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Tribunal Judicial da Comarca de ·····

Proc. n.º 2 /15


1ª Secção de Execução - Juiz 2

Meritíssimo Juiz de Direito

Fernando, NIF ·····, residente em ·····, executado nos autos em referência,


vem deduzir embargos de executado contra a exequente Sofides, SA, o
que faz nos termos e com os seguintes fundamentos:

1. A presente execução estriba-se num documento autenticado


por notário denominado "Contrato de Crédito em Conta
Corrente Associado a Cartão de Crédito", precedido de um
pedido de reserva permanente de dinheiro.

2. Em tal documento, onde se contém um clausulado geral, não é


possível delinear um qualquer contrato de mútuo - que apenas
se pode ter como concluído e perfeito com a entrega da coisa
mutuada -, mas antes e quando muito uma mera proposta de
um contrato de abertura de crédito.

3. No proémio do respectivo clausulado se fala, de resto, em


proposta: "Esta é uma proposta válida até 31/07/2014, que se
poderá converter em contrato definitivo nos termos seguintes".

4. E o mesmo se retira da cláusula 2.1: "A SOFIDES reserva-se o


direito de, após a recepção do exemplar do contrato que lhe é
destinado, confirmar ou recusar a concessão do crédito".

5. Por outro lado, do documento em análise nem sequer consta o


montante da quantia alegadamente mutuada, a respectiva taxa
de juros ou os valores do seu reembolso, tendo-se clausulado
apenas que o custo do crédito a constituir no âmbito do
contrato varia em função do montante e da duração do saldo
(cfr. cl. 7ª).
6. Por fim, tal documento e clausulado geral nem se mostra
assinado pelo executado, pois a assinatura deste apenas consta
do pedido de reserva permanente de dinheiro.

7. No fundo e em última análise, pelo documento em referência


não é possível determinar nem os sujeitos da relação executiva,
nem os limites da obrigação exequenda.

8. Todavia, a entender-se estar-se, não perante uma mera


proposta, mas perante um contrato de abertura de crédito
devidamente concretizado, neste apenas se contêm prestações
futuras ou a previsão da constituição de obrigações futuras, o
que não é posto em causa pelo teor da cláusula 3.6, em que
apenas se reconhece a exigibilidade destas obrigações: "O
mutuário reconhece a exigibilidade das dívidas decorrentes da
utilização do crédito em conta corrente e a sua responsabilidade
pelo respectivo pagamento à SOFIDES".

9. E, sendo assim, nem por aqui estaríamos perante um título


exequível.

O Direito

«Por definição, o título executivo é o documento que pode


segundo a lei, servir de base à execução de uma prestação, já
que ele oferece a demonstração legalmente bastante do direito
correspondente (cfr. Castro Mendes, Lições de Direi to Civil, 1969,
pág. 143).

Do ponto de vista formal, o título é o documento em si próprio e,


do ponto de vista material, é a demonstração legal do direito a
uma prestação (cfr. o mesmo Autor, A causa de Pedir na Acção
Executiva - Rev. Fac. Direito da Universidade de Lisboa, vol. XVIII,
págs. 189 e segs).

Como se sabe, o Processo Executivo visa realizar coercivamente


um direito já afirmado.
Ora, como "toda a execução tem por base um título, pelo qual se
determinam o fim e os limites da acção executiva" - artº.10º 1 do
nCPC - facilmente se percebe que aquela afirmação deve
necessariamente constar do título executivo.

E também só essa prévia afirmação do direito permitirá entender o


comando do art. 53º/1 do mesmo Código: "A execução tem de ser
promovida pela pessoa que no título executivo figura como credor
e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tinha a
posição de devedor".

Como se vê, "... pela análise do título se há-de determinar a


espécie de prestação e da execução que lhe corresponde
(entrega de coisa, prestação de facto, dívida pecuniária), se
determinará o quantum da prestação e se fixará a legitimidade
activa e passiva para a acção" (Anselmo de Castro, A Acção
Executiva Singular, Comum e Especial, pág. 11).

Conforme já salientava Alberto dos Reis, "...desde que a


execução não é conforme ao título, na parte em que existe
divergência, tudo se passa como se não houvesse título: nessa
parte a execução não encontra apoio no título" (Código do
Processo Civil Explicado, pág. 26).

E, sempre que isso aconteça, ou seja, "... se a discordância entre


o pedido e o título consistir em excesso de execução, isto é, em
se pedir mais do que o autorizado pelo título", cabe ao juiz
indeferir liminarmente o requerimento executivo na parte em que
exceda o conteúdo do título, mandando prosseguir a execução
pela parte que efectivamente lhe corresponda" (Lopes Cardoso,
Manual da Acção Executiva, pág. 29).

Se a discordância entre o pedido e o título for absoluta, o


indeferimento será, naturalmente, total.

Quanto à causa de pedir em acção executiva, há quem entenda


que ela se reconduz ao próprio título accionado (cfr. Alberto dos
Reis, Comentário, I, pág. 98, Lopes Cardoso, ob. cit., págs. 23 e
29 e Ac. do STJ de 24-11-83, BMJ 331/469), enquanto outros
sustentam que ela é antes constituída pela factualidade essencial
de onde emerge o direito, reflectida embora no próprio título (cfr.
Castro Mendes, A Causa de Pedir..., págs. 189 e sgs., Lebre de
Freitas, Acção Executiva, 2ª ed., pags. 64 e 65, A. Varela, RLJ,
121º/148 e sgs e Ac. do STJ de 27-1-98, CJ, STJ, I, pág. 40).

Como quer que seja, os próprios defensores da 2ª teoria não


retiram qualquer relevo ao título executivo, limitando-se a
enquadrá-lo no seu meio próprio, que é o processual, do mesmo
passo que enquadram a factualidade causal no seu meio próprio,
que é o substantivo (cfr. Ac. do STJ de 27-794, CJ, STJ, III, pág.
70).» Ac. TRL de 01-07-2010, Processo: 4986/09.1TCLRS.L1-6,
Rel: CARLOS VALVERDE

Sendo convencionada ou prevista a constituição de prestações


futuras, terá de ser anexado documento emitido na sua
conformidade, demonstrativo da efectiva realização de alguma
prestação ou da constituição de obrigação, no seguimento do
previsto pelas partes (art. 707º do nCPC).

E isto, porque é necessário que o título permita certificar a


existência da obrigação que se constituiu entre as partes, pois só
assim representa um facto jurídico constitutivo do crédito e que
deve emergir do próprio título (cfr. Alberto dos Reis, processo de
Execução, I, pág. 125).

Se não for junto tal documento complementar, que deve obedecer


às condições estabelecidas no documento que constitui o título-
base, não há prova da existência de obrigação dotada de força
executiva (cfr. Lopes Cardoso, ob. cit., pág.73, Lebre de Freitas,
ob. cit., pág. 49 e Antunes Varela, Manual de Processo Civil, 2ª
ed., pág. 80).

In casu, não foi feita essa prova.

Termos em que deverão os presentes embargos


ser recebidos e em decorrência ser inteiramente
extinta a presente execução.

Valor da Acção: nome, profissão e morada.


Junta: procuração forense e DUC comprovativo do pagamento da taxa
de justiça.

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