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PERCEPÇÃO E

ILUSÃO
Célia Teixeira
A CONCEPÇÃO INTUITIVA DA
PERCEPÇÃO
- A percepção, por exemplo, visual, parece
envolver pelo menos 3 elementos:
(i) O sujeito que vê,
(ii) Aquilo que é visto,
(iii) A relação entre o sujeito que vê e o
objecto que é visto (relação esta entendida
como uma relação causal em que o objecto
percepcionado causa a experiência visual no
sujeito).
A CONCEPÇÃO INTUITIVA DA
PERCEPÇÃO
Que tipo de coisas podem produzir em nós experiências visuais?
Que tipo de coisas são percepcionadas?

Candidatos óbvios: cadeiras, mesas, árvores, pessoas, etc.


A CONCEPÇÃO INTUITIVA DA
PERCEPÇÃO
As experiências perceptivas apresentam
uma nitidez e uma imediatez que outros
estados mentais não possuem.

Intuitivamente, através da percepção


temos um contacto directo e imediato
com o mundo exterior.
A CONCEPÇÃO
INTUITIVA DA
PERCEPÇÃO

De acordo com o filósofo sul-africano John


McDowell (n. 1942) a experiência perceptiva
consiste numa “abertura ao mundo”.
O ARGUMENTO DA ILUSÃO
I. Quando um sujeito é vítima de uma ilusão perceptiva, percepciona um objecto como
tendo uma propriedade que o objecto real não possuir.
II. Quando um sujeito percepciona algo como tendo uma certa propriedade, há algo que
o sujeito percepciona que tem essa propriedade.
III. Uma vez que o objecto real não tem essa propriedade, então nos casos de ilusões
perceptivas ou os sujeitos não percepcionam os objectos reais ou, se percepcionam,
fazem-no de forma indirecta.
IV. Do ponto de vista do sujeito, as percepções verídicas são indistinguíveis das meras
ilusões.
V. Logo, mesmo no caso das percepções verídicas, aquilo com que estamos
directamente em contacto não são os objectos externos.
VI. Logo, a concepção intuitiva da percepção está errada.
O ARGUMENTO DA
ALUCINAÇÃO
I. Quando se tem uma alucinação não há qualquer objecto externo responsável pela
experiência perceptiva.
II. Do ponto de vista do sujeito, a experiência de alucinar algo é indistinguível de
uma experiência verídica.
III. Tanto no caso da experiência verídica como no caso da alucinação há algo que é
o objecto da nossa percepção.
IV. Logo, mesmo no caso de percepções verídicas aquilo com que estamos
directamente em contacto não são os objectos externos.
V. Logo, a concepção intuitiva da percepção como uma forma directa de contacto
com o mundo exterior está errada.
O PROBLEMA DA
PERCEPÇÃO

Como diz o filósofo britânico Tim


Crane (n. 1962) o “problema da
percepção consiste num conflito
entre a concepção intuitiva da
percepção e os argumentos da ilusão
e da alucinação”.
ILUSÃO DE MÜLLER-LYER
ILUSÃO DE MÜLLER-LYER
A ILUSÃO
DO
TABULEIRO
DE XADREZ
A ILUSÃO
DOS
MORANGOS
TEORIAS TRADICIONAIS DA
PERCEPÇÃO
Realismo directo (ou ingénuo): Percepcionamos (por vezes) os objectos físicos de
forma directa ou imediata.

Realismo indirecto: Nunca percepcionamos os objectos físicos de forma directa ou


imediata.

Fenomenalismo e Idealismo: Apenas percepcionamos objectos não-físicos – os


objectos físicos nunca são percepcionados, nem indirectamente nem directamente.
GEORGE
BERKELEY
Um dos mais importantes filósofos idealistas é o
filosofo irlandês Geroge Berkeley (1685 –1753)
“Ser é ser percepcionado”.
REALISMO
INDIRECTO
A teoria dos dados dos sentidos
- O que percepcionamos directamente são os
nossos dados dos sentidos, que são objectos
mentais.

- Os dados dos sentidos têm as propriedades


que perceptivamente nos objectos exteriores.
DADOS DOS
SENTIDOS

O filósofo britânico Bertrand Russell (1872-


1970) foi um dos mais importantes proponentes
da teoria dos dados dos sentidos.
PROBLEMAS COM A TEORIA
DOS DADOS DOS SENTIDOS
- A própria natureza dos dados dos sentidos é algo misteriosa.
Os sense-data são vistos como objectos mentais com as propriedades que
percepcionamos nos objectos físicos.

Mas o que são objectos mentais? Qual a sua localização? E como podem os
objectos mentais terem as propriedades que percepcionamos nos objectos físicos?
(Por exemplo, quando estamos a alucinar um limão amarelo não há um limão
amarelo físico. Contudo, segundo este modelo da percepção, há um objecto que é
amarelo que é o objecto da nossa percepção – esse objecto é o “sense-datum”.
Contudo, nada há de amarelo e oval no nosso cérebro!)
PROBLEMAS COM A TEORIA
DOS DADOS DOS SENTIDOS
- O problema do véu da percepção: Segundo este modelo existe um véu perceptivo
entre nós e o mundo físico, mas neste caso que razões temos para acreditar na
existência de um mundo físico? Esta é a ameaça céptica que o modelo indirecto da
percepção enfrenta.

- A existência de dados dos sentidos parece incompatível com as nossas melhores


teorias sobre a mente, nomeadamente, as teorias fisicalistas.
E AGORA? AFINAL QUAIS SÃO
OS OBJECTOS DA
PERCEPÇÃO?
- Uma forma de rejeitar os argumentos da ilusão e da alucinação consiste em
rejeitar a premissa segundo a qual se algo parece P para alguém então há algo P que
assim parece (isto ficou conhecido como o Princípio Fenoménico).

- Mas rejeitar este princípio parece levar à rejeição da ideia de que a experiência
perceptiva é relacional: ter uma experiência perceptiva é ter uma experiência de
algo, independentemente de esse algo existir ou não no mundo físico.

- Mas como negar este aspecto relacional da experiência? Uma proposta consiste no
apelo à ideia de intencionalidade. Isto é o que as teorias intencionalistas propõem.
AS TEORIAS INTENCIONAIS
OU REPRESENTACIONAIS DA
PERCEPÇÃO
A intencionalidade é um termo técnico para a propriedade que os estados mentais
têm de ser acerca de algo.

O chamado conteúdo intencional de um estado mental é como esse estado


representa o mundo. E o objecto intencional é o objecto a que o estado intencional
se dirige.
INTENCIONALIDADE

A ideia de intencionalidade foi


introduzida pelo filósofo e psicólogo
alemão Franz Brentano (1838–1917)
AS TEORIAS INTENCIONAIS OU
REPRESENTACIONAIS DA
PERCEPÇÃO
- Os intencionalistas defendem que a percepção é uma forma de intencionalidade. Ou
seja, a percepção é uma forma de representação.

- As experiências perceptivas são estados representacionais, tal como as crenças


(chama-se também “representacionalismo” ao intencionalismo), e tal como podemos
ter uma crença sobre um objecto sem estar comprometido com a existência de um tal
objecto, também podemos ter uma experiência perceptiva de algo sem que esse algo
exista.
AS TEORIAS INTENCIONAIS OU
REPRESENTACIONAIS DA
PERCEPÇÃO
Os intencionalistas respondem ao problema da percepção ao rejeitar o princípio
fenoménico.

Mas como explicar os erros perceptivos?

A ideia é que os estados intencionais podem estar errados. Tal como podemos ter
crenças falsas acerca do mundo também podemos ter percepções erradas: em ambos
os casos o mundo é representado de forma errada.
AS TEORIAS INTENCIONAIS OU
REPRESENTACIONAIS DA
PERCEPÇÃO

Para os intencionalistas/representacionalistas as percepções verídicas têm


algo em comum com as percepções não-verídicas: o seu conteúdo
intencional.
No caso das percepções verídicas o seu conteúdo intencional representa o
mundo de forma correcta, no caso das percepções não-verídicas o seu
conteúdo não representa o mundo de forma correcta.
A filósofa norte-americana Susanna Siegel é
uma importante proponente do
representacionalismo.
QUAL A REPRESENTAÇÃO
CORRECTA?
O CONTEÚDO
REPRESENTACIONAL

- Será que representar uma galinha com 47 pintinhas


é diferente de representar uma galinha com 48
pintinhas?

- E se a galinha tivesse sido alucinada?


REPRESENTAÇÃO

A natureza dos conteúdos representacionais precisa de ser clarificada. Ter uma


experiência perceptiva é muito diferente de ter uma crença, apesar de ambos serem
estados mentais intencionais. O que os distingue?

A fenomenologia é particularmente importante: ver uma galinha nitidamente e ver uma


galinha um pouco desfocada pode ter o mesmo conteúdo representacional, mas a
experiência é diferente. Como acomodar isso?
O PROBLEMA DO VÉU DA
PERCEPÇÃO?
CONCLUSÃO
- As teorias representacionalistas enfrentam vários problemas, mas nenhum deles é
decisivo, e oferecem uma resposta elegante aos argumentos da ilusão e da
alucinação.

- Estas também parecem ser apoiadas pelos nossos conhecimentos de neurociência.

- O preço a pagar é a rejeição da concepção intuitiva da percepção. Mas talvez esse


seja um preço pequeno a pagar.
Obrigada!

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