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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2020.0000323792

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus Criminal nº


2071476-69.2020.8.26.0000, da Comarca de Mogi-Mirim, em que é paciente LEONARDO
DOS SANTOS MOREIRA e Impetrante HAMILTON TAVARES JUNIOR.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 3ª Câmara de Direito Criminal


do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Denegaram a ordem. V.
U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores RUY ALBERTO LEME


CAVALHEIRO (Presidente sem voto), LUIZ ANTONIO CARDOSO E TOLOZA NETO.

São Paulo, 8 de maio de 2020.

CÉSAR AUGUSTO ANDRADE DE CASTRO


Relator
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Voto nº 14.452

Habeas Corpus nº 2071476-69.2020.8.26.0000


Comarca de Mogi Mirim
Impetrante: Hamilton Tavares Junior
Paciente: Leonardo dos Santos Moreira
Impetrado: MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Judicial da Comarca de Mogi
Mirim

Ementa

“Habeas Corpus” Roubo em concurso de agentes e com emprego


de arma de fogo e tentativa de roubo em concurso de agentes e
com emprego de arma de fogo Decretação da Prisão Preventiva
Descabimento da concessão de liberdade provisória ou
substituição da custódia cautelar por outras medidas Decisão do
MM Juiz que se fundamentou no caso concreto Prisão cautelar
bem justificada para a garantia da ordem pública Eventuais
condições pessoais favoráveis que, por si só, não afastam a
necessidade da custódia cautelar Paciente reincidente Presentes
os requisitos necessários para a segregação cautelar, sua
manutenção é de rigor Ausência de violação à Recomendação nº
62 do CNJ, editada em razão da pandemia de Covid-19 Ausência
de constrangimento ilegal Ordem denegada.

Vistos.

Trata-se de “Habeas Corpus”, com pedido de liminar,


impetrado pelo advogado Hamilton Tavares Junior, em favor de LEONARDO
DOS SANTOS MOREIRA, alegando constrangimento ilegal por parte do MM.
Juiz de Direito da 2ª Vara Judicial da Comarca de Mogi Mirim.

O impetrante alega em síntese que o paciente foi preso


em flagrante pela suposta prática dos crimes previstos no artigo 157, § 2º, inciso II,
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e § 2º-A, inciso I, e no artigo 157, § 2º, inciso II, combinado com o artigo 14, inciso
II, do Código Penal, e que em audiência de custódia o MM Juiz houve por bem em
converter a prisão em preventiva, sem fundamentação idônea.

Sustenta a ausência dos requisitos previstos no artigo


312 do Código de Processo Penal e faz considerações a respeito das condições
pessoais do paciente, que seria primário, de bons antecedentes, com residência fixa
e ocupação lícita.

Argumenta ainda que a medida é desproporcional, pois


em caso de eventual condenação o paciente faria jus à fixação de regime inicial
diverso do fechado.

Por fim, acredita que a pandemia de Covid-19, associada


ao elevado risco de contaminação do paciente, e a superlotação da unidade prisional
em que se encontra preso, levaria à necessária reconsideração da decisão que
determinou a sua prisão cautelar.

Pretende, portanto, a concessão da ordem para que seja


revogada a prisão preventiva ou para que seja imposta medida cautelar diversa da
prisão, nos termos do artigo 319 do Código de Processo Penal, postulando já como
medida liminar o imediato alvará de soltura em favor do paciente.

A medida liminar foi indeferida.

As informações foram prestadas pela autoridade


apontada como coatora.
A douta Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se
pela denegação da ordem.

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Decorrido o prazo para que as partes se manifestassem


acerca de eventual oposição ao julgamento virtual, nos termos do artigo 1º, da
Resolução nº 549/2011, com redação estabelecida pela Resolução nº 772/2017,
ambas do Colendo Órgão Especial deste Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de
São Paulo, não houve oposição a essa forma de julgamento.

É o relatório.

Extrai-se das informações prestadas pela autoridade


apontada como coatora e da consulta ao feito de origem que o paciente foi
denunciado como incurso no artigo 157, § 2º, inciso II e § 2º-A, inciso I (Auto Posto
Oba), e no artigo 157, § 2º, inciso II, combinado com o artigo 14, inciso II (vítima
Alessandro), na forma do artigo 70, todos do Código Penal, porque, agindo em
concurso e com unidade de desígnios com Leonardo de Camargo e Bruno Gabriel
De Moraes Taveira, vulgo “Polenta”, subtraíram, em proveito de todos, mediante
grave ameaça exercida com o emprego de arma de fogo contra o funcionário Luiz
Henrique Zorzetto Tesch, a quantia de R$ 950,00, de propriedade do
estabelecimento comercial "Auto Posto Oba".

Consta ainda que o paciente e os corréus Leonardo de


Camargo e Bruno Gabriel De Moraes Taveira tentaram subtrair, em proveito de
todos, mediante grave ameaça exercida contra a vítima Alessandro Aparecido
Macedo, bens de propriedade do ofendido, somente não consumando o delito por
circunstâncias alheias à vontade dos agentes.
A denúncia foi recebida em 27 de março de 2020 e os
autos encontram-se aguardando a citação do paciente.

Portanto, a meu ver inexiste constrangimento ilegal a ser


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sanado por esta via.

A custódia cautelar foi devidamente fundamentada pelo


Juízo, que entendeu presentes a prova da materialidade e indícios da autoria, de
sorte que não há qualquer irregularidade formal.

Outrossim, os crimes pelos quais o paciente está sendo


processado, em concurso, são puníveis com penas privativas de liberdade máximas
superiores a 04 anos, o que está de acordo com o previsto no artigo 313, inciso I, do
Código de Processo Penal.

De outra parte, vale ressaltar que, preservado o princípio


constitucional da não culpabilidade, a conduta em tese praticada é permeada por
singular gravidade, e ainda sem contar que se trata de acusação que demanda
reconhecimento pessoal em audiência, com mais razão impõe-se a custódia para a
garantia da instrução criminal.

Consigno ainda que condições pessoais favoráveis, como


eventual primariedade, bons antecedentes, residência fixa e ocupação lícita, não
desautorizam a prisão cautelar; esta decorre da infração em análise, não da condição
pretérita do agente.

"As condições pessoais favoráveis, tais como primariedade,


ocupação lícita e residência fixa, entre outras, não têm o condão de, por si sós, garantirem ao
recorrente a revogação da prisão preventiva, se há nos autos elementos hábeis a recomendar
a manutenção de sua custódia cautelar, como é o caso da presente hipótese". (STJ, RHC
66359/RJ, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, DJe 01.04.2016).

Os objetivos da custódia não são afastados por tais


predicados, atendendo a segregação ao imperativo de garantia da ordem pública, em
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cujo conceito não se visa apenas a prevenir a reprodução de fatos criminosos, mas
acautelar o meio social e a própria credibilidade da Justiça.

Aliás, a garantia da ordem pública deve ter por norte a


gravidade da infração e sua repercussão social.

Outrossim, parece inapropriado eventual prognóstico


acerca da pena a ser imposta ao paciente ou mesmo de alguma benesse, com a
suposta demonstração da desproporcionalidade de sua custódia cautelar. A
concessão da ordem com supedâneo neste fundamento representaria antecipação do
julgamento da causa e, por consequência, supressão de instância.

PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS


CORPUS. ROUBO. PRISÃO PREVENTIVA. ALEGADA
AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DO DECRETO PRISIONAL
BEM COMO DOS REQUISITOS ENSEJADORES DA PRISÃO
PREVENTIVA. SEGREGAÇÃO CAUTELAR DEVIDAMENTE
FUNDAMENTADA NA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA.
PERICULOSIDADE CONCRETA. MODUS OPERANDI.
INVIABILIDADE DE ANÁLISE DE POSSÍVEL PENA A SER
APLICADA. CONDIÇÕES FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA.
RECURSO ORDINÁRIO DESPROVIDO. I - A segregação
cautelar deve ser considerada exceção, já que tal medida
constritiva só se justifica caso demonstrada sua real
indispensabilidade para assegurar a ordem pública, a instrução
criminal ou a aplicação da lei penal, ex vi do artigo 312 do
Código de Processo Penal. II - No caso, o decreto prisional
encontra-se devidamente fundamentado em dados extraídos dos
autos, que evidenciam que a liberdade do ora recorrente
acarretaria risco à ordem pública, notadamente se considerada
sua periculosidade concreta evidenciada pelo modus operandi
pelo qual o delito foi, em tese, praticado, eis que foi um crime de
roubo "praticado mediante emprego de uma faca, contra
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pluralidade de vítimas", o que justifica a necessidade da medida


extrema. III - Revela-se inviável a análise de eventual pena ou
regime a serem aplicados em caso de condenação, a fim de
determinar possível desproporcionalidade da prisão cautelar, uma
vez que tal exame deve ficar reservado ao Juízo de origem, que
realizará cognição exauriente dos fatos e provas apresentados no
caso concreto. IV - Condições pessoais favoráveis, tais como
primariedade, ocupação lícita e residência fixa, não têm o condão
de, por si sós, garantirem ao recorrente a revogação da prisão
preventiva se há nos autos elementos hábeis a recomendar a
manutenção de sua custódia cautelar. Pela mesma razão, não há
que se falar em possibilidade de aplicação de medidas cautelares
diversas da prisão, o que ocorre na hipótese. Recurso ordinário
desprovido. (STJ, RHC 113351 / MG, Rel. Ministro Leopoldo de
Arruda Raposo, Quinta Turma, DJe 08/10/2019).

Destarte, é de rigor que o Magistrado analise a


viabilidade da concessão da liberdade provisória ao paciente, ou ainda a substituição
da sua prisão preventiva por outras medidas cautelares, não existindo qualquer
ilegalidade na decisão que considera tais providências insuficientes à manutenção da
ordem pública.

Por outro lado, em relação à pandemia de Covid-19, tal


situação não afasta a gravidade concreta da conduta do paciente, tampouco a sua
notável periculosidade, sendo de rigor privilegiar-se a garantia da ordem pública.

Além disso, à luz da Recomendação nº 62/2020 do


Conselho Nacional de Justiça, em seu artigo 4º, inciso I, o paciente não se enquadra
às hipóteses de reavaliação da prisão provisória, posto que não está em quaisquer
dos grupos de risco indicados pela Organização Mundial de Saúde, tampouco
apresenta comorbidades que o tornem especialmente suscetível à doença em
questão.
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Não fosse o bastante, a Portaria Interministerial nº 07 de


18 de março de 2020 adota providências suficientes à contenção da pandemia no
sistema prisional, a tornar despicienda, ao menos nesse momento, a soltura do
paciente.

Portanto, ao menos, por ora, não há ilegalidade, abuso ou


constrangimento ilegal que sejam manifestos e, por conseguinte, aptos a ensejar a
concessão da ordem.

ASSIM, PELO MEU VOTO, DENEGO A ORDEM


DE “HABEAS CORPUS”.

Andrade de Castro
Relator

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