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Tema 14:

Direito Civil. Dano material e moral. Contrato de revenda com comodato de


equipamentos.

1ª QUESTÃO:
Trata-se de demanda ajuizada por Francisco Ivar em face de Consuelo Alimentos Ltda.
O autor alega que, em março de 2018, celebrou contrato por tempo indeterminado para a
revenda de produtos da ré, tendo ficado acordado que, além dos produtos (iogurtes),
seriam dados dois freezers em comodato.
Narra o autor que os equipamentos foram entregues em precário estado, na medida
em que apresentavam avarias nas laterais e ostentavam um mau funcionamento. Além
disso, ressalta que não foram fornecidos todos os produtos combinados, uma vez que
procedeu ao pagamento de vinte e duas caixas do produto Bgut, sendo que seis caixas que
sairiam como brinde jamais chegaram a seu estabelecimento.
O autor sustenta que o inadequada funcionamento do freezer inviabiliza o seu
trabalho, porque observar a temperatura correta é imprescindível para o adequado
armazenamento e para a comercialização do produto.
Sendo assim, o autor afirma que vem acumulando dívida de aluguel por culpa da ré, a
qual tem sido a principal responsável pelo insucesso de seu negócio. Por isso, por
telefone, o autor tentou resolver solucionar o problema, mas a ré não realizou a troca dos
produtos nem o reparo do freezers. Em abril de 2019, a ré notificou o autor sobre a
vontade de pôr fim ao contrato, o que foi realizado.
Por esses motivos, Francisco Ivar pede que a ré seja condenada ao pagamento de
R$ 15.000,00, a título de reparação por dano moral, de R$ 8.000,00, referente ao valor de
um ano de aluguel, e de R$ 10.000,00, a título de lucro cessante. Pede também a
condenação em honorários e custas processuais.
Em contestação, preliminarmente, a ré suscita a ilegitmidade ativa, haja vista que
o contrato não foi celebrado com o autor, mas com a empresa individual, a qual ostenta
CNPJ próprio.
No mérito, a ré afirma que os freezers fornecidos em comodato realmente não são
novos, mas de nenhuma forma apresentam mau funcionamento, e, ademais, passam todos
por minuciosa revisão, pois, obviamente, a ineficiência na revenda prejudicaria os lucros
de todas as partes. Por conseguinte, é certo que qualquer equipamento danificado é
substituído o mais rápido possível.
Afirma a ré ser falsa a alegação do autor de que teria entrado em contato para
informar os supostos defeitos, motivo pelo qual não há nos autos provas quanto às
tentativas de contato e tampouco há qualquer prova quanto à existência de lucro cessante.
Da mesma maneira, é falsa a afirmação de que as mercadorias não foram entregues.
Assim, a ré afirma que o que se vê no caso é uma tentativa de repassar a outrem os
problemas com os insucessos comerciais.
Consuelo Alimentos Ltda. alega que não se verifica nenhuma prova capaz de
demonstrar danos de ordem moral ou material, além de também não ter sido comprovado
nenhum tipo de culpa, o que é imprescindível em responsabilidade subjetiva, motivo pelo
qual requer a improcedência de todos os pedidos.
Às fls. 17-27, a parte autora juntou recibos de aluguel e fotografias do freezer com
arranhões. Às fls. 47-62, a ré juntou contrato, destacando a cláusula que estabelece que
“todas as notificações, solicitações, exigências e outras comunicações deverão ser feitas
por escrito”.
Elabore a sentença. Não há necessidade de relatório.

RESPOSTA:
Sobre a legitimidade ativa:
Em se tratando de empresário individual, é certo que a identidade pessoal e
patrimonial entre ambos é inegável, porque ambos respondem ilimitadamente, em âmbito
civil e empresarial, com os bens pelas obrigações assumidas. Portanto, não há motivo
para afastar a possibilidade de o empresário individual buscar ser reparado por danos
sofrido pela firma individual pela qual é responsável.

No mérito:
TJRJ - Décima Quinta Câmara Cível
Julgado em: 21 de maio de 2019.
Apelação Cível nº 1661932-23.2011.8.19.0004 (7)
Relator: Des. Ricardo Rodrigues Cardozo
ACÓRDÃO

APELAÇÃO CÍVEL. DANO MATERIAL E MORAL. CONTRATO DE REVENDA


DE PRODUTO ALIMENTÍCIO COM COMODATO DE EQUIPAMENTOS.
IMPROCEDÊNCIA. MANUTENÇÃO DO JULGADO.
A relação posta em apreço é contratual e deve observar o invocado princípio da boa-fé,
mas também o da autonomia da vontade e do pacta sunt servanda, ou seja, de que o
contrato assumido é a lei que rege as partes ali envolvidas.
Nesse sentido, existindo cláusula contratual que obriga as partes às comunicações
escritas, considerando que a avença foi celebrada livremente pelos envolvidos, não há
como prosperar o apelo, na medida em que o próprio autor reconhece a inexistência de
qualquer tipo de aviso escrito dos problemas que vinha tendo com os equipamentos dados
em comodato.
Além disso, não há, com os elementos coligidos aos autos, como se saber de forma
inequívoca, que o réu tomou conhecimento dos problemas relatados, o que, em tese,
supriria a exigência formal.
Essa a principal razão da improcedência.
Recurso desprovido, nos termos do voto do desembargador relator.

VISTOS, RELATADOS E DISCUTIDOS estes autos,


ACORDAM os Desembargadores que compõem a 15a Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade, em conhecer do recurso e
desprovê-lo, nos termos do voto do desembargador relator.
Ação indenizatória ajuizada pelo recorrente, ao argumento de que celebrou contrato com
a empresa Quala Alimentos para revenda de produto do gênero alimentício chamado
“icegurt”, tendo sido acordado também o comodato de equipamentos para conservação,
consistente em dois freezers, no entanto, tais freezers nunca funcionaram adequadamente,
pois não congelavam, o que inviabilizou seu negócio, não obstante as inúmeras tentativas
de resolução do problema. Assim, pleiteou indenização por danos materiais, pois teve
despesa com aluguel, encargos para estabelecimento do comércio, obras e assinou nota
promissória de R$ 12.000,00, bem como compensação pelos danos morais sofridos e
rescisão do contrato.
A juíza a quo, na sentença lida à pasta 207, julgou improcedente os pedidos, pois o
contrato celebrado previa a obrigação de que “todas as notificações, solicitações,
exigências e outras comunicações feitas no âmbito deste contrato deverão ser feitas por
escrito”, o que não ocorreu no caso. No corolário, condenou o autor ao pagamento das
custas processuais e dos honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor dado a
causa, na forma do art. 85, §§ 2º e 14 do CPC, observada a gratuidade de justiça.
A parte autora apelou à pasta 211. Discorreusobre os prejuízos e angústia experimentados
com a atuação da ré. Afirmou que houve cerceamento de defesa na espécie, pois juntou
provas de suas alegações, que não foram consideradas pela magistrada singular.
Reconheceu que, de fato, não fez comunicação por escrito, mas que tentou resolver por
telefone, de boa-fé, e que os prejuízos materiais e abalo de ordem moral estão provados
nos autos. Asseverou que a sentença prestigia a atuação desidiosa da ré, que sequer
compareceu às audiências marcadas pelo juízo. Assim, pleiteou a reforma in totum da
sentença.
Sem contrarrazões nos autos, conforme certificado à pasta 222.
É o relatório.

Presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, deve ser o recurso


conhecido.
Não merece guarida a insurgência autoral.
A hipótese em apreço não se insere no âmbito do direito do consumidor, cabendo ao autor
a prova de suas alegações.
A relação posta em apreço é contratual e deve observar sim o invocado princípio da boa-
fé, mas também o da autonomia da vontade e do pacta sunt servanda, ou seja, de que o
contrato assumido é a lei que rege as partes ali envolvidas.
Nesse sentido, existindo cláusula contratual que obriga as partes às comunicações
escritas, considerando que a avença foi celebrada livremente pelos envolvidos, não há
como prosperar o apelo, na medida em que o próprio autor reconhece a inexistência de
qualquer tipo de aviso escrito dos problemas que vinha tendo com os equipamentos dados
em comodato.
Além disso, não há, com os elementos coligidos aos autos, como se saber de forma
inequívoca, que o réu tomou conhecimento dos problemas relatados, o que, em tese,
supriria a exigência formal.
Essa a principal razão da improcedência.
Note-se que os prejuízos podem até ter existido, podem até ter sido causados pela ré, mas
o autor não cumpriu sua obrigação contratual de notificar por escrito o réu, o que conduz
à aplicação da exceção do contrato não cumprido.
Nessa trilha, tem-se que a parte autora não se desincumbiu do seu ônus probatório, inserto
no art. 373, I do CPC. A sentença deu correta solução ao litígio e não está a merecer
reparos.
Assim, nego provimento ao recurso. Majoro os honorários advocatícios em 2%, na forma
do art. 85, § 11 do CPC/2015, observada a gratuidade de justiça. É como voto.
Rio de Janeiro, 21 de maio de 2019.
Desembargador RICARDO RODRIGUES CARDOZO
Relator

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