Você está na página 1de 2

ARTIGO 9

No nono artigo perguntamos:


A verdade está no sentido?
[Leituras paralelas: S.T., I, 16, 2; 17, 2; 85, 6; III De anima, lect. 6, n. 660 seq.; IV Metaph., lect. 12, nn.
67 3, 68 1 seq.]
Dificuldades
E parece que não, pois
1. Anselmo diz: “A verdade é uma retidão perceptível apenas pela mente” 1. Mas o
sentido não é da mesma natureza que a mente. Portanto, a verdade não está no sentido.
2. Agostinho prova2 que a verdade não é conhecida pelos sentidos corporais, e
suas razões foram expostas acima. Portanto, a verdade não está no sentido.
Pelo contrário
Agostinho diz: “A verdade manifesta aquilo que é” 3. Mas aquilo que é, não se
manifesta apenas ao intelecto, mas também ao sentido. Portanto a verdade não está
apenas no intelecto, mas também no sentido.
RESPOSTA
A verdade está tanto no intelecto quanto no sentido, mas não do mesmo modo.
Está no intelecto como consequência do ato do intelecto e como conhecida pelo
intelecto. A verdade segue a operação do intelecto, na medida em que pertence ao
intelecto julgar sobre uma coisa como ela é. E a verdade é conhecida pelo intelecto pelo
fato de que o intelecto reflete sobre seu próprio ato – não apenas como conhecendo seu
próprio ato, mas como conhecendo a proporção de seu ato com a coisa. Ora, essa
proporção não pode ser conhecida sem conhecer a natureza do ato; e a natureza do ato
não pode ser conhecida sem conhecer a natureza do princípio ativo, isto é, o próprio
intelecto, cujo a natureza pertence conformar-se às coisas. Conseqüentemente, é porque
o intelecto reflete sobre si mesmo que ele conhece a verdade. Mas a verdade está no
sentido também como consequência de seu ato, pois o sentido julga as coisas como elas
são. Porém, a verdade não está no sentido como algo conhecido pelo sentido; pois,
embora o sentido julgue verdadeiramente sobre as coisas, ele não conhece a verdade
pela qual verdadeiramente julga. Embora o sentido conheça que sente, ele não conhece
sua própria natureza; conseqüentemente, ele não conhece a natureza de seu ato nem a
proporção deste ato para as coisas. Como resultado, ele não conhece sua verdade.
A razão disso é que as coisas mais perfeitas em entidade, como, por exemplo, as
substâncias intelectuais, retornam à sua essência com um retorno completo: conhecendo
algo externo a si mesmos, em certo sentido saem de si mesmos; mas ao conhecer que
conhecem, já começam a retornar a si mesmos, porque o ato de cognição faz a mediação
entre o conhecedor e a coisa conhecida. Mas esse retorno se completa na medida em que
conhecem suas próprias essências. Por isso, é dito no livro Sobre as causas: “Algo que
tem ciência de sua própria essência, retorna a ela por um retorno completo”4.
Como o sentido está mais próximo de uma substância intelectual do que outras
coisas, ele começa a retornar à sua essência; pois não só conhece o sensível, mas
também sabe que sente. Seu retorno, porém, não é completo, pois não conhece sua
própria essência. Avicena deu a razão para isso 5, apontando que o sentido não conhece
1
De verit., cap. 11.
2
LXXXIII Quaestionum [qu. 9].
3
Vera Religione [cap. 36].
4
De Causis [prop. 15 (14)].
5
De anima V, 2
nada exceto através de um órgão corporal, e um órgão corporal não pode ser um meio
entre uma potência sensitiva e ele mesmo. Mas as potências insensíveis não podem
retornar a si mesmas de modo algum, pois elas não possuem o conhecimento de que
estão agindo. Por exemplo, o fogo não tem o conhecimento de que está aquecendo.
A partir desta discussão, as soluções para as dificuldades são claras.

Você também pode gostar