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C AP ÍTU LO V

P ROCES S O DE T RAB ALHO E P ROCES S O DE V ALORIZAÇÃO


1. O p ro c e s s o d e tra ba lh o

A u t iliza çã o da for ça de t r a ba lh o é o pr ópr io t r a ba lh o. O com -


pr a dor da for ça de t r a ba lh o a con som e a o fa zer t r a ba lh a r o ven dedor
dela . O ú lt im o t or n a -se, desse m odo, actu ,279 for ça de t r a ba lh o r ea lm en t e
a t iva , o qu e a n t es er a a pen a s poten tia. 280 P a r a r epr esen t a r seu t r a ba lh o
em m er ca dor ia s, ele t em de r epr esen t á -lo, sobr et u do, em va lor es de
u so, em coisa s qu e sir va m pa r a sa t isfa zer a n ecessida des de a lgu m a
espécie. É, portanto, um valor de uso particular, um artigo determ inado,
que o capitalista faz o trabalhador produzir. A produção de valores de
uso ou bens não muda sua natureza geral por se realizar para o capitalista
e sob seu controle. Por isso, o processo de trabalho deve ser considerado
de início independentemente de qualquer form a social determinada.
An t es de t u do, o t r a ba lh o é u m pr ocesso en t r e o h om em e a
Na t u r eza , u m pr ocesso em qu e o h om em , por su a pr ópr ia a çã o, m edia ,
r egu la e con t r ola seu m et a bolism o com a Na t u r eza . E le m esm o se
defr on t a com a m a t ér ia n a t u r a l com o u m a for ça n a t u r a l. E le põe em
m ovim en t o a s for ça s n a t u r a is per t en cen t es a su a cor por a lida de, br a ços
e per n a s, ca beça e m ã o, a fim de a pr opr ia r -se da m a t ér ia n a t u r a l n u m a
for m a ú t il pa r a su a pr ópr ia vida . Ao a t u a r , por m eio desse m ovim en t o,
sobr e a Na t u r eza ext er n a a ele e a o m odificá -la , ele m odifica , a o m esm o
t em po, su a pr ópr ia n a t u r eza . E le desen volve a s pot ên cia s n ela a dor -
m ecida s e su jeit a o jogo de su a s for ça s a seu pr ópr io dom ín io. Nã o se
t r a t a a qu i da s pr im eir a s for m a s in st in t iva s, a n im a is, de t r a ba lh o. O
est a do em qu e o t r a ba lh a dor se a pr esen t a n o m er ca do com o ven dedor
de su a pr ópr ia for ça de t r a ba lh o deixou pa r a o fu n do dos t em pos pr i-
m it ivos o est a do em qu e o t r a ba lh o h u m a n o n ã o se desfez a in da de
su a pr im eir a for m a in st in t iva . P r essu pom os o t r a ba lh o n u m a for m a

279 De fa t o. (N. dos T.)


280 E m pot en cia l. (N. dos T.)

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OS ECON OMIS TAS

em qu e per t en ce exclu siva m en t e a o h om em . Um a a r a n h a execu t a ope-


r a ções sem elh a n t es à s do t ecelã o, e a a belh a en ver gon h a m a is de u m
a r qu it et o h u m a n o com a con st r u çã o dos fa vos de su a s colm eia s. Ma s
o qu e dist in gu e, de a n t em ã o, o pior a r qu it et o da m elh or a belh a é qu e
ele con st r u iu o fa vo em su a ca beça , a n t es de con st r u í-lo em cer a . No
fim do pr ocesso de t r a ba lh o obt ém -se u m r esu lt a do qu e já n o in ício
dest e exist iu n a im a gin a çã o do t r a ba lh a dor , e por t a n t o idea lm en t e.
E le n ã o a pen a s efet u a u m a t r a n sfor m a çã o da for m a da m a t ér ia n a t u r a l;
r ea liza , a o m esm o t em po, n a m a t ér ia n a t u r a l seu objet ivo, qu e ele
sa be qu e det er m in a , com o lei, a espécie e o m odo de su a a t ivida de e
a o qu a l t em de su bor din a r su a von t a de. E essa su bor din a çã o n ã o é
u m a t o isola do. Além do esfor ço dos ór gã os qu e t r a ba lh a m , é exigida
a von t a de or ien t a da a u m fim , qu e se m a n ifest a com o a t en çã o du r a n t e
t odo o t em po de t r a ba lh o, e isso t a n t o m a is qu a n t o m en os esse t r a ba lh o,
pelo pr ópr io con t eú do e pela espécie e m odo de su a execu çã o, a t r a i o
t r a ba lh a dor , por t a n t o, qu a n t o m en os ele o a pr oveit a , com o jogo de su a s
pr ópr ia s for ça s física s e espir it u a is.
Os elem en t os sim ples do pr ocesso de t r a ba lh o sã o a a t ivida de
or ien t a da a u m fim ou o t r a ba lh o m esm o, seu objet o e seu s m eios.
A t er r a (qu e do pon t o de vist a econ ôm ico in clu i t a m bém a á gu a ),
com o fon t e or igin a l de víver es e m eios já pr on t os de su bsist ên cia pa r a
o h om em ,281 é en con t r a da sem con t r ibu içã o dele, com o objet o ger a l do
t r a ba lh o h u m a n o. Toda s a s coisa s qu e o t r a ba lh o só despr en de de su a
con exã o dir et a com o con ju n t o da t er r a , sã o objet os de t r a ba lh o pr ee-
xist en t es por n a t u r eza . Assim o peixe qu e se pesca a o sepa r á -lo de
seu elem en t o de vida , a á gu a , a m a deir a qu e se a ba t e n a flor est a
vir gem , o m in ér io qu e é a r r a n ca do de seu filã o. Se, a o con t r á r io, o
pr ópr io objet o de t r a ba lh o já é, por a ssim dizer , filt r a do por m eio de
t r a ba lh o a n t er ior , den om in a m o-lo m a t ér ia -pr im a . P or exem plo, o m i-
n ér io já a r r a n ca do qu e a gor a va i ser la va do. Toda m a t ér ia -pr im a é
objet o de t r a ba lh o, m a s n em t odo objet o de t r a ba lh o é m a t ér ia -pr im a .
O objet o de t r a ba lh o a pen a s é m a t ér ia -pr im a depois de já t er exper i-
m en t a do u m a m odifica çã o m edia da por t r a ba lh o.
O m eio de t r a ba lh o é u m a coisa ou u m com plexo de coisa s qu e
o t r a ba lh a dor coloca en t r e si m esm o e o objet o de t r a ba lh o e qu e lh e
ser ve com o con du t or de su a a t ivida de sobr e esse objet o. E le u t iliza a s
pr opr ieda des m ecâ n ica s, física s, qu ím ica s da s coisa s pa r a fa zê-la s a t u a r
com o m eios de poder sobr e ou t r a s coisa s, con for m e o seu objet ivo.282

281 "Os pr odu t os n a t u r a is da t er r a , exist en t es em pequ en a s qu a n t ida des e t ot a lm en t e in de-


pen den t es do h om em , pa r ecem ser da dos pela Na t u r eza do m esm o m odo qu e se dá a u m
jovem u m a pequ en a som a pa r a qu e possa t r a ba lh a r e fa zer su a for t u n a ." (STE UART, J a m es.
Prin ciples of Polit. E con . E dit . Du blin , 1770, v. I, p. 116.)
282 "A r a zã o é t ã o a r dilosa com o poder osa . O a r dil con sist e n a a t ivida de m edia dor a , a qu a l,
a o fa zer os objet os a t u a r em u n s sobr e os ou t r os e desga st a r em -se m u t u a m en t e, segu n do
sua pr ópria natur eza , sem se inserir dir etam ente nesse pr ocesso, toda via, rea liza apena s seu
pr óprio fim." (HEGEL. Enzyk lopaedie. P ar te Pr imeir a. “Die Logik”. Berlim , 1840. p. 382.)

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MARX

O objet o do qu a l o t r a ba lh a dor se a poder a dir et a m en t e — a bst r a in do


a colet a de m eios pr on t os de su bsist ên cia , fr u t a s, por exem plo, em qu e
som en t e seu s pr ópr ios ór gã os cor por a is ser vem de m eios de t r a ba lh o
— n ã o é objet o de t r a ba lh o, m a s o m eio de t r a ba lh o. Assim , m esm o o
n a t u r a l t or n a -se ór gã o de su a a t ivida de, u m ór gã o qu e ele a cr escen t a
a seu s pr ópr ios ór gã os cor por a is, pr olon ga n do su a figu r a n a t u r a l, a pesa r
da Bíblia . Do m esm o m odo com o a t er r a é su a despen sa or igin a l, é
ela seu a r sen a l or igin a l de m eios de t r a ba lh o. F or n ece-lh e, por exem plo,
a pedr a qu e ele la n ça , com qu e r a spa , pr en sa , cor t a et c. A pr ópr ia
t er r a é u m m eio de t r a ba lh o, m a s pr essu põe, pa r a ser vir com o m eio
de t r a ba lh o n a a gr icu lt u r a , u m a sér ie de ou t r os m eios de t r a ba lh o e
u m n ível de desen volvim en t o r ela t iva m en t e a lt o da for ça de t r a ba lh o.283
Tã o logo o pr ocesso de t r a ba lh o est eja em a lgu m a m edida desen volvido
de t odo, n ecessit a ele de m eios de t r a ba lh o já t r a ba lh a dos. Na s ca ver n a s
h u m a n a s m a is a n t iga s en con t r a m os in st r u m en t os de pedr a e a r m a s
de pedr a . Ao la do de pedr a , m a deir a , osso e con ch a s t r a ba lh a dos, o
a n im a l dom est ica do e, por t a n t o, já m odifica do por t r a ba lh o, desem pe-
n h a n o in ício da h ist ór ia h u m a n a o pa pel pr in cipa l com o m eio de t r a -
ba lh o.284 O u so e a cr ia çã o de m eios de t r a ba lh o, em bor a exist a m em
ger m e em cer t a s espécies de a n im a is, ca r a ct er iza m o pr ocesso de t r a -
ba lh o especifica m en t e h u m a n o e F r a n klin defin e, por isso, o h om em
com o a toolm ak in g an im al, u m a n im a l qu e fa z fer r a m en t a s. A m esm a
im por t â n cia qu e a est r u t u r a de ossos fósseis t em pa r a o con h ecim en t o
da or ga n iza çã o de espécies de a n im a is desa pa r ecida s, os r est os dos
m eios de t r a ba lh o t êm pa r a a a pr ecia çã o de for m a ções sócioecon ôm ica s
desa pa r ecida s. Nã o é o qu e se fa z, m a s com o, com qu e m eios de t r a ba lh o
se fa z, é o qu e dist in gu e a s época s econ ôm ica s.285 Os m eios de t r a ba lh o
n ã o sã o só m edidor es do gr a u de desen volvim en t o da for ça de t r a ba lh o
h u m a n a , m a s t a m bém in dica dor es da s con dições socia is n a s qu a is se
t r a ba lh a . E n t r e os m eios de t r a ba lh o m esm os, os m eios m ecâ n icos de
t r a ba lh o, cu jo con ju n t o pode-se ch a m a r de sist em a ósseo e m u scu la r
da pr odu çã o, ofer ecem m a r ca s ca r a ct er íst ica s m u it o m a is decisiva s de
u m a época socia l de pr odu çã o do qu e a qu eles m eios de t r a ba lh o qu e
a pen a s ser vem de r ecipien t es do objet o de t r a ba lh o e cu jo con ju n t o
pode-se design a r , gen er a liza n do, de sist em a va scu la r da pr odu çã o,
com o, por exem plo, t u bos, ba r r is, cest a s, câ n t a r os et c. E les só com eça m
a desem pen h a r pa pel sign ifica t ivo n a fa br ica çã o qu ím ica .286

283 Ga n ilh , em seu escr it o, de r est o m iser á vel, T h éorie d e l’É con . Polit., P a r is, 1815, con fr on t a
a cer t a da m en t e os fisiocr a t a s com a la r ga sér ie de pr ocessos de t r a ba lh o qu e con st it u em o
pr essu post o da pr ópr ia a gr icu lt u r a .
284 E m R éflexion s su r la Form ation et la Distribu tion d es R ich esses (1766) Tu r got desen volve
bem a im por t â n cia do a n im a l dom est ica do pa r a os in ícios da cu lt u r a .
285 As pr ópr ia s m er ca dor ia s de lu xo sã o, de t oda s a s m er ca dor ia s, a s m en os sign ifica t iva s pa r a
a com pa r a çã o t ecn ológica de diver sa s época s de pr odu çã o.
286 Not a à 2ª ediçã o. P or pou co qu e a h ist or iogr a fia a t é a gor a con h eça o desen volvim en t o da
pr odu çã o m a t er ia l, a ba se, por t a n t o, de t oda vida socia l e por isso de t oda ver da deir a

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OS ECON OMIS TAS

Além da s coisa s qu e m edia m a a t u a çã o do t r a ba lh o sobr e seu


objet o e, por isso, ser vem , de u m m odo ou de ou t r o, de con du t or da
a t ivida de, o pr ocesso de t r a ba lh o con t a , em sen t ido la t o, en t r e seu s
m eios com t oda s a s con dições objet iva s qu e sã o exigida s pa r a qu e o
pr ocesso se r ea lize. E st a s n ã o en t r a m dir et a m en t e n ele, m a s sem ela s
ele n ã o pode decor r er a o t odo ou só deficien t em en t e. O m eio u n iver sa l
de t r a ba lh o desse t ipo é a pr ópr ia t er r a , pois ela dá a o t r a ba lh a dor o
locu s stan d i 287 e a o pr ocesso dele o ca m po de a çã o (field of em ploym en t).
Meios de t r a ba lh o desse t ipo, já m edia dos pelo t r a ba lh o, sã o por exem plo
edifícios de t r a ba lh o, ca n a is, est r a da s et c.
No pr ocesso de t r a ba lh o a a t ivida de do h om em efet u a , por t a n t o,
m edia n t e o m eio de t r a ba lh o, u m a t r a n sfor m a çã o do objet o de t r a ba lh o,
pr et en dida desde o pr in cípio. O pr ocesso ext in gu e-se n o pr odu t o. Seu
pr odu t o é u m va lor de u so; u m a m a t ér ia n a t u r a l a da pt a da à s n eces-
sida des h u m a n a s m edia n t e t r a n sfor m a çã o da for m a . O t r a ba lh o se
u n iu com seu objet ivo. O t r a ba lh o est á objet iva do e o objet o t r a ba lh a do.
O qu e do la do do t r a ba lh a dor a pa r ecia n a for m a de m obilida de a pa r ece
a gor a com o pr opr ieda de im óvel n a for m a do ser , do la do do pr odu t o.
E le fiou e o pr odu t o é u m fio.
Con sider a n do-se o pr ocesso in t eir o do pon t o de vist a de seu r e-
su lt a do, do pr odu t o, a pa r ecem a m bos, m eio e objet o de t r a ba lh o, com o
m eios de pr odu çã o,288 e o t r a ba lh o m esm o com o t r a ba lh o pr odu t ivo.289
Qu a n do u m va lor de u so sa i do pr ocesso de t r a ba lh o com o pr odu t o,
ou t r os va lor es de u so, pr odu t os de pr ocessos a n t er ior es de t r a ba lh o,
en t r a m n ele com o m eios de pr odu çã o. O m esm o va lor de u so con st it u i
o pr odu t o desse t r a ba lh o, e o m eio de pr odu çã o da qu ele. P r odu t os sã o,
por isso, n ã o só r esu lt a dos, m a s a o m esm o t em po con dições do pr ocesso
de t r a ba lh o.
E xcet o a s in dú st r ia s ext r a t iva s, cu jo objet o de t r a ba lh o é pr ee-
xist en t e por n a t u r eza , com o m in er a çã o, ca ça , pesca et c. (a a gr icu lt u r a
só n o ca so em qu e se desbr a va m t er r a s vir gen s), t odos os r a m os in -
du st r ia is pr ocessa m u m objet o qu e é m a t ér ia -pr im a , ist o é, u m objet o
de t r a ba lh o já filt r a do pelo t r a ba lh o, ele m esm o já pr odu t o de t r a ba lh o.
Assim , por exem plo, a sem en t e n a a gr icu lt u r a . An im a is e pla n t a s, qu e
se cost u m a m con sider a r pr odu t os da Na t u r eza , n ã o sã o a pen a s pr odu t os
t a lvez do t r a ba lh o do a n o pa ssa do, m a s, em su a s for m a s a t u a is, pr o-
du t os de u m a t r a n sfor m a çã o con t in u a da por m u it a s ger a ções, sob con -

H ist ór ia , pelo m en os dividiu -se o t em po pr é-h ist ór ico com ba se em pesqu isa s da s ciên cia s
n a t u r a is e n ã o da s ch a m a da s h ist ór ica s, em ida de da pedr a , do br on ze e do fer r o, segu n do
o m a t er ia l da s fer r a m en t a s e da s a r m a s.
287 Lu ga r pa r a fica r . (N. dos T.)
288 P a r ece u m pa r a doxo, por exem plo, con sider a r o peixe qu e a in da n ã o foi pesca do m eio de
pr odu çã o da pesca . Ma s a t é a gor a n ã o se in ven t ou a a r t e de pesca r em á gu a s on de n ã o
h a ja peixes.
289 E ssa det er m in a çã o de t r a ba lh o pr odu t ivo, t a l com o r esu lt a do pon t o de vist a do pr ocesso
sim ples de t r a ba lh o, n ã o ba st a , de m odo a lgu m , pa r a o pr ocesso de pr odu çã o ca pit a list a .

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MARX

t r ole h u m a n o e m edia da por t r a ba lh o h u m a n o. Qu a n t o a os m eios de


t r a ba lh o, pa r t icu la r m en t e, a gr a n de m a ior ia deles m ost r a a t é a o olh a r
m a is su per ficia l os vest ígios de t r a ba lh o a n t er ior .
A m a t ér ia -pr im a pode con st it u ir a su bst â n cia pr in cipa l de u m
pr odu t o ou só en t r a r em su a for m a çã o com o m a t ér ia a u xilia r . A m a t ér ia
a u xilia r é con su m ida pelo m eio de t r a ba lh o, com o ca r vã o pela m á qu in a
a va por , óleo pela r oda , fen o pelo ca va lo de t ir o, ou é a cr escen t a da à
m a t ér ia -pr im a pa r a m odificá -la m a t er ia lm en t e, com o clor o a o lin h o
n ã o br a n qu ea do, ca r vã o a o fer r o, t in t a à lã , ou a póia a execu çã o do
pr ópr io t r a ba lh o, com o, por exem plo, a s m a t ér ia s u sa da s pa r a ilu m in a r
e a qu ecer o loca l de t r a ba lh o. A difer en ça en t r e m a t ér ia pr in cipa l e
m a t ér ia a u xilia r se con fu n de n a fa br ica çã o pr opr ia m en t e qu ím ica , por -
qu e n en h u m a da s m a t ér ia s-pr im a s a plica da s r ea pa r ece com o su bst â n -
cia do pr odu t o.290
Com o ca da coisa possu i m u it a s pr opr ieda des e, por isso, é ca pa z
de diver sa s a plica ções ú t eis, o m esm o pr odu t o pode con st it u ir a m a -
t ér ia -pr im a de pr ocessos de t r a ba lh o m u it o difer en t es. Gr ã o, por exem -
plo, é m a t ér ia -pr im a do m oleir o, do fa br ica n t e de a m ido, do dest ila dor ,
do cr ia dor de ga do et c. Tor n a -se m a t ér ia -pr im a de su a pr ópr ia pr odu çã o,
com o sem en t e. Assim , o ca r vã o pr ovém , com o pr odu t o, da in dú st r ia
de m in er a çã o, e en t r a n ela com o m eio de pr odu çã o.
O m esm o pr odu t o pode n o m esm o pr ocesso de t r a ba lh o ser vir de
m eio de t r a ba lh o e de m a t ér ia -pr im a . Na en gor da do ga do, por exem plo,
o ga do, a m a t ér ia -pr im a t r a ba lh a da , é a o m esm o t em po m eio de ob-
t en çã o de est r u m e.
Um pr odu t o qu e exist e n u m a for m a pr on t a pa r a o con su m o, pode
t or n a r -se, de n ovo, m a t ér ia -pr im a de ou t r o pr odu t o, com o a u va t or n a -se
m a t ér ia -pr im a do vin h o. Ou o t r a ba lh o despa ch a seu pr odu t o em for m a s
em qu e só pode ser u sa do, de n ovo, com o m a t ér ia -pr im a . Ma t ér ia -pr im a
n essa con diçã o se ch a m a pr odu t o sem i-ela bor a do e ser ia m a is bem
den om in a da pr odu t o in t er m ediá r io, com o, por exem plo, a lgodã o, lin h o,
fio et c. E m bor a m esm o já sen do pr odu t o, a m a t ér ia -pr im a or igin a l pode
t er qu e per cor r er t odo u m esca lã o de pr ocessos difer en t es, n os qu a is
fu n cion a sem pr e de n ovo, em for m a ca da vez m a is a lt er a da , com o m a -
t ér ia -pr im a , a t é o ú lt im o pr ocesso de t r a ba lh o qu e a expele com o m eio
a ca ba do de su bsist ên cia ou m eio a ca ba do de t r a ba lh o.
Vê-se: o fa t o de u m va lor de u so a pa r ecer com o m a t ér ia -pr im a ,
m eio de t r a ba lh o ou pr odu t o, depen de t ot a lm en t e de su a fu n çã o de-

290 St or ch dist in gu e en t r e a pr ópr ia m a t ér ia -pr im a , m atière, e a s m a t ér ia s a u xilia r es, m ate-


riau x.* Ch er bu liez den om in a a s m a t ér ia s a u xilia r es de m atières in stru m en tales.**
*
STORCH , H en r i. Cou rs d ’É con om ie Politiqu e, ou E xposition d es Prin cipes qu i Déterm in en t
la Prospérité d es N ation s. v. 1, Sã o P et er sbu r go, 1815. p. 228. (N. da E d. Alem ã .)
**
CH E RBULIE Z, A. R ich esse ou Pau vreté. E xposition d es Cau ses et d es E ffets d e la Dis-
tribu tion Actu elle d es R ich esses S ociales. P a r is, 1841, p. 14. (N. da E d. Alem ã .)

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OS ECON OMIS TAS

t er m in a da n o pr ocesso de t r a ba lh o, da posiçã o qu e n ele ocu pa , e com


a m u da n ça dessa posiçã o va r ia m essa s det er m in a ções.
Ao en t r a r em n ovos pr ocessos de t r a ba lh o com o m eios de pr odu -
çã o, os pr odu t os per dem , por isso, o ca r á t er de pr odu t o. E les só fu n -
cion a m a gor a com o fa t or es objet ivos do t r a ba lh o vivo. O fia n deir o t r a t a
o fu so a pen a s com o o m eio com o qu a l fia e o lin h o com o objet o qu e
fia . Com efeit o n ã o se pode fica r sem m a t er ia l de fia r e sem fu so. A
exist ên cia desses pr odu t os 291 é por t a n t o pr essu post a a o com eça r a fia r .
Ma s n esse pr ocesso m esm o im por t a t ã o pou co qu e o lin h o e o fu so
seja m pr odu t os de t r a ba lh o pa ssa do, com o n o a t o da a lim en t a çã o in -
t er essa qu e o pã o seja pr odu t o dos t r a ba lh os pa ssa dos do ca m pon ês,
do m oleir o, do pa deir o et c. Ao con t r á r io, se os m eios de pr odu çã o fa zem
va ler , n o pr ocesso de t r a ba lh o, seu ca r á t er com o pr odu t os de t r a ba lh o
pa ssa do, isso a con t ece som en t e por in t er m édio de seu s defeit os. Um a
fa ca qu e n ã o cor t a , o fio qu e se pa r t e con st a n t em en t e et c., lem br a m
viva m en t e o cu t eleir o A e o fia n deir o E . No pr odu t o bem ela bor a do,
ext in gu iu -se a a qu isiçã o de su a s pr opr ieda des ú t eis por in t er m édio do
t r a ba lh o pa ssa do.
Um a m á qu in a qu e n ã o ser ve n o pr ocesso de t r a ba lh o é in ú t il.
Além disso, su cu m be à for ça dest r u idor a do m et a bolism o n a t u r a l. O
fer r o en fer r u ja , a m a deir a a podr ece. F io qu e n ã o é u sa do pa r a t ecer
ou fa zer m a lh a é a lgodã o est r a ga do. O t r a ba lh o vivo deve a poder a r -se
dessa s coisa s, desper t á -la s den t r e os m or t os, t r a n sfor m á -la s de va lor es
de u so a pen a s possíveis em va lor es de u so r ea is e efet ivos. La m bida s
pelo fogo do t r a ba lh o, a pr opr ia da s por ele com o seu s cor pos, a n im a da s
a exer cer a s fu n ções de su a con cepçã o e voca çã o, é ver da de qu e ser ã o
t a m bém con su m ida s, por ém de u m m odo or ien t a do a u m fim , com o
elem en t os con st it u t ivos de n ovos va lor es de u so, de n ovos pr odu t os,
a pt os a in cor por a r -se a o con su m o in dividu a l com o m eios de su bsist ên cia
ou a u m n ovo pr ocesso de t r a ba lh o com o m eios de pr odu çã o.
Se, por t a n t o, pr odu t os exist en t es sã o n ã o só r esu lt a dos, m a s t a m -
bém con dições de exist ên cia do pr ocesso de t r a ba lh o, por ou t r o la do é
su a in t r odu çã o n ele, ist o é, seu con t a t o com t r a ba lh o vivo, o ú n ico
m eio de con ser va r e r ea liza r esses pr odu t os de t r a ba lh o pa ssa do com o
va lor es de u so.
O trabalho gasta seus elem entos m ateriais, seu objeto e seu meio,
os devora e é, portanto, processo de consumo. Esse consumo produtivo
distingue-se do consumo individual por consum ir o últim o os produtos
como meios de subsistência do indivíduo vivo, o primeiro, porém, com o
meios de subsistência do trabalho, da força de trabalho ativa do indivíduo.
O produto de consum o individual é, por isso, o próprio consum idor, o
resultado do consum o produtivo um produto distinto do consumidor.

291 4ª ed.: desse pr odu t o. (N. da E d. Alem ã .)

302
MARX

Na m edida em qu e seu m eio e objet o m esm os já seja m pr odu t os,


o t r a ba lh o con som e pr odu t os pa r a cr ia r pr odu t os ou ga st a pr odu t os
com o m eios de pr odu çã o de pr odu t os. Com o o pr ocesso de t r a ba lh o se
pa ssa or igin a lm en t e só en t r e o h om em e a t er r a , qu e pr eexist ia sem
su a cola bor a çã o, con t in u a m a ser vir -lh e a in da t a is m eios de pr odu çã o
pr eexist en t es por n a t u r eza e qu e n ã o r epr esen t a m n en h u m a com bin a -
çã o de m a t ér ia n a t u r a l e t r a ba lh o h u m a n o.
O pr ocesso de t r a ba lh o, com o o a pr esen t a m os em seu s elem en t os
sim ples e a bst r a t os, é a t ivida de or ien t a da a u m fim pa r a pr odu zir
va lor es de u so, a pr opr ia çã o do n a t u r a l pa r a sa t isfa zer a s n ecessida des
h u m a n a s, con diçã o u n iver sa l do m et a bolism o en t r e o h om em e a Na -
t u r eza , con diçã o n a t u r a l et er n a da vida h u m a n a e, por t a n t o, in depen -
den t e de qu a lqu er for m a dessa vida , sen do a n t es igu a lm en t e com u m
a t oda s a s su a s for m a s socia is. P or isso, n ã o t ivem os n ecessida de de
a pr esen t a r o t r a ba lh a dor em su a r ela çã o com ou t r os t r a ba lh a dor es. O
h om em e seu t r a ba lh o, de u m la do, a Na t u r eza e su a s m a t ér ia s, do
ou t r o, ba st a va m . Tã o pou co qu a n t o o sa bor do t r igo r evela qu em o
pla n t ou , podem -se r econ h ecer n esse pr ocesso a s con dições em qu e ele
decor r e, se sob o br u t a l a çoit e do feit or de escr a vos ou sob o olh a r
a n sioso do ca pit a list a , se Cin cin n a t u s o r ea liza a o cu lt iva r su a s pou ca s
ju gera 292 ou o selva gem a o a ba t er u m a fer a com u m a pedr a .293
Volt em os a o n osso ca pit a list a in spe.294 Deixa m o-lo logo depois
de ele t er com pr a do n o m er ca do t odos os fa t or es n ecessá r ios a u m
pr ocesso de t r a ba lh o, os fa t or es objet ivos ou m eios de pr odu çã o e o
fa t or pessoa l ou a for ça de t r a ba lh o. Com o olh a r sa ga z de con h ecedor ,
ele escolh eu os m eios de pr odu çã o e a s for ça s de t r a ba lh o a dequ a dos
pa r a seu n egócio pa r t icu la r , fia çã o, fa br ica çã o de bot a s et c. Nosso ca -
pit a list a põe-se en t ã o a con su m ir a m er ca dor ia qu e ele com pr ou , a
for ça de t r a ba lh o, ist o é, ele fa z o por t a dor da for ça de t r a ba lh o, o
t r a ba lh a dor , con su m ir os m eios de pr odu çã o m edia n t e seu t r a ba lh o.
A n a t u r eza ger a l do pr ocesso do t r a ba lh o n ã o se a lt er a , n a t u r a lm en t e,
por execu t á -lo o t r a ba lh a dor pa r a o ca pit a list a , em vez de pa r a si
m esm o. Ma s t a m bém o m odo específico de fa zer bot a s ou de fia r n ã o
pode a lt er a r -se de in ício pela in t r om issã o do ca pit a list a . E le t em de
t om a r a for ça de t r a ba lh o, de in ício, com o a en con t r a n o m er ca do e,
por t a n t o, t a m bém seu t r a ba lh o da m a n eir a com o se or igin ou em u m

292 J eir a s. (N. dos T.)


293 P or essa r a zã o a lt a m en t e lógica , o Cor on el Tor r en s deve t er descober t o n a pedr a do selva gem
— a or igem do ca pit a l. “Na pr im eir a pedr a qu e o selva gem a t ir a n a best a qu e per segu e,
n o pr im eir o pa u qu e a pa n h a pa r a der r u ba r a fr u t a qu e n ã o pode a lca n ça r com a s m ã os,
vem os a a pr opr ia çã o de u m a r t igo pa r a o fim de a dqu ir ir ou t r o e descobr im os a ssim — a
or igem do ca pit a l.” (TORRE NS, R. An E ssay on th e Prod u ction of Wealth et c. p. 70-71.)
Da qu ele pr im eir o pa u * explica-se provavelm en te por qu e, em in glês, stock é sin ôn im o de
ca pit a l.
*
St ock, em a lem ã o (N. dos T.)
294 E m a spir a çã o. (N. dos T.)

303
OS ECON OMIS TAS

per íodo em qu e a in da n ã o h a via ca pit a list a s. A t r a n sfor m a çã o do pr ó-


pr io m odo de pr odu çã o m edia n t e a su bor din a çã o do t r a ba lh o a o ca pit a l
só pode ocor r er m a is t a r de e deve por isso ser con sider a da som en t e
m a is a dia n t e.
O pr ocesso de t r a ba lh o, em seu decu r so en qu a n t o pr ocesso de
con su m o da for ça de t r a ba lh o pelo ca pit a list a , m ost r a dois fen ôm en os
pecu lia r es.
O t r a ba lh a dor t r a ba lh a sob o con t r ole do ca pit a list a a qu em per -
t en ce seu t r a ba lh o. O ca pit a list a cu ida de qu e o t r a ba lh o se r ea lize
em or dem e os m eios de pr odu çã o seja m em pr ega dos con for m e seu s
fin s, por t a n t o, qu e n ã o seja desper diça da m a t ér ia -pr im a e qu e o in s-
t r u m en t o de t r a ba lh o seja pr eser va do, ist o é, só seja dest r u ído n a m e-
dida em qu e seu u so n o t r a ba lh o o exija .
Segu n do, por ém : o pr odu t o é pr opr ieda de do ca pit a list a , e n ã o
do pr odu t or dir et o, do t r a ba lh a dor . O ca pit a list a pa ga , por exem plo, o
va lor de u m dia da for ça de t r a ba lh o. A su a u t iliza çã o, com o a de
qu a lqu er ou t r a m er ca dor ia , por exem plo, a de u m ca va lo qu e a lu gou
por u m dia , per t en ce-lh e, por t a n t o, du r a n t e o dia . Ao com pr a dor da
m er ca dor ia per t en ce a u t iliza çã o da m er ca dor ia , e o possu idor da for ça
de t r a ba lh o dá , de fa t o, a pen a s o va lor de u so qu e ven deu a o da r seu
t r a ba lh o. A pa r t ir do m om en t o em qu e ele en t r ou n a oficin a do ca pi-
t a list a , o va lor de u so de su a for ça de t r a ba lh o, por t a n t o, su a u t iliza çã o,
o t r a ba lh o, per t en ce a o ca pit a list a . O ca pit a list a , m edia n t e a com pr a
da for ça de t r a ba lh o, in cor por ou o pr ópr io t r a ba lh o, com o fer m en t o
vivo, a os elem en t os m or t os con st it u t ivos do pr odu t o, qu e lh e per t en cem
igu a lm en t e. Do seu pon t o de vist a , o pr ocesso de t r a ba lh o é a pen a s o
con su m o da m er ca dor ia , for ça de t r a ba lh o por ele com pr a da , qu e só
pode, n o en t a n t o, con su m ir a o a cr escen t a r -lh e m eios de pr odu çã o. O
pr ocesso de t r a ba lh o é u m pr ocesso en t r e coisa s qu e o ca pit a list a com -
pr ou , en t r e coisa s qu e lh e per t en cem . O pr odu t o desse pr ocesso lh e
per t en ce de m odo in t eir a m en t e igu a l a o pr odu t o do pr ocesso de fer -
m en t a çã o em su a a dega .295

295 "Os pr odu t os sã o a pr opr ia dos a n t es de se t r a n sfor m a r em em ca pit a l, essa t r a n sfor m a çã o


n ã o os livr a da qu ela a pr opr ia çã o". (CH E RBULIE Z. R ich esse ou Pau vreté. É dit . P a r is, 1841.
p. 54.) “Ao ven der seu t r a ba lh o por det er m in a do qu an tu m de m eios de su bsist ên cia (ap-
provision n em en t), r en u n cia o pr olet á r io in t eir a m en t e a t oda pa r t icipa çã o n o pr odu t o. A
a pr opr ia çã o dos pr odu t os fica a m esm a qu e a n t es; ela n ã o se a lt er a , de m odo a lgu m , pelo
con vên io m en cion a do. O pr odu t o per t en ce exclu siva m en t e a o ca pit a list a , qu e for n eceu a s
m a t ér ia s-pr im a s e o approvision n em en t. E ssa é u m a con seqü ên cia r igor osa da lei da a pr o-
pr ia çã o, cu jo pr in cípio fu n da m en t a l er a in ver sa m en t e o dir eit o exclu sivo de pr opr ied a de de
ca da t r a ba lh a dor do seu pr odu t o.” (Op. cit., p. 58.) MILL, J a m es. E lem en ts of Pol. E con .
et c. p. 70-71: “Se os t r a ba lh a dor es t r a ba lh a m por u m sa lá r io, é o ca pit a list a pr opr iet á r io
n ã o só do ca pit a l” (o qu e sign ifica , a qu i, dos m eios de pr odu çã o) “m a s t a m bém do t r a ba lh o
(of th e labou r also). In clu in do-se, com o é cost u m e, n o con ceit o de ca pit a l o qu e se pa ga
com o sa lá r io, é a bsu r do fa la r do t r a ba lh o sepa r a da m en t e do ca pit a l. A pa la vr a ca pit a l,
n esse sen t ido, com pr een de a m bos, ca pit a l e t r a ba lh o”.

304
MARX

2. O p ro c e s s o d e v a lo riza ç ã o
O pr odu t o — a pr opr ieda de do ca pit a list a — é u m va lor de u so,
fio, bot a s et c. Ma s, em bor a a s bot a s, por exem plo, con st it u a m de cer t o
m odo a ba se do pr ogr esso socia l e n osso ca pit a list a seja u m decidido
pr ogr essist a , n ã o fa br ica a s bot a s por ca u sa dela s m esm a s. O va lor de
u so n ã o é, de m odo a lgu m , a coisa qu ’on aim e pou r lu i-m êm e. 296 P r o-
du zem -se a qu i va lor es de u so som en t e por qu e e n a m edida em qu e
seja m su bst r a t o m a t er ia l, por t a dor es do va lor de t r oca . E pa r a n osso
ca pit a list a , t r a t a -se de du a s coisa s. P r im eir o, ele qu er pr odu zir u m
va lor de u so qu e t en h a u m va lor de t r oca , u m a r t igo dest in a do à ven da ,
u m a m er ca dor ia : Segu n do, ele qu er pr odu zir u m a m er ca dor ia cu jo va lor
seja m a is a lt o qu e a som a dos va lor es da s m er ca dor ia s exigida s pa r a
pr odu zi-la , os m eios de pr odu çã o e a for ça de t r a ba lh o, pa r a a s qu a is
a dia n t ou seu bom din h eir o n o m er ca do. Qu er pr odu zir n ã o só u m va lor
de u so, m a s u m a m er ca dor ia , n ã o só va lor de u so, m a s va lor e n ã o só
va lor , m a s t a m bém m a is-va lia .
De fa t o, t r a t a n do-se a qu i de pr odu çã o de m er ca dor ia s, con side-
r a m os, a t é a gor a , eviden t em en t e a pen a s u m la do do pr ocesso. Com o
a pr ópr ia m er ca dor ia é u n ida de de va lor de u so e va lor , seu pr ocesso
de pr odu çã o t em de ser u n ida de de pr ocesso de t r a ba lh o e pr ocesso
de for m a çã o de va lor .
Con sider em os o pr ocesso de pr odu çã o a gor a t a m bém com o pr o-
cesso de for m a çã o de va lor .
Sa bem os qu e o va lor de t oda m er ca dor ia é det er m in a do pelo qu an -
tu m de t r a ba lh o m a t er ia liza do em seu va lor de u so, pelo t em po de
t r a ba lh o socia lm en t e n ecessá r io à su a pr odu çã o. Isso va le t a m bém pa r a
o pr odu t o qu e n osso ca pit a list a obt eve com o r esu lt a do do pr ocesso de
t r a ba lh o. De in ício, t em -se por t a n t o de ca lcu la r o t r a ba lh o m a t er ia liza do
n esse pr odu t o.
Seja , por exem plo, fio.
P a r a a fa br ica çã o do fio pr ecisa -se, em pr im eir o lu ga r , de su a
m a t ér ia -pr im a , por exem plo, 10 libr a s de a lgodã o. Nã o é n ecessá r io
in vest iga r o va lor do a lgodã o pois o ca pit a list a o com pr ou n o m er ca do
pelo seu va lor , por exem plo, 10 xelin s. No pr eço do a lgodã o já est á
r epr esen t a do o t r a ba lh o exigido pa r a su a pr odu çã o, com o t r a ba lh o ger a l
socia l. Su pon h a m os a in da qu e a m a ssa de fu sos desga st a da n o pr o-
cessa m en t o do a lgodã o, qu e r epr esen t a , pa r a n ós, t odos os ou t r os m eios
de t r a ba lh o em pr ega dos, t en h a u m va lor de 2 xelin s. Se u m a m a ssa
de ou r o de 12 xelin s é o pr odu t o de 24 h or a s ou 2 dia s de t r a ba lh o,
segu e-se, de in ício, qu e n o fio est ã o objet iva dos 2 dia s de t r a ba lh o.
Nã o n os deve descon cer t a r a cir cu n st â n cia de qu e o a lgodã o m u -

296 Qu e se a m a por si m esm a . (N. dos T.)

305
OS ECON OMIS TAS

dou su a for m a e a m a ssa de fu sos con su m ida desa pa r eceu t ot a lm en t e.


Segu n do a lei ger a l do va lor , 10 libr a s de fio, por exem plo, sã o u m
equ iva len t e de 10 libr a s de a lgodã o m a is 1/4 de fu so, desde qu e o va lor
de 40 libr a s de fio seja = o va lor de 40 libr a s de a lgodã o + o va lor de
u m fu so in t eir o, ist o é, qu e o m esm o t em po de t r a ba lh o seja exigido
pa r a pr odu zir o qu e est á em ca da u m dos la dos dessa equ a çã o. Nesse
ca so, o m esm o t em po de t r a ba lh o r epr esen t a -se u m a vez n o va lor de
u so fio, e a ou t r a vez n os va lor es de u so a lgodã o e fu so. Ao va lor é
in difer en t e se a pa r ece em fio, fu so ou a lgodã o. O fa t o de qu e fu so e
a lgodã o, em vez de fica r em pa r a dos, u m a o la do do ou t r o, se u n em n o
pr ocesso de fia çã o, qu e m odifica su a s for m a s de u so t r a n sfor m a n do-se
em fio, a fet a t ã o pou co o seu va lor qu a n t o se fossem r ea liza dos, m e-
dia n t e sim ples in t er câ m bio, con t r a u m equ iva len t e de fio.
O t em po de t r a ba lh o exigido pa r a a pr odu çã o do a lgodã o é pa r t e
do t em po de t r a ba lh o exigido pa r a a pr odu çã o do fio, a o qu a l ser ve de
m a t ér ia -pr im a , e por isso est á con t ido n o fio. O m esm o va le pa r a o
t em po de t r a ba lh o exigido pa r a pr odu zir a m a ssa de fu sos, sem cu ja
depr ecia çã o ou con su m o o a lgodã o n ã o poder ia ser fia do.297
Na m edida em qu e, por t a n t o, o va lor do fio, o t em po de t r a ba lh o
exigido pa r a su a pr odu çã o, é con sider a do, os difer en t es pr ocessos pa r -
t icu la r es de t r a ba lh o sepa r a dos n o t em po e n o espa ço, qu e t em qu e
ser per cor r idos pa r a pr odu zir o pr ópr io a lgodã o e a m a ssa de fu sos
desga st a da e pa r a fa zer , fin a lm en t e, de a lgodã o e fu so fio, podem ser
con sider a dos com o diver sa s fa ses su cessiva s do m esm o pr ocesso de
t r a ba lh o. Todo o t r a ba lh o con t ido n o fio é t r a ba lh o pa ssa do. Qu e o
t em po de t r a ba lh o exigido pa r a a pr odu çã o dos elem en t os con st it u t ivos
do fio t en h a pa ssa do a n t es, est a n do n o m a is-qu e-per feit o, en qu a n t o o
t r a ba lh o em pr ega do dir et a m en t e n o pr ocesso fin a l, a fia çã o, en con t r a -se
m a is per t o do pr esen t e, n o pr et ér it o per feit o, é u m a cir cu n st â n cia a b-
solu t a m en t e in difer en t e. Se det er m in a da qu a n t ida de de t r a ba lh o, 30
dia s de t r a ba lh o por exem plo, é n ecessá r ia pa r a con st r u ir u m a ca sa ,
n ã o se a lt er a n a da n o qu an tu m t ot a l do t em po de t r a ba lh o in cor por a do
à ca sa pelo fa t o de qu e o t r igésim o dia de t r a ba lh o en t r ou n a pr odu çã o
29 dia s depois do pr im eir o dia de t r a ba lh o. E a ssim pode con sider a r -se
o t em po de t r a ba lh o con t ido n o m a t er ia l de t r a ba lh o e n os m eios de
trabalho com o se tivesse sido despendido num a fase anterior do processo
de fiação, antes do trabalho finalm ente acrescentado, sob a forma de fiação.
Os va lor es dos m eios de pr odu çã o, do a lgodã o e do fu so, expr essos
n o pr eço de 12 xelin s, for m a m , por t a n t o, pa r t es in t egr a n t es do va lor
do fio ou do va lor do pr odu t o.
Só du a s con dições t êm de ser pr een ch ida s. P r im eir o, a lgodã o e

297 "No va lor da s m er ca dor ia s n ã o in flu i a pen a s o t r a ba lh o n ela s dir et a m en t e a plica do, m a s
t a m bém o t r a ba lh o a plica do n os in st r u m en t os, fer r a m en t a s e edifícios qu e a póia m o t r a ba lh o
dir et a m en t e despen dido." (RICARDO. Op. cit., p. 16.)

306
MARX

fu so devem t er ser vido r ea lm en t e à pr odu çã o de u m va lor de u so.


Devem t er -se t or n a do em n osso ca so fio. Qu e va lor de u so o por t a é
in difer en t e a o va lor , m a s u m va lor de u so t em de por t á -lo. Segu n do,
pr essu põe-se qu e som en t e o t em po de t r a ba lh o n ecessá r io, sob da da s
con dições socia is de pr odu çã o, foi a plica do. Se, por t a n t o, a pen a s 1 libr a
de a lgodã o fosse n ecessá r ia pa r a fia r 1 libr a de fio, en t ã o deve-se con -
su m ir a pen a s 1 libr a de a lgodã o n a fa br ica çã o de 1 libr a de fio. O
m esm o va le pa r a o fu so. Ain da qu e o ca pit a list a t ivesse a fa n t a sia de
em pr ega r fu sos de ou r o em vez de fu sos de fer r o, n o va lor do fio só
con t a , t oda via , o t r a ba lh o socia lm en t e n ecessá r io, ist o é, o t em po de
t r a ba lh o n ecessá r io pa r a a pr odu çã o de fu sos de fer r o.
Sa bem os a gor a qu a l pa r t e do va lor do fio for m a os m eios de
pr odu çã o, a lgodã o e fu so. É igu a l a 12 xelin s, ou à m a t er ia liza çã o de
2 dia s de t r a ba lh o. Tr a t a -se a gor a da qu ela pa r t e de va lor qu e o t r a ba lh o
do pr ópr io fia n deir o a cr escen t a a o a lgodã o.
Agor a t em os de obser va r esse t r a ba lh o sob u m a spect o t ot a lm en t e
diver so da qu ele sob o qu a l o con sider a m os du r a n t e o pr ocesso de t r a -
ba lh o. Lá , t r a t a va -se da a t ivida de or ien t a da a o fim de t r a n sfor m a r
a lgodã o em fio. Qu a n t o m a is a dequ a do o t r a ba lh o a esse, t a n t o m elh or
o fio, su pon do-se in a lt er a da s t oda s a s dem a is cir cu n st â n cia s. O t r a ba lh o
do fia n deir o er a especifica m en t e difer en t e de ou t r os t r a ba lh os pr odu -
t ivos, e a diver sida de m a n ifest a va -se su bjet iva e objet iva m en t e n o fim
pa r t icu la r da fia çã o, em seu m odo pa r t icu la r de oper a r , n a n a t u r eza
pa r t icu la r de seu s m eios de pr odu çã o, n o va lor de u so pa r t icu la r de
seu pr odu t o. Algodã o e fu so ser vem de m eios de su bsist ên cia do t r a ba lh o
de fia r , m a s n ã o se pode com eles fa zer ca n h ões r a ia dos. Na m edida
em qu e o t r a ba lh o do fia n deir o é, pelo con t r á r io, for m a dor de va lor ,
ist o é, fon t e de va lor , n ã o se dist in gu e em n a da do t r a ba lh o do per fu -
r a dor de ca n h ões, ou , qu e est á a qu i m a is pr óxim o, dos t r a ba lh os do
pla n t a dor de a lgodã o e do pr odu t or de fu sos, r ea liza dos n os m eios de
pr odu çã o do fio. É a pen a s por ca u sa dessa iden t ida de qu e pla n t a r
a lgodã o, fa zer fu sos e fia r podem for m a r pa r t es a pen a s qu a n t it a t iva -
m en t e difer en t es do m esm o va lor t ot a l, do va lor do fio. Aqu i já n ã o se
t r a t a da qu a lida de, da n a t u r eza e do con t eú do do t r a ba lh o, m a s a pen a s
de su a qu a n t ida de. É fá cil ca lcu lá -la . P r essu pom os qu e o t r a ba lh o de
fia r é t r a ba lh o sim ples, t r a ba lh o socia l m édio. Ver -se-á depois qu e o
pr essu post o con t r á r io n ã o a lt er a n a da n a coisa .
Durante o processo de trabalho, o trabalho se transpõe continua-
mente da forma de agitação para a de ser, da forma de movimento para
a de objetividade. Ao fim de 1 hora, o movimento de fiar está representado
em determ inado quantum de fio, portanto determinado quantum de tra-
balho, 1 hora de trabalho, está objetivado no algodão. Dizemos hora de
trabalho, isto é, o dispêndio da força vital do fiandeiro durante 1 hora,
pois o trabalho de fiar apenas vale aqui enquanto dispêndio de força de
trabalho e não enquanto trabalho específico de fiação.

307
OS ECON OMIS TAS

Agor a é de im por t â n cia decisiva qu e du r a n t e o pr ocesso, ist o é,


du r a n t e a t r a n sfor m a çã o do a lgodã o em fio, som en t e o t em po de t r a -
ba lh o socia lm en t e n ecessá r io seja con su m ido. Se sob con dições socia is
de pr odu çã o n or m a is, ist o é, m édia s, A libr a s de a lgodã o t êm de ser
t r a n sfor m a da s, du r a n t e 1 h or a de t r a ba lh o, em B libr a s de fio, en t ã o
som en t e va le com o jor n a da de t r a ba lh o de 12 h or a s a qu ela jor n a da de
t r a ba lh o qu e t r a n sfor m a 12 x A libr a s de a lgodã o em 12 x B libr a s de
fio. P ois a pen a s o t em po de t r a ba lh o socia lm en t e n ecessá r io con t a com o
for m a n do va lor .
Com o o pr ópr io t r a ba lh o, a ssim a m a t ér ia -pr im a e o pr odu t o
a pa r ecem a qu i sob u m a lu z t ot a lm en t e difer en t e da pr ojet a da pelo
pon t o de vist a do pr ocesso de t r a ba lh o pr opr ia m en t e dit o. A m a t ér ia -
pr im a fu n cion ou a qu i a pen a s com o a lgo qu e a bsor ve det er m in a do qu an -
tu m de t r a ba lh o. P or m eio dessa a bsor çã o t r a n sfor m a -se, de fa t o, em
fio, por qu e a for ça de t r a ba lh o foi despen dida e lh e foi a cr escen t a da
sob a for m a de fia çã o. Ma s o pr odu t o, o fio, é a gor a a pen a s u m a esca la
gr a du a da qu e m ede o t r a ba lh o a bsor vido pelo a lgodã o. Se em 1 h or a
1 2/3 libr a de a lgodã o é fia da ou t r a n sfor m a da em 1 2/3 libr a de fio,
en t ã o 10 libr a s de fio in dica m 6 h or a s de t r a ba lh o a bsor vida s. Qu a n -
t ida des de pr odu t o det er m in a da s, ver ifica da s pela exper iên cia , r epr e-
sen t a m a gor a n a da m a is qu e det er m in a da s qu a n t ida des de t r a ba lh o,
det er m in a da m a ssa de t em po de t r a ba lh o solidifica do. Sã o a pen a s a
m a t er ia liza çã o de 1 h or a , de 2 h or a s, de 1 dia de t r a ba lh o socia l.
Que o trabalho seja precisamente trabalho de fiar, seu material o
algodão e seu produto o fio interessa aqui tão pouco quanto o objeto do
trabalho, por sua vez, ser já produto, portanto, matéria-prima. Se o tra-
balhador, em vez de fiar, estivesse ocupado numa m ina de carvão, o objeto
de trabalho, o carvão, seria preexistente por natureza. Apesar disso, de-
term inado quantum de carvão arrancado da rocha, 1 quintal por exem plo,
representaria determ inado quantum de trabalho absorvido.
Ao t r a t a r da ven da da for ça de t r a ba lh o, foi su post o qu e seu
va lor diá r io = 3 xelin s e qu e n est es ú lt im os est ã o in cor por a da s 6 h or a s
de t r a ba lh o, sen do, por t a n t o, exigido esse qu an tu m de t r a ba lh o pa r a
pr odu zir a som a m édia dos m eios diá r ios de su bsist ên cia do t r a ba lh a -
dor . Se n osso fia n deir o, du r a n t e 1 h or a de t r a ba lh o, t r a n sfor m a 1 2/3
libr a de a lgodã o em 1 2/3 libr a de fio,298 en t ã o t r a n sfor m a r á , em 6
h or a s, 10 libr a s de a lgodã o em 10 libr a s de fio. Du r a n t e o pr ocesso da
fia çã o o a lgodã o a bsor ve, por t a n t o, 6 h or a s de t r a ba lh o. O m esm o t em po
de t r a ba lh o r epr esen t a -se n u m qu an tu m de ou r o de 3 xelin s. Media n t e
a pr ópr ia fia çã o a cr escen t a -se, pois, a o a lgodã o u m va lor de 3 xelin s.
Veja m os a gor a o va lor t ot a l do pr odu t o, da s 10 libr a s de fio.
Nela s se objet iva m 2 1/2 dia s de t r a ba lh o, sen do 2 dia s con t idos n o

298 E sses n ú m er os sã o t ot a lm en t e a r bit r á r ios.

308
MARX

a lgodã o e n a m a ssa de fu sos, e 1/2 dia a bsor vido du r a n t e o pr ocesso


da fia çã o. O m esm o t em po de t r a ba lh o r epr esen t a -se n u m a m a ssa de
ou r o de 15 xelin s. O pr eço a dequ a do a o va lor da s 10 libr a s de fio é,
por t a n t o, 15 xelin s, o pr eço de 1 libr a de fio, 1 xelim e 6 pen ce.
Nosso ca pit a list a fica per plexo. O va lor do pr odu t o é igu a l a o
va lor do ca pit a l a dia n t a do. O va lor a dia n t a do n ã o se va lor izou , n ã o
pr odu ziu m a is-va lia , o din h eir o n ã o se t r a n sfor m ou pois em ca pit a l.
O pr eço da s 10 libr a s de fio é 15 xelin s, e 15 xelin s for a m despen didos
n o m er ca do pelos elem en t os con st it u t ivos do pr odu t o ou , o qu e é o
m esm o, pa r a os fa t or es do pr ocesso de t r a ba lh o: 10 xelin s pa r a o a l-
godã o, 2 xelin s pa r a a m a ssa de fu sos con su m ida e 3 xelin s pa r a a
for ça de t r a ba lh o. O va lor in ch a do do fio em n a da a ju da , pois seu va lor
é a pen a s a som a dos va lor es qu e a n t es se dist r ibu ír a m en t r e a lgodã o,
fu so e for ça de t r a ba lh o, e de t a l a diçã o sim ples de va lor es pr eexist en t es
n ã o pode a gor a e ja m a is su r gir u m a m a is-va lia .299 E sses va lor es est ã o
con cen t r a dos a gor a n u m a só coisa , m a s já o est a va m n a som a de di-
n h eir o de 15 xelin s a n t es qu e est a se fr a gm en t a sse por m eio de t r ês
com pr a s de m er ca dor ia s.
E m si pa r a si, esse r esu lt a do n ã o t em n a da de est r a n h o. O va lor
de 1 libr a de fio é 1 xelim e 6 pen ce, e por 10 libr a s de fio n osso
ca pit a list a t er ia de pa ga r n o m er ca do, por t a n t o, 15 xelin s. Ta n t o fa z
qu e com pr e n o m er ca do su a ca sa pa r t icu la r já pr on t a , ou qu e a m a n de
con st r u ir , n en h u m a dessa s oper a ções a u m en t a r á o din h eir o ga st o n a
a qu isiçã o da ca sa .
O ca pit a list a , fa m ilia r iza do com a econ om ia vu lga r , dir á t a lvez
qu e a dia n t ou seu din h eir o com a in t en çã o de, com isso, fa zer m a is
din h eir o. Ma s o ca m in h o a o in fer n o est á ca lça do de boa s in t en ções e
ele poder ia , do m esm o m odo, t er a in t en çã o de fa zer din h eir o sem
pr odu zir n a da .300 Am ea ça . Nã o o a pa n h a r ã o de n ovo. F u t u r a m en t e,
com pr a r á a m er ca dor ia pr on t a n o m er ca do em vez de fa br icá -la . Ma s
se t odos os seu s ir m ã os ca pit a list a s fizer em o m esm o, on de dever á ele
en con t r a r m er ca dor ia s pr on t a s? E din h eir o ele n ã o pode com er . E le
fa z u m ser m ã o. Deve-se leva r em con sider a çã o su a a bst in ên cia . P oder ia
esba n ja r seu s 15 xelin s. E m lu ga r disso, os con su m iu pr odu t iva m en t e

299 E ssa é a pr oposiçã o fu n da m en t a l em qu e se ba seia a dou t r in a fisiocr á t ica da im pr odu t ivida de


de t odo t r a ba lh o n ã o a gr ícola , e ela é ir r efu t á vel pa r a o econ om ist a — de pr ofissã o. “E ssa
m a n eir a de im pu t a r a u m ú n ico objet o os va lor es de vá r ios ou t r os” (por exem plo, a o lin h o
a su bsist ên cia do t ecelã o), “de a cu m u la r , por a ssim dizer , diver sos va lor es em ca m a da s
sobr e u m ú n ico, fa z com qu e est e cr esça n a m esm a pr opor çã o. (...) A pa la vr a a diçã o design a
m u it o bem o m odo com o se for m a o pr eço da s m a n u fa t u r a s; est e pr eço é a pen a s a som a
t ot a l de vá r ios va lor es con su m idos e a dicion a dos; m a s a dicion a r n ã o é m u lt iplica r .” (RI-
VIÈ RE , Mer cier de la . Op. cit., p. 599.)
300 Assim , por exem plo, ele r et ir ou de 1844 a 1847 pa r t e de seu ca pit a l do n egócio pr odu t ivo
pa r a per dê-la n a especu la çã o com a ções fer r oviá r ia s. Assim , a o t em po da Gu er r a de Secessã o
a m er ica n a , fech ou a fá br ica e la n çou o oper á r io n a r u a , pa r a joga r n a Bolsa de a lgodã o
de Liver pool.

309
OS ECON OMIS TAS

e os t r a n sfor m ou em fio. Ma s, gr a ça s a isso, ele t em fio em vez de


r em or sos. E le n ã o deve, de m odo a lgu m , r eca ir n o pa pel do en t esou r a dor
qu e já n os m ost r ou o qu e se obt ém do a scet ism o. Além disso, on de
n a da exist e, o im per a dor per deu seu dir eit o. Qu a lqu er qu e seja o m ér it o
de su a r en ú n cia , n ã o exist e n a da pa r a pa gá -lo a dicion a lm en t e, u m a
vez qu e o va lor do pr odu t o qu e r esu lt a do pr ocesso é a pen a s igu a l à
som a dos va lor es da s m er ca dor ia s la n ça da s n ele. Tem de con sola r -se
com a idéia de a vir t u de ser a r ecom pen sa da vir t u de. Ma s, em vez
disso, ele se t or n a im por t u n o. O fio n ã o lh e ser ve de n a da . E le o pr odu ziu
pa r a a ven da . Assim qu e ele o ven da ou , m elh or a in da , qu e pr odu za
n o fu t u r o a pen a s coisa s pa r a seu pr ópr io u so, r eceit a qu e seu m édico
da fa m ília , Ma cCu lloch , já pr escr ever a com o r em édio com pr ova do con -
t r a a epidem ia da su per pr odu çã o. E le se t or n a t eim oso. Dever ia o t r a -
ba lh a dor , com seu s pr ópr ios m em br os, cr ia r n o ét er figu r a ções de t r a -
ba lh o, pr odu zir m er ca dor ia s? Nã o lh e deu ele a m a t ér ia , com a qu a l
e n a qu a l pode da r cor po a seu t r a ba lh o? Sen do a m a ior pa r t e da
socieda de con st it u ída dos qu e n a da t êm n ã o pr est ou ele u m ser viço
in est im á vel à socieda de com seu s m eios de pr odu çã o, seu a lgodã o e
seu s fu sos, e t a m bém a o pr ópr io t r a ba lh a dor , a o qu a l for n eceu a in da
m eios de su bsist ên cia ? Nã o deve ele a pr esen t a r a con t a por t a l ser viço?
Ma s n ã o pr est ou -lh e o t r a ba lh a dor em con t r a pa r t ida o ser viço de t r a n s-
for m a r a lgodã o e fu so em fio? Além disso, n ã o se t r a t a a qu i de ser vi-
ços.301 Um ser viço é n a da m a is qu e o efeit o ú t il de u m va lor de u so,
seja da m er ca dor ia , seja do t r a ba lh o.302 Ma s a qu i t r a t a -se do va lor de
t r oca . O ca pit a list a pa gou a o t r a ba lh a dor o va lor de 3 xelin s. O t r a -
ba lh a dor devolveu -lh e u m equ iva len t e exa t o, n o va lor de 3 xelin s, a cr es-
cido a o a lgodã o. Va lor con t r a va lor . Nosso a m igo, a t é h á pou co ca pi-
t a list ica m en t e a r r oga n t e, a ssu m e su bit a m en t e a a t it u de m odest a de
seu pr ópr io t r a ba lh a dor . Nã o t r a ba lh ou ele m esm o? Nã o execu t ou o
t r a ba lh o de vigilâ n cia e su per in t en dên cia sobr e o fia n deir o? Nã o cr ia
va lor t a m bém esse seu t r a ba lh o? Ma s seu pr ópr io overlook er303 e seu
ger en t e en colh em os om br os. E n t r em en t es, já r ecobr ou com u m sor r iso

301 "Deixa qu e se exa lt em , se a dor n em e se en feit em . (...) Ma s qu e t om a m a is ou a lgo m elh or "


(do qu e dá ) “pr a t ica u su r a e n ã o pr est a ser viço, m a s ca u sa pr eju ízo a seu pr óxim o, com o
se fu r t a sse ou r ou ba sse. Nem t u do qu e se ch a m a de ser viço e ben efício a o pr óxim o é ser viço
e ben efício. P ois u m a dú lt er o e u m a a dú lt er a se pr est a m m u t u a m en t e gr a n de ser viço e
pr a zer . Um ca va leir o pr est a gr a n de ser viço a o in cen diá r io e a ssa ssin o, a ju da n do-o a r ou ba r
n a s est r a da s, a fa zer gu er r a a t er r a s e gen t es. Os pa pist a s pr est a m a os n ossos gr a n de
ser viço, a o n ã o a foga r em , qu eim a r em , a ssa ssin a r em ou fa zer em a podr ecer a t odos n a s
pr isões, m a s deixa m a lgu n s viver em , dest er r a n do-os ou despoja n do-os de seu s h a ver es. O
pr ópr io dia bo pr est a a seu s ser vidor es gr a n de e in est im á vel ser viço (...) E m r esu m o, o
m u n do est á ch eio de gr a n des e excelen t es ser viços e ben efícios diá r ios.” (LUTH E R, Ma r t in .
An d ie Pfarrh errn , w id er d en Wu ch er zu Pred igen et c. Wit t en ber g, 1540.)
302 E m Z u r Kritik d er Pol. Oek ., p. 14, obser vo sobr e isso, en t r e ou t r a s coisa s: “Com pr een de-se
qu a l ‘ser viço’ a ca t egor ia ‘ser viço’ (service) deve pr est a r a u m a espécie de econ om ist a s com o
J .-B. Sa y e F . Ba st ia t ”.*
*
Ver v. 13 da M E W. p. 24. (N. da E d. Alem ã .)
303 F isca l. (N. dos T.)

310
MARX

a legr e su a fision om ia a n t er ior . E le t r oçou de n ós com t oda essa la da i-


n h a . Nã o da r ia u m cen t a vo por ela . E le deixa esses e sem elh a n t es
su bt er fú gios e pet a s va zia s a os pr ofessor es da E con om ia P olít ica , ex-
pr essa m en t e pa gos pa r a isso. E le m esm o é u m h om em pr á t ico qu e
n em sem pr e pen sa n o qu e diz for a do n egócio, m a s sem pr e sa be o qu e
fa z den t r o dele.
E xa m in em os a coisa m a is de per t o. O va lor de u m dia da for ça
de t r a ba lh o im por t a va em 3 xelin s, por qu e n ela m esm a est á objet iva da
m eia jor n a da de t r a ba lh o, ist o é, por qu e os m eios de su bsist ên cia n e-
cessá r ios pa r a pr odu zir dia r ia m en t e a for ça de t r a ba lh o cu st a m m eia
jor n a da de t r a ba lh o. Ma s o t r a ba lh o pa ssa do qu e a for ça de t r a ba lh o
con t ém , e o t r a ba lh o vivo qu e ela pode pr est a r , seu s cu st os diá r ios de
m a n u t en çã o e seu dispên dio diá r io, sã o du a s gr a n deza s in t eir a m en t e
difer en t es. A pr im eir a det er m in a seu va lor de t r oca , a ou t r a for m a
seu va lor de u so. O fa t o de qu e m eia jor n a da seja n ecessá r ia pa r a
m a n t ê-lo vivo du r a n t e 24 h or a s n ã o im pede o t r a ba lh a dor , de m odo
a lgu m , de t r a ba lh a r u m a jor n a da in t eir a . O va lor da for ça de t r a ba lh o
e su a va lor iza çã o n o pr ocesso de t r a ba lh o sã o, por t a n t o, du a s gr a n deza s
dist in t a s. E ssa difer en ça de va lor o ca pit a list a t in h a em vist a qu a n do
com pr ou a for ça de t r a ba lh o. Su a pr opr ieda de ú t il, de poder fa zer fio
ou bot a s, er a a pen a s u m a con d itio sin e qu a n on , 304 pois o t r a ba lh o
pa r a cr ia r va lor t em de ser despen dido em for m a ú t il. Ma s o decisivo
foi o va lor de u so específico dessa m er ca dor ia ser fon t e de va lor , e de
m a is va lor do qu e ela m esm a t em . E sse é o ser viço específico qu e o
ca pit a list a dela esper a . E ele pr ocede, n o ca so, segu n do a s leis et er n a s
do in t er câ m bio de m er ca dor ia s. Na ver da de, o ven dedor da for ça de
t r a ba lh o, com o o ven dedor de qu a lqu er ou t r a m er ca dor ia , r ea liza seu
va lor de t r oca e a lien a seu va lor de u so. E le n ã o pode obt er u m , sem
desfa zer -se do ou t r o. O va lor de u so da for ça de t r a ba lh o, o pr ópr io
t r a ba lh o, per t en ce t ã o pou co a o seu ven dedor , qu a n t o o va lor de u so
do óleo ven dido, a o com er cia n t e qu e o ven deu . O possu idor de din h eir o
pa gou o va lor de u m dia da for ça de t r a ba lh o; per t en ce-lh e, por t a n t o,
a u t iliza çã o dela du r a n t e o dia , o t r a ba lh o de u m a jor n a da . A cir cu n s-
t â n cia de qu e a m a n u t en çã o diá r ia da for ça de t r a ba lh o só cu st a m eia
jor n a da de t r a ba lh o, a pesa r de a for ça de t r a ba lh o poder oper a r , t r a -
ba lh a r u m dia in t eir o, e por isso, o va lor qu e su a u t iliza çã o cr ia du r a n t e
u m dia é o dobr o de seu pr ópr io va lor de u m dia , é gr a n de sor t e pa r a
o com pr a dor , m a s, de m odo a lgu m , u m a in ju st iça con t r a o ven dedor .
Nosso ca pit a list a pr eviu o ca so qu e o fa z sor r ir .305 O t r a ba lh a dor
en con t r a , por isso, n a oficin a , os m eios de pr odu çã o n ecessá r ios n ã o
pa r a u m pr ocesso de t r a ba lh o de 6 h or a s, m a s de 12. Se 10 libr a s de

304 Con diçã o in dispen sá vel. (N. dos T.)


305 "Ka su s, der ih n la ch en m a ch t ", cit a çã o m odifica da de Goet h e, Fau sto. P a r t e P r im eir a .
“Qu a r t o de E st u da n t e”. (N. da E d. Alem ã .)

311
OS ECON OMIS TAS

a lgodã o a bsor via m 6 h or a s de t r a ba lh o e t r a n sfor m a va m -se em 10 libr a s


de fio, en t ã o 20 libr a s de a lgodã o a bsor ver ã o 12 h or a s de t r a ba lh o e
se t r a n sfor m a r ã o em 20 libr a s de fio. Con sider em os o pr odu t o do pr o-
cesso pr olon ga do de t r a ba lh o. Na s 20 libr a s de fio est ã o objet iva da s
a gor a 5 jor n a da s de t r a ba lh o: 4 n a m a ssa con su m ida de a lgodã o e
fu sos, 1 a bsor vida pelo a lgodã o du r a n t e o pr ocesso de fia çã o. Ma s a
expr essã o em ou r o de 5 jor n a da s de t r a ba lh o é 30 xelin s ou 1 libr a
est er lin a e 10 xelin s. E sse é, por t a n t o, o pr eço da s 20 libr a s de fio.
Um a libr a de fio cu st a , depois com o a n t es, 1 xelim e 6 pen ce. Ma s a
som a dos va lor es da s m er ca dor ia s la n ça da s n o pr ocesso im por t ou em
27 xelin s. O va lor do fio é de 30 xelin s. O va lor do pr odu t o u lt r a pa ssou
de 1/9 o va lor a dia n t a do pa r a su a pr odu çã o. Dessa m a n eir a , t r a n sfor -
m a r a m -se 27 xelin s em 30. Der a m u m a m a is-va lia de 3 xelin s. F in a l-
m en t e a a r t im a n h a deu cer t o. Din h eir o se t r a n sfor m ou em ca pit a l.
Toda s a s con dições do pr oblem a for a m r esolvida s e, de m odo a l-
gu m , a s leis do in t er câ m bio de m er ca dor ia s for a m viola da s. Tr ocou -se
equ iva len t e por equ iva len t e. O ca pit a list a pa gou , com o com pr a dor , t oda
m er ca dor ia por seu va lor , a lgodã o, m a ssa de fu sos, for ça de t r a ba lh o.
Depois fez o qu e fa z qu a lqu er ou t r o com pr a dor de m er ca dor ia s. Con -
su m iu seu va lor de u so. Do pr ocesso de con su m o da for ça de t r a ba lh o,
a o m esm o t em po pr ocesso de pr odu çã o da m er ca dor ia , r esu lt ou u m
pr odu t o de 20 libr a s de fio com u m va lor de 30 xelin s. O ca pit a list a
volt a a gor a a o m er ca do e ven de m er ca dor ia , depois de t er com pr a do
m er ca dor ia . Ven de a libr a de fio por 1 xelim e 6 pen ce, n en h u m cen t a vo
acima ou abaixo de seu valor. E, não obstante, tira da circulação 3 xelins
mais do que nela lançou. Todo esse seguim ento, a transformação de seu
dinheiro em capital, se opera na esfera da circulação e não se opera nela.
Por intermédio da circulação, por ser condicionado pela compra da força
de trabalho no m ercado. Fora da circulação, pois ela apenas introduz o
processo de valorização, que ocorre na esfera da produção. E assim é tout
pour le m ieux dans le m eilleur des m ondes possibles.306
O ca pit a list a , a o t r a n sfor m a r din h eir o em m er ca dor ia s, qu e ser -
vem de m a t ér ia s con st it u in t es de u m n ovo pr odu t o ou de fa t or es do
pr ocesso de t r a ba lh o, a o in cor por a r for ça de t r a ba lh o viva à su a obje-
t ivida de m or t a , t r a n sfor m a va lor , t r a ba lh o pa ssa do, objet iva do, m or t o
em ca pit a l, em va lor qu e se va lor iza a si m esm o, u m m on st r o a n im a do
qu e com eça a “t r a ba lh a r ” com o se t ivesse a m or n o cor po.307
Se com pa r a m os o pr ocesso de for m a çã o de va lor com o pr ocesso
de va lor iza çã o, vem os qu e o pr ocesso de va lor iza çã o n ã o é n a da m a is
qu e u m pr ocesso de for m a çã o de va lor pr olon ga do a lém de cer t o pon t o.

306 "Tu do pelo m elh or n o m elh or dos m u n dos possíveis." Afor ism o do r om a n ce sa t ír ico de Volt a ir e
Can d id e, ou l’Optim ism e. (N. da E d. Alem ã .)
307 "Com o se t ivesse a m or n o cor po" — als h aett’es L ieb im L eibe — cit a çã o m odifica da de
Goet h e. Fau sto. P a r t e P r im eir a . “Adega de Au er ba ch , em Leipzig.” (N. da E d. Alem ã .)

312
MARX

Se est e a pen a s du r a a t é o pon t o em qu e o va lor da for ça de t r a ba lh o


pa go pelo ca pit a l é su bst it u ído por u m n ovo equ iva len t e, en t ã o é u m
pr ocesso sim ples de for m a çã o de va lor . Se u lt r a pa ssa esse pon t o, t or -
n a -se pr ocesso de va lor iza çã o.
Se com pa r a m os, a lém disso, o pr ocesso de for m a çã o de va lor com
o pr ocesso de t r a ba lh o, vem os qu e est e con sist e n o t r a ba lh o ú t il qu e
pr odu z va lor es de u so. O m ovim en t o é con sider a do a qu i qu a lit a t iva -
m en t e, em seu m odo e m a n eir a pa r t icu la r , segu n do seu objet ivo e con -
t eú do. O m esm o pr ocesso de t r a ba lh o a pr esen t a -se n o pr ocesso de for -
m a çã o de va lor som en t e em seu a spect o qu a n t it a t ivo. Tr a t a -se a qu i
a pen a s do t em po qu e o t r a ba lh o pr ecisa pa r a su a oper a çã o ou da du -
r a çã o n a qu a l a for ça de t r a ba lh o é despen dida de for m a ú t il. Ta m bém
a s m er ca dor ia s qu e en t r a m n o pr ocesso de t r a ba lh o a qu i já n ã o va lem
com o fa t or es m a t er ia is, det er m in a dos fu n cion a lm en t e, da for ça de t r a -
ba lh o a t u a n do or ien t a da m en t e pa r a u m fim . Apen a s con t a m com de-
t er m in a da s qu a n t ida des de t r a ba lh o objet iva do. O t r a ba lh o, seja con t ido
n os m eios de pr odu çã o, seja a cr escido a eles pela for ça de t r a ba lh o,
som en t e con t a por su a du r a çã o. Repr esen t a t a n t a s h or a s, dia s et c.
Ma s con t a som en t e n a m edida em qu e o t em po ga st o n a pr odu çã o
do va lor de u so é socia lm en t e n ecessá r io. Isso en volve vá r ios fa t or es.
A for ça de t r a ba lh o t em de fu n cion a r em con dições n or m a is. Se a m á -
qu in a de fia r é o in st r u m en t o de t r a ba lh o socia lm en t e dom in a n t e pa r a
a fia çã o, en t ã o n ã o se deve pôr u m a r oda de fia r n a s m ã os do t r a ba -
lh a dor . E le n ã o deve r eceber , em vez de a lgodã o de qu a lida de n or m a l,
u m r efu go qu e r a sga a t odo in st a n t e. E m a m bos os ca sos, ele pr ecisa r ia
de m a is do qu e o t em po socia lm en t e n ecessá r io pa r a a pr odu çã o de 1
libr a de fio, m a s esse t em po exceden t e n ã o ger a r ia va lor em din h eir o.
O ca r á t er n or m a l dos fa t or es m a t er ia is de t r a ba lh o n ã o depen de, por ém ,
do t r a ba lh a dor , m a s do ca pit a list a . Ou t r a con diçã o é o ca r á t er n or m a l
da pr ópr ia for ça de t r a ba lh o. No r a m o qu e se a plica deve possu ir o
gr a u m édio de h a bilida de, dest r eza e r a pidez. Ma s n osso ca pit a list a
com pr ou n o m er ca do for ça de t r a ba lh o de qu a lida de n or m a l. E ssa for ça
t em de ser despen dida n o gr a u m édio h a bit u a l de esfor ço, com o gr a u
de in t en sida de socia lm en t e u su a l. Sobr e isso o ca pit a list a exer ce vigi-
lâ n cia com o m esm o t em or qu e m a n ifest a de qu e n en h u m t em po seja
desper diça do, sem t r a ba lh o. Com pr ou a for ça de t r a ba lh o por pr a zo
det er m in a do. In sist e em t er o qu e é seu . Nã o qu er ser r ou ba do. F i-
n a lm en t e — e pa r a isso t em ele seu pr ópr io cod e pén al 308 — n ã o deve
ocor r er n en h u m con su m o desn ecessá r io de m a t ér ia -pr im a e m eios de
t r a ba lh o, por qu e m a t er ia l e m eios de t r a ba lh o desper diça dos r epr esen -
t a m qu a n t ida des despen dida s em excesso de t r a ba lh o objet iva do, qu e,
por t a n t o, n ã o con t a m n em en t r a m n o pr odu t o da for m a çã o de va lor .309

308 Código pen a l. (N. dos T.)


309 E ssa é u m a da s cir cu n st â n cia s qu e en ca r ecem a pr odu çã o ba sea da n a escr a vidã o. O t r a -

313
OS ECON OMIS TAS

Vê-se: a difer en ça obt ida a n t er ior m en t e da a n á lise da m er ca dor ia ,


en t r e o t r a ba lh o en qu a n t o cr ia dor de va lor de u so e o m esm o t r a ba lh o
en qu a n t o cr ia dor de va lor , a pr esen t a -se a gor a com o difer en cia çã o dos
difer en t es a spect os do pr ocesso de pr odu çã o.
Com o u n ida d e do pr ocesso de t r a ba lh o e pr ocesso d e for m a çã o
de va lor , o pr ocesso de pr odu çã o é p r ocesso de p r od u çã o de m er ca -
dor ia s; com o u n ida de d o pr ocesso de t r a ba lh o e pr ocesso d e va lor i-
za çã o, é ele pr ocesso de pr odu çã o ca pit a list a , for m a ca pit a list a da
pr odu çã o de m er ca dor ia s.
Obser va m os a n t er ior m en t e qu e pa r a o pr ocesso de va lor iza çã o é
t ot a lm en t e in difer en t e se o t r a ba lh o a pr opr ia do pelo ca pit a list a é t r a -
ba lh o sim ples, t r a ba lh o socia l m édio ou t r a ba lh o m a is com plexo, t r a -
ba lh o de peso específico su per ior . O t r a ba lh o qu e va le com o t r a ba lh o
su per ior , m a is com plexo em fa ce do t r a ba lh o socia l m édio, é a ext e-
r ior iza çã o de u m a for ça de t r a ba lh o n a qu a l en t r a m cu st os m a is a lt os
de for m a çã o, cu ja pr odu çã o cu st a m a is t em po de t r a ba lh o e qu e, por
isso, t em va lor m a is eleva do qu e a for ça de t r a ba lh o sim ples. Se o
va lor dessa for ça é su per ior , ela se ext er ior iza , por con segu in t e, em
t r a ba lh o su per ior e se objet iva n os m esm os per íodos de t em po, em
va lor es pr opor cion a lm en t e m a is a lt os. Qu a lqu er qu e seja , por ém , a

ba lh a dor a í, segu n do a expr essã o a cer t a da dos a n t igos, a pen a s se dist in gu e do a n im a l,


com o in stru m en tu m sem ivocale, * e dos in st r u m en t os de t r a ba lh os m or t os, com o in stru m en-
tu m m u tu m , ** por ser in stru m en tu m vocale. *** Ma s ele m esm o fa z o a n im a l e os in st r u m en t os
de t r a ba lh o sen t ir em qu e n ã o é seu igu a l, m a s u m h om em . E le pr opor cion a a si m esm o a
a u t ocon sciên cia de ser difer en t e deles a o m a lt r a t á -los e dest r u í-los con am ore. Va le, por
isso, n esse m odo de pr odu çã o, com o pr in cípio econ ôm ico, a pen a s em pr ega r os in st r u m en t os
de t r a ba lh o m a is t oscos, m a is pesa dos, por ém exa t a m en t e devido à su a ca n h est r a r u st icida de
difíceis de ser em est r a ga dos. At é a eclosã o da Gu er r a de Secessã o en con t r a va m -se, por isso,
n os E st a dos escr a vocr a t a s sobr e o golfo do México a r a dos con st r u ídos com o os dos a n t igos
ch in eses, qu e fu ça va m a t er r a com o u m por co ou u m a t ou peir a , sem fen dê-la n em r evir á -la .
Ver CAIRNE S, J . E . T h e S lave Pow er. Lon dr es, 1862. p. 46 et seqs. E m seu S eaboard S lave
S tates [p. 46-47], con t a Olm st ed, en t r e ou t r a s coisa s: “Most r a r a m -m e a qu i in st r u m en t os
qu e, en t r e n ós, n en h u m a pessoa r a zoá vel im por ia a seu t r a ba lh a dor , a qu em pa ga sse sa lá r io.
Seu peso ext r a or din á r io e su a r u st icida de t or n a m o t r a ba lh o execu t a do com ele, n a m in h a
opin iã o pelo m en os, 10% m a is difícil do qu e ser ia com os in st r u m en t os qu e n ós ger a lm en t e
u sa m os. Com o m e a ssegu r a r a m , por ém , o m odo n egligen t e e in ept o com qu e os escr a vos
a pa r en t em en t e os m a n eja m , n ã o per m it e con fia r -lh es, com bom r esu lt a do, in st r u m en t os
m a is leves ou m en os t oscos; in st r u m en t os com o os qu e n ós con fia m os a os n osso t r a ba lh a dor es
e a liá s com bom lu cr o pa r a n ós, n ã o du r a r ia m u m dia n u m ca m po de cer ea is da Vir gín ia
— em bor a a t er r a seja m a is leve e m en os pedr egosa qu e a n ossa . Do m esm o m odo, qu a n do
per gu n t ei por qu e n a s fa zen da s se u sa va m ger a lm en t e m u la s em vez de ca va los, m e a pr e-
sen t a r a m com o r a zã o pr im or dia l e decisiva a de qu e os ca va los n ã o su por t a m o t r a t a m en t o
qu e con t ín u a e in evit a velm en t e r ecebem dos n egr os. Os ca va los, em pou co t em po, sã o in u -
t iliza dos e a leija dos de t a n t o a pa n h a r , en qu a n t o a s m u la s a gü en t a m a s bor doa da s e a fa lt a
oca sion a l de u m a ou du a s r a ções, sem pr eju ízo físico. Nã o se r esfr ia m , n em a doecem por
descu ido ou excesso de t r a ba lh o. Ma s n ã o pr eciso ir a lém da ja n ela do qu a r t o em qu e est ou
escr even do pa r a ver , qu a se a qu a lqu er h or a , o ga do ser t r a t a do de m odo qu e leva r ia qu a lqu er
farm er **** do n or t e a despedir im edia t a m en t e o va qu eir o”.
*
In st r u m en t o sem ivoca l (N. dos T.)
**
In st r u m en t o m u do. (N. dos T.)
***
In st r u m en t o voca l. (N. dos T.)
****
Agr icu lt or . (N. dos T.)

314
MARX

difer en ça de gr a u en t r e o t r a ba lh o do fia n deir o e o do joa lh eir o, a


por çã o de t r a ba lh o com qu e o joa lh eir o a pen a s r epõe o va lor de su a
pr ópr ia for ça de t r a ba lh o n ã o se dist in gu e qu a lit a t iva m en t e, de m odo
a lgu m , da por çã o de t r a ba lh o a dicion a l, com qu e ger a m a is-va lia . Depois
com o a n t es, a m a is-va lia r esu lt a som en t e de u m excesso qu a n t it a t ivo
de t r a ba lh o, da du r a çã o pr olon ga da do m esm o pr ocesso de t r a ba lh o,
qu e é em u m ca so o pr ocesso da pr odu çã o de fios, em ou t r o, o pr ocesso
da pr odu çã o de jóia s.310
P or ou t r o la do, em t odo pr ocesso de for m a çã o de va lor , o t r a ba lh o
su per ior sem pr e t em de ser r edu zido a t r a ba lh o socia l m édio, por exem -
plo, u m a jor n a da de t r a ba lh o su per ior a x jor n a da s de t r a ba lh o sim -
ples.311 E vit a -se, por t a n t o, u m a oper a çã o su pér flu a e sim plifica -se a
a n á lise, por m eio da su posiçã o de qu e o t r a ba lh a dor em pr ega do pelo
ca pit a l execu t a t r a ba lh o socia l m édio sim ples.

310 A difer en ça en t r e t r a ba lh o su per ior e t r a ba lh o sim ples, sk illed e u n sk illed labou r, ba seia -se,
em pa r t e, em m er a s ilu sões ou pelo m en os difer en ça s qu e h á m u it o t em po cessa r a m de
ser r ea is e só per du r a m em con ven ções t r a dicion a is; em pa r t e ba seia -se n a sit u a çã o de-
sa m pa r a da de cer t a s ca m a da s da cla sse t r a ba lh a dor a , sit u a çã o qu e lh es per m it e m en os
qu e a s ou t r a s exer cer pr essã o pa r a obt er em o va lor de su a for ça de t r a ba lh o. Cir cu n st â n cia s
a ciden t a is desem pen h a m n o ca so u m pa pel t ã o im por t a n t e qu e os m esm os t ipos de t r a ba lh o
in ver t em su a s posições. On de, por exem plo, a su bst â n cia física da cla sse t r a ba lh a dor a est á
en fr a qu ecida e r ela t iva m en t e esgot a da , com o em t odos os pa íses de pr odu çã o ca pit a list a
desen volvida , os t r a ba lh os em ger a l br u t a is, qu e exigem m u it a for ça m u scu la r , se t or n a m
ger a lm en t e su per ior es em con fr on t o com t r a ba lh os m u it o m a is delica dos, qu e descen dem
a o n ível de t r a ba lh o sim ples, com o, por exem plo, n a In gla t er r a , o t r a ba lh o de u m brick layer
(pedr eir o) ocu pa u m n ível m u it o m a is a lt o qu e o de u m t ecedor de da m a sco. P or ou t r o
la do, o t r a ba lh o de u m fu stian cu tter (t osa dor de velu do) figu r a com o t r a ba lh o “sim ples”,
em bor a exija m u it o esfor ço físico e fa ça , a lém disso, m u it o m a l à sa ú de. De r est o, n in gu ém
deve se ilu dir qu e o ch a m a do sk illed labou r r epr esen t e u m a pr opor çã o qu a n t it a t iva m en t e
sign ifica t iva do t r a ba lh o n a cion a l. La in g ca lcu la qu e n a In gla t er r a (e P a ís de Ga les) a
exist ên cia de m a is de 11 m ilh ões ba seia -se em t r a ba lh o sim ples. Depois de descon t a r 1
m ilh ã o de a r ist ocr a t a s e 1,5 m ilh ã o de m en digos, va ga bu n dos, cr im in osos, pr ost it u t a s et c.
da popu la çã o de 18 m ilh ões qu e exist ia a o pu blica r -se su a obr a , fica m 4,65 m ilh ões pa r a
a cla sse m édia , in clu sive pequ en os r en t ist a s, fu n cion á r ios, escr it or es, a r t ist a s, pr ofessor es
et c. P a r a ch ega r a esses 4 2/3 m ilh ões, ele in clu i n a pa r t e t r a ba lh a dor a da cla sse m édia ,
a lém de ba n qu eir os et c., t odos os “t r a ba lh a dor es de fá br ica ” m a is bem r em u n er a dos! Ta m bém
os brick layers n ã o fa lt a m n essa ca t egor ia de “t r a ba lh a dor es pot en cia dos”. Rest a m -lh e en t ã o
os r efer idos 11 m ilh ões. (LAING, S. N ation al Distress et c. Lon dr es, 1844. [p. 49-52 passim .])
“A gr a n de cla sse qu e, em t r oca de a lim en t o, n a da m a is pode da r qu e t r a ba lh o com u m , é
a gr a n de m a ior ia do povo.” (MILL, J a m es. No a r t igo “Colon y”. In : S u pplem en t to th e E n -
cyclop. B rit. 1831.)
311 "Qu a n do se fa la de t r a ba lh o com o pa dr ã o do va lor , su ben t en de-se n ecessa r ia m en t e det er -
m in a da espécie de t r a ba lh o (...) a pr opor çã o em qu e a s ou t r a s espécies de t r a ba lh o est ã o
em r ela çã o a ela é fá cil de a ver igu a r ." (CAZE NOVE , J . Ou tlin es of Polit. E con om y. Lon dr es,
1832. p. 22-23.)

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