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Aula 7

Estudos Clínicos Randomizados I

Disciplina: Epidemiologia II
Questões Norteadoras
Estudos de Intervenção

Quais suas características?

Como são classificados?

Quais são as fases dos Ensaios Clínicos?

Como delinear os Ensaios Clínicos Randomizados (ECRs)?

Quais medidas de associação podem ser empregadas na


análise de dados e suas inferências?
Estudos de Intervenção: Definição

Pesquisador manipula o fator de exposição


(intervenção), ou seja, provoca uma modificação
intencional em algum aspecto do estado de saúde,
através da introdução de um esquema profilático ou
terapêutico.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO

✓ Podem ter ou não grupo-controle;

Exemplo de um estudo não-controlado – “antes e depois”

ou before and after – todos os pacientes recebem o mesmo

tratamento e sua condição é verificada no início e em

vários momentos após o tratamento.

Ex: melhora do hipotireoidismo a partir do uso do

hormônio da tireoide – todos recebem o hormônio;


ESTUDOS DE INTERVENÇÃO

✓ Podem referir-se a indivíduos ou a comunidades

Exemplos:

Indivíduos:

✓ Terapêutico: combinação de drogas para tuberculose;

✓ Profilático: flúor na prevenção de cáries ou AAS para


prevenção de infarto;

Comunidade: extensão dos profiláticos. Ex: fluoração de


toda água que abastece para prevenção de cáries.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO

Estudos Quase-experimentais

O fator de interesse (intervenção) é manipulado pelo

investigador, mas a alocação dos indivíduos nos grupos

não se dá de modo aleatório (ao acaso).


ESTUDOS DE INTERVENÇÃO

Exemplo de um estudo Quase-experimental

Estudo de James Lind sobre intervenções no escorbuto,

em 1753, no qual o pesquisador distribuiu algumas

intervenções a 12 pacientes marinheiros com

escorbuto, concluindo pelo efeito benéfico do uso de

laranjas e limões.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO

Classificação dos estudos de intervenção:

De acordo com o objetivo da intervenção:

Profiláticos: investigam intervenções preventivas.


Ex: vacina;

Terapêuticos: investigam intervenções terapêuticas.


Ex: hipoglicemiante.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO

Classificação dos estudos de intervenção:

De acordo com a unidade de análise:

Clinical trials: indivíduos.

Community trials: comunidades são a unidade de


alocação para receber a intervenção (Ex: uma cidade).
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO

Exemplos de Community trials:


✓ Efeitos da fluoração da água sobre a incidência de
cáries nos Estados Unidos e Canadá;

✓Prevenção de doença coronariana na Karelia do Norte


(Finlândia): ação conjunta do setor de saúde, indústria
alimentícia e meios de comunicação de massa para
promoção de hábitos saudáveis na comunidade
(alimentação saudável, atividade física e redução do
tabagismo).
Fase Pré-clínica
✓ Muito importante e deve preceder os ensaios clínicos:

➢ Síntese de novas drogas;

➢ Estudos em animais (metabolismo, eficácia e toxicidade

potencial);

✓ Fase de maior gasto estimado em pesquisas sobre

drogas.
O que pode ser identificado
nos estudos em animais ?

- toxicidade aguda;
- danos em órgãos específicos;
- dose e efeito;
- metabolismo (mecanismos);
- farmacocinética;
- carcinogenicidade;
- mutagenicidade;
- teratogenicidade.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO

Ensaio Clínico Randomizado

✓ Estudo prospectivo em seres humanos;

✓ Compara uma intervenção (profilática ou terapêutica)


com controles;

✓ Fator de intervenção atribuído de forma aleatória


(técnica de randomização);

✓ Intervenção pode ser: fármaco, técnicas ou


procedimentos;

✓ Melhor fonte de determinação da eficácia de uma


intervenção (MBE).
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO

Fases da Experimentação ou dos Ensaios Clínicos


Ensaios clínicos com drogas pode ser classificados em
quatro fases principais:
✓ Fase I

✓ Fase II

✓ Fase III

✓ Fase IV
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Fases da Experimentação ou dos Ensaios Clínicos

Fase I
✓Ensaios de farmacologia clínica e toxicidade no homem,
primariamente relacionados à segurança e não à eficácia
e em geral, realizados em voluntários;

✓Principal objetivo: determinar uma dose aceitável da


droga (experimentos de doses escalonadas) que está
sendo testada (não causar efeitos colaterais sérios);

✓Envolve estudos do metabolismo e da


biodisponibilidade;
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Fases da Experimentação ou dos Ensaios Clínicos

Fase I
✓Após ensaios em voluntários normais, ainda nesta fase
testa-se em pacientes;

✓Requerem entre 20 a 80 indivíduos e pacientes;

✓Geralmente não randomizados e nem controlados,


costumam ser apenas séries de casos cuidadosamente
monitorados pelos investigadores.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Fases da Experimentação ou dos Ensaios Clínicos

Fase II
✓Ensaios iniciais de investigação clínica do efeito do
tratamento;

✓Investigações em pequena escala da eficácia e


segurança (estudos-piloto de eficácia);

✓Algumas vezes são conduzidos para selecionar drogas


realmente eficazes (entre inúmeras), que irão para a Fase
III;
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Fases da Experimentação ou dos Ensaios Clínicos

Fase II

✓Requerem geralmente 100 a 200 pacientes por droga;

✓Com frequência são estudos não-randomizados.


ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Fases da Experimentação ou dos Ensaios Clínicos

Fase III
✓Avaliação em larga escala do tratamento;

✓Compara a droga potencialmente eficaz com o(s)


tratamento(s) padrão(ões) disponível(eis) para a mesma
condição médica;

✓Ensaio controlado com um número suficientemente


grande de pacientes (geralmente milhares);

✓Maioria é randomizado.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Fases da Experimentação ou dos Ensaios Clínicos

Fase IV
✓ Fase de vigilância pós-comercialização;

✓Após droga ter sido aprovada para distribuição ou


comercialização pela ANVISA ou FDA;

✓Ainda monitoramento de efeitos adversos


(Farmacovigilância – Hospitais Sentinela), morbidade e
mortalidade;
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Fases da Experimentação ou dos Ensaios Clínicos

Ensaios clínicos para avaliação de novas


drogas
✓ Sustentados principalmente pela indústria farmacêutica;

✓ Estimativa: uma em cada 10.000 drogas sintetizadas


atinge a fase de estudos clínicos e no máximo 20% destas
chegam à comercialização;

✓Duração média da pesquisa total – 7 a 10 anos e metade é


representada pelos ensaios clínicos e envolve milhões de
dólares.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO

Características dos Ensaios Clínicos Randomizados

✓ Randomização (alocação de forma aleatória - ao acaso):

➢ Todos os participantes têm a mesma chance de


alocação para cada grupo de estudo;

➢ A alocação não é determinada pelos investigadores -


reduz viés de seleção;

• Comparabilidade - distribuição balanceada de possíveis


fatores de confundimento;
• Imprevisibilidade da alocação;
• Reprodutibilidade da alocação.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Características dos Ensaios Clínicos Randomizados

Técnicas de Randomização
✓ Randomização simples:
➢ Mais utilizada;

➢ Participantes alocados diretamente nos grupos de estudo


e controle, sem etapas intermediárias;

➢ Ex. 1: cara e coroa com moeda – cara é tratamento e


coroa é controle ou vice-versa;

➢ Ex. 2: tabela de números aleatórios, onde ímpares vão


para o grupo de intervenção e os pares para o controle (ou
programas de computador para gerar sequências
aleatórias).
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Características dos Ensaios Clínicos Randomizados

Técnicas de Randomização
✓ Randomização em blocos:

➢ Formação de blocos com número fixo de indivíduos,


dentro dos quais se tem a mesma quantidade de
indivíduos alocados em cada grupo;

➢ Ex. 1: blocos de seis (1,2,3,4,5,6) sequenciados


aleatoriamente em cada bloco e em cada seis
indivíduos randomizados, três serão intervenção e três
serão controles;

➢ Vantagens: número igual de participantes nos grupos,


pode ser aplicado em estudos com número reduzido de
participantes.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Características dos Ensaios Clínicos Randomizados

Técnicas de Randomização

✓ Randomização pareada:

➢ Inicialmente são formados pares de participantes;

➢ A alocação aleatória é feita no interior do par, onde um


indivíduo recebe o tratamento em estudo e o outro será
o controle.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Características dos Ensaios Clínicos Randomizados

Técnicas de Randomização

✓ Randomização estratificada:

➢ São formados inicialmente estratos de acordo com


características que possam intervir no desfecho (idade,
sexo, estadiamento de tumor);

➢ A alocação aleatória é feita dentro de cada estrato para


aumentar a chance de grupos balanceados quanto aos
fatores interferentes.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Características dos Ensaios Clínicos Randomizados

Técnicas de Randomização
✓ Randomização por minimização:

➢ Inicia-se com a randomização simples;

➢ Após a alocação de alguns indivíduos, suas características


são analisadas;

➢ Cálculos são refeitos com o recrutamento de novos


participantes, que passam a ter maior probabilidade de
serem alocados em um dos grupos de modo a diminuir as
diferenças que forem detectadas, ou para manter o
equilíbrio já alcançado;

➢ Técnica nova apoiada na informática para reduzir ao


máximo as diferenças entre os grupos.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Características dos Ensaios Clínicos Randomizados

Tamanho da Amostra
✓ Deve-se obter um número razoável de pacientes que
permita uma estimativa razoável de precisão da resposta ao
tratamento em análise;

✓ Questões prática e ética estão envolvidas;

✓ Abordagem estatística padrão para estimar o poder do


estudo.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Características dos Ensaios Clínicos Randomizados

Tamanho da Amostra

Quando a amostra precisa ser muito grande, o ensaio


pode ser realizado em vários centros (ensaios
multicêntricos, mega trial);

O objetivo desde tipo de ensaio é atingir um maior poder


estatístico e maior generalização de resultados.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Características dos Ensaios Clínicos Randomizados

Tamanho da Amostra

Ensaio “n-of-1” ou ensaio em um indivíduo: é basicamente um


desenho crossover (parte dos participantes, em ordem
randômica, recebe a intervenção e a outra parte corresponde
ao controle, e após uma pausa temporal, faz-se a inversão).

Não permite generalizações, mas pode ser útil para situações


particulares, como por exemplo, um paciente com uma doença
rara para a qual não existam ensaios específicos.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Características dos Ensaios Clínicos Randomizados

Organização, Planejamento e Monitoramento do


Ensaio
Deve-se definir com precisão:

- Seleção de participantes – critérios e inclusão e exclusão;

- Tratamento a ser avaliado: drogas, doses, mudança de


grupo de tratamento, outras drogas (co-intervenções);

- Desfechos a serem analisados: comparabilidade da


mensuração, efeito desejado (melhora) e efeitos colaterais;

- Como a resposta de cada paciente será avaliada - Perfil


de risco - variáveis que influenciam o prognóstico.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Características dos Ensaios Clínicos Randomizados

Organização, Planejamento e Monitoramento do


Ensaio
No Monitoramento deve-se acompanhar:

- Adesão ao protocolo: não adesão, perda de participantes;

- Efeitos adversos;

- Processamentos dos dados: avaliação incompleta,


cruzamento entre os grupos após randomização;

- Análises intermediárias para detectar se já existem


evidências definitivas de diferenças entre os grupos.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Características dos Ensaios Clínicos Randomizados

Tipos de Análises
Duas formas principais:

- Entre os que de fato terminaram o tratamento em cada


um dos grupos;

- Segundo a “intenção de tratar” (intention-to-treat) – são


incluídos todos que foram randomizados para formar os
grupos, independente de terem ou não completado o
tratamento (não adesão, por ex.).
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Características dos Ensaios Clínicos Randomizados

Tipos de Análises
Análise segundo “intenção de tratar” (intention-to-treat):

- tem sido a preferida;

- Vantagens: garante a manutenção dos grupos aleatórios e


avalia o tratamento em condições reais, incluindo as
imperfeições;

- Porém, necessita de informações sobre os que não


completaram o tratamento, se houve cruzamento entre os
grupos, para evitar viés.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Características dos Ensaios Clínicos Randomizados

Tipos de Análises
Análise de subgrupo - há grandes riscos inerentes à essa
análise:

1) Número inadequado de pacientes se a análise não fazia


parte do plano amostral inicial;

2) Risco de viés – os subgrupos selecionados por


características levantadas após a alocação, podem não ser
comparáveis, mesmo que retirados dos grupos inicialmente
randomizados;
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Características dos Ensaios Clínicos Randomizados

Tipos de Análises
Análise de subgrupo:

3) Quando um grande número de subgrupos é analisado, há


um aumento na chance de que alguns deles venham a mostrar
uma diferença estatisticamente significativa equivocada.

Ex: estudo ISIS-2 – análise da associação do signo astrológico


e o uso de aspirina no infarto do miocárdio – concluiu que o
uso da aspirina era benéfico para todos os signos, com exceção
de Libra e Gêmeos, para os quais havia aparentemente dano.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Características dos Ensaios Clínicos Randomizados

Mascaramento e Uso de Placebo


Mascaramento ou avaliação cega (blinding) ou ocultamento:
✓Objetivo: evitar que os participantes do ensaio saibam o
tratamento administrado, para evitar viés;
✓Pode envolver: o paciente, o grupo de profissionais que aplica
o tratamento e o avaliador;
✓Duplo-cego: todos os participantes estão cegos quanto à
condição de tratamento;
✓Mascaramento e uso de placebo: evitar a mudança de
comportamento dos indivíduos quando conhecem as
informações sobre a intervenção.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO
Características dos Ensaios Clínicos Randomizados

Mascaramento e Uso de Placebo

Ensaio aberto (open label):


✓ Quando não há uso de mascaramento;
✓ Não é possível quando a intervenção envolve: avaliação dos
efeitos de cirurgias, radioterapia ou dieta.

Placebo:
✓ Recurso para se alcançar o mascaramento;
✓ Ética: não pode ser utilizado se existe um tratamento
padrão alternativo de eficácia estabelecida.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO

Estimativa do Tamanho do Efeito do Tratamento

Distribuição de possíveis efeitos nos grupos tratado


e controle
Evento de Interesse Risco do
Grupo Presente Ausente Evento
Tratado a b RT = a/(a+b)
Controle c d RC = c/(c+d)

RT = risco no grupo tratado


RC = risco no grupo-controle
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO

Medidas do tamanho do efeito do tratamento

Risco relativo (RR): razão entre o risco no grupo tratado


(RT) e o risco no grupo-controle (RC).

RR = RT/RC

RT = a/(a+b) e RC = c/(c+d)

Interpretação: representa quanto o risco do grupo tratado


é maior ou menor que o risco do grupo controle.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO

Medidas do tamanho do efeito do tratamento

Redução absoluta de risco (RAR): diferença de risco entre o


grupo-controle (RC) e o grupo tratado (RT) em termos
absolutos.

RAR = RC - RT

Interpretação: representa a diminuição, em termos


absolutos, do risco no grupo tratado.
Resultados devem ser apresentados e interpretados na
forma de porcentagem
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO

Medidas do tamanho do efeito do tratamento


Redução relativa de risco (RRR): expressa a redução percentual
de eventos no grupo tratado (RT) em relação ao grupo-controle
(RC). Também conhecida como eficácia.

RRR = (1 - RT/RC) x 100


ou
RRR = (1 - RR) x 100

Interpretação: redução relativa do risco obtida com a


intervenção.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO

Medidas do tamanho do efeito do tratamento


Número necessário para tratar (NNT): expressa o número de
pacientes que devem ser tratados para que um se beneficie. É o
inverso da redução absoluta de risco. É um meio de medir o
impacto da intervenção.

NNT = 1/RAR
ou
NNT = 1/(RC-RT)

Interpretação: número de pacientes que devem ser tratados


para que um se beneficie.
ESTUDOS DE INTERVENÇÃO

Medidas do tamanho do efeito do tratamento

Odds ratio (OR) ou razão de chances: razão entre as chances de


apresentar o desfecho esperado no grupo de intervenção e no
grupo-controle.

OR = (a/b)/(c/d)
ou
OR = a.d/b.c
Sumarizando...

✓ Características

✓ Classificação

✓ Fases dos Ensaios Clínicos e suas características

✓ Características e maneiras de delinear os Ensaios


Clínicos Randomizados

✓ Medidas de associação empregadas nas análises de


dados e suas inferências
Bibliografia

MEDRONHO, R. A.; BLOCH, K.V; LUIZ, R.R.;


WERNECK, G.L. (Orgs) Epidemiologia (2. Ed). São
Paulo: Atheneu, 2009. 685p. Capítulo 13.

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