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Atuação do psicólogo

frente a políticas públicas


em saúde mental
Ms. Marina Morabi
História da loucura

Pré- Antiguidad Idade


história e Clássica Média
Pré História
Forças externas
Forças sobrenaturais
Maus espíritos
Transtorno Mental
Bruxos
Demônios
Deuses

Atendidas em rituais tribais, para corrigir tal distúrbio.

Insucesso

Abandonado à própria sorte


Ferreira (2012)
Antiguidade
Clássica
Sem espaços sociais destinados
Pobres: ruas
Ricos: residência Caridade Pública /
Pequenos serviços
• Crises de agitação: forças sobrenaturais, decorrentes de possessões
demoníacas
• Indivíduo louco: problema familiar e não social

Grécia (860 a.C.):


• Sacerdotes: loucos: tratados com bondade e proporcionadas atividade físicas
• Médicos: grande consideração pelos doentes: ar fresco, água pura, luz solar.
• Mestres, alunos e doentes faziam caminhadas, encenações teatrais para melhorar o “humor”.
• Mas: os paciente que não reagiam ao tratamento eram submetidos à inanição e a flagelação

Ferreira (2012)
Sócrates
• Supremacia da faculdade do "pensamento", que
considerava a melhor via para se chegar ao
"conhecimento de si próprio".
• “Só sei que nada sei”
• “Conhece-te a ti mesmo” - Oráculo de Delphos
• Filosofia  Antropologia (Nosce te ipsum, de
Sócrates).
Platão
(427 a. C. -
347 a. C.)
• Mundo das Ideias (inteligível) X Mundo dos sentidos
(sensível)
• Conceito monista (corpo e natureza são manifestações da
essência ideal)
• Platão e Aristóteles: filosofia  período "sistemático“:
• Elaboração de conceitos ( Teoria das Ideias, de Platão), por
meio dos quais se pode chegar até as leis de associação (lógica
formal de Aristóteles) e à definição do corpo científico do que
viria a constituir mais tarde a ciência da psicologia.
Aristótel
es (384-
322 a.C)
• Sensações, inteligência, imaginação, juízos,
raciocínio e memória
• Operações psíquicas: funções dos órgãos
materiais.
• “Metodologia da razão“
• Fundou a "escola peripatética" que pode ser
considerada uma das precursoras da psicoterapia
e da psicopedagogia.
Hipócrates (460 a. C. – 377 a. C.)
Rezende (2003)
Teoria dos humores

• Enfoque organicista da loucura.


• Ordenamento divino não seria mais o responsável pela loucura, mas sim o
funcionamento do organismo sediado no cérebro humano e no equilíbrio de seus
elementos essenciais - os humores (calor, frio, secura, umidade) – com o ambiente.
Doenças = "reações de adaptação" do organismo.
• Práticas de cura e a concepção de saúde física/mental: restabelecimento do
equilíbrio dos humores com o meio externo através de alimentação adequada, oitiva
e prática de música, banhos termais, atividades físicas, regulagem do sono e limpeza
do organismo pela catarse (laxantes naturais e vomitórios). De Tilio (2007)
Galeno
(131 a.C. –
200 a.C.)
• Pautado em estudos de dissecação cerebral continuará a tradição
hipocrática definindo a loucura como manifestação mental de causas
orgânicas e fisiológicas
• Promoveu um avanço em seu entendimento nosográfico por
intermédio da classificação sistemática de quadros sintomáticos
(loucuras divididas entre as manias, melancolias, delirantes, entre
outras), cada qual com uma sede e substrato cerebral específico.
• Práticas de cura seguiam as prédicas estabelecidas por Hipócrates
De Tilio (2007)
Idade Média

• Eixo central: Religião – possessão demoníaca


• Doente mentais eram chamados de lunáticos (do latim
luna=lua), pois acreditava-se que a mente das pessoas era
influenciada pelas fase da lua.
• Eram também considerados pecadores.
• Desfrutavam de relativa liberdade de ir e vir: alvo de
caridade.
• Doente mentais mais graves ou agressivos eram
acorrentados, escorraçados, submetidos a jejuns prolongados
sob a alegação de estarem possuídos pelo “demônio”.
• Submetidos a rituais religiosos de exorcismo.
Navio dos Loucos, Ferreira (2012)
Figueiredo (2017)
Hieronymus Bosch (1450 - 1516)
Idade
Moderna
•“Homem vitruviano”
Leonardo da Vinci
Retomada de princípios racionalistas na observação e
descrição das doenças mentais, em oposição ao
misticismo religioso.
Início do mercantilismo, formação de cidades e
concentração da população  surgimento dos
problemas sociais e sanitários, ocorrendo aumento do
número de mendigos.
Pobres e loucos: vistos como desocupados, como não
trabalhavam, não produziam riquezas, eram
considerados marginais , improdutivos.
Os mendigos eram expulso das cidades, os doente
mentais e mendigos sem família eram condenados ao
isolamento.
Nessa época surgem os Hospitais Gerais (instalados
nos antigos leprosários), onde eram internados não só
os loucos, mas toda população marginalizada na época.
Ferreira (2012)
• Eixo central: Racionalismo e Empirismo – desrazão
• Cuidado passa a ser médico Psiquiatria;
• Início Séc. XVII - Grande Internação – mendigos, pobres, bêbados,
loucos, deficientes  era manicomial
• Final Séc. XVII e início do XVIII – Revolução Industrial: internação
somente dos improdutivos (loucos e deficientes) – início da era
manicomial.
• Era das grandes classificações psicopatológicas
Figueiredo (2017)
1.2

https://www.google.com/url?
sa=i&source=images&cd=&cad=rja&uact=8&ved=2ahUKEwjloa79mObfAhXDGZAKHbsABrEQjxx6BAgBEAI&url=https%3A%2F
Mític
Modelos o-
Religi
oso

Lou
cura Orga
Psicol
nicist
ógico
a Serrano (1992)
1.3
Socia
l

Deba
te
etern Psico
Bioló
gico
o lógic
o
Século XIX: A instituição da psiquiatria (Pinel, Esquirol) e o tratamento moral
O domínio do hospício e o papel da ciência médica
Renascimento
• Apesar das críticas a René Descartes (1596-1650), sua proposta
de separar o corpo da alma foi, naquele momento, o que permitiu
a que a ciência voltasse a estudar o corpo (p.ex.: dissecações
anatômicas), uma vez que a Igreja poderia seguir ocupando-se da
alma.
• A separação do Divino do Humano, da Igreja do Estado possibilitaram a
retomada de avanços sociais e científicos.
• O Iluminismo trouxe a valorização do Homem e da Razão
• (o que, de uma certa forma, manteve o doente mental mais uma vez fora do
processo, já que este prescinde –por definição– desta última, a razão!)

https://slideplayer.com.br/slide/68501/
Das primeiras instituições
de encarceramento e do
alienismo

• Século XVII: Expansão das casas de


internação por toda a Europa, onde
conviviam loucos, pobres, órfãos,
mendigos, pessoas com doenças venéreas,
rebeldes.
• França, Itália, Holanda, Inglaterra
• Grande internação ou enclausuramento dos
pobres, sem relação com o saber médico
ou com a consolidação da medicina como
fundamento terapêutico da internação
Edito do rei Luis XIV (1676) –
construção do hospital geral
por toda a frança

• Lyon – Primeiro Hospital Geral de


internação dos desempregados e mendigos
que habitavam Paris desde 1530
• 1530: 30.000 pessoas na mendicância em
uma população de 100.000 habitantes
• Apesar disto, Pinel (1745-1826)
percebeu que muitas pessoas
que apresentavam alterações de
conduta e que se encontravam
em prisões (ou vagando pelas
ruas), o faziam em razão de
algum transtorno mental. Assim,
reuniu-as em uma instituição
própria, para cuidados médicos
e estudo.
https://slideplayer.com.br/slide/68501/
Fundação Ruptura com modelo de
enclausuramento

da clínica
– ato de Trasnformação na apreensão da
loucura: ausência de pensamento –
pinel alienação mental

(1745- Entrada do saber Inspiração


empirista

1826) médico na elucidação


da alucinação mental:
Traço
nominalista
Esquirol (1772 –
1840) - Monomania
• Tipos de paixões:
• Depressivo (lipemania)
• Expansivo (monomania)

• Monomania intelectual
• Monomania afetiva (cpto)
• Monomania instintiva (vontade)
O desencanto com o
racionalismo
• Entretanto, a razão e a ciência não
resolveram os problemas da humanidade.
No séc.XX tivemos 2 grandes guerras, uma
polarização entre os ideais de esquerda e
de direita, a guerra fria um certo
desencanto com a cultura ocidental....
• A contra-cultura e os movimentos sociais dos anos
60-70 exercem uma grande influência no Ocidente.
https://slideplayer.com.br/slide/68501/
• Pinel, que fora considerado o libertador dos
doentes mentais, passou a ser visto por alguns
pensadores como seu algoz:
• Foucault (1926-1984, Loucura e Civilização):
• As instituições da Era Moderna passaram a predominar
o “olhar” médico científico, transformando a loucura em
“doença mental”, passível assim, de um tratamento.
• Esse movimento de apropriação da loucura pela
medicina, tinha na figura de Pinel sua principal
expressão. https://slideplayer.com.br/slide/68501/
• Tais ideais são facilmente absorvidos por uma sociedade cansada dos excessos ditatoriais
da 1ª metade do s.XX.
• Na psiquiatria, o repudio ao autoritarismo* associado às péssimas condições de alguns
hospitais psiquiátricos, motivou dois movimentos, nos anos 60 e 70, que começaram na
Europa (principalmente Itália, Basaglia e a lei 180) e se estendeu aos Estados Unidos.

• Resumidamente:
• O da anti-psiquiatria
• Negação da doença mental (passa a ser um construto social e o paciente o “bode-espiatório”) e
principalmente da psiquiatria como especialidade médica encarregada do tratamento.
• O movimento Anti-manicomial
• (entendimento de que todo hospital psiquiátrico é uma cárcere)
• * Laing, Cooper e Esterson (Inglaterra); Thomas Szas; Goffman (o homem do estigma); Roy Medvedev (o químico russo que foi preso
pelo Brejnev em um hospício e tomou Haldol e ECT). No Brasil, Luiz Cerqueira e Gentile (repórter da Folha, que denunciaram o "cheque
ao portador" quando se internavam mendigos e doentes mentais de rua para passar o fim de semana no hospícios em algumas capitais
da Pindorama -Rio, Recife, Salvador,SPaulo...).
https://slideplayer.com.br/slide/68501/
Assim, a complexidade da Mente e a falta de exames documentais,
permitem que o entendimento acerca da doença mental se veja
novamente cindido.
“O gesto de Pinel ao liberar os loucos das correntes,
não possibilita sua inscrição em espaço
de liberdade, mas, pelo
contrário, funda a ciência
que os classifica e acorrenta
como objeto de
saberes/discursos/práticas
atualizados na instituição da doença mental”.
(Paulo Amarante, 1995)
J.Nash Estamira

https://slideplayer.com.br/slide/68501/
https://www.google.com/url?sa=i&source=images&cd=&cad=rja&uact=8&ved=2ahUKEwjc8_-dmebfAhUDE5AKHSomCD0Qjxx6BAgB EAI&url=http
%3A% 2F%2Fobviousmag.org%2Frealidades_sonhos%2F2016%2Fsanidade-x-loucura.html&psig=AOvVaw1xMJ78N8eLuLg2-
HZkrHcN&ust=1547312024595303
2. Origens da
Crítica do Saber
Psiquiátrico
Inglaterra (1950) – Maxwell Jones –
Comunidades terapêuticas
Participação e
papel
Lógica:
terapêutico de
democracia
todos os
das relações
membros da
comunidade

Ênfase na
Fundamento:
comunicação
tentativa de
e no trabalho:
reprodução do
instrumentos
ambiente
essenciais no
terapêutico,
processo de
no mundo
recuperação
externo
dos internos Aroldo Gavioli (2013)
França – psicoterapia institucional e psiquiatria
de setor

Não acreditava ser


possível tal obra
dentro de uma
Promoção da Recuperação da instituição alienante,
restauração do aspecto função terapêutica da promovendo as ações
terapêutico Psiquiatria. comunitárias, tendo na
internação apenas uma
das etapas do
tratamento

Aroldo Gavioli (2013)


Estados Unidos - 1960
• Psiquiatria comunitária
• Prevenção e promoção da saúde mental
• Reformulação da prática sem ruptura epistemológica

Aroldo Gavioli (2013)


Inglaterra (1960) – Laing e Cooper –
Movimento antipsiquiatria
• Questionamento: psiquiatria e doença mental
• Loucura: fato social / reação à violência externa
• Precisaria que fosse acompanhado em suas vivências

Aroldo Gavioli (2013)


Itália (1960)
• Movimento que promove a maior ruptura
epistemológica e metodológica entre saber/prática
psiquiátrico
• Psiquiatria Democrática Italiana
• Propõe nova forma de olhar para o fenômeno
• Complexidade da loucura: inerente à condição humana –
vai além do domínio da psiquiatria – diz respeito ao
sujeito, à família, à comunidade e aos demais atores sociais

Aroldo Gavioli (2013)


A própria estrutura social teria que promover
a revisão de valores e práticas institucionais
excludentes. Trata-se de uma tentativa de
colocar a doença entre parênteses, voltando
toda a atenção ao sujeito, considerando sua
complexidade, através de um trabalho
interdisciplinar e psicossocial
Aroldo Gavioli (2013)
BASAGLIA E FOUCAULT: (psiquiatra italiano e
filósofo) - um estranho encontro no manicômio

Paulo Amarante - Fiocruz


Foucault: entrevista em jornal da Tunísia
• "...Há tempos atrás escrevi um livro sobre a história da loucura. O livro foi muito mal
recebido, exceto por uns poucos como Blanchot ou Barthes. Ainda agora,
recentemente, nas universidades, quando se falava deste livro para os estudantes, se
fazia questão de observar que não fora escrito por um médico, e que, em conseqüência
disto, se deveria fugir dele como que da peste. Ora, uma coisa me comoveu: Após
alguns anos de tê-lo escrito se desenvolveu na Itália, em torno de Basaglia e na
Inglaterra, um movimento que se chama a anti-psiquiatria. Estas pessoas
desenvolveram estes movimentos, por certo, a partir de suas idéias e de suas
experiências de psiquiatria, mas encontraram no livro que eu havia escrito uma espécie
de justificativa histórica, e têm, de qualquer forma, motivação por conta própria, mas
que, até certo ponto demonstram que este livro histórico está causando uma espécie de
êxito prático. Então, digamos que estou um pouco enciumado e que agora desejarei
fazer as coisas eu mesmo. Ao invés de escrever um livro sobre a história da justiça, que
seria utilizado por algumas pessoas que colocariam, na prática, a justiça em questão,
desejarei eu mesmo começar a colocar a justiça em questão e depois, ah!, se ainda
estiver vivo e se não estiver preso, escreverei um livro!..." (164)
Paulo Amarante - Fiocruz
No início do trabalho em Gorizia (Basaglia)
As três grandes linhas de
intervenção:
1. a origem e o
pertencimento de classe
dos internos do hospital
2. a pretensão de
neutralidade e de produção
de verdade por parte das
ciências
3. a função social e de
tutela dos técnicos na
produção de hegemonia
Paulo Amarante - Fiocruz
Em Crimes da Paz
Crimes da
paz é uma
A crítica à
denúncia e
ciência tem
uma
um caráter
ruptura
ao mesmo
epistemoló
tempo
gica ao
político e
demonstrar
epistemoló
a relação
gico, pois
entre a
na verdade
ciência
é
psiquiátrica
impossível
ea
desvincular
violência
uma à
social e
outra.
instituciona
l
Paulo Amarante - Fiocruz
Em A instituição negada
• “O questionamento do
sistema institucional
transcende a esfera
psiquiátrica e atinge as
estruturas sociais que o
sustentam, levando-nos a
uma crítica da neutralidade
científica- que atua como
sustentáculo dos valores
dominantes - , para depois
tornar-se crítica e ação
política”. IN p. 09)
Paulo Amarante - Fiocruz
Em Um problema de psiquiatria institucional

• “a objetivação do homem em
síndromes, operada pela psiquiatria
positivista, tem tido consequencias
extremamente irreversíveis no doente
que – originalmente objetivado e
restrito aos limites da doença – foi
confirmado como categoria fora do
humano por uma ciência que devia
distanciar-se e excluir aquilo que não
estava em grau de compreender”
(UPPI, pp. 309-310).

Paulo Amarante - Fiocruz


Marco teórico conceitual
• Reforma psiquiátrica como “processo social complexo”
(Rotelli, 1990; Amarante, 2007), onde se destaca o
princípio de que a reforma psiquiátrica não se reduz a
reforma administrativa, de serviços e tecnologias
científicas ou gerenciais, mas de transformar o lugar
social da loucura” (Birman, 1992), valorizando assim a
“dimensão sócio-cultural”.
Paulo Amarante - Fiocruz
“Era quase impossível andar pelas ruas do Rio de Janeiro no início da década de
1830 sem se deparar com alienados vagando por becos e vielas.

Em geral, eram recolhidos às enfermarias da Santa Casa de Misericórdia ou à


cadeia pública, de onde não saíam senão mortos.

Encarcerados em cubículos fétidos e estreitos, muitos passavam os dias


acorrentados.
Já os submetidos à tutela de instituições religiosas, não raro, sofriam sanções físicas
punitivas.

O estado de abandono em que se encontravam os doentes mentais chamou a atenção


de alguns membros da Academia Imperial de Medicina e da Faculdade de
Medicina do Rio de Janeiro, que se engajaram em campanhas pela criação de um
estabelecimento para o tratamento dos alienados. O argumento era de que a Santa
Casa não estava
Silva,organizada paraloucos,
E. M. (2018). Aos promover a cura
o hospício. desses
Pesquisa indivíduos.
Fapesp. Edição 263.
“O decreto autorizando a construção do hospício foi aprovado pelo imperador
Pedro II (1825-1891) em julho de 1841, com base no projeto do político José
Clemente Pereira (1787-1854), administrador da Santa Casa do Rio de Janeiro.

O imperador contribuiu com boa parte da verba para a construção do edifício – o


restante veio da Irmandade da Misericórdia e de abastadas famílias cariocas.

O Hospício Pedro II, também chamado de “Palácio dos Loucos”, abriu suas
portas em dezembro de 1852. Funcionava em um terreno próximo à baía de
Botafogo, “em um bairro salubre, amplamente aberto para o mar e dominado por
montanhas arborizadas, localizado em uma distância conveniente do rico subúrbio
de Botafogo e do terminal das linhas de bondes que atendem essa área”, descreveu
o médico Philippe-Marius Rey, do Asilo de Alienados de Saint-Anne, em Paris,
França, em L’hospice Pedro II et les aliénés au Brésil.”.
Corpo clínico do Hospital Nacional de
Alienados, no Rio de Janeiro, em 1904
Arquivo de Fátima de Vasconcellos
Silva, E. M. (2018). Aos loucos, o hospício. Pesquisa Fapesp. Edição 263.
“O Pedro II manteve-se vinculado à Santa
Casa até 1890, quando passou à administração
federal, sob a jurisdição do Ministério da
Justiça e Negócios Interiores. A partir de
então, teve o nome mudado para Hospital
Nacional dos Alienados e o trabalho das irmãs
de caridade nas enfermarias foi suspenso.

Em 1903, a instituição começou a ser dirigida


pelo médico baiano Juliano Moreira (1873-
1933), um dos primeiros a divulgar, no Brasil,
as ideias de Sigmund Freud (1856-1939),
médico austríaco criador da psicanálise. Durante
os 27 anos em que esteve à frente da instituição,
Silva, E. M. (2018). Aos loucos, o hospício. Pesquisa Fapesp. Edição 263.
Moreira construiu a psiquiatria como
• Hospício de Alienados de Olinda, em
Pernambuco, em 1864
• Hospício Provisório de Alienados de
Belém, no Pará, em 1873
• Asilo de Alienados São João de Deus, em
Salvador, na Bahia, em 1874
• Hospício de Alienados São Pedro, em
Médico psiquiatra durante Porto Alegre, no Rio Grande do Sul
aplicação de raios infra- • São Paulo, o Hospício Provisório de
vermelho em pacientes do
Hospital do Juquery Alienados foi fundado em 1852

no mesmo ano de inauguração do Pedro II.


“Diferentemente dos outros hospícios do
país,Aoso loucos,
Silva, E. M. (2018). de São PauloPesquisa
o hospício. não era administrado
Fapesp. Edição 263.
“Formado pela Faculdade de Medicina
do Rio de Janeiro, Franco da Rocha
(1864-1933) foi um dos primeiros a se
especializar em psiquiatria no Brasil,
ao lado de Juliano Moreira. Foi
nomeado para o hospício paulista em
1891 e protagonizou uma campanha
para a construção de um moderno asilo
de alienados na cidade. A empreitada
vinha na esteira de recomendações
apresentadas e discutidas durante o
Congresso Internacional de
Alienistas de 1889 em Paris, França,
Silva, E. M. (2018). Aos loucos, o hospício. Pesquisa Fapesp. Edição 263.
acerca da criação de colônias
“A Colônia Agrícola de Alienados
do Juquery foi inaugurada em maio
de 1898. Foi erguida em um terreno
de 170 hectares localizado a menos
de 50 quilômetros da cidade, com
edificações projetadas pelo
arquiteto Francisco Ramos de
Azevedo (1851-1928). O asilo
cresceu em ritmo acelerado.
Construído para abrigar 300
pacientes, passou por sucessivas
ampliações para atender à demanda.
Em 1901, o Juquery abrigava 590
pacientes.
Silva, E. M. (2018). Aos loucos, Em
o hospício. 1912,
Pesquisa eram
Fapesp. 1.250
Edição 263.
“Somente na República é que a loucura é retirada do discurso religioso e encampada pelo
discurso científico médico-psiquiátrico, propondo substituir o tratamento desumano e
primitivo por valores humanitários. Viabiliza-se, assim, a implantação do projeto de
medicalização da loucura e sua transformação efetiva em doença mental (Fonte, 2011). Na
prática, há uma expansão da rede pública de hospitais psiquiátricos. O isolamento nessas
instituições é justificado, em primeiro lugar, pela separação do louco em relação às causas da
doença (principalmente a família), e, em segundo, pela possibilidade de intervenção
terapêutica. Não haveria cura sem isolamento.

Machado (1978) descreve como a concepção arquitetônica do Pedro II, por exemplo, foi
pensada para regular a vida no hospício de modo a facilitar a vigilância pelos enfermeiros.
“Tem a forma de um retângulo com um bloco central separando essas duas alas [masculina e
feminina] laterais, cada uma contendo dois pátios internos” (Machado, 1978, p. 433). Essa
divisão contempla a separação por classes e por estágio da doença (tranquilos e agitados,
limpos e sujos, afetados por moléstias contagiosas etc.). O hospício também não pode ser lugar
de ócio. O trabalho é terapêutico e deve ser a principal ocupação dos internos. “A norma do
trabalho impera no hospício e se materializa em oficinas de costura, bordados, flores
artificiais, alfaiataria, estopa, alcochoaria, escovas, móveis, calçados” (Machado, 1978, p.
440). Uma mão de obra barata e capaz de gerar renda para a manutenção do próprio hospício.
Àqueles sem aptidão para essas atividades era prescrita a jardinagem ou o trabalho como
servente em obras, refeitórios e enfermarias.”
Batista, Micheline Dayse Gomes. (2014). BREVE HISTÓRIA DA LOUCURA, MOVIMENTOS DE
CONTESTAÇÃO E REFORMA PSIQUIÁTRICA NA ITÁLIA, NA FRANÇA E NO BRASIL. POLÍTICA &
TRABALHO Revista de Ciências Sociais, n. 40, Abril de 2014, pp. 391-404 .
Início do Processo
de Reforma Psiquiátrica

• O final da Ditadura no final dos


anos 70

• O cenário da redemocratização

• as lutas sociais

Laboratório de Estudos e Pesquisas em Saúde Mental -


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da

do
no chão

Jurujuba
violência
A imagem

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Barbacena - 1979
Franco Basaglia em
visita ao Hospital de

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O movimento social
• A organização dos

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encontros de
usuários e
familiares
• o usuário e a
família como
protagonistas do
processo
“1978, o Movimento de Trabalhadores em Saúde Mental, ligado ao
movimento de Reforma Sanitária, provocaria a derrocada da
denominada “indústria da loucura”, numa época em que os hospitais
privados se multiplicavam pelo país e, com eles, a precariedade nos
serviços prestados à população (Fonte, 2011). A discussão da
desinstitucionalização entra no meio acadêmico-intelectual. Já no
final da década de 1980, articulados e influenciados pelo pensamento
de Basaglia, técnicos de saúde, acadêmicos, militantes sociais e
organizações
A década de comunitárias
1990 vem para conseguem
consolidar provocar
todo esse o fechamento de
movimento através
alguns manicômios
de mudanças e a abertura
promovidas nasdosáreas
primeiros Centros de
legislativa, Atenção
jurídica e
Psicossocial
administrativa(CAPS).(Fonte, Vários
2011).dessesFonte atores
vaidão origem que
observar ao Movimento
são desse
da Luta Antimanicomial,
período as primeiras uma ação coletiva
normas federaisemque prol de “uma sociedade
regulamentam a
sem manicômios”
implantação dos serviços de atenção diária, inspirados nas
experiências dos primeiros CAPS, bem como as primeiras diretrizes
para fiscalização e classificação dos hospitais. “Neste período, a
Batista, Micheline Dayse Gomes. (2014). BREVE HISTÓRIA DA LOUCURA, MOVIMENTOS DE
Reforma Psiquiátrica
CONTESTAÇÃO E REFORMA efetivamente
PSIQUIÁTRICA NAcomeçou a seE NO
ITÁLIA, NA FRANÇA materializar em&
BRASIL. POLÍTICA
TRABALHO Revista de Ciências Sociais, n. 40, Abril de 2014, pp. 391-404 .
Ainda segundo Fonte (2011), desde o início da década de
2000, é possível detectar dois movimentos no Brasil:
1) “a construção de uma rede de saúde mental
substitutiva ao modelo centrado na internação
hospitalar e a
2) fiscalização e redução progressiva dos leitos
psiquiátricos existentes” (Fonte, 2011, s/p).

A reforma psiquiátrica foi consolidada como política


oficial do Sistema Único de Saúde (SUS) na III
Conferência Nacional de Saúde Mental, realizada em
2001, em Brasília. Essa política confere aos CAPS um
papel estratégico na mudança de modelo. Um dos
indicadores disso, diz a autora, é a alocação de recursos.
“Se no final da década de 1990 osMicheline
Batista, gastosDayse
hospitalares
Gomes. (2014). BREVE HISTÓRIA DA LOUCURA, MOVIMENTOS DE
correspondiam a mais de CONTESTAÇÃO E REFORMA PSIQUIÁTRICA NA ITÁLIA, NA FRANÇA E NO BRASIL. POLÍTICA &
90% dos recursos do SUS para
TRABALHO Revista de Ciências Sociais, n. 40, Abril de 2014, pp. 391-404 .
a saúde mental, no final de 2006, 56% destinavam-se aos
1990: Reforma
Psiquiátrica
1987: Primeiro Brasileira -
CAPS no Brasil Movimentos
em SP e NAPS dos
1978: Aprovada em Santos (24 profissionais e
lei proibindo a hs). famílias-
criação de novos Impasses,
hospícios e sua tensões,
substituição por conflitos e
1960: Franco pensões desafios- Lei
Basaglia protegidas, lares proibindo a
(Itália) abrigados, criação de
questiona a hospital-dia, novos
existência dos leitos hospitais
hospitais psiquiátricos em psiquiátricos e
Ferreira, 2012
psiquiátricos. enfatizando o
2001: Lei 10.216
que redireciona a
assistência em
saúde mental,
1992: Movimentos privilegiando o
sociais aprovam em oferecimento de
vários estados tratamento em
brasileiros as serviços de base
primeiras leis que comunitária.
determinam a • Proteção e direitos dos
substituição doentes mentais
progressiva dos • Rede de atenção diária
Ferreira, 2012
Hospital Prof º Adauto Botelho
(1954 – 1997)
1995:
• Inaugurada a Casa de Atenção Integral em Saúde Mental
Água-Viva, primeira instituição de Saúde Mental de Goiânia
pensada para ser um espaço de atenção diária (Silva, 2010;
Guilardi et al., 2005).
• Fechamento Adauto
• Fundação da Associação dos Usuários de Saúde Mental do
Estado de Goiás (AUSSM/GO);
• Implantação do ambulatório de psiquiatria no Pronto Socorro
Psiquiátrico Wassily Chuc (PSPWC) (Guilardi et al., 2005
2000:
• O Decreto n. 2.231, de novembro de 2000, aprovou o novo
Regimento Interno da SMS e reestruturou a Divisão de Saúde
Mental (DSM) de Goiânia, à qual competia desenvolver
programas de atendimento integral à saúde mental; planejar,
programar e avaliar as ações e serviços de saúde mental do
município; promover investigações epidemiológicas no campo
da saúde mental; promover, acompanhar e avaliar atividades de
formação e qualificação de equipes multiprofissionais; e manter
integração com as demais áreas de atuação em Saúde Mental no
âmbito do município (Goiânia, 2000b).
2001:
• Inauguração do CAPS Mendanha, tipo II adulto, destinado a atender a região
Noroeste e Oeste. Esse serviço posteriormente passou a se chamar CAPS Esperança.
2002:
• Em janeiro de 2002, foi instituída a Lei Municipal n. 8.088 criando o Conselho
Municipal de Saúde (CMS) de Goiânia, enquanto um órgão colegiado, deliberativo,
normativo, fiscalizador e consultivo da saúde, no âmbito do SUS, no Município de
Goiânia (Goiânia, 2002). A criação do CMS consistiu em um avanço no âmbito do
controle social dos serviços de saúde em Goiânia, podendo ser considerado um
avanço também no processo de descentralização do poder público atendendo aos
preceitos das Reformas Sanitária e Psiquiátrica.
• Nesse ano também foi aprovada a lei municipal n. 8129/2002, que criou a
gratificação destinada especificamente para os médicos psiquiatras que exerciam
suas atividades nos setores públicos de Urgência Psiquiátrica. Essa lei teve o
objetivo de estimular a contratação desses profissionais de saúde, que se faziam
escassos na rede psicossocial (Guilardi et al., 2005). Podemos indicar como
justificativa para esse fato a tensão entre os paradigmas manicomial, ainda
predominante na formação profissional, e o modelo psicossocial, que demandava
novos saberes, práticas e novos espaços de assistência.
• Como consequência das portarias nacionais n. 336/2002, 626/2002 e n.
1455/2003, a Casa de atenção Água Viva foi transformada em CAPS
infantil. Guilardi et al. (2005) relatam que a conversão do modelo de
ambulatório para o modelo CAPS garantiu o recebimento do incentivo do
MS, mas não viabilizou, de fato, a existência de um CAPS infantil na
cidade, pois este ainda funcionava em regime de ambulatório
interdisciplinar.
• O CAPS Novo Mundo, CAPS Esperança e CAPSi Água Viva foram
cadastrados no MS em 2002. A Portaria Ministerial n. 1.455/2003 destinou
incentivo financeiro para os novos CAPS cadastrados no MS em 2002 e
2003. Assim, receberam a verba os CAPS II Esperança e CAPSi Água Viva
(R$ 30.000,00 para cada serviço). Segundo a Secretaria Municipal de Saúde
(Goiânia, 2004a) foram encaminhados, em 2001 e 2002, projetos técnicos
para firmar convênio entre MS e SMS, para implantação e financiamento de
cinco novos CAPS. No entanto foram aprovados os projetos para
implantação de apenas três novos CAPS, com recebimento do incentivo
financeiro do MS no ato do cadastramento. Também foi solicitado incentivo
para implantação de Serviços Residenciais Terapêuticos (SRTs).
• Os três CAPS aprovados em 2001/2002 foram
inaugurados em 2003, sendo que o Hospital-Dia se
transformou em CAPS Vida, tipo II adulto, mudando-
se de endereço para um local mais apropriado e com
melhores condições, atendendo a região sul/sudeste.
• Em 15 de outubro de 2003, houve a abertura do
CAPS Infantil Álcool e Drogas, CAPSadi Girassol e,
em 19 de dezembro, foi inaugurado o CAPS II Beija-
flor para adultos, localizado na região sudoeste.
• 2004, foi inaugurado o CAPSad Casa, para adultos
com necessidades decorrentes do uso de álcool e
outras drogas (Goiânia, 2004a).
• Em síntese, entre os anos 2000 e 2004, foram
inaugurados sete CAPS, sendo quatro CAPS II (Novo
Mundo, Esperança, Vida e Beija-flor), CAPSi Água
Viva, CAPSadi Girassol e CAPSad Casa e três SRTs. Os
avanços foram a regulamentação dos CAPS,
implementação dos cargos de gestores com gratificação,
gratificação para os profissionais de saúde mental,
contratação de servidores públicos concursados,
atividades de formação para os profissionais, descre-
denciamento de duas clínicas psiquiátricas e a redução
do número de leitos e dos dias de internação.
• PSP Wassily Chuc e o Ambulatório Municipal de
Psiquiatria se mantiveram em funcionamento
O processo de transformação da assistência
em saúde mental que se concretiza no Brasil, desde
meados da década de 80 do século passado, não se
restringe apenas a uma mudança técnico-
organizacional ou administrativa dos serviços de
saúde.
Trata-se de um processo social complexo que
abrange múltiplas dimensões:
Dimensões do processo de reforma psiquiátrica
-Dimensão Teórico-conceitual –
Alienação/Transtorno Mental – Periculosidade
- Mudança de paradigma dos conceitos
que envolvem a saúde mental
-Dimensão Técnico-assistencial
- transformação nas formas de
cuidar do sofrimento psíquico
-Dimensão Jurídico-política
- Induz e provoca mudanças no
estatuto jurídico, no lugar do louco
na sociedade
-Dimensão sociocultural
- convida a sociedade a se repensar
e a se transformar em sua relação
não apenas com a loucura, mas
Paulo Amarante - Fiocruz com a diferença, com a diversidade
Dimensão epistemológica (teórico-conceitual)
• Crise paradigmática da ciência moderna

• a ciência como produtora de Verdade


• o mito da neutralidade dos saberes ditos científicos
• o papel do técnico - o intelectual orgânico, os funcionários do
consenso, operadores do saber prático

Paulo Amarante - Fiocruz


A POLITICA NACIONAL DE SAUDE MENTAL

Antes da Reforma Psiquiátrica Depois da Reforma

• Cuidado Centrado na internação em Hospital • Criação de ampla rede de cuidado em saúde:


Psiquiátrico:

• Territorial;
• Isolamento;
• Complexificação do objeto de
• Normatização dos sujeitos; cuidado;
• Lógica da Instituição total; • Ampliação das práticas e
• Violação dos direitos saberes;
humanos.
Modo Asilar Modo Psicossocial/
Novo modelo assistencial.

Objeto Simples Complexo


Doença mental Existência-sofrimento
Estratégias de Isolamento e Predominância da
Intervenção predominantemente diversidade e da invenção
biológica
Instituição Hospitalização Rede e intersetorialidade

Prática social Exclusão/violência Inclusão e solidariedade


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