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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2017.0000651621

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº


1010172-62.2016.8.26.0506, da Comarca de Ribeirão Preto, em que é apelante ROMILDO
MAGALHÃES DE LIMA (JUSTIÇA GRATUITA), é apelado POLICARD SYSTEMS E
SERVICOS LTDA (REVEL).

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 12ª Câmara de Direito Privado


do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao
recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores JACOB VALENTE


(Presidente sem voto), SANDRA GALHARDO ESTEVES E CASTRO FIGLIOLIA.

São Paulo, 30 de agosto de 2017.

Tasso Duarte de Melo


Relator
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

APELAÇÃO Nº 1010172-62.2016.8.26.0506
COMARCA: RIBEIRÃO PRETO 5ª VARA CÍVEL
APELANTE: ROMILDO MAGALHÃES DE LIMA (JG)
APELADA: POLICARD SYSTEMS E SERVIÇOS LTDA.

VOTO Nº 24884

AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE


DÉBITO C.C. REPARAÇÃO DE DANOS. Revelia da
Apelada. Presunção de veracidade do art. 344 do NCPC que é
relativa. Cartão “Policard” para antecipação salarial.
Utilização do cartão, com descontos em folha de pagamento, ao
menos desde março/2013. Ação judicial ajuizada somente em
março/2016, ausentes sequer indícios de impugnação
extrajudicial dos descontos, conforme alega o Apelante. Falta
de verossimilhança das alegações de desconhecimento das
transações e/ou não utilização do cartão. Inadmissibilidade de
inversão do ônus da prova. Apelante que não provou os fatos
constitutivos do seu direito. Sentença mantida na íntegra, nos
termos do art. 252 do RITJSP.

Recurso não provido.

Trata-se de recurso de apelação (fls. 53/57) interposto por


ROMILDO MAGALHÃES DE LIMA nos autos da ação declaratória c.c. reparação
de danos, contra a r. sentença (fls. 46/51) proferida pela MM.ª Juíza de Direito da
5ª Vara Cível da Comarca de Ribeirão Preto, Dra. Lucilene Aparecida Canella de
Melo, que julgou improcedentes os pedidos.
Sustenta o Apelante, em suma, não ter realizado qualquer
negócio jurídico com a Apelada que autorizasse o desconto de valores em sua
folha de pagamento; que não teria como fazer prova de fato negativo, ou seja, de
que não teria utilizado o cartão; que, de outro lado, a Apelada poderia fazer prova
de que o Apelante realizou as transações; que a Apelada seria revel. Cita
jurisprudência e pede a reforma da r. sentença, para que os pedidos sejam
julgados procedentes.
Sem contrarrazões pela Apelada (fls. 61).
Sem oposição ao julgamento virtual (fls. 68).

É o relatório.
Apelação nº 1010172-62.2016.8.26.0506 -Voto nº 24884 2
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O recurso não deve ser provido.

Aduz o Apelante, servidor público municipal, que teria direito


ao uso de cartão denominado “antecipação salarial”, porém, mesmo sem ter
utilizado o referido cartão, estaria sofrendo descontos diretamente em folha de
pagamento. Alega desconhecer tais operações.
Estes são, em suma, os fatos deduzidos na petição inicial.
Em que pese a revelia da Apelada, tal fato, por si só, não
implica a procedência dos pedidos.
A presunção de veracidade do art. 344 do NCPC é relativa e
deve ser afastada sempre que existir elementos nos autos que neguem os fatos
narrados na petição inicial, consoante lição de José Roberto dos Santos
Bedaque1.
Portanto, ausente a verossimilhança das alegações ou de
provas dos fatos constitutivos do direito do autor da ação, não se impõe
automaticamente a procedência dos pedidos.
Na espécie, conforme bem decidido pelo juízo a quo, falta
verossimilhança às alegações do Apelante.
Isso porque, da análise dos documentos de fls. 21/35, extrai-
se que os descontos efetivados em folha de pagamento a título de “antecipação
de salário”, decorrência da utilização do cartão “Policard” (fls. 20), estão sendo
efetivados ao menos desde março/2013, sem qualquer providência concreta pelo
Apelante a fim de impugnar tais descontos.
Não é crível que, diante da gravidade dos fatos alegados,
somente em março/2016, ou seja, depois de aproximadamente 03 anos de
descontos indevidos, viesse o Apelante alegar desconhecimento dos valores
cobrados e/ou não utilização do cartão de antecipação salarial.
Chama a atenção, ainda, que não há qualquer indício de
que o Apelante tenha comunicado o fato a Apelada, pois sequer indica o número
de protocolo das supostas ligações que fez para impugnar os descontos.
1
Código de processo civil interpretado. Coordenação Antonio Carlos Marcato. São Paulo: Atlas, 2004 p.
967.

Apelação nº 1010172-62.2016.8.26.0506 -Voto nº 24884 3


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Ainda que se admita a inversão do ônus da prova em caso


como dos autos, seja com fundamento no CDC (inversão do ônus da prova ope
legis em razão do fato de serviço art. 14 CDC), seja com fundamento no art.
373, § 1º, do NCPC (teoria da inversão dinâmica do ônus da prova), tal inversão
somente deve ser admitida quando existam indícios mínimos da veracidade das
alegações.
Neste caso concreto, repita-se, não há qualquer indício da
ocorrência dos fatos narrados na petição inicial, tendo em vista a dinâmica dos
fatos e o tempo decorrido entre o início do suposto ilícito e o ajuizamento da
ação.
Se o Apelante foi descuidado ao documentar, minimamente,
as provas indiciárias dos fatos constitutivos do seu direito, não é possível
presumir a inequívoca ocorrência de falha no serviço, pena de arbitrariedade,
consoante regras da experiência comum (art. 375 do NCPC).
Em suma, tendo em vista a ausência de indícios factíveis
dos fatos narrados na petição inicial, a hipótese não é de inversão do ônus da
prova, o que impõe o julgamento de improcedência dos pedidos, tendo em vista a
ausência da prova dos fatos constitutivos do direito do Apelante.
Neste sentido, incorporam-se a este v. acórdão os
fundamentos da r. sentença, nos termos do art. 252 do RITJSP:
“Desta feita, considerando que os descontos vem
sendo efetuados desde meados de 2013 em diante,
outrossim, considerando a variação de valores, bem
como de meses que sofreram descontos, com a
observação de que em determinados meses não fora
efetuado qualquer dedução à título de adiantamento de
seu salário, consoante se infere dos documentos
acostados às págs. 21/25, tem-se pela total
improcedência do pedido inicial, até porque não
trouxe aos autos parte autora qualquer documento
capaz de elidir a contratação e utilização dos
serviços prestados pela ré, uma vez que ao narrar em
sua inicial tratativa por telefone junto à suplicada
sequer citou qualquer número de protocolo, deixando,
assim, de corroborar suas afirmações.
Posta a questão nestes termos, não é possível
extrair-se, com clareza, da juntada aos autos dos
meros relatórios emitidos pela Prefeitura Municipal

Apelação nº 1010172-62.2016.8.26.0506 -Voto nº 24884 4


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de Ribeirão Preto (págs. 21/25), que os valores ali


descontados à título de Cartão Antecip. Salar. Dec.,
igualmente, do Demonstrativo de Vencimentos e
Descontos(págs. 26/35), foram feitos de maneira
indevida.
Quanto aos mais, verifica-se que se ensejaram à
parte autora todas as oportunidades de comprovação do
direito alegado; mas ela não logrou êxito em tal
mister, uma vez que mesmo após intimada a manifestar-
se nos autos quanto a necessidade de produção de
novas provas (pág. 43), pugnou pelo julgamento do
feito no estado (pág. 45), não carreando aos autos
elemento algum de efetiva convicção no sentido de que
lhe assiste o ordenamento jurídico, em termos de
mérito, na hipótese apreciada.
No caso destes autos, tal não ocorreu, e a
forçosa conclusão a que se há de chegar é que o
veredicto de mérito há de ser desfavorável a quem
ajuizou a demanda, com todos os consectários de praxe
daí decorrentes.” (destacamos)

Diante do exposto, nega-se provimento ao recurso,


mantida na íntegra a r. sentença.
Não se aplica à espécie o art. 85, § 11, do NCPC, pois,
além de revel, a Apelada não compareceu aos autos, sequer apresentando
contrarrazões.

TASSO DUARTE DE MELO


Relator

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