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Habeas Corpus Criminal Nº 1.0000.20.

553477-9/000

<CABBCAADDAABCCBBADCADBCAAAACBDABADCAADDABACCB>
EMENTA: ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA – PECULATO – REVOGAÇÃO DA
PRISÃO PREVENTIVA – IMPOSSIBILIDADE – PRESENTES OS
REQUISITOS AUTORIZADORES DA MEDIDA EXTREMA – GRAVIDADE
CONCRETA – GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA – ELEVADO DANO AO
ERÁRIO – MANTIDA A PRISÃO PREVENTIVA.
V.V.: HABEAS CORPUS – PECULATO, CORRUPÇÃO PASSIVA E
ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA – PRISÃO PREVENTIVA – REVOGAÇÃO –
POSSIBILIDADE – ENCERRAMENTO DA INSTRUÇÃO CRIMINAL –
AUSÊNCIA DE RISCO À INSTRUÇÃO PROCESSUAL – GRAVIDADE DO
CRIME E CLAMOR SOCIAL – FUNDAMENTAÇÃO INSUFICIENTE PARA A
MANUTENÇÃO DA MEDIDA EXTREMA – LIBERDADE PROVISÓRIA
CUMULADA COM MEDIDAS DIVERSAS – VIABILIDADE. Após a entrada
em vigência da Lei n.º 12.403/11, a prisão preventiva, modalidade de
medida cautelar, passou a ser exceção na sistemática processual penal,
sendo certo que a mera afirmação de gravidade do crime e de clamor
social não é suficiente para fundamentar a constrição cautelar.
Precedentes. O afastamento cautelar do agente de seu mandado político
é medida suficiente e adequada para evitar a reiteração de crimes contra
a Administração Pública. Ademais, após o encerramento da instrução
processual, não há que se falar em risco à mesma. Assim, inexistindo
motivos para a subsistência da constrição cautelar, nos termos do art.
316 do Código de Processo Penal (CPP), deve ser ela imediatamente
revogada, sendo viável a concessão da liberdade provisória, nos termos
do art. 321 do CPP, cumulada com as medidas cautelares diversas da
prisão, previstas no art. 319 do CPP, por se revelarem adequadas e
suficientes.
HABEAS CORPUS CRIMINAL Nº 1.0000.20.553477-9/000 - COMARCA DE CAMPINA VERDE - PACIENTE(S):
ALEXANDRE FREITAS MACEDO - AUTORID COATORA: JUIZ DE DIREITO DA SECRETARIA DO JUÍZO - ÚNICA DE
CAMPINA VERDE

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 8ª CÂMARA CRIMINAL do


Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da
ata dos julgamentos, por maioria, vencido o Relator, em DENEGAR A
ORDEM, VENCIDO O DES. RELATOR.

DES. HENRIQUE ABI-ACKEL TORRES


RELATOR.

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Número Verificador: 1000020553477900020201323898


Habeas Corpus Criminal Nº 1.0000.20.553477-9/000

DESA. MÁRCIA MILANEZ


PRESIDENTE E RELATORA PARA O ACÓRDÃO.

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Habeas Corpus Criminal Nº 1.0000.20.553477-9/000

DES. HENRIQUE ABI-ACKEL TORRES (RELATOR)

Trata-se de ordem de habeas corpus, com pedido liminar,


impetrada pelo Dr. Horácio Bouças Loureiro Jr., inscrito na OAB/MG
sob o nº 76.767, em favor de ALEXANDRE FREITAS MACÊDO, cuja
prisão preventiva foi decretada pela MMª. Juíza de Direito da única
Vara da Comarca de Campina Verde/MG, no bojo da ação penal em
que se apura a suposta prática, pelo paciente, dos delitos previstos nos
artigos 2º, §4º, II, da Lei nº 12.850/2013; 312 e 299, ambos, do Código
Penal; e 1º da Lei 9.613/98.
O impetrante alega, em síntese, que os motivos para
manutenção da prisão preventiva deixaram de existir, pois todas as
testemunhas já foram ouvidas, não havendo mais a possibilidade de o
paciente exercer influência na colheita de provas.
Salienta que todas as testemunhas inocentaram o paciente,
inexistindo, assim, os requisitos e pressupostos dos arts. 312 e 313,
ambos, do Código de Processo Penal.
Aduz que a gravidade e a complexidade dos fatos imputados ao
paciente, não justificam a manutenção da prisão preventiva,
salientando que a tese persecutória adota critérios puramente
objetivos.
Afirma que o acautelamento está sendo utilizado como
antecipação de pena, sendo certo que as testemunhas foram
uníssonas em afirmar que os negócios do paciente com venda e
compra de gado foram feitos dentro da estrita legalidade.
Pleiteia, assim, a revogação da decisão que decretou a prisão
preventiva do paciente, determinando a expedição do competente
alvará de soltura, ou, subsidiariamente, a aplicação das medidas
cautelares previstas no art. 319 do CPP.

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A inicial (fls. 01/22 – doc. único), veio acompanhada de


documentos (fls. 23/186 – doc. único).
O pedido liminar foi indeferido (fls. 193/195 – doc. único).
O impetrante se opôs ao julgamento virtual, manifestando seu
interesse em realizar sustentação oral (fl. 202 – doc. único).
A autoridade apontada como coatora prestou informações (fls.
208/209 – doc. único) e juntou cópia da respeitável sentença (fls.
214/317 – doc. único).
Instada a se manifestar, a douta Procuradoria-Geral de Justiça
opinou pela denegação da ordem de habeas corpus (fls. 321/325 –
doc. único).
É o breve relatório.

ADMISSIBILIDADE
Presentes os pressupostos legais de admissibilidade e
processamento, conheço do habeas corpus.

MÉRITO
Conforme deixei consignado quando do julgamento do HC nº
1.0000.20.527045-7/000, entendo que os motivos para a manutenção
da constrição cautelar do paciente não mais subsistem.
Não poderia deixar de registrar, como já fiz em outras
oportunidades, que a instrução do referido processo foi conduzida com
absoluta maestria pela zelosa Juíza de Direito Eleusa Maria Gomes,
que, mesmo diante de um contexto de emergência internacional em
decorrência da pandemia pelo novo Coronavírus (Covid-19), tomou
todas as precauções possíveis, resguardando a saúde do paciente e
dos demais corréus, e mantendo o regular andamento da ação penal,
em observância aos ditames do sistema processual penal acusatório.

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Não desconheço, igualmente, que esta colenda 8ª Câmara


Criminal já analisou a necessidade da manutenção da prisão
preventiva do paciente, e demais corréus, por diversas de vezes no
curso da instrução processual, ressaltando, em síntese que:
“[...] os delitos em tese praticados pelo paciente se
revelam de especial e concreta gravidade,
considerando, especialmente a suposta participação
do paciente em uma organização criminosa formada
para a prática, em tese, de peculato-desvio,
consistente na apropriação de diárias de viagens
obtidas pelos Vereadores da Comarca de Campina
Verde, as quais não possuíam nenhuma finalidade
pública, ao contrário tornaram-se verdadeiro
complemento salarial dos agentes políticos. Havendo
indícios de que, durante os anos de 2017, 2018 e
2019, foram desviados pela organização criminosa o
total de R$ 476.960,00 (quatrocentos e setenta e seis
mil, novecentos e sessenta reais), sendo o paciente
responsável por se apropriar, em tese, do montante
de R$ R$ 88.430,00 (oitenta e oito mil, quatrocentos e
trinta mil reais). Outrossim, supostamente, o paciente
teria recebido documento que possuía o valor de R$
60.000,00 (sessenta mil reais), a fim de que votasse
em seu corréu Cortopassi para que este fosse eleito
presidente da Câmara. Ressalta-se que tais delitos
foram exercidos por detentores de cargos públicos,
que possuem a confiança da comunidade e deveriam
zelar pela idoneidade moral e pela ética.
Evidentemente os cometimentos de tais delitos
comprometem o meio social e autorizam a custódia
cautelar do acusado, a fim de se evitar a repetição
dos atos nocivos censuráveis e, com isso, garantir a
ordem pública. [...].” (TJMG - Habeas Corpus Criminal
1.0000.20.032897-9/000, Relator(a): Des.(a) José
Luiz de Moura Faleiros (JD Convocado) , 8ª CÂMARA
CRIMINAL, julgamento em 14/05/0020, publicação da
súmula em 14/05/2020).

Ademais, a ilustre Magistrada a quo, em cumprimento ao


disposto no art. 316, parágrafo único, do CPP, revisou a prisão de cada
um dos envolvidos nos dias 15/05/2020, 13/07/2020, 14/08/2020 e
03/09/2020, mostrando mais uma vez seu zelo para com a
cautelaridade processual.

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Destaca-se que, de fato, havia um fundado receio de que o


paciente e os demais corréus poderiam interferir na instrução
processual, daí a justificativa da cautela determinada e mantida.
Aliás, conforme consta da respeitável decisão que decretou sua
prisão preventiva este era o principal motivo para a manutenção do
cárcere:
“[...] distingo e depreendo que existe perigosa
probabilidade de continuidade delitiva e influência e
manipulação de testemunhas. De fato, a atual
presidência da Câmara informou que há mais de 190
mil reais para pagamento de diárias este ano de 2020
e que a lei anterior que ensejou as fraudes segue
vigente, existindo outro diploma aguardando sanção
do prefeito, porém que continua autorizando o
pagamento da verba. Contudo, isso não é o
principal, em verdade, os investigados, caso em
liberdade, pela sua elevada articulação e ambição,
podem abordar as várias pessoas que surgiram ao
longo das investigações – servidores da Câmara e
pessoas da sociedade – com quem conversaram e
revelaram seus intuitos delituosos, as quais foram
a maior parte citadas e identificadas nas
interceptações conversando até mesmo com os
próprios investigados.
Campina Verde é uma cidade pequena, de 20 mil
habitantes, altamente influenciável pela política
local, onde os vereadores detêm grande poder e
influência. [...].” – destaquei.

Registro, por fim, que após a apresentação das derradeiras


alegações finais, e prolação da respeitável sentença, a instrução
processual se encontra completamente encerrada.
Registro, por fim, que após a apresentação das derradeiras
alegações finais, e prolação da respeitável sentença, a instrução
processual se encontra completamente encerrada.
Não desconheço que o paciente já se encontra condenado, em
primeira instância, nas disposições do art. 2º, §4º, II, da Lei 12.850/13;
art. 312, caput, c/c art. 13, por 29 vezes; art. 299, por diversas vezes,
todos do CP; e art. 1º, caput, da Lei 9.613/98, por diversas vezes.

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Contudo, ao final da respeitável sentença, a MMª. Juíza a quo


apenas reiterou os fundamentos já apresentados para manter a prisão
cautelar do paciente, e dos corréus, indeferindo a eles o direito de
recorrer em liberdade.
“[...] é pacifico na doutrina e jurisprudência o
entendimento de que a presença de eventuais
condições pessoais favoráveis dos réus, tais como,
residência fixa, primariedade e bons antecedentes
não possuem o condão de, por si só obstar a custódia
cautelar. Avalio como especialmente habituais, sérios,
graves e desqualificantes os vários eventos
criminosos delineados. Para a garantia da ordem
pública e diante da gravidade concreta dos delitos,
não há como abrandar o cárcere ou facultar aos
agentes recorrerem em liberdade, posto que em nada
foram alterados os motivos ensejadores do
decreto da prisão preventiva. [...].”

Cumpre ressaltar, com a devida vênia, que a mera


superveniência de um édito condenatório não redunda,
necessariamente, em “novo titulo” prisional.
Pois, como bem apontado pela MMª Juíza a quo, os motivos
ventilados por ela para manter o acautelamento do paciente são os
mesmos, a saber, a gravidade concreta dos fatos.
Com efeito, nos dias 07/11/2019 e 03/03/2020, o Supremo
Tribunal Federal, ao julgar as ADCs nº 43, 44 e 54 e ARE 1.217.425
AgR, retomou seu entendimento segundo o qual o cumprimento da
pena somente pode ter início com o esgotamento de todos os
recursos, e não automaticamente, como se a condenação em primeira
instância, ou sua confirmação em sede recursal, fosse um “novo título”
prisional.
“AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO
EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO.
CONSTITUCIONAL. PENAL E PROCESSO PENAL.
EXECUÇÃO ANTECIPADA DA PENA.
INCONSTITUCIONALIDADE. VIOLAÇÃO DA
GARANTIA CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO
DE INOCÊNCIA. DECLARAÇÃO DE

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CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 283 DO


CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (ADCs 43/DF,
44/DF e 54/DF). RÉ QUE RESPONDEU AO
PROCESSO EM LIBERDADE. AUSÊNCIA DE
DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA PELAS
INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. AGRAVO REGIMENTAL
A QUE SE NEGA PROVIMENTO. I – A execução
antecipada da pena, antes do trânsito em julgado da
sentença penal condenatória, viola a garantia
constitucional da presunção de inocência (art. 5°, LVII,
da CF/1988) II – O art. 283 do CPP foi declarado
constitucional pelo Plenário do Supremo Tribunal
Federal no julgamento das ADCs 43, 44 e 54, de
relatoria do Ministro Marco Aurélio. III – A decretação
de prisão antes do trânsito em julgado somente se
justifica na modalidade cautelar, quando
preenchidos os requisitos do art. 312 do CPP. IV –
O réu que respondeu ao processo em liberdade e que
não teve prisão preventiva decretada em seu
desfavor, deve iniciar a execução da pena após o
trânsito em julgado da condenação. V – Agravo
regimental a que se nega provimento. (ARE 1217425
AgR, Relator(a): RICARDO LEWANDOWSKI,
Segunda Turma, julgado em 06/12/2019, PROCESSO
ELETRÔNICO DJe-043 DIVULG 02-03-2020 PUBLIC
03-03-2020).

Naquela oportunidade, a Suprema Corte reafirmou a


constitucionalidade do art. 283 do CPP, com redação data pela Lei nº
12.403/11, segundo o qual: “ninguém poderá ser preso senão em
flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade
judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória
transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em
virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.”
Em outras palavras, antes do trânsito em julgado de sentença
condenatória, a prisão do agente somente é possível por meio de
decisão judicial fundamentada nos pressupostos e requisitos dos arts.
312 e 313 do CPP, em caso de prisão preventiva; ou na Lei nº
7.960/89, em caso de temporária.

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Assim, segundo o atual entendimento do Pretório Excelso, é


indispensável a analise da necessidade, ou não, da prisão cautelar à
luz de seus requisitos e pressupostos, independente da fase em que
se encontra o processo.
Portanto, a meu ver, somente haverá “novo título” prisional se os
motivos apresentados na decisão judicial que mantiver o
acautelamento do agente forem outros.
Aliás, mutatis mutandi, conforme antigo precedente do STF, “o
habeas corpus fica prejudicado apenas quando a sentença
condenatória que mantém o réu preso utiliza fundamentos diversos do
decreto de prisão preventiva, o que não ocorreu na espécie vertente.”
(STF, HC nº 113.457/SP, Rel. Min. Cármen Lúcia).
No caso, reafirmo meu entendimento, segundo o qual, o motivo
fundamental – apontando na decisão que decretou a prisão preventiva
do paciente e que justificava a manutenção do acautelamento durante
a instrução processual –, de fato, deixou de existir com o término da
colheita de provas.
Portanto, apesar de ser censurável o suposto dano ao erário,
não verifico elementos objetivos nos autos que me permitam aferir que
a soltura do paciente representará riscos à ordem pública, à ordem
econômica, à instrução do processo (que já se encerrou) ou à
aplicação da lei penal, não havendo indicação de que, em liberdade,
possa praticar outros delitos.
Até porque o afastamento cautelar do paciente de seu mandado
político é medida suficiente e adequada para evitar a prática de crimes
contra a Administração Pública, atendendo à proporcionalidade
necessária para providências cautelares.
Ademais, conforme assentada jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal “a mera afirmação de gravidade do crime e de clamor
social, de per se, não são suficientes para fundamentar a constrição

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cautelar, sob pena de transformar o acusado em instrumento para a


satisfação do anseio coletivo pela resposta penal.” (STJ, HC 94554;
HC 95362; HC 100012; e HC 100863).
Recentemente, e em caso semelhante, o augusto Superior
Tribunal de Justiça consignou que:
“[...] A despeito do que ressaltou o Tribunal estadual,
não está demonstrada a imprescindibilidade da
custódia cautelar, tendo em vista a exoneração dos
cargos públicos em comissão da paciente e demais
envolvidos na empreitada criminosa, circunstância
que, a toda evidência, obsta o prosseguimento do
desvio de recursos públicos com nomeações de
„servidores fantasmas‟, e afasta o risco dessa
reiteração delitiva.
Além do mais, a par do encerramento das
investigações e do recebimento da denúncia, sem
evidência de intimidação às testemunhas ou
ingerência na produção probatória, a motivação do
acórdão impugnado afigura-se inidônea, pois
escorada em meras suposições. Portanto, a
segregação corporal não é mais necessária para
acautelar a ordem pública ou, ainda, para a
conveniência da instrução criminal.
Lado outro, apesar dos crimes denunciados serem
graves, interrompida a atividade ilícita da suposta
organização criminosa que se valia dos cargos
públicos para sua atuação, dado o afastamento
dos envolvidos da Administração Pública, não há
como negar a mudança dos pressupostos fáticos
e jurídicos da medida extrema decretada, impondo
seu afastamento. [...].” (STJ, HC 511.900/RN, Rel.
Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em
04/02/2020, DJe 17/02/2020) - destaquei.

Nesse mesmo sentido, já decidiu este egrégio TJMG:


“HABEAS CORPUS - ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA,
PECULATO E FRAUDE À LICITAÇÃO - PRISÃO
PREVENTIVA - AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO
CONCRETA E FUNDAMENTADA DOS REQUISITOS
DO ART. 312 DO CPP - LIBERDADE PROVISÓRIA -
VIABILIDADE - NECESSIDADE, CONTUDO, DE
IMPOSIÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES - LIMINAR
RATIFICADA - ORDEM PARCIALMENTE
CONCEDIDA. 1. A prisão preventiva, modalidade de
medida cautelar, se tornou exceção na sistemática

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processual atual, primordialmente, após a entrada em


vigência da Lei n.º 12.403/11. 2. Assim, ainda que
atendidos os requisitos instrumentais do art. 313 do
CPP, não tendo sido demonstrada, na decisão
combatida, a existência, de forma concreta e
fundamentada, de ao menos um dos requisitos do art.
312 do CPP, impositiva a concessão da liberdade
provisória, nos termos do art. 321 do CPP, ainda que
cumulada com medidas cautelares diversas da prisão
previstas no art. 319 do CPP, considerando as
peculiaridades do caso concreto. 3. Concedido, em
parte, o habeas corpus. (TJMG - Habeas Corpus
Criminal 1.0000.18.059168-7/000, Relator(a): Des.(a)
Eduardo Brum, 4ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento
em 08/08/2018, publicação da súmula em
16/08/2018).

“HABEAS CORPUS. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA,


LAVAGEM DE DINHEIRO E PECULATO. PRISÃO
PREVENTIVA DECRETADA PARA GARANTIA DA
ORDEM PÚBLICA E CONVENIÊNCIA DA
INSTRUÇÃO PROCESSUAL CRIMINAL. FATOS
JUSTIFICADORES DA CUSTÓDIA
CONTROVERTIDOS. SUBSTITUIÇÃO POR MEDIDA
CAUTELAR ALTERNATIVA PREVISTA NO INCISO
VIII DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.
ADEQUAÇÃO E SUFICIÊNCIA. PRINCÍPIOS DA
RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE.
ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA, COM
FIXAÇÃO DE FIANÇA. - Evidenciado que os fins
acautelatórios almejados quando da ordenação da
preventiva podem ser alcançados com a aplicação de
medida cautelar diversa, prevista no inciso VIII do
artigo 319 do CPP, a substituição da custódia por
providência alternativa é medida que se impõe,
observando-se os princípios da necessidade,
adequação e proporcionalidade, não se olvidando,
ademais, da gravidade dos fatos em apuração.
(TJMG - Habeas Corpus Criminal 1.0000.16.053723-
9/000, Relator(a): Des.(a) Renato Martins Jacob , 2ª
CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 11/08/2016,
publicação da súmula em 24/08/2016).

Como cediço, a prisão cautelar é medida excepcional, sendo


admitida somente nos casos em que for possível constatar a existência
cumulativa de fumus commissi delicti (indícios de autoria e prova da
materialidade) e periculum libertatis (garantia da ordem pública, da

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ordem econômica, conveniência da instrução criminal, ou para


assegurar a aplicação da lei penal).
E, em que pese a existência de indícios de autoria e prova da
materialidade, após o encerramento da instrução processual não mais
se revela evidente o periculum libertatis.
Afinal, a prisão preventiva possui natureza excepcional, e não
pode assumir natureza de antecipação de pena, razão pela qual, nos
termos do art. 316 do CPP, verificada a falta de motivos para a
subsistência da constrição cautelar, deve ser ela imediatamente
revogada.
Isso posto, considerando que não estão mais presentes, no
caso concreto, os requisitos do artigo 312 do CPP, concedo
parcialmente a ordem impetrada, deferindo a liberdade provisória ao
paciente, nos termos do artigo 321 do CPP, mediante a assinatura de
termo de compromisso de comparecimento a todos os atos
processuais.
Ademais, a meu ver, julgo necessária e adequada à imposição
de medidas cautelares diversas da prisão.
Afinal, a natureza dos delitos supostamente praticados pelo
paciente e a influência política que exerce na cidade de Campina
Verde/MG, impõe um maior controle sobre suas atividades, ainda mais
com a proximidade das eleições municipais.
Não obstante, conforme já fundamentado, o afastamento do
apelante de suas funções legislativas é medida indispensável para a
prevenção da prática de crimes contra a Administração Pública.
Trata-se, portanto, de aplicação do princípio da
proporcionalidade tanto em sentido amplo, quanto estrito, isto é, a
proibição do excesso e a representação de um equilíbrio, no qual a
atuação estatal representa mais benefícios do que danos (Polaino

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Navarrete, Miguel. Derecho Penal, Parte general, tomo I. Barcelona:


Bosch: 2001, p. 263).
Por derradeiro, cumpre destacar que, em se tratando de
parlamentar municipal, não há necessidade de remessa à Casa
respectiva para deliberação (STJ. 5ª Turma. RHC 88.804-RN, Rel. Min.
Reynaldo Soares da Fonseca, j. 07/11/2017 (info 617)).
Assim, submeto o paciente às seguintes medidas cautelares
diversas da prisão:
a) Afastamento cautelar de suas funções
legislativas (art. 319, VI, do CPP).
b) Comparecimento periódico em juízo para
informar e justificar atividades (art. 319, I, do
CPP), sem perder de vista o disposto no art. 4º,
inciso II, da Recomendação nº 62 do Conselho
Nacional de Justiça (CNJ), enquanto durar o
avanço epidêmico da COVID-19 no Estado de
Minas Gerais;
c) Recolhimento domiciliar no período noturno
e nos dias de folga (art. 319, V, do CPP);
d) Proibição de ausentar-se da Comarca, sem
autorização judicial (art. 319, VI, do CPP); e
e) Monitoração eletrônica (art. 319, IX, do
CPP).
DISPOSITIVO
Feitas tais considerações, por vislumbrar a existência de
constrangimento ilegal, CONCEDO A ORDEM, determinando que o
paciente seja colocado, imediatamente, em liberdade provisória, com
aplicação das medidas cautelares diversas da prisão mencionadas
acima, facultando ao Juízo de origem a fixação de outras condições, se
entender necessárias.

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Caso meu entendimento seja acompanhado pelos meus


eminentes Pares, comunique-se, com urgência, a autoridade coatora
sobre o teor deste acórdão, determinando que seja expedido o
competente alvará de soltura clausulado, mediante a assinatura de
termo de compromisso de comparecimento a todos os atos
processuais e de cumprimento das medidas cautelares diversas da
prisão, advertindo o paciente que o descumprimento de quaisquer
delas poderá, nos termos do art. 282, §4º, do CPP, ensejar a
decretação de nova prisão preventiva.
Tendo em vista a impossibilidade de análise sobre a
equivalência entre as situações fático-jurídicas de todos os corréus,
recomendo à ilustre Magistrada que analise a possibilidade de
estender os efeitos dessa decisão aos demais, nos termos do art. 580
do CPP.
Sem custas.
É como voto.

DESA. MÁRCIA MILANEZ (PRESIDENTE E RELATORA PARA O


ACÓRDÃO)

VOTO

Divirjo do Des. Relator quanto à concessão da ordem, vez que


compreendo ser o caso de denegá-la, mantendo a prisão preventiva do
paciente.
Consoante delineei em sede do habeas corpus nº
1.0000.20.527045-7/000, se mantém presentes os requisitos
autorizadores da medida extrema, inscritos nos arts. 312 e 313 do
Código de Processo Penal.
Malgrado tenha se encerrado a instrução criminal, com prolação
de sentença que condenou o paciente ao cumprimento de pena de 06

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anos e 15 dias de reclusão, em regime inicialmente fechado, mais o


pagamento de 18 dias-multa, tem-se nos autos a narrativa da suposta
prática de crimes de organização criminosa majorada e peculato, este
último perpetrado inúmeras vezes, com o desvio de, pelo menos, R$
476.960,00, proveniente de diárias de viagens que não eram
realizadas pelos agentes, gerando o enriquecimento ilícito de
vereadores, tudo isso em razão de investigação empreendida pelo
GAECO.
A prisão preventiva se mostra necessária, portanto, tendo em
vista a elevada gravidade das condutas cometidas, com importante
dano ao erário, assim como à própria moralidade do Legislativo
municipal, que se vê ameaçada em virtude do envolvimento de
diversos agentes, organizados, no desvio de verbas públicas voltadas
às diárias de viagem dos membros da Câmara.
Colaciono, na oportunidade, trecho do édito condenatório a
respeito:

“Destarte, é pacífico na doutrina e jurisprudência o


entendimento de que a presença de eventuais
condições pessoais favoráveis dos réus, tais como,
residência fixa, primariedade e bons antecedentes
não possuem o condão de, por si só, obstar a
custódia cautelar. Avalio como especialmente
habituais, sérios, graves e desqualificantes os vários
eventos criminosos delineados. Para a garantia da
ordem pública e diante da gravidade concreta dos
delitos, não há como abrandar o cárcere ou facultar
aos agentes recorrerem em liberdade, posto que em
nada foram alterados os motivos ensejadores do
decreto da prisão preventiva. (...)” (fls. 315/316 do
doc. único).

Assim, tenho como inviável a revogação da constrição do


paciente à presença dos requisitos autorizadores do acautelamento,
elencados nos arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal,

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mostrando-se de rigor a manutenção da prisão preventiva como


garantia à ordem pública – o que igualmente indica desarrazoadas as
medidas cautelares diversas da prisão, tais quais comparecimento
periódico em juízo, recolhimento noturno ou mesmo monitoramento
eletrônico, pelo perigo que representa a liberdade do réu.
Portanto, divirjo do Des. Relator para manter a prisão preventiva
do paciente.
É como voto.

DES. DIRCEU WALACE BARONI

Peço vênia ao eminente Des. Relator para divergir de seu voto.


Isso porque, analisando os documentos carreados aos autos,
entendo que a prisão deve ser mantida, ante a presença de seus
pressupostos, requisitos e fundamentos autorizadores, sendo a custódia
cautelar necessária para a garantia da ordem pública e para aplicação da
lei penal, inclusive como forma de desestimular a criminalidade.
Ora, o paciente foi denunciado pela prática, em tese, dos crimes
previstos no artigo 2º, §4º, inciso II, da Lei n.º 12.850/2013, no artigo 312,
caput, c/c art. 13, §2º, “a”, ambos do CP, por dezenas de vezes, no artigo
299 do CP, por dezenas de vezes, e no art. 1º, caput, da Lei n.º 9.613/1998
– já tendo sido proferida sentença condenatória em seu desfavor e
aplicada pena total de 18 anos, 04 meses e 25 dias de reclusão, a ser
cumprida inicialmente em regime fechado, e 74 dias-multa, sem direito de
apelar em liberdade.
Consta que tal indivíduo supostamente integra organização
criminosa e se valeu de seu cargo de vereador, na companhia dos
supostos comparsas, também agentes políticos, para desviar, 41 (quarenta
e uma) vezes, em proveito próprio ou alheio, valores públicos no total de
R$ 476.960,00 (quatrocentos e setenta e seis mil, novecentos e sessenta

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reais). Narra a inicial acusatória que tais desvios foram feitos através do
recebimento indevido de diárias de viagem sem nenhuma vantagem
pública.
Nesse sentido, não se pode olvidar a existência de indícios de
autoria e prova da materialidade, até mesmo considerando que a
investigação foi realizada por meio de interceptação telefônica, a notícia de
que o ora paciente teria, na qualidade de tesoureiro e de Presidente da
Câmara de Vereadores, autorizado o pagamento de diárias de viagem
indevidas, apesar de seu dever legal de impedir resultados danosos, a
revelar a gravidade concreta dos crimes num pequeno município.
Consta, ainda, que Alexandre, que também é pecuarista e
coproprietário de leilão de gado na Comarca, teria inserido, em
documentos públicos, declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita,
com o fim de prejudicar direito ou alterar a verdade sobre fato
juridicamente relevante, além de ter dissimulado e ocultado a origem,
localização, disposição, movimentação e a propriedade de bens
provenientes de infrações penais.
Com efeito, a prisão mostra-se necessária para garantir a ordem e
a opinião pública, sobretudo tendo em vista que o paciente é detentor de
cargo político, em pequena cidade interiorana e, na teoria, deveria zelar
pela idoneidade moral esperada de sua função, já que foi eleito pelo povo,
sendo certo que, como dito, a instrução criminal já se encerrou, mas o
acautelamento servirá como exemplo a desestimular a criminalidade.
É certo, ainda, que a preventiva não foi decretada apenas para
garantir a instrução criminal, tendo a Juíza a quo fundamentado sua
decisão em dados concretos, consubstanciado na gravidade demonstrada
do conjunto habitual de fatos criminosos, evidenciada pelo modus operandi
articulado dos agentes, além do dano de quase meio milhão de reais, do
risco de reiteração delitiva, a fim de desestimular a criminalidade.

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É de se salientar que na sentença a Juíza primeva negou ao


paciente o direito de recorrer em liberdade, aduzindo que em nada foram
alterados os motivos ensejadores da preventiva.
No mais, conforme jurisprudência firmada, qualquer outra
condição de natureza pessoal favorável ao paciente não é suficiente para
autorizar a concessão da liberdade provisória, quando presentes outros
elementos que recomendam a manutenção da custódia cautelar.
Em face do exposto, com a devida vênia ao Des. Relator, DENEGO A
ORDEM impetrada.
Sem custas.
É como voto.

SÚMULA: "ORDEM DENEGADA, VENCIDO O DES.


RELATOR"
Documento assinado eletronicamente, Medida Provisória nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001.
Signatário: Desembargadora MARCIA MARIA MILANEZ, Certificado:
00CA5A634F6EBB60155A0F203E3B02E625, Belo Horizonte, 19 de novembro de 2020 às 14:32:06.
Signatário: Desembargador DIRCEU WALACE BARONI, Certificado:
7DF55079F27D490299217F102C84CEC1, Belo Horizonte, 19 de novembro de 2020 às 14:38:53.
Signatário: Desembargador HENRIQUE ABI ACKEL TORRES, Certificado: 345E2008265355D7, Belo
Horizonte, 19 de novembro de 2020 às 14:47:59.
Julgamento concluído em: 19 de novembro de 2020.
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