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Fichamento: STEIN, Stanley e Barbara H. Stein. A Herança Colonial da América


Latina. pp. 97-119.

A base econômica do neocolonialismo

O texto começa abordando sobre os relatos, do século XIX, que os europeus faziam
sobre os recursos naturais da América Latina, descrevendo que suas tecnologias e o
capital estrangeiro estimularam o crescimento da região, constituindo uma herança
colonial. Assim, o autor deixa claro, salvo algumas exceções que as nações ex-
coloniais não escaparam de imediato à herança da dependência. Porém, é relatado
que na América Latina houve inúmeras pressões voltadas para mudar o quadro de
dependência europeia.

O autor propõe nesse estudo a abordagem do desenvolvimento pós-colonial a partir


de duas perspectivas: a primeira seria sobre as estruturas econômicas e sua
transformação, e, a segunda, seria a abordagem das estruturas políticas, do papel
da ideologia e a mudança social.

O autor adverte que as afirmações propostas, não podem ser generalizadas, pois
estas podem levar a equívocos por considerar a vasta área que corresponde a
América Latina, onde os recursos naturais, composição étnica e os interesses de
grupos são diversos.

Sobre a análise da dimensão histórica de mudança econômica da América Latina, o


autor faz uma indagação de como duas áreas anteriormente colonial, os Estados
Unidos e a América Latina, desenvolveram padrões de crescimento econômico tão
diferentes após suas respectivas independências? Contudo, é mostrado que a
historiografia do século XIX, estaria carente de estudos que atendesse a certas
questões da história agrícola, comercial e financeira e por outro lado, o tratamento
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político não estaria direcionado por uma visão mais abrangente dos grupos de
pressão nacionais, regionais e internacionais. Todavia, o autor responde sobre a
indagação acima, afirmando que para encontrar uma resposta que sirva de base
para estudos comparativos entre essas áreas, Estados Unidos e América Latina, no
desenvolvimento pós-colonial, é levado para a questão que condiz aos complexos
culturais europeus (ingleses e ibéricos). Assim, o autor mostra a origem dos
elementos culturais em suas matrizes europeias, expondo que os colonizadores
ingleses, diferentemente dos espanhóis, saíram de uma Inglaterra em um período de
modernização, que encarava o conhecimento, a tolerância, os direitos individuais, a
liberdade econômica, a poupança e o investimento como elementos inseparáveis do
processo de transformação e crescimento.

Além disso, o meio natural era diferente do que foi encontrado nos solos, dos
Estados Unidos e da América Latina. Então, esse fator foi determinante no quesito
de exploração, pois os colonizadores da América do Norte por não encontrar minas
de metais preciosos na região decidiram expulsar ou assassinar os ameríndios
nômades, mostrando que na época da colonização, assim como no presente, a
condição indígena da América do Norte foi considerada irrelevante e periférica.
Contudo o autor indaga se a condição de recursos naturais fosse diferente, talvez a
colonização dessa área poderia ser de modo diverso.

Os fatores externos tiveram um papel importante no crescimento político e


econômico dos Estados Unidos, o texto expõe sobre o desenvolvimento da
manufatura náutica e das atividades mercantis, na região do Caribe e
posteriormente nas colônias do sul, estabeleceram bases para uma agricultura de
exploração utilizando mão de obra escrava. Outro fator a considerar diz respeito que
o processo de independência dos Estados Unidos teve apoio da França e da
Espanha e que notadamente essa ajuda trouxe prejuízos para esses países. Em
contrapartida, o autor expõe que as colônias espanholas no processo de
independência não obtiveram nenhuma assistência vinda de fora. Outro fator a
considerar sobre a consolidação e crescimento da economia norte-americana, diz
respeito que durante período do bloqueio continental os comerciantes
estadunidenses e construtores navais exportaram para Europa os seus produtos.
Assim, é visto que as exportações reforçaram a estrutura financeira.
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É observado que ao norte dos Estados Unidos, no século XIX, tinha adquirido
contornos de um centro financeiro e ao sul era voltado para atividade agrícola.
Porém, é observado que após a ocupação e colonização do oeste houve uma crise
interna, desencadeando para uma guerra civil. Nesse período da Guerra de
Sucessão, os Estados Unidos já haviam sido estimulados por fatores externos e pela
criação de um mercado nacional que posteriormente viria a surgir a industrialização
norte-americana.

Nesse tópico, o autor chama a atenção sobre a herança colonial e sobre as


condições externas antes, durante e depois do processo de independência dos
Estados latino-americanos, visto que os velhos conflitos de interesse permaneceram
insolúveis por muito tempo e em decorrência disso, houve o desencadeamento de
diversas guerras civis.

Sobre o movimento de independência da América Latina, é correto afirmar que a


grande parte da elite colonial ansiava por manter a aliança com a Espanha,
desfrutando do direito de comercializar com a Europa e com os Estados Unidos.
Percebe-se que a elite não desejava transformar a sociedade, mas sim, ampliar o
acesso e o gozo de posições que permitissem compartilhar o monopólio rentável,
buscando com isso, tornar o sistema econômico colonial racional em termos de seu
próprio interesse.

O texto traz ainda a informação que o houve ainda problemas entre as capitais e as
sub-regiões, pois era notado que ambos desejavam manter a sua posição no
comércio externo e interno, trazendo uma grande instabilidade interna. Contudo, é
percebido que todos tinham um interesse em comum, defendiam a federação.

Assim, é visto que as novas nações foram divididas pelos conflitos: entre aqueles
que desejavam monopolizar todo o comércio interno e externo, de um lado, e
aqueles que buscavam ocupar posições monopolísticas locais; entre aqueles
desejosos de proteger a produção artesanal local e aqueles interessados na
comercialização de artigos importados mais baratos; entre aqueles que favoreciam o
fomento à agricultura e aqueles que prestigiavam a atividade mineira ou industrial.
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Percebe-se com isso, que as regiões não forçaram de imediato em uma unidade
nacional, inexistindo a unificação de uma política econômica.

Outro fator a considerar diz respeito que por uma série de problemas internos a
América Latina foi forçada a desempenhar o papel de fornecedora de matérias-
primas, para poder reembolsar o valor correspondente às importações das
manufaturas inglesas, visto que, o comércio inglês acabou com a indústria local de
tecnologia primitiva. Assim, a herança econômica colonial foi reforçada pelas
condições locais e pela pressão econômica inglesa. O autor deixa claro que essa
herança colonial retardou a formação que hoje denominamos de sociedades
modernizadas.

O autor argumenta que o crescimento econômico latino-americano (diversificação


econômica e industrialização) não poderia ter lugar enquanto persistissem os
padrões coloniais de produção, acumulação e investimento de capital, distribuição e
utilização de renda. Portanto, a inexistência de uma economia autônoma e auto-
sustentada fortalece a herança e as barreiras deixadas pelo colonialismo na América
Latina após 1824.

A herança colonial mais significativa foi as grandes propriedades voltadas para a


agricultura interna e o cultivo de matérias-primas voltadas para o comércio exterior.
Essas áreas eram vistas como representantes de um tipo de organização social,
fonte de prestígio e poder político, de riqueza e renda.

No século XX é visto que a base da oligarquia latino-americana ergueu seu


predomínio tomando como base a monopolização da posse da terra.

O autor descreve sobre a concentração de propriedade e de trabalho na América


Latina. É observado no México que no final do século XVIII existiam conflitos entre
os proprietários e a força de trabalho dependente ou entraves entre os indígenas.
Por volta do século XIX, com toda a devastação das propriedades com o processo
das independências, é percebido que não houve uma reforma agrária, as terras
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indígenas e as propriedades religiosas e públicas passaram para a propriedade


privada.

Assim, o México neocolonial completou a conquista da terra e a mobilização da força


de trabalho nativa para o lucro da empresa privada, todo esse processo é
apresentado como semelhante ao processo da colonização espanhola do século
XVII. Por essa distribuição de terras no México o autor argumenta que foi uma
espécie de esforço clássico, voltado para a livre empresa, em busca da
modernização da agricultura, objetivando a seguir e fomentar a industrialização.

O México maximizou o apoio para a iniciativa privada liberando o acesso para o


extrativismo mineral, subsidiando para a construção de ferrovias que ligavam para o
litoral, facilitando para o comércio exportador e incentivou o mercado interno a
absorver a produção agrícola e industrial. Esse crescimento econômico sem dúvidas
afetou muito para o pequeno produtor, pois geraram tensões que se tornaram
intoleráveis desencadeando para uma guerra civil que acabou, pela revolução social
que se seguiu, destruindo a herança colonial da fazenda. No século XX é observado
que o México seria o único país latino-americano a ter destruído os símbolos e a
realidade desse antigo sistema sócio-econômico.

O texto aborda sobre as passagens da terra para o domínio privado, visto que ao
longo do século XIX não deixaram os efeitos sociais visíveis, no caso do México. Na
Argentina é notado que ela emergiu de sua posição colonial como nação
caracterizada por vastas regiões de pradaria, adequada para a pecuária. Porém o
autor aborda que as lutas internas provocaram o retardamento da exportação de
carne.

Por volta de 1853, é percebido que as grandes estancias pecuárias (herança


colonial) foram vendidas ou locadas, nos anos que sucederam é notado que os
locatários das terras recebem títulos de posse. Esse dado sugere sobre o tipo de
distribuição de terras posto em prática no país. Contudo, o autor observa que as
melhores terras ficavam nas mãos de empresas privadas de grandes dimensões. O
autor faz menção sobre a imigração de 100 mil pessoas para trabalhar nas
propriedades oligárquicas.
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Por fim, mostra que a combinação de padrões coloniais de propriedade da terra,


demanda externa e divisão internacional do trabalho acabaria por incorporar a
Argentina no mercado mundial.

O Brasil do século XIX, fora sem dúvida um exemplo da herança colonial da


agricultura de exportação baseada na exploração da mão-de-obra escrava. É
percebido que esse modelo delineou os padrões de transformação econômica e
social no período pós-colonial, gerando uma estrutura neocolonial de inevitáveis
consequências sociais. O texto mostra que ao longo do século XIX, o país
continuava essencialmente agrícola e uma feitoria comercial ao longo da costa
atlântica para as nações desenvolvidas do mundo.

O Brasil, desde a chegada dos portugueses, havia sido inserido na economia


mundial através da exportação de matérias-primas. Houve uma estagnação
econômica no início do século XIX, com o fim do tráfico de escravos africanos.
Começa-se a introduzir, timidamente, indústrias, porém o país carecia de mão-de-
obra especializada. Esse projeto fracassou, pois além dos motivos mostrados
anteriormente tinha a Inglaterra que continuava a dominar a economia brasileira,
introduzindo no seu mercado brasileiro seus produtos, impossibilitando que o país
exportasse alguns dos seus produtos.

O café foi mostrado como um produto impulsionador na economia, permitindo que


as exportações cafeeiras ultrapassassem a casa dos 40% das exportações do país.
Outro fator relevante seria que os cafeicultores detiveram de influencias políticas
gerando a formação de grandes propriedades voltadas para o cultivo de café.

Sobre a mão-de-obra escrava africana, é visto que no início do século XIX, o Brasil
trouxe cerca 2,25 milhões de escravos e ao longo do século mais 1,35 milhões de
escravos para trabalhar nas fazendas açucareiras do nordeste e nas fazendas
cafeeiras do Rio de Janeiro. Os grupos de pressão política que permitiram a
manutenção do tráfico de escravos merece ser objeto de análise, já que, os ingleses
queriam o fim do tráfico.

Com a abolição da escravatura concretizada (1888), é percebido que houve uma


concentração de escravos nas áreas cafeeiras no sudeste. Ao longo do tempo a
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produtividade do café entra em declínio em decorrência da idade avançada dos


escravos e da exaustão do solo. Em decorrência foi observado o desenvolvimento
da rede ferroviária e a vinda dos imigrantes, impulsionando o cultivo do café para o
interior do país. Porém é observado que o processo econômico brasileiro houve a
presença de orientação estrangeira.

O autor argumenta que houve transformações nos padrões do setor externo da


economia latino-americana. Com o comércio livre, possibilitou a entrada de navios
estrangeiros que pela introdução dos seus produtos no comercio local os governos
instituíram taxas alfandegárias, constituindo uma fonte de receita. O texto mostra
que os comerciantes estrangeiros representavam os padrões considerados
superiores e mais cultos pelas elites crioullas, mostrando que esses comerciantes
estrangeiros trouxeram padrões de vida, vestimenta, mobiliário e de cozinha. Outro
fato seria a literatura produzida pelos viajantes, pois estes descreviam com senso de
etnocentrismo diante das novas nações latino-americanas, mostrando em seus
relatos o sentimento de atraso e de inferioridade.

Outro aspecto a considerar retrata que os comerciantes ingleses, franceses e


americanos não conseguiram dominar as economias nacionais até o nível do
comércio varejista, já no comércio atacadista verificou o desenvolvimento de artigos
importados. Na metade do século XIX, o círculo de grandes importadores fora
ampliado, mas o autor observa que de modo semelhante ao período colonial, os
estrangeiros dominaram a oferta e os preços das importações e das exportações,
bem como os fluxos de intercâmbio comercial.

A língua foi outro fator que possibilitou que o comércio urbano e rural permanecesse
nas mãos dos portugueses e espanhóis, intermediando com o comércio
internacional. Assim, os ibéricos preservaram a infraestrutura herdada nos tempos
coloniais. Mesmo com as sociedades pós-independência é percebido que esses
comerciantes emergiram como figura altamente prestigiada na sociedade, já os
comerciantes estrangeiros detinham de um prestígio ainda maior na medida que os
governos de seus países de origem protestavam sempre que seus interesses
fossem afetados por quaisquer políticas governamentais (comerciantes ingleses).
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O autor relata que os comerciantes, banqueiros e embarcadores ingleses foram os


que mais se beneficiaram com o colonialismo sobre a América ao longo do século
XVIII. Mostra que essa posição inglesa só fez aumentar nos séculos posteriores.
Londres passou a centralizar a vida financeira, manipulando pagamentos
internacionais aos exportadores franceses, alemães e norte-americanos que por sua
vez vendiam para a América Latina.

A investimento inglês ao longo do século XIX possibilitou a entrada e a ampliação


das ferrovias no México, Argentina e Brasil para estimular o desenvolvimento de
suas indústrias e fomentaram as exportações da agricultura, pecuária e mineração
latino-americanas.

Mesmo com a distribuição econômica voltada para o interior das regiões é percebido
que os ingleses ampliaram o seu papel nessas nações, pois o autor relata que a
Inglaterra fornece tecnologia, equipamentos, manutenções e investimentos para a
urbanização. Esses fatores são vistos como fundamentais para a destruição do
imperialismo ibérico. Assim, os ingleses constituíram um império informal do livre
comércio e investimento.

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