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22/04/24, 16:08 TC > Jurisprudência > Acordãos > Acórdão 315/2024

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22/04/24, 16:08 TC > Jurisprudência > Acordãos > Acórdão 315/2024
ACÓRDÃO Nº 315/2024

Processo n.º 321/2024


3 Secção
Relator: Conselheiro João Carlos Loureiro

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório
1. Nestes autos, A. interpôs, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15
de novembro (Lei do Tribunal Constitucional – LTC), recurso para o Tribunal Constitucional do
acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora em 20/02/2024.
2. O presente recurso de constitucionalidade constitui incidente no Processo n.º
22/19.8GBTMR-A, em que o recorrente é arguido.
2.1. Nesse processo, o arguido foi condenado em 1.ª instância pela prática, em concurso efetivo,
de um crime de roubo, previsto e punido pelo artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal, e de um crime de
injúria, previsto e punido pelo artigo 181.º, n.º 1, do Código Penal, na pena única de três anos e sete
meses de prisão.
2.2. Na sequência da entrada em vigor da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, o tribunal de 1.ª
instância, por despacho proferido em 25/09/2023, declarou extinta a pena aplicada ao arguido pela
prática do crime de injúria, mantendo a pena que lhe fora aplicada pela prática do crime de roubo.
2.3. Inconformado, o arguido recorreu desse despacho para o Tribunal da Relação de Évora, o
qual, por decisão sumária proferida em 29/01/2024, rejeitou o recurso por ser manifestamente
improcedente.
2.4. Permanecendo inconformado, reclamou para a conferência, tendo a reclamação sido
indeferida por acórdão de 20/02/2024.
2.5. Ainda irresignado, interpôs recurso desse acórdão para o Tribunal Constitucional – dando
origem aos presentes autos –, através de requerimento com o seguinte teor:
«A., recorrente nos presentes autos, tendo sido notificado do Acórdão proferido por este Tribunal a 20 de fevereiro de
2024, vem dele INTERPOR RECURSO PARA O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL, nos termos do artigo
75.º-A da Lei do Tribunal Constitucional.
O presente Recurso devera ser admitido a subir, NOS PRÓPRIOS AUTOS E COM EFEITO SUSPENSIVO
(artigo 78.º, n.º 3, da LTC), porque interposto por SUJEITO DOTADO DE LEGITIMIDADE (artigo 72.º, n.º 1,
alínea b, e n.º 2, da LTC) de DECISÃO RECORRÍVEL (artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC).
O presente recurso é interposto ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC.
Sendo o recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º, as normas ou princípios constitucionais ou
legais que se consideram violados, na perspetiva do recorrente, é a norma contida na alínea g) do n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º
38- A/2023, de 2 de agosto, por violação do princípio da aplicação da lei mais favorável ao arguido – artigo 29.º, n.ºs 1 e 4,
da CRP – quando interpretada no sentido de que o crime de roubo do artigo 210.º, n.º 1, do CP se enquadra nas exclusões
previstas no artigo 7.º da referida Lei do Perdão, mais concretamente na exceção prevista na alínea g) do n.º 1 daquele artigo
7.º, não devendo beneficiar – por isso – do perdão os condenados pelo crime de roubo do n.º 1 do artigo 210.º do CP.
A PRESENTE QUESTÃO DE CONSTITUCIONALIDADE, objeto do presente Recurso de
Constitucionalidade, foi suscitada ao longo do processo, mais concretamente perante o Tribunal da Relação de Évora na
reclamação que se fez da decisão sumária proferida.
O ora recorrente, por acórdão proferido no dia 3/12/2021, foi condenado pela prática em autoria material e na forma
consumada de um crime de roubo, previsto no artigo 210.º, n.º 1, do CP, na pena de 3 anos e 6 meses de prisão; e de 1 crime
de injúria, previsto no artigo 181.º, n.º 1, do mesmo código, na pena de 2 meses de prisão; e, operado o cúmulo jurídico, foi
condenado na pena única de 3 anos e 7 meses de prisão.
Na sequência da publicação e entrada em vigor da Lei n.º 38- A/2023, de 2 de agosto, que estabeleceu um perdão de
penas e uma amnistia de infrações, por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude, o referido
tribunal da condenação, no pretérito dia 25/09/2023, nos termos do disposto no artigo 128.º, n.º 2, do CP, declarou extinta
por amnistia a pena na qual o recorrente havia sido condenado pela prática do crime injúria, mas considerou não abrangido
(por amnistia ou perdão de pena) o crime de roubo praticado, mantendo-se portanto a pena que lhe havia sido fixada no
acórdão condenatório.
Notificado dessa decisão e não concordando com a mesma, veio o arguido dela recorrer, concluindo que o arguido, tendo
sido condenado pelo n.º 1 do artigo 210.º do CP, e não pelo n.º 2 do mesmo artigo, beneficia do perdão, pois o crime em causa
não está incluindo nas exceções ali referidas, tendo, portanto, direito ao perdão previsto na Lei n.º 38-A/2023.
No exame preliminar, ao abrigo do disposto no artigo 417.º, n.º 6, alínea b), do CPP, considerou-se ser manifesta a
improcedência do recurso (artigo 420.º, n.º 1, alínea a), do CPP), pelo que o relator, através de decisão sumária, determinou a
sua rejeição.

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O recorrente reclamou para a conferência dessa decisão sumária, tendo sido proferido – então – o Acórdão agora
recorrido.
Entende o recorrente que tem de ser declarado o perdão da pena de prisão aplicada ao arguido também pela prática do
crime de roubo do artigo 210.º, n.º 1, do CP, por este crime não se enquadrar em nenhuma das exclusões previstas no artigo
7.º da referida Lei do Perdão, sob pena de inconstitucionalidade da alínea g) do n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023 de
2 de agosto.
Assim, o recorrente, na reclamação que fez da decisão sumária proferida, levantou, arguiu e requereu a
inconstitucionalidade da norma contida na alínea g) do n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, por
violação do princípio da aplicação da lei mais favorável ao arguido – artigo 29.º, n.ºs 1 e 4, da CRP – quando interpretada
no sentido de que o crime de roubo do artigo 210.º, n.º 1, do CP se enquadra nas exclusões previstas no artigo 7.º da referida
Lei do Perdão, mais concretamente na exceção prevista na alínea g) do n.º 1 daquele artigo 7.º.
Inconstitucionalidade que aqui se alega para todos os efeitos legais.
Cumpre destacar que a Lei n.º 38-A/2023, ao dispor das exceções às quais não se aplica perdão e a amnistia previstos
na mencionada lei, dispõe no n.º 1, alínea b), item i), do artigo 7.º que, no âmbito dos crimes contra o património, não se
aplica o perdão aos condenados por crime de roubo previsto no n.º 2 do artigo 210.º do CP, mas não o roubo previsto no n.º 1
do mesmo artigo.
No caso dos presentes autos, o arguido foi condenado pelo n.º 1 do artigo 210.º do CP, e não pelo n.º 2 do mesmo artigo,
razão pela qual é possível constatar que o arguido não está incluindo nas exceções ali referidas, tendo, portanto, direito ao
perdão ali previsto, sob pena de inconstitucionalidade da norma supra indicada.
Face ao exposto, entende o recorrente que deve ser declarada a inconstitucionalidade da norma contida na alínea g) do n.º
1 do artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, por violação do princípio da aplicação da lei mais favorável ao arguido
– artigo 29.º, n.ºs 1 e 4, da CRP – quando interpretada no sentido de que o crime de roubo do artigo 210.º, n.º 1, do CP se
enquadra nas exclusões previstas no artigo 7.º da referida Lei do Perdão, mais concretamente na exceção prevista na alínea g)
do n.º 1 daquele artigo 7.º, com todos os efeitos legais.
Pede a V. Ex.ª deferimento.»
3. Pela Decisão Sumária n.º 199/2024, decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1,
da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso, com a seguinte fundamentação:
«4.1. Para além de o recurso previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC dever observar os requisitos formais
constantes dos n.os 1 e 2 do artigo 75.º-A da LTC e ser interposto de uma decisão jurisdicional, no prazo definido no artigo
75.º da LTC, a sua admissibilidade, segundo jurisprudência constitucional reiterada e uniforme, depende da verificação
cumulativa dos seguintes pressupostos: «a suscitação pelo recorrente, em termos tempestivos e adequados (n.º 2 do artigo 72.º
da LTC), de uma questão de inconstitucionalidade normativa; a efetiva aplicação, expressa ou implícita, de tal norma ou
interpretação normativa, em termos de a mesma constituir “ratio decidendi” ou fundamento jurídico da decisão proferida no
caso concreto; o esgotamento dos normais meios impugnatórios existentes no ordenamento adjetivo que rege a atividade do
tribunal que proferiu a decisão recorrida; finalmente, que o recurso não seja de considerar, em termos de análise liminar, como
manifestamente infundado» – Carlos Lopes do Rego, Os recursos de fiscalização concreta na lei e na jurisprudência do
Tribunal Constitucional, Coimbra, Almedina, 2010, p. 75. A falta de preenchimento de algum destes pressupostos obsta ao
conhecimento do objeto do recurso.
No que especificamente respeita ao segundo pressuposto, escreveu Carlos Lopes do Rego o seguinte (ob. cit., pp. 109-
110):
«Segundo jurisprudência uniforme e reiterada do Tribunal Constitucional, só ocorre efetiva aplicação de uma norma
quando ela constitui “ratio decidendi” da decisão proferida, isto é, fundamento jurídico determinante da solução dada ao pleito
pelo tribunal a quo. Não há, deste modo, efetiva aplicação da norma quando a decisão proferida assentou num outro e
autónomo fundamento de direito, diverso do invocado pelas partes como base das pretensões deduzidas, dirimindo o tribunal a
quo o litígio em função de um diferente e inovatório enquadramento jurídico, decorrente da utilização dos seus poderes de
interpretação e determinação do direito infraconstitucional aplicável, não condicionados pela qualificação feita pelas partes.
[...]
Por outro lado, quando o recurso seja reportado à inconstitucionalidade de certa interpretação normativa, especificada
pelo recorrente, é indispensável que haja efetiva e estrita coincidência ou identidade normativa entre a interpretação da norma
(especificada pelo recorrente como padecendo de inconstitucionalidade) e a interpretação que o tribunal, ao julgar o caso, fez de
tal norma, aplicando-a como efetivo fundamento de direito da decisão; aliás, um número extremamente significativo de recursos
acaba por não ser apreciado precisamente em consequência da inverificação deste requisito: o interessado para melhor
fundamentar o seu recurso, “força a nota”, procurando “construir” uma interpretação normativa que – a ter sido realizada –
seria provavelmente colidente com a Constituição – verificando-se, todavia, que não foi realmente essa a interpretação acolhida
pelo tribunal, que se fundou em critério normativo substancialmente diverso do questionado pelo recorrente.»
Trata-se de um requisito que traduz uma exigência de utilidade do recurso de fiscalização concreta, já que este – atenta
a sua função instrumental – só deve admitir-se na medida em que a eventual procedência implique uma alteração da decisão
recorrida. Com efeito, não sendo questionada a conformidade constitucional do efetivo critério normativo mobilizado pela
decisão recorrida, a utilidade do recurso encontra-se comprometida, pois um eventual juízo de inconstitucionalidade nunca
poderia determinar uma reformulação dessa decisão (cf., entre muitos outros, o Acórdão n.º 372/2015), inviabilizando a
referida função instrumental.
Sublinha-se, ainda, que, na nossa ordem jurídica, o controlo da constitucionalidade tem natureza estritamente
normativa, ou seja, versa necessariamente sobre “normas” ou “interpretações normativas”. Do ponto de vista da idoneidade

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do objeto, o recurso de fiscalização concreta não deve destinar-se a discutir o mérito das decisões, mas sim a confrontar as
normas que lhes serviram de critério com parâmetros da Constituição.
4.2. O recorrente indica como objeto do presente recurso a «alínea g) do n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2
de agosto, [...] quando interpretada no sentido de que o crime de roubo do artigo 210.º, n.º 1, do CP se enquadra nas
exclusões previstas no artigo 7.º da referida Lei do Perdão, mais concretamente na exceção prevista na alínea g) do n.º 1
daquele artigo 7.º».
Nos autos estava em causa saber se era ou não aplicável alguma das exceções ao perdão de pena previstas no n.º 1 do
artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, designadamente na sua alínea g). Esta alínea refere-se aos «condenados por
crimes praticados contra crianças, jovens e vítimas especialmente vulneráveis, nos termos do artigo 67.º-A do Código de
Processo Penal, aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de fevereiro» (sublinhado acrescentado).
Para fundamentar a sua decisão o tribunal recorrido socorreu-se do n.º 3 do referido artigo 67.º-A do Código de
Processo Penal, segundo o qual são sempre “vítimas especialmente vulneráveis” as vítimas de “criminalidade violenta”, em
conjugação com a alínea j) do n.º 1 do artigo 1.º do Código de Processo Penal, que define este tipo de criminalidade. Em
virtude de o crime de roubo previsto e punido pelo artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal tutelar também bens jurídicos pessoais
(como a liberdade individual de decisão e ação, a integridade física e mesmo a vida), considerou que a sua prática integra o
conceito de criminalidade violenta. É por isso que conclui que a situação dos autos se enquadra na exceção ao perdão prevista
na alínea g) do n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto. O critério decisório principal foi, assim, a
qualificação da conduta punida como violenta e, por via disso, da respetiva vítima como especialmente vulnerável, sendo que a
conclusão de que o crime de roubo previsto e punido pelo artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal cabe na referida exceção ao
perdão é meramente consequencial do percurso hermenêutico descrito.
Do exposto resulta que a ratio decidendi do acórdão recorrido assenta num arco normativo mais amplo e complexo,
envolvendo um juízo em que relevam, de forma conjugada, não só o artigo 7.º, n.º 1, alínea g), da Lei n.º 38-A/2023, de 2
de agosto, (associado ao artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal), mas também os artigos 67.º-A, n.º 3, e 1.º, n.º 1 , alínea j),
ambos do Código de Processo Penal, que o recorrente simplesmente omite do objeto do recurso (e, parcialmente, na suscitação
prévia em sede de reclamação para a conferência, que não inclui este último preceito legal), assim deixando de cobrir todo o
arco normativo relevante.
As considerações precedentes permitem concluir que não se verifica uma exata coincidência entre o sentido normativo
invocado – exclusivamente por referência à alínea g) do n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto (associado
ao artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal) – e o arco normativo efetivamente aplicado como ratio decidendi do acórdão recorrido,
o que compromete a utilidade do recurso e obsta ao conhecimento do seu objeto. »
4. Inconformado com tal decisão, veio o recorrente reclamar para a conferência, ao abrigo do
disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A da LTC, nos seguintes termos:
«1.º
O reclamante por acórdão proferido no dia 03/12/2021 foi condenado pela prática em autoria material e na forma
consumada de um crime de roubo, previsto no artigo 210.º, § 1.º do Código Penal, na pena de 3 anos e 6 meses de prisão; e
de 1 crime de injúria, previsto no artigo 181.º, § 1, do mesmo código, na pena de 2 meses de prisão; e, operado o cúmulo
jurídico, foi condenado na pena única de 3 anos e 7 meses de prisão.
2.º
Na sequência da publicação e entrada em vigor da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, que estabeleceu um perdão de
penas e uma amnistia de infrações, por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude, o referido
tribunal da condenação, no pretérito dia 25/09/2023, nos termos do disposto no artigo 128.º, § 2.º, do Código Penal,
declarou extinta por amnistia a pena na qual o recorrente havia sido condenado pela prática do crime injúria, mas considerou
não abrangido (por amnistia ou perdão de pena) o crime de roubo praticado, mantendo-se, portanto, a pena que lhe havia sido
fixada no acórdão condenatório.
3.º
Não concordando o reclamante com tal decisão interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Évora, por entender que
no caso dos presentes autos o arguido foi condenado pelo n.º 1 do artigo 210.º do Código Penal, e não pelo n.º 2 do mesmo
artigo, razão pela qual o arguido não está incluindo nas exceções ali referidas, tendo, portanto, direito ao perdão previsto na
Lei n.º 38-A/2023.
4.º
Tal como o Tribunal da condenação, o Tribunal de recurso entendeu que o crime de roubo pelo qual o arguido foi
condenado está excluído das medidas de clemência, nos termos do disposto no artigo 7.º Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto,
porque de acordo com o disposto no artigo 7.º, n.º 1, alínea g), desse diploma legal não beneficiam do perdão os condenados por
crimes praticados contra crianças, jovens e vítimas especialmente vulneráveis, nos termos do artigo 67.º-A do Código de
Processo Penal.
5.º
Concluindo, assim e por isso, que o reclamante não pode beneficiar do perdão da pena que lhe foi aplicada pelo crime de
roubo do artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal, por tal crime estar dele excluído, de harmonia com o que resulta das
disposições conjugadas dos artigos 7.º, n.º 1, alínea g), da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, 210.º, n.º 1, do Código Penal,
67.º-A, n.º 1, alínea b), e n.º 3, e 1.º, alínea l), ambos do Código de Processo Penal.
6.º
Não concordando o reclamante com tal decisão por parte do Tribunal da Relação, veio interpor recurso para este
Tribunal Constitucional, expondo que as normas ou princípios constitucionais ou legais que se considera violados, na

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perspetiva do recorrente, é a norma contida na alínea g) do n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 38- A/2023, de 2 de agosto, por
violação do princípio da aplicação da lei mais favorável o arguido – artigo 29.º, n.ºs 1 e 4, da CRP – quando interpretada
no sentido de que crime de roubo do artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal se enquadra nas exclusões previstas no artigo 7.º da
referida Lei do Perdão, mais concretamente na exceção prevista na alínea g) do n.º 1 daquele artigo 7.º, não devendo beneficiar
– por isso – do perdão os condenados pelo crime de roubo do n.º 1 do artigo 210.º do CP – questão já anteriormente alegada.
7.º
Contudo, o reclamante foi notificado de decisão sumária que decidiu não tomar conhecimento do objeto do recurso
interposto pelo mesmo, porquanto se entendeu que a ratio decidendi do acórdão recorrido assenta num arco normativo mais
amplo e complexo que envolve não só o artigo 7.º, n.º 1, alínea g), da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, mas também os
artigos 67.º-A, n.º 3, e 1.º, n.º 1, alínea al. j), ambos do Código de Processo Penal, mas o ora reclamante apresenta como
objeto do recurso exclusivamente a alínea g) do nº 1 do artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto.
8.º
Decisão com a qual não concordamos, de todo, e daí a presente Reclamação.
9.º
A questão central é a de saber se o artigo 7.º da referida Lei do Perdão, mais concretamente na exceção prevista na
alínea g) do n.º 1 daquele artigo 7.º, apenas engloba como exceção o crime de roubo do n.º 2 do artigo 210.º do Código Penal
ou se – pelo contrário – engloba como exceção ao perdão o crime de roubo previsto também no n.º 1 daquela disposição legal,
desde logo tendo em conta a própria letra do artigo 7.º da Lei do Perdão, na medida em que o mesmo artigo na sua alínea i)
exclui expressamente o roubo do artigo 210.º, n.º 2, e não o roubo do artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal.
10.º
A alínea g) do artigo 7.º da Lei do Perdão apenas engloba o roubo do n.º 2 do artigo 210.º do Código Penal e não o
roubo do n.º 1, porque o próprio artigo 7.º na sua alínea i) apenas prevê expressamente como estando excluído do perdão o
roubo do artigo 210.º, n.º 2, do Código Penal e note-se que ambos os roubos se integram no conceito de vítimas especialmente
vulneráveis, nos termos do artigo 67.º-A do Código de Processo Penal.
11º
Ora, se a norma decidendi fosse no caso em concreto os artigos 67.º-A, n.º 3, e 1.º, n.º 1, alínea j), do Código de
Processo Penal, bastaria ao legislador a alínea g) do artigo 7.º, não tendo havido qualquer necessidade de englobar na sua
alínea i) o roubo do n.º 2 do artigo 210.º do Código Penal.
Bastava a alínea g) do artigo 7.º da Lei do Perdão.
12.º
E, portanto, a norma decidendi é esta alínea g) do artigo 7.º da Lei do Perdão e não qualquer outra.
13.º
Aliás, se virmos a decisão de primeira instância, e da qual se recorreu, verificamos que a norma, que agora se diz ser a
norma decidendi, a norma dos artigos 67.º-A, n.º 3, e 1.º, n.º 1, alínea j), do Código de Processo Penal, nem sequer é ali
mencionada.
14.º
A primeira decisão recorrida – a proferida pelo Tribunal de Santarém – apenas decide tendo em conta, precisa e
unicamente, o disposto na alínea g) do artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023.
15.º
Esta é a ratio decidendi, sempre foi.
16.º
Aliás, nem se percebe o sentido da decisão sumária da qual reclamamos se a verdade é que o artigo 7.º, alínea g), da Lei
n.º 38-A/2023 faz expressamente referência ao artigo 67.º-A do Código de Processo Penal.
17º
Portanto, a ratio decidendi é sempre o artigo 7.º, alínea g), da Lei n.º 38-A/2023.
18.º
A questão não é a de saber se o crime de roubo do n.º 1 ou o crime de roubo do n.º 2 se integra ou não no conceito de
vítimas especialmente vulneráveis, nos termos do artigo 67.º-A do Código de Processo Penal.
19º
Não é nem nunca foi, porque isso já sabemos que sim. Ambos se integram no conceito de vítimas especialmente
vulneráveis, nos termos do artigo 67.º-A do Código de Processo Penal.
20.º
A questão é a de saber se apesar disso, se apesar de o crime de roubo, quer o do n.º 1 quer o do n.º 2 do artigo 210.º do
Código Penal, integrarem ambos o conceito de vítimas especialmente vulneráveis, nos termos do artigo 67.º-A do Código de
Processo Penal, ambos estão incluídos ou não na exceção da alínea g) da Lei do Perdão, na medida em que esta lei
expressamente apenas exclui do benefício do perdão apenas um deles, precisamente e como vimos já, o roubo do n.º 2 do artigo
210.º do Código Penal e na alínea i) daquele artigo 7.º da Lei do Perdão.
21.º
E, portanto, a norma decidendi é sem dúvida alguma a norma cuja inconstitucionalidade foi arguida e levantada, a
saber: artigo 7.º, alínea g), da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, e é inconstitucional nos exatos termos em que o

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defendemos no nosso recurso interposto para este Alto Tribunal.
22.º
Dizer-se que a norma decidendi é a norma contida no artigo 67.º-A do Código de Processo Penal é incompreensível, na
medida em que essa norma engloba os dois roubos: o roubo dos n.ºs 1 e 2 do artigo 210.º do Código Penal e, portanto, nunca
poderá ser esta a norma que poderá justificar englobar ou não na exclusão da alínea g) do artigo 7.º da Lei do Perdão apenas
um deles.
23.º
O recorrente veio alegar no seu recurso para este Tribunal, e bem a nosso ver porque essa é a ratio decidendi, a
inconstitucionalidade da norma contida na alínea g) do n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, por
violação do princípio da aplicação da lei mais favorável ao arguido – artigo 29.º, n.ºs 1 e 4, da CRP – quando interpretada
no sentido de que o crime de roubo do artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal se enquadra nas exclusões previstas no artigo 7.º
da referida Lei do Perdão, mais concretamente na exceção prevista na alínea g) do n.º 1 daquele artigo 7.º, com todos os efeitos
legais.
As razões sumariamente expendidas evidenciam a manifesta procedência do recurso, termos em que, nos melhores de
Direito e com o sempre mui douto suprimento de Vs. Exas., deve a PRESENTE RECLAMAÇÃO SER
DEFERIDA POR ACÓRDÃO EM CONFERÊNCIA, com todas as consequências legais para que, pela vossa
douta palavra, se cumpra a consueta Justiça.»
5. O Ministério Público pronunciou-se no sentido do indeferimento da reclamação da seguinte
forma:
«1.º
Pela douta Decisão Sumária n.º 199/2024, decidiu-se não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto
para o Tribunal Constitucional por A. ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de
novembro (Lei do Tribunal Constitucional, adiante designada “LTC”), do acórdão de 20 de fevereiro de 2024, do
Tribunal da Relação de Évora.
2.º
Conforme resulta do exposto naquela douta decisão sumária, foi decidido que:
“O recorrente indica como objeto do presente recurso a «alínea g) do n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023,
de 2 de agosto, [...] quando interpretada no sentido de que o crime de roubo do artigo 210.º, n.º 1, do CP se enquadra
nas exclusões previstas no artigo 7.º da referida Lei do Perdão, mais concretamente na exceção prevista na alínea g) do
n.º 1 daquele artigo 7.º». Ora, (…) O critério decisório principal foi, assim, a qualificação da conduta punida como
violenta e, por via disso, da respetiva vítima como especialmente vulnerável, sendo que a conclusão de que o crime de
roubo previsto e punido pelo artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal cabe na referida exceção ao perdão é meramente
consequencial do percurso hermenêutico descrito.
Do exposto resulta que a ratio decidendi do acórdão recorrido assenta num arco normativo mais amplo e
complexo, envolvendo um juízo em que relevam, de forma conjugada, não só o artigo 7.º, n.º 1, alínea g), da Lei n.º
38-A/2023, de 2 de agosto, (associado ao artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal), mas também os artigos 67.º-A, n.º
3, e 1.º, n.º 1 , alínea j), ambos do Código de Processo Penal, que o recorrente simplesmente omite do objeto do recurso
(e, parcialmente, na suscitação prévia em sede de reclamação para a conferência, que não inclui este último preceito
legal), assim deixando de cobrir todo o arco normativo relevante”.
3.º
Na verdade, perante a formulação da questão de constitucionalidade a sujeitar ao Tribunal Constitucional,
conjugada com a apreciação do teor da douta decisão recorrida, não poderia o Exmo. Sr. Conselheiro relator deixar de
decidir, como decidiu, não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto.
4.º
Resulta, tal como explicitado na decisão reclamada, que constitui jurisprudência firme deste Tribunal que os
recursos interpostos no âmbito da fiscalização concreta da constitucionalidade têm uma função instrumental, o que
significa que apenas poderá conhecer-se do respetivo objeto nos casos em que o julgamento da questão de
constitucionalidade for suscetível de repercutir-se, de forma útil e eficaz, na solução jurídica do caso concreto.
5.º
Sempre que a resolução da questão de constitucionalidade for insuscetível de confrontar o tribunal a quo com a
necessidade de reformar o sentido do seu julgamento, o conhecimento do objeto do recurso carecerá de utilidade, como
acontece no caso em apreço.
6.º
Como se escreveu no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 199/2024, “Não está, portanto, verificado o
pressuposto da ratio decidendi, que constitui uma inerência do caráter instrumental dos recursos de fiscalização concreta
da constitucionalidade: embora estes recursos se restrinjam à questão da invalidade da norma, é necessário que as
decisões proferidas no seu âmbito possam repercutir-se sobre a decisão recorrida, o que só pode acontecer quando haja
coincidência entre a norma cuja inconstitucionalidade é invocada e a norma ou normas que foram de facto aplicadas
pelo tribunal recorrido para fundamentar a sua decisão. Visto que no presente caso essa coincidência não se verifica,
um eventual juízo de inconstitucionalidade por parte do Tribunal Constitucional relativamente a uma norma extraída
dos preceitos indicados não poderia repercutir-se, em termos de impor a sua reforma, sobre a decisão recorrida”
(sublinhado nosso).

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7.º
Ora, confrontado com a inferência alcançada pela douta Decisão Sumária n.º 199/2024, limita-se o reclamante
a discordar do juízo de não conhecimento enunciado pelo Exmo. Sr. Conselheiro relator, nada aditando de relevante
sobre as razões que determinaram a decisão de não conhecimento assumida pela Exmo. Sr. Conselheiro relator,
evidenciando a falta de fundamento da reclamação.
8.º
Acrescente-se que conforme tem sido sucessivamente reiterado pelo Tribunal Constitucional, ao contrário do que
parece manifestamente pretender o reclamante, a revisão da própria decisão recorrida não cabe no âmbito do recurso
apresentado ao Tribunal Constitucional, de natureza estritamente normativa.
9.º
A este Tribunal cabe o escrutínio da constitucionalidade de normas e não de quaisquer outras operações,
designadamente o modo como o tribunal recorrido interpretou ou aplicou o direito infraconstitucional: essa é matéria de
direito comum, para a qual são competentes os tribunais comuns competindo à jurisdição constitucional o controlo da
conformidade constitucional de normas, excluindo a apreciação de decisões judiciais, sob pena de inadmissibilidade.
10.º
Assim sendo, tendo-se o reclamante limitado a divergir do entendimento expresso por este Tribunal Constitucional
na douta decisão sumária reclamada, não logrando imputar-lhe erros, omissões ou quaisquer outros vícios, não poderá
a sua pretensão deixar de ser, em nosso juízo, desatendida.
11.º
Por força do acabado de expor, deve a presente reclamação ser, em nosso entender, indeferida.»
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
6. Com a interposição do presente recurso, visou o recorrente questionar a constitucionalidade
da «alínea g) do n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, [...] quando interpretada no
sentido de que o crime de roubo do artigo 210.º, n.º 1, do CP se enquadra nas exclusões previstas no
artigo 7.º da referida Lei do Perdão, mais concretamente na exceção prevista na alínea g) do n.º 1
daquele artigo 7.º».
Na decisão sumária reclamada entendeu-se não tomar conhecimento do objeto do recurso por
inutilidade, dada a falta de correspondência entre a interpretação normativa enunciada pelo
recorrente e a ratio decidendi da decisão recorrida.
Para tanto, considerou-se, em síntese, que a ratio decidendi do acórdão recorrido assenta num
arco normativo mais amplo e complexo, envolvendo um juízo em que relevam, de forma conjugada,
não só o artigo 7.º, n.º 1, alínea g), da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, (associado ao artigo 210.º,
n.º 1, do Código Penal), mas também os artigos 67.º-A, n.º 3, e 1.º, n.º 1 , alínea j), ambos do Código
de Processo Penal (e não apenas aquele artigo 67.º-A, como, certamente, por lapso, refere o
reclamante no artigo 22.º da sua reclamação), que o recorrente simplesmente omite do objeto do
recurso (e, parcialmente, na suscitação prévia em sede de reclamação para a conferência, que não
inclui este último preceito legal), assim deixando de cobrir todo o arco normativo relevante.
Contrapõe o reclamante que a questão central é a de saber se o artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023,
de 2 de agosto, mais concretamente na alínea g) do seu n.º 1, também engloba como exceção o crime
de roubo previsto no n.º 1 do artigo 210.º do Código Penal ou se inclui apenas o crime de roubo
previsto no n.º 2 do mesmo artigo – concluindo, tendo em conta, desde logo, a própria letra do
referido artigo 7.º, cuja alínea i) exclui expressamente o crime de roubo previsto no n.º 2 e não o
crime de roubo previsto no n.º 1, que a segunda hipótese é a correta (cf. os artigos 9.º a 11.º da
reclamação).
Sucede que, ao assim argumentar, o reclamante discute, na verdade, a melhor interpretação do
direito infraconstitucional aplicável ao caso, revelando que a sua intenção é contestar, no plano do
direito ordinário, o sentido que o tribunal a quo conferiu ao artigo 7.º, n.º 1, alínea g), da Lei n.º 38-
A/2023, de 2 de agosto. O que o reclamante defende é que seja acolhida uma interpretação desse
preceito legal que entende ser mais adequada à sua pretensão (cf., também, os artigos 18.º a 21.º da
reclamação). Ora, não compete ao Tribunal Constitucional apreciar a validade das decisões judiciais
no que respeita à eventual correção da interpretação e aplicação dos preceitos de direito
infraconstitucional.
Por outro lado, a afirmação do reclamante de que a decisão proferida em 1.ª instância não
menciona os artigos 67.º-A, n.º 3, e 1.º, n.º 1, alínea j), do Código de Processo Penal, mas apenas o
artigo 7.º, n.º 1, alínea g), da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto (cf. os artigos 13.º e 14.º da
reclamação) é irrelevante, na medida em que o presente recurso versa sobre o acórdão do Tribunal da
Relação de Évora de 20/02/2024, a cujo conteúdo se deve, pois, atender para determinar que
normas foram efetivamente aplicadas para efeitos de apreciação dos pressupostos de recorribilidade.
Por fim, também não convence o argumento segundo o qual o artigo 7.º, n.º 1, alínea g), da Lei
n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, faz expressamente referência ao artigo 67.º-A do Código de Processo
Penal (cf. o artigo 16.º da reclamação), uma vez que este preceito legal inclui várias categorias de

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vítimas e não apenas as “especialmente vulneráveis” porque sujeitas a “criminalidade violenta” nos
termos do n.º 3 – dimensão normativa esta que o recorrente deveria ter enunciado expressamente.
Posto isto, reiteram-se as considerações expendidas na decisão sumária ora reclamada: para
fundamentar a sua decisão o tribunal recorrido socorreu-se do n.º 3 do referido artigo 67.º-A do
Código de Processo Penal, segundo o qual são sempre “vítimas especialmente vulneráveis” as
vítimas de “criminalidade violenta”, em conjugação com a alínea j) do n.º 1 do artigo 1.º do Código
de Processo Penal, que define este tipo de criminalidade; em virtude de o crime de roubo previsto e
punido pelo artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal tutelar também bens jurídicos pessoais (como a
liberdade individual de decisão e ação, a integridade física e mesmo a vida), considerou que a sua
prática integra o conceito de criminalidade violenta; é por isso que conclui que a situação dos autos
se enquadra na exceção ao perdão prevista na alínea g) do n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023,
de 2 de agosto; o critério decisório principal foi, assim, a qualificação da conduta punida como
violenta e, por via disso, da respetiva vítima como especialmente vulnerável, sendo que a conclusão
de que o crime de roubo previsto e punido pelo artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal cabe na referida
exceção ao perdão é meramente consequencial do percurso hermenêutico descrito.
Confirma-se, assim, que não existe coincidência entre a interpretação normativa enunciada e
aquela que constitui o arco normativo efetivamente aplicado como ratio decidendi do acórdão
recorrido.
Recordando o que se explicou na decisão reclamada, existe uma «evidente conexão» entre a
utilidade do recurso e a «necessidade de que haja ocorrido efetiva aplicação [...] pela decisão recorrida
da norma ou interpretação a que vem reportado o recurso interposto perante o Tribunal
Constitucional», de forma a que o julgamento do recurso se possa «projetar ou repercutir, de forma
útil e eficaz, na decisão recorrida», alterando «no todo ou em parte, a solução jurídica que se obteve
no caso concreto» – tanto que «faltam os pressupostos de admissibilidade de qualquer dos tipos de
recurso quando o decidido pelo tribunal “a quo” sobre tal matéria [não] se configura [...] como “ratio
decidendi” da solução dada ao litígio» (cf. Carlos Lopes do Rego, Os recursos de fiscalização
concreta na lei e na jurisprudência do Tribunal Constitucional, Coimbra, Almedina, 2010, pp. 52 e
53).
Note-se, por fim, que, não estando em causa uma mera insuficiência formal do requerimento de
interposição do recurso, mas sim a sua inutilidade, não há lugar ao convite previsto no artigo 75.º-A,
n.os 5 e 6, da LTC, pelo que a não verificação das condições legalmente previstas para recorrer não é
suprível através daquela correção.
7. Não havendo argumentos aptos a afastar os fundamentos da decisão reclamada, resta
confirmá-la.
Nestes termos, improcede na íntegra a presente reclamação.

III. Decisão
Pelo exposto, decide-se:
a) indeferir a reclamação apresentada;
b) condenar o reclamante nas custas, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) UC, ponderados
os critérios referidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro (cf. o artigo 7.º
do mesmo diploma).

Lisboa, 11 de abril de 2024 - João Carlos Loureiro - Joana Fernandes Costa - José João Abrantes

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22/04/24, 16:08 TC > Jurisprudência > Acordãos > Acórdão 315/2024

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