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O QUE É PEDAGOGIA

Fonte: www.centrorefeducacional.com.br

primeiro passo para entendermos o que é pedagogia inclui uma revisão terminológica.
Precisamos localizar o termo “pedagogia”, e ver o que cai sobre sua delimitação e o que
escapa de sua alçada. Para tal, a melhor maneira de agir é comparar o termo
“pedagogia” com outros três termos que, em geral, são tomados – erradamente – como
seus sinônimos: “filosofia da educação”, “didática” e “educação”.

O termo “educação”, ou seja, a palavra que usamos para fazer referência ao “ato
educativo”, nada mais designa do que a prática social que identificamos como uma
situação temporal e espacial determinada na qual ocorre a relação ensino-aprendizagem,
formal ou informal.

A relação ensino-aprendizagem é guiada, sempre, por alguma teoria, mas nem sempre
tal teoria pode ser explicitada em todo o seu conjunto e detalhes pelos que participam de
tal relação – o professor e o estudante, o educador e o educando – da mesma forma que
poderia fazer um terceiro elemento, o observador, então munido de uma ou mais teorias
a respeito das teorias educacionais. A educação, uma vez que é a prática social da
relação ensino-aprendizagem no tempo e no espaço, acaba em um ato e nunca mais se
repete. Nem mesmo os mesmos participantes podem repeti-la. Nem podem gravá-la.
Nem na memória nem por meio de máquinas. É um fenômeno intersubjetivo de
comunicação que se encerra em seu desdobrar. No caso, se falamos de um encontro
entre o professor e o estudante, falamos de um fenômeno educacional – que é único.
Quando ocorrer outro encontro do mesmo tipo, ele nunca será o mesmo e, enfim, só
superficialmente será similar ao anterior.

O termo “didática” designa um saber especial. Muitos dizem que é um saber técnico,
porque vem de uma área onde se acumulam os saberes que nos dizem como devemos
usar da chamada “razão instrumental” para melhor contribuirmos com a relação ensino-
aprendizagem. A razão técnica ou instrumental é aquela que faz a melhor adequação
entre os meios e os fins escolhidos. A didática é uma expressão pedagógica da razão
instrumental. Sua utilidade é imensa, pois sem ela nossos meios escolhidos poderiam,
simplesmente, não serem os melhores disponíveis para o que se ensina e se aprende e,
então, estaríamos fazendo da educação não a melhor educação possível.

Mas a didática depende da pedagogia. Ou seja, depende da área onde os saberes são, em
última instância, normas, regras, disposições, caminhos e/ou métodos. O termo
“pedagogia”, tomado em um sentido estrito, designa a norma em relação à educação.
“Que é que devemos fazer, e que instrumentos didáticos devemos usar, para a nossa
educação?” – esta é a pergunta que norteia toda e qualquer corrente pedagógica, o que
deve estar na mente do pedagogo.

Às vezes tomamos a palavra “pedagogia” em um sentido lato; trata-se da pedagogia


como o campo de conhecimentos que abriga o que chamamos de “saberes da área da
educação” – como a filosofia da educação, a didática, a educação e a própria pedagogia,
tomada então em sentido estrito. Mas, de fato, é em um sentido estrito que a pedagogia
nos deve interessar. Pois, quando ampliamos a extensão do termo o que resta pouco nos
ajuda a entender o quadro no qual se dá a diferenciação dos saberes relativos ao ensino.
A pedagogia, em um sentido estrito, está ligada às suas origens na Grécia antiga.
Aqueles que os gregos antigos chamavam de “pedagogo” era o escravo que levava a
criança para o local da relação ensino-aprendizagem; não era exclusivamente um
instrutor, ao contrário, era um condutor, alguém responsável pela melhoria da conduta
geral do estudante, moral e intelectual. Ou seja, o escravo pedagogo tinha a norma para
a boa educação; se, por acaso, precisasse de especialistas para a instrução – e é certo que
precisava –, conduzia a criança até lugares específicos, os lugares próprios para o
“ensino de idiomas, de gramática e cálculo”, de um lado, e para a “educação corporal”,
de outro.

A concepção que diz que a pedagogia é a parte normativa do conjunto de saberes que
precisamos adquirir e manter se quisermos desenvolver uma boa educação, é mais ou
menos consensual entre os autores que discutem a temática da educação. Ela, a
pedagogia, é aquela parte do saber que está ligada à razão que não se resume à razão
instrumental apenas, mas que inclui a razão enquanto razoabilidade; a racionalidade que
nos possibilita o convívio, ou seja, a vigência da tolerância e, mesmo, do amor.
Ao falarmos, por exemplo, “não seja violento, use da razão”, queremos ser
compreendidos como dizendo, “use de métodos de comunicação que são próprios do
diálogo” – os métodos e normas da sociedade liberal (ideal). É esse tipo de razão ou
racionalidade que conduz, ou produz, a pedagogia. A didática busca meios para que a
educação aconteça e, assim, é guiada pela razão técnica ou instrumental, enquanto que a
pedagogia busca nortear a educação, e é guiada pela razoabilidade, pela fixação de
regras que só se colocam por conta da existência de um ou vários objetivos; no caso,
objetivos educacionais, o que é posto como meta e valor em educação. Quem estabelece
tais valores?

Pedagogia, didática e educação estão ligadas. Mas a filosofia da educação é um saber


mais independente, que pode ou não ter um vínculo com os saberes da pedagogia e da
didática, ou do saber-prático (e imediato) que faz a educação acontecer. O termo
“filosofia da educação” aponta para um tipo de saber que, de um modo amplo, é aquele
acumulado na discussão sobre o campo educacional. Faz assim ou para colocar valores
e fins e legitimá-los através de fundamentos, ou para colocar valores e fins e legitimá-
los através de justificações. Há, portanto, dois grandes tipos de filosofia da educação: a
filosofia da educação que serve como fundamentação para a pedagogia e filosofia da
educação que serve como justificação.

A filosofia da educação não está vinculada somente à razão instrumental ou à razão


comunicativa liberal, mas tem como sua produtora a razão enquanto elemento que
escolhe fins e, portanto, que valora. Ela pode falar em "valor de verdade" e "valor
moral", pode separá-los em campos que se excluem ou não, mas, sempre, vai falar em
valor e fins. A razão, aqui, é a razão que diz quais são os objetivos da educação e, então,
que explicita se as normas da pedagogia podem ser mantidas ou não, e que normas são
essas. Tais normais devem parecer legitimas, caso contrário, pelo menos em princípio,
elas não terão seguidores. O que as torna legítimas? Um discurso – o discurso
filosófico, a filosofia da educação ou fundacionista ou justificadora. Se a legitimação da
pedagogia se dá através de uma metafísica que encontra um fundamento último para
que a educação se processe de uma maneira e não de outra, dizemos que a filosofia da
educação fundamenta a pedagogia e, conseqüentemente, a educação. Se a legitimação
da pedagogia se dá através de um conjunto de argumentos que tentam justificá-la, sem
requisitar um ponto arquimediano metafísico, então dizemos que a filosofia da educação
justifica a pedagogia e, conseqüentemente, a educação.

Se nós acreditamos, por exemplo, no âmbito da filosofia da educação, que “somos


iguais porque todos nós somos filhos de Deus” ou que “somos iguais porque somos
todos seres humanos” ou que “somos iguais porque todos possuímos, diferentemente
dos animais, razão”, podemos então, no âmbito da fixação de normas pedagógicas, dizer
que nossa educação “tem como objetivo não destruir nossa igualdade original”. A
igualdade baseada na origem divina, ou baseada na noção de ser humano ou na posse de
algo que poderia chamar “razão”, funcionam, neste caso, como fundamentos
metafísicos para uma pedagogia igualitária. Mas se alguém diz que tal crença metafísica
não é algo que podemos crer à luz de crenças mais convincentes, e se nós não queremos
abandonar a nossa pedagogia igualitária, então nos cabe ou convencer nosso
interlocutor da validade do ponto metafísico (o que implica em refazer o sistema
filosófico adotado) ou, então, argumentar de modo a justificar que a igualdade como fim
da educação vale a pena, por exemplo, porque ela possibilitará um mundo com menos
injustiça, um mundo melhor – usamos aí um argumento pragmático, que não implica
qualquer metafísica. Assim, uma mesma pedagogia (uma pedagogia igualitária, por
exemplo), pode ter discursos legitimadores diferentes, isto é, filosofias da educação
diferentes. Quem legitima a pedagogia pode apelar para a fundamentação ou para a
justificação.

Uma tal reflexão – a de como a pedagogia se legitima - é própria da “área da filosofia da


educação”. É o trabalho próprio aos filósofos da educação. Não raro, é uma discussão
que envolve argumentos técnicos em filosofia e, portanto, não produz um saber que
possa ser de domínio imediato dos que estão executando a relação ensino-
aprendizagem, embora os professores conheçam, ao menos, as máximas filosófico-
pedagógicas que escapam do domínio técnico e lhes caem nos ouvidos, e, assim, eles
ficam satisfeitos com suas pedagogias. Não raro, uma única máxima filosófico-
pedagógica guia uma vida inteira de trabalho de um professor.

Que não se tire daí a conclusão que os professores devem apenas saber didática, ou, ao
contrário, que vão ser “críticos” e bem mais capazes se souberem filosofia da educação,
seja esta fundacionista ou justificadora. O saber de cada professor varia. Uns podem ter
uma aptidão melhor para a reflexão filosófica, e serem desajeitados para o trabalho que
implica forte aptidão didática, outros podem dominar os trâmites das normas da
pedagogia, e não terem gosto pela reflexão da filosofia da educação. Outros, ainda,
podem ser práticos, meramente práticos, e se saírem bem em resultados de
aproveitamento com os alunos. O importante é que, na formação dos professores, se
saiba que empregamos todos os tipos de racionalidades que temos em nossa linguagem
(a instrumental, a da tolerância e a que fixa objetivos e valores), e que a formação deve
ser harmoniosa, pois tem tudo, em suas vestes originais, para ser harmoniosa – pois
fazer educação nos leva, sempre, para os quatro saberes acima apontados, e para o
emprego das três formas de racionalidade.

A harmonia não vem de separarmos, eqüitativamente, o que cada professor precisa


saber em filosofia da educação, pedagogia, didática e ensino (educação). A harmonia
vem, sim, da nossa capacidade de termos políticas educacionais que cultivem as
instituições de formação de professores que protegem uma cultura onde os quatro
saberes acima descritos não fiquem a descoberto, nas mãos de leigos. Tal cultura, sem
que seja preciso qualquer reunião formal, será o fator determinante de convergência das
conversações, no interior das instituições onde se dá a formação do professor, e ela
poderá criar legiões de bons professores, em graus diferentes de aptidões. Isso vale para
qualquer instituição de ensino que forma professores.

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