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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO

CENTRO DE TEOLOGIA E CIÊNCIAS HUMANAS

HELDER COELHO BARRETO


JOSÉ DE SÁ ARAÚJO NETO
RAFAEL GUSTAVO

CULTURA E FORMAÇÃO DA PERSONALIDADE

RECIFE
2019
HELDER COELHO BARRETO,
JOSÉ DE SÁ ARAÚJO NETO
RAFAEL GUSTAVO

CULTURA E FORMAÇÃO DA PERSONALIDADE

Trabalho desenvolvido por alunos do 2º


período de Licenciatura Plena em Filosofia
da Universidade Católica de Pernambuco,
com o propósito de apontar fatores
determinantes da cultura, para a formação
da personalidade dos indivíduos.

RECIFE – 2019
SUMÁRIO

1 METODOLOGIA.............................................................................................03

2 INTRODUÇÃO................................................................................................03

3 A CULTURA E A FORMAÇÃO DA PERSONALIDADE.................................04

4 HEREDITARIEDADE E CULTURA................................................................05

5 TEORIAS........................................................................................................07

6 TEORIA PSICANALÍSTICA DE SIGMUND FREUD.......................................08

7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...............................................................14
3

1 METODOLOGIA

O recurso metodológico adotado no presente trabalho consiste na síntese de


uma pesquisa realizada em torno do posicionamento de autores conceituados no
tema abordado. Cada ponto de reflexão acerca da influência da cultura na formação
da personalidade será analisado com base em critérios de fundamentação teórica da
psicologia, no intuito de evitar uma perspectiva baseada nas opiniões dos alunos
realizadores dessa proposta.

Serão avaliadas questões direcionadas ao conceito de personalidade


fornecido pela psicologia, a forma pela qual os fatores genéticos e ambientais
influenciam na formação da personalidade. Também será objeto de exposição o
conceito de cultura e como esta é desenvolvida pelo homem e se torna influência
para o comportamento humano, atravessando gerações. Por fim, faremos um
cruzamento dessas informações com o propósito de facilitar a compreensão da
relação entre a subjetividade do indivíduo e os fatores culturais, enfocando os
principais conceitos freudianos.

2 INTRODUÇÃO

Entende-se por cultura todo o resultado da interferência humana no meio


natural, o qual é transmitido de geração em geração. Essa herança social é
composta por costumes, tradições, leis, linguagem, valores éticos, morais, religiosos,
dentre outros princípios que regem e padronizam o comportamento de uma
determinada sociedade na qual o homem está inserido.

Tais elementos são apresentados aos indivíduos desde o início de suas


relações familiares e sociais, tornando-se as características da realidade que o cerca
e suas principais referências comportamentais. É por meio da interação social
atrelada à subjetividade que cada pessoa irá adquirindo traços de formação da sua
personalidade.

É certo que o princípio da individualidade é o que vai distinguir um ser


humano do outro, evidenciando as peculiaridades e os aspectos particulares de
cada um. Porém, o meio físico e social, irá exercer influencia direta, durante todo o
4

processo do desenvolvimento de sua psyqué, somando-se aos aspectos próprios do


indivíduo e formulando um todo, o qual a psicologia chama de personalidade.

3 A CULTURA E SUA INFLUÊNCIA NA FORMAÇÂO DA PERNSONALIDADE

Sabe-se que cada indivíduo possui uma configuração específica de sua


personalidade. Esta é desenvolvida de acordo com fatores genéticos, pois cada um
irá possuir sua estrutura biológica particular, além dos fatores ambientais, os quais
são resultado da produção material e intelectual humana. Toda experiência que o
indivíduo irá vivenciar será dada no contexto sociocultural, e é por meio desta
relação que continuamente cada um irá modificando e transformando seu modo de
pensar e agir diante do mundo externo.

O processo dinâmico de formação da personalidade é culturalmente


determinado ou reprimido, já que o modelo de comportamento instituído na
sociedade, irá interferir diretamente nas trajetórias dos indivíduos. Sua necessidade
de reconhecimento, seus objetivos pessoais e profissionais, seus anseios e
frustrações materiais, tal como sua inserção em determinados grupos serão dados
na forma com que esse indivíduo interage com o meio e as manifestações da vida
cotidiana.

Para Lev Vygotsky (1896-1934), o aprendizado e o desenvolvimento humano


são dados por meio das interações sociais e condição de vida de cada indivíduo.
Portanto, na sua teoria, o homem é o resultado de sua relação com outros
indivíduos, assim como das suas vivências. Vygotsky sofre total influência da
concepção marxista do homem, a qual defende que a principal característica da
espécie humana é a sua capacidade de interferência e transformação do meio
natural através do trabalho. Seria por meio da atividade produtiva que o homem iria
se relacionar com outros indivíduos e transformar a natureza dada em natureza
humanizada. Essas transformações realizadas pelo homem na natureza, formariam
exatamente a sua cultura.

Dentro de tal perspectiva, o homem, ao produzir novos instrumentos de


representação do seu pensamento e de suas necessidades, também desenvolve, no
seio da sociedade, características de um modelo de vida que, por ser criado em
ambiente de trabalho coletivo e interação social, acaba por ganhar adesão de uma
grande quantidade de pessoas e constituir um padrão cultural. Sendo assim, o
homem é artífice de uma cultura em constante transformação e resultado dela, pois
adapta-se constantemente a tais modificações do processo de construção cultural.

É no contexto sócio-histórico em que se encontra e por meio deste, que o


indivíduo irá formar a sua identidade. A vida em sociedade determina regras de
convivência, institui limites para o comportamento e impõe suas exigências. A
5

necessidade de adequação ao padrão comportamental dessa sociedade, exige que


os indivíduos que a compõem não possuam total liberdade de ação, e suas práticas
passem a ser determinadas não somente pela sua vontade, mas de acordo com o
que é possível dentro dos critérios éticos e valores morais vigentes.

Suas pressões internas não são inatas, mas sim, ressonâncias das
exigências da sociedade. O modelo político-econômico, por exemplo, pode ser fator
determinante no comportamento de uma sociedade. O consumo que gera status, a
competição que determina os vencedores, a exigência de ascensão social e o
reconhecimento diante dos demais, são exemplos de fatores determinados por um
sistema de governo e sua proposta econômica. No momento em que um modelo de
vida é colocado como padrão, instantaneamente, os indivíduos tendem a necessitar
preencher os requisitos exigidos para se tornar parte daquele conjunto social,
direcionando seus interesses para determinadas coisas, evidenciando os fatores
externos como responsáveis de suas principais escolhas.

4 HEREDITARIEDADE E CULTURA

4.1 Hereditariedade

O psicólogo John B. Watson, em 1925, acreditava que qualquer criança


poderia ser transformada por meio do conhecimento. Ao abordarmos Cultura e
Hereditariedade, é profícuo afirmarmos que se tudo dependesse da hereditariedade,
convergiríamos para uma suposição aristocrata 1. Desde logo, dizer que tudo é
hereditariedade como supõe os aristocratas, também é errado 2. A devida
interpretação é realizada por meio dos psicólogos com inúmeras pesquisas de bases
científicas. Hereditariedade e ambiente se dão na interseção, ou seja, em uma
interação para formar a personalidade do indivíduo. Com efeito, “Sem uma boa
hereditariedade, nenhum ambiente, por melhor que seja, pode desenvolver um
indivíduo medíocre, além de um determinado ponto” 3.

É perfeitamente compreensível que hereditariedade e ambiente são uma


conjuntura de assaz importância. Estes desenvolvem limites para o desenvolvimento
da capacidade humana nos dois tipos de ambientes, seja ele fisiológico ou sensorial.

Por ambiente fisiológico, entende-se o que vai do início da gravidez, este,


assim chamado de ambiente sensorial uniforme. Temperatura, nuanças de
iluminação e som. Por outro lado, seu ambiente fisiológico – no qual está criança,
ligada por laços sanguíneos – recebe nutrientes e hormônios do sangue da mãe.

1
Cf. CLIFFORD, 1915
2
MORGAN, Clifford Thomas, 1915 – Introdução à Psicologia, trad. Aurisphebo B. Simões, São Paulo, 1977.
3
Loc. Cit.
6

Caso a fonte de alimentação apresente alguma anomalia, alterações nos estados de


“normalidade”, aqui no sentido fisiológico, podem vir a ocorrer 4.

O ambiente fisiológico, pode apresentar anomalias de diversas maneiras.


Segundo Clifford, uma delas seria a nutrição: o corpo, mas principalmente o cérebro,
necessita de nutrientes adequados para que seu pleno desenvolvimento. O feto, por
falta de nutrientes, semelhante à sua genitora, com falta de proteínas podem,
ulteriormente, retardar o crescimento do cérebro e limitar sua capacidade mental.
“Sabemos disso a partir de experimentos com animais que as mães são mantidas
com regimes alimentares deficientes e em que seus filhos são examinados depois
em algumas capacidades”5.

O nascimento é apenas o início de todo processo. Os três primeiros anos,


sobretudo, é de extrema importância para o crescimento e desenvolvimento de uma
criança. O Córtex cerebral6 é decisivo para sua capacidade mental final.

4.2 Cultura

A influência dos pais tange o indivíduo desde a mais tenra infância e até
mesmo durante e depois da puberdade. Muitas de suas atitudes são moldadas pela
influência dos pais. Os estudos são comparados em relação às atitudes das crianças
mediadas ou tolhidas por seus pais. Pode-se afirmar que há uma correlação entre
ambos, especialmente nas atitudes políticas ou religiosas. Muito embora, algumas
escolhas se mobilizem em outros aspectos, como, por exemplo, um indivíduo sendo
filho de uma mãe cristã e pai comunista, pode enveredar-se por suas convicções e
influências do meio social correspondente, tornando-se panteísta e apolítico.
Contudo, há mais similaridade do que dissimilaridade entre as atitudes dos filhos em
relação aos pais7.

4
Ibídem, p. 29
5
Loc. Cit. p.29
6
Os estudos de Marian Diamond quebraram o paradigma de que o cérebro era uma estrutura estática
que não mudava. BBC NEWS. 27 de Abril de 2019.
7
Loc. Cit. p.29
Os estudos de Marian Diamond quebraram o paradigma de que o cérebro era uma estrutura estática que
não mudava. BBC NEWS. 27 de Abril de 2019.
Ibidem, Cap. 3. Influência dos Pais.
7

Não obstante, à medida que os filhos avançam em idade, outras influencias


sociais constroem uma parcela de seus novos valores. A isto se deu o nome de
período crítico8. Nesta fase, pode-se dizer que as atitudes se cristalizam. Atuam
sobre ele três fatores principais: influência dos pares, informações provenientes dos
veículos noticiosos, outras fontes e a educação.

5 TEORIAS

A maioria dos estudiosos concorda em afirmar que a personalidade pode ser


entendida como “o conjunto de comportamentos peculiares do indivíduo” 9. A
individualidade da pessoa humana, as suas particularidades mais identitárias, o seu
caráter, o temperamento predominantemente presente nas suas relações
interpessoais e a inteligência que apresenta nas diversas atividades cotidianas são a
“marca registrada” de sua presença no ambiente vital e nas reações diante das mais
diversificadas circunstâncias.

Apesar da existência de tantas teorias da personalidade, basicamente a


totalidade delas busca ordenar um conjunto de conhecimentos acerca do
comportamento humano, considerado complexo por sua multifatorialidade. Ademais,
diversos são os aspectos comportamentais que podem ser abordados e os métodos
de investigação que conduzirão o pesquisador a resultados, não raras vezes,
inesperados.

“Os psicólogos estudam a personalidade de maneiras diferentes: o


método utilizado depende do aspecto da personalidade que está
sendo investigado. Alguns psicólogos estão interessados somente no
comportamento manifesto – o que fazemos e dizemos em resposta a
determinados estímulos – e outros se preocupam com sentimentos e
experiências conscientes, de acordo com o que é medido pelos
testes e questionários [...] outros investigadores tentam entender as
forças inconscientes que nos motivam. Um método útil para examinar
um aspecto da personalidade pode ser inadequado para outro
aspecto”.10

8
SERARS, 1969 apud CLIFFORD.
9
BRAGHIROLLI et al. Psicologia Geral. 21ª ed. Porto Alegre: Editora Vozes, 1990, p. 175.
10
SCHUTZ, Duarte P.; SCHUTZ, Sydney Ellen. Teorias da Personalidade. 3ª ed. São Paulo: CENGAGE Learning,
2015, p. 23.
8

No que se segue, deteremo-nos a expor brevemente os trabalhos de


Sigmund Freud, enfatizando a relação entre o desenvolvimento da personalidade do
indivíduo e o seu desenvolvimento psicossexual.

6 TEORIA PSICANALÍSTICA DE SIGMUND FREUD

Nascendo em 1856 e, acometido de um câncer na mandíbula, vindo a falecer


em 1939, Sigmund Freud formou-se neurologista em Viena e, posteriormente,
desenvolveu estudos com o psiquiatra francês Jean Charcot (1825 – 1893). Naquela
época, grande era o número de casos de histeria, predominantemente em mulheres,
o que levou Charcot a utilizar a hipnose para analisar os sintomas das histéricas. Ele
observou que, durante a hipnose, os sintomas eram suprimidos, assim, o jovem
doutor Freud pôde concluir que a histeria não era proveniente de lesões
neurológicas nos pacientes, como se acreditava no ambiente acadêmico tradicional.

A partir desses estudos, Freud focalizou os aspectos anormais da


personalidade e, usando como método o estudo de caso, elaborou uma consistente
teoria para explicar a personalidade normal e anormal. É também conhecida a sua
relação com as pesquisas de Josef Breuer (1842 – 1925), o qual tratava os seus
pacientes permitindo-lhes que falassem livremente sobre si mesmos, constituindo
um método catártico. Freud entendeu que, por meio da livre associação das ideias
de um paciente que fosse estimulado a falar o que lhe viesse à mente, o
inconsciente se manifestava, por exemplo, em chistes, lapsos, atos falhos e nas
narrativas dos sonhos.

Todas essas pesquisas levaram o pai da psicanálise a mudar o centro da


problemática psicológica do consciente para o inconsciente. Com isso, o terapeuta
assumia uma posição passiva, pois apenas ouvia e estimulava com perguntas
quando o paciente se calava. Contudo, jamais poderia interrompê-lo durante a sua
fala. O ambiente propício para essa “catarse” deveria ser caracterizado pelo silêncio,
onde o paciente pudesse sentir-se bastante relaxado para livremente falar sem que
se preocupasse com o ordenamento de ideias e os juízos alheios, além de estar
confortavelmente deitado em uma espécie de sofá, o divã.
9

A existência do inconsciente constitui um dos pilares básicos


da teoria e prática psicanalíticas, esta foi uma descoberta original.
Antes do nascimento da psicanálise, acreditava-se na completa
equivalência entre o psiquismo e a consciência, o único objeto da
psicologia era o consciente11.

6.1 Os níveis de consciência e os sistemas constituintes da personalidade

O que pode estar por trás de todo o seu brilhante trabalho é a certeza de que
nada é por acaso, e muito menos na vida mental, pois cada processo psíquico é
provocado consciente ou inconscientemente. Freud dividiu os conteúdos mentais em
três níveis (consciente, inconsciente e pré-consciente) e a personalidade em três
sistemas (Id, Ego e Superego).

O consciente, que era até então o objeto central da psicologia, segundo os


estudos psicanalíticos, é uma pequena porção do aparelho psíquico humano, e
consiste em tudo aquilo que conhecemos, predominantemente, um conteúdo mental
proveniente de um acontecimento captado pelos sentidos e interpretado pelas
percepções. O inconsciente é um nível da consciência caracterizado por ser o
“lugar” das pulsões, das representações reprimidas, experiências e vivências que
não são esquecidas, mas recalcadas, ou seja, reprimidas ao nível do não-
consciente. Os principais determinantes da personalidade estão no inconsciente,
guardados sob a sobra do “recalque”, mecanismo de repressão da libido e das
vivências ou impulsos considerados agressivos à pessoa ou à sua socialização 12. O
pré-consciente é uma região limítrofe entre o consciente e o inconsciente, ou seja,
“porções da memória que são acessíveis fazem parte do pré-consciente [...] É como
uma vasta área de posse das lembranças de que a consciência precisa para
desempenhar suas funções”13. Em outras palavras, o pré-consciente é o nível da
consciência em que estão as representações que podem chegar a ter acesso ao
consciente se não tiverem sido recalcadas e forem do interesse do indivíduo.

O Id é a região original da psyqué, a instância em que o Ego e o Superego se


diferenciam. O seu conteúdo é o conjunto das representações psíquicas das
pulsões, ou seja, o reservatório da libido que, por sua vez, é todo inconsciente.
11
BRAGHIROLLI et al., 1990, p. 179.
12
“Certas inadequações de nosso funcionamento psíquico e certas ações que são aparentemente involuntárias
demonstram ser bem motivadas quando submetidas à investigação psicanalítica” (Freud, 1901 apud FADIMAN,
James; FRAGER, Robert. Teorias da personalidade. São Paulo: HARBRA, 2002, p. 27).
13
FADIMAN e FRAGER, 2002, p. 28.
10

Naturalmente, segundo Freud, o Id não conhece valores morais e nem tolera a


tensão14. O Ego é a sede de quase todas as operações psíquicas e, diferentemente
do Id, é capaz de diferenciar a realidade subjetiva mental da realidade externa, além
de ser o responsável por controlar as pulsões de acordo com o peso cultural e as
condições ambientais. Vejamos o que o próprio Freud nos diz acerca dessa relação
entre o Id e o Ego:

São estas as principais características do ego: em consequência da


conexão preestabelecida entre a percepção sensorial e a ação
muscular, o ego tem sob seu comando o movimento voluntário. Ele
tem a tarefa de autopreservação. Com referência aos
acontecimentos externos desempenha essa missão dando-se conta
dos estímulos externos, armazenando experiências sobre eles (na
memória), evitando estímulos excessivamente internos (mediante a
fuga), lidando com estímulos moderados (através da adaptação) e,
finalmente, aprendendo a produzir modificações convenientes no
mundo externo, em seu próprio benefício (através da atividade). Com
referência aos acontecimentos internos, com relação ao id, ele
desempenha essa missão obtendo controle sobre as exigências dos
instintos, decidindo se elas devem ou não ser satisfeitas, adiando
essa satisfação para ocasiões e circunstâncias favoráveis no mundo
externo ou suprimindo inteiramente as suas excitações. É dirigido,
em sua atividade, pela consideração das tensões produzidas pelos
estímulos; despejam estas tensões nele presentes ou são nele
introduzidas. A elevação dessas tensões é, em geral, sentida como
desprazer e o seu abaixamento como prazer.... O ego se esforça
pelo prazer e busca evitar o desprazer.15

Com relação ao Superego, ele é o último dos sistemas a ser desenvolvido,


sendo considerado uma porção bastante diferenciada do Ego. Pode ser entendido
como o conjunto internalizado dos valores e ideias culturalmente transmitidos e
reforçados pela dinâmica entre a recompensa e a punição que, desde cedo, os pais
estabelecem na relação com os seus filhos. Por isso mesmo, afirma Freud que o
Superego dos filhos é moldado não conforme o modelo querido pelos pais, mas
segundo o Superego deles. Ou seja, os conteúdos que formam tanto o do filho
quanto o dos pais são bastante semelhantes, sendo o Superego, dessa forma, um
veículo da perpetuação da tradição através das gerações.

14
“Quando ocorre uma estimulação externa ou uma excitação interna, o nível de tensão do organismo se eleva
e o id funciona de tal maneira visando a descarregar imediatamente essa tensão, pois não tolera energias
muito intensas. Procura fazer com que o organismo retorne e permaneça num nível de conforto e baixa tensão.
Esse princípio de redução da tensão é denominado princípio do prazer” (CARRARA, Kester et al. Introdução à
psicologia da educação: seis abordagens. 1ª ed. São Paulo: Avercamp, 2004, p.18).
15
FREUD, 1940 apud FADIMAN e FRAGER, 2002, p. 31).
11

É o censor das funções do ego e decide se algo é certo ou errado, de


modo a garantir que uma pessoa aja em harmonia com os padrões
sociais vigentes. E o árbitro moral internalizado [...] representa mais o
ideal do que o real, tende mais à perfeição do que ao prazer e,
podemos dizer, é o componente social da personalidade. Dessa
forma, bloqueia os impulsos do id, principalmente os de natureza
sexual e agressiva, pois são os impulsos mais condenados pela
sociedade quando exteriorizados16.

6.2 Desenvolvimento Psicossexual

Freud elaborou uma teoria que, da forma como entende os processos


psíquicos correlacionados tanto ao desenvolvimento biológico da criança quanto aos
fortes influxos da cultura, pode ser considerada como desenvolvimentista. A
formação da personalidade está intimamente relacionada ao desenvolvimento dos
impulsos sexuais, da possibilidade de controle sobre eles e da forte pressão cultural,
inicialmente exercida pelos pais, os quais introduzem as crianças nos moldes
vigentes da sociedade em que estão situados. Ele defendia a existência de impulsos
ou pulsões parciais presentes desde a infância. Essas pulsões ditas parciais foram
compreendidas como um aspecto perverso da sexualidade infantil, em outras
palavras, consistiam em “desvios do impulso sexual em relação ao seu objeto e ao
seu fim”17.

Assim, no ensaio sobre a sexualidade infantil, Freud traçou uma linha


desde a turbulência da primeira infância até a turbulência da
adolescência, passando pelos anos relativamente calmos da latência
[...] Ninguém antes dele [...] havia reconhecido claramente a
ubiquidade de “uma pulsão sexual na infância” [...] atribuía essa falta
de reconhecimento quase universal da atividade sexual infantil ao
pudor e ao decoro, mas não só a eles. O período de latência desde
os cinco anos até à puberdade, essa fase de desenvolvimento em
que as crianças fazem enormes progressos intelectuais e morais,
empurra a expressão de suas sensações sexuais para um segundo
plano. E mais, uma invencível amnésia envolve os primeiros anos da
infância como um denso véu; a visão corrente de que a vida sexual
se inicia na puberdade fora confirmada pelo próprio testemunho dos
amnésicos em causa própria [...] O que esse esquecimento
estranhamente eficaz apaga, afirmou ele, é a experiência erótica da
criança, juntamente com o resto de sua jovem vida agitada18.

Na fase oral (0 – 2 anos), a necessidade e a gratificação estão concentradas


predominantemente em volta dos lábios, da língua e, posteriormente, também nos

16
CARRARA et al., op.cit., p. 19.
17
Ibid., p. 27.
18
GAY, Peter. Freud: uma vida para o nosso tempo. 2ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2012, pp. 160.161.
12

dentes devido à mastigação. A fome e a sede provocam no organismo do bebê um


aumento de tensão, o que lhe causa desprazer. Dessa forma, a sua pulsão básica
terá como fim a redução dessa tensão, causando-lhe prazer. Entretanto, é mister
enfatizar que a criança, enquanto é alimentada, é também acariciada e todo o seu
corpo é estimulado no contato com o corpo da mãe. Isso faz com que ela associe a
redução do nível de tesão (princípio do prazer) ao processo da amamentação.
Nessa fase, a boca (e sua extensão) é a primeira área do corpo que a criança pode
controlar, sendo a zona erógena que mais concentra energia libidinal. Conforme a
criança cresce e se desenvolve, outras áreas corporais começam a receber um
relevante nível de energia sexual, tornando-se importantes regiões de gratificação,
mas uma porção da libido é preservada na região oral.

Ao longo do crescimento da criança, novas áreas de tensão são tornadas


conscientes. Entre os dois e quatro anos, a criança começa a ter o controle sobre os
esfíncteres anais e a bexiga, e esse controle é uma nova forma de poder e fonte de
prazer que ela começa a tomar consciência na medida em que, por exemplo, os pais
começam a elogiá-la por causa das primeiras demonstrações de domínio sobre o
próprio corpo. Essa é a fase anal, justamente, caracterizada pelas primeiras
expressões de poder que a criança manifesta aos pais, e um exemplo disso pode
ser identificado quando elas ficam observado as suas próprias fezes, ou mesmo
“presenteiam” os seus pais com elas. Quanto às sensações, o “prazer ou desprazer
está associado à expulsão (defecação) ou à retenção das fezes”, pois “Ao conseguir
controlar seus esfíncteres, a criança tem a sensação de poder controlar também
seus impulsos”19.

Na fase fálica (4 – 5/6 anos), pela primeira vez, as crianças se dão conta das
diferenças sexuais, entretanto, o seu interesse se volta, inicialmente, para a
presença ou ausência do pênis. Os meninos, ao tomarem consciência de que
possuem “algo” que as meninas não têm, começam a ter curiosidade acerca do
corpo dos seus colegas; enquanto que as meninas, ao descobrirem que lhes falta o
que os meninos possuem, passam a desejá-lo, isto é, a desejar o que estes portam
de diferencial. Freud identificou nessa fase o complexo de édipo, que não cabe a
esse trabalho descrever, mas do qual pode ser brevemente dito:

19
CARRARA et al., op. cit., p.28.
13

Trata-se de uma relação de amor que tem como objeto o progenitor


do sexo oposto - mãe, no caso do menino; pai, no caso da menina -
e impulsos de rivalidade e ciúme do progenitor do mesmo sexo. O
nome complexo de Édipo origina-se na tragédia grega Édipo - rei,
escrita por Sófocles [...] O amor infantil dirigido ao progenitor do sexo
oposto carrega também impulsos de ciúme e rivalidade dirigidos ao
progenitor do mesmo sexo, representando a situação edipiana. Essa
situação suscita sentimentos ambivalentes, ou seja, sentimentos de
amor e ódio. Simultaneamente, a criança teme ser punida por seus
desejos proibidos, o que gera nela sentimento de culpa. Enfim,
vencida pelo sentimento de culpa e medo diante de um rival superior
e poderoso (pai e mãe), a criança aceita renunciar ao seu objeto de
amor. Transforma a rivalidade em identificação, isto é, em desejo de
ser como o pai ou a mãe, antigos rivais. Mãe e pai transformam-se,
dessa forma, em modelos constitutivos: a mãe para a filha, o pai para
o filho. Essa situação edipiana constitui um ensaio geral dos amores
futuros da criança.

Por ser a fase fálica muito intensa (sentimentos edipianos e o


desenvolvimento do Superego), a criança, após ela, entra em um período mais
calmo, correspondente ao período que antecede a adolescência e que é basilar para
a aquisição de papeis socialmente aceitos. Nesse período da vida, surgem atitudes
decorrentes da maior organização do Superego, por exemplo, a vergonha, a repulsa
e o temor, além de o indivíduo se voltar para o desenvolvimento de suas habilidades
intelectuais. O contato com outras pessoas faz com que a criança exercite a
tolerância e a flexibilidade. Com isso, pode-se dizer que “Essa fase é a mera
consequência lógica da situação edipiana vivida anteriormente como
desenvolvimento dos papéis sexuais e resultante da identificação da criança com o
pai ou com a mãe e da acentuação do seu papel sexual” 20.

A estrutura básica da personalidade é formada ao fim da fase fálica. A


adolescência é o período da reativação das pulsões acalmadas no período de
latência. É, dessa forma, que na adolescência tem início a fase genital. As fases
anteriores eram caracterizadas pelo narcisismo, isto é, o indivíduo tem gratificação
ao estimular e manipular o próprio corpo, contudo, na fase genital esse centramento
na satisfação dos próprios impulsos é canalizado para relações de maior alteridade.
Os meninos e as meninas geralmente alcançam essa nova fase com consciência de
suas identidades sexuais distintas, passando a buscar novas formas de satisfação
das pulsões recorrendo ao tecido das relações interpessoais. Nessa fase, os
adolescentes revivem o período edipiano: quando se apaixonam por pessoas do
20
Ibid., p. 34.
14

sexo oposto, geralmente o objeto de sua paixão é alguém bastante semelhante ao


seu progenitor oposto.

Por conseguinte, no que diz respeito ao desenvolvimento da personalidade,


Freud identifica quatro fontes principais de tensão, isto é, de estimulação e agitação
do organismo: o crescimento fisiológico, as frustrações, os conflitos e os perigos. “O
indivíduo é obrigado a desenvolver formas de reduzir tensões que emanam dessas
fontes, o que o leva ao crescimento, à evolução” 21. Todo esse processo acima
descrito, a passagem de uma fase psicossexual para outra, é de integração, e não
de desaparecimento da anterior.

7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRAGHIROLLI, Maria. BISI, Paulo; RIZZON, Luiz; NICOLLETO, Ugo. Psicologia


Geral. Editora Vozes. São Paulo, 2003.

CARRARA, Kester et al. Introdução à psicologia da educação: seis abordagens.


1ª ed. São Paulo: Avercamp, 2004.

FADIMAN, James; FRAGER, Robert. Teorias da personalidade. São Paulo:


HARBRA, 2002.

GAY, Peter. Freud: uma vida para o nosso tempo. 2ª ed. São Paulo: Companhia das
Letras, 2012.

OLIVEIRA, Marta. Vygotsky, Aprendizado e desenvolvimento – Um Processo Sócio-


histórico; Editora Scipione. São Paulo, 1993.

SCHUTZ, Duarte P.; SCHUTZ, Sydney Ellen. Teorias da Personalidade. 3ª ed. São
Paulo: CENGAGE Learning, 2015.

21
Ibid., p. 35.

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