalfabetos, o que revela que a escrita não pode ser
considerada a única linguagem humana fundamental. As pessoas que
não dominam suas representações gráficas encontram na oralidade sua
principal forma de se comunicar.
2. Há diversos povos que não conhecem sistema de escrita, baseando-se
totalmente na oralidade. E, mesmo com uma cultura completamente
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baseada na oralidade, essas sociedades apresentam todas as característi-


cas e complexidades que qualquer outra sociedade com escrita apresenta.

Complementando esse pensamento, os autores apontam a questão do poder


e da discriminação:

[…] a linguagem não é usada somente para veicular informações, isto é, a


função referencial denotativa da linguagem não é senão uma entre outras;
entre estas ocupa uma posição central a função de comunicar ao ouvinte a
posição que o falante ocupa de fato ou acha que ocupa na sociedade em que
vive (FARACO; TEZZA, 2016, p. 105).

Valendo-se de Bourdieu, os autores citados consideram o poder da palavra


como o poder de mobilizar a autoridade acumulada pelo falante em um ato
linguístico.
Faraco e Tezza (2016) explicam que a escrita assumiu papel importante ao
longo da história porque, desde seu surgimento, ela atua como uma ferramenta
de distinção social. Seu domínio — em especial, o domínio da norma culta e
das regras gramaticais e ortográficas — é competência dos mais letrados e com
uma posição social mais privilegiada. Desse modo, é possível compreender por
que a oralidade não é bem quista e a sua importância é relegada a um segundo
plano, sendo relacionada a momentos de descontração e informalidade.
Correia (2013) destaca que a língua escrita não pode ser caracterizada
apenas como a representação da língua falada, pois ela se apresenta sob um
sistema mais disciplinado e rígido. Faraco e Tezza (2016) reforçam essa dife-
renciação, ao destacarem que é comum associar a escrita apenas à gramática;
no entanto, a gramática se refere a um conjunto de regras de uso da língua.
Essa gramática pode ser normatizada ou não. No caso do Brasil, a língua
portuguesa apresenta uma gramática normativa, ou seja, as suas regras e os
seus códigos de utilização são normatizados segundo um padrão, recebendo
o nome de língua culta padrão.
Outro aspecto específico da escrita, apontado por Faraco e Tezza (2016),
é o conservadorismo. As mudanças que ocorrem na linguagem escrita são
extremamente lentas, e leva muitos anos para que mudanças na oralidade,
por exemplo, sejam incorporadas à escrita. Alguns fatores contribuem para
esse conservadorismo da língua escrita. O primeiro fator é que a escrita se
constrói por meio de representações gráficas, que possuem a capacidade de
permanecer no tempo e no espaço — ou seja, ela é muito mais duradoura do
que o som (oralidade). Além disso, essa permanência favorece o exercício do
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controle social mais intenso; portanto, formatos mais inovadores encontram


bloqueios nesse processo. O segundo fator se refere aos contextos sociais a que
a escrita, normalmente, está associada; trata-se de ambientes mais formais,
como trabalho ou academia. Os estudos linguísticos revelam que, nesses am-
bientes formais, há um uso preferencial de formas linguísticas conservadoras.
Ou seja, o falante, para satisfazer suas expectativas sociais, procura evitar,
nesses contextos, formas próprias de vernáculos.
Portanto, cabe ressaltar que não é possível dizer que a língua escrita possui
mais valor do que a língua falada, ou vice-versa. As duas modalidades da
língua, oral e escrita, se complementam e se completam. A comparação entre
fala e escrita revela apenas as especificidades de cada uma. Enquanto a fala é
mais flexível e heterogênea, pois proporciona liberdade de escolha e múltiplas
variações possíveis, a escrita é mais conservadora e se constrói baseada em
um conjunto de regras e normas de utilização — a gramática.
Além disso, a oralidade não deixa de ser complexa, pois, além do som das
palavras, há diversos elementos que compõem a comunicação por meio da
fala, incluindo o tom de voz (entonação), os gestos, as mímicas, o olhar e, até
mesmo, as expressões faciais. Já a escrita é mais simplória, nesse sentido, pois
conta apenas com a representação gráfica das palavras; a sua complexidade
consiste em apresentar um conjunto amplo e abrangente de regras, além de
inúmeros gêneros textuais, que vão lhe conferir diversas modalidades de
produção textual.
Assim, segundo Faraco e Tezza (2016), a oralidade carrega uma série
de fatores que dão complexidade à linguagem oral, e todo esse conjunto de
elementos possui impacto na forma de comunicação oral. Dentro do campo da
pragmática, essas diferentes entonações e formas distintas de se dizer a mesma
coisa, mas resultando em ações completamente diferentes, foram estudadas
por Grice, que definiu as máximas conversacionais.

Máximas conversacionais
Os estudiosos do campo da pragmática defendem que, ao analisarmos um texto,
nossa compreensão extrapola a compreensão visual. Para eles, uma produção
textual envolve um conjunto de palavras e frases tanto com significados ex-
plícitos como com significados implícitos. Desse modo, para a compreensão
total de um texto e de qualquer outra ação da língua, no contexto da oralidade,
é necessário identificar e compreender a enunciação em sua completude,
envolvendo o contexto, o significado explícito, o significado implícito e a
interpretação do receptor.
Produção textual e expressão oral 9

A pragmática é um campo de estudo que se dedica a compreender a língua a partir


do ponto de vista dos usuários. Para isso, os pesquisadores observam tanto as escolhas
feitas pelo autor quanto o resultado usual da apropriação da língua em contextos de
intenção social — ou seja, os efeitos do uso sobre outros participantes em um ato
de comunicação.

Um dos autores que se dedicou ao estudo da conversação sob a perspectiva


pragmática foi Grice (1957 apud LEÃO, 2013). O autor afirma que, na maioria
dos textos, as informações são transmitidas de maneira tanto explícita como
implícita. Nessas situações, o que o falante quer dizer vai além daquilo que
ele diz de fato. Essa informação que o falante quer dizer para além daquilo
que diz é o que ele sugere, indica, insinua etc. Essas sugestões, indicações e
insinuações são identificadas pelo ouvinte/leitor, não por meio da descodifi-
cação do significado linguístico, mas por meio de inferências (GRICE, 1957
apud LEÃO, 2013).
Para Grice (1975 apud LEÃO, 2013), em uma situação de conversação,
os interlocutores assumem de maneira implícita um contrato conversacional,
um conjunto de normas que regem o diálogo; Grice denominou esse conjunto
de regras como máximas conversacionais. De acordo com Vitali e Mengarda
(2008), as máximas conversacionais têm como base a interação, a comunicação
e o princípio cooperativo entre falante e ouvinte, e é por meio desse princípio
que é possível direcionar o processo comunicativo.
Segundo Leão (2013), o princípio cooperativo é definido por Grice como
a situação em que o locutor dá a sua contribuição conversacional tal como
requerida, no momento esperado, de acordo com o propósito do diálogo ou com
o rumo que ele tomou durante a troca verbal em questão (GRICE, 1957, apud
LEÃO, 2013). Esse princípio se divide em quatro subprincípios, apresentados
como máximas conversacionais, listadas a seguir.

 Máxima da quantidade:
■ faça com que a sua contribuição seja tão informativa quanto o
necessário;
■ não faça a sua contribuição mais informativa do que o necessário.
 Máxima da qualidade:
10 Produção textual e expressão oral

■ tente fazer com que a sua contribuição seja verdadeira;


■ não diga aquilo que acredita ser falso;
■ não diga aquilo para o que não possui evidência suficiente.
 Máxima da relação:
■ seja relevante.
 Máxima do modo:
■ seja claro;
■ evite obscuridade de expressão;
■ evite a ambiguidade;
■ seja breve;
■ seja organizado.

É importante destacar, conforme aponta Leão (2013), que essas máximas


conversacionais são um contrato preexistente entre locutor e receptor; ou seja,
não necessitam ser explicitadas e acordadas previamente, por já fazerem parte
de um contrato comunicativo. Os interlocutores já presumem que as pessoas
com quem vão dialogar, normalmente, vão construir uma conversa com a
quantidade apropriada de informações, para manter uma conversa coerente, vão
falar a verdade e serão relevantes naquilo que se propõem a dialogar, fazendo
isso de maneira coerente e com clareza. É importante observar, ainda, que
essas máximas conversacionais também são princípios aplicados ao contexto
da produção textual. Ou seja, as máximas de Grice são importantes para
observar como se dá a construção de sentido e significado no contexto tanto
da oralidade como da escrita.

2 Produção textual e norma culta


No campo da comunicação, o texto é a base fundamental das atividades,
seja no jornalismo, nas relações públicas ou na publicidade. Tudo o que é
realizado nas atividades de comunicação envolve texto, seja de maneira direta
ou indireta. Nesse contexto, é essencial compreender e dominar as técnicas
para uma produção textual que seja coerente e de acordo com a norma culta.
O primeiro aspecto de um texto é que ele se origina da reunião de palavras.
Essa organização forma sentenças, as sentenças formam parágrafos, e os pa-
rágrafos formam textos completos ou até capítulos de livros. No entanto, essa
aglomeração de palavras não deve acontecer aleatoriamente; é preciso coesão
e coerência na produção textual. Ou seja, é preciso que essa organização e essa
junção das palavras sigam uma lógica, tenham concordância entre si e apresen-
Produção textual e expressão oral 11

tem uma harmonia, resultando em um enunciado de informações passíveis de


serem interpretadas por outras pessoas. Vejamos a seguir quais são os principais
aspectos que devem ser considerados em uma produção textual coerente.

Coesão e coerência textual


Correia (2013) destaca que o texto é produzido por meio da organização
de palavras, que se unem umas às outras no intuito de formar uma frase
adequadamente. As sentenças ou frases formam uma oração, e as orações
formam períodos.

Essa união ou ligação entre os elementos de um texto deve apresentar um


sentido lógico, coerente; para isso é necessário observar as relações semân-
ticas existentes entre eles. Na verdade, há uma relação de dependência entre
os termos e as orações que se estabelece pela coordenação ou subordinação
das ideias (CORREIA, 2013, documento on-line).

Além disso, a autora enfatiza que um texto, para se caracterizar como uma
produção bem construída e coesa, deve utilizar as regras gramaticais no interior
das sentenças de forma adequada. Essas regras auxiliam a proporcionar coesão
e coerência às frases. Elementos como conjunções, pronomes, preposições
e advérbios são essenciais para deixar um texto mais harmônico e facilitar
sua compreensão. As conjunções, por exemplo, auxiliam na interpretação de
uma explicação ou de uma sentença que apresenta fato e consequência. Já os
pronomes indicam sobre quem está se referindo a informação apresentada, sem
a necessidade de se repetir a todo instante o nome do sujeito. Já as preposições
auxiliam na conexão entre as palavras e as frases, auxiliando na construção
do sentido e da coerência textual.
Segundo Correia (2013, documento on-line), “[…] se esses elementos de
ligação forem mal-empregados, o texto não apresentará noção de conjunto,
ou ainda, sua linguagem se tornará ambígua e incoerente”. A coesão textual
se refere à forma ou à organização de um texto. Ela é construída por meio de
procedimentos gramaticais, isto é, pela escolha dos conectivos mais adequados
para a conexão dos diversos enunciados que compõem um texto. Por sua vez,
conforme estabelece Correia (2013), a coerência textual é resultado de uma
relação harmoniosa entre os pensamentos ou as ideais apresentadas pelo autor
de um texto sobre determinado assunto. Refere-se, assim, ao conteúdo desse
texto, que é apresentado por meio de uma sequência ordenada e lógica de
opiniões e informações expostas.
12 Produção textual e expressão oral

Importância da coesão e da coerência textual


Para que um texto seja compreendido, é preciso que suas informações sejam organiza-
das de tal modo que o leitor interprete as informações ou a história exposta de forma
linear, sem confusões ou ambiguidades de interpretação. Para isso, os elementos de
coesão e coerência são essenciais. Veja um exemplo de como a coesão e a coerência
podem gerar confusão se não forem adequadamente empregadas.

1. Carlito partiu no barco verde. O barco era longo e forte. Carlito


parou perto da árvore. Era tarde, e Carlito dormia. Acordou e co-
meu carne de carneiro. “Que calor! Vou nadar!" (POSSENTI, 2002,
p. 114–115).

Na sentença 1, há elementos que não apresentam coerência, ou seja, não seguem


uma construção lógica de uma ideia. A principal inconsistência se refere ao fato de o
personagem Carlito estar em um barco, navegando, e comer carneiro. Ou seja, falta
algo para dar sentido e esclarecer as informações apresentadas. A inclusão de coesão
e coerência no enunciado proporciona facilidade na compreensão do sentido textual.

2. Carlito partiu em um barco verde, que era longo e forte. O menino


avistou uma árvore e parou perto dela. Ficou tarde, e Carlito acabou
adormecendo. Quando acordou, o menino sentiu-se com fome e uma
vontade de comer carne de carneiro. Mas, como carneiro não dá na
água, o menino decidiu nadar para amenizar o calor que sentia (POS-
SENTI, 2002, p. 114–115).

Esses exemplos reforçam a importância da coerência e da coesão. Ou seja,


para ser compreendido e interpretado, um texto precisa ser construído com
articulação das ideias, com lógica e raciocínio — ou seja, seu conteúdo precisa
ser coerente. A coesão é o aspecto que organiza as estruturas gramaticais
de acordo com as regras linguísticas. Ou seja, para compreender um texto,
é preciso se atentar à concordância, ao uso adequado dos elementos, como
conjunções, preposições, advérbios e demais elementos que vão compor as
estruturas frasais, além do emprego adequado do vocabulário.
Na construção de um texto, assim como na fala ou na conversação, utilizam-
-se diversos mecanismos para garantir a compreensão por parte do interlocutor.
Produção textual e expressão oral 13

Esses mecanismos linguísticos que estabelecem a conectividade e a retomada


do que foi escrito/dito são os referentes textuais e buscam garantir a coesão
textual para que haja coerência, não só entre os elementos que compõem a
oração, como também entre a sequência de orações dentro do texto (CORREIA,
2013, documento on-line).

Nesse sentido, ao se empregarem diferentes mecanismos linguísticos, sejam


eles lexicais (repetição, substituição, associação) ou gramaticais (pronomes,
conjunções, numerais, preposições, advérbios), eles auxiliam a ordenar as ideias
e as informações nas frases, oferecendo suporte para a organização coerente e
coesa de um texto. Por coesão, entende-se a ligação, ou seja, a relação causal
entre os elementos que compõem uma estrutura textual.

Concisão
Segundo Correia (2013), a conciso é o texto que consegue transmitir o máximo
de informações com o mínimo de palavras. Ou seja, a concisão pode ser des-
crita basicamente como a economia linguística. No entanto, conforme alerta a
autora, isso não significa economia de pensamento, mas, sim, a construção e a
organização textual que é objetiva e sucinta, sem se estender ou “enrolar”. A
concisão se trata, portanto, de excluir palavras sem necessidade, redundâncias
e passagens que não acrescentam ao objetivo do texto.
Outro aspecto a que se refere a concisão textual é a hierarquia de infor-
mações. Para Correia (2013, documento on-line), “[…] deve-se perceber a
hierarquia de ideias que existe em todo texto de alguma complexidade: ideias
fundamentais e secundárias”. Em uma produção textual adequada, as infor-
mações secundárias são utilizadas com o intuito de esclarecer o sentido das
informações principais, detalhando-as ou exemplificando-as. Desse modo, as
ideias secundárias que não complementem o texto ou as informações principais
podem ser dispensadas.

Clareza
De acordo com Correia (2013, documento on-line), a clareza deve ser uma
qualidade básica de qualquer produção textual. “Claro é aquele texto que
possibilita imediata compreensão pelo leitor. A clareza não é algo que se
atinja por si só: ela depende estritamente das demais características da redação
oficial”. Nesse sentido, a clareza pode ser compreendida como um elemento
complementar da coesão e da coerência. Afinal, um texto que se apresente
14 Produção textual e expressão oral

de forma coerente e coesa, consequentemente, será de fácil compreensão e,


portanto, terá clareza textual.
Correia (2013) destaca algumas dicas de como tornar uma produção textual
mais compreensível. Confira a seguir.

 Impessoalidade: construir um texto que não expresse o ponto de vista


do sujeito evita duplicidades de interpretação, que poderão ocorrer
devido ao tratamento personalista dado ao texto.
 Norma culta: o uso do padrão linguístico seguindo a norma culta, em
princípio, propicia um entendimento mais abrangente e generalista, uma
vez que, ao se evitar o uso de vocábulos com circulação restrita a um
determinado segmento, gírias e jargões, o texto será mais facilmente
compreendido por um número maior de pessoas.
 Formalidade: além do uso da norma culta padrão, que auxilia na
compreensão textual, ao se utilizar uma linguagem mais formal e res-
peitar os padrões de estilo para cada gênero textual, tende a ser mais
fácil compreender o conteúdo exposto. Utilizar uma linguagem mais
informal, dependendo do contexto em que a produção textual está
sendo redigida, faz com que os leitores fiquem confusos com relação às
informações e à veracidade delas. Além disso, normalmente, a lingua-
gem informal tende a ser utilizada em momentos mais descontraídos
ou carregados de humor.
 Padronização: possibilita a uniformização dos textos, apresentando
certa previsibilidade em seu conteúdo.
 Concisão: somada aos outros elementos, a concisão auxilia na com-
preensão e na clareza textual, uma vez que apresenta as informações
e os argumentos de forma coerente e objetiva, retirando os excessos
linguísticos que, normalmente, dificultam a compreensão.
 Revisão: o último aspecto a ser considerado, segundo Correia (2013), é
a releitura e revisão final do texto redigido, para se atentar aos demais
pontos, corrigir possíveis desvios e erros gramaticais ou reelaborar frases
e sentenças que não possuem coesão e coerência. Essa releitura e revisão
garante que os demais aspectos da clareza textual sejam aplicados.

Cacofonia
A cacofonia, segundo Correia (2013), é um vício de linguagem resultante
da junção entre o final de uma palavra e o início de outra. De origem grega,
a palavra cacofonia significa som ruim ou som desagradável. Nesses casos,
Produção textual e expressão oral 15

geralmente, o som produzido pelas palavras soa estranho ou cômico. Embora


esses encontros de sons geralmente ocorram sem intencionalidade, eles também
podem ser utilizados de maneira intencional, para fins humorísticos, ou para
produzir duplos sentidos em músicas ou poemas.
Esse fenômeno linguístico, apontado pela autora (2013) como um vício de
linguagem, é mais evidente na fala do que na escrita; no entanto, a caracteri-
zação desses sons ocorre principalmente na linguagem escrita. Caracterizada
pela junção de sons entre palavras, a cacofonia pode resultar em um efeito
de sentido diferente daquele incialmente pretendido pelo falante e, em casos
mais graves, pode produzir sentidos inconvenientes e, até mesmo, obscenos.
Para evitar a cacofonia e o duplo sentido intencional, é preciso conhecer
os principais exemplos de cacófatos que se apresentam na língua portuguesa.
Cabe ressaltar que a listagem a seguir apresenta as cacofonias mais encontra-
das em produções textuais dos mais variados gêneros, porém, as cacofonias
não se limitam a esses exemplos, já que há uma série de sons e palavras que
originam cacófatos.

 Nosso hino nacional é bonito.


 Cobramos por cada laranja.
 Vou-me já.
 Na vez passada você fez isso.
 Um guri lá do meu bairro.
 Eu tenho pouca fé nele.
 Eu vi ela na rua.
 A Justiça pôs a culpa nela.
 Ela tinha pouco juízo na cabeça.
 Mandou-me colocar uma mão na cabeça.
 Nunca beijei a boca dela.
 Correu tudo bem, já que tinha esperanças de vê-la.
16 Produção textual e expressão oral

Cacofonia intencional
A cacofonia pode ser uma estratégia linguística utilizada para criar duplo sentido e
produzir uma segunda mensagem, oculta. Um exemplo clássico desse uso é uma
performance realizada pelos artistas brasileiros Chico Buarque de Holanda e Caetano
Veloso, na gravação da música “Você Não Entende Nada/Cotidiano”. Eles conseguiram
driblar a censura da ditadura militar à época, a partir da união de duas canções, uma de
cada artista. Segundo a historiadora Priscila Correa (CAPELAS, 2011, documento on-line):

[…] juntas, as canções mostram a indignação da classe média dentro


do contexto da Sociedade do Espetáculo, falando de sua realidade
maçante e opressora. “Cotidiano” lida com uma visão do coletivo,
enquanto “Você Não Entende Nada” traça um olhar acerca da indivi-
dualidade, dialogando com desejos de consumo, falando de Coca-Cola,
por exemplo.

Ouça “Você Não Entende Nada/Cotidiano”, de Caetano Veloso e Chico Buarque, e


compreenda melhor a cacofonia.

3 Oralidade
Conforme já apresentado no início do capítulo, a língua possui duas mo-
dalidades: fala e escrita. A fala é a primeira expressão da língua, ou seja,
a oralidade se configura como a primeira organização humana em função
da comunicação. Segundo Pugliese (2010), a oralidade se refere à forma de
linguagem mais básica do homem e se constrói por meio de duas tipologias
distintas: a oralidade primária e a oralidade secundária. O autor explica que
a oralidade primária está associada às culturas orais, ágrafas, ou seja, aquelas
culturas que não possuem escrita ou representação gráfica de suas línguas e,
portanto, são classificadas como sociedades não letradas de cultura oralista.
Ainda de acordo com Pugliese (2010), nessas comunidades, os signos
comuns da voz são compreendidos pelos membros do grupo, e é por meio
deles que as pessoas se comunicam e apreendem os significados. Além disso,
nessas comunidades, a cultura também é transmitida por meio oral, princi-
palmente por meio de narrativas, mitos e contação de histórias. E, para que o
Produção textual e expressão oral 17

conhecimento seja disseminado e não seja esquecido, frequentemente, esses


conhecimentos são contados ou repetidos em voz alta.
Lévy (1997) também aborda a importância da oralidade nas comunidades
não letradas. Para o autor, é por meio da oralidade que os ritos e mitos folcló-
ricos são retidos e transmitidos de geração em geração, por meio de rodas de
contação de histórias. Segundo Lévy (1997, p. 3):

Nas sociedades orais, as mensagens linguísticas eram sempre recebidas no


tempo e no lugar em que eram emitidas. Emissores e receptores partilhavam
uma situação idêntica e, em geral, um universo análogo de significado. Os
atores da comunicação estavam embebidos no mesmo banho semântico, no
mesmo contexto, no mesmo fluxo vivo de interação.

Esse pensamento de Lévy destaque que, tanto nas comunidades que se


baseiam na oralidade como naquelas que se constroem por meio da escrita, é
preciso que haja um compartilhamento dos signos e significados. Isso porque
é por meio desse compartilhamento de sentido que ocorrerá o processo de
comunicação. Como aponta Pugliese (2010), a coerência das mensagens será
construída por meio da unidade de sentidos que existe na consciência daqueles
que compartilham a mesma lógica de acontecimentos.
Na narração de histórias, por exemplo, a interpretação dessa história
acontece de maneira subjetiva, e cada sujeito vai imaginar e interpretar uma
história de acordo com suas habilidades e sua bagagem cultural. Porém, em
uma sociedade oralista, essas construções de significados são mais próximas,
uma vez que a bagagem cultural dos sujeitos é bastante similar. Além disso,
“[…] as sociedades orais são constituídas de gente diferenciada, não por
suas habilitações especializadas ou sinais visíveis, mas por suas singulares
misturas emocionais” (MCLUHAN, 1974, p. 69 apud PUGLIESE, 2010, do-
cumento on-line). Portanto, a oralidade primária vai qualificar e compreender
as culturas das sociedades que são desprovidas do conhecimento de qualquer
forma de escrita.
Já a oralidade secundária identifica as sociedades que possuem um sistema
de escrita, mas também utilizam a oralidade como modalidade linguística.
Atualmente, esse é o principal modelo encontrado nas sociedades humanas.
Para Pugliese (2010), até hoje, a linguagem oral é a nossa principal forma de
comunicação; isso porque essa linguagem carrega um aspecto efetivo, que
tem a capacidade de aproximar e relacionar os sujeitos, resultando em maior
fixação das informações. Um exemplo disso são os espaços de ensino, nos
18 Produção textual e expressão oral

quais professores e alunos usam preferencialmente a fala como recurso para


interagir, e, na maioria dos casos, o aluno é quem menos se expressa.
No ambiente escolar, são produzidas narrativas orais de maneira mais
simplória e inconsistente, visando ao armazenamento das informações trans-
mitidas, acreditando-se, assim, que a fixação mnemônica produza efetivamente
aprendizado. De acordo com Pugliese (2010), a sociedade oral aposta, portanto,
na memorização, na repetição e na continuidade como formas de compreensão
de seus conteúdos. Assim, a oralidade secundária define a sociedade atual.
Ela se caracteriza pela combinação dos elementos da oralidade primária
acrescidos dos fatores que caracterizam as culturas que possuem e utilizam
a linguagem escrita.

CAPELAS, B. Historiadora analisa conexões da obra de Caetano Veloso e Chico Buarque.


2011. Disponível em: https://www5.usp.br/3472/estudiosa-analisa-conexoes-da-obra-
-de-caetano-veloso-e-chico-buarque/. Acesso em: 16 abr. 2020.
CORREIA, A. Comunicação oral e escrita aplicada. 2013. Disponível em: http://www.ifcur-
sos.com.br/sistema/admin/arquivos/17-36-14-ap0stilac0municaca00raleescritaaplicada.
pdf. Acesso em: 16 abr. 2020.
FARACO, C. A.; TEZZA, C. Prática de texto para estudantes universitários. Petrópolis: Vozes,
2016. (Coleção Série Manuais).
LEÃO, L. B. C. Implicaturas e a violação das máximas conversacionais: uma análise do
humor em tirinhas. Working Papers em Linguística, v. 15, nº. 1, jan./mar., 2013. Disponível
em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/workingpapers/article/download/1984-
-8420.2013v14n1p65/26354. Acesso em: 16 abr. 2020.
LÉVY, P. A globalização dos significados. Folha de São Paulo, 1997. Disponível em: https://
www1.folha.uol.com.br/fsp/1997/12/07/mais!/4.html. Acesso em: 1 abr. 2020.
POSSENTI, S. Mal comportadas línguas. 2. ed. Curitiba: Criar Edições, 2002.
PUGLIESE, A. Comunicação: reflexões sobre a mídia e a linguagem. In: ENCONTRO DE
HISTÓRIA DA MÍDIA DA REGIÃO NORTE, 2010, Palmas. Anais eletrônicos [...]. Disponível
em: http://www.ufrgs.br/alcar/noticias-dos-nucleos/artigos/Comunicacao%20refle-
xoes%20sobre%20a%20midia%20e%20a%20linguagem.pdf. Acesso em: 16 abr. 2020.
VITALI, F.; MENGARDA, E. J. A dimensão pragmática da comunicação em textos orais
e escritos. In: CONGRESSO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO NA REGIÃO SUL, 9., 2008,
Produção textual e expressão oral 19

Guarapuava. Anais eletrônicos [...]. Disponível em: http://www.intercom.org.br/papers/


regionais/sul2008/resumos/R10-0382-1.pdf. Acesso em: 16 abr. 2020.

Leituras recomendadas
GRICE, H. P. Utterer’s meaning and intentions. The Philosophical Review, v. 78, nº. 2,
p. 147–177, abr. 1969. Disponível em: http://williamstarr.net/teaching/speech_acts/
Grice-1969-Utterers_Meaning%E2%80%93and_Intentions.pdf. Acesso em: 17 abr. 2020.
MCLUHAN, M. Os meios de comunicação como extensões do homem. São Paulo: Cultrix,
1964.

Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu fun-
cionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a
rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de
local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade
sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links.
Dica do professor
Para escrever bem, não basta saber organizar as palavras e selecionar o vocabulário, é preciso
conhecer a língua em todas as suas especificidades, incluindo as diferenças e aproximações entre
suas modalidades linguísticas, ou seja, entre fala e escrita.

Nesta Dica do Professor, você vai acompanhar uma reflexão sobre as principais distinções
existentes entre essas modalidades.

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Exercícios

1) A língua pode ser considerada um fenômeno social, porque acontece por intermédio da
interação social entre indivíduos. É comum associar o estudo da linguística apenas à escrita;
no entanto, a língua se configura por meio de duas modalidades: a fala e a escrita, ambas
com especificidades e características próprias.

Em relação às características das modalidades linguísticas, assinale a alternativa correta.

A) A escrita é uma modalidade mais flexível e dinâmica.

B) A fala é uma modalidade mais flexível e dinâmica.

C) A oralidade é uma modalidade mais conservadora e estável.

D) A representação gráfica da língua é mais flexível e dinâmica.

E) A fala é uma modalidade mais conservadora e estável.

2) A coerência é uma propriedade linguística que se estabelece entre as partes de um texto,


com o intuito de criar unidade de sentido. Ela resulta em uma construção lógica, um
encadeamento racional de ideias e pensamentos, dando sentido e continuidade à produção
textual. Essa propriedade pode ser observada tanto dentro da estrutura frasal como fora, de
acordo com as informações complementares que possibilitam a interpretação do texto.

Das alternativas a seguir, assinale a que apresenta uma frase sem coerência.

A) Eu decidi ir para a festa, tanto que a festa está lotada.

B) O solo do Nordeste é muito seco e aparentemente árido. Quando caem as chuvas,


imediatamente brota a vegetação.

C) Eu fui comprar um pão, mas a bicicleta estava muito cara.

D) O trânsito em São Paulo ficou completamente paralisado dia 15, das 14 às 18 horas.

E) Eu conheço eles dês que a gente era colega de colégio.

3) Para que uma produção textual cumpra suas funções de informar e comunicar, é preciso
utilizar adequadamente alguns princípios e prerrogativas que auxiliam no processo de
recepção e interpretação do texto. Um desses princípios refere-se à conexão linguística que
precisa ser estabelecida entre as frases, permitindo, assim, uma amarração das ideias dentro
de um texto. Para que essas relações linguísticas aconteçam, é preciso utilizar recursos,
como advérbios, pronomes, conectivos, sinônimos e preposições, que têm como objetivo
estabelecer a interligação entre os segmentos de um texto.

Essa descrição está se referindo a qual elemento linguístico?

A) Coesão.

B) Coerência.

C) Clareza.

D) Concisão.

E) Gramática.

4) A cacofonia é um vício de linguagem que acontece por meio da junção entre o final de uma
palavra e o início de outra, resultando em sons ruins ou desagradáveis. Geralmente, esses
sons resultantes soam palavras estranhas ou cômicas. Esse fenômeno linguístico é mais
evidente na fala do que na escrita; no entanto, a possibilidade de duplo sentido ou
interferência na interpretação textual ocorre principalmente na modalidade escrita. Para
evitar esses desconfortos, é preciso conhecer os principais cacófatos e revisar o texto,
excluindo trechos que possam soar estranhos ou obscenos.

Das alternativas a seguir, assinale aquela que apresenta uma frase com cacófato.

A) Uma única mão estava no bolso da calça.

B) Eu a vi na escola esta tarde, ela estava acompanhada.

C) Eu a amo mais que tudo nesse mundo.

D) Desculpe-me pelo ocorrido.

E) Ela tinha olhos lindos.

5) A oralidade é a primeira expressão da língua e se configura como a primeira forma de


organização humana em torno da comunicação e do processo comunicativo. Além disso,
refere-se à forma de linguagem humana mais básica, e se constrói por meio da interlocução
entre os indivíduos. No entanto, básica não quer dizer simples, muito pelo contrário, a
oralidade se qualifica como uma modalidade linguística complexa que envolve não apenas a
conversa e a exposição de palavras, mas outros elementos que complementam sua
interpretação.

Em relação à oralidade, assinale a alternativa correta.

A) A entonação de voz não interfere na interpretação da fala.

B) Os discursos são produções textuais baseadas na escrita.

C) A entonação de voz interfere na interpretação da escrita.

D) Os discursos são produções textuais baseadas na fala.

E) A entonação de voz é um elemento linguístico baseado na escrita.


Na prática
A oralidade é uma modalidade da língua que está associada à pessoalidade e ao uso social e
partilhado dos sentidos. Com o avanço das tecnologias da informação, novos aplicativos foram
desenvolvidos para intermediar essa relação. Os próprios usuários também ressignificaram seus
usos, aplicando essas ferramentas no contexto organizacional.

Neste Na Prática, você vai conhecer o caso de uma empresa que utilizou um aplicativo de
mensagens instantâneas como forma de se aproximar e se conectar com públicos estratégicos.
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Saiba +
Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor:

Voice design: será que temos consciência do poder da palavra


falada?
No link a seguir, confira uma reflexão do comunicador e pesquisador Jorge Cury Neto sobre o
poder da palavra falada e sua presença permanente no dia a dia das pessoas.

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Escrever é a habilidade mais valorizada no mercado de


trabalho, diz Forbes
Uma pesquisa da revista Forbes revelou que a produção textual, ou seja, a habilidade de escrever, é
uma das competências mais valorizadas no mercado de trabalho. Veja, no link a seguir, algumas
dicas que podem ajudá-lo a escrever bem.

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Produção de texto e comunicação


Neste vídeo, acompanhe uma explanação da professora Silvia Colello, da Univesp, sobre os
diferentes tipos de linguagem e seu impacto na produção textual e no processo de comunicação.
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