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Deficiência de alfa-1 antitripsina

Por Robert A. Wise, MD, Johns Hopkins Asthma and Allergy Center

Última modificação do conteúdo jun 2020

A deficiência de alfa-1 antitripsina é a ausência congênita de uma antiprotease pulmonar primária, alfa-1
antitripsina, que leva ao aumento da destruição tecidual mediada pela protease e enfisema em adultos.
O acúmulo hepático de alfa-1 antitripsina anormal pode causar hepatopatia em crianças e adultos. O
nível sérico de alfa-1 antitripsina < 11 mmol/L (< 80 mg/dL) confirma o diagnóstico. O tratamento
envolve interrupção do tabagismo, broncodilatadores, tratamento precoce de infecções e, em casos
selecionados, reposição de alfa-1 antitripsina. A hepatopatia pode exigir transplante. O prognóstico está
relacionado principalmente ao grau de comprometimento pulmonar.

Fisiopatologia

A alfa-1 antitripsina é um inibidor da elastase neutrofílica (antiprotease), cuja principal função é


proteger os pulmões da destruição tecidual mediada pela protease. A maior parte da alfa-1 antitripsina
é sintetizada por hepatócitos e monócitos, difundindo-se passivamente através da circulação até os
pulmões; parte é produzida de maneira secundária pelos macrófagos alveolares e células epiteliais. A
conformação proteica (e, consequentemente, a funcionalidade) e a quantidade de alfa-1 antitripsina
circulante são determinadas pela expressão codominante dos alelos parentais; foram identificados e
descritos > 90 diferentes alelos pelo fenótipo do inibidor de protease (PI*).

Fígado

A hereditariedade de alguns alelos variantes provoca alteração na conformação da molécula de alfa-1


antitripsina, conduzindo à polimerização e à retenção dentro dos hepatócitos. O acúmulo hepático de
moléculas de alfa-1 antitripsina aberrante causa icterícia colestática neonatal em 10 a 20% dos
pacientes; o restante provavelmente é capaz de degradar a proteína anormal, apesar de o mecanismo
protetor exato não estar esclarecido. Cerca de 20% dos casos de comprometimento hepático neonatal
resultam no desenvolvimento de cirrose na infância. Cerca de 10% das crianças sem hepatopatia
desenvolvem cirrose na idade adulta. O comprometimento hepático aumenta o risco de câncer do
fígado.

Pulmões

Nos pulmões, a deficiência de alfa-1 antitripsina aumenta a atividade da elastase neutrofílica, o que
facilita a destruição tecidual, conduzindo ao enfisema (especialmente em tabagistas, uma vez que o
tabagismo também aumenta a atividade de protease). Estima-se que a deficiência de alfa-1 antitripsina
seja responsável por 1 a 2% de todos os casos de doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC). A
deficiência de alfa-1 antitripsina mais comumente causa enfisema precoce; os sinais e sintomas do
envolvimento pulmonar em fumantes ocorrem mais cedo do que em não fumantes, mas em ambos os
casos são raros antes dos 25 anos. Alguns pacientes com bronquiectasia apresentam deficiência de alfa-
1 antitripsina.

Outros tecidos

Possivelmente, outras doenças associadas a variantes da alfa-1 antitripsina incluem paniculite (um
distúrbio inflamatório do tecido subcutâneo), hemorragia potencialmente fatal (por mutação que
converte a alfa-1 antitripsina de uma elastase neutrofílica em um inibidor de fator de coagulação),
aneurismas, colite ulcerativa , vasculite com anticorpo citoplasmático antineutrófilo (ANCA) positivo e
doença glomerular.

Classificação

O fenótipo PI normal é PI*MM. Mais de 95% dos indivíduos com deficiência grave de alfa-1-antitripsina
e enfisema são homozigotos para o alelo Z (PI*ZZ) e possuem níveis de alfa-1 antitripsina de,
aproximadamente, 30 a 40 mg/dL (5 a 6 micromol/L). A prevalência na população normal é 1/1500 a
1/5000. A maioria é de cor branca, com descendência do norte da Europa; o alelo Z é raro em asiáticos e
negros. Embora enfisema seja comum em pacientes com PI*ZZ, muitos pacientes não fumantes que são
homozigotos para PI*ZZ não desenvolvem enfisema; aqueles que desenvolvem têm tipicamente uma
história familiar de DPOC. Fumantes com PI*ZZ têm expectativa de vida inferior àqueles com PI*ZZ que
não fumam, os quais têm expectativa de vida inferior àqueles com PI*MM tabagistas ou não. Se são
tabagistas, as pessoas heterozigotas PI*MZ têm maior probabilidade de apresentar diminuições mais
rápidas do volume expiratório forçado em 1 segundo (VEF1) ao longo do tempo do que as pessoas na
população em geral.

Outros fenótipos raros incluem PI*SZ e dois tipos com alelos sem expressão, PI*Z-nulo e PI*nulo-nulo
(ver tabela Expressão dos fenótipos na deficiência de alfa-1 antitripsina ). O fenótipo nulo acarreta níveis
séricos indetermináveis de alfa-1 antitripsina. Níveis séricos normais de afla-1 antitripsina com mau
funcionamento podem ser observados na vigência de mutações raras.

TABELA

Expressão dos fenótipos na deficiência de alfa-1 antitripsina icon

Sinais e sintomas
Lactentes com envolvimento hepático podem manifestar icterícia colestática e hepatomegalia durante a
primeira semana de vida; em geral, a icterícia regride por volta dos 2 a 4 meses de idade. Pode haver o
desenvolvimento de cirrose na infância ou na idade adulta (os sinais e os sintomas da cirrose e do
carcinoma hepatocelular são discutidos em outras seções deste Manual). Adultos com enfisema têm
sinais e sintomas da DPOC , incluindo dispneia, tosse, sibilos e expiração prolongada.

A gravidade da doença pulmonar varia muito, dependendo do fenótipo, tabagismo e outros fatores. A
função pulmonar é bem preservada em alguns tabagistas PI*ZZ e pode estar gravemente comprometida
em alguns PI*ZZ não tabagistas. Indivíduos PI*ZZ identificados em estudos populacionais (aqueles sem
sintomas ou pneumopatia) tendem a ter melhor função pulmonar, sendo tabagistas ou não, do que os
indivíduos catalogados (aqueles selecionados por serem pneumopatas). A obstrução das vias
respiratórias ocorre com mais frequência em homens e em indivíduos com asma , infecções
respiratórias recorrentes, exposição à poeira ocupacional e antecedentes familiares de pneumopatia.

Paniculite , uma doença inflamatória dos tecidos moles subcutâneos, manifesta-se como placas ou
nódulos endurecidos, sensíveis e descoloridos, tipicamente no abdome inferior, na região glútea e nas
coxas.

Diagnóstico

Nível sérico de alfa-1 antitripsina

Genotipagem

Suspeita-se de deficiência de alfa-1 antitripsina nos seguintes casos:

Tabagistas que desenvolvem enfisema antes dos 45 anos de idade

Não tabagistas sem exposições ocupacionais que desenvolvem enfisema em qualquer idade

Pacientes cuja radiografia de tórax mostra enfisema pulmonar predominantemente nos lobos inferiores

Pacientes com antecedentes familiares de enfisema ou cirrose sem explicação

Pessoas com história familiar de deficiência de alfa-1 antitripsina

Pacientes com paniculite

Recém-nascidos com icterícia ou elevação de enzimas hepáticas


Pacientes com bronquiectasia ou doença hepática inexplicável

Faz-se o diagnóstico identificando os níveis séricos de alfa-1 antitripsina < 80 mg/dL (< 15 micromol/L),
se medido pelo método de imunodifusão radial, ou níveis < 50 mg/dL (< 9 micromol/L) se medido por
nefelometria. Pacientes com níveis baixos devem ter confirmação por genotipagem.

Prognóstico

Como grupo, as pessoas com deficiência grave de alfa-1 antitripsina que nunca fumaram têm uma
expectativa de vida normal e apenas insuficiência moderada da função pulmonar. A causa mais comum
de morte na deficiência de alfa-1 antitripsina é enfisema, seguido por cirrose , muitas vezes com
carcinoma hepatocelular .

Tratamento

Cuidados de suporte

Para a doença pulmonar, geralmente reposição de alfa-1 antitripsina

O tratamento da pneumopatia é com alfa-1 antitripsina humana purificada (60 mg/kg, IV durante 45 a
60 min, administrados 1 vez/semana, ou 250 mg/kg, durante 4 a 6 h, administrados 1 vez por mês
[somente concentrado]), o que mantém o nível sérico de alfa-1-antitripsina acima do nível ideal de
proteção de 80 mg/dL (35% do normal). Como o enfisema provoca alteração estrutural permanente, a
terapia não pode melhorar a função ou a estrutura pulmonar comprometida, mas é administrada para
impedir a progressão. O tratamento é caro e, portanto, reservado para pacientes que não fumam e com
os dois alelos anormais, função pulmonar leve a moderada e confirmação do diagnóstico por baixo nível
sérico de alfa-1 antitripsina. Não está indicado para os pacientes com doen-ça grave ou para aqueles nos
quais um ou ambos os alelos são normais.

Cessação do tabagismo , uso de broncodilatadores e tratamento precoce das infecções respiratórias são
particularmente importantes para os pacientes com deficiência de alfa-1 antitripsina e enfisema.

Para os indivíduos com comprometimento grave e idade < 60 anos, deve-se considerar o transplante
pulmonar . A redução do volume pulmonar no tratamento do enfisema por deficiência de alfa-1
antitripsina é controversa.

A terapia genética encontra-se em estudo.


O tratamento da hepatopatia é paliativo. A reposição de enzima não ajuda, pois a doença é causada pelo
processamento anormal, em vez de deficiência enzimática. Pode-se usar o transplante de fígado em
pacientes com insuficiência hepática.

O tratamento da paniculite não está bem definido. Corticoides, antimaláricos e tetraciclinas foram
utilizados.

Pontos-chave

Suspeitar de deficiência de alfa-1 antitripsina se o paciente tiver enfisema inexplicável, doença hepática
(particularmente em recém-nascidos), paniculite ou bronquiectasias.

Diagnosticar utilizando o nível sérico de alfa-1 antitripsina < 80 mg/dL (< 15 micromol/L) e confirmar por
genotipagem.

Tratar os pacientes selecionados (pacientes que não fumam nos quais ambos os alelos são anormais e
que têm função pulmonar leve a moderada e baixos níveis séricos de alfa-1-antitripsina) com alfa-1
antitripsina humana purificada.

Considerar transplante de fígado caso se desenvolva insuficiência hepática.

Tratamento da agudização de DPOCHemorragia alveolar difusa

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