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Punção de Líquor

Chapter · November 2013


DOI: 10.13140/2.1.1228.3849

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4 authors:

Carlos Brandao Felipe von Glehn


Neurolife University of Brasília
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Lidiane S Campos Tania Aparecida Marchiori Cardoso


University of Campinas University of Campinas
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Seção II – Sistema Neurológico
Capítulo 10
PUNÇÃO DE LÍQUOR

Carlos Otávio Brandão MD, PhD


Médico Neurologista, Pesquisador Colaborador do Laboratório de Neuroimunologia
e Líquido Cefalorraquiano, Instituto de Biologia da Universidade Estadual de
Campinas, UNICAMP.

Lidiane Soares Campos MD


Médica Neurologista, Mestranda em Neurologia pela Faculdade de Ciências
Médicas da Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP.

Felipe von Glehn MD, MSc


Médico Neurologista, Doutorando em Neurologia pela Faculdade de Ciências
Médicas da Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP.

Tânia Aparecida Marchiori de Oliveira Cardoso MD, PhD


Médica Neurologista, Professora Doutora do Departamento de Neurologia,
Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP.
Seção II – Sistema Neurológico
Capítulo 10
PUNÇÃO DE LÍQUOR
Carlos Otávio Brandão
Lidiane Soares Campos
Felipe von Glehn
Tânia Aparecida Marchiori de Oliveira Cardoso

Sumário
Introdução
Punção Lombar
Indicações
Contra-indicações
Complicações
Cefaléia pós-punção
Acidente de punção
Punção seca
Dor irradiada para membros inferiores
Técnica
Vias de acesso alternativo
Punção cisternal
Punção cervical lateral
Síndromes liquóricas
Recomendações
Bibliografia
Seção II – Sistema Neurológico
Capítulo 10
PUNÇÃO DE LÍQUOR
Carlos Otávio Brandão
Lidiane Soares Campos
Felipe von Glehn
Tânia Aparecida Marchiori de Oliveira Cardoso

Introdução
O líquor (Líquido Cefalorraquiano- LCR) é um fluído oligocelular, límpido e
incolor que preenche os ventrículos cerebrais e o espaço subaracnóideo,
circundando o encéfalo e a medula espinhal. Devido à proximidade do sistema
nervoso, o estudo liquórico reflete o processo patológico que ocorre em diversos
distúrbios neurológicos. O exame consiste principalmente na observação da
composição físico-química, citológica, microbiológica e imunológica do LCR. As
modificações detectadas na sua composição, fluxo e pressão auxiliam no
diagnóstico e tratamento das patologias do sistema nervoso.
A via de acesso ao LCR preconizada pela Academia Brasileira de Neurologia
é a punção lombar (PL), que foi descrita por Quincke, em 1891. Atualmente, a PL é
considerada um ato médico de rotina para anestesia, diagnóstico, pesquisa ou
tratamento de doenças que acometem o sistema nervoso central (SNC) e raízes
nervosas. A compreensão dos aspectos anatômicos é fundamental para o sucesso
e a segurança do procedimento.
Este capítulo tem por objetivo discorrer sobre aspectos relacionados à técnica
da punção lombar, suas indicações, contraindicações, complicações e as principais
síndromes liquóricas, especialmente em unidades de terapia intensiva (UTI).

Punção Lombar

A punção lombar é uma técnica invasiva de acesso ao líquor que envolve a


introdução de uma agulha dentro do espaço subaracnóideo lombar.

Indicações
A punção lombar em UTI tem como principal objetivo examinar o líquor e sua
hidrodinâmica, especialmente anormalidades na pressão liquórica e bloqueio
subaracnóideo espinhal. O estudo liquórico é essencial para o diagnóstico
diferencial e acompanhamento de diversas síndromes neurológicas: síndromes
infecciosas agudas (meningites, encefalites, mielites, radiculites) e crônicas (HIV,
sífilis, cisticercose, criptococose, tuberculose); síndromes neoplásicas
(carcinomatose meníngea, leucemias, linfomas); síndromes paraneoplásicas;
síndromes vasculares (hemorragia subaracnóidea); síndromes inflamatórias do SNC
(vasculites, sarcoidose); síndromes do pseudotumor (hipertensão intracraniana
idiopática); doenças autoimunes do SNC (esclerose múltipla, neuromielite óptica);
doenças autoimunes do SNP (polirradiculoneurites) e doenças neurodegenerativas
(doença de Alzheimer, doenças priônicas).
A punção terapêutica é muito utilizada para drenagem do LCR em alguns
quadros de hidrocefalia (hipertensão intracraniana idiopática e hidrocefalia de
pressão normal) e para introdução de determinadas drogas, como: álcool e fenol
(tratamento de dor e espasticidade); quimioterápicos (tratamento das leucemias,
linfomas e outras neoplasias); antibióticos e antifúngicos (algumas formas de
meningites e ventriculites).

Contra-indicações

Algumas condições contraindicam formalmente o procedimento (Tabela


40.1).

Tabela 40.1- Contra-indicações para punção lombar


Infecção local supurativa da pele ou tecidos mais profundos
Terapêutica anticoagulante
Discrasias sanguíneas
Hipertensão intracraniana com risco de herniação cerebral

Nas síndromes de hipertensão intracraniana a avaliação, com auxílio dos


exames de neuroimagem (tomografia computadorizada-TC ou ressonância
magnética-RM), deve ser criteriosa e o procedimento indicado com extrema cautela.
A alteração súbita da pressão em lesões expansivas intracranianas, especialmente
da fossa craniana posterior (tumor cerebelar ou abscesso), pode forçar as tonsilas
do cerebelo e a medula para dentro do forâmen magno, causando depressão
respiratória e morte súbita. A diminuição abrupta da pressão infratentorial
desencadeada pelo procedimento, diante de uma hipertensão intracraniana, pode
também causar herniação do giro hipocampal.
Existe uma remota possibilidade de a punção lombar induzir meningite
bacteriana em pacientes com septicemia. Porém, na suspeita diagnóstica de
meningite associada, o procedimento não deve ser formalmente contraindicado.

Complicações

A punção lombar realizada por profissional habilitado é normalmente bem


tolerada pelos pacientes, mas, apesar de ser um procedimento relativamente
simples, complicações podem ocorrer (Tabela 40.2). O médico, portanto, deve
demonstrar conhecimento e habilidade para conduzir as intercorrências. As
complicações são mais frequentes quando utilizadas agulhas mais calibrosas (16G)
ao invés das mais finas (22G, 23G, 25G). A grande maioria das complicações é
transitória e desaparece sem tratamento (cefaléia, dor lombar e sintomas sensitivos
radiculares). Outras situações, menos frequentes, podem ocorrer como diplopia (por
paralisia de nervo craniano), hemorragia subaracnóidea, hemorragia extradural,
meningite purulenta, meningite asséptica, osteomielite, abscesso extradural,
implante de tumor epidermóide, lesão de disco intervertebral com ruptura do núcleo
pulposo para dentro do canal e herniação cerebral (complicação grave, podendo
levar a óbito).

Tabela 40.2- Principais complicações da punção lombar


Cefaléia pós-punção
Acidente de punção prejudicando a análise do líquor
Insucesso da coleta com punção seca
Dor irradiada para membros inferiores devido à punção de raiz nervosa

Cefaléia pós-punção

Cefaléia é o efeito adverso mais frequente da punção lombar (15- 30% dos
pacientes). Caracteriza-se por dor occipital que aparece até cinco dias após a
punção e, quando mais intensa, pode ser acompanhada por vertigens, rigidez de
nuca, zumbido, hipoacusia transitória, borramento da visão, fotofobia, náuseas e
vômitos. Ela aparece quando o paciente fica de pé ou levanta a cabeça e tende a
melhorar em até 30 minutos após decúbito. A duração pode variar com de 1-2
horas, resolução espontânea dentro de uma semana, ou ser incapacitante até duas
semanas. Estatura elevada, sexo feminino, pacientes jovens entre 15 e 40 anos,
maior calibre da agulha (menor que 20G), agulha traumática (tipo Quincke),
pacientes muito magros, número de punções ou história de cefaléia prévia são
fatores descritos como associados ao aparecimento ou piora da cefaléia pós-
punção.
Entre as possíveis teorias para a cefaléia pós-punção estão o
extravasamento de líquor através de orifício dural, criado pela punção lombar, com
uma redução de volume do compartimento liquórico e consequente queda do
encéfalo sobre a fossa posterior, tracionando as estruturas da convexidade cerebral,
como os seios venosos. A diminuição do volume liquórico seria compensada por
uma vasodilatação venosa, sendo a dor desencadeada pela distensão vascular. A
dor de cabeça não parece ser dependente da quantidade de LCR retirada, exceto
se retirados mais do que 30 ml, e pode ocorrer em pacientes puncionados sem
retirada de LCR.
Esta situação adversa normalmente é resolvida com a orientação de repouso
absoluto no leito, com a cabeça tão baixa quanto, ou mais baixa do que o restante
do corpo, por alguns dias. Analgésicos e sedativos convencionais podem ser
necessários e a ingestão de líquidos deve ser recomendada. Nos casos mais
graves, que não respondem ao repouso, o tamponamento sanguíneo epidural
(injeções epidurais do próprio sangue do paciente) pode ser necessário para
interromper o vazamento do LCR. A melhora da cefaléia começa dentro de poucas
horas e ela, geralmente, desaparece em 48 horas (tratamento eficaz em 80-95%
dos pacientes).

Acidente de Punção

O acidente de punção é caracterizado pela presença de sangue


macroscópico vindo misturado ao LCR durante a coleta. Frequentemente, ele ocorre
pela inserção da agulha muito lateralmente à linha média ou pela sua inserção muito
avançada, muito anteriormente. As veias do plexo venoso vertebral interno,
localizadas no espaço epidural, são geralmente as mais acometidas. O acidente de
punção deve ter sempre diagnóstico diferencial com hemorragia subaracnóidea.
Durante a coleta, o clareamento do LCR, com a diminuição progressiva da
contagem de hemácias entre os tubos coletados e a formação de coágulo nestes
tubos indicam uma origem traumática do sangue.

Punção Seca

Uma punção seca está geralmente relacionada a posicionamento incorreto do


paciente e consequente trajeto errôneo da agulha para o espaço subaracnóideo,
frequentemente atingindo estruturas ósseas. Uma inclinação excessiva da agulha
para cima ou para baixo, ou muito lateralizada, implica em um trajeto contra os
processos espinhosos das vértebras superior ou inferior, ou contra o processo
articular e forâmen intervertebral. A flexão insuficiente do tronco pode resultar em
espaço intervertebral estreito e dificuldade na progressão da agulha.
Outras causas de insucesso: uma raiz da cauda eqüina ou uma dobra da
aracnóide podem obstruir a ponta da agulha; material estranho (pus ou coágulo)
obstruindo a agulha; preenchimento do cone medular ou cauda equina por tumor;
bloqueio completo do espaço subaracnóideo acima do local da punção; hipotensão
liquórica; a agulha pode empurrar o saco dural para frente ou para um dos lados
devido ao ângulo inadequado do bisel; anormalidades da coluna vertebral
(escoliose), artrose ou espondilite.

Dor irradiada para membros inferiores por punção de raiz nervosa

Durante o procedimento, o paciente pode se queixar de dor do tipo choque


irradiada para um dos membros inferiores, indicando que alguma raiz nervosa foi
pinçada e que a agulha deve estar muita lateralizada. Deve-se retirar a agulha até o
tecido subcutâneo e reiniciar o procedimento, de forma a mantê-la na linha média.
Técnica

Passo 1: Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)

Antes do início do procedimento é fundamental que o paciente ou


responsável seja informado e esclarecido sobre todos os detalhes relacionados à
punção liquórica. A idéia é tranquilizar o paciente e explicar que a punção é de
relativa simplicidade e pouco dolorosa.

Passo 2: Posicionamento

A posição do paciente é um dos parâmetros mais importantes para o sucesso


do procedimento. O paciente deve estar confortável e relaxado, deitado em maca
relativamente firme e rígida. Caso o procedimento seja realizado em cama, o
paciente deve ser deslocado para a borda lateral. A PL pode ser realizada com o
paciente sentado ou em decúbito lateral. Recomenda-se o decúbito lateral
(esquerdo para os médicos assistentes destros), pois é a única posição que permite
realização adequada da medida da pressão liquórica (raquimanometria).
O paciente deve permanecer com cabeça, pescoço e tronco flexionados
(queixo encostado no tórax), pernas flexionadas sobre as coxas e estas sobre o
abdômen (joelhos parados no abdômen e contidos pelas mãos na fossa poplítea).
As cinturas escapular e pélvica devem estar alinhadas e em paralelo, devendo-se
colocar pequeno travesseiro embaixo da cabeça para alinhar a coluna vertebral.
Esta posição tem o objetivo de abrir os espaços intervertebrais que estão
estreitados pela lordose lombar fisiológica.

Passo 3: Local da punção

O local da inserção da agulha é determinado através de uma linha imaginária


traçada entre os limites superiores das cristas ilíacas (Linha de Tuffier), a qual cruza
a linha média no processo espinhoso de L4 ou interespaço L4-L5. Na maioria dos
adultos, a porção final da medula espinhal está no nível L1-L2 da coluna vertebral e
a agulha pode ser introduzida nos espaços L3-L4, L4-L5 ou L5-S1, sem riscos de
lesar a medula espinhal ou o cone medular.

Passo 4: Assepsia e Anestesia Local

A pele, na região da punção lombar, deve ser lavada com preparação


antisséptica. Utilizar luvas, campos e demais instrumentos estéreis.
O uso de anestésico local (lidocaína) é muito útil. Uma agulha hipodérmica
pequena (25G) deve ser utilizada para infiltração na pele e tecidos subcutâneos. Em
seguida, uma quantidade um pouco maior pode ser injetada lentamente com uma
agulha mais larga (21 G) dentro das estruturas mais profundas (músculos e fáscias,
ligamento interespinhal no espaço interespinhoso, proximidades do periósteo e
meninges externas), especialmente em pacientes obesos.
A perfuração da pele e da dura-máter geralmente é dolorosa e a dor pode ser
amenizada pela utilização do anestésico local. Se o periósteo do processo
espinhoso ou do corpo vertebral é traumatizado pode haver dor. Em situações,
como artrite da coluna vertebral, a punção pose ser muito dolorosa.
Se o paciente for muito tenso ou ansioso pode ser necessário apoio de um
assistente segurando-o firmemente, principalmente quando for criança. Em algumas
situações (pacientes com delírios ou alteração do comportamento) pode ser
necessário o uso de anestesia geral ou sedação intravenosa.

Passo 5: Inserção da agulha

A agulha deve ser bem afilada e ter um bisel curto com um estilete (mandril)
bem ajustado. Após alguns minutos da introdução do anestésico local, a agulha
deve ser inserida na pele inferiormente no espaço intervertebral determinado pela
palpação do processo espinhoso. A inserção deve ser feita na linha média em
direção à cicatriz umbilical, perpendicular ao plano das costas e paralela ao plano
horizontal do leito, ou em algumas ocasiões, levemente inclinada no sentido
cefálico. A agulha pode também ser inserida, como alternativa, 1-2 cm lateral à linha
média e avançada com um ligeiro ângulo em direção à linha média. O bisel (a parte
cortante da agulha) deve ser mantido paralelo às fibras durais (voltado para cima na
posição de decúbito ou para os lados na posição sentada). A dura-máter é
composta por fibras dispostas longitudinalmente, desta forma, a agulha deve ser
inserida separando suas fibras ao invés de cortá-las, diminuindo os riscos de
vazamento de líquor (fístula) e, consequente, cefaléia pós-punção.
Após a penetração da pele, a agulha deve ser realinhada e aprofundada lenta
e cuidadosamente com as duas mãos. O percurso, até chegar ao espaço
subaracnóideo, inclui pele, tecido subcutâneo, ligamento supraespinhal, ligamento
interespinhoso, ligamento amarelo, espaço epidural (gordura), dura-máter,
aracnoide e, finalmente, entra no espaço subaracnóideo. Nos adultos, a agulha
pode percorrer cerca de 5-6 cm até chegar ao espaço, dependendo da espessura
dos músculos lombares e tecido subcutâneo. Não é recomendado modificar o curso
da agulha durante a penetração; se houver obstáculo, a agulha deve ser recuada
até o tecido subcutâneo e reintroduzida com um ângulo levemente diferente. Ao
passar pelo ligamento amarelo, a agulha alcança o espaço epidural e o examinador
tem a sensação de queda abrupta da resistência podendo sentir um leve estalo ou
clique. Neste momento, o mandril deve ser retirado para verificar se a agulha está
no espaço subaracnóideo. Se nenhum fluído for obtido, o mandril deve ser
reposicionado e ajustado novamente na agulha. A partir daí, deve-se avançar
lentamente, retirando o estilete da agulha a cada 2 mm para verificar a saída de
líquor. É bastante comum sentir outro clique quando a agulha penetra através da
dura. Neste instante, o mandril deve ser retirado novamente, e, caso não ocorra
drenagem do fluído, a posição da agulha deve ser reajustada levemente ou rodada
cerca de 90º, pois sua ponta pode estar obstruída por uma raiz nervosa ou um filme
de tecido aracnóideo.
Em caso de insucesso (punção seca ou resistência óssea), a agulha deve ser
recuada até próximo à pele e redirecionada, com revisão dos pontos anatômicos
antes da reintrodução. A agulha não deve ser introduzida tão profundamente, pelo
risco de traumatismo do disco intervertebral ou dos plexos venosos extradurais.
Caso haja drenagem de sangue (acidente de punção), antes de penetrar a
aracnoide, a agulha deve ser substituída e a nova inserção deve ser,
preferencialmente, em outro espaço. Ocasionalmente, pode ocorrer uma dor
lancinante irradiada para uma perna e isto indica que uma das raízes da cauda
equina foi traumatizada. Esta dor normalmente desaparece imediatamente e não é
recomendado modificar a posição da agulha durante o gotejamento.
Após o início do gotejamento do líquor, o mandril deve ser reintroduzido e o
paciente deve ser tranquilizado, relaxando levemente suas pernas e pescoço,
explicando que a punção foi um sucesso e que não haverá mais desconforto, para,
então, finalizar o procedimento (raquimanometria e coleta do líquor).

Passo 6: Raquimanometria e coleta do líquor

O manômetro deve ser conectado rapidamente na agulha para evitar perda


do líquor. A presença de oscilação da pressão indica que a agulha está no espaço e
há livre comunicação entre o espaço e o manômetro. Se o fluído vier levemente
hemorrágico (possibilidade de pequeno acidente de punção), pode-se descartar
pouco volume antes da coleta do material. Em seguida, o líquor é coletado em três
ou mais tubos secos, claros e estéreis para realização dos estudos citológicos,
bioquímicos, microbiológicos e imunológicos. A pressão final deve ser obtida e o
mandril reintroduzido antes da retirada lenta da agulha.
Se há rápida queda de pressão ou deterioração das condições do paciente
durante a drenagem, o procedimento deve ser imediatamente interrompido.
Após a retirada da agulha, o local da punção deve ser novamente esterilizado
com antisséptico e, comprimido por dois minutos para prevenir extravasamento. O
orifício de punção deve ser coberto por curativo estéril.
Ao final, o paciente deve ser orientado novamente sobre os cuidados após o
exame e todo o procedimento deve ser registrado em prontuário: condições do
paciente durante a punção, descrição da pressão inicial e final, aspecto e cor do
fluído, volume retirado e, possíveis intercorrências.

Vias de acesso alternativo

As punções cisternal e cervical lateral são opções para as situações de


contraindicação ou insucesso da punção lombar. A punção no nível de C1-C2 ou
pela cisterna magna pode ser mais efetiva nos casos de injeção de rádio isótopos
para a avaliação dos casos de hidrocefalia e fístulas liquóricas. Estes procedimentos
são mais seguros quando guiados por métodos radiológicos que permitem
visualização do posicionamento da agulha.
Na tabela 40.3, encontram-se as vantagens e desvantagens das técnicas
mais utilizadas na rotina neurodiagnóstica.

Tabela 40.3 - Vantagens e desvantagens das punções lombar e suboccipital


Procedimento Vantagem Desvantagem
Punção Inexistência de cefaléia pós- Risco de lesão potencialmente
Suboccipital punção. fatal da artéria cerebelar póstero-
inferior ou seus ramos.

Pouca interferência se há Pouca sensibilidade para


alterações osteoarticulares patologias medulares e/ou
cervicais ou se obesidade. radiculares.

Menor risco de herniação


cerebral se há hipertensão
intracraniana.

Procedimento simples e rápido


quando realizado por
profissional bem treinado.

Punção Lombar Ausência de riscos de lesão Dificuldade técnica em pacientes


vascular grave. idosos e obesos.

Maior segurança no diagnóstico Risco de cefaléia pós-punção.


de patologias medulares e/ou
radiculares.

Maior sensibilidade para


detecção de células
neoplásicas.

Maior concentração proteica


que facilita a detecção de
processos inflamatórios
crônicos.
Punção cisternal

A punção cisternal pode ser realizada na posição sentada ou em decúbito


lateral, sendo esta última preferida, devido à baixa pressão do fluido cisternal na
posição sentada. Em decúbito lateral, os ombros devem ficar alinhados no plano
vertical e a cabeça levemente flexionada com apoio de um pequeno travesseiro de
maneira que o eixo crânio-caudal da coluna cervical fique paralelo ao plano de apoio
do paciente. A punção cisternal na posição sentada necessita de maior cooperação
do paciente que deve ficar com a coluna alinhada no eixo vertical, braços
descansados sobre uma mesa e leve flexão cervical aproximando o mento do terço
médio do pescoço. As precauções com assepsia e agulhas, geralmente, são as
mesmas utilizadas na punção lombar.
A agulha (com mandril, em geral de 80 x 0,8mm) deve ser introduzida na
linha média da região occipital (entre a protuberância occipital externa e o processo
espinhoso do axis) e conduzida anterior e superiormente em direção à glabela. O
percurso da agulha (em média 4 ou 6 cm de profundidade) segue a seguinte ordem:
pele, tecido subcutâneo, ligamento cervical posterior, membrana atlanto-occipital
posterior , espaço epidural (gordura e plexo venoso vertebral interno), dura-máter,
aracnoide e, finalmente, o espaço subaracnóideo. A penetração do espaço cisternal
é precedida de leve sensação táctil característica (clique) ao se atravessar a
membrana atlanto-occipital e a dura-máter; no entanto, é recomendável retirar o
mandril a cada milímetro, uma vez atingido os planos mais profundos, porque nem
sempre é possível sentir o clique. Em caso de insucesso (toque da agulha na base
do osso occipital), a agulha deve ser recuada até a pele e reinserida com inclinação
levemente inferior. Após a coleta do líquor e manometria final, o mandril deve ser
recolocado e a agulha retirada, com compressão local por alguns minutos.

Punção cervical lateral

A punção é realizada no interespaço atlanto-axial (C1-C2) por ser amplo e


seguro, não havendo justaposição das vértebras cervicais em suas porções laterais
(as articulações interpediculares em C1-C2 são projetadas em direção anterior). O
acesso também pode ser feito no nível atlanto-occipital. O procedimento de coleta
do líquor pode ser realizado na enfermaria ou no ambulatório e não exige
formalmente controle radioscópico.
Durante o procedimento, o paciente deve ficar com a cabeça e pescoço
retificados, em decúbito prono ou supino. A agulha espinhal (80 x 7 mm ou 80 x 8
mm) deve seguir em direção paralela ao plano de apoio do paciente e perpendicular
ao seu pescoço, após ser introduzida no local determinado pelos pontos de
referência (1.0 cm caudal e 1.0 cm dorsal à ponta da mastóide para C1-C2; 1.0 a
2.5 cm dorsal à ponta da mastoide para o espaço atlanto-occipital). O percurso da
agulha tem a seguinte ordem: pele, subcutâneo, ligamento cervical superior, plano
muscular, membrana atlanto-occipital posterior ou ligamento atlanto-axial posterior,
espaço peridural, dura-máter, aracnoide e finalmente, o espaço subaracnóideo. Não
é fácil perceber a penetração do espaço subaracnóideo e, portanto, o mandril deve
ser removido a cada avanço da agulha até a drenagem do líquor. A introdução
cautelosa da agulha é essencial para evitar a penetração na medula espinhal.
Causas de insucesso: com a introdução em ponto mais posterior ou sua
angulação no sentido dorsal, a agulha pode penetrar na musculatura paraespinhal
sem atingir o espaço subaracnóideo; se a agulha tocar a segunda raiz cervical, o
paciente apresentará dor aguda intensa e poderá sair da posição; a obstrução da
agulha pelo ligamento denteado ou pela própria medula, cessando o fluxo de líquor
e, nestes casos, a agulha deve ser reposicionada; mobilização da agulha durante a
manometria. No caso de existência de alterações anatômicas ou paciente pouco
cooperativo, é indicado auxílio de fluoroscopia para guiar o procedimento.
Após a raquicentese do líquor e medida da pressão final, o mandril deve ser
recolocado e a agulha rapidamente retirada, seguida de compressão local por
alguns minutos.

Síndromes liquóricas

A compreensão de como o exame do líquor pode ajudar no diagnóstico


diferencial exige o entendimento das origens deste fluído. O maior volume do LCR
(2/3) é derivado do plexo coróide e chega ao espaço liquórico após atravessar a
barreira hemato-liquórica (BHL); aproximadamente 1/3 é proveniente do líquido
intersticial cerebral que passa pela barreira hemato-encefálica (BHE); um volume
menor é agregado, pela maior permeabilidade nas raízes dorsais (BHD) às
proteínas do sangue. O exemplo mais marcante do comprometimento desta última é
o que ocorre na síndrome de Guillain-Barré, em que o líquor pode apresentar níveis
muito elevados das proteínas totais no âmbito da medula espinhal, enquanto nos
ventrículos os níveis estão normais. As meninges normalmente não produzem
líquor, contudo, a inflamação das meninges em determinadas condições (infecção,
carcinomatose e outras lesões inflamatórias) pode contribuir para aumentar a
concentração das proteínas totais no líquor (quebra das barreiras e/ou síntese local
de proteínas específicas).
A análise liquórica nas diferentes síndromes neurológicas pode compreender
métodos qualitativos e quantitativos: pesquisa de antígenos específicos, proteínas
específicas e outros marcadores inespecíficos. Uma análise cautelosa dos achados
deve ser feita para evitar interpretações equivocadas. A inspeção visual do líquor, já
à beira do leito, pode sugerir o diagnóstico: turbidez devido à presença de
neutrófilos nas meningites e xantocromia na evolução das hemorragias
subaracnóideas.
Achados liquóricos frequentes nas diferentes síndromes:

Síndromes infecciosas

Nas síndromes infecciosas, os achados liquóricos são essenciais para


estabelecer o diagnóstico etiológico e o tratamento antimicrobiano específico
(Tabela 40.4). Os agentes infecciosos podem ser detectados por exames
microbiológicos diretos (Gram, Ziehl, Tinta da China), culturas específicas (germes
comuns, fungos, micobactérias e vírus), pesquisa de antígenos (látex para
antígenos bacterianos e fungos), reações imunológicas (pesquisa de anticorpos
para diferentes agentes como na sífilis, cisticercose, esquistossomose e diferentes
vírus) e pesquisa direta do DNA/RNA dos diferentes patógenos através do método
da polimerase em cadeia (PCR).
Os pacientes imunossuprimidos ou imunodeprimidos (infecção pelo HIV)
podem apresentar uma síndrome liquórica diferenciada com celularidade baixa
(pouca resposta inflamatória) e exames microbiológicos positivos nas infecções
bacterianas e fúngicas.

Tabela 40.4 - Anormalidades liquóricas nas meningites agudas.


Agente Pressãoa Leucócitosb Proteínasc Glicosed Testes
etiológico liquórica / mm3 (mg/dl) (mg/dl) Específicos
(Sensibilidade)
Bactéria Elevada Predomínio Elevadas Baixa Gram (30-85%)
de (100-500); Látex (30-100%)
neutrófilos ocasional (antígeno)
(> 1000) mente > Cultura (até 85%)
1000 PCR (até 90%)

Micobactéria Elevada; Geralmente Elevadas Baixa Ziehl (8-86%)


(Tuberculose) baixa em 25- 100; (100-200); (< 45 em Cultura (50-80%)
casos de raramente > muito ¾ dos PCR (até 85%)
bloqueio 500; elevadas casos)
espinhal predomínio nos casos
de linfócitos de
exceto em bloqueio
estágios espinhal
iniciais
(neutrófilos)

Fungus Elevada Variável Variável Baixa na Látex (até 90%)


(Cryptococcus (0-800); (20-500); maioria (antígeno)
neoformans) predomínio dos Tinta da China
de linfócitos casos (50-70%)
Cultura (até 80%)

Viral Normal Predomínio Normal ou Normal; PCR (até 98%):


ou de linfócitos discreto discreta - enterovírus
discreto (5-500) aumento redução - herpes simplex
- varicela zoster
aumento exceto em (< 100) em ¼ - epstein-barr vírus
estágios casos de - citomegalovirus
iniciais HSV,
(neutrófilos); CMV e
raramente > Caxumba
1000
a
Pressão liquórica: valores normais no adulto até 20 cm H2O.
b 3
Contagem de leucócitos: valores de referência < 5 células/mm .
c
Proteínas totais no líquor lombar do adulto: valores de referência 20-40 mg/dl.
d
Glicose (70% soro): valores de referência 40-70 mg/dl na ausência de hiperglicemia.

Síndromes neoplásicas (carcinomatoses meníngeas)


O diagnóstico da disseminação leptomeníngea de tumores primários
(glioblastoma, meduloblastoma) e metastáticos (leucemia, linfoma, carcinoma de
mama, carcinoma de pulmão, adenocarcinoma de tubo digestivo e outros) depende
da demonstração de células malignas no exame citológico do líquor (sensibilidade
de 40-70% na primeira punção e de 86-92% na terceira amostra). Achados
liquóricos freqüentes são: aumento de pressão, pleocitose discreta, aumento de
proteínas e glicose baixa.
Existe uma extensa literatura sobre a utilização de marcadores tumorais
específicos para o diagnóstico, estadiamento e tratamento das neoplasias do SNC:
proteínas embrionárias (HCG, alfafeto-proteína, CEA), proteínas cerebrais
específicas (S-100), peptídeos hormonais (ACTG, TSH, GH) e outros (enolase,
beta2 microglobulina etc.).

Síndromes paraneoplásicas

Auto-anticorpos (reação cruzada com células de um tumor e um tecido neural


normal) podem ser detectados no líquor e soro de pacientes com síndrome
neurológica em associação com neoplasia sistêmica na ausência de doença
metastática. Estes incluem diferentes anticorpos, como Hu e Yo, contra células de
Purkinge na degeneração cerebelar e anticorpos anti-nucleares neuronais em
neuronopatias sensoriais agudas e subagudas.

Síndromes vasculares

A presença de hemácias no líquor pode indicar uma hemorragia


subaracnóidea, mas o diagnóstico diferencial com uma punção traumática (acidente
de punção) é essencial (Tabela 40.5). Quando é observado fluído hemorrágico na
punção lombar, a coleta deve ser realizada em três tubos. Nas punções traumáticas
o fluído fica progressivamente mais claro do primeiro para o terceiro tubo (a
contagem das hemácias confirma a inspeção visual). A amostra hemorrágica deve
ser imediatamente centrifugada e o sobrenadante observado (incolor nas punções
traumáticas e pigmentado na hemorragia subaracnóidea). Xantocromia pode
aparecer de duas até 12 horas após o início do sangramento. Na citologia
diferencial podem ser demonstrados macrófagos eritrófagos (durante a primeira
semana) e macrófagos pigmentados com hemossiderina ou com hematoidina
(persistem por semanas ou meses) após a hemorragia subaracnóidea.
Outro distúrbio vascular que pode determinar alterações no líquor é a
trombose venosa central. A pressão liquórica e os níveis de proteínas totais podem
estar normais ou elevados, podendo haver pleocitose, geralmente com valores
inferiores a 100 células/ mm3 e com predomínio de linfócitos. Se houver hematoma
parenquimatoso associado, hemácias podem ser observadas na citologia global.

Síndromes inflamatórias do SNC

O SNC pode ser afetado por lesões inflamatórias em associação ou não com
várias condições sistêmicas como sarcoidose, vasculites e doenças reumatológicas.
Os achados liquóricos são inespecíficos e incluem pleocitose variável, aumento de
proteínas e ocasionalmente síntese intratecal de anticorpos. A definição do
diagnóstico envolve a exclusão de doenças infecciosas do SNC e investigação
detalhada para outras síndromes inflamatórias sistêmicas.

Síndromes do pseudotumor (hipertensão intracraniana idiopática)

O diagnóstico da hipertensão intracraniana benigna depende da


demonstração do aumento da pressão liquórica sem outras anormalidades na
composição do LCR.

Doenças autoimunes do SNC

O estudo do líquor colabora para o diagnóstico das doenças autoimunes do


SNC pela demonstração do processo inflamatório e pela exclusão de causas
infecciosas ou neoplásicas. Os marcadores liquóricos não são específicos, mas
apresentam um perfil característico para cada síndrome.
Na esclerose múltipla, o LCR mostra uma pleocitose discreta (<50
células/mm3 com predomínio de células mononucleares), discreto aumento de
proteínas totais (<100 mg/dl) e padrão oligoclonal de síntese intratecal de anticorpos
IgG em pelo menos 80% dos pacientes na forma clínica remitente/recorrente.
Na encefalomielite disseminada aguda (ADEM), o perfil liquórico pode ser
bem semelhante ao encontrado na esclerose múltipla, exceto alguns casos com
pleocitose acima de 100 células/mm3, com presença de neutrófilos e proteinorraquia
mais pronunciadas. A presença de bandas oligoclonais (síntese intratecal de
anticorpos) pode ser transitória e desaparece com a remissão do quadro, o que
normalmente não ocorre na esclerose múltipla.
A Neuromielite Óptica (Doença de Devic) está associada à presença de um
anticorpo sérico denominado anti-aquaporina-4 (NMO-IgG) e com perfil liquórico
inespecífico (pleocitose variável, aumento de proteínas totais e presença de bandas
oligoclonais IgG, essas em menor frequência do que na esclerose múltipla).

Doenças autoimunes do SNP

Ausência de pleocitose e aumento significativo das proteínas totais


(dissociação proteinocitológica) são os achados característicos da
polirradiculoneuropatia inflamatória aguda idiopática (síndrome de Guillain-Barré). O
momento da realização da punção lombar é importante na interpretação destes
parâmetros. Nos primeiros dias da instalação do quadro, os níveis de proteínas
totais podem estar normais e atingem os valores máximos entre 10 e 20 dias.
Ocasionalmente, a citologia global pode demonstrar pleocitose discreta.
Polirradiculoneuropatia inflamatória desmielinizante crônica (CIDP) apresenta
curso lento e progressivo com flutuações. Os níveis de proteínas totais estão
elevados (100-200 mg/dl), especialmente durante os surtos, e parecem relacionados
ao grau de comprometimento da neuropatia. Pleocitose discreta (< 50 células/mm 3)
pode ocorrer em um menor número de casos.

Doenças neurodegenerativas

As demências neurodegenerativas geralmente estão associadas com um


perfil liquórico normal. Mais recentemente, outros biomarcadores (proteínas tau,
beta-amilóide e proteína 14.3.3) têm sido estudados para favorecer o diagnóstico
específico e mais precoce das doenças neurodegenerativas.
Na doença de Alzheimer os níveis de beta-amilóide (Aβ42) estão diminuídos
(< 500 pg/ml) e as proteínas tau estão elevadas (500-1000 pg/ml). A doença de
Creutzfeldt-Jacob está associada com a presença da proteína 14.3.3 e valores
extremamente elevados das proteínas tau no líquor (> 1500 pg/ml).

Recomendações para a coleta do líquor (Tabela 40.6)

Tabela 40.6 - Recomendações para a coleta do líquor


Assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido
Neuroimagem de crânio (TC ou RM)
Contagem de plaquetas > 50000/ mm3 e INR< 1,5
Utilização da via mais segura e adequada
Utilização de agulhas padronizadas conforme objetivo e fatores de risco
Pós-procedimento (repouso relativo, hidratação e orientações sobre cefaléia)

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)

O paciente ou responsável deve ser informado da real necessidade do


procedimento e esclarecido com explicação detalhada sobre a punção liquórica,
seus riscos e possíveis complicações.

Neuroimagem (TC ou RM de crânio)

Os pacientes com suspeita ou risco de hipertensão intracraniana (idade>60


anos, doença neurológica prévia, convulsão recente, diminuição do nível de
consciência, edema de papila óptica, anormalidades no exame neurológico) devem
realizar neuroimagem de encéfalo (TC ou RM) para diminuir o risco de herniação
cerebral.

Contagem de plaquetas > 50000/ mm3; INR< 1.5

Trombocitopenia ou INR (International Normalized Ratio) elevado aumentam


o risco de hemorragia e formação de hematoma espinhal. Antes da realização do
procedimento é recomendável verificar a contagem de plaquetas e outros riscos de
sangramento (coagulopatias, medicações antiagregantes ou anticoagulantes).
Quando possível, as drogas que afetam a coagulação devem ser descontinuadas.
Em situações de não conformidade com os parâmetros da coagulação, o
procedimento deve ser adiado até correção.

Utilização de vias alternativas

A via preferencial e rotineira de coleta do LCR é a via lombar, mas na


impossibilidade de realização da punção lombar (infecção local da pele,
anormalidades do desenvolvimento da coluna ou medula espinhal, espondilose,
estenose de canal, bloqueio raquimedular, politraumatizados e agitação
psicomotora), outras vias permitem a coleta do LCR.
A punção cervical lateral pode ser muito útil em pacientes agitados ou
politraumatizados. A punção é relativamente fácil em decúbito supino e permite a
contenção do paciente com esforço mínimo, sem a necessidade de mobilização. A
punção da artéria vertebral extracraniana ou da artéria cerebelar póstero-inferior
(variação anatômica da origem) pode levar a acidentes hemorrágicos. As
contraindicações são as mesmas que para a punção lombar.
A punção suboccipital também é de fácil execução e apresenta menor
incidência de cefaléia pós-punção, porém não é mais recomendada pela Academia
Brasileira de Neurologia, salvo em casos excepcionais, devido ao risco de
ocorrência de hemorragia subaracnóidea pela lesão arterial ou lesão direta do bulbo
pela agulha. As contraindicações deste procedimento são infecção local,
anormalidade óssea ou artrodese occipitocervical, suspeita de lesão expansiva da
fossa posterior e malformação de Arnold-Chiari.

Utilização de agulhas espinhais padronizadas

A Academia Brasileira de Neurologia recomenda a utilização de agulhas


padronizadas descartáveis (Quincke) de calibre fino (22G). Diversos trabalhos
demonstraram que agulhas com calibres menores provocam menos cefaléia pós-
punção, porém não são adequadas para a realização da raquimanometria. Desta
forma, a utilização de agulhas mais finas (23G ou 25G) deve ser reservada para as
condições clínicas em que a raquimanometria não é relevante e para os pacientes
com maior risco de cefaléia pós-punção. Neste grupo de pacientes deve ser
considerada a possibilidade de utilizar as agulhas atraumáticas (Sprotte, Pajunk) ou
em ponta de lápis.

Recomendações aos pacientes após a punção lombar

Orientar o paciente a permanecer em repouso relativo por algumas horas


após a punção, preferencialmente deitado, e beber muito líquido. A grande maioria
dos pacientes não apresenta qualquer problema após a punção e pode retornar
normalmente às suas atividades após o repouso.
Explicar que alguns pacientes (em torno de 10%) poderão apresentar cefaléia
quando ficarem de pé após o repouso. Nestes casos, o paciente deverá permanecer
em repouso absoluto deitado (preferencialmente em decúbito ventral) por 48 horas
seguidas e ingerir muito líquido, especialmente bebidas hidratantes com cafeína.
Em situações mais raras, a cefaléia pode se prolongar por mais tempo e o
médico deve ser contatado para maiores esclarecimentos e orientações.

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