SUPERAÇÃO DO CONFLITO RACIONALISTA- EMPIRISTA A – A PROPOSTA DO INTELECTUALISMO 1. Introdução
O intelectualismo procura ser uma
mediação entre racionalismo e empirismo. Esta proposta considera que tanto a razão quanto a experiência participam da produção do conhecimento. O intelecto tem a função de ler os dados da experiência. Os conceitos provêm dela. A experiência e o pensamento constituem juntos o fundamento do conhecimento. A experiência participa das representações das intuições sensíveis e o pensamento dos conceitos. Há uma relação genética entre eles. Aristóteles inclinava-se para o empirismo como pesquisador da natureza, mas tinha uma posição semelhante àquela do intelectualismo. A essência das coisas foi transferida do mundo inteligível para os objetos do mundo. A essência das coisas torna-se compreensível pela ação do intelecto ativo (noûs poietikós). Ela é transformada em conhecimento pelo intelecto passivo (noûs pathetikós). Tomás de Aquino recebe essa teoria e defende uma posição semelhante. Os conceitos têm relação e se fundamentam na experiência. Os intelectualistas vão exaltar o conhecimento abstrativo. Enquanto, os voluntaristas vão colocar a vontade acima do entendimento. Hegel apresenta uma forma de intelectualismo devido a sua alta confiança na racionalidade. A ideia tem totalmente independência no seu sistema. As formas de voluntarismo de Schopenhauer e Nietzsche serão justamente uma reação à sua extrema confiança na razão. O intelectualismo defende a existência de juízos necessários e universalmente válidos. EM SÍNTESE:
“O intelectualismo antepõe que o conhecer
humano é realista, já que, partindo dos dados sensíveis, o entendimento, por meio da abstração, apreendera as espécies inteligíveis nas que logo após alcançará a essência das coisas individuais.” 1.1. Apriorismo kantiano A teoria epistemológica de Kant pode ser resumida nos seguintes pontos:
a) A “coisa em si” não pode ser conhecida;
b) o nosso conhecimento se limita aos fenômenos; c) o mundo dos fenômenos surge na nossa consciência que elabora os dados sensíveis a partir das formas a priori da sensibilidade e do entendimento; d) o conhecimento é uma construção da consciência do sujeito; e) por esta natureza, o conhecimento tende a ser relativo; e f) a razão não pode conhecer ideias transcendentais, mas pode utilizá-las para questões de ordem prática. Conhecimento a priori: é totalmente independente da experiência. A necessidade é um dos critérios desse tipo de conhecimento. Exemplo: as proposições da matemática. O apriorismo considera tanto a experiência quanto o pensamento como fontes do conhecimento. Diferentemente do racionalismo, ele considera esses conhecimentos a priori de natureza formal. Esses conhecimentos são formas para receber o conteúdo da experiência. O princípio que governa o apriorismo diz o seguinte: “conceitos sem intuições são vazios; intuições sem conceitos são cegas.” 2. Intelectualismo de Tomás de Aquino Santo Tomás explica a intelecção como ação, insistindo em sua natureza como intencionalidade. O conhecer consiste em extrair o universal do particular, o inteligível do singular. Os tomistas buscavam o conhecimento da parte imaterial das coisas. A verdade é a adequação do intelecto e da coisa. Em oposição a Agostinho, Tomás considera que a verdade não está nas coisas, mas no intelecto. A verdade está no intelecto e em conformidade com aquilo que é inteligido. “Deste modo, é necessário afirmar que nosso entendimento conhece as realidades materiais abstraindo-as das imagens” (Summa Theologiae, Questão 81, artigo 1). RACIONALISMO EMPIRISMO INTELECTUALISMO O pensamento é a fonte A fonte e fundamento Ambas participam na e o fundamento do é a experiência. formação do conhecimento. Não há nada de novo conhecimento. Os conceitos são no pensamento. Retira os conceitos da produtos a priori da experiência. razão. Há conteúdos novos produzidos pelo pensamento. B – A PROPOSTA DO APRIORISMO Imanuel Kant procura criticar e equilibrar o embate entre racionalismo e empirismo. O conhecimento provém de duas fontes, em duas fases. Kant é o iniciador do apriorismo. O conhecimento começa com a experiência, mas procedem do intelecto. O apriorismo considera tanto a experiência quanto o pensamento como fontes do conhecimento. O nosso conhecimento possui conteúdos independentemente da experiência. Diferentemente do racionalismo, ele considera esses conhecimentos de natureza formal. Esses conhecimentos são formas para receber o conteúdo da experiência. O princípio que governa o apriorismo diz o seguinte: “conceitos sem intuições são vazios; intuições sem conceitos são cegas. O intelectualismo deriva o fator racional do fator empírico. O apriorismo o faz do próprio pensamento. 3. Pressupostos do voluntarismo O voluntarismo medieval se expressa em termos morais, a vontade é preponderante em relação ao intelecto nas ações. Na Idade Contemporânea, Hegel propõe um intelectualismo metafísico que gera reações voluntaristas. Para ele, a realidade é inteligível, não uma vontade irracional. Schopenhauer e Nietzsche reagem ao intelectualismo de Hegel. O voluntarismo afirma o primado da vontade sobre do intelecto. 4. Schopenhauer Schopenhauer chama o fenômeno kantiano de representação e a coisa em si, de vontade. Sendo que a vontade é predominante. Diferentemente de Kant, acredita na possibilidade de conhecer a coisa em si. Mas o conhecimento nunca atinge um ponto absoluto. “O corpo humano visto de fora não passa de uma representação como qualquer outra. Mas compreendido por dentro se revela como elo de unificação entre a vontade e a representação.” “A vontade é o conhecimento a priori do corpo; o corpo é o conhecimento a posteriori da vontade.” Vontade: “é um ímpeto cego, irresistível, que já vemos aparecer na natureza inorgânica e vegetal, assim como também na parte vegetativa de nossa própria vida.” Conhecemos os objetos por meio da experiência interna do corpo. Schopenhauer procura entender a causalidade a partir da experiência interna. Os conteúdos da experiência são organizados dentro do espaço (posição) e do tempo (sucessão). A geometria e aritmética são, respectivamente, as ciências do espaço e do tempo (razão do ser). Os estados das coisas formam uma cadeia de sucessão, causas e efeitos, dentro do espaço e do tempo (razão do devir). O entendimento humano é capaz de formular conceitos e a razão faz um ordenamento do conhecimento (razão do conhecer). Os movimentos dos corpos são motivados pela vontade. O sentido interno é o sujeito do querer e este vem a ser objeto do conhecer (razão do agir). 5. Nietzsche Nietzsche usa vontade como impulso fundamental e mecânico, sem causa racional, que impele a natureza para a vida. A motivação da busca de conhecimento é a vontade de poder. É um esforço para evitar cair na mentira e na falsidade. A razão é orientada por um modo de vida ou de moral. A base do conhecimento é o instinto de conservação. Para Nietzsche, o conhecimento absoluto e integral da realidade é considerado uma impossibilidade. Não podemos conhecer um fato em si. O conhecimento do mundo passa pelas interpretações em diferentes perspectivas. A realidade que o homem procura conhecer em Nietzsche é a vida. E ela é movida pela vontade. Nieztsche questiona a distinção sujeito- objeto tão cara aos epistemólogos modernos. A partir de uma influência biológica, ele busca formular uma explicação do conhecimento. Ele é um produto da evolução da espécie humana. As forças instintivas interagem com o meio, se regulam, e atuam na conservação da espécie. O filósofo abandona a busca pela verdade e se concentra nas vantagens do conhecimento para a conservação da vida. Ele tem a função de controle e de manejo do meio para a sobrevivência. A linguagem é outro produto do processo que contribui para essa finalidade porque possibilitou o compartilhamento do pensamento, e daí, a cooperação. “Para o filósofo conhecimento é perspectivo e condicionado às formas de vida”. As funções cognitivas esquematizam, identificam regularidades nas relações do corpo com o meio. A função da razão é adequar, igualar o caos das impressões sensórias. O corpo precisa de permanência e regularidade para realizar sua vontade de poder. As percepções se dividem em dois grupos. Há um grupo que é moldado para fins de socialização e outro que permanece latente. A percepção concatena arbitrariamente os fenômenos. A coisa em si não pode ser conhecida, aliás, é para Nietzsche uma ilusão. Todas as percepções são classificadas em juízo de valor, entre úteis e prejudiciais. CAMPO DAREFERÊNCIAS: TEORIA DO CONHECIMENTO ALVIM, Márcia Helena, BRZOZOWSKI, Sonia. Artigo VI “se o conhecimento intelectual é adquirido a partir das coisas sensíveis?”. Saberes, Natal RN, v. 19, n. 2, Agosto, 93-106, 2018. HESSEN, Johannes. Teoria do Conhecimento. São Paulo: Martins Fontes, 2000. FERNANDES, Paulo Adriano do Amaral. O conceito de relação a partir da noção tomásica da verdade como “adequação da coisa e do intelecto” na questão 16 da primeira parte da suma teológica. Anais da Jornada de Estudos Antigos e Medievais, Maringá, 2013. CAMPO DA TEORIA DO CONHECIMENTO JESUS, Francisco de Paula Santana de. Nietzsche e a teoria do conhecimento. Revista Apoena, v.2, n. 4, 2020.