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22/04/24, 16:06 TC > Jurisprudência > Acordãos > Acórdão 320/2024 .

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22/04/24, 16:06 TC > Jurisprudência > Acordãos > Acórdão 320/2024 .
ACÓRDÃO Nº 320/2024

Processo n.º 291/2024


3.ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Medeiros de Carvalho

Acordam, em conferência, na 3.ª secção do Tribunal Constitucional

I. RELATÓRIO
1. Nos presentes autos, vindos do TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA (doravante
«TRL»), em que é reclamante A. e reclamado o MINISTÉRIO PÚBLICO, o primeiro reclamou, ao
abrigo do artigo 76.º, n.º 4, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional,
adiante designada «LTC»), do despacho do relator daquele Tribunal, de 14 de fevereiro de 2024, que
não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional (cf. fls. 10v-11).

2. O ora reclamante, na qualidade de arguido em processo crime, interpôs recurso para o TRL
de decisão condenatória proferida em 1.ª instância. Por acórdão desse Tribunal de 14 de novembro
de 2023, foi negado provimento ao recurso e confirmado o acórdão condenatório.
Por requerimento apresentado em 6 de dezembro de 2023, o arguido, ora reclamante, arguiu a
nulidade desse acórdão, com fundamento em omissão de pronúncia, requerimento que foi indeferido
por acórdão de 23 de janeiro de 2024 (cf. fls. 5v-7v).

2.1. Deste acórdão foi interposto recurso para este Tribunal (cf. fls. 9-10), a 8 de fevereiro de
2024, com o seguinte teor:
«A., recorrente nestes autos, por não se conformar com o douto acórdão do Tribunal da Relação de
Lisboa proferido em 23 de janeiro de 2024, vem, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do
artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, interpor recurso para o COLENDO
TRIBUNAL CONSTITUCIONAL, o que faz nos termos e pelos fundamentos seguintes:

COLENDOS SENHORES DOUTORES


JUÍZES CONSELHEIROS

O recorrente arguiu a nulidade do douto acórdão proferido pelo Tribunal da Relação por entender
existir omissão de fundamentação de direito quanto à questão de a favorável inserção familiar e
profissional do recorrente e o facto de não existir registo de que tenha prosseguido com a atividade
criminosa em causa nestes autos ou qualquer outra, não assumir relevância para a atenuação da sua
responsabilidade criminal.
Por acórdão de 23 de janeiro de 2024, veio o Tribunal da Relação transcrever a decisão proferida no
acórdão cuja nulidade se arguiu e acrescentar o seguinte:
Parece-nos que resulta claro do acórdão aqui em causa que foi tido e consideração tudo o que o
arguido alegou nas conclusões do recurso e que o Acórdão proferido por este Tribunal não padece
do apontado vício.
Neste sentido, pretende-se ver apreciada a inconstitucionalidade das normas extraídas dos artigos
97.º, n.º 5; 379.º, n.º 1, alínea c); 425.º, n.º 4 do CPP e 40.º e 71.º do CP com a interpretação de que
não padece do vício de omissão de pronúncia a decisão judicial que não exare fundamentação de
direito quanto à questão de a favorável inserção familiar e profissional do arguido e o facto de não
existir registo de que tenha prosseguido com a atividade criminosa em causa nos autos ou qualquer
outra, não assumir relevância para a atenuação da sua responsabilidade criminal.
Esta interpretação em que o Tribunal omite qualquer tipo de fundamentação de direito inquina de
inconstitucionalidade aquelas normas por violarem o estatuído nos artigos 18.º, n.º 1, 32.º, n.ºs 1 e 2
e 205.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa.
Nestes termos se requer a V. Exa se digne admitir o presente recurso, ordenando a
notificação do ora recorrente para apresentar alegações.»

2.2. Por despacho de 14 de fevereiro de 2024 (cf. fls. 10v), decidiu o Relator daquele Tribunal não
admitir o recurso interposto pelo arguido, ora reclamante, podendo ler-se na decisão:
«Veio arguido A. recorrer para o Tribunal Constitucional do acórdão proferido por este Tribunal
da Relação de Lisboa que indeferiu a arguição da nulidade por omissão de pronúncia do Acórdão
desta mesma Relação que confirmou o Acórdão da primeira instância relativamente ao recorrente
Porém, em nosso entender, tal recurso não deve ser admitido, pelas razões que passamos a expor.
Estabelece o artigo 72.º, n.º 2 daquela mesma Lei de Organização, Funcionamento e Processo do
Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82, de 15 de novembro), que:

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“Os recursos previstos nas alíneas b) e f) do n.º 1 do artigo 70.º só podem ser interpostos pela parte que haja
suscitado a questão da inconstitucionalidade ou da ilegalidade de modo processualmente adequado perante o tribunal
que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer.”
E, de acordo com o disposto no artigo 75.º-A do mesmo diploma legal:
“1 - O recurso para o Tribunal Constitucional interpõe-se por meio de requerimento, no qual se indique a alínea
do n.º 1 do artigo 70.º ao abrigo da qual o recurso é interposto e a norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade se
pretende que o Tribunal aprecie.
2 - Sendo o recurso interposto ao abrigo das alíneas b) e f) do n.º 1 do artigo 70.º do requerimento deve ainda
constar a indicação da norma ou princípio constitucional ou legal que se considera violado, bem como da peça
processual em que o recorrente suscitou a questão da inconstitucionalidade ou ilegalidade.
(…).”
Por último, em conformidade com o disposto no artigo 76.º do citado diploma legal:
“1 - Compete ao tribunal que tiver proferido a decisão recorrida apreciar a admissão do respetivo recurso.
2 - O requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional deve ser indeferido quando não
satisfaça os requisitos do artigo 75.º-A, mesmo após o suprimento previsto no seu n.º 5, quando a decisão o não
admita, quando o recurso haja sido interposto fora do prazo, quando o requerente careça de legitimidade ou ainda, no
caso dos recursos previstos nas alíneas b) e f do n.º 1 do artigo 70.º, quando forem manifestamente infundados.”
Do requerimento de interposição do recurso vemos que este se funda na alegação de que o
acórdão proferido por esta Relação viola o estatuído nos artigos 18.º, n.º 1, 32.º, n.ºs 1 e 2 e 205.º,
n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, ao interpretar os artigos 97.º, n.º 5; 379.º, n.º 1,
alínea c); 425.º, n.º 4 do CPP e 40.º e 71.º do CP no sentido de que não padece do vício de omissão
de pronúncia a decisão judicial que não exare fundamentação de direito quanto à questão de a
favorável inserção familiar e profissional do arguido e o facto de não existir registo de que tenha
prosseguido com a atividade criminosa em causa nos autos ou qualquer outra, não assumir
relevância para a atenuação da sua responsabilidade criminal.
Como resulta do exposto, os recorrentes não pretendem obter a apreciação da conformidade à
Constituição de uma norma que tenha sido aplicada na decisão recorrida e cuja
inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo.
Por outro lado, no recurso não é apresentada uma dimensão normativa que tenha sido acolhida
por este Tribunal a propósito da exigência de fundamentação das decisões que se extrai da
conjugação dos artigos 97.º, n.º 2, 379.º, n.º 1, alínea c) e 425.º, n.º 4, todos do Código de Processo
Penal e ainda do disposto nos artigos 40.º e 71.º do CP, nunca este Tribunal da Relação aderiu a
qualquer interpretação das mencionadas normas que supusesse a dispensa de fundamentação
autónoma da decisão do Tribunal de recurso. Ou seja, nenhuma das normas convocadas foi
interpretada na decisão com o sentido que lhes atribui o recorrente.
Nesta conformidade, é de entender que o recurso em questão, além de convocar
inconstitucionalidade não suscitada anteriormente no processo, é manifestamente infundado, pelo
que se impõe o respetivo indeferimento.
Termos em que, em conformidade com o disposto no artigo 76.º, n.º 2, da Lei de Organização,
Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82, de 15 de novembro), não se
admite o recurso interposto pelo arguido A..»

3. Desse despacho foi pelo arguido, ora reclamante, apresentada reclamação, ao abrigo do artigo
76.º, n.º 4, da LTC, através de requerimento formulado nos seguintes termos (cf. fls. 2v-3v):
«A. , recorrente nestes autos, notificado do douto despacho de não admissão do recurso, vem do
mesmo RECLAMAR, nos termos do disposto nos artigos 405.º do CPP e 76.º, n.º 4 da Lei n.º
28/82, de 15 de novembro, para o Exmo. Senhor Juiz Presidente do Tribunal Constitucional,
nos termos e pelos fundamentos seguintes:
EXMO. SENHOR JUIZ PRESIDENTE
DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
O despacho ora reclamado não admitiu o recurso interposto pelo recorrente, julgando-o
manifestamente infundado, nos termos do disposto no artigo 76.º, n.º 2, da Lei n.º 28/82, de 15 de
novembro.
O recorrente arguiu a nulidade do douto acórdão proferido pelo Tribunal da Relação por entender
existir omissão de fundamentação de direito quanto à questão de a favorável inserção familiar e
profissional do recorrente e o facto de não existir registo de que tenha prosseguido com a atividade
criminosa em causa nestes autos ou qualquer outra, não assumir relevância para a atenuação da sua
responsabilidade criminal.
Por acórdão de 23 de janeiro de 2024, veio o Tribunal da Relação transcrever a decisão proferida no
acórdão cuja nulidade se arguiu e acrescentar o seguinte:
Parece-nos que resulta claro do acórdão aqui em causo que foi tido e consideração tudo o que o arguido alegou nas
conclusões do recurso e que o Acórdão proferido por este Tribunal não padece do apontado vício.
Neste sentido, pretende-se ver apreciada a inconstitucionalidade das normas extraídas dos artigos
97.º, n.º 5, 379.º, n.º 1, alínea c); 425.º, n.º 4 do CPP e 40.º e 71.º do CP com a interpretação de que
não padece do vício de omissão de pronúncia a decisão judicial que não exare fundamentação de
direito quanto à questão de a favorável inserção familiar e profissional do arguido e o facto de não
existir registo de que tenha prosseguido com a atividade criminosa em causa nos autos ou qualquer
outra, não assumir relevância para a atenuação da sua responsabilidade criminal.
Esta interpretação em que o Tribunal omite qualquer tipo de fundamentação de direito inquina de
inconstitucionalidade aquelas normas por violarem o estatuído nos artigos 18.º, n.º 1, 32.º, n.ºs 1 e 2
e 205.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa.
Deve assim a presente reclamação ser considerada procedente.

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Nestes termos e nos demais de direito deverá a presente
reclamação ser considerada procedente e consequentemente
admitido o recurso interposto.»

4. Neste Tribunal, o Ministério Público pronunciou-se pelo indeferimento da reclamação (cf. fls.
20-22), abreviadamente, pelas seguintes razões:
«…
6.
Resulta com clareza da decisão reclamada que o recurso interposto não reúne os pressupostos
essenciais de admissão para este Tribunal Constitucional, exigidos pelos artigos 280.º, n.º 1, al. b),
da CRP e 70.º, n.º 1, al. b) e 72.º, n.º 2, ambos da LTC.
7.
Com efeito, e como ali se refere “(..) os recorrentes não pretendem obter a apreciação da conformidade à
Constituição de uma norma que tenha sido aplicada na decisão recorrida e cuja inconstitucionalidade haja sido
suscitada durante o processo. (..) por outro lado, no recurso não é apresentada uma dimensão normativa que tenha
sido acolhida por este Tribunal a propósito da exigência de fundamentação das decisões (…). Ou seja, nenhuma
das normas convocadas foi interpretada na decisão com o sentido que lhes atribui o recorrente (..). Termos em que,
em conformidade com o disposto no artigo 76.º, n.º 2, da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do
Tribunal Constitucional (...), não se admite o recurso interposto (...)”.
8.
Ora, caracterizando-se, como é sabido, o sistema de fiscalização concreta de constitucionalidade
pela normatividade, o objeto normativo constitui a condição essencial do recurso de
constitucionalidade previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.
9.
“(..) No que respeita ao recurso previsto na alínea b) do n.º 1 deste artigo 70.º, a jurisprudência constitucional
vem entendendo, de modo reiterado e uniforme, que ele implica ou pressupõe cumulativamente:
- a suscitação pelo recorrente, em termos tempestivos e adequados (n.º 2 do artigo 72.º) de uma questão de
inconstitucionalidade normativa;
- a efectiva aplicação, expressa ou implícita, de tal norma ou interpretação normativa, em termos de a mesma
constituir a “ratio decidendi”, ou fundamento jurídico da decisão proferida no caso concreto;
- o esgotamento dos normais meios impugnatórios existentes no ordenamento adjectivo que rege a actividade do
tribunal que proferiu a decisão recorrida;
- finalmente, que o recurso interposto não seja de considerar, em termos de análise liminar, como manifestamente
infundado (..)”1
[1]
Carlos Lopes do Rego, Os Recursos de Fiscalização Concreta na Lei e na Jurisprudência
do Tribunal Constitucional”, Edição Almedina, 2010, pág. 75.
10.
Ora, a falta de suscitação prévia corresponde a um ónus cujo cumprimento, relativamente aos
recursos interpostos ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC, como sucede in casu,
constitui, desde logo, um requisito de legitimidade do recorrente.
11.
E assim sendo, não podemos deixar de acompanhar o entendimento expresso pelo Senhor Juiz
Desembargador do TRL, subscritor do despacho de não admissão do recurso, por falta de
pressupostos essenciais e não supríveis para que fosse admitido o recurso de fiscalização
concreta da constitucionalidade.
12.
Afigura-se-nos que o reclamante não introduz com a sua reclamação qualquer argumento
relativamente aos pressupostos essenciais do recurso de fiscalização concreta de
constitucionalidade que contrarie o decidido naquele despacho de não admissão do recurso para
este Tribunal.
13.
E, por isso, não logra o reclamante abalar a fundamentação do despacho reclamado, o qual se
sustenta numa indiscutível interpretação da lei e que, igualmente, se respalda na firme e constante
jurisprudência do Tribunal Constitucional.
14.
Por força do explanado, e pelos fundamentos constantes do despacho reclamado, em virtude da
falta de pressupostos essenciais de admissibilidade do recurso, afigura-se-nos que não deverá
deixar de ser indeferida a presente reclamação.»

Cumpre apreciar e decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO

5. De acordo com o n.º 4 do artigo 76.º da LTC, «[d]o despacho que indefira o requerimento de
interposição de recurso ou retenha a sua subida cabe reclamação para o Tribunal Constitucional», apresentada no

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prazo de dez dias, contados da notificação do despacho reclamado (artigo 643.º, n.º 1, do Código de
Processo Civil, aplicável ex vi do disposto no artigo 69.º da LTC).
A decisão reclamada é o despacho do Relator do TRL, datado de 14 de fevereiro de 2024 (v.
supra § 2.2.), que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional, por, sinteticamente: i) «não ser
apresentada uma dimensão normativa que tenha sido acolhida por [aquele] Tribunal»; ii) ser invocada
«inconstitucionalidade não suscitada anteriormente no processo»; e, iii) ser «manifestamente infundado» (v. supra §
2.2.).
Na reclamação apresentada nos termos do artigo 76.º, n.º 4, da LTC, o recorrente, aqui ora
reclamante, limita-se a reproduzir o teor do requerimento de interposição do recurso de
constitucionalidade, insistindo que «arguiu a nulidade do douto acórdão proferido pelo Tribunal da Relação por
entender existir omissão de fundamentação de direito quanto à questão de a favorável inserção familiar e profissional do
recorrente e o facto de não existir registo de que tenha prosseguido com a atividade criminosa em causa nestes autos ou
qualquer outra, não assumir relevância para a atenuação da sua responsabilidade criminal», concluindo que, a seu
ver, «[e]sta interpretação em que o Tribunal omite qualquer tipo de fundamentação de direito inquina de
inconstitucionalidade aquelas normas por violarem o estatuído nos artigos 18.º, n.º 1, 32.º, n.ºs 1 e 2 e 205.º, n.º 1 da
Constituição da República Portuguesa» (v. supra § 3.).
Não se mostra, todavia, possível reconhecer razão ao reclamante.

6. O recurso de constitucionalidade que não foi admitido pelo despacho ora reclamado veio
interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, nos termos da qual cabe recurso
para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que «apliquem norma cuja inconstitucionalidade
haja sido suscitada durante o processo».
Nos termos da LTC, e segundo jurisprudência constante deste Tribunal, a admissibilidade do
recurso pressupõe, necessariamente: i) que este seja atempadamente interposto (artigo 75.º); ii) de
decisão que não admita recurso ordinário (artigo 70.º, n.os 2 a 5); iii) que vise a apreciação de norma(s)
(artigo 70.º, n.º 1); iv) cuja inconstitucionalidade tenha sido prévia e adequadamente suscitada diante
do tribunal que proferiu a decisão recorrida (artigos 70.º, n.º 1, alínea b), e 72.º, n.º 2); e que v)
coincidam com a ratio decidendi dessa decisão, atenta a natureza instrumental dos recursos de
fiscalização concreta (artigo 80.º, n.º 2).

6.1. Analisado o requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade, verifica-se que


o ora reclamante identificou o objeto do recurso do seguinte modo: «pretende-se ver apreciada a
inconstitucionalidade das normas extraídas dos artigos 97.º, n.º 5; 379.º, n.º 1, alínea c); 425.º, n.º 4 do CPP e 40.º
e 71.º do CP com a interpretação de que não padece do vício de omissão de pronúncia a decisão judicial que não exare
fundamentação de direito quanto à questão de a favorável inserção familiar e profissional do arguido e o facto de não
existir registo de que tenha prosseguido com a atividade criminosa em causa nos autos ou qualquer outra, não assumir
relevância para a atenuação da sua responsabilidade criminal» (v. supra o § 2.1.).

6.2. Este enunciado, embora se refira a preceitos legais (artigos 97.º, n.º 5, 379.º, n.º 1, alínea c),
425.º, n.º 4, do Código de Processo Penal [adiante designado «CPP»] e 40.º e 71.º do Código Penal
[adiante designado «CP»]), não reveste natureza normativa, única idónea ao controlo da
constitucionalidade. Pelo contrário, ao assacar diretamente à decisão a violação dos parâmetros
constitucionais referidos (i.e., artigos 18.º, n.º 1, 32.º, n.os 1 e 2 e 205.º, n.º 1 da Constituição) e ao
afirmar que «esta interpretação em que o Tribunal omite qualquer tipo de fundamentação de direito inquina de
inconstitucionalidade aquelas normas por violarem o estatuído nos artigos 18.º, n.º 1, 32.º, n.ºs 1 e 2 e 205.º, n.º 1 da
Constituição da República Portuguesa», o recorrente, aqui reclamante, torna claro que o que pretende é
discutir a (in)suficiência da fundamentação e a consequente inconstitucionalidade da decisão
proferida pelo TRL, e não de qualquer critério, dissociável das circunstâncias concretas do caso,
dotado da generalidade e abstração própria das normas. Isto é, o recorrente dirigiu o recurso ao
modo como o Tribunal a quo aplicou o direito infraconstitucional – designadamente criticando a
decisão recorrida por, a seu ver, «existir omissão de fundamentação de direito quanto à questão de a favorável
inserção familiar e profissional do recorrente e o facto de não existir registo de que tenha prosseguido com a atividade
criminosa em causa nestes autos ou qualquer outra, não assumir relevância para a atenuação da sua responsabilidade
criminal» –, e não a qualquer norma que reputasse inconstitucional e cuja aplicação devesse ter sido
recusada pelo Tribunal a quo.
Não pode, todavia, ser satisfeita a pretensão do arguido, ora reclamante, a ver apreciada a
inconstitucionalidade de tal decisão, nem a sua bondade, justeza ou correção, já que esse não configura
objeto idóneo do recurso de constitucionalidade.

6.3. No que respeita, em especial, à norma ou interpretação normativa cuja inconstitucionalidade se


pretende ver apreciada por este Tribunal, importa recordar que segundo o disposto na alínea b) do
n.º 1 do artigo 280.º da Constituição, e no n.º 1 do artigo 70.º, da LTC, cabe recurso para o Tribunal
Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido
suscitada durante o processo, «identificando-se assim, o conceito de norma jurídica como elemento definidor do
objeto do recurso de constitucionalidade, pelo que apenas as normas e não já as decisões judiciais podem constituir objeto
de tal recurso» (v., entre muitos outros, os Acórdãos do Tribunal Constitucional n.os 361/98, 164/2013,
279/2014, 689/2017, 722/2021, 863/2021, 629/2022 e 99/2023).
Com efeito, o sistema português de fiscalização da constitucionalidade confere ao Tribunal
Constitucional competência para exercer um controlo estritamente normativo, que exclui a

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apreciação da inconstitucionalidade de decisões, judiciais ou administrativas, a impugnar pelos meios
próprios da correspondente ordem jurisdicional (v., entre muitos outros, os Acórdãos n.os 526/1998,
695/2016 e 733/2021). Significa isto que este Tribunal não pode substituir-se aos tribunais
recorridos, v.g., na fixação e qualificação dos factos, na valoração da prova, na determinação do
direito ordinário aplicável ou na apreciação sobre a suficiência da fundamentação das decisões
recorridas, sob pena de se imiscuir no concreto ato de julgamento e de rever decisões, quando apenas
lhe compete apreciar da inconstitucionalidade ou ilegalidade de normas (cf. o n.º 1 do artigo 71.º da
LTC e o artigo 280.º da Constituição).
Tanto bastaria para concluir que não merece censura o despacho reclamado.

7. A decisão reclamada não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional, também, por ser
invocada uma «inconstitucionalidade não suscitada anteriormente no processo» (v. supra § 2.2.).
Quanto a este fundamento, o aqui ora reclamante nada acrescentou. Com efeito, confrontado o
requerimento de interposição de recurso, constata-se que o requerimento de reclamação é igual, ou
seja, tendo sido dada a possibilidade ao arguido, ora reclamante, de indicar as peças processuais em
que este teria suscitado esta questão de constitucionalidade, o mesmo não o fez. Mantendo-se, pois,
incólume por incontestada nessa parte a fundamentação do despacho ora reclamado.

8. A decisão reclamada também não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional por
considerar o recurso «manifestamente infundado» (v. supra § 2.2.).
Pode ler-se na decisão reclamada que «ao recurso não é apresentada uma dimensão normativa que tenha
sido acolhida por este Tribunal a propósito da exigência de fundamentação das decisões que se extrai da conjugação dos
artigos 97.º, n.º 2, 379.º, n.º 1, alínea c) e 425.º, n.º 4, todos do Código de Processo Penal e ainda do disposto nos
artigos 40.º e 71.º do CP», rematando que «nunca [aquele] Tribunal da Relação aderiu a qualquer interpretação
das mencionadas normas que supusesse a dispensa de fundamentação autónoma da decisão do Tribunal de recurso. Ou
seja, nenhuma das normas convocadas foi interpretada na decisão com o sentido que lhes atribui o recorrente».
Embora no Acórdão do TRL de 14 de novembro de 2023 se faça expressa menção ao artigo
379.º, n.º 1, alínea c), do CPP, percebemos que no contexto da fundamentação da decisão essa
menção é feita para justificar, precisamente, o entendimento segundo o qual o Tribunal quo não
estava dispensado de fundamentar a decisão de recurso, ou seja, entendeu o Tribunal a quo ser exigida
a fundamentação e que a mesma foi realizada.
Constata-se, deste modo, que – ainda que fosse possível reconhecer que o recorrente, aqui ora
reclamante, logrou enunciar uma verdadeira norma ou critério normativo no requerimento de
interposição do presente recurso, o que não se concede – a ratio decidendi da decisão ali recorrida não
coincidiria com tal «interpretação», tal como se afirmou no despacho ora reclamado – afirmação que,
de resto, o reclamante também não refuta na reclamação ora apresentada.

9. Por todo o exposto, resta, assim, concluir, como o fez a decisão reclamada, no sentido de que,
tal como enunciada pelo ora reclamante no requerimento de interposição do recurso, a questão
suscitada nos presentes autos não configura objeto idóneo do recurso de constitucionalidade – o que,
por si só, obsta a que possa ser conhecida por este Tribunal, termos em que, não podendo dar-se por
reunidos os pressupostos essenciais de admissão do recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1
do artigo 70.º da LTC, se impõe o indeferimento da reclamação aqui sub specie.

III. DECISÃO

Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação, confirmando a decisão de não


admissão do recurso de constitucionalidade interposto.

Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta (cf. o n.º
4 do artigo 84.º da LTC e o artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro).

Lisboa, 11 de abril de 2024 - Carlos Medeiros de Carvalho

O Relator atesta os votos de conformidade do Senhor Juiz Conselheiro Afonso Patrão e do


Senhor Juiz Conselheiro Presidente, José João Abrantes.
Carlos Medeiros de Carvalho

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