Você está na página 1de 10

ESTUDOS SOCIOANTROPOLÓGICOS

3
CONCEITOS BÁSICOS DE ANTROPOLOGIA
1. INTRODUÇÃO........................................................................................................... 3
2. AS ORIGENS DA ANTROPOLOGIA E SEU CAMPO DE PESQUISA ........................ 3
3. LÉVI-STRAUSS E AS FASES DO ESTUDO ANTROPOLÓGICO ............................... 7
4. REVISÃO DA AULA .................................................................................................. 9
5. REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 10

Este conteúdo foi produzido pelo Núcleo de Educação a Distância da Universidade Brasil e sua reprodução e distribuição são autorizadas
apenas para alunos regularmente matriculados em cursos de graduação, pós-graduação e extensão da Universidade Brasil e das
Faculdades e dos Centros Universitários que mantêm Convênios de Parceria Educacional ou Acordos de Cooperação Técnica com a
Universidade Brasil, devidamente celebrados em contrato.
AULA 3

CONCEITOS BÁSICOS DE
ANTROPOLOGIA

Identificar as características que proporcionaram o surgimento da


antropologia e seus objetos de estudo a partir da pesquisa de
campo;

Compreender a relação da antropologia com as particularidades


da estrutura social dos agrupamentos humanos;

Conhecer o processo metodológico de Lévi-Strauss e


entender suas definições de Etnografia e Etnologia.

2
1. INTRODUÇÃO

Nessa aula você verá um pouco mais do processo de surgimento dos Estudos
Socioantropológicos, retomará alguns conceitos da antropologia apresentados na primeira
aula e compreenderá melhor as suas aplicações. Ao final da aula, você entenderá o que é
cultura em seu sentido antropológico, as fases de seus procedimentos metodológicos e a
importância da linguagem para tais estudos.

Tenha uma boa leitura!

2. AS ORIGENS DA ANTROPOLOGIA E SEU CAMPO DE PESQUISA

Como você viu nas aulas anteriores, a antropologia surgiu em um momento em que as
potências europeias tinham o objetivo de ampliar seus domínios. Sendo assim, esse campo
do conhecimento serviu, em muitos momentos, de embasamento teórico e epistemológico
para a construção de uma visão eurocêntrica, segundo a qual os povos europeus seriam mais
“evoluídos” que os demais, principalmente indígenas e africanos, reforçando assim
preconceitos e estereótipos.

A antropologia tem como objeto de estudo aquilo que há de semelhante e de diferente,


em termos culturais, nos variados agrupamentos humanos, além de analisar a origem e
evolução das culturas e modos de vida dos diferentes povos. Isso permite que ela observe
tanto as características socioculturais dos povos pré-letrados, quanto das tribos urbanas
contemporâneas.

Além disso, a antropologia também estuda as várias formas de organização familiar,


os cultos religiosos, os ritos de passagem em determinadas sociedades, os diversos tipos de
casamento, entre outros aspectos.

É sabido que o pesquisador deve buscar não interferir no modo de vida do objeto
pesquisado, a fim de não comprometer seu trabalho. Porém, é necessário perguntar: é
possível ser totalmente neutro? Quem de nós está livre de pré-noções e julgamentos
antecipados? Sendo assim, podemos dizer que os primeiros antropólogos desbravaram um
caminho até então desconhecido, mas mantendo em suas pesquisas um olhar eurocêntrico
e até mesmo etnocêntrico a respeito dos agrupamentos humanos por eles observados.

3
FIQUE ATENTO

Eurocentrismo – visão que coloca o que existe ou vem da Europa como sendo
superior ao que tem origem em outras partes do mundo, em especial das
nações subdesenvolvidas ou emergentes.
Etnocentrismo – tendência a considerar os valores e as normas da própria
sociedade como superior aos dos demais grupos, sendo assim aplicáveis a
todos.

O ser humano cresce habituado a enxergar o que acontece em sua volta tendo como
base as pessoas próximas e crendo que essa é a vida “normal”, como se só pudesse existir
esse modo de ser, que as coisas sempre foram e serão da mesma forma. No entanto, essa é
uma visão permeada pelo juízo de valor, a qual nos faz acreditar que só o modo de viver com
o qual estamos acostumados é o correto e que nenhuma outra maneira de convivência
coletiva é possível.

A Antropologia se propõe, fundamentalmente, a uma desnaturalização da maneira de


ver o mundo, a partir do estranhamento da realidade. Apenas quando observamos o mundo
que nos cerca procurando as suas contradições, observando o que nos é diferente e com o
intuito de entender suas razões, temos os fundamentos necessários para o estudo das
Ciências Sociais, e no caso dessa aula, da Antropologia.

Os primeiros antropólogos foram europeus ou norte-americanos e buscavam estudar


os grupos humanos que viviam de forma diferente dos habitantes dos países industrializados.
Porém, estes pioneiros esbarravam frequentemente em uma questão metodológica: os
pesquisadores partiam do pressuposto que estavam em um estágio avançado de civilização,
o que sustentava uma visão de que o “outro” vivia de forma “primitiva”.

Essa análise sustentava a dominação dos países europeus sobre os países e


sociedades africanas, americanas e asiáticas. Esses povos historicamente subjugados
sofreram, durante séculos, com a exploração e colonização, algo que, ainda hoje, representa
um grande impacto em seus processos de desenvolvimento nacional, além de reforçar uma
visão estereotipada dos referidos povos tidos como menos evoluídos que os europeus.

EXEMPLIFICANDO

Os índios Ianomâmis, que vivem na Amazônia brasileira, habitam a mesma


área há cerca de 3000 anos e estão em um estágio diferente de
desenvolvimento humano, pois ainda hoje não detêm técnicas sofisticadas,

4
como ferramentas e utensílios domésticos tão comuns no cotidiano da
sociedade industrial. Seu modo de vida, baseado na caça e na coleta, além de
uma agricultura rudimentar, representa um sistema social mais simples em
comparação ao das sociedades industriais e tecnológicas, como as
modernas metrópoles do Japão ou Estados Unidos. No caso dos Ianomâmis,
sua sobrevivência depende dos meios naturais, pois sua estrutura social é
fundamentada na relação com a natureza. Não existe desperdício, nem
competição, todas as formas de existência se completam, sejam elas
humanas ou advindas dos recursos naturais. Em caso de destruição do meio
natural, aquela estrutura social também se desfaz.

Muitas vezes utilizamos o termo cultura no sentido de definir sofisticação ou


refinamento: “fulano é educado, ele tem cultura”, como se esta pessoa tivesse tido contato
com saberes mais importantes do que outros que não apreenderam tais ensinamentos. Essa
definição de cultura sustenta uma visão segundo a qual aqueles que detêm certo modo de
vida e conhecimentos decorrentes deste, são superiores aos demais.

Também há o entendimento de que cultura representa educação formal: quanto maior


a escolaridade do indivíduo, maior sua bagagem cultural, o que nem sempre representa uma
verdade, pois alguns saberes e conhecimentos necessários para a vida humana transcendem
a mera formação escolar.

Quando confundimos o termo cultura com formação escolar ou sofisticação, que é


uma versão tomada pelo senso comum, sustentamos uma análise preconceituosa que
classifica os conhecimentos de forma hierárquica. Como se as produções oriundas de pobres,
negros, moradores de favela, analfabetos e mulheres (em geral, grupos dominados)
estivessem abaixo das que são produzidas pelos grupos dominantes.

Como você viu na primeira aula, para não incorrer em falhas na sua pesquisa ou
desvios de análise que podem comprometer o seu trabalho, o pesquisador-antropólogo deve
ter um olhar relativista sobre o outro e seu modo de viver, por mais distante que sua existência
esteja de seu cotidiano habitual.

EXEMPLIFICANDO

O samba, ritmo musical tipicamente brasileiro e de matriz africana, foi


perseguido, discriminado e depreciado em suas origens, devido às suas
raízes populares e negras. Com o tempo, passou a ser tolerado e até
estimulado em locais próprios da classe dominante, como as rádios e os
cassinos. No entanto, para amenizar suas propriedades afro-brasileiras e

5
populares, houve diversos movimentos de cooptação e apropriação, como
nos casos de artistas e movimentos musicais como Carmem Miranda e a
Bossa Nova, que foram influenciados pelo samba, mas se apresentavam
mais palatáveis ao gosto da classe dominante, por amenizarem as suas
características de origem.

Sendo assim, a antropologia nos ensina que aquilo que consideramos como natural e
imutável é, na verdade, resultado de processos culturais que possibilitaram aquele modo de
vida, suas regras e diretrizes coletivas. Mesmo gestos, mímicas, relações afetivas, hábitos
alimentares, vestimentas, ritmos musicais, festividades e constituição familiar derivam de
características do ambiente e da sociabilidade que os possibilitaram.

EXEMPLIFICANDO

As religiões afro-brasileiras como a Umbanda e o Candomblé guardam em si


muitas práticas, costumes, tradições e ritualísticas africanas que foram
trazidas pelos negros que vieram para o Brasil na condição de escravos. Por
mais que tenham sido reduzidos a meras ferramentas de trabalho, negando
a sua condição de seres humanos, os negros escravizados trouxeram junto
de si suas construções coletivas, adaptando-as conforme as condições
existentes no Brasil, criando novos códigos religiosos próximos dos
praticados na África, porém diferentes, devido ao novo lugar em que se viram
obrigados a viver.

SAIBA MAIS

Para identificar características semelhantes entre diferentes povos, você


pode assistir o documentário de Bibiano Girard: “Atlântico Negro – Na rota
dos Orixás” (1998). Esse documentário trata da riqueza cultural africana,
sobretudo sua religiosidade. A obra exibe rituais e trajes típicos que guardam
semelhanças e diferenças entre os habitantes do nosso país e do continente
africano, mostrando com nitidez a relação existente entre esses povos. O
documentário aponta uma admiração e respeito recíprocos entre o Brasil e a
África, bem como um grande entrosamento cultural entre eles.
Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=5h55TyNcGiY> Último
acesso: 28 jun. 2018

6
3. LÉVI-STRAUSS E AS FASES DO ESTUDO ANTROPOLÓGICO

De acordo com um dos mais influentes antropólogos, o belga Claude Lévi-Strauss


(1908-2009), um importante aspecto da ciência antropológica reside nas etapas de sua
pesquisa. Lévi-Strauss se inspira em princípios estruturais na formação dos idiomas e da
linguagem, pois, desde que o ser humano desenvolveu a linguagem e passou a se comunicar
simbolicamente, surgiram codificações que adquirem seu sentido no interior do grupo
determinado, podendo, portanto, alterarem de acordo com os diferentes grupos.

Laplantine afirma que é por meio da linguagem que

Os indivíduos que compõem uma sociedade se expressam e expressam seus


valores, suas preocupações, seus pensamentos. Apenas o estudo da língua
permite compreender: o como os homens pensam, o que vivem e o que
sentem, isto é, suas categorias psicoafetivas e psicocognitivas; o como eles
expressam o universo e o social (estudo da literatura, não apenas escrita, mas
também de tradição oral); o como, finalmente, eles interpretam seus próprios
saber e saber-fazer (2003, p. 10)

A linguagem pode ser considerada o âmbito mais autossuficiente da antropologia em


virtude da grande diversidade de idiomas, sendo que cada um deles pode possuir uma
estrutura básica.

Tais considerações nos ajudam a entender o funcionamento de diferentes etapas do


método antropológico, em especial do ponto de vista estruturalista.

A primeira etapa é a etnografia, que pode ser definida como a ação de colher dados
sobre um grupo humano, em outras palavras, a pesquisa de campo propriamente dita. Nesse
momento o mais importante é a observação e a descrição – por vezes detalhada – da
experiência social dentro de um determinado grupo.

Uma vez recolhidos os elementos descritos acima, o antropólogo pode seguir para
outra etapa, a etnologia, que produzirá uma síntese dos dados obtidos na etnografia, levando
em conta algumas considerações:

 Contexto geográfico: determinar se os dados obtidos podem ser similares em


grupos vizinhos ao estudado, buscando ver se alguns valores se estendem de uma
determinada região em direção para outros grupos.
 Contexto histórico: por meio dos dados, refletir acerca do grupo humano em
relação com sua ancestralidade, possibilitando assim ver se os valores são
rupturas ou permanências através do tempo.
 Sistematizar determinado elemento observado durante a etapa etnográfica,
ampliando o nível de detalhamento sobre o grupo estudado.

7
A etapa final desses estudos configura a Antropologia propriamente dita. Essa é a fase
de estudos sobre os grupos humanos em seus contextos universais e particulares sendo, por
isso, capaz de estabelecer padrões de caráter global acerca dos homens em sociedade.
Assim seria possível chegar a conclusões comuns a sociedades em espaços (contexto
geográfico) e tempos (contexto histórico) diferentes, de agrupamentos indígenas às tribos
urbanas contemporâneas.

FIQUE ATENTO

A etnografia e a etnologia são partes integrantes da antropologia,


constituindo-se em etapas de pesquisa que permitirão a afirmação de
conhecimentos relativos ao homem e sua relação com o meio social. Em
linhas gerais, a etnografia utiliza um método descritivo e sincrônico (dentro
de um único recorte cronológico), com comparações em pequena escala que
buscam alcançar um entendimento geral baseado em casos particulares
comparáveis entre si. A etnologia utiliza um método comparativo e
diacrônico, com comparações em larga escala, tendendo para a criação de
leis sociais baseadas numa grande quantidade de casos e comportamentos
sociais.

SAIBA MAIS

Para entender melhor sobre a vida e o pensamento de Lévi-Strauss você pode


ler o artigo da revista Pesquisa Fapesp: Entre o Cru e o Cozido – Biografia
intelectual de Lévi-Strauss revela vida de dilemas.
Disponível em http://revistapesquisa.fapesp.br/2008/05/01/entre-o-cru-e-o-
cozido/ Último acesso: 29 jun. 2018.

8
4. REVISÃO DA AULA

Nesta aula você reviu o contexto do surgimento da antropologia, suas definições para
a cultura e a intencionalidade por trás desse contexto, o qual envolveu processos de
etnocentrismo e eurocentrismo.

Relembrou da importância e dificuldade do cientista em se manter isento em sua


pesquisa, não podendo levar em conta seu conhecimento prévio sobre um agrupamento antes
de estudá-lo.

Compreendeu a importância da linguagem para uma melhor estruturação do saber


antropológico e entendeu como funcionam as três fases do processo metodológico da
antropologia estrutural.

9
5. REFERÊNCIAS

GONÇALVEZ, Alicia Ferreira. Etnografia, etnologia & teoria antropológica. Revista de Ciências
Sociais, n. 44, jan.-jun. 2016, pp. 247-261. Disponível em
www.periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/politicaetrabalho/article/view/23396/16479 Último
acesso: 28 jun. 2018.

LAPLANTINE, François. Aprender Antropologia. Tradução de Marie-Agnês Chauvel. São


Paulo: Brasiliense, 2003. Disponível em:
https://pedropeixotoferreira.files.wordpress.com/2010/03/laplantine_aprender-
antropologia.pdf Último acesso: 28 jun. 2018.

OLIVEIRA, José Lisboa Moreira de. A evolução como processo cultural. In: Introdução ao
pensamento antropológico. Disponível em:
http://www.ucb.br/sites/000/14/introducaoaopensamentoantropologico.pdf. Último acesso:
28 jun. 2018.

OLIVEIRA, Luiz Fernandes de. COSTA, Ricardo Cesar Rocha da. Sociologia para jovens do
século XXI. 4º ed. Rio de Janeiro: Imperial Novo Milênio, 2016.

OLIVEIRA, Pérsio Santos de. Introdução à sociologia. São Paulo: Ática, 2004.

Este conteúdo foi produzido pelo Núcleo de Educação a Distância da Universidade Brasil e sua reprodução e distribuição são autorizadas
apenas para alunos regularmente matriculados em cursos de graduação, pós-graduação e extensão da Universidade Brasil e das
Faculdades e dos Centros Universitários que mantêm Convênios de Parceria Educacional ou Acordos de Cooperação Técnica com a
Universidade Brasil, devidamente celebrados em contrato.
10

Você também pode gostar