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Aspectos Psicológicos do Paciente com

Câncer e Repercussões no Profissional


de Saúde

DGA - 2010
A Psico-oncologia e a Psicologia Hospitalar

A Psico-Oncologia é definida como uma sub-especialidade da


Oncologia, que procura estudar as duas dimensões
psicológicas presentes no diagnóstico do câncer:

1) o impacto do câncer no funcionamento emocional do


paciente, sua família e profissionais de saúde envolvidos
em seu tratamento;

2) o papel das variáveis psicológicas e comportamentais na


incidência e na sobrevivência ao câncer.
A Psico-oncologia e a Psicologia Hospitalar

Representa a área de interface entre a Psicologia e


a Oncologia e utiliza conhecimento educacional,
profissional e metodológico proveniente da
Psicologia da Saúde para aplicá-lo:
1º) Na assistência ao paciente oncológico, sua família e
profissionais de saúde envolvidos com a prevenção, o
tratamento, a reabilitação e a fase terminal da doença;

PACIENTE
PREVENÇÃO

TRATAMENTO

REABILITAÇÃO

TERMINALIDADE

FAMÍLIA EQUIPE
2º) Na pesquisa e no estudo de variáveis psicológicas
e sociais relevantes para a compreensão da incidência,
recuperação e tempo de sobrevida após o diagnóstico do
câncer;

3º) Na participação em Programas que visem o


atendimento integral do paciente, enfatizando de modo
especial a formação e o aprimoramento dos profissionais da
saúde envolvidos nas diferentes etapas do tratamento
O universo do “Cuidar” é
bem mais abrangente que o
do curar

Podemos não curar sempre,


mas sempre poderemos
cuidar e diminuir o
sofrimento
Psicologia Hospitalar ICESP

• Atendimento integral ao paciente na visão biopsicosociocultural e


espiritual, conforme determina a OMS – Organização Mundial da Saúde

• O pressuposto principal da atividade do psicólogo dentro do hospital é


resgatar a visão do indivíduo como um todo, em cujo princípio básico da
própria existência consiste no direito à dignidade e ao respeito.

(FONGARO & SEBASTIANI, 2001)

• Proporcionar prática humanizada e interprofissional em saúde;

• Promover humanização e excelência no atendimento em saúde aos


pacientes, acompanhantes e equipe de saúde.
PSICOLOGIA EM PROGRAMAS DE HUMANIZAÇÃO

Grupo Acolhida
Grupo Liberação de
Sala de Espera
Grupo Acolhida Acolhida Liberação de Visitas em
Humanizada em
Ambulatórios Conversando Visitas em UTI Unidade de
UTI
com a Equipe Internação
(planejamento)

Grupo
Grupo Acolhida
Terapêutico Grupo de Direito a
Preparando para
Tsurus e as Encontro Acompanhante
Cirurgia
Dobraduras Pacientes Liberação Especial
(planejamento)
da Vida

Grupo Acolhida
Programa de
Sala de Espera Visita
Visita de Cuidados Grupo de
Humanizada em Humanizada
Menores Especiais ao encontro Familiar
Centro Cirúrgico em UTI
Óbito
(planejamento)

Participação multi Reunião Grupo Grupo


na Passagem de Multiprofissional Terapêutico Terapêutico
Plantão da de Discussão de de CA de de CA de
Enfermagem Casos Clínicos Mama Pelve
O adoecer com câncer
Aspectos psicológicos do paciente
O diagnóstico de câncer, ou mesmo a
possibilidade de recebê-lo, traz um
impacto psicológico profundo, gerador de
crise e desequilíbrio emocionais a paciente
e familiar, pois está muito associado à
morte, tanto que,
mesmo se o paciente obtém a cura, a
marca psicológica da morte antecipada
permanecerá para sempre em sua vida.
Além do câncer, há muitas outras
doenças fatais, entretanto, a sensação que
temos é de que as outras doenças
matam, mas o câncer destrói.
(Carvalho, 2003).
O DIAGNÓSTICO INCLUI:

A vivência dos primeiros sintomas

A investigação diagnóstica

O impacto da notícia

Período inicial de reajustamento


O diagnóstico transforma a pessoa de
Sujeito de intenções em sujeito de
atenção
orgânica desarmonização
Doença
psíquica da pessoa

Assim o aparecimento de
sintomas mobiliza temores
ligados às possibilidades de
adoecer e morrer. E o medo
frente a doença e a morte
estimulará fantasias racionais e
irracionais que passarão a
compor o comportamento do
doente
TRINÔMIO DE RELAÇÃO COM A DOENÇA
CRÔNICA

DEPENDÊNCIA REGRESSÃO

PASSIVIDADE
O adoecer com câncer induz:
novos modos de enfrentamento
mudanças nas auto-definições dos pacientes e familiares
(ser sadio / ser doente)
períodos extensos de adaptação

múltiplas perdas

saúde física
funcionamento
hábitos
perda da identidade

perda dos sonhos e projetos

possibilidade de morte

geralmente sintomática

progride em severidade

incapacidade aumenta gradualmente


Alguns aspectos desencadeadores de angústia e
fragilidade emocional

• Condutas terapêuticas invasivas e


agressivas (exames, QT, RT...)

• Esquema corporal modificado


(amputação, caquexia, traqueo, alopécia...)

• Ruptura drástica do cotidiano e das


atividades antes exercidas facilmente
(andar, ir ao banheiro, falar, alimentar-se...)

• Distanciamento do lar, dos vínculos


afetivos
Alguns aspectos desencadeadores de angústia e
fragilidade emocional

• Convívio com pessoas estranhas e


ambiente hostil (hospital)

• Perdas significativas (emprego, financeira,


amizade, conjugal...)

• Perda dos sonhos e objetivos

• Dor física...
Manifestações Psíquicas
e Comportamentais

Depressão
Ansiedade
Stress psicorgânico
Insegurança
Frustração
Medo
Impotência
Raiva
Hostilidade
Dependência
Sentimento de culpa
Perda de autonomia
Limitação de atividades
Manifestações psíquicas
e comportamentais

Incertezas quanto ao futuro e recidivas


Perda do sentimento de invulnerabilidade
Alternância entre estabilidade e crise
Manifestações Psíquicas
e Comportamentais

Sensação de punição (castigo)


Sensação de abandono (real ou pela
dificuldade de comunicação e de troca
afetiva que interferem na auto-estima e na
aderência ao tratamento - sexualidade)
Sensação de fracasso (sentimento de
menos-valia direcionado a si próprio)
Conflitos quanto a privacidade
(despessoalização pela perda da sensação
de particularidade)
Angústia de morte (vivência da perda da
existência)
O paciente e sua família vão ter que
aprender a conviver:
com a sintomatologia crônica

períodos mínimos de alívio

contínua adaptação e mudanças

de papéis

tensão contínua para o paciente

e cuidadores

exercício de flexibilidade

reorganização interna de papéis

disposição para utilizar recursos externos


Estágios do Adoecer

As Fases de K. Ross
• ESTÁGIOS DO ADOECER
• IMPACTO DO DIAGNÓSTICO
• NEGAÇÃO - “não, não é possível”

• negação parcial – na maioria dos pacientes


• negação ansiosa – informação abrupta
• a negação, em geral é temporária
• serve como um ‘amortecedor’ para a angústia
• reações comuns –
demora em iniciar o tratamento
busca de tratamentos alternativos
abandono de tratamento
• negação em todos os níveis

CONSPIRAÇÃO DO SILÊNCIO
• ESTÁGIOS DO ADOECER
• NEGAÇÃO - “não, não é verdade”
• RAIVA / REVOLTA - “por que eu”?

• quando não é mais possível negar


• raiva, revolta, ressentimento, inveja dos sadios
• estágio bastante difícil para a equipe e família
• reação é de afastamento ou de contra-ataque
• pacientes controladores / status social
• ESTÁGIOS DO ADOECER
• NEGAÇÃO - “não, não é verdade”
• RAIVA / REVOLTA - “por que eu”?
• BARGANHA ou NEGOCIAÇÃO

• paciente busca uma nova forma de enfrentar


• acredita que se fizer acordos, promessas, trocas,
conseguirá se curar ou adiará sua morte
• paciente estabelece sua meta e impõe o prêmio
• pode encobrir culpa e sensação de punição
• ESTÁGIOS DO ADOECER
• NEGAÇÃO - “não, não é verdade”
• RAIVA / REVOLTA - “por que eu”?
• BARGANHA ou NEGOCIAÇÃO
• DEPRESSÃO

• quando não há mais possibilidade de negar a doença


• a negação, a raiva, a troca, cedem lugar ao sentimento
de perda
• é preciso DIFERENCIAR:
• ESTÁGIOS DO ADOECER
• NEGAÇÃO - “não, não é verdade”
• RAIVA / REVOLTA - “por que eu”?
• BARGANHA ou NEGOCIAÇÃO
• DEPRESSÃO

• DEPRESSÃO REATIVA
• DEPRESSÃO PREPARATÓRIA
• ESTÁGIOS DO ADOECER

• NEGAÇÃO - “não, não é verdade”


• RAIVA / REVOLTA - “por que eu”?
• BARGANHA ou NEGOCIAÇÃO
• DEPRESSÃO
• ACEITAÇÃO

• é o estágio final
É amplamente reconhecido na literatura que o diagnóstico
da doença oncológica atinge diretamente a integridade
psicológica de pacientes e familiares, tornando-os
fragilizados e vulneráveis e implicando no aparecimento de
numerosos e importantes estressores físicos e psicológicos

Burisch e Redd, 1994; Given, 1994;


Chen, 1994; Schwarz, Bernhard, Flechtner, Hurny e Kuchler, 1994;
Molassiotis, 1997; Wochna, 1997; Del Valle, 1998; Wingard,1998;
Chiattone, 2001; Chiattone, 2002; Santos, 2003;
Del Valle et al,2006
O transtorno psicológico mais freqüente refere-se ao
transtorno de adaptação reativo ao stress imposto pelo
diagnóstico e tratamento

Os sintomas psicológicos característicos


envolvem estados de ansiedade e depressão,
acrescidos da persistência excessiva desses sintomas
e de interferência anormal no tratamento
Pacientes de risco:

Antecedentes psiquiátricos ou psicopatológicos


Pacientes que negam os sintomas;
Pacientes com relações difíceis com a equipe
assistente;
Pacientes que aguardam resultados milagrosos do
tratamento;
Pacientes de risco:

Pacientes que apresentam problemas


especiais de diagnóstico;
Pacientes que manifestam pouca ou
exagerada ansiedade no pré-diagnóstico;
Pacientes envolvidos na ‘conspiração do
silêncio’
Cuidado ao dizer:

“Não chore”
“Nossa, você está muito magrinho... ”
“Você vai ficar bom novamente”
“Você deve ser forte neste momento”
“Tem pessoas piores que você e não reclamam”
“Você não é o único que sofre”
“O sofrimento purifica”
“Eu sei o que você está sentindo”
“Eu também passei por isso ou aquilo (perdas) e olha como estou
melhor”
O Adoecer do paciente e o
Profissional de Saúde

1. Contato íntimo e frequente


com a dor e o sofrimento

2. Lidar com a intimidade


corporal e emocional
3. Contato íntimo e
frequente com as
perspectivas de morte e
com o morrer

4. Lidar com enfermos difíceis - queixosos, rebeldes e


não aderentes ao tratamento, agressivos, hostis,
reivindicadores, auto-destrutivos, cronicamente
depressivos
5. Lidar com incertezas e limitações do
conhecimento técnico que se contrapõe com as
demandas e expectativas dos enfermos que
desejam certezas e garantias

cura, rapidez, indolor, sem sequelas


6. Enfrentar um contexto de trabalho paradoxal:
Alta demanda e as vezes poucos recursos,
materiais e Humanos

7. Alto índice de exigências e ansiedade depositadas no


profissional; pela sociedade, enfermo, família, colegas e
ele mesmo
ONIPOTÊNCIA X IMPOTÊNCIA

Cura = Êxito Morte = Fracasso


ou Cronicidade

AÇÃO = REFLEXÃO
PROJEÇÃO DO PACIENTE NO PROFISSIONAL

Raiva e hostilidade Produtos da impotência


frente ao Adoecer

Paradoxal frente a Dependência

Aceita ou NÃO aceita o Cuidado


Mitificação da figura do médico e demais
profissionais

“Doutor, depois de Deus é


o senhor...”
OS CUIDADOS DO CUIDADOR
A) Formação que valorize o humano em todos os
sentidos paciente - família - profissional
( efetivação do modelo biopsicossocial e espiritual)
B) Conhecimento pessoal de seus limites e a seu
respeito
C) Qualidade de vida além das atividades
profissionais: lazer, outros interesses, vida afetiva,
férias, hobbies, vida cultural, esportes, etc.
D) Procurar ajuda profissional, caso perceba
mudanças de comportamento que estejam
incomodando (stress, irritabilidade, agressividade,
insônia, desânimo...)
NÃO SE PODE DAR ESPERANÇA SE NÃO
TIVERMOS ESPERANÇA
NÃO SE PODE LUTAR PELA DIGNIDADE E VIDA DO
OUTRO SE NÃO VALORIZAMOS A NOSSA
NÃO SE PODE PROMOVER SAÚDE SE NÃO SOMOS
SAUDÁVEIS
NÃO SE PODE DAR O QUE NÃO SE TEM.....
SER OCEANO
Diz-se que, mesmo antes de
um rio cair no oceano, ele
treme de medo
Olha para trás, para toda a jornada: os cumes,
as montanhas, o longo caminho sinuoso através
das florestas, através dos povoados, e vê a sua
frente um oceano tão vasto que entrar nele nada
mais é do que desaparecer para sempre
Mas não há outra maneira. O rio não pode
voltar. Ninguém pode voltar. Voltar é
impossível na existência. Você pode apenas ir
em frente.
O rio precisa se arriscar e entrar no oceano
E somente quando ele entra no oceano é
que o medo desaparece, porque apenas
então o rio saberá que não se trata de
desaparecer no oceano.
Mas tornar-se oceano.
Durante todos esses anos, aprendi que um
profissional da saúde só poderá ser considerado
assim... se tiver compaixão
Se puder tocar no coração de seus pacientes...
E isso não é coisa de outro
mundo...
É o que dá sentido à vida!

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