Se, nas salas de aula presenciais, faltam atenção e entusiasmo aos alunos, os ambientes de
convívio e interação virtuais ganham cada vez mais espaço na vida dos jovens de hoje. Com o uso
crescente das midias sociais em significativa parcela da população brasileira, já é hora de a
educação se apropriar dessas novas ferramentas e fazer avanços nesse universo, onde hoje o
conhecimento circula em todas as direções, não mais apenas do professor para o aluno. Para falar
do grande desafio que é tornar o uso de mídias sociais um instrumento poderoso e eficaz no
aprendizado, convidamos o professor Ronaldo Lemos, coordenador do Centro de Tecnologia e
Sociedade da FGV DIREITO RIO e do projeto Creative Commons no Brasil, a discutir o assunto,
respondendo às perguntas elaboradas pela professora Claudia Capello, coordenadora pedagógica
do FGV Online.
A educação precisa ir aonde as pessoas estão. Muitas vezes, vejo projetos grandes e
complexos que criam "portais" educacionais na expectativa de que os estudantes
mudarão seus hábitos de uso da rede e passarão a frequentá-los com frequência. Em
geral, não é isso o que acontece. O uso das redes sociais no âmbito educacional aponta
nesse sentido. Pode haver críticas às redes sociais e sobre como elas ocupam o tempo útil
das pessoas, mas é um fato importante hoje, no Brasil, que muitos jovens dedicam sua
atenção e seu entusiasmo para interagir com outras pessoas no âmbito dessas redes. Isso
abre possibilidades educacionais importantes, especialmente porque atenção e entusiasmo
são elementos que andam em falta nas salas de aula.
2) As iniciativas de levar as redes sociais para a sala de aula já são uma realidade, ainda que
nem sempre formalizada pela instituição de ensino. Não é comum, porém, que o uso
dessas redes seja inserido em um projeto pedagógico, o que parece importante que seja
feito, já que a internet, por si, é um meio, mas não um espaço pedagógico por natureza.
O que o senhor acha a respeito da inclusão das redes sociais nos projetos pedagógicos das
instituições de ensino?
Sem dúvidas, em nenhum momento, o professor e um planejamento pedagógico
inteligente podem ser menosprezados. Mas nem sempre isso acontece. É preciso lembrar
que o conhecimento hoje não circula apenas do professor para o aluno, mas acontece
também de aluno para aluno e até de aluno para o professor. É preciso reconhecer isso e
estimular os alunos, de forma inteligente, a serem também produtores do conhecimento.
O maior desafio da educação é justamente este: fazer com que a responsabilidade do
ensino e do aprendizado seja compartilhada entre alunos, professores e outros atores
sociais não envolvidos originalmente no processo educacional.
3) Nem todos os docentes veem com bons olhos o uso da tecnologia e, sobretudo, das redes
sociais, como ferramenta educacional. Para o senhor, qual a melhor forma de integrar o
docente a essa nova realidade?
Esse é outro desafio. Hoje o uso da tecnologia é visto como concorrente da escola. O
tempo da escola é lento, o da tecnologia é rápido. A velocidade de informação da
tecnologia é imediata, da escola é mediata. Isso, e outros fatores, geram tensões entre
professores, alunos e instituições. A meu ver, isso traz um momento de oportunidade. É
uma boa hora para repensar a educação a partir das mudanças de mídia que estamos
atravessando. A escola ainda é excessivamente organizada em torno do "texto". No
entanto, nossa vida é cada vez mais "multimídia". A escola precisa se preparar para se
tornar multimídia também, ensinando habilidades que vão muito além do "texto".
Essa é uma dupla tarefa. O professor precisa vivenciar, ainda que em parte, o universo
tecnológico em que os alunos estão inseridos. Esse é um problema hoje que possui um
componente geracional. As próximas gerações de professores já irão naturalmente
assimilar melhor os usos da tecnologia, mesmo que demore a haver um planejamento
específico sobre isso. A outra tarefa é não subestimar a capacidade dos alunos de lidar
com a tecnologia. Por exemplo, era comum até pouco tempo laboratórios de informática
trancados, porque os equipamentos eram caros e os alunos não deveriam utilizá-los sem
supervisão.
Gosto do enfoque de projetos com o Hole on the Wall, na índia, desenvolvido pelo
Sugata Mitra , Mas não acho que seja suficiente, Ele representa só o primeiro passo : expor
os alunos à tecnologia, seja ela qual for, dos celulares aos computadores e tablets, Os
passos seguintes são igualmente importantes, como assimilar as novas mídias sociais na
educação. E ainda ensinar os alunos a não tomarem a tecnologia como "dado", isto é,
saber que a própria tecnologia pode ser modificada e reapropriada para outros propósitos
que vão além do que é esperado dela .
6) O uso pedagógico das redes sociais vai além da utilização dessas redes para compartilhar
conhecimento e criar atividades: é preciso ter uma gestão eficiente, que preserve a ética e
os valores da instituição. O que o senhor considera imprescindível para que seja feita uma
gestão competente das redes sociais com fins educacionais?
O primeiro passo é garantir acesso total e ilimitado a elas. Políticas educacionais que
restringem os usos das redes sociais já saem perdendo e são um fator adicional de
desestímulo com relação à educação. Acho que a escola tem muito a aprender com a
forma corno a comunicação acontece nas midias sociais. O desafio é justamente trazer a
vivência expandida que a exposição às redes sociais traz para o contexto educacional,
ampliando os horizontes da educação. A questão da ética é um excelente exemplo: não
vejo forma mais interessante de desenvolver um aprendizado sobre ética do que
discutindo temas que estão presentes no dia a dia das mídias sociais. É um aprendizado
que se desloca da teoria , do plano abstrato dos livros, para uma vivência prática. Essa é
uma imagem-síntese do que penso sobre o futuro da educação.