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CENTRO UNIVERSITÁRIO DE OURINHOS

PSICOFARMACOLOGIA

Teoria & Prática


AULA 04
Farmacocinética
Distribuição
DISTRIBUIÇÃO DE FÁRMACOS

Distribuição de fármacos é o processo pelo qual um fármaco reversivelmente abandona o leito vascular e entra
no interstício (líquido extracelular) e, então, nas células dos tecidos.

Para fármacos administrados por via IV, onde não existe absorção, a fase inicial (isto é, imediatamente após a
administração até a rápida queda na concentração) representa a fase de distribuição, na qual o fármaco
rapidamente sai da circulação e entra nos tecidos.
DISTRIBUIÇÃO DE FÁRMACOS

A passagem do fármaco do plasma ao interstício depende:


• do débito cardíaco e do fluxo sanguíneo regional;
• da permeabilidade capilar do volume do tecido;
• do grau de ligação do fármaco às proteínas plasmáticas e
tissulares;
• e da lipofilicidade relativa do fármaco.
A. Fluxo sanguíneo
A taxa de fluxo de sangue para os capilares dos tecidos varia amplamente;

Por exemplo, o fluxo de sangue para os órgãos ricos em vasos (cérebro, fígado
e rins) é maior do que para os músculos esqueléticos;

O tecido adiposo, a pele e as vísceras têm fluxo sanguíneo ainda menor.

OU SEJA,
Quanto maior o fluxo sanguíneo no local de ação do fármaco, mais
rápido ele chegará lá.
A. Fluxo sanguíneo
• TECIDOS DE ALTA IRRIGAÇÃO SANGUÍNEA - vão receber o fármaco mais rápido e em
maior parte:
- fígado
- rim
- cérebro
- coração
- pulmões

• TECIDOS DE BAIXA IRRIGAÇÃO SANGUÍNEA - vão receber o fármaco mais lentamente


e em menor parte:
- músculos
- vísceras
- pele
- tecido adiposo
B. Permeabilidade capilar

A permeabilidade capilar é determinada pela estrutura capilar e pela


natureza química do fármaco.

A estrutura capilar varia em termos de fração exposta da membrana basal


com junções com frestas entre as células endoteliais.

No fígado e no baço, uma fração significativa da membrana basal é exposta


em razão de os capilares serem descontínuos e grandes, através dos quais
podem passar grandes proteínas plasmáticas.
B. Permeabilidade capilar

No cérebro, a estrutura capilar é contínua, e não existem frestas . Para entrar no cérebro, o fármaco
precisa passar através das células endoteliais dos capilares do SNC ou ser transportado ativamente.

Em contraste, fármacos lipossolúveis entram facilmente no SNC, pois se dissolvem na membrana das
células endoteliais.

Fármacos ionizados ou polares em geral fracassam tentando entrar no SNC, pois não conseguem passar
através das células endoteliais, as quais não apresentam junção com frestas. Essas células intimamente
justapostas formam junções estreitadas que constituem a barreira hematoencefática.
C. Ligação de fármacos a proteínas
plasmáticas e dos tecidos

Ligação a proteínas plasmáticas: A ligação reversível às proteínas plasmáticas


fixa os fármacos de forma não difusível e retarda sua transferência para fora do
compartimento vascular.

A albumina é a principal proteína ligadora e pode atuar como uma reserva de fármaco
(à medida que a concentração do fármaco livre diminui,
devido à eliminação, o fármaco ligado se dissocia da proteína).
Isso mantém a concentração de fármaco livre como uma fração constante
do fármaco total no plasma.
C. Ligação de fármacos a proteínas
plasmáticas e dos tecidos

Ligação a proteínas dos tecidos: Vários fármacos se acumulam nos tecidos,


levando a concentrações mais elevadas no tecido do que no líquido extracelular
e no sangue.

Os fármacos podem acumular como resultado da ligação a lipídeos, proteínas ou ácidos nucleicos. Os
fármacos também podem ser transportados ativamente aos tecidos.

Os reservatórios nos tecidos podem servir de fonte principal de fármaco e prolongar sua ação ou causar
toxicidade local ao fármaco.
D. Lipofilicidade

A natureza química do fármaco influencia fortemente a sua capacidade de atravessar membranas celulares;

Os fármacos lipofílicos se movem mais facilmente através das membranas biológicas. Esses fármacos se dissolvem nas membranas
lipídicas e permeiam toda a superfície celular;

O principal fator que influencia a distribuição do fármaco lipofílico é o fluxo de sangue para aquela área;

Em contraste, os fármacos hidrofílicos não penetram facilmente nas membranas celulares e devem passar através de junções com
fendas.
E. Volume de distribuição
O volume de distribuição aparente, Vd, é o volume de líquido necessário para conter todo o fármaco do organismo na mesma concentração
presente no plasma, ou seja, de maneira homogênea entre o sangue e o tecido.

O Vd é calculado dividindo-se a dose que alcança a circulação sistêmica pela concentração no plasma no tempo zero (C0):

Embora o Vd não tenha base física ou fisiológica, pode ser útil para comparar a distribuição de um fármaco com os volumes dos
compartimentos de água no organismo.
Determinação do Vd

Por exemplo, se 10 mg de um fármaco são injetados em um paciente, e a concentração plasmática para o


tempo zero (C0) é igual a 1 mg/L, então:

Vd = 10 mg
1 mg/L

Vd= 10 L.
Relação entre o Vd e o local
de distribuição no organismo
Meia-vida (t1/2) do fármaco

C
O
N
C
E
N
T
R
A
Ç
Ã
O

TEMPO
Efeito de Vd na meia-vida (t1/2)
do fármaco

• O Vd tem influência importante na meia-vida do fármaco, pois a sua eliminação depende da quantidade de
fármaco ofertada ao fígado ou aos rins (ou outro órgão onde ocorra a biotransformação).
• Se o fármaco tem um Vd elevado, a maior parte do fármaco está no espaço extraplasmático e indisponível
para os órgãos excretores.
• Portanto, qualquer fator que aumente o Vd pode aumentar a meia-vida e prolongar a duração de ação do
fármaco.
Nota: um valor de Vd excepcionalmente elevado indica considerável sequestro do fármaco em algum tecido ou compartimento do
organismo.
Farmacocinética

Metabolismo e
Excreção
DEPURAÇÃO DE FÁRMACOS
POR MEIO DA BIOTRANSFORMAÇÃO
Logo que o fármaco entra no organismo começa o processo de eliminação.
As três principais vias de eliminação são:
• Biotransformação hepática;
• Eliminação biliar;
• e Eliminação urinária.

Juntos, esses processos de eliminação diminuem exponencialmente a


concentração no plasma.
Reações da biotransformação de fármacos

• Os rins não conseguem eliminar os fármacos lipofílicos de modo eficiente, pois


estes facilmente atravessam as membranas celulares e são reabsorvidos nos
túbulos contorcidos distais.

• Por isso, os fármacos lipossolúveis são primeiramente biotransformados no


fígado em substâncias mais polares (hidrofílicas), usando dois grupos gerais de
reações, denominados fase I e fase II.
Fase I
1. Fase I: As reações de fase I convertem fármacos lipofílicos em
moléculas mais polares, introduzindo ou desmascarando um grupo
funcional polar, como –OH ou –NH2.
As reações de fase I em geral envolvem redução, oxidação ou hidrólise.

 HIDRÓLISE: Quebra da molécula


 OXIDAÇÃO: Perde elétrons
 REDUÇÃO: Ganha elétrons
Fase I
a. Reações de fase I utilizando o sistema P450:
• As reações de fase I envolvidas com maior frequência na biotransformação de fármacos são catalisadas pelo
sistema citocromo P450 (também denominado oxidases microssomais de função mista).
• O sistema P450 é importante para a biotransformação de vários compostos endógenos (como esteroides,
lipídeos) e para a biotransformação de substâncias exógenas.
• O citocromo P450, designado como CYP, é uma superfamília de isoenzimas presentes na maioria das células,
mas principalmente no fígado e no TGI.
• Essas enzimas têm a capacidade de modificar um grande número de substratos estruturalmente
distintos.
CYP P450
As enzimas P450 exibem considerável variabilidade genética entre indivíduos e grupos raciais.

Exemplos:
Algumas pessoas, por exemplo, não obtêm benefício do analgésico opiáceo codeína, porque não têm a
enzima CYP2D6 que o ativa.

Polimorfismos similares foram caracterizados para a subfamília CYP2C. Por exemplo, o clopidogrel tem a
advertência de que os pacientes que são maus biotransformadores pela CYP2C19 têm maior incidência de
eventos cardiovasculares (p. ex., choque ou infarto do miocárdio) quando usam esse fármaco.
O clopidogrel é um pró-fármaco, e a ativação pela CYP2C19 é necessária
para convertê-lo no metabólito ativo.
Fase I
b. Reações de fase I que não envolvem o sistema P450:
Essas reações incluem :
 a oxidação de aminas;
 a desidrogenação do álcool;
 E a hidrólise (p. ex., procaína).
Fase II
2. Fase II: Esta fase consiste em reações de conjugação.

• Se o metabólito resultante da fase I é suficientemente polar, ele pode ser excretado pelos rins.
• Contudo, vários metabólitos de fase I continuam muito lipofílicos para serem excretados.
• Uma reação subsequente de conjugação com um substrato endógeno produz um composto polar em geral mais
hidrossolúvel e terapeuticamente inativo.

Nota: os fármacos que possuem um grupo –OH, –NH2 ou –COOH podem entrar diretamente na fase II e ser conjugados sem uma
reação de fase I prévia.)

O fármaco conjugado altamente polar é então excretado pelos rins ou pela bile.
DEPURAÇÃO DE FÁRMACOS
PELOS RINS

 Os fármacos devem ser suficientemente polares para serem eliminados do


organismo;
 A saída do fármaco do organismo ocorre por numerosas vias, sendo a
eliminação na urina por meio dos rins a mais importante;
 Pacientes com disfunção renal podem ser incapazes de excretar os fármacos,
ficando sujeitos ao risco de acumulá-los e apresentar efeitos adversos.
A. Eliminação renal dos fármacos
1. Filtração glomerular:

 Os fármacos chegam aos rins pelas artérias renais, que se dividem para formar
o plexo capilar glomerular;
 O fármaco livre (não ligado à albumina) difunde-se através das fendas
capilares para o espaço de Bowman como parte do filtrado glomerular;
 A lipossolubilidade e o pH não influenciam a passagem dos fármacos para o
filtrado glomerular. Contudo, variações na velocidade de filtração glomerular e
a ligação dos fármacos às proteínas afetam esse processo.
A. Eliminação renal dos fármacos
2. Secreção tubular proximal:

 Os fármacos que não foram transferidos para o filtrado glomerular saem dos glomérulos através das arteríolas
eferentes, que se dividem formando um plexo capilar ao redor do lúmen no túbulo proximal.
 A secreção ocorre primariamente nos túbulos proximais por dois mecanismos de transporte ativo que exigem
energia: um para ânions (p. ex., formas desprotonadas de ácidos fracos) e outro para cátions (p. ex., formas
protonadas de bases fracas).
 Cada um desses sistemas de transporte apresenta baixa especificidade e pode transportar vários compostos.
Assim, pode ocorrer competição entre fármacos pelos transportadores em cada um dos sistemas.
A. Eliminação renal dos fármacos

3. Reabsorção tubular distal:


 Enquanto o fármaco se desloca em direção ao túbulo contorcido distal, sua concentração aumenta e excede à do
espaço perivascular.
 O fármaco, se for neutro, pode difundir-se para fora do lúmen, retornando à circulação sistêmica.
 A manipulação do pH da urina, para aumentar a fração ionizada do fármaco no lúmen, pode ser feita para minimizar
a retrodifusão e, assim, aumentar a depuração de um fármaco indesejável.
 Como regra geral, ácidos fracos podem ser eliminados alcalinizando a urina, ao passo que a eliminação de bases
fracas pode ser aumentada por acidificação da urina.
 Por exemplo, um paciente apresentando dose excessiva de fenobarbital (um ácido fraco) pode receber bicarbonato,
que alcaliniza a urina e mantém o fármaco ionizado, diminuindo, assim, a sua reabsorção.
A. Eliminação renal dos fármacos

4. Papel da biotransformação de fármacos:

 A maioria dos fármacos é lipossolúvel e, sem modificação química, se difundiria para fora do lúmen tubular renal quando a sua
concentração no filtrado se tornasse maior do que a do espaço perivascular;

 Para minimizar essa reabsorção, os fármacos são modificados basicamente no fígado em substâncias mais polares por meio das
reações de fase I e fase II (descritas anteriormente);

 Os conjugados polares ou ionizados são incapazes de difundir para fora do lumen renal.
DEPURAÇÃO POR OUTRAS VIAS
A depuração de fármacos pode ocorrer também por intestinos, bile, pulmões, saliva, suor leite, entre outros;

Os fármacos que não são absorvidos após administração oral ou fármacos que são secretados diretamente para os intestinos ou na bile são eliminados com as fezes;

Os pulmões estão envolvidos primariamente na eliminação dos gases anestésicos (p. ex., isoflurano);

A eliminação de fármacos no leite pode expor a criança lactente aos medicamentos e/ou seus metabólitos ingeridos pela mãe, e é uma fonte potencial de efeitos
indesejados na criança;

A excreção da maioria dos fármacos no suor, na saliva, nas lágrimas, nos pelos e na pele ocorre em pequena extensão.
B. Situações clínicas que alteram a
meia-vida do fármaco
Quando o paciente apresenta uma anormalidade que altera a meia-vida do fármaco, são necessários ajustes na dosagem.

Pacientes que podem apresentar aumento da meia-vida de fármacos são aqueles que têm:

1) diminuição do fluxo de sangue renal ou hepático (p. ex., choque cardiogênico, insuficiência cardíaca ou hemorragia);

2) diminuição na capacidade de extrair o fármaco do plasma (p. ex., doença renal); e

3) diminuição da biotransformação (p. ex., quando outros fármacos concomitantes inibem a biotransformação, ou na insuficiência hepática, como

na cirrose).
B. Situações clínicas que alteram a
meia-vida do fármaco

Nesses pacientes, pode ser necessário diminuir a dosagem ou aumentar o tempo entre as dosificações.

Em contraste, a meia-vida de um fármaco pode ser reduzida aumentando o fluxo sanguíneo hepático, diminuindo a
ligação às proteínas ou aumentando a biotransformação. Isso pode exigir dosagens maiores ou dosificações mais
frequentes.
DÚVIDAS
Referências
FONSECA, A. M. Introdução à psicofarmacologia e noções e tratamento farmacológico [livro
eletrônico. Guarujá, SP: Científica Digital, 2021.

GUIMARÃES, F. S. Bases farmacológicas. In: GRAEFF, F. G.; GUIMARÃES, F. S. (eds.).


Fundamentos de psicofarmacologia. São Paulo: Atheneu, 2005. p. 1-28.

HILAL-DANDAN, R.; BRUNTON, L.L. Manual de Farmacologia e Terapêutica de Goodman &


Gilman. 2ª ed. Rio de Janeiro: McGraw-Hill, 2014.

HYMAN, E. E.; COHEN, J. D. Transtornos do humor e de ansiedade. In: KANDEL, E. R. et al. (eds.).
Princípios de neurociências. 5. ed. Porto Alegre: AMGH, 2014. p. 1222-1241.

KATZUNG, G. B.; TREVOR, A. J. Farmacologia básica e clínica – LANGE. 13ª ed. Rio de Janeiro:
McGraw-Hill, 2017.

SADOCK, B. J.; SADOCK, V. A.; SUSSNAM, N. Manual de farmacologia psiquiátrica de Kaplan &
Sadock. 6 ed. Porto Alegre: Artmed, 2015. 344 p.

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