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Você tem ideia de como veem as

crianças com baixa visão?


13/08/2017  2   Por MARIA AMÉLIA M. FRANCO

Hoje proponho um desafio: experimentar ver como uma


pessoa com baixa visão possivelmente vê. Talvez só assim
você possa entender do que ela precisa para ter melhor
autonomia e independência.
Mas já vou avisando que isso é muuuuito relativo!
Talvez essa seja a questão mais importante que pais e
professores devem compreender.
O que é capaz de ver e fazer uma criança com baixa visão é
algo muito variável e pessoal. A visão subnormal é
uma condição intermediária entre a visão normal e a
cegueira e mesmo a correção com lentes ou óculos não é
suficiente para que ela enxergue bem. Ou seja, que ela
perceba o tamanho, a forma, as cores e o contorno de objetos
próximos ou distantes.
Por isso é tão importante falar disso e entender suas limitações
e suas superações.

Baixa visão: nem cego, nem vidente


Dizer que uma criança tem baixa visão é vago. Existem infinitas
possibilidades visuais entre a escuridão e a nitidez, não é
mesmo?
É complexo, pois a dificuldade para ver depende do nível de
comprometimento das funções visuais e de como a criança
usa da melhor forma o seu resíduo visual (o que lhe resta de
visão).
Pense que essa dificuldade pode estar relacionada à

 redução da acuidade, perdendo a nitidez do que é


observado;
 maior sensibilidade ao contraste, deixando de reconhecer
faces e o contorno das letras, de perceber os degraus de
escadas, ou até mesmo quando um copo já está cheio de
água;
 ao desconforto visual ou menor resolução da imagem
conforme a luz incide;
 redução do campo visual (restando visão central, setorial
ou periférica)
 presença de escotomas, que são como manchas escuras
dispersas que obstruem a imagem; e/ou a
 alterações na percepção de cores.

Então, como saber do que ela precisa para facilitar o


reconhecimento das coisas, a realização das atividades de vida
diária e a sua mobilidade?
Só há uma forma: avaliando o funcionamento da visão ou,
como costuma-se dizer, a função visual. Geralmente isso se
atribui a uma equipe multidisciplinar formada por
oftalmologista, optometrista, terapeuta e/ou professor
especializado e capacitado em deficiência visual.
Há importantes instituições voltadas ao atendimento de
pessoas com deficiência visual que são um importante alicerce
e um estímulo para a inclusão. Veja relação de alguns em
grandes centros aqui.

Como a criança com baixa visão enxerga?


Que tal fazer um pequeno experimento para entender na
prática como é? Veja o que tentei fazer por aqui, pensando que
seria algo fácil para você fazer aí também.

Para cobrir a lentes dos meus óculos eu usei papel de seda e canetinha
própria para vidros da Crayola, pois é lavável.
Eu senti um baita desconforto! Foi notável eu fazendo movimentos com a
cabeça para buscar o ângulo que me permitisse ver melhor por trás das
“manchas”. E a experiência com o papel de seda sobre as lentes foi de
certa forma angustiante. Perdi a qualidade do que vi, tudo ficou sem
contraste e ofuscado.
Claro que com os óculos eu não tive total bloqueio do meu campo de
visão periférico, mas ainda assim valeu!
Para você ter uma ideia, de acordo com o perfil de resposta visual, a
criança com baixa visão pode ver sem nitidez, uma imagem estreita e/ou
com manchas que criam pontos cegos. Foi isso que vivenciei com os
óculos acima.
Agora observe no quadro a seguir como esta imagem seria vista por
crianças com diferentes diagnósticos indicativos de baixa visão.
Fonte – Sampaio, MW; Haddad [et al.] Baixa visão e cegueira: os caminhos para a
reabilitação, a educação e a inclusão. Rio de Janeiro: Cultura Médica, Guanabara
Koogan, 2010
Por isso, a maioria das crianças com baixa visão precisa lançar mão
da tecnologia assistiva em seu dia a dia dentro e fora da escola.
O que é isso? É todo tipo de dispositivo, auxílio, adaptação… que
elimine as barreiras para a locomoção, as tarefas rotineiras e a
aprendizagem das pessoas com deficiência, incapacidades ou
mobilidade reduzida.
Tem uma frase que para quem já estudou sobre inclusão é até bem
batidinha… mas acho que ela diz muito e sempre faz refletir:
Para as pessoas sem deficiência, a tecnologia torna as coisas
mais fáceis.
Para as pessoas com deficiência, a tecnologia torna as coisas
possíveis. 
Mary Pat Radabaugh
Antiga diretora do Centro Nacional de Apoio para Pessoas com Deficiência da IBM,
nos EUA.

As adaptações mudam essa realidade


O mundo dos sonhos seria que toda criança com visão subnormal
tivesse acesso a auxílios ópticos, não-ópticos e/ou eletrônicos, que
tornassem as adaptações de tamanho, contraste, brilho e iluminação
viáveis. Veja no quadro abaixo como isso faz toda a diferença!
Mas essas adaptações ainda são um desafio. Os recursos ópticos e
eletrônicos – como lentes especiais, lupas, sistemas telescópicos e de
videoampliação – requerem conhecimento técnico para avaliação e
uma correta indicação (um trabalho para aquela equipe multidisciplinar
que comentei antes). Tem ainda o custo de aquisição e o treinamento,
por isso é tão importante contar com uma instituição ou um
profissional especializado em baixa visão para este fim – o que não é
a realidade do nosso Brasilzão, eu sei.
Por outro lado, adaptações de ambiente e os auxílios não ópticos são
mais simples e acessíveis. Uma cortina ou anteparo na janela já
ajudam a controlar a entrada de luz que ofusca uma leitura em casa
ou no quadro negro da escola (vale dizer aqui que aqueles quadros
brancos não são uma boa ideia, pois o brilho deles prejudica ainda
mais a visibilidade). Bem como aumentar ilustrações, as fontes e os
espaçamentos dos textos, ofertar leitura em papel fosco ou até mesmo
usar acetato amarelo sobre a página para melhorar o contraste.
E assim vai. Todo cuidado e carinho para ajustar o tamanho dos
materiais, melhorar o contraste e o conforto visual para brincar, ler e
escrever contam! É como um trabalho sob medida.
Bem, detalhar como devem ser todas essas adaptações fica para uma
próxima postagem. É muita coisa!
Se ainda quer entender mais como seria ver com catarata, glaucoma e
retinopatia, de acordo com a severidade? Indico este simulador que é
um projeto da FRED HOLLOWS FOUNDATION, uma organização
internacional dedicada à prevenção da cegueira. Simule
em simulator.seenow.org/webgl.html
E para aprofundar bem no assunto, sugiro uma das publicações mais
completas sobre baixa visão:
Baixa visão e cegueira: os caminhos para a reabilitação, a educação
e a inclusão.
Autores: Marcos Wilson Sampaio, Maria Aparecida Onuki Haddad,
Helder Alves da Costa Filho, Mara Olimpia de Campos Siaulys
Editora: Cultura Médica, Guanabara Koogan, 2010

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