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Urinálise e

Citopatologia Clínica
Prof. Elder Ferri Lourenzi
Profª. Maria Carolina Stipp Gonçalves

Indaial – 2021
1a Edição
Copyright © UNIASSELVI 2021

Elaboração:
Prof. Elder Ferri Lourenzi
Profª. Maria Carolina Stipp Gonçalves

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

L892u

Lourenzi, Elder Ferri

Urinálise e citopatologia clínica. / Elder Ferri Lourenzi; Maria


Carolina Stipp Gonçalves. – Indaial: UNIASSELVI, 2021.

201 p.; il.

ISBN 978-65-5663-689-4
ISBN Digital 978-65-5663-687-0

1. Análise da urina. - Brasil. I. Gonçalves, Maria Carolina Stipp.


II. Centro Universitário Leonardo da Vinci.
CDD 610

Impresso por:
Apresentação
Olá, acadêmico! Seja bem-vindo ao Livro Didático Urinálise e
Citopatologia Clínica. A análise da urina compreende fatores físicos,
químicos e microscópicos, sendo essencial para a triagem de pacientes em
diferentes condições patológicas, principalmente aquelas que afetam os
sistemas geniturinário, renal, hepático e metabólico do organismo.

Na Unidade 1, abordaremos a fisiologia do sistema renal, com foco


no funcionamento das estruturas renais para formar a urina, tal como os
glomérulos e túbulos renais. Em seguida, veremos a importância dos cui-
dados nos parâmetros pré-analíticos, que envolvem a coleta e o transporte
da amostra de urina tipo 1 de pacientes pediátricos e adultos, e da urina de
24 horas. Com esses conceitos introdutórios em mente, compreenderemos
a análise analítica do exame de urina, como: análise macroscópica ou físi-
ca, com avaliação da coloração, pH, densidade e aspecto; análise química,
por meio da avaliação de glicose, bilirrubinas, urobilinogênio, leucócitos,
sangue, nitritos e proteínas; análise microscópica, na qual se verifica a pre-
sença de cristais, células, cilindros, entre outros componentes que fazem
parte da urina.

Na Unidade 2, estudaremos a citologia clínica, um ramo voltado ao


rastreamento e à detecção de lesões celulares importantes do tipo neoplásica
ou inflamatória, bem como à identificação de agentes patogênicos nas mais
diversas amostras de material celular. Também conhecida como citopatologia
ou citologia oncótica, veremos temas voltados aos aspectos históricos no Brasil
e no mundo, suas aplicações e complicações, além da definição de citologia
oncótica e seus objetivos, da estrutura de um laboratório e da epidemiologia
do câncer, tema de fundamental importância para o entendimento da
necessidade da atuação profissional nesse campo diagnóstico.

Na Unidade 3, exploraremos a área da citopatologia que mais


apresenta demanda: a citologia de colo uterino, que está ligada a muitos
programas de prevenção do câncer dessa região anatômica, por meio
do rastreamento. Assim, descreveremos células normais, inflamatórias e
neoplásicas, micro-organismos e demais componentes presentes em uma
amostra obtida do colo de útero – importantes para a o monitoramento
interno e externo de qualidade, bem como para a nomenclatura padrão dos
laudos citopatológicos.

Boa leitura!

Prof. Elder Ferri Lourenzi


Profª. Maria Carolina Stipp Gonçalves
NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há
novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto
em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.
 
Bons estudos!
LEMBRETE

Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela


um novo conhecimento.

Com o objetivo de enriquecer seu conhecimento, construímos, além do livro


que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você terá
contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complementares,
entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento.

Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada!


Sumário
UNIDADE 1 — URINÁLISE.................................................................................................................. 1

TÓPICO 1 — FORMAÇÃO DA URINA E PROCEDIMENTOS PRÉ-ANALÍTICOS............... 3


1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................................... 3
2 FISIOLOGIA RENAL.......................................................................................................................... 4
2.1 FORMAÇÃO DA URINA ............................................................................................................. 5
2.2 COMPOSIÇÃO DA URINA . ........................................................................................................ 8
3 FASE PRÉ-ANALÍTICA .................................................................................................................... 10
3.1 COLETA DE URINA TIPO 1 PARA PARCIAL DE URINA.................................................... 10
3.2 COLETA DE AMOSTRA EM BEBÊS ......................................................................................... 12
3.3 COLETA DE URINA EM TEMPO MARCADO (24 HORAS)................................................. 13
4 TRANSPORTE, ARMAZENAMENTO E IDENTIFICAÇÃO
DE AMOSTRA DE URINA .............................................................................................................. 14
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 15
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 16

TÓPICO 2 — ANÁLISE FÍSICA E QUÍMICA DA URINA........................................................... 19


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 19
2 CARACTERÍSTICAS FÍSICAS DA URINA................................................................................. 20
2.1 COR . ............................................................................................................................................... 20
2.1.1 Urina amarelo escuro, amarelo claro e transparente....................................................... 21
2.1.2 Urina laranja, âmbar e mel.................................................................................................. 21
2.1.3 Urina verde/azul .................................................................................................................. 21
2.1.4 Urina rosa, vermelha, marrom ou preta............................................................................ 22
2.2 VOLUME......................................................................................................................................... 23
2.3 DENSIDADE ................................................................................................................................. 24
2.4 ASPECTO ....................................................................................................................................... 25
2.5 ODOR ............................................................................................................................................. 26
3 AVALIAÇÃO QUÍMICA DA URINA ............................................................................................ 27
3.1 PH URINÁRIO .............................................................................................................................. 28
3.2 GLICOSE ........................................................................................................................................ 30
3.3 CORPOS CETÔNICOS ................................................................................................................ 31
3.4 PROTEÍNAS .................................................................................................................................. 32
3.5 UROBILINOGÊNIO/BILIRRUBINA........................................................................................... 32
3.6 HEMOGLOBINA E MIOGLOBINA........................................................................................... 33
3.7 NITRITOS........................................................................................................................................ 34
3.8 LEUCÓCITOS ............................................................................................................................... 34
3.9 ÁCIDO ASCÓRBICO ................................................................................................................... 35
3.10 RESULTADOS NA TIRA REATIVA.......................................................................................... 35
4 URINA DE 24 HORAS ...................................................................................................................... 36
4.1 CLEARANCE DE CREATININA................................................................................................. 37
4.2 PROTEINÚRIA.............................................................................................................................. 39
4.3 SÓDIO URINÁRIO........................................................................................................................ 39
4.4 CÁLCIO URINÁRIO..................................................................................................................... 40
4.5 ÁCIDO ÚRICO............................................................................................................................... 41
4.6 POTÁSSIO....................................................................................................................................... 42
4.7 UROPORFIRINAS ........................................................................................................................ 42
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 44
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 45

TÓPICO 3 — ANÁLISE SEDIMENTOSCÓPICA DA URINA.................................................... 47


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 47
2 CÉLULAS ............................................................................................................................................. 48
2.1 CÉLULAS EPITELIAIS................................................................................................................. 48
2.2 LEUCÓCITOS NA URINA........................................................................................................... 50
2.3 HEMÁCIAS NA URINA.............................................................................................................. 50
3 CRISTAIS ............................................................................................................................................ 51
3.1 CRISTAL DE FOSFATO TRIPLO................................................................................................. 51
3.2 CRISTAL DE ÁCIDO ÚRICO ..................................................................................................... 52
3.3 CRISTAL DE OXALATO DE CÁLCIO....................................................................................... 52
3.4 URATO AMORFO ........................................................................................................................ 53
3.5 OUTROS CRISTAIS ...................................................................................................................... 54
4 CILINDROS......................................................................................................................................... 55
4.1 CILINDRO HIALINO .................................................................................................................. 56
4.2 CILINDRO HEMÁTICO . ............................................................................................................ 56
4.3 CILINDRO LEUCOCITÁRIO...................................................................................................... 57
4.4 CILINDRO EPITELIAL . .............................................................................................................. 57
4.5 OUTROS CILINDROS ................................................................................................................. 57
5 OUTROS COMPONENTES URINÁRIOS.................................................................................... 58
5.1 BACTÉRIAS, LEVEDURAS E PARASITAS............................................................................... 59
5.2 MUCO ............................................................................................................................................ 60
5.3 ESPERMATOZOIDES .................................................................................................................. 61
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 62
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 67
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 68

REFERÊNCIAS....................................................................................................................................... 71

UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA........................................................................................... 75

TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO À CITOLOGIA CLÍNICA............................................................. 77


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 77
2 ASPECTOS HISTÓRICOS E OBJETIVOS DA CITOLOGIA CLÍNICA................................. 77
2.1 CITOPATOLOGIA NÃO GINECOLÓGICA............................................................................. 79
2.2 CITOPATOLOGIA GINECOLÓGICA . ..................................................................................... 81
3 ESTRUTURA LABORATORIAL..................................................................................................... 83
3.1 LABORATÓRIO DE CITOLOGIA CLÍNICA............................................................................ 85
3.1.1 Materiais de escritório e administrativo............................................................................ 85
3.1.2 Área técnica........................................................................................................................... 86
4 ARQUIVAMENTO............................................................................................................................. 88
5 EPIDEMIOLOGIA DO CÂNCER.................................................................................................... 89
5.1 FATORES PARA O DESENVOLVIMENTO DAS NEOPLASIAS........................................... 90
5.1.1 Hereditariedade.................................................................................................................... 91
5.1.2 Infecções................................................................................................................................. 91
5.1.3 Exposição solar e a radiações ............................................................................................. 92
5.1.4 Tabagismo.............................................................................................................................. 93
6 FATORES PREVENTIVOS............................................................................................................... 93
6.1 ALIMENTAÇÃO............................................................................................................................ 94
6.2 EXERCÍCIOS FÍSICOS.................................................................................................................. 94
6.3 PREVENÇÃO DE CÂNCERES DE ETIOLOGIA MICROBIANA.......................................... 94
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 96
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 97

TÓPICO 2 — COLETA E PROCESSAMENTO DE AMOSTRAS CITOLÓGICAS................. 99


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 99
2 CITOLOGIA ESFOLIATIVA............................................................................................................ 99
3 CITOLOGIA ASPIRATIVA............................................................................................................ 100
3.1 PAAF GUIADA POR PALPAÇÃO............................................................................................ 100
3.2 PAAF GUIADA POR ULTRASSOM......................................................................................... 101
3.3 CITOLOGIA EM MEIO LÍQUIDO............................................................................................ 102
4 COLETA E PROCESSAMENTO.................................................................................................... 103
4.1 COLETA DE EXAMES POR ESFOLIAÇÃO............................................................................ 103
4.2 LAVADOS..................................................................................................................................... 105
4.3 MATERIAIS OBTIDOS ESPONTÂNEAMENTE.................................................................... 105
4.4 PUNÇÃO ASPIRATIVA POR AGULHA FINA (PAAF)........................................................ 105
5 PROCESSAMENTO DO MATERIAL CITOLÓGICO.............................................................. 106
RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 109
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 110

TÓPICO 3 — PRINCIPAIS APLICAÇÕES DA CITOLOGIA NÃO GINECOLÓGICA............ 113


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 113
2 CITOLOGIA DA MAMA................................................................................................................ 113
3 CITOLOGIA DA TIREOIDE.......................................................................................................... 117
LEITURA COMPLEMENTAR........................................................................................................... 120
RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 125
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 126

REFERÊNCIAS..................................................................................................................................... 128

UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA ......................................................................... 133

TÓPICO 1 — ANATOMIA, HISTOLOGIA E FISIOLOGIA DO COLO UTERINO............. 135


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 135
2 ANATOMIA DO TRATO GENITAL FEMININO..................................................................... 135
2.1 OVÁRIOS ..................................................................................................................................... 136
2.2 TUBAS UTERINAS...................................................................................................................... 137
2.3 ÚTERO........................................................................................................................................... 137
3 FISIOLOGIA DO TRATO GENITAL FEMININO ................................................................... 139
4 COMPONENTES NORMAIS DO EXAME CITOPATOLÓGICO
DE COLO DE ÚTERO...................................................................................................................... 141
4.1 CÉLULAS EPITELIAIS............................................................................................................... 141
4.1.1 Células escamosas.............................................................................................................. 142
4.1.2 Células glandulares endocervicais................................................................................... 144
4.1.3 Metaplasia escamosa.......................................................................................................... 145
4.1.4 Células endometriais.......................................................................................................... 146
4.2 COMPONENTES NÃO EPITELIAIS........................................................................................ 146
4.2.1 Hemácias.............................................................................................................................. 146
4.2.2 Leucócitos............................................................................................................................ 147
4.2.3 Neutrófilos polimorfonucleares (PMN).......................................................................... 147
4.2.4 Linfócitos e histiócitos........................................................................................................ 148
RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 149
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 150

TÓPICO 2 — CITOLOGIA INFLAMATÓRIA E MICRO-ORGANISMOS............................ 153


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 153
2 CITOLOGIA INFLAMATÓRIA.................................................................................................... 153
2.1 VACUOLIZAÇÃO DO CITOPLASMA ................................................................................... 154
2.2 HALO PERINUCLEAR............................................................................................................... 154
2.3 PSEUDOEOSINOFILIA.............................................................................................................. 155
2.4 CERVICITE FOLICULAR E VAGINITE ATRÓFICA............................................................. 155
2.5 HIPERQUERATOSE E PARAQUERATOSE............................................................................ 156
3 REPARO TECIDUAL....................................................................................................................... 156
4 MICRO-ORGANISMOS................................................................................................................. 158
4.1 BACTÉRIAS.................................................................................................................................. 158
4.1.1 Bacilos de Döderlein (lactobacilos).................................................................................... 158
4.1.2 Gardnerella vaginalis............................................................................................................ 159
4.1.3 Cocos e bacilos.................................................................................................................... 160
4.1.4 Actinomyces.......................................................................................................................... 160
4.2 MICOSES (FUNGOS).................................................................................................................. 161
4.2.1 Candida sp............................................................................................................................. 161
4.3 PROTOZOÁRIOS........................................................................................................................ 162
4.3.1 Trichomonas vaginalis........................................................................................................... 162
4.4 INFECÇÕES VIRAIS................................................................................................................... 163
4.4.1 Herpes vírus........................................................................................................................ 163
4.4.2 Papilomavírus humano (HPV)......................................................................................... 164
RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 168
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 169

TÓPICO 3 — LESÕES PRÉ-NEOPLÁSICAS E MALIGNAS DE COLO DE ÚTERO............ 171


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 171
2 ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS ............................................................................................... 171
3 LESÕES INTRAEPITELIAIS ESCAMOSAS DO COLO UTERINO...................................... 172
3.1 CRITÉRIOS CITOMORFOLÓGICOS DAS LESÕES INTRAEPITELIAIS
DE BAIXO GRAU (LSIL)............................................................................................................ 174
3.1.1 Conduta médica recomendada após resultado.............................................................. 175
3.2 CARACTERÍSTICAS CITOMORFOLÓGICAS DAS LESÕES
INTRAEPITELIAIS DE ALTO GRAU (HSIL).......................................................................... 176
3.2.1 Conduta médica recomendada após resultado.............................................................. 177
3.3 ATIPIAS EM CÉLULAS ESCAMOSAS (ASC)......................................................................... 177
3.3.1 Atipias em células escamosas de significado indeterminado: ASC-US...................... 177
3.3.2 Atipias em células escamosas não podendo afastar lesão de alto grau: ASC-H.............. 177
3.4 CARCINOMA ESCAMOSO....................................................................................................... 179
3.4.1 Características citológicas e subclassificação.................................................................. 179
3.5 TUMORES MENOS FREQUENTES.......................................................................................... 181
4 LESÕES GLANDULARES DO COLO UTERINO..................................................................... 181
4.1 ASPECTOS GERAIS.................................................................................................................... 181
4.1.1 Atipia em células glandulares: AGC................................................................................ 182
4.2 ADENOCARCINOMA IN SITU (AIS)..................................................................................... 183
4.3 ADENOCARCINOMA INVASIVO.......................................................................................... 184
4.4 LAUDO CITOPATOLÓGICO DO COLO DE ÚTERO........................................................... 185
4.4.1 Avaliação pré-analítica....................................................................................................... 187
4.4.2 Adequabilidade do material............................................................................................. 187
4.4.3 Epitélios representados na amostra................................................................................. 187
4.4.4 Dentro dos limites da normalidade................................................................................. 188
4.4.5 Microbiologia...................................................................................................................... 188
4.4.6 Alterações celulares............................................................................................................ 188
4.4.7 Observações......................................................................................................................... 189
LEITURA COMPLEMENTAR........................................................................................................... 190
RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 197
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 198

REFERÊNCIAS..................................................................................................................................... 200
UNIDADE 1 —

URINÁLISE

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender os processos envolvidos na fisiologia renal para formação


da urina e composição da urina;

• realizar boas práticas laboratoriais para parâmetros pré-analíticos, como


coleta e transporte de amostra de urina para diferentes análises;

• interpretar as análises físicas e químicas da urina;

• identificar células, cristais, cilindros, entre outros constituintes urinários


observados no microscópio óptico.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – FORMAÇÃO DA URINA E PROCESSOS PRÉ-ANALÍTICOS

TÓPICO 2 – ANÁLISE FÍSICA E QUÍMICA DA URINA

TÓPICO 3 – ANÁLISE SEDIMENTOSCÓPICA

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

1
2
TÓPICO 1 —
UNIDADE 1

FORMAÇÃO DA URINA E PROCEDIMENTOS


PRÉ-ANALÍTICOS

1 INTRODUÇÃO

Neste tópico, será realizada uma introdução ao processo de formação


da urina e aos aspectos pré-analíticos para a análise de amostras de urina. A
formação da urina é um processo complexo, que envolve aspectos importantes
da fisiologia renal e que, para ser compreendido, é necessário recordarmos a
anatomia dos rins.

Os rins (Figura 1) são órgãos com formato de feijão, encontrados abaixo


do diafragma, um em cada lado da coluna vertebral. Cada rim é amplamente
inervado pelo sistema nervoso central (SNC) e irrigado por vasos sanguíneos,
além de conter um ureter. Os ureteres são responsáveis por direcionar a urina
até a bexiga. Eles formam cálices na estrutura interna dos rins, que coletam a
urina formada pelo tecido renal. Cada cálice encaixa-se em pirâmides renais, que
constituem a medula do rim, e, no ápice das pirâmides, também conhecida como
papila, projeta-se para um cálice menor.

Esses componentes são constituídos por néfrons, túbulos e vasos


sanguíneos, sendo localizados no interstício, em que podemos observar células
como fibroblastos, responsáveis pela secreção de matriz extracelular e colágeno,
proteoglicanos e glicoproteínas. Dessa forma, os rins somam uma série de
importantes constituintes e funções fisiológicas que serão discutidas com mais
detalhes mais adiante (EATON; POOLER, 2015). Entre elas, podemos destacar
a formação da urina, que é analisada dentro da urinálise. Para que essa análise
aconteça, torna-se necessária uma etapa denominada como fase pré-analítica,
quando ocorre a coleta da amostra.

3
UNIDADE 1 — URINÁLISE

FIGURA 1 – ANATOMIA DO SISTEMA URINÁRIO E RENAL

FONTE: Os autores

No entanto, a fase pré-analítica não compreende somente a coleta da


amostra biológica, mas também as etapas de transporte e armazenamento da
amostra. Embora sejam aspectos básicos, esses processos são essenciais, uma
vez que grande parte dos erros em laboratórios clínicos ocorrem na fase pré-
analítica. Para amostras urinárias, isso não é diferente. Assim, caso as etapas que
correspondem a essa fase sejam realizadas de forma incorreta, a análise torna-se
comprometida (XAVIER; DORA; BARROS, 2016).

2 FISIOLOGIA RENAL
Os rins são essenciais e indispensáveis para a sobrevivência do ser hu-
mano. Esses órgãos somam diferentes funções, que ajudam a manter a home-
ostasia no organismo como um todo. Entre as suas principais funções se en-
contram: a gliconeogênese, produção de vitamina D, manutenção do equilíbrio
acidobásico, controle da resistência vascular, produção de eritropoetina para
controle na produção de eritrócitos, regulação da osmolaridade plasmática,
controle do volume do líquido extracelular, manutenção do equilíbrio hídrico e
eletrolítico e, de modo especial, o processo de excreção de substâncias que não
são úteis para o organismo. De maneira geral, essas substâncias em concentra-
ções elevadas podem ser extremamente prejudiciais, levando à desregulação de
condições fisiológicas de outros sistemas do corpo. Consequentemente, os rins
atuam em conjunto, por exemplo, com outros órgãos, como fígado e coração
(EATON; POOLER, 2015).

4
TÓPICO 1 — FORMAÇÃO DA URINA E PROCEDIMENTOS PRÉ-ANALÍTICOS

2.1 FORMAÇÃO DA URINA


Compreender a essência do funcionamento renal e, consequentemente,
da formação da urina é simples, porque os rins recebem o líquido que chega
pela corrente sanguínea, alteram a sua composição adicionando ou excluindo
constituintes e formam a urina, que contém o equilíbrio de cada substância. Esse
processo é realizado nos néfrons renais (Figura 2), responsáveis pela filtração do
sangue, os quais precisam estar em perfeito estado de funcionamento (EATON;
POOLER, 2015).

FIGURA 2 – NÉFRON RENAL

FONTE: Os autores

Cada néfron é formado por um glomérulo e túbulos renais, que se


encontram no ducto coletor. O glomérulo é formado por vasos sanguíneos
e “coberto” pela cápsula de Bowman (corpúsculo renal). O sangue penetra
pela cápsula de Bowman através das arteríolas aferentes para os capilares do
glomérulo, e a arteríola eferente drena o sangue. Dentro da cápsula, há um
espaço vazio, onde o líquido flui dos capilares glomerulares antes de penetrar na
primeira porção do túbulo. Essa estrutura (Figura 3) forma uma barreira essencial
para a filtração, similar a uma “peneira”, permitindo que passe grandes volumes
e impedindo a passagem de grandes proteínas plasmáticas, como albumina
(EATON; POOLER, 2015).

5
UNIDADE 1 — URINÁLISE

FIGURA 3 – GLOMÉRULO RENAL

FONTE: Os autores

A filtração glomerular é a etapa inicial para a formação da urina. O


conteúdo filtrado é muito semelhante ao plasma sanguíneo, contendo substâncias
livremente filtradas, como íons inorgânicos (sódio, potássio, cloreto, bicarbonato),
solutos orgânicos sem carga elétrica (glicose e ureia), hormônios peptídicos
(insulina, hormônio antidiurético) e aminoácidos de baixo peso molecular
(EATON; POOLER, 2015).

O conteúdo filtrado é medido pela taxa de filtração glomerular (TFG), que


é igual a 180 L/dia em um homem adulto, jovem e saudável. Consequentemente,
o sangue total chega a ser filtrado cerca de 60 vezes ao dia, permitindo a excreção
de substâncias biotransformadas e a manutenção da homeostasia do organismo.
Como exemplo, podemos imaginar que, caso todo o conteúdo filtrado fosse
excretado de forma íntegra, urinaríamos várias vezes ao dia e ficaríamos
desidratados em questão de poucas horas. Por isso, o conteúdo filtrado será
encaminhado aos túbulos renais, onde ocorrem processos de reabsorção e secreção
tubulares (Figura 4), ou seja, o líquido recebido é modificado de modo específico
em cada segmento, a fim de enviar o líquido para o outro segmento. A reabsorção
é caracterizada pela remoção de substâncias do túbulo renal para o sangue
circulante; enquanto a secreção se caracteriza pelo acréscimo de substâncias do
sangue circulante para o lúmen do túbulo renal (EATON; POOLER, 2015).

Os túbulos renais são formados logo após o glomérulo e são uma


extensão da cápsula de Bowman, dividindo-se basicamente em túbulo contorcido
proximal, alça de Henle, túbulo contorcido distal e ducto coletor. Essas estruturas
são constituídas por células epiteliais conectadas por junções firmes, responsáveis
por manter as células unidas (EATON; POOLER, 2015).

O túbulo proximal é o primeiro, localizado logo após a cápsula de


Bowman. Dessa forma, ele drena o conteúdo filtrado por esse compartimento
para a sequência de túbulos. Ele é responsável pelo primeiro processo de rea-
bsorção tubular, no qual são absorvidos novamente para o organismo cerca de
dois terços da água filtrada, do sódio e do cloreto. Além disso, todas as moléculas

6
TÓPICO 1 — FORMAÇÃO DA URINA E PROCEDIMENTOS PRÉ-ANALÍTICOS

orgânicas úteis como glicose e aminoácidos precisam ser reabsorvidas para se-
rem conservadas no organismo. Compostos como potássio, fosfato, cálcio e bicar-
bonato são reabsorvidos parcialmente. Apesar de ser essencial para reabsorção,
esse compartimento é responsável pela secreção de algumas substâncias, como
produtos biotransformados (creatinina, ácido úrico) e fármacos (penicilina) (EA-
TON; POOLER, 2015).

Logo após, encontramos a alça de Henle, que é um segmento dividido


em ramo ascendente e descendente. De modo geral, é responsável por 20% da
reabsorção do sódio e cloreto e 10% da água filtrada, líquido que se torna diluído
em relação ao plasma normal, devido à concentração de sal absorvida ser superior
à concentração de água. O túbulo distal reabsorve cerca de 10% de sal e água, já
o ducto coletor mantém o processo de reabsorver sal e água, excretando, ainda,
ácidos e bases, e regulando a excreção de ureia (EATON; POOLER, 2015).

FIGURA 4 – FILTRAÇÃO, REABSORÇÃO E SECREÇÃO RENAL

FONTE: <https://bit.ly/3DbxyDb>. Acesso em: 29 abr. 2021.

NTE
INTERESSA

Para visualizar melhor esses processos renais, assista ao seguinte vídeo sobre
o processo de filtração, reabsorção, secreção e excreção renal, acessando: https://www.
youtube.com/watch?v=R4cNMryGOro.

7
UNIDADE 1 — URINÁLISE

Portanto, percebe-se que é indispensável que determinadas substâncias


sejam excretadas pelos rins e que esse processo é controlado por diferentes
mecanismos, os quais, geralmente, têm funções muito similares. Assim, quando
há uma falha nos controles de um mecanismo, ela pode ser compensada por outro.
Caso isso não seja possível, o organismo é capaz de se adaptar a determinadas
condições crônicas, modulando sua eficiência com o passar do tempo.

Por fim, para cada substância do plasma, existe uma combinação particu-
lar de filtração, reabsorção e secreção, e a combinação desses fatores resulta no
que será excretado e quanto. Os rins buscam regular as concentrações ideias de
cada substância, de modo que, se algo está acima do normal, será excretado em
maior quantidade ou vice-versa.

2.2 COMPOSIÇÃO DA URINA


Como podemos perceber, a urina humana é constituída principalmente
por água, que corresponde a cerca de 90 a 96% do volume total. A água é
secretada através dos rins, coletada na bexiga e excretada na uretra. Além do
componente líquido, a urina pode conter solutos, como sódio, potássio, cálcio,
magnésio, cloreto, creatinina, ureia, vitaminas, hormônios, ácido úrico, dentro
outros compostos orgânicos e inorgânicos (ROSE et al., 2015).

Os compostos sólidos totais na urina chegam a pesar cerca de 59 g/cap/


dia. A matéria orgânica corresponde a 65% a 85% dos constituintes sólidos secos
da urina. A ureia é mais predominante, variando de acordo com a ingestão de
proteínas, mas constituindo cerca de 50% dos sólidos orgânicos totais. Íons
como Na+, K+ e Ca2+ também variam de acordo com a dieta. Outros íons menos
frequentes são amônio, sulfatos de ácidos aminados e fosfatos, que podem mudar
de acordo com o nível hormonal da paratireoide. Portanto, a composição de
soluto é modificada conforme as condições ambientais, como uma variação na
alimentação, através da ingestão de proteínas, sal, cálcio, ou ainda, por modulação
na secreção hormonal (Figura 5) (ROSE et al., 2015).

8
TÓPICO 1 — FORMAÇÃO DA URINA E PROCEDIMENTOS PRÉ-ANALÍTICOS

FIGURA 5 – DIFERENÇA NA COMPOSIÇÃO DE SÓLIDOS NA URINA DE ACORDO COM A DIETA

FONTE: Os autores

A produção total de urina varia de acordo com a ingestão de líquidos,


tamanho do corpo, prática de exercícios físicos excessivos (suor) e de acordo com
a raça (ROSE et al., 2015). O Quadro 1 indica a relação entre esses fatores e a
produção de urina por dia.

QUADRO 1 – FATORES QUE LEVAM A VARIAÇÃO NA PRODUÇÃO TOTAL DE URINA

FATOR PRODUÇÃO DE URINA

O volume de água ingerido é, geralmente, igual


Ingestão de líquidos
ao volume de urina produzida.

Crianças produzem uma quantidade inferior de


urina (50% a menos) do que adultos.
Tamanho do corpo
Quanto maior o tamanho do corpo, maior a
produção de urina.

A prática excessiva leva ao suor, que, por sua


Exercícios físicos excessivos
vez, afeta a hidratação corpórea.

Mulheres negras têm volume urinário inferior


Raça
(0,24 L/dia) do que mulheres brancas.

FONTE: Os autores

9
UNIDADE 1 — URINÁLISE

3 FASE PRÉ-ANALÍTICA
A fase pré-analítica compreende fatores que antecedem a análise
laboratorial, voltados ao preparo do paciente, à identificação, à coleta, à
manipulação, ao armazenamento e ao transporte de uma amostra biológica.
Consequentemente, é uma fase repleta de possibilidades para os grandes erros
em laboratórios clínicos, que, muitas vezes, não são controlados e/ou detectados.
Uma vez que os erros ocorrem e não são identificados, isso pode levar a resultados
incorretos, que não condizem com a realidade do paciente (XAVIER; DORA;
BARROS, 2016).

No entanto, o laboratório pode e deve buscar minimizar esses erros,


pelo treinamento adequado dos profissionais responsáveis pelas tarefas.
Quando existe uma gestão da qualidade da fase pré-analítica, os erros podem
ser facilmente identificados e corrigidos, antes que prejudiquem a qualidade
dos serviços prestados pelo laboratório, evitando, assim, outros problemas.
Por esse motivo, uma padronização dos processos deve ser adotada, aumen-
tando a segurança e confiança do paciente.

Considerando os parâmetros pré-analíticos para amostras de urina, eles


podem fugir do controle do laboratório, uma vez que o paciente realiza a sua
própria coleta. Contudo, uma orientação adequada possibilita que o paciente seja
instruído da maneira correta para fazer a coleta do material, minimizando os
principais erros pré-analíticos nessa área. Em relação à identificação do paciente,
esta é de responsabilidade do laboratório, que deve confirmar o nome completo
e dados pessoais do paciente respectivo a amostra recebida. Outro fator a ser
analisado na entrega da amostra é se ela se encontra “apta” para análise, pois,
em alguns casos, indica-se uma nova coleta. Esses casos incluem amostras em
recipientes inadequados (vidros de conserva, potes de plásticos, entre outros);
amostras com resquícios de fezes; amostras com tempo de coleta superior ao
tempo de transporte permitido para a análise; amostras malconservadas. A
seguir, poderemos entender mais sobre os processos de coleta e transporte da
amostra de urina e sua importância da fase pré-analítica.

3.1 COLETA DE URINA TIPO 1 PARA PARCIAL DE URINA


A coleta de amostra urinária para realização do parcial de urina é
relativamente simples, mas precisa ser seguida à risca, caso contrário pode ocorrer
contaminações importantes, que exigem a necessidade de uma nova coleta. De
modo geral, ela é realizada pelo próprio paciente, por esse motivo, é necessário
fazer uma correta orientação sobre as etapas, a fim de facilitar as fases analíticas
(RAVEL, 1997).

As recomendações da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina


Laboratorial (SBPC/ML) indicam que a primeira amostra da manhã é ideal para
o exame de urina de rotina, porque ela se encontra mais concentrada, permitindo

10
TÓPICO 1 — FORMAÇÃO DA URINA E PROCEDIMENTOS PRÉ-ANALÍTICOS

que os elementos e substâncias químicas presentes sejam adequadamente analisa-


dos. Caso isso não seja possível, alguns laboratórios indicam um intervalo de 2 a
4 horas entre as micções para que, então, a coleta seja realizada (SBPC/ML, 2017).

A urina é coletada em um frasco de material limpo, seco e à prova de


vazamento. Os frascos não devem ser reutilizados, uma vez que a reutilização pode
resultar em contaminação da amostra de urina. De modo geral, os laboratórios
fornecem o frasco coletor ao paciente e solicitam que a amostra seja coletada em
casa, a fim de que a primeira urina da manhã seja obtida (RAVEL, 1997).

O paciente não precisa de nenhum preparo especial para realizar o exame,


mas é importante informar que o uso de medicamentos ou os hábitos alimentares
podem promover alterações significativas na amostra urinária (RAVEL, 1997).
Além disso, o exame só será confiável se a amostra de urina for confiável.

As regras para coleta adequada do material podem ser observadas nas


Figuras 6 e 7. As regras são as mesmas para os exames parcial de urina ou cultura
de urina (urocultura):

• A região genital deve ser higienizada previamente com água e sabão neutro
ou lenço umedecido. O uso de soluções antissépticas pode interferir na análise
química do exame.
• O paciente deve desprezar o primeiro jato de urina, para que as impurezas
contidas no canal uretral sejam eliminadas.
• Após, o paciente pode coletar o jato médio urinário até preencher o frasco.
• Por fim, o paciente deve desprezar o restante de urina no vaso sanitário.

FIGURA 6 – ILUSTRAÇÃO PARA COLETA DE AMOSTRA DE URINA EM HOMENS

FONTE: <https://bit.ly/3zdqgwc>. Acesso em: 17 mar. 2021.

11
UNIDADE 1 — URINÁLISE

FIGURA 7 – ILUSTRAÇÃO PARA COLETA DE AMOSTRA DE URINA EM MULHERES

FONTE: <https://bit.ly/3zdqgwc>. Acesso em: 17 mar. 2021.

3.2 COLETA DE AMOSTRA EM BEBÊS


A coleta em crianças pequenas é realizada com o auxílio de um saco cole-
tor infantil (Figura 8) estéril e é realizada no laboratório. Assim como no adulto,
é importante realizar uma higiene prévia no órgão genital do bebê com o auxílio
de água e sabão, ou, então, com lenço umedecido, sempre de cima para baixo.
Caso o bebê não urine por um período de 30 minutos a 1 hora, o saco coletor
precisa ser trocado e inserido novamente (FLEMING, 2015).

Para colocar o saco coletor da maneira adequada, deve-se retirar o papel


que recobre a parte adesiva do saco coletor e dobrar o adesivo ao meio, deixando
a parte adesiva do saco coletor para fora, pois está será “fixada” na região do
interglúteo. Entretanto, o saco coletor deve ficar para baixo e há algumas variações
para meninas e meninos (FLEMING, 2015).

Para posicionar adequadamente o saco coletor:

• Em meninos, é necessário colocar o órgão genital dentro da abertura do saco


coletor, o qual é fixado na pele pela parte superior, a fim de evitar vazamentos.
• Em meninas, é necessário abrir os grandes lábios da vagina, fixando a parte
superior do adesivo. Isso é necessário para que a uretra fique dentro do círculo,
a fim de evitar vazamentos.

Em seguida, assim que a criança urinar, o saco coletor é retirado e o


conteúdo é transferido para um pote coletor padrão. Caso o volume urinário seja
muito baixo, pode ser necessário solicitar uma nova coleta de amostra.
12
TÓPICO 1 — FORMAÇÃO DA URINA E PROCEDIMENTOS PRÉ-ANALÍTICOS

FIGURA 8 – SACO COLETOR DE URINA INFANTIL

FONTE: <http://lfleming.com.br/INSTRUCOES-COLETAS.pdf>. Acesso em: 17 mar. 2021.

3.3 COLETA DE URINA EM TEMPO MARCADO (24 HORAS)


A coleta de urina em tempo marcado é simples e muito utilizada para
determinação de algumas substâncias, cuja excreção pode variar no decorrer de 24
horas. Assim, não podemos coletar uma amostra pontual, sem saber exatamente
se a substância está presente naquele momento ou será excretada em maiores
concentrações posteriormente. Dessa forma, precisamos quantificar a excreção
urinária no período de 24 horas, para que os efeitos envolvidos na variação da
excreção durante diferentes condições ou períodos do dia, não sejam prejudiciais
para o exame (REIS, 2020; PINHEIRO, c2008-2021).

Para realizar a coleta, o paciente deve escolher o horário mais confortável


para a sua realização. De modo geral, indica-se que a primeira urina seja
desprezada, devendo-se anotar o horário em que isso ocorreu. Por exemplo, se
o paciente acordar às 8 horas, ele pode esvaziar a bexiga completamente no vaso
sanitário. Isso é necessário porque a urina armazenada na bexiga foi produzida
no período da noite, ou seja, se coletássemos essa urina, estaríamos considerando
um período maior do que 24 horas. Ao coletar somente após a primeira micção
e o horário marcado, teremos certeza de que a próxima urina foi produzida no
período adequado (REIS, 2020; PINHEIRO, c2008-2021).

Em seguida, toda nova micção durante as próximas 24 horas devem ser


armazenadas no frasco coletor (Figura 9) fornecido pelo laboratório, indepen-
dente se for um volume grande, ou uma simples gota de urina. Caso seja ne-
cessário mais de um frasco, o mesmo deve ser solicitado ao laboratório, mas
é importante enfatizar que todo conteúdo de 24 horas deve ser coletado. No
dia seguinte, a coleta deve ser finalizada no mesmo horário em que iniciou.
Uma tolerância de 10 minutos é permitida para mais e para menos (7h50min ou
8h10min, por exemplo), mas, se o paciente tiver vontade de urinar mais cedo
do que o horário final, ele deve tentar ingerir líquidos para conseguir urinar
novamente no horário final (REIS, 2020; PINHEIRO, c2008-2021).

13
UNIDADE 1 — URINÁLISE

FIGURA 9 – FRASCO COLETOR DE URINA DE 24 HORAS

FONTE: <https://shutr.bz/3sJpO6y>. Acesso em: 19 mar. 2021.

Alguns pontos devem ser enfatizados ao paciente, como a importância


de coletar toda urina dentro desse período. Se o paciente urinar diretamente no
vaso sanitário, no chuveiro, ou outro local, um novo ciclo deve ser iniciado. Além
disso, o paciente só deve utilizar o frasco fornecido pelo laboratório, para evitar
contaminações. Esses fatores são indispensáveis, pois, caso haja falha na coleta,
o exame não será confiável e o laboratório não terá ciência disso, fazendo com o
desfecho clínico para o paciente seja incerto, já que o médico pode tomar decisões
incorretas de acordo com o resultado de uma amostra incompleta.

4 TRANSPORTE, ARMAZENAMENTO E IDENTIFICAÇÃO DE


AMOSTRA DE URINA
As amostras de urina, seja para parcial de urina, urocultura, ou urina de
24 horas, devem ser coletadas no recipiente fornecido pelo laboratório. Se o pa-
ciente não realizar a coleta no laboratório, a amostra deve ser encaminhada para
análise em um período de 1 a 2 horas. É muito importante que a amostra seja
mantida refrigerada nesse período. A amostra de urina de 24 horas pode perma-
necer fechada por até 48 horas em temperatura ambiente, contudo, o mais indica-
do é que seja refrigerada e entregue rapidamente ao laboratório (STRASINGER;
DI LORENZO, 2009).

Ao receber amostras de urina, devemos verificar os dados do paciente,


como nome completo, data da entrega e horário da coleta do material. Outro
fator pré-analítico importante, é verificar se não há contaminação com fezes,
menstruação ou coleta em outros recipientes, pois isso pode prejudicar as análises
posteriores (STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

14
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• O sistema urinário é formado pelos rins, ureter e bexiga. Os rins são órgãos
vascularizados e que recebem inervação do sistema nervoso central. Já
os ureteres, direcionam a urina até a bexiga, enquanto esta realiza o seu
armazenamento, uma vez que será excretada pela uretra.

• Os rins são indispensáveis para a sobrevivência do ser humano. Entre as


principais funções dos rins estão a gliconeogênese, a produção de vitamina D,
a manutenção do equilíbrio acidobásico, o controle da resistência vascular, a
produção de eritropoetina para controle na produção de eritrócitos, a regulação
da osmolalidade plasmática, o controle do volume do líquido extracelular, a
manutenção do equilíbrio hídrico e eletrolítico e, de modo especial, o processo
de excreção de substâncias que não são úteis para o organismo.

• Os néfrons renais são formados por um glomérulo e túbulos renais, que se


encontram no ducto coletor. O processo de filtração ocorre no glomérulo, por
meio do qual os sólidos de baixo peso molecular e a água ultrapassam para os
túbulos renais. Em seguida, uma série de processos de reabsorção e secreção
é efetuada por túbulo contorcido proximal, alça de Henle, túbulo contorcido
distal e ducto coletor.

• A urina é composta principalmente por água (90 a 96% do volume total) e


pode conter solutos, como sódio, potássio, cálcio, magnésio, cloreto, creatini-
na, ureia, vitaminas, hormônios, ácido úrico, entre outros compostos organis-
mos e inorgânicos.

• A coleta para parcial de urina e cultura de urina segue como critérios:


higienização da região genital; descarte do primeiro jato de urina; coleta do jato
médio urinário até preencher o frasco; e descarte do restante no vaso sanitário.

• A urina de 24 horas segue parâmetros diferentes dos estabelecidos pelo parcial


de urina. A primeira urina do dia é desprezada, sendo o horário anotado.
Depois, o paciente coleta toda urina das próximas 24 horas e a armazena no
frasco fornecido pelo laboratório. No dia seguinte, a coleta é finalizada no
mesmo horário em que iniciou, com uma tolerância de 10 minutos, que é
permitida para mais e para menos.

• O transporte da amostra de urina deve ser realizado em um período de 1 a 2


horas após a coleta e o seu armazenamento, em geladeira.

15
AUTOATIVIDADE

1 Os parâmetros químicos da urina são úteis para predizer determinadas


condições ou doenças que possam estar acometendo o paciente. De acordo
com os parâmetros químicos da urina, classifique V para as sentenças
verdadeiras e F para as falsas:

( ) A gliconeogênese, produção de vitamina D e manutenção do equilíbrio


acidobásico, correspondem a importantes funções renais.
( ) Entre as funções renais, está o processo de excreção de substâncias úteis
para o organismo.
( ) Os rins auxiliam na produção de eritropoetina, na regulação da
osmolalidade plasmática, no controle do volume do líquido extracelular,
na manutenção do equilíbrio hídrico e eletrolítico.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.

2 A coleta de amostra urinária é relativamente simples, mas precisa ser segui-


da à risca, caso contrário pode ocorrer contaminações/falhas importantes,
que exigem a necessidade de uma nova coleta. Com base nas regras para
coleta de uma boa amostra de urina, analise as sentenças a seguir:

I- A coleta da primeira urina do dia é essencial para o parcial de urina, mas,


caso o paciente não possa esperar e já tenha urinado, ele pode coletar após
o período de 2 a 4 horas sem urinar.
II- A urina de 24 horas é requerida em situações específicas de substratos ex-
cretados pela urina em diferentes períodos do dia, tornando-se necessário
que o paciente colete toda a urina dentro de um período de 24 horas.
III- A urina de 24 horas exige que o paciente colete a primeira urina da manhã
e anote o horário, coletando toda a urina dentro do período de 24 horas,
sem exceção. Após coletar a primeira urina da manhã do próximo dia, o
paciente encerra a coleta e encaminha a amostra ao laboratório.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças I e III estão corretas.


b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

16
3 Compreender a essência do funcionamento renal e, consequentemente,
da formação da urina é simples, porque os rins recebem o líquido que
chega pela corrente sanguínea, alteram a sua composição, adicionando ou
excluindo constituintes e formam a urina, que contém o equilíbrio de cada
substância. De acordo com os processos para filtração do sangue, assinale a
alternativa CORRETA:

a) ( ) A filtração corre no glomérulo, que funciona como uma espécie de


peneira, permitindo a passagem de constituintes sólidos de baixo peso
molecular e água.
b) ( ) A etapa de reabsorção ocorre no túbulo contorcido proximal, onde são
reabsorvidas grandes quantidades de proteínas.
c) ( ) A reabsorção permite que substâncias sólidas que não conseguiram
atravessar pelo glomérulo, sejam excretadas nos túbulos renais.
d) ( ) Os processos de excreção favorecem a retirada de substâncias
dos túbulos renais para a corrente sanguínea, permitindo que as
substâncias sejam armazenadas no organismo.

4 A coleta de urina em tempo marcado é muito utilizada para determinação


de algumas substâncias, cuja excreção pode variar no decorrer de 24 horas.
Disserte sobre a metodologia utilizada para essa coleta.

5 A fase pré-analítica compreende todos os processos que antecedem a análise


laboratorial. Disserte sobre os principais erros pré-analíticos, relatando os
cuidados necessários para evitá-los.

17
18
TÓPICO 2 —
UNIDADE 1

ANÁLISE FÍSICA E QUÍMICA DA URINA

1 INTRODUÇÃO

A análise de urina, também denominada como urinálise, é considerada


um parâmetro de baixo custo, não invasivo e relativamente simples, permitindo
a obtenção de informações do sistema genito-urinário e demais sistemas do
organismo. Isso é possível, devido às diversas funções dos rins em secretar
substâncias e manter a homeostasia intrínseca. Dessa forma, quaisquer alterações
podem ser detectadas por meio de uma análise simples da urina. Está análise se
inicia após a coleta da amostra, que chega ao laboratório para a etapa analítica, ou
seja, etapa em que ocorrem as avaliações da urina como um todo (ALVES, 2011;
DALMOLIN, 2011; NETO, 2017).

A fase analítica compreende todo o processo de avaliação física e química


da amostra, assim como identificação de componentes microscópicos, que serão
discutidos no tópico a seguir. Essas análises são de modo geral subjetivas, uma
vez que o profissional responsável irá identificar visualmente aspectos físicos,
como cor, turbidez, densidade e volume; ou ainda químicos, como bilirrubinas,
urobilinogênio, hemácias, leucócitos, proteínas, glicose, e corpos cetônicos,
através das tiras reagentes (ALVES, 2011; XAVIER; DORA; BARROS, 2016).

É importante que a análise seja cautelosa, uma vez que se passar


despercebida, pode prejudicar o diagnóstico do paciente.

E
IMPORTANT

A análise de urina é realizada somente após a cultura da urina, a fim de evitar


contaminações durante a manipulação da amostra. Uma sugestão de leitura sobre o tema
está disponível em: http://www.rbac.org.br/artigos/diagnostico-laboratorial-das-infeccoes-
urinarias-relacao-entre-urocultura-e-o-eas/.

19
UNIDADE 1 — URINÁLISE

2 CARACTERÍSTICAS FÍSICAS DA URINA


A avaliação das características físicas da urina corresponde a aspectos
básicos e, que normalmente, são avaliados de modo subjetivo, como cor, aspecto/
turbidez, densidade e volume. Assim, precisamos olhar cada amostra e identificar
se há ou não alteração nesses parâmetros, não necessitando de qualquer outra
análise mais aprofundada. Uma exceção tem sido a avaliação da densidade, que
pode ser feita através da análise da tira reativa, em conjunto com os demais testes
bioquímicos. A seguir, veremos um pouco mais sobre a importância da análise
física da urina.

2.1 COR
Uma amostra de urina pode chegar ao laboratório com cores distintas do
amarelo, como verde, azul, marrom, vermelha, rosa ou laranja. Cada uma dessas
colorações é determinada por pigmentos endógenos ou exógenos, que modificam
a coloração da urina. A alteração da cor urinária pode indicar modulações
fisiológicas, que resultam na liberação de pigmentos endógenos, ou somente o
resultado de pigmentos exógenos, oriundos da dieta alimentar. Apesar de ser
um indicativo de que determinada condição esteja acometendo o paciente, a
coloração da urina deve ser avaliada em associação aos demais dados da urinálise
e ao quadro clínico do paciente, a fim de identificar possíveis quadros fisiológicos
ou patológicos (DALMOLIN, 2011; RAMIREZ, 2021).

A coloração considerada normal da urina varia de transparente a amarela.


Algumas condições podem aumentar a concentração urinária, resultando em
uma coloração amarela mais escura, enquanto urinas mais diluídas apresentam
colorações amareladas mais claras (NETO, 2017; RAVEL, 1997; RAMIREZ, 2021).
A Figura 10 demonstra as diferentes colorações de uma amostra de urina.

FIGURA 10 – DIFERENTES COLORAÇÕES DA URINA

FONTE: Os autores

20
TÓPICO 2 — ANÁLISE FÍSICA E QUÍMICA DA URINA

2.1.1 Urina amarelo escuro, amarelo claro e transparente


A urina considerada normal, ou seja, aquela com a quantidade adequada
de água e substâncias sólidas, deve estar entre os tons de amarelo-claro e
transparente. Essa coloração se deve à excreção do urocromo, que, quanto mais
diluído, menor o seu grau de coloração. Pacientes que consumem uma quantidade
grande de água diariamente costumam produzir uma quantidade maior de urina.
Além disso, essa urina estará com uma quantidade de água superior à quantidade
de solutos, podendo chegar a ser transparente, dependo do grau de hidratação
do paciente. Quando a urina está com o tom amarelo-escuro, provavelmente está
mais concentrada, indicando que o paciente consume uma quantidade menor
de água do que o normal, podendo ficar desidratado. No entanto, a coloração
escura ainda é um parâmetro dentro da normalidade, uma vez que o consumo de
água varia de uma pessoa para outra (NETO, 2017; RABINOVITCH et al., 2009;
RAVEL, 1997; RAMIREZ, 2021).

2.1.2 Urina laranja, âmbar e mel


A coloração alaranjada ou até mesmo âmbar/mel da urina pode indicar a
excreção de pigmentos exógenos, adquiridos através da dieta. Contudo, de modo
geral, é indicativa de desidratação do paciente. Quanto menor o consumo de
água, mais concentrada será a urina, permitindo que pigmentos como bilirrubinas
se tornem mais presentes e modifiquem a coloração da urina. Além disso, essa
coloração pode indicar problemas hepáticos ou na vesícula biliar, através do
aumento de bilirrubinas no sangue do paciente, que, consequentemente, serão
mais excretadas na urina (NETO, 2017; RABINOVITCH et al., 2009; RAVEL, 1997;
RAMIREZ, 2021).

2.1.3 Urina verde/azul


A urina de coloração esverdeada ou azulada indica o consumo de
pigmentos exógenos, que podem chegar ao organismo pelo uso de medicações
ou pela dieta. Os medicamentos que mais causam alteração da cor da urina para
o verde são a amitriptilina, propofol, nitazoxanida, Sepurin® (metenamina e
metiltionínio) e indometacina, enquanto para a coloração azulada são triantereno,
amitriptilina, indometacina e viagra. Quanto à dieta, o consumo de aspargos
pode resultar na alteração de cor para o verde, assim como de alimentos ricos
em corantes verdes/azulados (NETO, 2011; RABINOVITCH et al., 2009; RAVEL,
1997; RAMIREZ, 2021).

Apesar disso, pode ser indicativo de quadros de infecção urinária, pois


uma bactéria denominada como Pseudomonas aeruginosa é muito conhecida
pela liberação de pigmentos esverdeados ou azulados, que podem sair na urina
(RABINOVITCH et al., 2009; RAVEL, 1997).

21
UNIDADE 1 — URINÁLISE

2.1.4 Urina rosa, vermelha, marrom ou preta


A coloração avermelhada ou rosada da urina é um forte indicativo de
hemácias ou hemoglobina na amostra, condição conhecida como hematúria ou
hemoglobinúria. A urina vermelha e com aspecto turvo indica a presença de
hemácias (hematúria) íntegras na urina, dando o aspecto turvo devido à membrana
celular, enquanto a urina vermelha límpida indica a presença de hemoglobina ou
mioglobina. Isso acontece em quadros que ocorre sangramento nas vias urinárias,
como em doenças renais e na próstata, ou processos infecciosos e tumores.
Contudo, a coloração também pode ser influenciada pela dieta, pelo consumo de
beterraba e amoras, ou pelo uso de medicamentos, como a rifampicina e vitamina
B (LOPES et al., 2018; MAYO, c1998-2021; NETO, 2011; RABINOVITCH et al.,
2009; RAVEL, 1997; RAMIREZ, 2021).

Já a coloração mais escura ou, até mesmo, preta indica a presença de


hemoglobina, mioglobina ou, ainda, de bilirrubina na amostra, conhecidas,
respectivamente, como hemoglobinúria, mioglobinúria e bilirrubinúria. A
hemoglobina se torna marrom em condições de baixo pH, similar ao que
ocorre com o sangue no fim da menstruação. Essas condições são normalmente
relacionadas a problemas hepáticos ou casos de desidratação severa. Outro caso
possível é a presença de melanina na amostra, que também pode deixar a urina
escura (LOPES et al., 2018; MAYO, c1998-2021; NETO, 2011; RABINOVITCH et al.,
2009; RAVEL, 1997; RAMIREZ, 2021).

O uso de alguns medicamentos pode resultar na coloração preta ou


marrom da urina, como metildopa, metronidazol, levodopa e cloroquina.

NTE
INTERESSA

Urina roxa
Apesar de ser pouco comum, pode ocorrer em pacientes com infecções do trato urinário,
principalmente de pacientes que usam cateter vesical em hospitais. As bactérias que são
envolvidas nesse processo são Providencia stuartii, Klebsiella pneumoniae, Pseudomonas
aeruginosa, Escherichia coli ou Enterococcus, pois metabolizam o triptofano, resultando
em pigmentos vermelhos e azuis, que, ao se misturarem, podem ficar roxos. Isso está
associado à modificação do pH da urina e à insuficiência renal.
Para saber mais sobre o assunto, sugerimos a seguinte leitura: https://bit.ly/3mtek60.

22
TÓPICO 2 — ANÁLISE FÍSICA E QUÍMICA DA URINA

2.2 VOLUME
A avaliação do volume tem deixado de ser relevante na urinálise, uma
vez que usamos um valor padronizado para análise de 10 mL e não conseguimos
predizer, com uma única amostra, se o volume excretado resulta de um aumento
do volume urinário. Contudo, a alteração no volume urinário pode ser descrita
pelo paciente durante a anamnese e traz indícios essenciais para complementar a
urinálise do paciente.

De modo geral, o volume da urina indica a quantidade de água excretada


pelos rins e determina o estado de hidratação do corpo, assim como a ingestão de
fluidos, perda de fluidos por fontes não renais, variação na secreção do hormônio
antidiurético ou, ainda, a necessidade de excretar grandes quantidade de solutos,
como glicose e sais. Essa avaliação é mais bem observada na urina de 24 horas, em
que o volume pode ser entre 800 e 1.500 mL/dia (STRASINGER; DI LORENZO,
2009; XAVIER; DORA; BARROS, 2016).

O Quadro 2 indica a denominação para as variações no volume urinário,


bem como as principais causas envolvidas.

QUADRO 2 – VARIAÇÕES NO VOLUME URINÁRIO

ALTERAÇÃO DO
DENOMINAÇÃO CAUSAS
VOLUME URINÁRIO

Desidratação pela perda de água, seja


Redução do volume
Oligúria por vômitos, diarreia, transpiração,
urinário
queimaduras grades.

Resultado da oligúria, ou lesão renal


Cessação do fluxo
Anúria grave, assim como redução do fluxo
urinário
sanguíneo para os rins.

Aumento na excreção Volume diurno é 2 a 3 vezes maior


Nictúria
noturna da urina que o noturno.

Aumento do volume Diabetes melito, uso de diurético,


Poliúria
urinário diário cafeína ou álcool.

FONTE: Os autores

23
UNIDADE 1 — URINÁLISE

2.3 DENSIDADE
A densidade da urina permite verificar qual a concentração da urina,
ou seja, reflete se o rim é capaz de concentrar ou de diluir a urina, não sendo
influenciada pelo tempo de armazenamento da amostra. Ela é definida como a
relação entre a massa de um volume líquido e a massa de um mesmo volume
de água destilada, sendo muito utilizada na prática clínica (STRASINGER; DI
LORENZO, 2009).

Existem dois métodos para avaliação desse parâmetro: a refratometria


e a medida em tira reagente. Como a tira reagente é amplamente utilizada em
laboratórios clínicos, dificilmente utilizamos a metodologia de refratometria
(também conhecida como urodensímetro), pois, embora seja de uso simples,
dificultaria a rotina do laboratório clínico.

A Figura 11 ilustra o refratômetro. Para utilizá-lo, deve-se levantar a


tampa de acrílico, pingar uma gota da urina no visor, fechar a tampa de acrílico
e apontar o refratômetro para uma luz. Em seguida, irá aparecer uma divisão
escuro/claro, com a medida da densidade da urina.

FIGURA 11 – REFRATÔMETRO

FONTE: Os autores

Para a avaliação através da tira reagente, basta verificar o tom de cor da


almofada respectiva (Figura 13), a densidade e indicar a densidade da urina
do paciente. O princípio do teste é relativo à concentração iônica e se baseia na
alteração aparente do pKa, cuja coloração pode variar entre o verde azulado-
escuro ao verde amarelado. É preciso ter cautela durante a avaliação, pois, caso
a glicose e proteína do paciente estejam alterados, pode ocorrer uma variação
na cor da densidade, conduzindo a interpretação errônea de que o paciente está
com a densidade aumentada. Ela deve estar entre 1005 e 1035, ou seja, quanto
menor a densidade, mais diluída será a urina e, quanto maior a densidade, mais
concentrada; portanto, ela varia de acordo com a hidratação do paciente e o
consumo de líquidos (BIOTÉCNICA, 2019).

24
TÓPICO 2 — ANÁLISE FÍSICA E QUÍMICA DA URINA

Assim como a avaliação dos parâmetros que correspondem à urinálise,


a densidade precisa ser considerada em conjunto com as demais análises e com
a clínica do paciente, porque uma diminuição na densidade pode indicar tanto
poliúria (aumento do volume urinário) e polidipsia (aumento na ingestão de
líquidos) quanto falência renal primária, já que uma lesão nos túbulos renais pode
conduzir para uma dificuldade renal em concentrar a urina. Portanto, ao avaliar
o grau de hidratação do paciente, é possível verificar se a urina concentrada é
resultado de um paciente desidratado, eliminando falha renal como causa da
desidratação (GRAFF, 1983; RABINOVITCH et al., 2009).

DICAS

A relação entre volume e densidade é inversa: quanto menos a quantidade


água na urina, maior a densidade.

2.4 ASPECTO
O aspecto da urina pode ser associado a avaliação da cor, uma vez que
é um parâmetro subjetivo, avaliado a olho nu. Sua avaliação deve ser realizada
rapidamente, logo após a coleta de preferência, pois o armazenamento pode
facilitar a precipitação de cristais, principalmente se não for feito do modo correto
ou com tempo superior a 2 horas (GRAFF, 1983; RABINOVITCH et al., 2009;
STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

Como o paciente realiza a coleta à domicílio na maioria das vezes, é


possível implementar a análise do aspecto logo que a urina chegar ao laboratório,
para evitar que esse parâmetro se altere devido ao prazo para análise.

Com a avaliação do aspecto, deve-se verificar a turbidez da urina, que


pode ser influenciada pela concentração da urina. Quanto mais concentrada uma
urina, mais turva ela será e, quanto menos concentrada, mais límpida. A sua des-
crição segue exatamente esse princípio, sendo que a urina pode apresentar aspec-
to turvo, levemente turvo ou límpido (Figura 12) (GRAFF, 1983; RABINOVITCH
et al., 2009; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

A presença de fatores celulares, como leucócitos, hemácias, cristais,


cilindros, bactérias ou, ainda, muco, leveduras, material fecal e lipídeos, pode
deixar a amostra mais turva. Contudo, só é possível identificar a causa de
uma variação do aspecto na avaliação do sedimento urinário (GRAFF, 1983;
RABINOVITCH et al., 2009; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

25
UNIDADE 1 — URINÁLISE

FIGURA 12 – ASPECTOS DA AMOSTRA DE URINA

FONTE: <https://bit.ly/38efEBy>. Acesso em: 23 mar. 2021.

NTE
INTERESSA

A amostra de urina pode aparecer com espuma, que, normalmente, está


relacionada com a quantidade de proteína na amostra. Para entender mais sobre o assunto,
sugerimos como leitura o seguinte texto da Associação Nacional de Atenção ao Diabetes:
https://www.anad.org.br/por-que-minha-urina-e-espumosa/.

2.5 ODOR
O odor da urina não é usualmente utilizado como parâmetro avaliativo
em laboratórios clínicos, mas é perceptível e pode indicar alguns fatores anormais
da amostra. Contudo, assim como os demais parâmetros, precisa ser avaliado
em conjunto com outros dados (GRAFF, 1983; RABINOVITCH et al., 2009;
STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

A urina recém-coletada possui aroma de sui generis (único do seu


gênero), mas não é desagradável. No entanto, o odor pode mudar de acordo com
a alimentação do paciente, como a ingestão de alho e aspargos, ou ainda pela
presença de infecções ou outras doenças. O odor fétido pode indicar presença de
infecções, enquanto o odor frutal pode indicar paciente diabético, com aumento
de corpos cetônicos (GRAFF, 1983; RABINOVITCH et al., 2009; STRASINGER; DI
LORENZO, 2009).

26
TÓPICO 2 — ANÁLISE FÍSICA E QUÍMICA DA URINA

3 AVALIAÇÃO QUÍMICA DA URINA


A avaliação química, também denominada como bioquímica da urina, é
realizada através das tiras reagentes. Esse método é qualitativo ou semiquantitativo
e permite monitorar aspectos bioquímicos da urina, como a presença de hemácias,
leucócitos, nitrito, urobilinogênio, bilirrubinas, proteínas, além de avaliar o pH
e a densidade urinária (discutida na avaliação física da urina) (GRAFF, 1983;
RABINOVITCH et al., 2009; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

No entanto, antes de desvendar o significado de cada parâmetro, é preciso


entender como obtemos esses resultados – processo que pode ser observado na
Figura 13. Sua metodologia é simples e rápida. Inicialmente, homogeneizamos
a amostra de urina, retiramos as tiras reativas do tubo e fechamos o tubo
imediatamente. Só então, as tiras são imersas na urina por cerca de 2 segundos.
É importante lembrar que todas as almofadas devem entrar em contato com a
urina. O excesso de urina deve ser retirado, acomodando a tira sob um papel
toalha, para evitar que ocorra mistura de reagentes químicos das áreas da
reação. Posteriormente, a leitura do resultado pode ser manual ou automatizada
(BIOTÉCNICA, 2019).

A leitura manual é acompanhada com a escala de cores das almofadas


correspondentes no rótulo da embalagem nos tempos especificados pelo
fabricante, indicando a presença ou a ausência de cada um dos parâmetros
avaliados e ainda a quantidade dos parâmetros. É importante enfatizar que não
podemos tocar nas tiras reativas para evitar contaminações e erros de leituras
(BIOTÉCNICA, 2019).

FIGURA 13 – TÉCNICA MANUAL PARA LEITURA DA TIRA REAGENTE

FONTE: Os autores

27
UNIDADE 1 — URINÁLISE

A leitura automatizada das tiras reagentes é realizada por instrumentos


que identificam a coloração de cada almofada que compõe a tira. De modo similar
à leitura manual, a tira é inserida pelo técnico na urina, mas, em seguida, é inserida
no equipamento. Após a leitura, o equipamento emite o resultado, que pode ser
observado em um painel digital ou ainda impresso. A automatização da leitura
de tiras reagentes, além de diminuir o tempo da avaliação, minimiza a chance
de erros ou diferenças de intepretação entre diferentes profissionais, devido à
interpretação das cores, sendo muito utilizada em laboratórios de grande porte.
A Figura 14 ilustra um equipamento que realiza esse tipo de leitura.

Para desvendar cada uma das leituras realizadas pela tira reagente, a
seguir, serão apresentadas informações muito importantes sobre cada parâmetro
avaliado na análise química da urina.

FIGURA 14 – LEITOR AUTOMÁTICO DE TIRA REAGENTE

FONTE: <http://www.kovalent.com.br/equipamento/uriscan-pro/>. Acesso em: 26 mar. 2021.

3.1 PH URINÁRIO
O pH urinário não é proporcional ao pH sanguíneo (7,35 a 7,45), sendo
relativamente ácido no período da manhã, estando entre 5,0 e 6,0. No decorrer
do dia, esse pH pode variar entre 4,5 e 8,5, podendo ser diretamente influenciado
por equilíbrio acidobásico do sangue, função renal, dieta ou uso de medicamen-
tos, presença de infecção bacteriana ou, ainda, pelo tempo de coleta e armaze-
namento da urina (GRAFF, 1983; RABINOVITCH et al., 2009; STRASINGER; DI
LORENZO, 2009).

Todavia, o ponto mais importante para o pH urinário se deve ao fato


dos rins, em conjunto com os pulmões, serem responsáveis pela manutenção
do equilíbrio acidobásico do sangue, pois promovem a excreção de substâncias
ácidas e básicas. A excreção de hidrogênio, por exemplo, ocorre através na forma
de íons amônio, fosfato de hidrogênio e ácidos orgânicos fracos; já o bicarbonato
pode ser reabsorvido nos túbulos renais. Apesar de ser uma avaliação importante,

28
TÓPICO 2 — ANÁLISE FÍSICA E QUÍMICA DA URINA

para determinar a existência de distúrbios eletrolíticos sistêmicos de origem


metabólica ou respiratória, ou, ainda, para o tratamento de problemas urinários
que exija o controle do pH urinário, não existem valores de referência ou normais
para o pH urinário, pois ele deve ser avaliado com os dados clínicos do paciente.
Contudo, com as mudanças no pH urinário, a urina pode ser ácida ou alcalina
(GRAFF, 1983; RABINOVITCH et al., 2009; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).
O Quadro 3 exemplifica os principais responsáveis pelas alterações de pH para
urina alcalina e ácida.

QUADRO 3 – URINA ALCALINA E URINA ÁCIDA

URINA ALCALINA URINA ÁCIDA

Dieta pobre em proteínas Dieta rica em proteínas

Dieta rica em laticínios Dieta pobre em laticínios

Dieta com frutas cítricas (formação de


Diarreia
bicarbonato de sódio)

Citrato de potássio Uso de diuréticos

Infecções bacterianas por bactérias


produtoras de urease (conversão de ureia Patologia nos túbulos renais
em amônia)

Uso de medicamentos (por exemplo, Hipocalemia, pois há maior reabsorção de


acetazolamina) K+, acompanhada da excreção de H+

Alcalose respiratória ou metabólica, Acidose respiratória ou metabólica,


devido à menor excreção de íons H+ devido à maior excreção de íons H+

Vômito, que induz perda de HCl e


Decomposição da amônia em ureia,
K+, promovendo reabsorção de Na+ e
devido à retenção da urina
bicarbonato da urina

Atraso no processamento

Conservação inadequada de amostra

Administração de substâncias básicas

FONTE: Os autores

Para avaliação do pH, podemos utilizar as tiras reagentes de urinálise,


tiras de pH ou pHmetros. A almofada correspondente ao pH na tira reagente
é composta por um sistema de medição do pH que usa indicador duplo com
vermelho de metila e azul de bromotimol. O vermelho de metila é ativo na faixa
de 4,4 a 6,2 de pH, mudando do vermelho para o amarelo, enquanto o azul de
bromotimol é alterado do amarelo para o azul na faixa de 6,0 a 8,6. As faixas de
5,0 a 9,0 na tira reativa podem ser visualizadas nas cores desde laranja (pH 5,0),

29
UNIDADE 1 — URINÁLISE

passando pelo amarelo e verde, até o azul-escuro final (pH 9,0). De modo geral,
as tiras são confiáveis, não interagindo com outras substâncias, mas, por serem
avaliadas subjetivamente pelo profissional responsável dentro de um espectro
de cores, pode haver pequenos erros na interpretação da cor apresentada. Dessa
forma, o uso de pHmetros apresenta uma sensibilidade superior, uma vez que
liberam de modo preciso o pH da urina. No entanto, as tiras reagentes facilitam o
dia a dia do laboratório, sendo mais utilizadas (BIOTÉCNICA, 2019).

NTE
INTERESSA

Urina de recém-nascido não chega ao pH 9,0 nem mesmo em condições


patológicas. Caso isso ocorra, provavelmente está ligado à conservação incorreta.

FIGURA 15 – INDICADOR DE PH

FONTE: <https://shutr.bz/3DfGVBB>. Acesso em: 27 abr. 2021.

3.2 GLICOSE
A glicose é filtrada pelo glomérulo e, então, reabsorvida no túbulo
contorcido proximal, não estando presente na composição da urina. Dessa
forma, a presença de glicose na urina, também conhecida como glicosúria, não é
considerada normal. Quando presente na amostra urinária, a glicose passa pelo

30
TÓPICO 2 — ANÁLISE FÍSICA E QUÍMICA DA URINA

processo de oxidação pela glicose oxidase, originando ácido glucônico e peróxido


de hidrogênio, o qual reage com o iodeto de potássio na presença da peroxidase.
Quanto mais cromógeno oxidado, maior a variação da coloração, abrangendo de
verde a marrom (Figura 16) (BIOTÉCNICA, 2019).

Caso apareça, duas condições precisam ser investigadas: lesão nos tú-
bulos renais e hiperglicemia. A hiperglicemia é a principal condição associada
a presença de glicose na urina, a qual ocorre devido ao excesso de glicose que
deveria ser reabsorvida pelos túbulos proximais, que, por estarem sobrecarre-
gados, não conseguem exercer a sua função, ou seja, a glicose é secretada na
urina. Quando a glicosúria está presente na ausência de hiperglicemia, devemos
suspeitar de lesões tubulares, pois os túbulos renais não estão exercendo sua
função normal de reabsorver a glicose do filtrado glomerular e podem aumentar
a excreção de glicose (GRAFF, 1983; RABINOVITCH et al., 2009; STRASINGER;
DI LORENZO, 2009).

Essa análise, assim como as demais, precisa ser feita com rapidez, pois,
caso o paciente esteja com infecção urinária, as bactérias presentes na amostra
de urina podem consumir a glicose, resultado em um resultado falso-negativo
(GRAFF, 1983; RABINOVITCH et al., 2009; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

FIGURA 16 – INDICADOR DE GLICOSE

FONTE: <https://bit.ly/2WqndT6>. Acesso em: 28 abr. 2021.

3.3 CORPOS CETÔNICOS


A presença de corpos cetônicos na urina, conhecida como cetonúria, não
é uma condição fisiológica. Ela ocorre somente em casos de aumento de corpos
cetônicos no sangue, que é resultado de um desequilíbrio no metabolismo de
ácidos graxos e carboidratos. Isso pode ocorrer durante dietas rigorosas, com
baixo ou nenhum consumo de carboidratos, ou em jejuns prolongados; durante
quadros de cetoacidose diabética, em que os pacientes diabéticos apresentam

31
UNIDADE 1 — URINÁLISE

aumento de corpos cetônicos; ou, ainda, em casos de febre, doenças agudas,


hipertireoidismo, gravidez e aleitamento, pois essas condições estão associadas
ao aumento de corpos cetônicos no sangue, que resultam na sua excreção na urina
(GRAFF, 1983; RABINOVITCH et al., 2009; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

Para sua detecção na tira reativa, utiliza-se o nitroprussiato de sódio e


ácido acetoacético, que reagem com a acetona, variando de rosa-claro a roxo.
O resultado é expresso em cruzes, indicando quantos corpos cetônicos estão
presentes na amostra, podendo ser negativo ou positivos (+, ++, +++ e ++++)
(BIOTÉCNICA, 2019).

3.4 PROTEÍNAS
As proteínas não são secretadas na urina, uma vez que não são filtradas
pelo glomérulo. Caso ela esteja presente, pode ser decorrente de problemas
renais ou, ainda, de quadros independentes da função renal. Ao considerarmos
mecanismos independentes dos rins, identificamos que quadros de desidratação,
febre, convulsões, exercício muscular intenso, frio ou calor intenso podem resultar
no aumento de proteínas no sangue e no aumento de pequenas proteínas que
serão filtradas pelos rins. Esse aumento ainda pode ser um resultado de processos
inflamatórios e infecciosos do trato urinário inferior, que resultam na liberação de
proteínas na urina. Quando pensamos em um quadro decorrente de problemas
renais, normalmente, está ligada a processos inflamatórios ou infecciosos
nos glomérulos e/ou túbulos renais, resultando em falhas nos mecanismos de
transporte tubular. Pequenos traços de proteínas podem ser considerados
normais, mas esse resultado precisa ser associado à densidade urinaria, já que
está relacionado com a concentração da urina (GRAFF, 1983; RABINOVITCH et
al., 2009; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

A determinação desse parâmetro urinário se dá através da avaliação da


tira reagente, que detecta a albumina, liberando resultados semiquantitativos. A
reação para detecção de proteínas se baseia na mudança de cor do indicador azul
de tetrabromofenol que reage com as proteínas, variando do amarelo ao verde
(BIOTÉCNICA, 2019).

3.5 UROBILINOGÊNIO/BILIRRUBINA
O urobilinogênio é um produto da degradação da bilirrubina pelas
bactérias intestinais. A bilirrubina, por sua vez, é formada graças a degradação da
hemoglobina. Uma vez formado no intestino, o urobilinogênio chega ao sangue,
sendo que uma pequena quantidade pode ser excretada na urina. Contudo,
qualquer aumento da bilirrubina plasmática leva ao aumento de urobilinogênio
urinário, podendo ser detectado antes que ocorra icterícia, por exemplo. De
modo geral, a bilirrubina direta, ou não conjugada, não é excretada nos rins, já
que está ligada à albumina. No entanto, caso haja uma lesão glomerular, ela pode

32
TÓPICO 2 — ANÁLISE FÍSICA E QUÍMICA DA URINA

aparecer na urina. Portanto, o aumento de urobilinogênio está ligado diretamente


a problemas hepáticos ou hemolíticos, assim como em quadros de obstrução das
vias biliares, como nas colestases (GRAFF, 1983; RABINOVITCH et al., 2009;
STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

O teste para detecção de bilirrubina se baseia na ligação da bilirrubina


com a diacloroanilna diazotizada em meio ácido, que resulta na variação de
cor, diretamente proporcional à concentração na urina. Já para detectar o
urobilinogênio, utiliza-se a reação modificada de Erlich entre os compostos
p-dietilaminobenzaldeído e ácido urobilinogênico, que, em meio fortemente
ácido, resulta na coloração rosa (BIOTÉCNICA, 2019).

3.6 HEMOGLOBINA E MIOGLOBINA


A presença de sangue na urina (hematúria) indica lesão renal ou lesão
do trato genitourinário, como ocorre em processos inflamatórios, infecciosos e
neoplasias. Para detectar o sangue, as tiras reagentes utilizam a porção heme,
presente na hemoglobina e na mioglobina, ou seja, a identificação de hemoglobina
e mioglobina ocorre em conjunto nas tiras reativas, mas corresponde a quadros
patológicos diferentes. Sua distinção deve ser observada com cautela e avaliada
com outros dados clínicos e biológicos do paciente (GRAFF, 1983; RABINOVITCH
et al., 2009; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

O aumento de hemoglobina (hemoglobinúria) está associado a presença


de hemácias integras que são lisadas no meio urinário diluído, ou quando há
elevado nível de hemoglobina no sangue, devido a quadros de hemólise na circu-
lação sanguínea. Já o aumento de mioglobina (mioglobinúria) ocorre em quadros
de rabdomiólise, sendo resultado de injúria isquêmica, traumática, tóxica ou ain-
da necrose tecidual (GRAFF, 1983; RABINOVITCH et al., 2009; STRASINGER; DI
LORENZO, 2009).

DICAS

“A rabdomiólise (RM) e uma síndrome caracterizada por uma destruição das


fibras musculares esqueléticas e que resulta na liberação dos constituintes intracelulares das
fibras para a circulação sanguínea”. Leia mais em: https://sbrate.com.br/esporte-com-saude/
rabdomiolise/.

33
UNIDADE 1 — URINÁLISE

O princípio do teste tem como base a atividade da pseudoperoxidase


da hemoglobina, responsável por catalisar a reação de di-hidroperóxido de iso-
propilbenzeno e 3-3’,5,5’-tetrametilbenzidina, resultando em um espectro de cor
que vai do amarelo ao azul. Caso apareçam pontos verdes-azulados ou manchas,
tem-se forte indicativo de eritrócitos íntegros (BIOTÉCNICA, 2019).

3.7 NITRITOS
A identificação de nitritos é um parâmetro muito importante e permite
identificar a presença de infecções bacterianas. Caso haja presença de bactérias
Gram-negativas, de modo geral, há a conversão do nitrato urinário em nitrito,
identificado na fita reativa com coloração rosa. É importante esclarecer que
resultados negativos de nitrito não indicam ausência de infecção, pois as
bactérias podem não ter tempo suficiente para realizar a conversão, podem não
converter nitrato em nitrito ou, ainda, produzir quantidades insuficientes para
serem identificadas no teste. Assim, a urocultura é a única capaz de confirmar
a presença ou ausência de infecção bacteriana urinária, mas o teste de nitrito
positivo é um forte indicador dessa condição (GRAFF, 1983; RABINOVITCH et
al., 2009; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

A reação para detecção do nitrito é feita pelo uso de ácido p-arsanílico em


meio acidificado, que reage com o nitrito e forma um composto diazônico, o qual
se liga com o 1-naftil-etilenodiamino para produzir a coloração rosa que indica
um teste positivo (BIOTÉCNICA, 2019).

3.8 LEUCÓCITOS
Os leucócitos, quando presentes nas amostras de urina, estão diretamente
relacionados com processos inflamatórios ou infecciosos que promovem um
aumento das células de defesa no corpo para tentar combater a infecção ou,
ainda, a injúria estabelecida, que pode estar localizada tanto no trato urinário
baixo quanto no trato urinário alto (GRAFF, 1983; RABINOVITCH et al., 2009;
STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

A identificação de leucócitos na urina identifica a esterase dos granuló-


citos. A esterase reage com o éster de ácido amino pirazol, liberando hidroxipi-
razol. Por sua vez, o pirazol irá reagir com o sal diazônico, resultando em um
espectro de cor violeta, que é proporcional à quantidade de leucócitos presentes
na amostra de urina (BIOTÉCNICA, 2019).

34
TÓPICO 2 — ANÁLISE FÍSICA E QUÍMICA DA URINA

3.9 ÁCIDO ASCÓRBICO


A detecção do ácido ascórbico permite a identificação de falhas no teste da
tira reagente, uma vez que interfere na detecção de hemoglobina, glicose, nitritos,
bilirrubina e cetonas. Esse teste não está presente em todas as tiras reagentes, mas
pode ser encontrado como controle em algumas marcas (BIOTÉCNICA, 2019).

3.10 RESULTADOS NA TIRA REATIVA


A leitura de uma variação de cores pode ser complexa. Como podemos
perceber, a leitura da tira reagente leva a todos os resultados esperados pela
análise química da urina. Por esse motivo, não poderíamos deixar de ilustrar,
em detalhes, o espectro de cores das almofadas, indicando a cor respectiva a
determinado resultado. Na Figura 17, podemos observar as alterações de cores
que ocorrem para leucócitos (LEU), nitrito (NIT), urobilinogênio (URO), proteína
(PRO), pH, sangue (BLO), densidade (SG), cetonas (KET), bilirrubinas (BIL) e
glicose (GLU) (BIOTÉCNICA, 2019). Apesar disso, ressalta-se que cada leitura é
realizada de acordo com o kit utilizado e que pequenas alterações no espectro de
cores podem ser encontradas.

FIGURA 17 – ESCALA DE CORES PARA LEITURA DA TIRA REAGENTE

35
UNIDADE 1 — URINÁLISE

FONTE: <https://bit.ly/389dHpR>. Acesso em: 28 abr. 2021.

4 URINA DE 24 HORAS
O exame de urina de 24 horas possibilita quantificar substâncias
específicas excretadas na urina e que podem predizer o funcionamento dos rins.
Essa avaliação precisa ser realizada dentro do período de 24 horas, pois a excreção
de uma substância pode variar ao longo dia, o que dificulta a padronização do
teste com uma amostra coletada em um horário fixo. Ao coletar toda a urina
dentro do período de 24 horas, essa variação é minimizada e a análise se torna
mais confiável. No entanto, utilizamos somente uma pequena alíquota para
realizar as análises, não sendo necessário utilizar todo volume coletado. Além
disso, é importante lembrarmos que cada substância detém de uma ou mais
metodologias específicas para sua determinação e que cada laboratório irá
determinar o que melhor se adequa a sua realidade.

E
IMPORTANT

Coletar somente uma pequena amostra em um horário aleatório pode não


dizer a real excreção renal.

36
TÓPICO 2 — ANÁLISE FÍSICA E QUÍMICA DA URINA

4.1 CLEARANCE DE CREATININA


A creatinina não possui função biológica, sendo excretada pelos rins; é o
produto da degradação da creatina muscular, utilizada como reserva enérgica
dos músculos. Dessa forma, é correto afirmar que a produção de creatinina varia
de acordo com a massa muscular do paciente (GALANTE; ARAÚJO, 2012).

Atualmente, ela é um importante marcador da função renal, uma vez


que é produzida de modo constante e sofre uma pequena influência da dieta do
paciente, mantendo os níveis plasmáticos e urinários praticamente inalterados.
Quando ocorre um aumento da creatinina no plasma do paciente, há um forte in-
dício de problemas na excreção renal. No entanto, pode decorrer também de qua-
dros de necrose muscular, atrofias e distrofias musculares, hipertrofia da próstata
ou, ainda, obstrução dos ureteres e da uretra (GALANTE; ARAÚJO, 2012).

Sua determinação pode ser feita por metodologias de cinética enzimática


ou com o uso de ligantes, como no método do picrato alcalino de Jaffé. Para a
realização do teste, uma pequena alíquota da urina do paciente deve ser diluída
em 1:5 ou 1:25, dependendo do teste realizado. O método de Jaffé tem como base
a reação da creatinina presente na amostra com o picrato alcalino e acidificante,
sendo que a reação é monitorada a 510 nm em espectrofotômetro, podendo
ser realizada uma leitura pontual (método de ponto final) ou, ainda, uma
leitura seriada (método cinética), de acordo com as preferências do laboratório
(GOLD ANALISA, 2018a). Já o método cinético, proposto pela bula da Labtest,
promove uma série de conversões enzimáticas a partir da creatinina até formar
quinoneimina, detectada a 526 nm (LABTEST, 2012).

DICAS

Confira a bula da Labtest para mais informações sobre o teste enzimático para
determinação de creatinina. Acesse: https://bit.ly/3sLoqjE.

São valores de referência para urina de 24 horas:

• Crianças: 8 a 22 mg/kg de peso corporal/24 horas.


• Homens: 21 a 26 mg/kg de peso corporal/24 horas.
• Mulheres: 16 a 22 mg/kg de peso corporal/24 horas.

37
UNIDADE 1 — URINÁLISE

Para avaliar, de modo preciso, esse parâmetro na urina, é realizado o


clearance de creatinina, ou depuração da creatinina, no qual são necessárias
dosagens plasmáticas e urinárias. Por meio dessa medida, é possível avaliar a
depuração de creatinina endógena (DCE), cuja fórmula é apresentada a seguir,
determinando a quantidade de sangue que os rins conseguem filtrar por minuto.
É importante ressaltar que, para que o exame seja exato, deve-se levar em conta
outros fatores, como o volume da urina, o tempo de coleta e a superfície corporal
do paciente (DUSSE et al., 2016).

DICAS

Para entender um pouco mais sobre os biomarcadores da função renal. leia o


artigo na integra, no link: http://www.rbac.org.br/artigos/biomarcadores-da-funcao-renal-
do-que-dispomos-atualmente/.

A depuração de creatinina endógena pode ser feita por meio da seguinte


fórmula:

Em que: U corresponde à creatinina na urina (mg/dl); V, ao volume


urinário (mL/min); P, à creatinina no plasma ou soro (mg/dl); A, à superfície
corporal em m2; e 1,73, à superfície corporal padrão.

Como exemplo, podemos citar um paciente do sexo masculino, de 50 anos


de idade, que obteve os seguintes resultados de creatinina:

• Creatinina na urina: 50 mg/dL.


• Creatinina no soro: 1,2 mg/dL.
• Volume da urina de 24 horas: 2.000 mL em 24 horas, ou seja 1,39 mL/min.
• Superfície corporal do paciente: 1,80.

Com esses dados, podemos calcular a depuração de creatinina endógena,


utilizando a fórmula descrita:

38
TÓPICO 2 — ANÁLISE FÍSICA E QUÍMICA DA URINA

Como resultado da DCE, temos 120,235 mL/min/1,73 m2.

São valores de referência para o resultado:

• Crianças: 40 a 140 mL/min/1,73 m2.


• Mulheres adultas: 88 a 128 mL/min/1,73 m2.
• Homens adultos: 97 a 137 mL/min/1,73 m2.

4.2 PROTEINÚRIA
A avaliação da proteína urinária permite identificar com exatidão a
quantidade de proteína excretada. É importante lembrar que em situações
fisiológicas essa excreção não ocorre. Além disso, é possível avaliar a presença
de proteínas específicas, como a albumina, por exemplo, que quando presente é
denominada como albuminúria (GALANTE; ARAÚJO, 2012).

Para determinação dos níveis de proteínas em uma amostra urinária,


podem ser utilizadas diferentes metodologias, como os métodos colorimétricos,
os métodos de ligação a correntes como Bradford, vermelho de pirogalol,
Ponceau S e CBB, ou, ainda, o método de biureto, que determina a concentração
de proteínas precipitadas após um tratamento da amostra de urina com ácido
(ALVES et al., 2017). O valor de referência é de até 150 mg/24 horas.

ATENCAO

Acadêmico, não se esqueça de que cada laboratório escolhe o método que


melhor se adapta a sua rotina.

4.3 SÓDIO URINÁRIO


O sódio é essencial na manutenção da osmolaridade e do volume
plasmático, sendo o principal íon extracelular. A sua concentração plasmática é
regulada pelo sistema renina-angiotensina-aldosterona renal. A dosagem de sódio
na urina é uma forma indireta de identificar a quantidade de sal ingerida pelo
paciente durante a alimentação. Caso o paciente ingira uma quantidade muito
elevada de sódio, este é normalmente excretado nos rins. Todavia, a quantidade
de sódio excretada depende de quanto sódio e água foi reabsorvido nos túbulos
renais. Se pouco sódio for reabsorvido, a produção de urina é maior e, se muito
sódio for reabsorvido, urina-se menos (GALANTE; ARAÚJO, 2012).

39
UNIDADE 1 — URINÁLISE

Contudo, a manutenção entre o equilíbrio sódio e água pode estar


prejudicada na doença renal crônica, sendo o primeiro problema importante a ser
reportado durante o agravamento da lesão renal. Em um quadro de doença renal
crônica, o nível de sódio acaba se alterando no organismo, levando ao aumento
ou à diminuição desse íon no plasma (GALANTE; ARAÚJO, 2012).

Para determinar a concentração de sódio na urina, utiliza-se um eletrodo


seletivo para o íon de sódio, por meio do método potenciométrico. No entanto,
para obter uma informação completa a respeito da excreção urinária desse íon,
utiliza-se a fórmula de FENA, na qual se considera a concentração de sódio na
urina (UNa), o sódio sérico (PNa), a creatinina urinária (Ucr) e a creatinina sérica (Pcr)
(HENRY, 2008).

Em condições normais, o resultado fica entre 0,5 e 1%. Valores superiores a


1% indicam lesão tubular aguda, não ocorrendo a reabsorção máxima de sódio; já
valores abaixo de 1% podem estar ligados ao aumento de aldosterona, provocado
principalmente em casos de desidratação. Ainda é possível encontrar valores
abaixo de 0,1%, que indicam que ocorre uma produção máxima de aldosterona
(HENRY, 2008).

O valor de referência considerado está entre 135 e 145 mEq/L.

4.4 CÁLCIO URINÁRIO


O cálcio é o íon mais abundante no organismo, estando presente,
principalmente, nos ossos, que também é o principal depósito de cálcio. Pode ser
encontrado, ainda, nos tecidos moles e nos líquidos extra e intracelular. Esse cátion
possui funções essenciais na contração muscular e na coagulação sanguínea, por
exemplo. Seu metabolismo é complexo e envolve a absorção intestinal (quanto
de cálcio é absorvido), a deposição nos ossos e a excreção renal. É regulado por
calcitonina, vitamina D e hormônios tireoidianos e sexuais e, de modo mais
específico, pelo paratormônio (PTH) (GALANTE; ARAÚJO, 2012).

O aumento do cálcio urinário (hipercalciúria) está diretamente relacionado


com a formação de cálculo renal, que pode ser originado pela deposição de
nutrientes como cálcio, oxalato, sódio, potássio, proteínas, purinas, vitamina C e
baixa ingestão de líquidos (GALANTE; ARAÚJO, 2012).

A dosagem na urina de 24 horas ocorre com uso de uma alíquota de 20


mL de urina, a qual é adicionado 20 mL de HCl 6 mol/L. Em seguida, a amostra é
homogeneizada. Para a realização do teste, deve-se esperar cerca de 60 minutos,
sendo uma pequena alíquota retirada do ensaio colorimétrico de ponto final. De
acordo com o teste disponível, o ensaio pode ter, como princípio, a reação do

40
TÓPICO 2 — ANÁLISE FÍSICA E QUÍMICA DA URINA

cálcio com púrpura de ftaleína em meio alcalino, o qual é mensurado a 570 nm em


espectrofotômetro (LABTEST, 2014a), bem como a reação do cálcio com arsenazo
III, que é mensurado a 660 nm em espectrofotômetro (GOLD ANALISA, 2018b).

O valor de referência do cálcio na urina está entre 150 e 300 mg/dL.

4.5 ÁCIDO ÚRICO


O ácido úrico tem origem endógena e exógena. A origem endógena
ocorre a partir da degradação de nucleotídeos, como a adenosina e a guanina; já a
exógena pelo consumo alimentar, que corresponde a 75% do total de ácido úrico
diário. A grande maioria, cerca de 3/4 do total de ácido úrico, é excretada pelos
rins e o restante pelo trato gastrointestinal (GALANTE; ARAÚJO, 2012).

Quando há um quadro de aumento de ácido úrico urinário, podemos


suspeitar de doenças como gota, caracterizada por:

• aumento da síntese e da deposição de cristais de urato nas articulações;


• aumento da destruição dos nucleotídeos, como ocorre nas leucemias, na
policitemia e no uso de quimioterápicos;
• defeitos enzimáticos na via das purinas, podendo ser por deficiência enzimática
ou pela hiperatividade da enzima;
• ou, ainda, distúrbios nos túbulos renais, pois, normalmente, ocorre devido ao
aumento na produção, na excreção ou de ambos.

Esse aumento precisa ser identificado, a fim de evitar a formação de


cálculos renais devido à deposição de cristais de urato. A hiperuricosúria pode
estar associada, ainda, ao aumento do cálcio sérico, a distúrbios ósseos e à
diminuição do ácido úrico plasmático (hipouremia) (GALANTE; ARAÚJO, 2012).

O ácido úrico é determinado por meio da reação de Trinder, a qual tem


especificidade da enzima uricase. A reação ocorre pela oxidação do ácido úrico
pela uricase, formando alantoína e peróxido de hidrogênio, que, por sua vez,
reagem com DHBS e 4-aminoantipirina. Para a urina, uma alíquota de 10 mL é
separada, e o pH é ajustado para 7,0-9,0 com NaOH 5%. Em seguida, a urina é
aquecida por 10 minutos a 56 °C, a fim de que os cristais de urato e ácido úrico
sejam dissolvidos. Posteriormente, é necessário diluir a urina em 1:10 (LABTEST,
2014b). É importante mencionar que cada laboratório terá a sua metodologia,
sendo que, para muitos casos, essas dosagens são totalmente automatizadas.

Os valores de referência para o ácido úrico na urina são de 250 a 750


mg/dL.

41
UNIDADE 1 — URINÁLISE

4.6 POTÁSSIO
O potássio é um íon encontrado, principalmente, no meio intracelular e
tem como função o controle do metabolismo celular, participando, assim, dos
mecanismos de excitação neuromuscular. Alterações nos níveis de potássio po-
dem ser fatais, uma vez que são essenciais para a manutenção do funcionamento
do coração. O potássio pode ser utilizado na investigação de doenças nos túbulos
renais, uma vez que, na insuficiência renal, ocorre uma diminuição da excreção
de potássio. Além disso, alguns fármacos podem interferir na sua excreção, como
os inibidores da enzima conversora de angiotensina, os anti-inflamatórios não es-
teroides, a ciclosporina, o cetoconazol, entre outros (GALANTE; ARAÚJO, 2012).

Sua determinação ocorre através de uma alíquota da urina e o uso de


um eletrodo seletivo de íons (ESI), responsável por converter a atividade (ou
concentração efetiva) do íon dissolvido na urina em um potencial elétrico,
mensurado por um voltímetro (ASIRVATHAM et al., 2013).

O valor de referência do potássio na urina é de 22 a 125 mmol/L.

4.7 UROPORFIRINAS
A uroporfirina é uma porfirina solúvel em água e excretada na urina ou,
em menores concentrações, no sangue e nas fezes. Para essa análise, a amostra
deve ser coletada em frasco âmbar com conservante (5 g de bicarbonato por litro
de urina), mantido sob refrigeração e protegido da luz no período da coleta. Sua
detecção ocorre pelo método de cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC),
através de uma alíquota de 4,0 mL de urina em tubo âmbar. É muito útil no
diagnóstico de porfirias, uma condição que decorre de “deficiências enzimáticas
na biossíntese do grupo heme da cadeia da hemoglobina” (DINARDO et al., 2010,
p. 106). Além disso, é útil no diagnóstico da intoxicação por metais pesados, como
chumbo, leucemias, linfomas e anemia hemolítica.

O valor de referência para uroporfirina é inferior a 35 µg/24 horas.

DICAS

Para saber mais sobre a cromatografia líquida de alta eficiência, sugerimos a


leitura do seguinte texto: https://freitag.com.br/blog/o-que-e-a-cromatografia-liquida-de-
alta-eficiencia/.

42
TÓPICO 2 — ANÁLISE FÍSICA E QUÍMICA DA URINA

DICAS

Conheça um pouco mais sobre porfirias com a leitura do artigo Porfirias:


quadro clínico, diagnóstico e tratamento: https://www.revistas.usp.br/revistadc/article/
view/46282/49937.

43
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• A avaliação física da urina é subjetiva, mas essencial, pois auxilia na análise


conjunta dos dados da urinálise do paciente. Modificações na coloração, aspecto
e densidade são fortes indicativos de que outros parâmetros bioquímicos estão
alterados.

• A avaliação bioquímica ou química da urina é feita por meio de tiras reativas,


que auxiliam na detecção de parâmetros importantes da urinálise, como ni-
tritos, hemoglobina, leucócitos, urobilinogênio, bilirrubinas, proteínas, corpos
cetônicos, glicose e pH.

• A avaliação da urina de 24 horas é muito importante, pois permite a análise


completa de componentes urinários de um paciente, como creatinina,
proteínas, sódio, potássio, ácido úrico e cálcio urinário. Além disso, o volume
urinário só pode ser avaliado, de modo concreto, com uma coleta realizada em
24 horas, pois a coleta do parcial de urina indica somente uma pequena parcela
do volume urinário do paciente.

• A associação entre os testes realizados na urina, assim como a avaliação dos


parâmetros clínicos do paciente, é essencial, uma vez que os parâmetros obtidos
pela urina são somente uma triagem, não podendo predizer diagnóstico de
determinadas patologias ao paciente.

• Pacientes com doenças renais podem apresentar: proteínas, leucócitos, hemo-


globina, com diminuição ou aumento da densidade, diferença na coloração e
no aspecto.

• Pacientes com infecções, normalmente, apresentam teste de nitrito e leucócitos


positivos. Caso o teste de nitrito seja negativo, a infecção não pode ser
descartada, já que o teste diagnóstico é a urocultura e algumas bactérias não
convertem nitrato em nitrito.

• A presença de glicose e corpos cetônicos pode ocorrer em pacientes diabéticos,


mas também estão relacionados com outros fatores.

44
AUTOATIVIDADE

1 Paciente diabético, com elevados níveis glicêmicos e em estado de


cetoacidose diabética, chega ao pronto-atendimento. Considerando os
parâmetros urinários desse paciente e de acordo com suas funções renais,
classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) Um paciente com glicose e corpos cetônicos positivos na tira reagente,


provavelmente, é diabético.
( ) A bilirrubina e o urobilinogênio podem indicar distúrbios biliares ou
hemolíticos.
( ) A presença de proteínas na amostra de urina é considerada normal.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.

2 Paciente, sexo feminino, 30 anos de idade, atleta, apresentou as seguintes


alterações no exame de urina: traço de proteína, corpos cetônicos + e pH de
5,0. Com base na análise química da urina, analise as sentenças a seguir:

I- A presença de corpos cetônicos na amostra pode ser indicativa de que a


paciente esteja com quadro de diabetes melito.
II- O pH ácido da amostra indica que a paciente possui uma dieta rica em
proteínas.
III- A presença de traços de proteína é comum em atletas, principalmente se
a amostra for coletada logo após um intenso exercício físico.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças II e III estão corretas.


b) ( ) Somente a sentença I está correta.
c) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 A coloração da urina é importante para predizer determinadas condições


do paciente. Sobre a cor da urina, assinale a alternativa CORRETA:

45
a) ( ) A coloração azulada ocorre em quadros de problemas hepáticos, em
que há um excesso de bilirrubina sendo excretado.
b) ( ) A coloração amarela indica que a amostra de urina está com uma
quantidade excessiva de proteínas.
c) ( ) A coloração preta ocorre devido a processos de infecção bacteriana
com Pseudomonas aeruginosa.
d) ( ) A coloração transparente e amarelo-claro são indicativos de que o
paciente está saudável e bem hidratado.

4 Paciente, sexo masculino, 60 anos de idade, chegou ao pronto-atendimento


relatando fortes dores na coluna, oligúria, vômitos e queda da pressão
arterial. O quadro a seguir apresenta os resultados dos exames solicitados:

Exame Físico
Volume 10 mL
Cor Vermelho
Aspecto Turvo
Densidade 1.100
Exame Químico
pH 4,5
Proteína ++++
Corpos cetônicos Ausência
Hemoglobina ++++
Nitrito +
Leucócitos +++
Glicose ++
Urobilinogênio +

FONTE: Os autores

Disserte sobre o provável diagnóstico do paciente.

5 Paciente, sexo feminino, 70 anos de idade, reclama de dores articulares e


inchaço na região do dedo dos pés. O hemograma da paciente foi normal.
Após realizar o exame de urina de 24 horas para determinação de ácido
úrico urinário, os resultados do exame apresentaram 1.200 mg/dL de ácido
úrico. Disserte sobre o provável diagnóstico da paciente.

46
TÓPICO 3 —
UNIDADE 1

ANÁLISE SEDIMENTOSCÓPICA DA URINA

1 INTRODUÇÃO

Neste tópico, conheceremos a análise do sedimento urinário. A obtenção


do sedimento urinário é realizada somente após a leitura dos parâmetros físicos
e químicos da urina. A análise é precedida de centrifugação, para que haja a
separação física dos componentes da urina de acordo com a sua densidade. Os
elementos pesados e sólidos irão se sedimentar. Para isso, o método clássico e
manual utiliza cerca de 10 a 15 mL da amostra. A amostra é centrifugada de
1.500 a 2.500 rpm, por 10 minutos, e o sobrenadante é descartado. Em seguida,
o sedimento obtido é ressuspenso e uma gota é coletada e colocada sobre uma
lâmina. A análise pode proceder utilizando uma lâmina convencional ou lâminas
específicas, como a câmara de Neubauer e K-cell (Figura 18), a qual deve ser
analisada no microscópio óptico (ALVES, 2011).

FIGURA 18 – CÂMARA DE NEUBAUER (A) E LÂMINA K-CELL (C) OBSERVADAS EM


MICROSCOPIA ÓPTICA (B E D)

FONTE: Adaptada de <https://centerlabsp.com.br/blog/como-utilizar-a-lamina-k-cell>; <https://


bit.ly/3gw8yNl>. Acesso em 30 mar. 2021.

47
UNIDADE 1 — URINÁLISE

A análise microscópica é muito importante, pois complementa os


dados obtidos na análise física e química, em que os elementos sólidos, como
hemácias, leucócitos, células epiteliais, bactérias e cristais, podem ser avaliados
e identificados com mais cautela. Cada achado possui morfologia característica e
contribui para identificar doenças de todos os sistemas do corpo (GRAFF, 1983;
RABINOVITCH et al., 2009; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

Além de ser essencial para visualização dos componentes microscópicos,


é útil para identificar possíveis contaminações na amostra, assim como auxiliar
no diagnóstico das infecções ou lesões renais ou, até mesmo, acompanhar e
identificar um paciente diabético (GRAFF, 1983; RABINOVITCH et al., 2009;
STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

2 CÉLULAS
A análise do sedimento urinário possibilita identificar os constituintes
celulares da urina, como as células epiteliais, hemácias e leucócitos, e, ao quantificá-
los, podemos indicar se ocorrem processos inflamatórios ou infecciosos no trato
urinário.

2.1 CÉLULAS EPITELIAIS


A classificação das células epiteliais se dá de acordo com o local de origem,
podendo ser células epiteliais escamosas, células epiteliais de transição e células
epiteliais tubulares. Apesar de ser uma nomenclatura importante, normalmente
não indicamos no laudo qual tipo de célula epitelial estava presente na amostra
do paciente. Assim, o resultado é expresso de acordo com a presença ou ausência
de células epiteliais na urina. Para quantificação, utilizamos o padrão de campo,
no qual a presença de até três células é conhecida como rara, de quatro a 10
células, como “algumas” e de 10 células, como “numerosas” (GREENBERG, 2014;
KASVI, 2019; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

No entanto, identificar o tipo celular é importante para predizer se


há alteração na amostra e qual sistema se encontra comprometido. As mais
encontradas em amostras de urina são as escamosas (Figura 19), pois constituem
o canal vaginal e uretral de mulheres e homens. De modo geral, ao serem
encontradas, podem indicar contaminação da amostra urinária e, nesse caso,
também podemos encontrar uma quantidade significativa de bactérias. Para
identificar se realmente se trata de uma coleta inadequada, devemos avaliar os
demais parâmetros da amostra, assim como a clínica do paciente (GREENBERG,
2014; KASVI, 2019; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

48
TÓPICO 3 — ANÁLISE SEDIMENTOSCÓPICA DA URINA

FIGURA 19 – CÉLULA EPITELIAL ESCAMOSA (EM B, INDICADA PELO CÍRCULO AMARELO)

FONTE: Adaptada de <https://bit.ly/2WoxCyi>. Acesso em: 9 maio 2021.

As células epiteliais de transição (Figura 20) estão presentes na bexiga e,


normalmente, aparecem em quadros de infecção urinária. Nesse caso, a presença
dessas células estará acompanhada de uma quantidade significativa de leucócitos
(GREENBERG, 2014; KASVI, 2019; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

FIGURA 20 – CÉLULAS EPITELIAIS DE TRANSIÇÃO (DESTACADAS NO CÍRCULO AZUL)

FONTE: Adaptada de Câmara (2017, n.p.)

Já as células tubulares (Figura 21) constituem os túbulos renais e apare-


cem na urina esporadicamente, mas, quando associadas a cilindros, são forte
indício de problemas renais. Quanto mais células tubulares, maior a lesão renal
e maior a chance de perda de função. Consequentemente, quando encontramos
essas células, podemos identificar parâmetros bioquímicos como ureia e crea-
tinina alterados também (GREENBERG, 2014; KASVI, 2019; STRASINGER; DI
LORENZO, 2009).

49
UNIDADE 1 — URINÁLISE

FIGURA 21 – CÉLULA EPITELIAL TUBULAR

FONTE: <https://bit.ly/2WoxCyi>. Acesso em: 9 maio 2021.

2.2 LEUCÓCITOS NA URINA


A presença de leucócitos (Figura 22) na urina pode ser considerada
normal, quando em pequenas quantidades (< cinco leucócitos por campo
– 10.000 leucócitos por mL de urina). No entanto, quando ultrapassa essa
quantidade, isso indica a presença de um processo infeccioso, lúpus eritematosos
sistêmicos, doenças renais ou, ainda, tumores (GREENBERG, 2014; KASVI, 2019;
STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

O valor de referência no laudo é de até cinco leucócitos por campo.

FIGURA 22 – LEUCÓCITOS

FONTE: Câmara (2017, n.p.)

2.3 HEMÁCIAS NA URINA


Uma pequena quantidade de hemácias (Figura 23) na urina pode
ser considerada normal (< três por campo), mas o aumento dessas células
está diretamente relacionado com doenças renais. Não é acompanhada de

50
TÓPICO 3 — ANÁLISE SEDIMENTOSCÓPICA DA URINA

sintomatologia, mas, em grande quantidade, pode ser visualizada a olho nu pela


mudança de coloração da urina para rosa-claro a vermelho. Além de indicar lesão
renal, sua presença também está relacionada com infecção urinária, processos
inflamatórios no trato geniturinário, uso de medicamentos, como anticoagulantes,
presença de cálculo renal ou ainda câncer nos rins (GREENBERG, 2014; LOPES et
al., 2018; MAYO, 1998-2021).

O valor de referência no laudo é de até três hemácias por campo.

FIGURA 23 – HEMÁCIA

FONTE: Câmara (2017, n.p.)

3 CRISTAIS
Os cristais na urina estão associados à precipitação de substâncias
presentes no organismo, que é resultado de alteração no pH da urina, infecções
urinárias, alteração brusca na temperatura do organismo ou, ainda, uma elevada
concentração desses componentes, que pode ocorrer pela dieta ou por uso de
medicamentos. Os mais comuns são as substâncias orgânicas como cálcio,
magnésio e fosfato, sendo que sua presença em quantidades baixas na urina não
indica quadro patológico. No entanto, a grande concentração desses cristais pode
indicar doenças como gota, cálculo renal ou infecções urinárias (GREENBERG,
2014; KASVI, 2019; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

É importante ressaltar que existem diferentes tipos cristais diretamente


correlacionados com determinadas condições. Os mais comuns são os cristais de
fosfato triplo, ácido úrico e oxalato de cálcio, mas eles não são os únicos. Por isso,
deve-se ter atenção às informações apresentadas a seguir.

3.1 CRISTAL DE FOSFATO TRIPLO


O fosfato triplo (Figura 24), normalmente, é encontrado em urinas
alcalinas, sendo composto por fosfato, magnésio e amônia. Sua presença é
considerada normal, mas o aumento desse cristal pode indicar infecção urinária
ou hipertrofia prostática (GREENBERG, 2014; KASVI, 2019; STRASINGER; DI
LORENZO, 2009).

51
UNIDADE 1 — URINÁLISE

FIGURA 24 – CRISTAL DE FOSFATO TRIPLO

FONTE: <https://bit.ly/3zhzXtN>. Acesso em: 9 maio 2021.

3.2 CRISTAL DE ÁCIDO ÚRICO


O cristal de ácido úrico (Figura 25) é encontrado em pH urinário ácido e
está diretamente relacionado com uma dieta rica em proteínas, pois é importante
lembrarmos que o ácido úrico é um produto da degradação de proteínas. Apesar
disso, eles também estão presentes em doenças como gota e nefrites crônicas
(GREENBERG, 2014; KASVI, 2019; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

FIGURA 25 – CRISTAL DE ÁCIDO ÚRICO

FONTE: <https://bit.ly/38rKDKB>; <https://bit.ly/3myMMMC>. Acesso em: 28 jul. 2021.

3.3 CRISTAL DE OXALATO DE CÁLCIO


O cristal de oxalato de cálcio (Figura 26) é encontrado em urinas neutras
ou ácidas e, apesar de ser normal em baixas concentrações, seu aumento está
relacionado com cálculo renal, devido à baixa ingestão de água e à rica ingestão
de cálcio. Além disso, é comum encontrarmos esses cristais em condições como
diabetes melito, doenças hepáticas ou renais graves (GREENBERG, 2014; KASVI,
2019; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).
52
TÓPICO 3 — ANÁLISE SEDIMENTOSCÓPICA DA URINA

FIGURA 26 – CRISTAL DE OXALATO DE CÁLCIO

FONTE: Câmara (2017, n.p.)

3.4 URATO AMORFO


Os uratos (Figura 27) ocorrem em pH urinário ácido ou em amostras
resfriadas, sendo encontrados com outros cristais citados anteriormente. O
resfriamento induz a cristalização de algumas substâncias na urina, resultando,
assim, no aparecimento de uratos. Portanto, a análise rápida da amostra é essencial,
para evitar interferências no laudo. Sua presença em grande concentração pode
resultar na alteração da coloração da urina para rosa, mas, de modo geral,
não causam sintomas no paciente. No exame sedimentoscópico, os uratos são
caracterizados por um conjunto granulado amarelo a preto (GREENBERG, 2014;
KASVI, 2019; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

FIGURA 27 – URATO AMORFO

FONTE: <https://bit.ly/38rKDKB>. Acesso em: 31 mar. 2021.

53
UNIDADE 1 — URINÁLISE

3.5 OUTROS CRISTAIS


Além dos cristais já apresentados, cristais de bilirrubina, carbonato de
cálcio, cistina, colesterol, leucina, magnésio-amônio-fosfato e tirosina também são
encontrados na urina, com menor frequência, porém não podem ser descartados.
É muito importante atentar a esse tipo de informação, pois esses cristais são
ligados a condições clínicas, muitas vezes, graves e devem ser identificados no
laudo do paciente de maneira correta. A Tabela 1 apresenta as suas indicações,
ilustrando o cristal.

TABELA 1 – OUTROS CRISTAIS ENCONTRADOS EM AMOSTRAS DE URINA

TIPO DE CARACTERÍSTICAS
RELEVÂNCIA CLÍNICA
CRISTAL MICROSCÓPICAS

Cristais de
Indicam doenças hepáticas.
bilirrubina

Cristais de
Podem estar presentes em
carbonato de
urinas alcalinas.
cálcio

Presente em cistinose,
Cristais de cistinúria congênita,
cistina insuficiente reabsorção renal
ou hepatopatias tóxicas.

Costuma ser um sinal de


Cristais de
perdas
colesterol
maciças de proteína na urina.

54
TÓPICO 3 — ANÁLISE SEDIMENTOSCÓPICA DA URINA

Indicam doenças hepáticas,


como cirrose, hepatite viral,
Cristais de atrofia amarela aguda do
leucina fígado ou envenenamento
por fósforo, tetracloreto de
carbono ou clorofórmio.

Podem ser normais, mais


Cristais de presentes em casos de urina
magnésio- muito alcalina, provocada por
amônio-fosfato infecção urinária pelas bacté-
rias Protheus ou Klebsiella.

Presente na tirosinemia e
Cristais de associadas aos cristais de
tirosina leucina em doenças hepáticas
graves.

FONTE: Adaptada de Câmara (2017, n.p.); <https://bit.ly/3ykfrat>; <https://bit.ly/38rKDKB>.


Acesso em: 26 abr. 2021.

4 CILINDROS
A presença de uma grande quantidade de cilindros em uma amostra
de urina é indicativa de que alguma lesão renal esteja ocorrendo, isso porque
dificilmente encontramos cilindros em amostras normais de urina. Eles são
formados pela união de várias proteínas Tamm-Horsfall, excretadas nos túbulos
contorcidos distais e ducto coletor. Ao se unirem, forma-se uma estrutura
sólida, com o formato de um cilindro. Esse processo costuma ser mais intenso
após atividade física, estresse ou doenças renais e pode estar associado a outros
componentes presentes durante a formação de um cilindro, como bactérias, células
epiteliais, hemácias, leucócitos, células gordurosas, entre outras (GREENBERG,
2014; KASVI, 2019; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

Portanto, existem diferentes composições de cilindros, sendo que a sua


identificação é essencial para que seja possível identificar e diferenciar um quadro
normal de um quadro grave de lesão renal. Além disso, dependendo do tipo de
cilindro, ao observarmos esse componente, também encontramos outras alterações
no exame físico e químico da urina, como a presença de proteínas, leucócitos,
hemoglobina, entre outros (GREENBERG, 2014; KASVI, 2019; STRASINGER; DI
LORENZO, 2009).

55
UNIDADE 1 — URINÁLISE

A seguir, conheceremos a morfologia e a relevância clínica dos diferentes


tipos de cilindros.

4.1 CILINDRO HIALINO


O cilindro hialino (Figura 28) é muito comum, sendo formado somente
pela proteína Tamm-Horsfall. Por ser o mais comum, é possível encontrar até
dois cilindros hialinos por campo na urina analisada, que pode ser resultado de
um exercício físico intenso, estresse ou, ainda, calor excessivo. Contudo, quando
ultrapassa esse valor, pode indicar quadros de lesão renal, como glomerulonefrite,
pielonefrite ou doença renal crônica (GREENBERG, 2014; KASVI, 2019;
STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

FIGURA 28 – CILINDRO HIALINO

FONTE: Câmara (2017, n.p.)

4.2 CILINDRO HEMÁTICO


O cilindro hemático (Figura 29) é composto por um cilindro hialino
recheado por hemácias, sendo um forte indicativo de sangramento no
parênquima renal, como ocorre na glomerulonefrite e em lesões tubulares. Esse
cilindro é muito similar ao cilindro granular, mas costuma ser encontrado em
conjunto com a positividade de hemoglobina na urina, assim como hemácias na
análise de sedimentoscopia (GREENBERG, 2014; KASVI, 2019; STRASINGER; DI
LORENZO, 2009).

FIGURA 29 – CILINDRO HEMÁTICO

FONTE: Câmara (2017, n.p.)

56
TÓPICO 3 — ANÁLISE SEDIMENTOSCÓPICA DA URINA

4.3 CILINDRO LEUCOCITÁRIO


O cilindro leucocitário (Figura 30) é constituído por leucócitos e indica
processos infecciosos ou inflamatórios nos rins. No entanto, a presença desse tipo
de cilindro não confirma se há ou não infecção e/ou inflamação, sendo necessária
a associação a outros parâmetros da análise da urina, bem como avaliação do
exame de urocultura (GREENBERG, 2014; KASVI, 2019; STRASINGER; DI
LORENZO, 2009).

FIGURA 30 – CILINDRO LEUCOCITÁRIO

FONTE: Câmara (2017, n.p.)

4.4 CILINDRO EPITELIAL


Os cilindros epiteliais (Figura 31) estão presentes em quadros de lesão dos
túbulos renais crônica, sendo associado à toxicidade medicamentosa, a infecções
virais ou, ainda, à exposição a metais pesados (GREENBERG, 2014; KASVI, 2019;
STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

FIGURA 31 – CILINDRO EPITELIAL

FONTE: Câmara (2017, n.p.)

4.5 OUTROS CILINDROS


Além dos cilindros apresentados, existem outras conformações que mere-
cerem atenção durante a análise microscópica de uma amostra de urina. Por isso,
a Tabela 2 traz um resumo de outros cilindros menos comuns, mas que, ainda
assim, são relevantes na prática clínica.
57
UNIDADE 1 — URINÁLISE

TABELA 2 – OUTROS CILINDROS ENCONTRADOS EM AMOSTRAS DE URINA

TIPO DE RELEVÂNCIA CARACTERÍSTICAS


CONSTITUIÇÃO
CILINDRO CLÍNICA MICROSCÓPICAS

Indica síndrome
Cilindro
Célula de gordura nefrótica ou
gorduroso
diabetes melito

Pode estar
presente logo
Cilindro Grânulo de
após o exercício
granular proteínas séricas
físico ou em
doenças renais

Formado pela
proteína Tamm-
Horsfall, com
camada mais fina Indica doença
e frágil, podendo parenquimatosa
Cilindro
apresentar cortes crônica ou fase
céreo
ao longo das terminal de
bordas e índice de necrose tubular
refração maior do
que os cilindros
hialinos

FONTE: Adaptada de Câmara (2017, n.p.)

5 OUTROS COMPONENTES URINÁRIOS


Outros componentes podem ser identificados na amostra de urina,
sendo, muitas vezes, essenciais para auxiliar no diagnóstico do paciente. Entre
eles, podemos citar os microrganismos, como bactérias, leveduras e parasitas;
espermatozoides e muco. A seguir, descreveremos as características e a relevância
clínica de cada achado com detalhes, sendo importante sempre atentar para o
aspecto morfológico de cada componente, uma vez que é possível encontrá-los
durante a prática clínica, sendo essencial saber diferenciá-los.

58
TÓPICO 3 — ANÁLISE SEDIMENTOSCÓPICA DA URINA

5.1 BACTÉRIAS, LEVEDURAS E PARASITAS


A presença de microrganismos, como as bactérias (Figura 32), é muito
comum, principalmente nos casos de contaminação da amostra durante a coleta.
Caso o paciente não faça a higiene de modo adequado, é muito provável que a
amostra de urina contenha uma série de bactérias. No entanto, a sua presença
pode indicar também uma infecção urinária, sendo essencial que esse parâmetro
seja avaliado com os demais exames que compõem a urinálise, além de ser
confirmado pela urocultura (GREENBERG, 2014; KASVI, 2019; STRASINGER;
DI LORENZO, 2009).

FIGURA 32 – BACTÉRIAS EM AMOSTRAS DE URINA

FONTE: Câmara (2017, n.p.)

Outros microrganismos como leveduras, como a Candida (Figura 33), e


parasitas, como Trichomonas vaginalis, também podem estar presentes. Nesses
casos, ao encontrá-los, de modo geral, são responsáveis por processos infecciosos
(GREENBERG, 2014; KASVI, 2019; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

FIGURA 33 – LEVEDURA EM AMOSTRA DE URINA

FONTE: <https://bit.ly/3DaLhKm>. Acesso em: 30 mar. 2021.

59
UNIDADE 1 — URINÁLISE

O T. vaginalis (Figura 34) é identificado pela movimentação rápida


na lâmina, mas, por ser muito similar ao leucócito, quando está imóvel, a sua
identificação é muito difícil. Esse achado é resultado de contaminação de secreções
vaginais ou dos ureteres. Caso outros parasitas sejam observados, é muito
provável que tenha havido contaminação com amostra de fezes (GREENBERG,
2014; KASVI, 2019; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

FIGURA 34 – T. VAGINALIS EM AMOSTRA DE URINA INDICADO POR SETA PRETA


FONTE: <https://kasvi.com.br/sedimentoscopia-analise-urina/>. Acesso em: 30 mar. 2021.

5.2 MUCO
Os filamentos de muco (Figura 35) são resultado de processos de
descamação da bexiga e da uretra, sendo essenciais para a defesa do trato urinário.
Dessa forma, esse achado não é indício de doença (GREENBERG, 2014; KASVI,
2019; STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

FIGURA 35 – MUCO EM AMOSTRA DE URINA

FONTE: <https://bit.ly/2WoxCyi>. Acesso em: 9 maio 2021.

60
TÓPICO 3 — ANÁLISE SEDIMENTOSCÓPICA DA URINA

5.3 ESPERMATOZOIDES
Os espermatozoides (Figura 36) podem ser encontrados em amostras de
urina de pacientes que tiverem relações sexuais pouco antes da coleta da amos-
tra, sendo considerado um achado normal (GREENBERG, 2014; KASVI, 2019;
STRASINGER; DI LORENZO, 2009).

FIGURA 36 – ESPERMATOZOIDES EM AMOSTRA DE URINA

FONTE: <http://biomedicinafacil.blogspot.com/2008/02/>. Acesso em: em 30 mar. 2021.

61
UNIDADE 1 — URINÁLISE

LEITURA COMPLEMENTAR

A IMPORTÂNCIA DA ANÁLISE SEDIMENTOSCÓPICA DIANTE DOS


ACHADOS FÍSICO-QUÍMICOS NORMAIS NO EXAME DE URINA

Bruna Pessoa Nóbrega


Lorrany Junia Lopes de Lima
Diogo Vilar da Fonseca
Adirlene Pontes de Oliveira Tenório
Pedro Pereira Tenório
Matheus Rodrigues Lopes

INTRODUÇÃO
 
A urinálise é um teste laboratorial amplamente utilizado na prática
clínica, constituindo um dos indicadores mais importantes de saúde e doença, e
tem como objetivo detectar enfermidades pré-renais ou sistêmicas, renais e, pós-
renais ou do trato urinário. Além disso, distúrbios hepáticos,  diabetes melito e
degradação muscular também são avaliadas por meio do exame de urina.

O exame de urina é dividido em três etapas: análise física, análise química


e a sedimentoscopia, sendo os dois primeiros de execução mais simples e o último
é considerado moderadamente complexo.

A análise física abrange a cor, o aspecto e a densidade específica. A análise


da cor e do aspecto é percebida através da inspeção. A cor padrão normal da
urina é amarela, podendo atingir variações de tonalidades de pálida a âmbar.

Diversas colorações podem ser vistas de acordo com alterações na urina,


como: cor rósea, vermelha ou castanha, devido à presença de eritrócitos, hemo-
globina ou mioglobina; cor acastanhada pela presença de bilirrubinas, carotenos;
marrom escuro com presença de porfirina, melanina e coloração de alimentos.

Quanto ao aspecto, a urina pode ser classificada em límpida, ligeiramente


turva ou turva, devido à precipitação de fosfatos amorfos (urina alcalina),
precipitação de uratos amorfos (urina ácida) ou pela presença de bactérias,
leucócitos ou eritrócitos. Podendo também ser classificada em urina leitosa
(quilúria), que ocorre em situações de oclusão dos vasos linfáticos pélvicos.

A densidade específica é quantificada mediante o uso do densímetro,


refratômetro ou fita reativa e possui o objetivo de analisar a atividade dos rins em
manter, de acordo com o critério adequado, o equilíbrio hídrico do organismo.
Desse modo, a densidade específica contempla a relação entre a quantidade de
volume de água eliminado e solutos.

62
TÓPICO 3 — ANÁLISE SEDIMENTOSCÓPICA DA URINA

Na análise química, geralmente obtém-se o pH, proteínas totais, glicose,


bilirrubinas e urobilinogênio, corpos cetônicos, ação peroxidásica, esterase
leucocitária e nitritos. Os estudos dessa etapa podem ser efetuados em tubos de
ensaio, com a formação de reações químicas ou, por meio de tiras reagentes. A
utilização de tiras reagentes objetiva um teste mais veloz, simples, com baixo
custo e alta precisão.

Já a sedimentoscopia possui a finalidade de identificar e, ocasionalmen-


te, quantificar vários componentes figurados, como: leucócitos, hemácias, célu-
las epiteliais, bactérias, cilindros, cristais e fungos. Além disso, é um processo
de grande demanda que necessita de atividade laboratorial manual acentuada, é
pouco uniforme e acarreta um maior custo aos laboratórios porque é fundamental
a presença de mão de obra qualificada para se alcançarem resultados confiáveis.

A sedimentoscopia possui um alto valor preditivo negativo e a literatura


ainda menciona redução significativa de custos, além de abatimento do tempo de
trabalho. Dessa forma, em diversos países, a etapa sedimentoscópica é abolida
quando as análises físicas e químicas não possuem anormalidades.

Em diversos países, é indicado o emprego seletivo da sedimentoscopia


em exames de rotina de urina com achados físicos e químicos normais.  A
Confederação Europeia de Medicina Laboratorial indica que o exame de urina
deve ser requerido somente quando houver uma indicação clínica e a sua
utilização metodológica em populações demar­cadas precisa ser averiguada de
acordo com o custo/benefício.

No Brasil, não ocorre uma abordagem nesse modelo, pois a maioria dos
laboratórios clínicos realizam as três etapas preconizadas na rotina de urina.
Assim, é importante avaliar a importância da análise sedimentoscópica diante
dos achados físico-químicos normais no exame de urina.
 
Discussão

O exame de rotina de urina caracteriza-se por ser um exame de baixo


custo, simples e não invasivo. Entretanto, a quantidade de exames realizados
anualmente pode gerar um embate relacionado à saúde e à qualidade de vida
da população, pois são comuns resultados falso-positivos que requerem uma
investigação maior.

As sociedades de urologia americanas e canadenses não indicam a


realização do exame rotineiro de urina em pacientes com ausência de sinais e
sintomas clínicos. Nesse contexto, o sumário de urina é recomendado apenas em
grupos selecionados, como em crianças, diabéticos, grávidas e idosos.

Para se estabelecer o diagnóstico de proteinúria, hematúria e infecção do


trato urinário (ITU), o exame de urina é considerado relevante na pediatria, visto
que os recém-nascidos possuem uma alta prevalência de ITU.  Nessa idade, o

63
UNIDADE 1 — URINÁLISE

quadro clínico da ITU costuma ser inespe­cífico, o que representa um grande


obstáculo para o diagnóstico. O tratamento empírico deve ser estabelecido por
meio das alterações presentes no sumário de urina e pela sintomatologia.

Apesar de apenas alguns microrganismos (bactérias Gram-negativas)


serem capazes de reduzir nitrato a nitrito, a presença deste composto e da
esterase leucocitária na urina pode indicar ITU. Assim, é recomendada a terapia
empírica após coleta para urocultura em resultados com nitrito positivo no
sumário de urina.

A ITU está presente em cerca de 10% das crianças. Entre os lactentes e


crianças menores, a contaminação bacteriana é a mais recorrente, e sua prevalência
nessa faixa etária pode chegar a cerca de dois terços no sexo feminino. Em nossos
resultados, observamos a presença de flora bacteriana aumentada em cerca de
6%, piúria em aproximadamente 17% e esterase leucocitária em torno de 15% das
amostras de crianças, o que corrobora os dados encontrados na literatura.

É válido evidenciar que a ITU sintomática é a primeira causa mais


habitual de infecção em idosos e a segunda na população geral. Essa patologia é
a causa mais frequente de mortalidade em pacientes desse grupo etário devido
às infecções hospitalares. Além disso, a ITU relaciona-se à presença de sepse por
Gram-negativos e bacteremia.  Observamos o aumento da flora bacteriana nas
amostras da faixa etária acima de 60 anos em cerca de 15%, presença de piúria e
esterase leucocitária em aproximadamente 27% e 25%, respectivamente.

Um dos parâmetros utilizados para indicar o ritmo da progressão da


doença renal é a proteinúria, caracterizado como um marcador clássico de lesão
glomerular. A proteinúria é presente em casos de glomerulopatias e a permanência
desse achado é associada ao mau prognóstico dessas doenças.  Entretanto a
proteinúria pode não estar associada à lesão renal, como, por exemplo, na febre
e exercício físico intenso. Entre as proteinúrias benignas, a mais frequente é a
transitória idiopática, comum em crianças, adolescentes e adultos jovens.  Em
nossos resultados observamos a prevalência de proteinúria em cerca de 1% em
crianças e adultos, com valores de cerca de 6% da população idosa.

A hematúria pode ser um achado decorrente desde esforços físicos in-


tensos, até doenças graves, como as neoplasias do trato urinário. Em crianças e
adolescentes, a hematúria pode variar em 1,5% a 2%, e as etiologias são, prin-
cipalmente, glomerulopatias, ITU, distúrbios metabólicos e anormalidade con-
gênita.  Em adultos, a preva­lência varia de 4% a 13% e a principal causa é de
origem glomerular. Já em mulheres jovens, principalmente, ITU. Em idosos, a
prevalência de hematúria chega a cerca de 10% da população e as principais
causas são neoplasias, cistite, nefrolitíase, prostatite, uretrite, nefropatia por IgA,
glomerulonefrites hereditárias, entre outras. Em nossos achados evidenciamos
hematúria em cerca de 1% das crianças, em torno de 6% em adultos e, aproxi-
madamente 10% em idosos, o que corrobora os dados encontrados na literatura.

64
TÓPICO 3 — ANÁLISE SEDIMENTOSCÓPICA DA URINA

Com o envelhecimento, é descrito o aumento da incidência de diversas


patologias crônicas, como a diabetes melito. Deve-se pressupor seu diagnóstico em
pacientes que apresentem hiperglicemia e/ou glicosúria em exame de rotina. Em
nossos resultados observamos a presença de glicosúria em cerca de 10% das
amostras na faixa etária acima de 60 anos, enquanto que em amostras de pacientes
com menos de 60 anos esse valor não atingiu a marca de 5% das amostras
analisadas, o que corrobora os dados encontrados na literatura, evidenciando a
relação entre a glicosúria e o aumento da idade.

Além das recomendações de indicação do exame de urina somente


quando houver uma indicação clínica e em populações específicas, em diversos
países é sugerido o emprego seletivo da sedimentoscopia em exames de rotina de
urina com achados físicos e químicos normais.

No Brasil, o exame de urina é requisitado rotineiramente e os laboratórios


clínicos realizam as três etapas preconizadas.  Assim, a solicitação rotineira do
exame de urina, mesmo sem suspeitas de patologias, é uma justificativa relevante
para a elevada quantidade de normalidade dos sumários de urina.  Em nosso
trabalho, foi observado que cerca de dois terços das amostras analisadas não
apresentaram alterações no exame físico-químico.

Observamos que o resultado da análise físico-química foi um grande


indicativo da presença ou não de alterações sedimentoscópicas, visto que, em
praticamente todas as alterações evidenciadas (piócitos, bacteriúria, hematúria
e leveduras), o resultado foi estatisticamente significativo, não tendo sido
evidenciada diferença apenas para a presença de cristais.

Em contrapartida, percebeu-se que em torno de 8,5% das amostras


denotaram características físico-químicas normais e alguma anormalidade
sedimentoscópica. A partir da análise destes sedimentos urinários, a presença
de piócitos foi a anormalidade que apresentou maior índice, achado este bem
relevante, visto que o valor preditivo de piúria, conforme a literatura, varia entre
40% e 80% para ITU.

Em nosso trabalho, o valor preditivo negativo de alterações sedimentos-


cópicas em urinas com análise físico-química normal foi de 86%, inferior a ou-
tros dados da literatura que o situa em até 98%, e isso se deve possivelmente a
variações na etapa pré-analítica.

A etapa pré-analítica, caracterizada pela coleta, manipulação, chegada e


processamento da amostra, pode estar sujeita a erros, interferindo na fidedigni-
dade de alguns resultados. Essa fase é sujeita a erros, pois depende de mecanis-
mos manuais e ocorre com frequência em ambientes externos ao laboratório; cer-
ca de 45% a 70% dos erros de laboratórios ocorrem nessa etapa. Um erro comum

65
UNIDADE 1 — URINÁLISE

de se observar no exame de urina é a bacteriúria falso-positiva, que ocorre princi-


palmente devido à orientação insatisfatória ao paciente acerca da coleta da urina,
informando quanto à necessidade de assepsia adequada da região urogenital e
a utilização do jato médio de urina. Tal entrave não se limita apenas ao estudo
em questão, mas é uma realidade nacional que precisa ser considerada. Assim
sendo, o esclarecimento feito pelo médico ao paciente sobre o exame é essencial.

FONTE: Adaptada de NÓBREGA, B. P. et al. A importância da análise sedimentoscópica diante


dos achados físico-químicos normais no exame de urina. Revista RBAC, v. 51, n. 1, p. 58-64,
2019. Disponível em: http://www.rbac.org.br/artigos/importancia-da-analise-sedimentoscopica-
diante-dos-achados-fisico-quimicos-normais-no-exame-de-urina/. Acesso em: 27 abr. 2021.

66
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• A análise microscópica é essencial para complementar os dados obtidos na


análise física e química, pois os elementos sólidos, como hemácias, leucócitos,
células epiteliais, bactérias e cristais, podem ser avaliados e identificados com
mais cautela, a fim de diminuir os riscos de contaminações na amostra e auxiliar
no diagnóstico de lesões renais e infecções.

• As principais células encontradas na sedimentoscopia são as células epiteliais,


hemácias e leucócitos, sendo que, em baixas quantidades, podem ser conside-
radas normais. No entanto, o aumento da concentração desse tipo de células
está ligado a quadros de lesões renais, processos inflamatórios ou infecciosos.

• A presença de cristais na urina está relacionada com o pH urinário, sendo


comum encontrar alguns cristais em urina ácida ou alcalina. No entanto, eles
podem estar diretamente relacionados com cálculos renais, doenças hepáticas
ou ainda diabetes melito, sendo importante sempre relatar o cristal encontrado,
uma vez que essa análise irá ser avaliada em conjunto com outros dados clínicos
do paciente, e pode ser importante para indicar algum quadro patológico.

• Os cilindros são constituídos pela proteína Tamm-Horsfall e podem estar


recheados de outros componentes celulares, o que resulta na nomenclatura do
cilindro. Um cilindro vazio é conhecido como cilindro hialino, sendo muito
comum em amostras de urina normais, em baixas quantidades; um cilindro
hemático é recheado por hemácias; um cilindro leucocitário é composto por
leucócitos; e um cilindro granular, por material granular de proteínas.

CHAMADA

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67
AUTOATIVIDADE

1 Considerando a análise microscópica do sedimento urinário de um paciente


que frequentemente realiza atividades físicas e possui um consumo de
proteínas, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) O paciente possuirá uma urina ácida, podendo apresentar cristais como


uratos amorfos e oxalato de cálcio.
( ) É comum aparecerem grandes quantidades de cilindros hialinos em
pacientes que realizam atividades físicas com frequência.
( ) O paciente apresentará pH urinário ácido e, provavelmente, traços de
proteínas, hemoglobina e leucócitos em tira reativa.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.

2 Paciente, sexo feminino, apresenta normalidade no exame físico e químico


da urina. No entanto, em análise sedimentoscópica, são encontrados raros
cristais de fosfato triplo, oxalato de cálcio, urato amorfo e Trichomonas
vaginalis. Com base na análise sedimentoscópica da urina, analise as
sentenças a seguir:

I- A presença de T. vaginalis indica que os resultados químicos da urina


estão incorretos, uma vez que o teste de nitrito deveria ser positivo.
II- A presença de cristais de fosfato triplo, oxalato de cálcio e urato amorfo
indicam quadro de infecção por bactérias, responsáveis por acidificar o
pH urinário. Isso é comprovado com o achado de T. vaginalis.
III- Os cristais encontrados não indicam quadro clínico significativo, uma vez
que a análise física e química está normal. No entanto, a paciente está com
tricomoníase, devido à presença do T. vaginalis.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças II e III estão corretas.


b) ( ) Somente a sentença I está correta.
c) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

68
3 Paciente, sexo masculino, 56 anos de idade, apresentou as seguintes
alterações no exame de urina: coloração alaranjada, +++ bilirrubina;
cristal de cistina, cristal de leucina e cristal de tirosina. De acordo com os
resultados, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) O paciente apresenta um clássico quadro de diabetes melito, devido


aos cristais encontrados.
b) ( ) As informações coletadas são condizentes com um quadro de doença
hepática.
c) ( ) O achados podem ser relacionados com um quadro normal, sendo
relacionado com o excesso de atividade física.
d) ( ) Os cristais encontrados são relacionados ao pH alcalino da urina, não
indicando quadros patológicos específicos.

4 Paciente, sexo feminino, 30 anos de idade, chegou ao pronto-atendimento


com quadro de tontura, cansaço, náusea e dor abdominal. Durante
avaliação, o médico sente um forte odor cetônico, relacionando o quadro
com cetoacidose diabética. Disserte sobre quais parâmetros estariam
alterados no exame de urina da paciente e justifique.

5 Paciente, sexo feminino, chega ao pronto-atendimento reclamando de


dores ao urinar e febre de 38 °C. Os resultados do exame de urina estão
relacionados na tabela a seguir:

Exame físico
Volume 10 mL
Cor Alaranjada
Aspecto Turvo
Densidade 1.100
Exame químico
pH 6,0
Proteína Traços
Corpos cetônicos Ausente
Hemoglobina Presente (++)
Nitrito Positivo
Leucócitos Presente (+++)
Glicose Ausente
Urobilinogênio Ausente

69
Exame microscópico
Células epiteliais 1.000/mL
Hemácias 3.000/mL
Leucócitos 50.000/mL
Filamentos de muco Alguns
Flora bacteriana Aumentada

Hialinos: 1.000/mL
Cilindros
Leucocitário: 5.000/mL

Cristais Fosfato triplo (+++)

FONTE: Os autores

Disserte sobre o provável diagnóstico da paciente, com base no resultado do


seu exame.

70
REFERÊNCIAS
ALVES, M. T. et al. Proteinúria: um instrumento importante para o diagnóstico
da doença renal. 21. ed. Analisa, 2017. Disponível em: http://www.goldanalisa.
com.br/print.asp?id=136. Acesso em: 6 maio 2021.

ALVES, M. L. Análises laboratoriais. São Paulo: DCL; 2011.

ASIRVATHAM, J. R.; MOSES, V.; BJORNSON, L. Errors in potassium


measurement: a laboratory perspective for the clinician. North American Journal
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73
74
UNIDADE 2 —

CITOLOGIA CLÍNICA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• conhecer os aspectos históricos, a definição e o objetivo da citologia


clínica;

• entender a estrutura de um laboratório de citologia clínica;

• identificar os meios de coleta e o processamento para os exames


citológicos;

• saber quais as principais patologias pesquisadas pela citologia clínica.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – INTRODUÇÃO À CITOLOGIA CLÍNICA

TÓPICO 2 – COLETA E PROCESSAMENTO

TÓPICO 3 – CITOLOGIA ESPECIAL

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

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76
TÓPICO 1 —
UNIDADE 2

INTRODUÇÃO À CITOLOGIA CLÍNICA

1 INTRODUÇÃO

A citologia clínica é um ramo voltado ao rastreamento e à detecção de


lesões celulares importantes do tipo neoplásica ou inflamatória, bem como à
identificação de agentes patogênicos nas mais diversas amostras de material
celular. Pode ser encontrada com outras denominações, como citopatologia ou
citologia oncótica, que fazem parte da mesma área de atuação e estão entre as
habilitações da Biomedicina e da Farmácia, permitindo assumir responsabilidade
técnica e liberar laudos em laboratórios de citologia clínica.

Essa modalidade de diagnóstico tem ganhado cada vez mais espaço,


devido a sua simplicidade técnica (coleta e processamento das amostras), à alta
assertividade nos resultados e ao baixo custo. Entre as modalidades da citologia
oncótica, está a colpocitologia (exame de Papanicolaou), altamente difundida no
mundo e conhecida nos programas de saúde da mulher, que tem contribuído
continuamente para a redução da mortalidade e morbidade, causadas pelo câncer
de colo do útero.

Neste tópico, conheceremos, brevemente, os aspectos históricos no Brasil


e no mundo, suas aplicações e complicações. Mais adiante, veremos a definição de
citologia oncótica, seus objetivos, a estrutura de um laboratório e a epidemiologia
do câncer, tema de fundamental importância para o entendimento da necessidade
da atuação profissional nesse campo diagnóstico.

2 ASPECTOS HISTÓRICOS E OBJETIVOS DA CITOLOGIA


CLÍNICA
A citologia clínica (citopatologia) é a ciência aplicada aos estudos das
principais alterações celulares presentes nas neoplasias. Para tanto, faz uso do
microscópio óptico e avalia as modificações nucleares e citoplasmáticas das
células, por meio de técnicas específicas de coleta, processamento e análise dos
espécimes celulares (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012a; GAMBONI, 2013).

77
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

A primeira análise citológica com objetivo diagnóstico foi associada a


Sir Julius Vogel, em 1843. Em seguida, Henri Lebert, em 1845, Lionel S. Beale,
em 1850, e Donaldson, em 1853, fizeram descobertas utilizando raspados de tu-
mores, nas quais observaram as alterações citológicas presentes nas neoplasias.
Apesar das notáveis descobertas da época, a citologia clínica não progrediu,
fato que é associado aos avanços mais expressivos em histologia (MINISTÉRIO
DA SAÚDE, 2012).

Graças ao trabalho do médico George Papanicolaou, apresentado à


comunidade científica em 1928, a citologia angariou status de ciência, devido à
grande importância de suas descobertas na área ginecológica. Concomitantemente,
outro patologista, chamado Aurel Babes, também no ano de 1928 e sem conhecer
o trabalho de Papanicolaou, publicou um artigo chamado Diagnóstico do câncer do
colo uterino por esfregaços, na revista La Presse Medicale. Em 1943, Papanicolaou e
Traut publicaram um artigo sobre a importância da citologia para a descoberta do
câncer cervical e endometrial. Tais observações foram prontamente reconhecidas e
confirmadas por outros autores, estabelecendo, assim, o grande valor da citologia
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012a; KOSS; GOMPEL, 2006).

Desde então, vários trabalhos científicos foram desenvolvidos, refinando


os critérios citomorfológicos para a descrição das lesões celulares encontradas nas
amostras citológicas dos mais variados sítios anatômicos e oriundas de diversas
técnicas de coleta. O material citológico pode ser obtido por meio de raspados,
esfoliações induzidas por tração mecânica ou punções aspirativas por agulha fina
(PAAF), guiadas ou não por ultrassom (US) e, até mesmo, por amostras obtidas
espontaneamente, por exemplo, urina e secreção mamária (GAMBONI, 2013;
MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012b; MINISTÉRIO DA SAÚDE; INCA, 2016).

Para a avaliação da condição das células, utiliza-se microscópio óptico


e tingimento celular pela técnica de Papanicolaou, hematoxilina e eosina,
Romanowski, entre outros, técnicas que são escolhidas de acordo com o interesse
da avaliação. Contudo, rotineiramente, usa-se a técnica de Papanicolaou como
padrão de coloração (GAMBONI, 2013; KOSS; GOMPEL, 2006).

Atualmente, a citologia clínica é usada em larga escala como exame de


rastreamento, muito difundida na área ginecológica, embora apresente boa
aderência em outras áreas diagnósticas, sendo dois exemplos mais presentes na
rotina as citologias de mama e de tireoide, porém não há limitações quanto à
aplicabilidade do método (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012a; MINISTÉRIO DA
SAÚDE; INCA, 2016).

No Brasil, as primeiras campanhas de utilização da colpocitologia para


rastreamento do câncer de colo uterino tiveram início na década de 1960, com o
objetivo de levar as mulheres aos consultórios especificamente para rastreamento
da doença – situação que antes só era descoberta quando uma paciente procurava
atendimento por outros motivos e o médico examinava a região vulvovaginal por
rotina (TEIXEIRA, 2015).

78
TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO À CITOLOGIA CLÍNICA

Em 1970, a utilização de citologia esfoliativa para detecção do câncer de


colo uterino já era consenso entre os médicos, culminando com a estabilização
da técnica em nível global e com a consolidação das campanhas de prevenção.
A possibilidade de ampliação da cobertura e a rapidez do exame impulsionou o
uso do exame pelos médicos. Mais tarde, em 1998, um programa chamado “Viva
Mulher” ganhou força dentro do governo e, em 1999, sob comando do Instituto
Nacional do Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca), tornou-se a maior
campanha já executada no país dentro do âmbito de rastreamento do câncer de
colo do útero, atendendo cerca de 3,8 milhões de mulheres. O objetivo principal
dessa campanha era examinar mulheres com idades entre 35 e 49 anos, que nunca
haviam feito o exame ou estavam a mais de 3 anos sem fazê-lo (TEIXEIRA, 2015).

Atualmente, as campanhas de conscientização sobre o câncer de colo ute-


rino continuam ativas e a cada dia ganham mais força. Há programas de rastrea-
mento consolidados e funcionais. que acolhem as mulheres desde a coleta até a o
amparo, caso alguma lesão neoplásica seja identificada.

FIGURA 1 – CAMPANHA DO INCA

FONTE: <https://bit.ly/3mBO3Rg>. Acesso em: 20 jun. 2021.

2.1 CITOPATOLOGIA NÃO GINECOLÓGICA


Campo que abrange todas as áreas diagnósticas que podem se valer da
citopatologia, sendo exemplos mais comuns na rotina a citopatologia de mama e
tireoide. Com menor frequência, podem-se receber materiais biológicos oriundos
de peritônio, fígado, líquido cefalorraquidiano, urina, aspirados ou lavados
pulmonares, entre outros. Nesses campos, para obter o material, a forma pode
variar desde PAAF, esfoliação até lavados (GAMBONI, 2013; MINISTÉRIO DA
SAÚDE, 2012b).

O objetivo é o mesmo: detectar alterações celulares que indicam a presença


de neoplasias ou situações importantes, a fim de guiar o tratamento médico. Em
se tratando desses campos “especiais”, o material pode ser coletado de nódulos,
79
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

derrames ou secreções espontâneas. A citopatologia não ginecológica cumpre,


de forma excelente, seu papel com alta assertividade, reduzindo o número de
cirurgias desnecessárias, mostrando-se uma aliada no manejo e no tratamento do
paciente (GAMBONI, 2013).

Para a obtenção das amostras, diversas técnicas são empregadas, sendo


a PAAF a mais recorrente, utilizada na investigação de nódulos palpáveis,
guiada por US ou por palpação. Tal forma de coleta é amplamente aplicada nos
casos de nódulos tireoidianos e mamários (GOULART, 2018). Em sua pesquisa,
Gornals (2011) concluiu que essa modalidade de coleta de espécime não causa
danos maiores que os necessários nem hemorragias, além de relatar que há um
aproveitamento de 80% a 90% do material para citologia.

Freitas Júnior (2002) explica que se trata de um procedimento feito em


ambulatório de simples execução, custos reduzidos, com riscos controlados e
reações adversas mínimas, como hematomas pós-punção. É importante frisar que
essa modalidade de coleta não está incluída no rol de procedimentos permitidos
aos biomédicos. A técnica consiste na inserção de uma agulha fina (0,6 a 0,8 mm)
em direção ao nódulo (Figura 2), com o objetivo de aspirar células para avaliação
citológica. O material obtido é distendido em uma lâmina de vidro e fixado em
álcool. Já nos casos de suspeitas de neoplasias pulmonares, usa-se a técnica de
lavado broncoalveolar para obter as células para estudo. O lavado broncoalveolar
consiste em injetar uma solução estéril (soro fisiológico) pela traqueia até os
brônquios depois aspirá-la; dessa forma, obtém-se o material a ser analisado
(GAMBONI, 2013; CARVALHO et al., 2004).

TUROS
ESTUDOS FU

Para uma maior clareza no entendimento, abordaremos esse tema com mais
profundidade no Tópico 2.

Há grande abrangência da citopatologia e de suas aplicações no manejo


e no diagnóstico das doenças. É interessante lembrar que não existem muitas
limitações acerca de seu uso e praticamente todas as massas tumorais, com
exceção das tumorações ósseas, podem ser avaliadas pela citopatologia, mas,
para cada caso, há uma técnica específica de obtenção de material.

80
TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO À CITOLOGIA CLÍNICA

FIGURA 2 – PROCEDIMENTO DE PAAF EM NÓDULO TIREOIDIANO

FONTE: Adaptada de <https://bityli.com/xk6Fs>. Acesso em: 22 jun. 2021.

2.2 CITOPATOLOGIA GINECOLÓGICA


Campo de maior impacto dentro da citopatologia, desde os achados
de Papanicolaou, tem sido ampliada e largamente utilizada em campanhas de
prevenção do câncer do colo uterino em nível mundial. Representa também a
maior parte da rotina de um citopatologista, uma vez que também faz parte dos
exames de rotina da saúde da mulher (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012b; KOSS;
GOMPEL, 2006).

Conforme relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS), a


citopatologia ginecológica é um fator favorável para diminuição da mortalidade
e da incidência de câncer do colo uterino, obtendo resultados expressivos de
redução de casos nos países que organizaram políticas públicas de rastreamento
desde as décadas de 1950 e 1960 (WHO, 2002).

O câncer do colo uterino é associado ao papilomavírus humano (HPV),


em especial pelos subtipos HPV-16 e HPV-18, responsáveis por mais de 70%
dos casos de cânceres do colo de útero. O objetivo do rastreamento é conhecer
a história natural da doença e identificar os padrões celulares condizentes com
as lesões pré-cancerosas que podem estar presentes nas amostras, direcionando
as pacientes para o tratamento antes da evolução para o câncer de colo uterino
(MIRANDA et al., 2020).

A amostra é obtida pela esfoliação induzida por um instrumento chamado


de espátula de Ayre e uma escova endocervical. É um procedimento simples,
que pode ser realizado em ambiente clínico, por não exigir nenhum equipamento
complexo ou de alto custo. Tal simplicidade de coleta e processamento, associado

81
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

à boa acurácia, são os pontos fortes que fizeram a citopatologia diagnóstica


chegar ao patamar de primeira escolha no rastreamento do câncer de colo uterino
(GAMBONI, 2013; SCHNEIDER; SCHNEIDER, 1998). Segundo a normativas do
Conselho Federal de Biomedicina (CFBM) e do Conselho Federal de Farmácia
(CFF), o biomédico e o farmacêutico habilitado em citologia oncótica é apto a
fazer coletas de material citológico cervical.

FIGURA 3 – COLETA DO EXAME PAPANICOLAOU

FONTE: <https://bityli.com/EWoi8>. Acesso em: 22 jun. 2021.

Para a execução da técnica de coleta do exame, é necessário que a


paciente esteja em posição ginecológica. Após o preparo da paciente, é inserido
o espéculo para facilitar o acesso ao colo uterino, então a espátula de Ayre é
apoiada na mucosa do colo uterino, levemente pressionada, seguida de um giro
completo; após, a espátula é retirada e o material estendido em uma lâmina de
vidro e fixado com spray fixador ou álcool. O mesmo procedimento é feito para
coleta do material endocervical, porém utilizando uma escova endocervical (DA
COSTA et al., 2017).

DICAS

Para visualizar e complementar seu conhecimento sobre a coleta


cervicovaginal, sugerimos que acesse o Portal de Boas Práticas em Saúde da Mulher, da
Criança e do Adolescente: https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/atencao-mulher/
coleta-e-indicacoes-para-o-exame-citopatologico-do-colo-uterino/.

82
TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO À CITOLOGIA CLÍNICA

Essas coletas são feitas em consultório ou em laboratórios de análises clí-


nicas, que apresentem local adequado, conforme legislação vigente, pois não exi-
gem maiores esforços ou tecnologia para sua execução, porém essa simplicidade
não exclui a necessidade de uma técnica bem feita. Coletas não executadas cor-
retamente não são capazes de esfoliar as células necessárias de forma qualitativa
e quantitativa, podendo reduzir a eficácia do rastreamento (GAMBONI, 2013).

Conhecer a citopatologia ginecológica é muito importante, pois faz parte


de programas de rastreamento de câncer do colo uterino aplicados por todo
mundo, contribuindo para redução da mortalidade pela doença.

E
IMPORTANT

A coleta dos materiais para citologia não é de responsabilidade do laboratório,


como ocorre nos exames de análises clínicas. O fluxo normal para esse tipo de atendimento
é que o laboratório, em alguns casos, forneça o material para a coleta e já o receba pronto
para o processamento e análise, considerando que a maioria das coletas são feitas em
clínicas de ginecologia.

3 ESTRUTURA LABORATORIAL
O laboratório de citopatologia é, de certa forma, mais simples que
os demais laboratórios, uma vez que a demanda tecnológica mínima, para o
desenvolvimento das técnicas necessárias, é mais rudimentar. Apesar de haver
no mercado algumas automações, para a rotina convencional, não há necessidade
de aparelhos. Nesse aspecto, a citologia se torna mais barata, não é à toa que
foi escolhida como padrão de rastreamento e pré-diagnóstico contra o câncer de
colo uterino. Contudo, se é tão simples, surge a dúvida sobre o que compõe um
laboratório que trabalha exclusivamente com citopatologia.

Antes de mais nada, é preciso deixar bem claro que, para abrir qualquer
estabelecimento em saúde, deve-se ter registro (CNPJ) e contrato social da
empresa, alvará de localização municipal, alvará dos bombeiros e alvará da
Vigilância Sanitária, além de cumprir os requisitos da NR-9 (que versa sobre a
obrigatoriedade de implantação do Programa de Prevenção de Riscos Ambientais
– PPRA) e da NR-7 (Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional
– PCMSO); por ser um ente jurídico, é necessário estar alinhado com todas as
responsabilidades ficais e trabalhistas impostas a esse ramo. O biomédico e o
farmacêutico têm prerrogativas legais que os amparam no âmbito da citologia
oncótica, dando suporte ao exercício da profissão.

83
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

Ainda seguindo o fluxo administrativo, os laboratórios, em geral, devem


ter todos os procedimentos descritos e revisados em protocolos operacionais pa-
drão (POPs), desenvolver e implantar o Plano de Gerenciamento de Resíduos
do Sistema de Saúde (PGRSS). A falta dessas documentações impede a obtenção
dos alvarás e, por consequência, o funcionamento do estabelecimento de saúde
(ANVISA, 2005). Especificamente para a citologia oncótica, foi criada a Portaria
nº 3.388, de 30 de dezembro de 2013, que dispõe sobre o monitoramento interno
e externo de qualidade (MIQ e MEQ), o registro dos dados estatísticos e seus pa-
râmetros de qualidade, bem como o tempo de arquivamento de amostras e a res-
ponsabilidade que o laboratório tem sobre elas (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2013).

No que tange à estrutura física, ele deve seguir a norma padrão para
laboratórios (RDC nº 302 e RDC nº 50), que regulamentam o tipo de piso, a parede, a
exaustão, a ventilação, a metragem das salas, o condicionamento de temperatura,
bem como as questões mais burocráticas relacionadas com arquivamento
de requisições, laudos e informações dos pacientes. Nesse rol, também há
regulamentações direcionadas à identificação das amostras internamente e à
organização administrativa do laboratório (ANVISA, 2005).

A Resolução RDC nº 50, de 21 de fevereiro de 2002, “Dispõe do


regulamento técnico para planejamento, programação, elaboração e avaliação
de projetos físicos de estabelecimentos assistenciais de saúde” (ANVISA, 2002),
delimita as necessidades básicas estruturais de um laboratório, como metragem
quadrada por ambiente, sistemas de ventilação, controle de decibéis no ambiente,
incidência de luminosidade, entre outras situações sobre o espaço físico. Já a
Resolução RDC nº 302, de 13 de outubro de 2005: “Dispõe sobre Regulamento
Técnico para funcionamento de Laboratórios Clínicos” (ANVISA, 2005).

FIGURA 4 – DIAGRAMA ESTRUTURAL

FONTE: Os autores

Na RDC nº 302/2005, também constam os aspectos dos projetos estrutural/


arquitetônico, como devem ser apresentados os dados e as atribuições de cada
setor com a execução dos serviços de saúde. Vale ressaltar que essa resolução não
é específica para os laboratórios de citologia clínica, mas abrange todos os tipos de
estabelecimentos que prestam serviços à saúde pública e privada (ANVISA, 2005).

84
TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO À CITOLOGIA CLÍNICA

3.1 LABORATÓRIO DE CITOLOGIA CLÍNICA


Após a contextualização das normas que direcionam o desenvolvimento
físico e administrativo de um laboratório, a seguir, veremos a composição do
laboratório de citologia clínica, demonstrando os equipamentos e as soluções
utilizadas durante a rotina desse trabalho.

3.1.1 Materiais de escritório e administrativo


Os equipamentos administrativos contam com computador, impressora,
material de escritório e afins; apesar de ser uma informação simples, é de suma
importância utilizar equipamentos com tecnologia atual, a fim de suprir a
evolução dos sistemas de controle de qualidade e novas propostas de softwares.
Um bom computador, por exemplo, permite a captura e a melhora de fotos dos
casos presentes na rotina, sendo importante instalar bons softwares de gestão
laboratorial, para permitir a emissão de laudos sem erros ou evitar problemas
relativos ao sistema empregado.

Um bom aporte de materiais de escritório é necessário para que o labora-


tório funcione de forma ininterrupta. Por exemplo, no caso de faltar folhas ou ca-
rimbos, o profissional ficará impedido de imprimir e liberar laudos, até mesmo a
falta de uma caneta pode interferir na qualidade pós-analítica – são detalhes que
podem fazer a diferença, principalmente quando ausentes no local de trabalho.

Em resumo, pequenos detalhes interferem diretamente na qualidade do


trabalho exercido no laboratório. Portanto, quando falamos em bom funciona-
mento estrutural e administrativo, é fundamental pensarmos em cada detalhe
envolvido.

Na questão administrativa, outro importante aspecto dos laboratórios é o


controle de qualidade, que contempla os procedimentos feitos desde o momento
de entrada da amostra no ambiente laboratorial até a emissão do laudo (Figura
5). Durante todo esse processo, existe uma logística que deve ser estudada e
aplicada à realidade de cada unidade, garantindo o perfeito fluxo das amostras
(MINISTÉRIO DA SAÚDE; INCA, 2016).

FIGURA 5 – FLUXO DAS AMOSTRAS

FONTE: Os autores

85
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

DICAS

Atualmente, o principal documento de referência utilizado é o Manual de


Gestão da Qualidade para Laboratório de Citopatologia, que pode ser encontrado no
seguinte link: http://www.portalsbc.com.br/manual-citopatologia-2016.pdf.

3.1.2 Área técnica


Para a parte técnica, além das soluções corantes e demais insumos, são
necessárias cubas de vidro com tampa ou plástico e “berços” (Figura 6) para
o processo de coloração, pia com água corrente e bancada para confecção das
lâminas. Algumas características acerca das bancadas são essenciais, como altura
adequada, para evitar riscos ergonômicos; superfície impermeável e lavável; e pias,
preferencialmente, de inox. Essas características permitem maior durabilidade e
higiene do local. Naturalmente, corantes e soluções não podem ser descartados
na rede de esgoto comum, devendo seguir o PGRSS e ser acondicionados em
frascos adequados e descartados por empresas especialistas do ramo (KOSS;
GOMPEL, 2006; ANVISA, 2002).

É indispensável o uso de um microscópio óptico (Figura 7) de alta


qualidade, uma vez que, na citopatologia, devemos utilizar os detalhes celulares
para o diagnóstico, pois, além da qualidade de imagem que bons microscópios
proporcionam, seu desenho ergonômico é confortável, sendo indispensável nas
grandes rotinas. Bons microscópios tendem a ter um valor agregado, pesando no
orçamento inicial. Alguns empreendedores costumam, de forma errônea, adquirir
equipamentos mais baratos e de menor qualidade, o que, posteriormente, gera
um gasto extra com a aquisição de novos microscópios (ASSIS et al., 2021).

FIGURA 6 – BERÇO E CUBAS PARA COLORAÇÃO

FONTE: <https://bityli.com/TOQlh>. Acesso em: 22 jun. 2021.

86
TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO À CITOLOGIA CLÍNICA

FIGURA 7 – MICROSCÓPIO ÓPTICO

FONTE: <https://bityli.com/PsIsF>. Acesso em: 22 jun. 2021.

Há também a possibilidade de trabalhar com microcentrífugas automa-


tizadas ou semiautomatizadas (Figura 8), usadas especificamente para o pro-
cessamento de amostras coletadas para a técnica de citologia em meio líqui-
do (GAMBONI, 2013). Nesse caso, requerem maior investimento operacional.
Além dos equipamentos principais, são utilizados soluções corantes, álcool e,
em alguns casos, xilol na rotina de coloração, sendo exigido que a área técnica
conte com boa ventilação e uma capela de exaustão, devido ao risco de conta-
minação por vapores tóxicos. Ainda nos requerimentos estruturais, o piso e as
paredes devem ser laváveis e lisos, pintados com cores claras (ANVISA, 2005).

FIGURA 8 – CITOCENTRÍFUGAS

FONTE: <https://bit.ly/3aiOPx2>. Acesso em: 2 set. 2021.

87
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

Quando pensamos nas exigências, podem ocorrer pequenos acidentes


envolvendo as soluções utilizadas na rotina; caso isso aconteça, as superfícies
precisam ser resistentes aos produtos e facilmente higienizáveis. Além do mais,
a sala de microscopia deve ser separada da área técnica, para que o profissional
citologista não fique exposto aos riscos adicionais associados às soluções químicas
do ambiente técnico.

Embora os requerimentos para uma estrutura de citopatologia tenham


sido citados de forma superficial, o objetivo é mostrar o contraste com o laboratório
voltado para análises clínicas, que requer automações para, praticamente, todos
os setores. Isso não quer dizer que a estrutura possa ser disfuncional ou pouco
cuidadosa; muito pelo contrário, para atuar em citopatologia, é necessário extremo
cuidado com a qualidade ambiental, organização laboratorial e, principalmente,
bom conhecimento estatístico, já que o controle de qualidade em citopatologia é
feito com base nos números de casos satisfatórios negativos e positivos.

E
IMPORTANT

Cada município pode legislar em alguns aspectos, por isso, ao abrir um


laboratório, é importante entrar em contato com a Vigilância Sanitária e solicitar suporte
quanto às necessidades estruturais.

4 ARQUIVAMENTO
Em citopatologia, é exigido, por lei, o arquivamento das lâminas e de
requisições por, no mínimo, cinco anos. Portanto, o laboratório deve contar com
uma sala específica para arquivamento dos materiais, devendo contar com fácil
acesso e organização, uma vez que, se solicitado, é preciso recuperar lâminas e
requisições. Tal organização pode ser feita por armários porta-lâminas, os quais
possuem gavetas com divisões específicas para o tamanho da lâmina, e armários
com pastas para arquivar as requisições (MINISTÉRIO DA SAÚDE; INCA, 2016).

Para tanto, as lâminas e as requisições devem estar organizadas conforme o


número interno do exame, preferencialmente em ordem crescente. As requisições
devem seguir a mesma lógica quando arquivadas. Apesar de não ser uma
exigência legal, esse tipo de organização é o mais prático e simples, apesar de a
legislação permitir a digitalização e o arquivamento digital, de forma a reduzir a
necessidade de espaço físico e a facilitar o acesso à requisição (MINISTÉRIO DA
SAÚDE; INCA, 2016).

88
TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO À CITOLOGIA CLÍNICA

Para um bom funcionamento técnico-administrativo de uma estrutura


laboratorial, devemos levar em consideração desde os mínimos detalhes até os
grandes investimentos. Qualquer falha nesse processo pode acarretar perda da
qualidade e confiabilidade do serviço prestado.

DICAS

Quando da abertura de um negócio próprio, deve-se buscar uma assessoria


especializada. Atualmente, há inúmeros órgãos de apoio ao empreendedor. Assim, ao
entrar no mercado, o profissional estará preocupado apenas em executar um serviço de
qualidade e não terá problemas burocráticos no futuro.

5 EPIDEMIOLOGIA DO CÂNCER
Diversos autores definem epidemiologia e suas atribuições. Independente-
mente da definição conceitual, trata-se de uma ciência presente em todas as toma-
das de decisões da área da saúde; assim, podemos avaliar que a epidemiologia é:

Ciência que estuda o processo saúde-doença em coletividades huma-


nas, analisando a distribuição e os fatores determinantes das enfermi-
dades, danos à saúde e eventos associados à saúde coletiva, propondo
medidas específicas de prevenção, controle ou erradicação de doen-
ças, e fornecendo indicadores que sirvam de suporte ao planejamen-
to, administração e avaliação das ações de saúde (ROUQUAYROL;
GOLDBAUM, 2003 apud BOING; D’ORSI; REIBNITZ, 2016, p. 11).

Quando esse conceito é aplicado ao estudo do câncer, os indicadores


buscam representar as causas de agravo dos prognósticos, do aumento da
incidência, do tratamento e da prevenção dos cânceres. Apesar de alguns terem
mais representatividade nas campanhas de saúde, todas as doenças neoplásicas
têm impacto. Essa diferença de atenção se deve a alguns tipos de cânceres
serem mais incidentes numa população, gerando problemas de saúde coletiva
e individual, necessitando, dessa forma, de uma atenção maior para que mais
pessoas sejam salvas das terríveis consequências de uma neoplasia.

Para entender o impacto dessas ações, veremos um pouco de epidemiolo-


gia do câncer e analisaremos o comportamento dessa doença, a fim de esclarecer
a funcionalidade dessa especialidade na saúde pública. Segundo um levanta-
mento do Inca, a estimativa de novos casos de câncer no Brasil, para o biênio
2020-2022, é cerca de 626 mil casos, dado que engloba todos os tipos de câncer
em ambos os sexos. Isso leva a uma criteriosa análise sobre a situação da saúde
populacional e seu impacto nas políticas públicas de saúde (INCA, 2020a).

89
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

Nesse levantamento, estima-se que a maior incidência de câncer nos


homens será o câncer de próstata (65.840 casos), seguido do de cólon e reto
(20.540 casos) e, em terceiro lugar, do trato respiratório inferior (17.760 casos –
traqueia, pulmão e brônquios). Nas mulheres, a maior incidência será o câncer de
mama (66.280 casos), de cólon e reto (20.470) e do colo do útero (16.710). Para os
pesquisadores, as grandes taxas previstas estão relacionadas com o estilo de vida
do brasileiro, isto é, seus hábitos alimentares, tabagismo, álcool, sedentarismo
etc., porém a melhora na sensibilidade diagnóstica e o maior acesso ao sistema de
saúde também influenciarão nos valores expostos (INCA, 2020a).

Outro dado estatístico de suma importância é a mortalidade por câncer.


No censo do Inca (2019), a taxa de mortalidade foi de 232.030 casos, prevalecendo
os cânceres de trato respiratório inferior (16.733) nos homens e o câncer de mama
(18.068) nas mulheres. Ao observar os dados, devemos entender a necessidade
de atenção à doença e a sua prevenção.

No Brasil, a mortalidade por câncer de colo uterino é de 6.696 casos –


esse tipo de neoplasia maligna possui uma sólida política de prevenção, por isso
a mortalidade relativamente baixa, porém, sem a detecção precoce das lesões,
caso fossem negligenciadas, os casos evoluiriam para câncer. Desse modo,
investimentos em prevenção do câncer não impactam somente na qualidade
de vida das pessoas, mas impedem que elas passem por sofrimento físico e
psicológico em decorrência das doenças, além de diminuírem o custo de saúde
no país, já que a maioria dos casos é custeada pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Portanto, a prevenção é sempre a melhor opção (INCA, 2020a).

5.1 FATORES PARA O DESENVOLVIMENTO DAS NEOPLASIAS


No portal do Inca (2018), alguns fatores de risco são elencados como mais
importantes para o desenvolvimento de neoplasias. Fatores de risco são quaisquer
situações que colaborem para o aumento da ocorrência de uma doença ou o
agravo dela, os quais podem ser divididos em fatores ambientais ou intrínsecos.
A seguir, veremos alguns desses fatores e suas implicações, bem como possíveis
formas de evitá-los, a fim de obter uma melhor qualidade de saúde humana.

FIGURA 9 – FATORES DE RISCO

FONTE: Os autores

90
TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO À CITOLOGIA CLÍNICA

5.1.1 Hereditariedade
Fatores hereditários são, conceitualmente, aqueles distribuídos pelas
gerações e que aumentam a presença da doença dentro da família do indivíduo.
Entretanto, são raros os cânceres que têm esse tipo de fator como preponderante.
Um exemplo de câncer com forte fator hereditário é o retinoblastoma, um
câncer infantil que acomete o olho da criança e que tem uma incidência familiar
de aproximadamente 40% dos casos. Outros tipos de câncer que têm influência
genética são os de glândula mamária, cólon e estômago, porém não é possível
afastar a possibilidade de os membros das famílias terem sido expostos a fatores
externos comuns (KUMAR et al., 2012).

Kumar et al. (2012) afirmam que menos de 10% dos pacientes com câncer
herdaram genes com a predisposição para a doença. Para alguns tipos de tumores
malignos, a taxa é ainda menor: apenas 0,1%. Quando se fala em neoplasias
herdadas, podemos dividi-las em três categorias:

• Síndromes neoplásicas hereditárias com padrão autossômico dominante:


grupo de neoplasias em que apenas um gene dominante é responsável pelo
desenvolvimento da doença. Geralmente, essa mutação ocorre em apenas um
alelo de um gene supressor de tumor.
• Síndromes do defeito no reparo do DNA: grupo de condições que predispõe
o indivíduo a defeito na reparação do DNA, que resulta em instabilidade
do DNA. De forma geral, essa síndrome ocorre em um padrão de herança
autossômica recessiva.
• Cânceres familiares: além das condições citadas anteriormente, existe um
grupo de neoplasias que ocorre com maior frequência em indivíduos da mesma
família. Os aspectos que caracterizam os cânceres familiares incluem tumores
múltiplos, idade precoce de aparecimento e repetição do tipo tumoral em mais
de um indivíduo da família.

Apesar de a maioria dos casos de neoplasias malignas ser de origem


ambiental, a falta de história familiar não exclui a presença de um fator hereditário.
Logo, é difícil descartar uma base hereditária no surgimento de um câncer, já que
os fatores ambientais e genéticos têm uma estreita relação (KUMAR et al., 2012).

5.1.2 Infecções
Algumas infecções, tanto virais quanto bacterianas, podem causar
câncer. Assim, micro-organismos são capazes de desencadear neoplasias. O mais
comum é o HPV, causador do câncer de colo do útero e de outros sítios, como
reto e esôfago. Contudo, não é o único. Infecções pela bactéria Helicobacter pylori
podem cronificar no nível estomacal e contribuir para o desenvolvimento do
câncer de estômago. Os vírus da hepatite B e C estão associados a carcinomas

91
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

hepáticos, sendo que a infecção por esses tipos virais se dá por via sexual, sangue,
compartilhamento de agulhas, alicates de unhas ou qualquer instrumento que
possa ter entrado em contato com material biológico contaminado (MINISTÉRIO
DA SAÚDE, 2018, KUMAR et al., 2012).

Os vírus são capazes de se integrar ao genoma do hospedeiro. Dessa


forma, utilizam a maquinaria celular para produzir suas proteínas e se replicar.
Entretanto, essa interação pode gerar um desequilíbrio nas funções bioquímicas
da célula e transformá-la em uma célula cancerígena. Várias proteínas virais
estão envolvidas nesse processo e, normalmente, essa situação ocorre quando há
infecção persistente e não tratada (KUMAR et al., 2012).

A bactéria H. pylori não age diretamente no DNA, mas causa uma infecção
crônica na mucosa estomacal, resultando em um processo inflamatório persistente
que aumenta o risco do aparecimento de um câncer:

Em alguns casos, a inflamação crônica pode aumentar o grupo de


células-tronco teciduais que se tornam susceptíveis ao efeito de agentes
mutagênicos. Estes mediadores também causam estresse genômico e
mutações; além disso, as células imunes produzem espécies reativas de
oxigênio que são diretamente genotóxicas (KUMAR et al., 2012, p. 497).

A curto prazo, as células do corpo se adaptam e sobrevivem aos processos


inflamatórios, porém, em caso de cronificação do processo, haverá permanência
dessa agressão e mutações, podendo levar ao aparecimento do câncer (KUMAR
et al., 2012).

5.1.3 Exposição solar e a radiações


A exposição solar é o principal fator de risco para o desenvolvimento dos
cânceres de pele. Segundo o Inca, o tumor do tipo melanoma é mais frequente em
ambos os sexos. A exposição aos raios ultravioleta de forma intensa faz com que
o DNA da célula seja lesionado, o que pode ser suficiente para causar a neoplasia
maligna. O bronzeamento artificial é uma importante fonte de raios ultravioleta
e, consequentemente, um grande fator de risco para o desenvolvimento dos
cânceres de pele (BRASIL, 2018).

Por isso, há a indicação de reduzir, ao máximo, a exposição solar das 10h


às 16h, quando existe uma maior incidência de raios ultravioleta sobre a atmosfera
terrestre. O grau de agressão dos raios ultravioleta está ligado à quantidade de
melanina produzida pela pele, ou seja, quanto maior a quantidade de melanina,
maior é o fator protetivo. A lesão causada por raios ultravioleta é do tipo
indução de formação de dímeros de pirimidina no DNA; em situações normais,
essa modificação é reparada, porém, com a repetição, a agressão à capacidade
reparativa é perdida, abrindo espaço para o desenvolvimento dos cânceres de
pele (BRASIL, 2018).

92
TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO À CITOLOGIA CLÍNICA

Ainda, a exposição às radiações ionizantes (presentes nos equipamentos


de raio-X) também é capaz de causar danos ao DNA celular e favorecer o desen-
volvimento dos cânceres. Nesse caso, não está restrito a um órgão específico. Ape-
sar dos riscos, é preciso uma exposição às radiações de forma intensa e descontro-
lada, para que ocorram tais lesões no DNA (BRASIL, 2018; KUMAR et al., 2012).

5.1.4 Tabagismo
O tabagismo é reconhecido como doença crônica, fazendo parte do grupo
de transtornos mentais e comportamentais, causados por substâncias psicoativas
(CID-10). A OMS (WHO, 2021) aponta que o tabaco mata mais de 8 milhões de
pessoas por ano, estimando que 7 milhões delas são causadas diretamente pelo
consumo do tabaco e o restante, a não fumantes expostos ao fumo passivo. O
tabagismo está relacionado a diversos tipos de câncer:

leucemia mieloide aguda; câncer de bexiga; câncer de pâncreas; cân-


cer de fígado; câncer do colo do útero; câncer de esôfago; câncer de
rim e ureter; câncer de laringe (cordas vocais); câncer na cavidade
oral (boca); câncer de faringe (pescoço); câncer de estômago; câncer
de cólon e reto; câncer de traqueia, brônquios e pulmão (CDC, 2017).

Uma análise estatística de dados, feita por Kfouri et al. (2018), demonstrou
que o câncer de laringe foi o mais presente em todas as cidades brasileiras estuda-
das, com uma prevalência dos cânceres de cabeça e pescoço associados ao tabagis-
mo de 20,9% na região Centro-Oeste, de 19,5% no Sudeste e de 18,3% no Sul. Além
disso, foi destacado que o uso do tabaco tem diminuído no Brasil, mas ainda é um
fator de alto impacto no desenvolvimento das neoplasias malignas, assim como
a presença de alcoolismo como agravante. Grande parte desses casos poderia ter
sido evitada apenas removendo o tabaco e o álcool do estilo de vida dos pacientes.

As campanhas com o objetivo de reduzir o consumo do tabaco têm como


base dados como esses, que claramente demonstram o impacto na perda de vidas
devido ao seu uso, tanto dos fumantes quanto de pessoas que são passivamente
atingidas pela inalação de substâncias nocivas resultantes da queima dos cigarros
e similares. Isso se deve porque os cânceres causados por ordem genética refletem
cerca de 5% a 10% dos casos, o restante (90% a 95%) tem como causa fatores
ambientais (KFOURI et al., 2018), o que mostra, de forma clara, que a eliminação
desse fator de risco da sociedade trará grandes benefícios à saúde coletiva.

6 FATORES PREVENTIVOS
Como vimos, há diversos fatores envolvidos no risco de desenvolvimento
dos cânceres, mas grande parte deles poderia ser evitada com atitudes simples e
incorporadas no dia a dia. Esses fatores protetivos já são bem conhecidos entre
a população, porém muitas pessoas ainda resistem em mudar seu estilo de vida,
fator que provavelmente contribui para o aumento das taxas de câncer no mundo
(BRASIL, 2018).
93
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

6.1 ALIMENTAÇÃO
A ingesta de alimentos ricos em vitaminas, minerais e de origem
orgânica tem capacidade protetiva, devido a menor quantidade de conservantes,
colorantes, estabilizantes e realçadores de sabor – substâncias que em excesso
podem desencadear, com maior frequência, doenças como alergias alimentares,
mas também são consideradas fatores agravantes para o desenvolvimento do
câncer. Algumas classes de pesticidas e agrotóxicos têm em sua composição
agentes químicos, capazes de danificar as células de forma irreversível, firmando
relação direta com o desenvolvimento de alguns tipos tumorais (SALES, 2017;
BRASIL, 2018).

Os alimentos orgânicos reforçam ainda mais sua posição como fatores


protetivos, uma vez que, para sua produção, há a redução ou a retirada completa de
agentes químicos, como pesticidas e agrotóxicos. A alimentação adequada permite
que haja suprimento correto das vitaminas, essenciais para o funcionamento do
sistema imunológico, o qual está diretamente ligado à supressão tumoral, por
meio de células especializadas, como linfócitos NK (SALES, 2017).

6.2 EXERCÍCIOS FÍSICOS


Cada vez mais, os exercícios físicos são relacionados com inúmeros
benefícios para a saúde. A execução de exercícios físicos melhora o ritmo
metabólico, colabora para a regulação hormonal, mantém o peso dentro do
ideal e auxilia na qualidade das defesas do corpo. Não é preciso exercício de alta
intensidade para obter os benefícios dessa prática e, quando associado a uma
alimentação de qualidade, isso melhora ainda mais a qualidade da saúde do
indivíduo (BRASIL, 2018).

6.3 PREVENÇÃO DE CÂNCERES DE ETIOLOGIA


MICROBIANA
Após entendermos que alguns micro-organismos têm a capacidade de
causar câncer, como o HPV, que está ligado ao câncer de colo de útero, e os vírus
da hepatite B e C, associados ao câncer no fígado. Para prevenir esses micro-
organismos, é preciso usar preservativos nas relações sexuais, não compartilhar
seringas e sempre esterilizar material cirúrgico não descartável (BRASIL, 2018).

Quando falamos em HPV, a melhor forma de prevenção é a vacinação,


que, desde 2014, é gratuita para meninos e meninas de 9 a 14 anos de idade. A
vacina disponível confere proteção contra os subtipos virais 6, 11, 16 e 18, que
são os de maior potencial oncogênico. Além da vacina, a educação sexual e o
uso de preservativos devem sempre ser lembrados como ferramentas contra a
disseminação do HPV (BRASIL, 2018).

94
TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO À CITOLOGIA CLÍNICA

DICAS

O Inca tem uma página dedicada a explicar o câncer e seus fatores de risco,
sua epidemiologia e suas formas de prevenção. Veja mais um pouco sobre esse fascinante
assunto acessando: https://www.inca.gov.br/causas-e-prevencao/como-prevenir-o-cancer.

Assim, observamos uma série de fatores de risco para o desenvolvimento


das neoplasias. Entretanto, é preciso saber que nenhum deles, isoladamente,
tem força suficiente para desencadear o processo de doença, sempre havendo
a associação de dois ou mais fatores de risco. Por exemplo, o tabagismo tem
influência no surgimento do câncer de mama, mas esse tipo de câncer tem forte
ligação genética – então, se uma pessoa tem predisposição geneticamente à
doença e for fumante, o risco de desenvolvimento aumenta.

Por isso, o câncer é uma doença de etiologia multifatorial, condição que


também explica por que pequenos cuidados com a saúde têm o poder de dimi-
nuir as chances de desenvolvimento das neoplasias, uma vez que, se é necessário
mais de um fator para o aparecimento do câncer e entre esses fatores existem
alguns que podem ser modificados, a mudança de hábitos pode ajudar a prevenir
a doença.

Toda essa base que vimos sobre a epidemiologia do câncer permite um


melhor entendimento da magnitude da citologia clínica. O profissional deve
sempre saber por qual motivo executa a técnica e em que ela se apoia; dessa
forma, será possível produzir resultados de qualidade e confiáveis.

95
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• A citologia é aplicada em diversos órgãos/locais de coleta, para a realização de


exames.

• É necessário ter uma estrutura laboratorial dentro dos parâmetros legais para
atuar nessa área.

• A citologia clínica tem implicação direta na redução das taxas de mortalidade/


morbidade das mais diversas doenças.

• É um método diagnóstico relativamente simples, de fácil aplicação na rotina


médica, mas que exige um amplo conhecimento técnico-científico para execução
dos procedimentos relativos a ele.

• A epidemiologia do câncer quantifica e qualifica os casos no Brasil e no mundo,


permitindo que ações de prevenção sejam criadas para auxiliar na melhora da
condição de saúde da população.

• Apesar de termos vários fatores de risco envolvidos no surgimento de uma ne-


oplasia maligna, também é possível prevenir o aparecimento apenas tomando
pequenas atitudes.

96
AUTOATIVIDADE

1 A citopatologia é de ampla aplicação diagnóstica e apresenta características


que a tornam um excelente instrumento diagnóstico e de rastreamento.
Considerando uma competência da citopatologia, assinale a alternativa
CORRETA:

a) ( ) Aplicável a todos os tipos de tumorações, sólidas ou císticas, obtidos


por raspados ou punções, inclusive tumorações de origem óssea.
b) ( ) Técnica de escolha para o rastreamento do câncer de fígado.
c) ( ) Para lesões suspeitas no parênquima pulmonar, a coleta é feita
através de um lavado broncoalveolar, no qual se aplica uma solução
hipotônica pela traqueia, que, em seguida, é reaspirada.
d) ( ) É uma técnica de baixo custo e com muitos benefícios, devido à redu-
ção de cirurgias desnecessárias para investigação de nódulos suspei-
tos em mama.

2 Para criar uma estrutura laboratorial funcional, devem-se seguir algumas


normas, a fim de obter um espaço seguro para o desenvolvimento das
atividades diagnósticas. Com base nas principais normas relativas à
estrutura laboratorial, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Resoluções RDC nº 50/2002 e RDC nº 302/2005.


b) ( ) NR 302 e Resolução RDC nº 50/2002.
c) ( ) ISO 3000 e Resolução RDC nº 50/2002.
d) ( ) Resolução RDC nº 302/2005 e ISO 9001.

3 Pequenos detalhes podem causar grandes problemas, uma vez que a


falta de um insumo simples pode atrasar a liberação de exames, gerando
desconforto e perda de confiabilidade no laboratório. Assim, o gestor deve
estar sempre atento a tudo que compõe o ambiente laboratorial, a fim de
suprir as necessidades diárias. Analise as sentenças a seguir:

I- É fundamental ter um estoque adequado de papel, tinta de impressora,


carimbos e demais materiais de escritório, materiais essenciais para o
funcionamento do laboratório.
II- A confiança e a qualidade não estão ligadas à capacidade administrativa
do laboratório, apenas a competência técnica é capaz de definir um
trabalho eficiente.
III- Acidentes com soluções podem ocorrer na rotina, por isso as superfícies
devem ser laváveis e não absorvíveis. Essas características permitem uma
rápida resposta e uma limpeza eficiente nesses casos.

97
IV- Cada setor funciona de forma integrada, com o objetivo de manter o fluxo
correto do laboratório. Dessa forma, é impossível que pequenas falhas,
como falta de papel, atrapalhem na liberação dos laudos.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.


b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

4 Apesar da simplicidade dos equipamentos de um laboratório de


citopatologia, há muitas exigências a respeito da estrutura física e
administrativa. Cite quais órgãos regulam e fiscalizam os laboratórios, a
fim de verificar se as exigências estão sendo cumpridas.

5 O câncer é uma doença de importância social, que aflige milhares de pes-


soas no mundo, sendo uma das principais causas de morbidade/morta-
lidade no Brasil. Diversos fatores contribuem para o desenvolvimento
das neoplasias malignas, porém, com algumas atitudes diárias, é possível
reduzir a chance do desenvolvimento do câncer. Descreva quais são os
fatores preventivos para o câncer.

98
TÓPICO 2 —
UNIDADE 2

COLETA E PROCESSAMENTO DE AMOSTRAS


CITOLÓGICAS

1 INTRODUÇÃO

Anteriormente, vimos algumas explicações acerca da citopatologia e da


importância dessa modalidade diagnóstica para a história da saúde pública,
bem como o seu impacto na tomada de decisão médica. Neste tópico, veremos
como coletar (esfoliação ou punção), processar as amostras (fixação, coloração e
montagem) e os cuidados relativos a sua preservação. Também serão abordados
os tipos de processamentos (convencional e meio líquido), suas vantagens, suas
desvantagens e suas principais diferenças.

A descrição desses procedimentos permite a compreensão das técnicas


empregadas em cada um e mostra por que é tão importante a criação dos
protocolos padrões. O profissional responsável técnico deve saber minuciosamente
como executar o preparo das amostras, por mais que não os execute, pois será
responsável pelo treinamento do pessoal e por manter o controle de qualidade
ativo e aplicado.

UNI

Ao final desta unidade, o acadêmico será capaz de reconhecer todos esses


processos e associá-los à prática laboratorial.

2 CITOLOGIA ESFOLIATIVA
O processo de obtenção das amostras citológicas tem papel fundamental
na qualidade do laudo emitido. Coletar de forma compatível com o objetivo da
análise possibilita a correta preservação do espécime, evitando possíveis artefatos
e contaminantes que possam atuar como interferentes e, em casos extremos, a
perda da amostra (GAMBONI, 2013; KOSS; GOMPEL, 2006).

99
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

Obter amostras citológicas por esfoliação significa fazer abrasão com


ferramentas como espátulas ou escovas na região de interesse da pesquisa. A
situação mais comum na citologia esfoliativa é o exame de Papanicolaou, no qual,
por meio da abrasão da espátula de Ayre e da escova endocervical (Figura 10), são
coletadas células da mucosa do colo uterino. Entretanto, a aplicação da citologia
esfoliativa não se resume apenas ao Papanicolaou, pois trata-se de uma técnica
que pode ser aplicada em exames de pele, mucosa oral e retal (MINISTÉRIO DA
SAÚDE, 2012). O amplo uso desse meio de coleta se deve, como já citado, a sua
simplicidade e eficácia.

FIGURA 10 – ESPÁTULA DE AYRE E ESCOVA ENDOCERVICAL

FONTE: <https://bit.ly/3loXVi2>. Acesso em: 24 jun. 2021.

3 CITOLOGIA ASPIRATIVA
Outro método empregado para a obtenção de células para exame é a
aspiração das amostras utilizando agulha fina, denominada de punção aspirativa
por agulha fina (PAAF), cujo objetivo é obter amostras celulares oriundas de
massas tumorais, sólidas ou císticas, dos mais variados sítios anatômicos. Por
exemplo, em uma situação de nódulo na tireoide, o médico pode optar por
realizar um exame citológico, cujo material será obtido por meio de PAAF. Para
aspirar, são usadas seringas comuns acopladas a agulhas finas (GAMBONI, 2013;
MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012). Esse é um método minimamente invasivo, que
pode ser feito em ambulatório ou, até mesmo, no consultório médico, o que o
torna prático e rápido para investigação de nódulos suspeitos.

3.1 PAAF GUIADA POR PALPAÇÃO


Trata-se de uma modalidade de punção em que o médico utiliza
os dedos para localizar o nódulo, introduz a agulha na estrutura e aspira o
material. Contudo, essa técnica não é mais tão utilizada, visto que a coleta era
feita praticamente no “escuro”, sem a devida compreensão da profundidade
da aplicação ou se realmente estava aspirando a estrutura de interesse. É fácil
perceber que, em muitos casos, havia a necessidade de recoleta (MINISTÉRIO
DA SAÚDE, 2012; GAMBONI, 2013).

100
TÓPICO 2 — COLETA E PROCESSAMENTO DE AMOSTRAS CITOLÓGICAS

FIGURA 11 – PAAF GUIADA POR PALPAÇÃO

FONTE: <https://bityli.com/wBQVP>. Acesso em: 24 jun. 2021.

3.2 PAAF GUIADA POR ULTRASSOM


Gamboni (2013) descreve que o procedimento é o mesmo que na PAAF
guiada por palpação, porém, nesse caso, o médico utiliza um aparelho de ultrassom
(Figura 12), o que torna possível acompanhar o trajeto da agulha até o nódulo com
precisão e coletar o material com maior eficiência e representatividade. Dessa
maneira, minimiza-se a necessidade de recoleta de material, devido à falta de
celularidade de interesse diagnóstico.

FIGURA 12 – PAAF GUIADA POR ULTRASSOM

FONTE: <https://bityli.com/wBQVP>. Acesso em: 24 jun. 2021.

101
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

3.3 CITOLOGIA EM MEIO LÍQUIDO


Alguns autores tratam essa base de citologia como a evolução do exame
de Papanicolaou, pois, de fato, transformou a forma de coletar e processar as
amostras citológicas. No entanto, o uso do meio líquido não se limita a exames
preventivos do colo uterino, podendo ser aplicado para qualquer tipo de
material citológico.

A citologia em meio líquido (CML) ou base líquida surgiu a partir da


necessidade de apresentar uma melhor disposição celular, conservação do material
e redução de exsudatos inflamatórios, hemácias e muco, resultando, assim, em
uma maior acurácia na detecção das lesões neoplásicas ou pré-neoplásicas. Essa
técnica permite também a confecção de lâminas extras e, caso necessário, podem
ser realizados testes moleculares, como pesquisa de HPV na amostra, devido ao
método de conservação do material (SILVA et al., 2018).

Assim, consiste em coletar o material com uma ferramenta especial,


conhecida como citobrush (Figura 13), que, em razão de seu formato anatômico,
esfolia, simultaneamente, a ectocérvice e a endocérvice. Após a coleta, a citobrush
é depositada diretamente em um frasco com solução conservante e, em caso de
materiais não ginecológicos, estes podem ser depositados diretamente no meio
conservante. O procedimento também evita artefatos de fixação. Mais adiante,
abordaremos o processamento das amostras obtidas por esse meio (GAMBONI,
2013; MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012).

FIGURA 13 – ESCOVA PARA CML

FONTE: <https://zmway.com/pt/citologia/>. Acesso em: 24 jun. 2021.

102
TÓPICO 2 — COLETA E PROCESSAMENTO DE AMOSTRAS CITOLÓGICAS

4 COLETA E PROCESSAMENTO
Após apresentarmos uma base sólida sobre as formas e os tipos de
coleta, aprofundaremos as técnicas de coleta, descrevendo detalhes desses
procedimentos e a importância do cuidado em cada etapa. Em seguida, trataremos
do processamento das amostras no laboratório até que a lâmina chegue ao setor
de microscopia. Quando se fala em coleta de material biológico, é imprescindível
destacar que se faz referência ao início de um laudo fidedigno, uma vez que se,
durante a obtenção da amostra, o material não for representativo, na etapa da
microscopia, não haverá o que ser relatado, gerando prejuízo à saúde do paciente.
Enquanto profissionais responsáveis, é importante atentar a esse procedimento e
garantir que ele seja executado de forma impecável.

Para facilitar a organização, veremos as etapas relacionadas com o tipo de


coleta (aspirativa, esfoliativa) e com o processamento das amostras obtidas.

4.1 COLETA DE EXAMES POR ESFOLIAÇÃO


A preparação do paciente é o primeiro passo para uma coleta bem-
sucedida em qualquer área diagnóstica. Na recepção, o paciente deve ser
registrado no sistema, no qual deve constar todas as informações possíveis
(nome, idade, endereço, comorbidades, uso de medicamentos etc.); em seguida,
ele é direcionado à sala de espera (caso haja) ou diretamente para a coleta. O
paciente deve estar ciente sobre como ocorrerá o procedimento e suas possíveis
intercorrência, mesmo que incomuns. No caso das coletas por esfoliação, podem
ocorrer discretos sangramentos e dor, devido à abrasão do instrumento de coleta.

Como vimos anteriormente, para que a citologia cumpra seu papel, é


necessário coletar uma amostra representativa. Um dos meios de obter o material
é por esfoliação – em outras palavras, é preciso raspar o local de interesse. A
abrasão da ferramenta com a pele/mucosa remove a camada superficial da derme
e, dessa forma, tem-se uma coleta do epitélio a ser estudado.

Com o paciente devidamente instruído e acondicionado, o profissional


pode preparar a bancada de trabalho, tendo disponíveis, de forma geral, os
seguintes itens:

• instrumento para a raspagem (espátula de Ayre, escova endocervical,


citobrush, bisturi e swabs);
• lâmina de vidro com borda fosca;
• algodão ou gaze;
• fixador citológico;
• luvas vinílicas ou de látex.

103
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

No caso de mucosa oral (Figura 14) ou regiões dérmicas, a coleta deve


iniciar com a identificação do local a ser raspado, para depois ser realizada a
raspagem. Nesses casos, não há técnica específica para fazer a abrasão, porém,
deve-se garantir pressão suficiente para descolar as células. Finalizada a coleta,
o material pode ser depositado diretamente na lâmina de vidro, previamente
identificada na borda fosca e fixada em álcool a 95% ou spray fixador (MINISTÉRIO
DA SAÚDE, 2012).

FIGURA 14 – COLETA DE MUCOSA ORAL

FONTE: <https://bityli.com/zBHBd>. Acesso em: 25 jun. 2021.

Já a coleta de epitélio do colo uterino (exame de Papanicolaou) tem um


protocolo bem estabelecido, que deve ser seguido para que haja representação
dos epitélios de interesse. A técnica é descrita no livro Técnico em citopatologia:
caderno de referência 2: citopatologia não ginecológica do Ministério da Saúde
(2012b) e, além dos itens relacionados anteriormente, consiste em acondicionar
a paciente em maca própria para esse fim e utilizar espéculo sem lubrificante.

Deve-se introduzir o espéculo no canal vaginal, com o objetivo de ter


melhor acesso ao colo uterino, e, com a gaze, remove-se o excesso de muco ou
secreções presentes. Com a espátula de Ayre, coleta-se a amostra da ectocérvice,
fazendo apenas um giro completo (360 graus), imediatamente removendo
a espátula e depositando o material coletado em uma lâmina de vidro. Na
sequência, é necessário inserir a escova endocervical no orifício cervical externo,
realizando um giro completo (360 graus) e breves movimentos de “vai e vem”.
Imediatamente após a coleta, deve-se depositar o material em lâmina de vidro,
aplicar o spray fixador ou depositar a lâmina em álcool a 95%. Em caso de coletas
para citologia em meio líquido, não é necessária a extensão no material em lâmina,
apenas se dispõe a citobrush diretamente no meio líquido.

104
TÓPICO 2 — COLETA E PROCESSAMENTO DE AMOSTRAS CITOLÓGICAS

FIGURA 15 – COLETA DE MATERIAL PARA EXAME DE PAPANICOLAOU

FONTE: <https://bit.ly/3BqpflG>. Acesso em: 25 jun. 2021.

4.2 LAVADOS
Consiste em instilar solução salina no local lesionado e realizar a aspiração
do material. Devem ser acondicionados em recipiente limpos e enviados
diretamente ao laboratório com a descrição do local coletado. Essa modalidade
de coleta é largamente utilizada para diagnósticos broncoalveolares, esofágicos,
peritoneais e gástricos (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012).

4.3 MATERIAIS OBTIDOS ESPONTÂNEAMENTE


Como o próprio nome sugere, trata-se de materiais que espontaneamente
são expelidos do organismo e podem servir como oportunidade diagnóstica.
Anteriormente, eram os espécimes mais utilizados para o diagnóstico citológico e
incluíam materiais de urina, escarro e secreção mamária.

Da mesma forma que os demais espécimes citológicos, devem ser disten-


didos em lâmina de vidro e imersos em álcool a 95% ou utilizando spray fixador
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012b).

4.4 PUNÇÃO ASPIRATIVA POR AGULHA FINA (PAAF)


Método de obtenção de amostras por meio da aspiração. Foi apresentado
por Martin e Ellis, em 1926, nos Estados Unidos. É aplicável na coleta de amostra
de tumores e nódulos em qualquer sítio anatômico, desde a superfície (mama,
tireoide e glândulas salivares) até as regiões mais profundas, como fígado,
retroperitônio e pulmão. Nas regiões mais superficiais, pode ser guiado pela
palpação ou ultrassom; quando em topografias mais internas, deve ser guiado
por ultrassom (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012b).

105
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

As agulhas utilizadas são de pequeno calibre (0,5 a 0,7 mm), sendo as


de menor calibre comumente utilizadas para nódulos palpáveis e superficiais;
quando há presença de material purulento ou espesso, é indicado o uso das
agulhas de maior calibre. Para a aspiração, utiliza-se seringa plástica descartável
de 10 mL ou 20 mL e é recomendado o uso do citoaspirador (Figura 16). Para
realizar a PAAF, deve-se acondicionar o paciente, marcar o local da punção e
inserir a agulha (GAMBONI, 2013).

Materiais oriundos de cistos devem ser centrifugados antes e, nesses


casos, utiliza-se o sobrenadante para confecção do esfregaço. As amostras são
encaminhadas em recipientes limpos e lacrados ou na própria seringa, sem
agulha e vedada. Caso não seja possível encaminhar imediatamente o material
coletado para a análise, é necessário mantê-lo resfriado. Nos materiais obtidos de
nódulos sólidos, deve-se puxar o êmbolo para trás, a fim de entrar ar na seringa,
reacoplar a agulha e depositar uma gota do material na lâmina de vidro, para
preparar o esfregaço. Para espalhar o material na seringa, pode-se apoiar uma
outra lâmina num ângulo de 45 graus e estender o material de forma rápida e
uniforme (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012).

FIGURA 16 – CITOASPIRADOR

FONTE: <https://bit.ly/3ahNpTo>. Acesso em: 25 jun. 2021

5 PROCESSAMENTO DO MATERIAL CITOLÓGICO


Apesar de termos visto como é realizado o processo de obtenção das
amostras citológicas, esse é apenas o primeiro passo. Após a recepção das amostras
no laboratório, estas passarão por processos que proporcionarão condições de
analisar as células contidas no espécime. A Figura 17 apresenta um fluxograma
com os processos envolvidos no fluxo das amostras.

106
TÓPICO 2 — COLETA E PROCESSAMENTO DE AMOSTRAS CITOLÓGICAS

FIGURA 17 – FLUXO DAS AMOSTRAS

FONTE: Os autores

Assim, podemos observar que, na recepção, existem duas etapas


importantes: a primeira é conferência dos dados e dos espécimes, isto é, verificar
se as requisições têm suas respectivas amostras e vice-versa. Amostras sem
requisição ou com dados divergentes não devem ser processadas. Essa situação
deve ser reportada ao local de origem, para que a coleta seja refeita. Um erro de
concordância entre requisição/material pode custar um falso diagnóstico, que,
muitas vezes, causa danos irreversíveis ao paciente (MINISTÉRIO DA SAÚDE;
INCA, 2016).

Caso esteja tudo em conformidade, o segundo passo é gerar o cadastro e


um número interno, que irá identificar a amostra durante todo o fluxo dentro do
laboratório. Esse número deve ser individual e não repetitivo dentro do ano – por
exemplo, a numeração pode começar com o ano seguido do respectivo número
“21.0001”, mantendo uma sequência crescente. No ano seguinte, o cadastro pode
voltar ao “0001”, mas com um o novo prefixo: “22.0001”. Não é obrigatório o uso
dessa composição numérica, mas ela é logicamente a mais simples (MINISTÉRIO
DA SAÚDE; INCA, 2016).

Após serem identificadas, as amostras seguem para a área técnica, para


o processamento necessário para análise, que inicia com o preparo da amostra
para coloração. Esse preparo consiste em remover o excesso de fixador quando
utilizado o spray; para isso, a amostra é deixada em álcool absoluto (99,9%) ou
95% por, no mínimo, 60 minutos e, depois, segue para a bateria de coloração
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012; KOSS; GOMPEL, 2006).

Koss e Gompel (2006) relatam que o protocolo de coloração pode variar


entre laboratórios, devido à marca de corantes utilizada ou a pequenas alterações
no procedimento. Entretanto, as soluções e os tipos de corantes são basicamente
os mesmos. A maioria das amostras citológicas são coradas pelo método
de Papanicolaou, técnica que consiste em banhos em álcool, água corrente,
hematoxilina de Harris, orange G e EA-36. Os banhos de álcool servem para
desidratar o material e a água, para remover excessos. Hematoxilina de Harris
cora os núcleos em roxo, enquanto orange G e EA-36 coram o citoplasma de
vermelho e verde-azulado, respectivamente (Figura 17).

107
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

FIGURA 17 – COLORAÇÃO PAPANICOLAOU

FONTE: Os autores

Depois de coradas, finalizamos a técnica com a montagem da lâmina.


Nesse momento, aplica-se uma lamínula sobre o material, usando bálsamo
ou Entellan® e, por fim, os espécimes seguem para a microscopia, para serem
analisados (GAMBONI, 2013).

DICAS

É importante ressaltar que algumas etapas do procedimento do protocolo de


coloração podem ser ligeiramente diferentes, como tempos em corantes, e que cabe a
cada laboratório e citologista adequar conforme a sua necessidade.
Para visualizar um exemplo de procedimento de coloração de Papanicolaou, assista ao
vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=5ajnTu4hdds.

108
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• Existem diversas formas de obter amostras citológicas, como esfoliação,


PAAF e lavados.

• A correta execução da coleta influencia diretamente na qualidade da análise


microscópica do material.

• Previamente à análise, existem processos importantes de preparação do


material para que o protocolo de coloração seja corretamente aplicado e cumpra
seu objetivo.

• Há diversas soluções e corantes envolvidos na coloração, porém cada um


possui uma finalidade específica e fundamental.

109
AUTOATIVIDADE

1 Leia o texto a seguir:

“Nas PAAFs, são utilizadas agulhas de alto calibre, uma vez que é preciso
uma grande quantidade de material para que haja representação da lesão
investigada”.

Analise a assertiva e justifique sua resposta.

2 Na coleta do material citológico para o exame de Papanicolaou, são utilizadas


ferramentas específicas, para potencializar a amostragem, seguindo passos
específicos que garantem a eficácia do procedimento. Assinale a alternativa
CORRETA:

a) ( ) Para obtenção das amostras, utilizam-se espátula de Ayrte e escova


endocervical.
b) ( ) Quando a espátula estiver posicionada, é preconizado girar 180 graus
para coletar a amostra.
c) ( ) Após transferir o material para a lâmina, já é possível enviá-lo ao
laboratório.
d) ( ) O material é obtido por secreção espontânea.

3 Devido à amplitude da citologia clínica para rastreamento ou diagnóstico


de doenças, clinicamente aparentes ou não, os mais diversos tipos de
materiais podem ser utilizados. Isso se deve à facilidade de obtenção das
amostras, que apresenta baixo risco para o paciente e baixíssima incidência
de reações adversas, que, caso ocorram, são de baixo grau, representadas
apenas por dor local e/ou equimoses. Considerando os métodos de coleta,
analise as assertivas a seguir:

I- PAAF, esfoliação, lavados em geral e secreção espontânea são exemplos


de formas de obter amostras para análise.
II- Não se aplica a técnica de coleta por esfoliação em casos de nódulos
císticos ou sólidos.
III- A maioria dos materiais obtidos para análise citológica, em um passado
recente, era representada por secreções espontâneas.
IV- A técnica de escolha para lesões superficiais e rastreamento do câncer de
colo uterino é a esfoliação.

110
Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As assertivas I e IV estão incorretas.


b) ( ) As assertivas II e III estão incorretas.
c) ( ) Apenas a assertiva IV está incorreta.
d) ( ) Todas as assertivas estão corretas.

4 Paciente feminina, 40 anos de idade, aproveitou a campanha nacional


“Outubro Rosa” para fazer seus exames de rotina de prevenção do câncer
de mama e de colo uterino. Para o rastreamento das mamas, foi solicitado
o exame de mamografia e, para o de câncer de colo uterino, o exame de
Papanicolaou. Descreva o procedimento que deve ser executado ao realizar
a coleta do exame de Papanicolaou no método convencional e cite os
materiais usados para tal finalidade.

5 A coloração padrão, utilizada para exames citológicos, também leva o


nome de Papanicolaou, seguindo padrões predeterminados, que podem ser
modificados ligeiramente entre os laboratórios, mas cuja base se mantém.
Acerca dos corantes e soluções utilizadas, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Os núcleos são tingidos pelo corante orange G.


b) ( ) A coloração avermelhada do citoplasma se deve à ação do corante
EA-36.
c) ( ) O corante hematoxilina de Harris é capaz de tingir os núcleos,
conferindo a cor roxa.
d) ( ) Orange G e EA-36, quando combinados, coram os nucléolos.

111
112
TÓPICO 3 —
UNIDADE 2

PRINCIPAIS APLICAÇÕES DA CITOLOGIA NÃO


GINECOLÓGICA

1 INTRODUÇÃO

Anteriormente, tratamos do histórico, das técnicas de coleta e processa-


mento, da estrutura de um laboratório e da epidemiologia do câncer. Neste tópico,
compreenderemos como elas se aplicam no dia a dia, em que são utilizadas e como
podemos visualizar isso em microscopia óptica, descrevendo os tipos de lesões
mais frequentemente pesquisados nos órgãos-alvo. O objetivo não é esgotar todo
o conteúdo relacionado a esse tema, mas introduzir os princípios de cada análise.

Será abordada a citologia de mama e tireoide com maior aprofundamento


teórico, bem como os principais distúrbios detectáveis pela citologia clínica, além
de outras topografias de forma mais geral. A citologia clínica é infinita em suas
possibilidades e não é possível descrevê-la em sua totalidade nesse momento,
mas, certamente, obter os conhecimentos das análises mais frequentes nos labo-
ratórios será de grande valia para o futuro profissional da área.

2 CITOLOGIA DA MAMA
A anatomia da mama humana contém um sistema de seis a dez ductos
principais. Externamente, encontra-se o epitélio queratinizado da pele, que, ao
interiorizar no ducto mamilar, bruscamente se modifica em epitélio cuboide, o qual
reveste os ductos e está organizado em dupla camada. Sequenciais ramificações
dos ductos maiores dão origem à formação da unidade ductal terminal. Nas
mulheres adultas, a unidade ductal terminal divide-se em um conglomerado de
pequenos ácinos, formando uma estrutura em formato de “cacho de uva” (Figura
18) (KUMAR et al., 2012; GAMBONI, 2013; MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012).

Comumente, as patologias da mama apresentam sintomas como dor,


massas palpáveis, presença de caroços ou descargas papilares. A dor relatada
pelas pacientes pode ter características cíclicas, as quais não têm correlação com
uma doença específica, e o tratamento normalmente tem como alvo os elevados
níveis hormonais ou, ainda, ser de característica não cíclica e relatada em um
local específico da mama, cuja causa pode ser rotura de cistos, traumas mecânicos
ou infecções. Apesar de 95% das massas dolorosas serem benignas, esse sintoma
está presente em 10% das neoplasias da mama (KUMAR et al., 2012).

113
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

FIGURA 18 – ANATOMIA DA MAMA

FONTE: <https://shutr.bz/3uVZAP7>. Acesso em: 25 jun. 2021.

Kumar et al. (2012) descrevem que as massas se tornam palpáveis quando


atingem no mínimo 2 cm de diâmetro, mas devem ser distinguidas dos nódulos
normais da mama. Estão presentes mais frequentemente em mulheres na pré-
menopausa e o risco de a nodularidade ser maligna aumenta conforme idade da
mulher. Apenas 10% dos nódulos palpáveis em mulheres com menos de 40 anos
de idade são malignos, enquanto em mulheres com idade igual ou superior a 50
anos esse número aumenta para cerca de 60%.

O Inca (2020) estima que 66.280 mulheres terão câncer de mama no


biênio 2020-2022 e aproximadamente 18.068 delas virão a óbito. Apesar desse
dado ser alarmante, esse é um câncer rastreável em suas fases mais iniciais e seu
tratamento correto leva a altas taxas de sucesso. O rastreamento pode ser feito
pelo autoexame de mama e por exames de imagem, e, a partir disso, a decisão de
biopsiar é tomada. Vale ressaltar que o câncer de mama também está presente nos
homens, embora sejam raros, representando apenas 1% de todos os casos, o que
implica uma estimativa de 227 mortes pela doença no biênio supracitado.

Quando identificados nódulos suspeitos pelos exames de imagem, pode


ser solicitada a análise citológica e, independentemente do tipo de nódulo (cístico
ou sólido), a coleta de material é realizada por PAAF. Em seguida, o laboratório
torna-se responsável pela resposta ao médico e o laudo emitido guiará o
seguimento da paciente – em outras palavras, se algum procedimento mais
invasivo será necessário ou não (MINISTÉRIO DA SAÚDE; INCA, 2016).

Segundo a classificação da OMS, há diversos tipos de cânceres de mama e


muitas formas de descrevê-los, sendo a maioria do tipo carcinoma (Figura 18). Para
um diagnóstico assertivo, deve-se utilizar como critérios gerais de malignidade:

114
TÓPICO 3 — PRINCIPAIS APLICAÇÕES DA CITOLOGIA NÃO GINECOLÓGICA

células dispersas, desordenadas e pleomorfismo. O núcleo é hipercro-


mático, frequentemente excêntrico, aumentado de volume, com con-
torno nuclear espessado e irregular e mitoses quando presentes são
atípicas. O nucléolo é proeminente, irregular ou múltiplo. No citoplas-
ma, lumens podem ser vistos contendo mucina ou lipídios positivos.
No fundo do esfregaço, pode-se observar hipercelularidade, presença
de muco, debris celulares e necrose. Chama a atenção à ausência de cé-
lulas mioepiteliais. Devemos ter o cuidado ao diagnosticar malignida-
de na presença de alguns padrões de benignidade tais como: aspirado
pobremente celular, ausência de células isoladas, presença de células
mioepiteliais, e atipia ausente ou escassa (MINISTÉRIO DA SAÚDE,
2012b, p. 60).

A Figura 18 representa apenas um tipo de carcinoma que pode se


desenvolver na mama. Contudo, dentro de citopatologia, alguns critérios básicos
estão presentes em praticamente todas as neoplasias, sobretudo nas alterações
nucleares citadas anteriormente. Para cada variação de neoplasia, buscam-se,
dentro do contexto da amostra, alterações citomorfológicas sutis, que acabam por
direcionar o diagnóstico.

FIGURA 18 – CARCINOMA DUCTAL DA MAMA: (A) NÚCLEOS VOLUMOSOS,


HIPERCROMÁTICOS E EXCÊNTRICOS (SETA); (B) NÚCLEOS VOLUMOSOS,
HIPERCROMÁTICOS E IRREGULARES (SETA); (C) MITOSE ATÍPICA (SETA); (D) NÚCLEO
ATÍPICO, VOLUMOSO, HIPERCROMÁTICO E EXCÊNTRICO.

FONTE: Ministério da Saúde (2012b, p. 60)

O Quadro 1 compara os critérios citomorfológicos utilizados para a


distinção de situações de malignidade e benignidade. Para uma avaliação
consistente do material, é preciso saber exatamente quais características
representam a presença de uma lesão maligna e quais não estão presentes nesse
tipo de alteração. Na citopatologia, qualquer equívoco ou descuido pode levar o
paciente a passar por procedimentos desnecessários.
115
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

QUADRO 1 – COMPARAÇÃO DE CRITÉRIOS CITOMORFOLÓGICOS

Benignidade Malignidade

Pobre a moderada
Celularidade Elevada
(fibroadenomas são celulares)

São comuns células


Dissociação celular Folhetos ou grupos coesivos
isoladas

Grupos celulares Limites lisos ou em paliçada Limite denteado

Tamanho da célula Pequeno Usualmente grande

Tamanho do núcleo Tamanho de um eritrócito Maiores

Pleomorfismo Nenhum Comum

Núcleo Contorno liso Contorno irregular

Vesicular ou finamente
Cromatina Em grumos
granular

Necrose Ausente Pode estar presente

Células mioepiteliais Muitas Raras

Células isoladas do estroma Comuns Raras

Fragmentos do estroma Comuns Raras

Vacúolos citoplasmáticos Incomuns Podem ser observados

Inclusões intranucleares Incomuns Podem ser observados

Mucina Rara Comum

Células inflamatórias Podem estar presentes Podem estar presentes

Macrófagos espumosos No geral presentes Às vezes presentes

Células tumorais gigantes Ausentes Podem estar presentes

Calcificação Pode estar presente Pode estar presente

Células apócrinas Comuns Raras

Mitoses Incomuns Comuns

Presente no carcinoma
Padrão cribiforme Ocasional em fibroadenoma
ductal in situ cribiforme

FONTE: Ministério da Saúde (2012b, p. 61)

116
TÓPICO 3 — PRINCIPAIS APLICAÇÕES DA CITOLOGIA NÃO GINECOLÓGICA

E
IMPORTANT

Há muito o que falar sobre o diagnóstico citológico de mama. Para aprofundar


seus estudos, sugerimos o acesso ao site do Inca, em que estão reunidas muitas informações
acerca das neoplasias da mama: www.inca.gov.br.

3 CITOLOGIA DA TIREOIDE
A glândula tireoide está situada na região do pescoço, anteriormente ao
esôfago, na região popularmente conhecida como “pomo de adão” (cartilagem
cricoide). É composta por dois lóbulos (esquerdo e direito) e ligada por uma
pequena região chamada de istmo. Cada lóbulo é composto de folículos, que
contêm células foliculares (Figura 20), que são a unidade funcional da tireoide.
A função dessa glândula é produzir e armazenar os hormônios tireoidianos,
responsáveis pelo metabolismo do organismo (KUMAR et al., 2012; MINISTÉRIO
DA SAÚDE, 2012).

O câncer de tireoide é o mais comum dos cânceres de cabeça e pescoço,


afeta três vezes mais mulheres que homens. A estimativa é de 13.780 novos casos,
com 869 mortes por ano. A taxa de mortalidade pode ser reduzida se a lesão
for identificada precocemente, requerendo exames de laboratório, radiológicos
ou clínicos, sendo que a maior parte dos nódulos é identificada como benigna
(INCA, 2021a).

A coleta do espécime é feita por PAAF, que apresenta sensibilidade


variável entre 65% e 98% e especificidade de 72% a 100%. Resultados falso-
positivos estão entre 0% e 24%, sendo relacionados a erros de interpretação.
Outro ponto importante são os resultados falso-negativos, que, por sua vez, são
atribuídos a múltiplas lesões, amostras inadequadas, insuficientes ou erros na
obtenção da amostra, o que faz com que a incidência dessa categoria diagnóstica
varie entre 0,3 e 28,7 pontos percentuais (GAMBONI, 2013).

Os elementos possivelmente encontrados em um esfregaço citológico são:

• Células foliculares: representam a celularidade normal do folículo.


• Células de Hürtle: são células foliculares repletas de mitocôndrias não
funcionais, pois não sintetizam tiroxinas, comuns em nódulos benignos.
• Células parafoliculares: células neuroendócrinas produtoras de calcitonina.
• Células da paratireoide: indistinguíveis das células foliculares sem a utilização
de coloração especial.
• Células inflamatórias crônicas: linfócitos.

117
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

• Células ciliadas: não fazem parte dos nódulos da tireoide; quando presentes,
significa que a punção pode ter atingido regiões adjacentes.
• Células musculares esqueléticas: erro de punção atingindo o músculo
esternocleidomastoideo.

Também podem estar presentes cristais ou pigmentos como hemosside-


rina, melanina ou cristais de oxalato. A presença de amiloides pode ocorrer em
carcinoma medular, amiloidose e outras patologias da tireoide. O coloide está
presente nas punções, é uma glicoproteína e representa os hormônios da tireoide
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012).

FIGURA 20 – CÉLULAS FOLICULARES

FONTE: Ministério da Saúde (2012b, p. 70)

Após a confecção da lâmina e o processamento discutido anteriormente,


o citologista deve analisar as células presentes e sua morfologia, além de
correlacionar com as informações clínicas, a fim de reproduzir o melhor
diagnóstico para o caso em estudo. Na tireoide, usa-se o Sistema Bethesda para
Relatos de Laudos Citopatológicos da Tireoide. O Quadro 2 exemplifica as seis
classes diagnósticas conforme o Sistema Bethesda.

QUADRO 2 – SISTEMA BETHESDA PARA LAUDOS CITOPATOLÓGICOS DA TIREOIDE

Classe Significado
Classe I Amostra insatisfatória
Classe II Nódulo benigno

Atipia de significado indeterminado ou lesão folicular de


Classe III
significado indeterminado

Classe IV Neoplasia folicular ou nódulo suspeito de neoplasia folicular


Classe V Lesão suspeita de malignidade
Classe VI Nódulo maligno

FONTE: Ministério da Saúde (2012b, p. 69)

118
TÓPICO 3 — PRINCIPAIS APLICAÇÕES DA CITOLOGIA NÃO GINECOLÓGICA

Neste tópico, estudamos os principais sítios não ginecológicos de aplicação


do diagnóstico citopatológico. Como visto anteriormente, podemos utilizar
a citologia para a investigação de lesões em praticamente qualquer topografia
do corpo. A lógica do estudo é a mesma: conhecer os critérios citomorfológicos
normais e alterados, correlacionar com a clínica e, quando possível, entregar um
laudo fidedigno à situação. A atuação do citologista deve ser pautada em certezas,
uma vez que os laudos irão determinar o seguimento do tratamento do paciente,
não sendo permitidos erros de interpretação.

Portanto, o estudo das lesões pode ser feito em pulmão, nódulos hepáticos,
renais, peritônio, anus, colo uterino, cavidade oral, líquido cefalorraquidiano,
lesões de pele, enfim, em qualquer que seja a possibilidade, a citologia pode
auxiliar e ser altamente eficaz e assertiva desde que sejam utilizadas as técnicas
corretas de coleta e processamento das amostras a serem analisadas.

119
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

LEITURA COMPLEMENTAR

PREVENÇÃO É A MELHOR FORMA DE EVITAR O CÂNCER

Natália Mancini

O Dia Mundial de Combate ao Câncer (4 de fevereiro) lembra


que  prevenção do câncer  é a melhor forma de evitar o seu surgimento. De
acordo com dados do Instituto Nacional de Câncer (Inca), são estimados 625
mil novos casos de câncer para 2020. Isso significa um aumento de cerca de 40
mil casos em relação a 2019. Pensando nisso, a Associação Brasileira de Linfoma
e Leucemia (Abrale) criou a ação “Vá de Lenço”.

O câncer aparece pela junção da disposição genética com a exposição aos


fatores de risco. A  disposição genética está ligada tanto à  hereditariedade, ou
seja, a capacidade da mutação genética que causa o tumor ser transmitida para a
próxima geração, quanto ao envelhecimento das células. Quando um indivíduo
envelhece, suas células também ficam mais velhas e sofrem mudanças. Nesse
processo, elas podem ficar mais suscetíveis a desenvolver um câncer.

Ao unir essas questões genéticas com os fatores de risco, situações que


fazem com que o risco se torne algo maior, explica-se o porquê das pessoas
com mais idade serem mais atingidas pelo câncer. “O aumento do número de
casos de câncer se dá basicamente por dois fatores principais. Primeiramente,
o envelhecimento populacional e, em segundo, o melhor controle de outras
doenças. Por isso, o câncer é uma doença preferencialmente de pessoas mais
velhas, embora possa acontecer em jovens”, explica o Dr. Felipe Ades, oncologista
no Hospital Oswaldo Cruz.

Entretanto, a grande questão é que cada vez mais pessoas com menor
idade também estão sendo diagnosticadas. De acordo com um estudo feito
pelo  Observatório de Oncologia, entre 1997 e 2016, houve um aumento no
diagnóstico de alguns tipos de cânceres em pessoas com 20 a 49 anos. “Cânceres
como de cólon e reto, próstata e glândula tireoide tiveram um aumento significativo
nessa faixa etária”, conta o Dr. Luiz Antonio Santini, ex-diretor geral do Inca.

120
TÓPICO 3 — PRINCIPAIS APLICAÇÕES DA CITOLOGIA NÃO GINECOLÓGICA

Importância da prevenção do câncer

CAMPANHA DE DIVULGAÇÃO “VÁ DE LENÇO”

Atualmente, no Brasil, uma a cada seis pessoas morre devido ao câncer,


de acordo com dados do Observatório de Oncologia. Desse modo, a cada seis
mortes, uma é devido a essa doença. Na genética, não há muito o que possa ser
feito. Entretanto, felizmente, os casos de câncer causados exclusivamente por essa
questão são raros. Assim, o que pode (e deve) ser feito é a diminuição de exposição
aos fatores de risco. Cerca de 80% a 90% dos casos poderiam ser evitados se
alguns hábitos da rotina da população fossem mudados. Para chamar a atenção
das pessoas para a necessidade de evitar esses costumes, a Abrale realizou uma
grande ação na Av. Paulista no Dia Mundial de Combate ao Câncer, para a
campanha “Vá de Lenço”.

Quem passava pelo local era convidado a entrar em uma cabine montada
em frente ao Shopping Top Center, para descobrir o seu futuro. Entretanto, ao
entrar, a pessoa percebia que não era um futuro qualquer. Era o futuro da saúde
dela e de todos os brasileiros. As pessoas respondiam a perguntas relacionadas
com os fatores de risco e descobriam se suas ações estavam levando-as para a
doença ou se tinham hábitos saudáveis. Foram mais de 400 pessoas diretamente
impactadas e conscientizadas pela ação física.

Além disso, a campanha “Vá de Lenço” mobilizou mais de 10 famosos nas


redes sociais, como Carol Castro, Juliano Cazarré, Malvino Salvador e Adriane
Galisteu, que foram convidados a postar uma foto nas suas redes sociais utilizando
um lenço para lembrar a população do Dia Mundial de Combate ao Câncer, da
importância da prevenção e para homenagear aqueles que já enfrentaram ou
enfrentam um câncer.

121
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

Como prevenir o câncer

Existem 12 “mandamentos” indicados pelo Inca para se ter uma vida


mais saudável e evitar o câncer. O Dr. Ades considera que “por ordem, o hábito
mais importante é não fumar. Depois, vem o tripé boa alimentação, prática de
exercícios e manutenção de um bom peso”.

1- Não fumar

Fumar aumenta em até 20 vezes a chance de a pessoa desenvolver


câncer de pulmão. Além disso, esse mau hábito também está ligado ao câncer de
laringe, faringe, cavidade oral e esôfago, e contribui para os cânceres de bexiga,
pâncreas, útero, rim, estômago e intestino e alguns tipos de leucemia. Somente
um cigarro por dia aumenta em 64% o risco de morte prematura, mas, ao parar
de fumar, dentro de 10 anos, a chance de desenvolver o câncer diminui em até
50%. Isso também vale para cigarros eletrônicos. Por mais que, antigamente, se
pensasse que eles eram menos nocivos, atualmente, sabe-se que eles também
são compostos por substâncias cancerígenas. Então, não vale substituir um pelo
outro. O mesmo acontece com o narguilé! Uma roda de 20 a 60 minutos inalando
a fumaça equivale a fumar cerca de 100 cigarros.

2- Evitar o consumo de bebidas alcoólicas

Duas doses por dia, ao longo de 40 anos, aumentam em 54% a chance de


desenvolver câncer de faringe, laringe, esôfago, estômago, fígado e intestino, e,
inclusive, o câncer de mama também está relacionado com esse hábito.

3- Evitar o consumo de carnes ultraprocessadas

Os conservantes presentes nesses alimentos e o modo como eles são


processados podem provocar danos nas células da mucosa intestinal. Dessa forma,
afeta seu DNA, causando câncer. Consumir 50 g/dia de carne ultraprocessada
aumenta 18% o risco de câncer colorretal. Isso equivale a duas fatias de bacon
ou uma salsicha. Outros exemplos de carnes processadas são presunto, linguiça,
salame, mortadela e peito e blanquet de peru.

4- Evitar exposição ao sol entre 10h e 16h

Evitar totalmente o Sol é impossível, e também não é recomendado. En-


tretanto, no intervalo entre 10h e 16h, o Sol está mais forte e ele é o grande vilão
de todos os tipos de câncer de pele. É importante sempre sair com protetor solar,
chapéu e protetor labial.

5- Evite exposição a substâncias industriais

Agentes químicos, físicos e biológicos, como o benzeno, presente na gaso-


lina, e agrotóxicos, estão relacionados ao desenvolvimento do câncer, principal-
mente linfoma de Hodgkin, leucemias e câncer de pulmão.
122
TÓPICO 3 — PRINCIPAIS APLICAÇÕES DA CITOLOGIA NÃO GINECOLÓGICA

6- Comer alimentos saudáveis

Esse “mandamento” foca principalmente na questão de consumir vegetais,


frutas, legumes, cereais etc., especialmente os livre de  agrotóxicos, já que essas
substâncias podem causar, além da intoxicação aguda, alteração nas células, le-
vando ao câncer. Fora isso, também se recomenda evitar o consumo de fast-foods.

7- Manter um peso adequado

Essa é uma indicação razoavelmente nova, de acordo com o Dr. Ades.


“As medidas para prevenção seguem as mesmas. Temos apenas mais ênfase
agora na  prevenção da  obesidade, um fator de risco anteriormente não muito
relacionado a câncer”.

8- Praticar exercícios físicos

As atividades mais indicadas são as chamadas aeróbicas, que são movi-


mentos contínuos, prolongados e rápidos, como corrida, dança ou até subir esca-
da. Além de ajudarem a controlar o peso, auxiliam na diminuição do colesterol e
fortalece o sistema imunológico.

9- Vacinação contra o HPV

O HPV é um vírus sexualmente transmissível, que pode causar mutações


genéticas nas células do local onde se hospedar. Ele está extremamente ligado aos
cânceres de colo do útero, canal anal, pênis e orofaringe. “A vacinação contra o
HPV é fundamental na prevenção do câncer de colo uterino. Praticamente todos
os casos são causados por este vírus”, diz o Dr. Ades. Dessa forma, meninas entre
9 e 14 anos e meninos entre 11 e 14 anos de idade devem ser vacinados!

10- Vacinação contra a hepatite B

O câncer de fígado está relacionado à infecção causada pelo vírus da


hepatite B. Assim como no caso do HPV, ao receber a vacina, a pessoa cria
anticorpos contra o vírus e, caso ela entre em contato com ele ao longo de sua
vida, seu corpo será capaz de combatê-lo.

11- Amamente

As mulheres que amamentam podem  reduzir de 20 a 25% as chances


de desenvolvimento de um câncer de mama e também de ovário. Isso acontece
porque, ao amamentar, há uma menor produção de estrógeno, hormônio ligado
ao desenvolvimento do câncer de mama, além dos hábitos saudáveis que as mães
costumam aderir durante a amamentação, como alimentação e não beber.

123
UNIDADE 2 — CITOLOGIA CLÍNICA

12- Realizar exame preventivo

De acordo com o Dr. Ades, a mamografia deve ser realizada anualmente


por mulheres acima de 45 anos e o preventivo de colo uterino a partir dos 25
anos de idade, o qual, após dois ou três resultados negativos, o intervalo entre os
exames passa a ser a cada três anos. A colonoscopia deve ser feita por homens e
mulheres com mais de 45 anos e em um intervalo de cinco anos. “Rastreamento
para câncer de próstata ainda é controverso. Entretanto, se for feito deve iniciar a
partir de 45 anos e feito a cada um ou dois anos”.

Além disso, os exames dermatológicos, com periodicidade determinada


pelo especialista, e tomografia helicoidal de baixa dose para fumantes de longa
data a partir dos 55 anos de idade também são indicados.

É possível prevenir os cânceres hematológicos?

Segundo o documento lançado pelo Inca com as estimativas do câncer para


os anos de 2020, 2021 e 2022, ainda não é possível estabelecer uma ligação direta
entre os fatores de risco e as leucemias. Entretanto, existem algumas associações
entre os fatores e alguns tipos específicos da leucemia. Por exemplo, leucemia
mieloide aguda (LMA): tabagismo, benzeno, radiação ionizante, quimioterapia,
síndrome de Down, síndrome mielodisplásica e outras desordens sanguíneas.

• Leucemia mieloide crônica (LMC): benzeno.


• Leucemia linfoide aguda (LLA): benzeno, radiação ionizante e quimioterapia.

A produção de borracha, histórico familiar, exposição a agrotóxicos, sol-


ventes e infecção por vírus da hepatite B ou C estão associadas a todos os tipos
de leucemia.

FONTE: Adaptada de MANCINI, N. Prevenção é a melhor forma de evitar o câncer. Revista ABRALE
On-line, 2020. Disponível em: https://revista.abrale.org.br/prevencao-principal-forma-de-evitar-
cancer/. Acesso em: 24 maio 2021.

124
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• A citologia pode ser aplicada rotineiramente a qualquer topografia do corpo,


mas as amostras de mama e tireoide são as mais comuns na rotina.

• Existem critérios citomorfólogicos gerais que podem indicar a condição da


doença na amostra, mas, para cada caso, é necessário aplicar conhecimentos
específicos, a fim de obter um resultado fiel.

• Os laudos de tireoide seguem uma orientação específica, conhecida como


Sistema Bethesda.

CHAMADA

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AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

125
AUTOATIVIDADE

1 O Sistema Bethesda para laudos da citopatologia da tireoide direciona o


citologista na confecção do laudo, de forma a padronizar a comunicação
entre o laboratório e o médico. Acerca desse sistema, assinale a alternativa
CORRETA:

a) ( ) O Sistema Bethesda é um limitador da atuação do profissional citologista.


b) ( ) Descreve em seis graus diagnósticos os achados citológicos, alinhando
o entendimento médico e laboratorial.
c) ( ) Trata-se de diretrizes que fomentam o diagnóstico e a pesquisa das
lesões, mas não incluem categorias diagnósticas.
d) ( ) Raspados de nódulos da tireoide são pouco sensíveis e específicos, não
sendo bons indicadores na pesquisa das doenças.

2 As glândulas mamárias desempenham um papel fundamental para a


nutrição e o desenvolvimento dos bebês, por meio da produção do leite
materno. Contudo, seu epitélio é susceptível a doenças graves, como o
câncer. Assim, deve ser mantido, principalmente após os 40 anos de idade,
um acompanhamento médico para rastrear possíveis nódulos ou alterações
malignas. Descreva a anatomia da mama humana e cite meios de obter
material para estudo citológico dessa topografia.

3 Diversas células podem ser observadas no exame dos espécimes citológi-


cos da tireoide, sendo que algumas fazem parte do interesse diagnóstico e
outras acabam sendo coletadas acidentalmente, devido a intercorrências no
momento da punção. Analise as assertivas a seguir:

I- As células foliculares normalmente estão presentes, mas não fazem


parte da tireoide e acabam por aparecer devido à punção do músculo
esternocleidomastoideo.
II- Pigmentações e cristais, como hemossiderina e cristais de oxalato de
cálcio, são encontrados em punções de nódulos tireoidianos.
III- Linfócitos são observados em PAAF de lesões inflamatórias agudas
da tireoide.
IV- Células da paratireoide são morfologicamente idênticas às células
foliculares.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Apenas a assertiva I está correta.


b) ( ) As assertivas II e III estão corretas.
c) ( ) As assertivas I e III estão corretas.
d) ( ) Todas as assertivas estão incorretas.
126
4 Alterações nas células guiam o citologista a identificar se a lesão apresen-
tada é benigna ou maligna. Essas alterações são descritas como “critérios
citomorfológicos” e seguem uma condição geral, que descreve quais cé-
lulas indicam o processo maligno. Descreva quais são os critérios gerais
de malignidade.

5 A tireoide é uma glândula endócrina, que produz os hormônios tetraiodo-


tiroxina (T4) e triiodotiroxina (T3). Também está envolvida na regulação
do metabolismo e suas doenças podem causar alterações em sono, peso
corporal e comportamento. Em relação à anatomia da tireoide, assinale a
alternativa CORRETA:

a) ( ) A tireoide é um órgão sólido, composto por um lóbulo, que está


localizada na região esternal.
b) ( ) Está relacionada com a cartilagem cricoide, possui dois lóbulos e
um istmo.
c) ( ) Encontra-se no pescoço, posteriormente ao esôfago, apresentando
dois lóbulos.
d) ( ) Possui dois lóbulos, compostos por folículos que, por sua vez,
apresentam abundância de células de Hürtlhe.

127
REFERÊNCIAS
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nº 50, de 21 de fevereiro de 2002. Dispõe sobre o Regulamento Técnico para
planejamento, programação, elaboração e avaliação de projetos físicos de
estabelecimentos assistenciais de saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2002.
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ANVISA. Resolução RDC nº 302, de 13 de outubro de 2005. Dispõe sobre


Regulamento Técnico para funcionamento de Laboratórios Clínicos. Disponível
em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2005/res0302_13_10_2005.
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GOULART, A. P. F. E. Análise de resultados de Punção Aspirativa por Agulha


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de Estudos e Pesquisa em Saúde Coletiva (Cepesc), 2012a. 194 p. Disponível em:
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/tecnico_citopatologia_caderno_
referencia_1.pdf. Acesso em: 27 ago. 2021.

129
MINISTÉRIO DA SAÚDE.  Técnico em citopatologia: caderno de referência 2:
citopatologia não ginecológica. Brasília: Ministério da Saúde; Rio de Janeiro:
Centro de Estudos e Pesquisa em Saúde Coletiva (Cepesc), 2012b. 86 p. Disponível
em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/tecnico_citopatologia_caderno_
referencia_2.pdf. Acesso em: 27 ago. 2021.

MINISTÉRIO DA SAÚDE. Portaria nº 3.388, de 30 de dezembro de 2013.


Qualificação Nacional em Citopatologia na prevenção do câncer do colo do útero
(QualiCito), no âmbito da Rede de Atenção à Saúde das Pessoas com Doenças
Crônicas. Brasília: Ministério da Saúde, 2013. Disponível em: https://bvsms.
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MINISTÉRIO DA SAÚDE; INCA – INSTITUTO NACIONAL DO CÂNCER


JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA. Manual de gestão da qualidade para
laboratório de citopatologia. Rio de Janeiro: Inca; 2016. Disponível em:
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MINISTÉRIO DA SAÚDE. Boletim Epidemiológico de Hepatites Virais – 2018.


Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde, 2018. Disponível em:
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MIRANDA, W. et al.  Atualização da nomenclatura brasileira para laudos


citopatológicos do colo uterino e áreas ano-genitais. Sociedade Brasileira
de Citopatologia, 2020. E-book. Disponível em: https://colposcopia.org.br/
wp-content/uploads/2020/08/E-BOOK-SOCIEDADE-BRASILEIRA-DE-
CITOPATOLOGIA_SBC-1-1.pdf. Acesso em: 20 maio 2021.

SALES, J. B. Prevalência e padrões de coexistência de fatores de risco e proteção


para o câncer na população adulta das capitais dos Estados e Distrito Federal.
2017. 92 f. Dissertação (Doutorado) – Curso de Enfermagem, Universidade Federal
de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2017. Disponível em: https://repositorio.ufmg.br/
bitstream/1843/ANDO-AM7RB8/1/jacqueline_de_barros_sales.pdf. Acesso em: 18
jun. 2021.

SCHNEIDER, M. L.; SCHNEIDER, V. Atlas de diagnóstico diferencial em


citologia ginecológica. Rio de Janeiro: Revinter, 1998.

SILVA, R. C. G. et al. Liquid medium cytology performance in identification


of cervico-vaginal microbiological agentes.  Revista Brasileira de Análises
Clínicas, v. 50, n. 2, p. 130-134, 2018. Disponível em: http://www.rbac.org.br/
artigos/desempenho-da-citologia-em-meio-liquido-na-identificacao-de-agentes-
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130
WORLD HEALTH ORGANIZATION. Cervical cancer screening in developing
countries: report of a WHO consultation. Geneva: WHO, 2002. Disponível em:
https://www.who.int/cancer/media/en/cancer_cervical_37321.pdf. Acesso em: 7
maio 2021.

WORLD HEALTH ORGANIZATION. Tobacco. WHO, 2021. Disponível em:


https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/tobacco. Acesso em: 30
maio 2021.

131
132
UNIDADE 3 —

CITOLOGIA GINECOLÓGICA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• reconhecer as estruturas anatômicas, histológicas e a fisiologia do trato


genital feminino;

• identificar os componentes normais de um exame citopatológico do colo


uterino;

• distinguir os diferentes micro-organismos presentes em um esfregaço


citopatológico e as reações inflamatórias que acometem o epitélio
escamoso;

• também será capaz de identificar células que correspondem as lesões pré-


neoplásicas do colo uterino;

• diferenciar as lesões pré-neoplásicas e neoplásicas do colo do útero;

• escrever um laudo citopatológico conforme normas internacionais.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – ANATOMIA, FISIOLOGIA E COMPONENTES DO EXAME


CITOLÓGICO DO COLO UTERINO

TÓPICO 2 – MICRO-ORGANISMOS E CITOLOGIA INFLAMATÓRIA

TÓPICO 3 – LESÕES PRÉ-NEOPLÁSICAS E MALIGNAS DO COLO


DE ÚTERO

133
CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

134
TÓPICO 1 —
UNIDADE 3

ANATOMIA, HISTOLOGIA E FISIOLOGIA DO


COLO UTERINO

1 INTRODUÇÃO

Nas unidades anteriores, estudamos, de modo geral, a aplicação da


citologia na rotina diagnóstica e seus métodos de coleta e processamento. Também
discutimos a estrutura administrativa necessária para o funcionamento de um
laboratório de citopatologia, bem como vimos superficialmente três aplicações
principais desse método: mama, tireoide e colo de útero.

Nesta unidade, aprofundaremos seus conhecimentos na área da


citopatologia que mais apresenta demanda, a citologia de colo uterino.
Como vimos anteriormente, ela está ligada a muitos programas – nacionais e
internacionais – de prevenção do câncer do colo de útero, por meio do chamado
rastreamento. Esses programas contemplam ações de autocuidado e diagnóstico
precoce do câncer e também na detecção das lesões precursoras dessa moléstia.

Assim, é possível atuar nessa área do conhecimento firmando laudos, os


quais levarão a condutas importantes com viés curativo e preventivo, contribuindo
diretamente para a saúde pública e observando fotos e diagramas de células
normais, inflamatórias e neoplásicas, micro-organismos e demais componentes
presentes em uma amostra obtida do colo de útero.

Por fim, mas não menos importante, falaremos de monitoramento


interno e externo de qualidade (MIQ e MEQ) e nomenclatura padrão dos laudos,
a fim de proporcionar um entendimento amplo e bem embasado de mais essa
possibilidade de especialização.

2 ANATOMIA DO TRATO GENITAL FEMININO


O trato genital feminino se diferencia substancialmente, uma vez que tem
como função a produção dos óvulos e dar suporte a uma gravidez. Os órgãos
envolvidos no trato genital feminino sofrem ação hormonal e se modificam
conforme o ciclo menstrual, que, geralmente, tem duração de 28 dias. Compondo
esse sistema, temos os ovários, as tubas uterinas, o útero e a vagina (MARIEB et
al., 2012).

135
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

2.1 OVÁRIOS
Estão presentes em pares e, macroscopicamente, se apresentam em
formatos ovalados, semelhantes a amêndoas (Figura 1), nas meninas apresentam
superfície lisa, após a puberdade passam a apresentar cicatrizes e depressões
devido a liberação dos óvulos. Localizam-se lateralmente ao útero e em condições
normais medem cerca de 1 × 1,5 cm, mas podem sofrer alterações no tamanho do
decorrer do ciclo menstrual e estão ligados ao útero pelas tubas uterinas (BRASIL,
2012; MARIEB et al., 2012).

FIGURA 1 – SISTEMA GENITAL FEMININO

FONTE: Adaptada de <https://bit.ly/3ncpXNz>. Acesso em: 29 ago. 2021.

Microscopicamente (Figura 2), estão envolvidas por uma fina cápsula


fibrosa: a túnica albugínea. Ela é recoberta por epitélio cuboide simples, que
intercala com epitélio pavimentoso, também chamado de epitélio germinativo.
O parênquima é dividido em córtex, rico em folículos ovarianos, corpo lúteo e
células de Leydig, e, em medula, é formada por tecido conjuntivo frouxo, rica
em vasos sanguíneos e também em células de Leydig, as quais, por sua vez, são
responsáveis pela produção dos hormônios ovarianos, quando estimuladas pelas
gonadotrofinas (BRASIL, 2012; MARIEB et al., 2012).

136
TÓPICO 1 — ANATOMIA, HISTOLOGIA E FISIOLOGIA DO COLO UTERINO

FIGURA 2 – FOTOMICROGRAFIA DE OVÁRIO

FONTE: Marieb et al. (2012, p. 789)

2.2 TUBAS UTERINAS


As tubas uterinas recebem o óvulo produzido nos ovários, onde ocorre
a fertilização (Figura 1). Essas tubas iniciam no ovário e terminam medialmente
na parte superior do útero. Na região próxima aos ovários, existem estruturas
chamadas fímbrias, semelhantes a franjas, que se abrem sobre ele (MARIEB et
al., 2012).

2.3 ÚTERO
O útero (Figura 3) é um órgão oco, posicionado anteriormente ao reto e
superior à bexiga. Sua função principal é receber e nutrir o óvulo fecundado e
dar suporte nutricional ao feto durante a gestação. É dividido em corpo e colo
uterino. O corpo uterino é a porção principal do órgão, dividido em endométrio,
que é a camada mais interna, composta por epitélio colunar simples e responde
ao estímulo hormonal do ciclo; miométrio, que corresponde à camada muscular
do órgão, que, nesse caso, se trata de musculatura lisa; e, por último, e mais
externamente, o perimétrio, que é a camada serosa (BRASIL, 2012; MARIEB et
al., 2012).

O colo uterino (Figura 3) liga-se ao canal vaginal, sendo delimitado pelo


óstio interno, que se liga ao útero e ao óstio externo, o qual se liga com o canal
vaginal. No colo uterino, encontramos os epitélios escamoso, na ectocérvice, e
glandular, na endocérvice e no metaplásico, uma região conhecida como zona de
transformação (Figura 4) (BRASIL, 2012).

137
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

FIGURA 3 – ÚTERO

FONTE: Adaptada de <https://bityli.com/ik4gp>. Acesso em: 11 ago. 2021.

Essa porção do útero recebe especial atenção, pois é nela que se origina o
segundo câncer mais letal nas mulheres – o câncer de colo de útero. A citologia do
colo uterino tem como base a análise e a interpretação das células coletadas desse
sítio (GAMBONI, 2013).

FIGURA 4 – EPITÉLIOS DA CÉRVICE

FONTE: Adaptada de <https://bit.ly/3jLQM9u>. Acesso em: 11 ago. 2021.

138
TÓPICO 1 — ANATOMIA, HISTOLOGIA E FISIOLOGIA DO COLO UTERINO

DICAS

Na Figura 4, podemos observar a presença dos três epitélios estudados na


citologia do colo uterino. É de suma importância conhecer essa disposição anatômica para
o bom exercício da profissão.

Após uma breve revisão da anatomia e da histologia do colo uterino,


nosso objetivo não é esgotar os assuntos relativos a seu posicionamento e a sua
função, uma vez que isso já foi tratado com profundidade em outras matérias.
Assim, veremos, de forma sucinta, uma breve revisão sobre o ciclo hormonal que
influencia o sistema reprodutor feminino.

3 FISIOLOGIA DO TRATO GENITAL FEMININO


O sistema reprodutor feminino sofre ação de uma sequência de
hormônios hierarquicamente dispostos, ou seja, para que um seja secretado, deve
ser estimulado por outro. Em primeira instância, temos a liberação de hormônio
liberador de gonadotrofina (GnRH), pelo hipotálamo, em resposta ao GnRH;
a hipófise secreta os hormônios folículo estimulante (FSH) e luteinizante (LH)
e, por fim, sob a ação do FSH e LH, os ovários liberam estradiol (estrógeno) e
progesterona (GUYTON; HALL, 2011).

FIGURA 5 – EPITÉLIOS DO COLO UTERINO

FONTE: <http://anatpat.unicamp.br/Dscn5179++.jpg>. Acesso em: 11 jul. 2021.

139
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

Durante o ciclo menstrual, esses hormônios são liberados em quantidades


diferentes, conduzindo uma variação rítmica dos níveis hormonais (Figura 5).
Esse ciclo dura normalmente 28 dias, porém, podem ocorrer variações drásticas
de mulher para mulher (GUYTON; HALL, 2011).

Os ovários respondem diretamente ao estímulo de FSH e LH, e, na


ausência desses hormônios, eles permanecem inativos, como acontece durante
a infância. Posteriormente, entre 12 e 14 anos de idade, a hipófise passa a
secretá-los, iniciando, então, a fase reprodutiva feminina, marcada pela menarca
(primeira menstruação), o aumento das glândulas mamárias e o amadurecimento
dos órgãos genitais (GUYTON; HALL, 2011).

FIGURA 6 – DISTRIBUIÇÃO HORMONAL DURANTE O CICLO MENSTRUAL

FONTE: Guyton; Hall (2011, p. 1049)

Quando os ovários são estimulados pelos hormônios FSH e LH, passam


a produzir e liberar estrógeno e progesterona, que influenciam diretamente na
proliferação do epitélio endometrial (Figura 7), o qual pode ser dividido em três
estágios: proliferação, alterações secretoras e descamação do endométrio. Mais
externamente, na ectocérvice, o epitélio escamoso sofre maturação pela influência
dos mesmos hormônios (GUYTON; HALL, 2011; GAMBONI, 2013).

140
TÓPICO 1 — ANATOMIA, HISTOLOGIA E FISIOLOGIA DO COLO UTERINO

FIGURA 7 – FASES ENDOMETRIAIS

FONTE: Guyton; Hall (2011, p. 1042)

Assim, encerramos o tema sobre a fisiologia do trato genital feminino e


sua resposta a hormônios específicos. É importante lembrarmos do ciclo para o
estudo das células em um exame citopatológico do colo uterino, pois é necessário
identificar o nível de maturação do epitélio para graduar, quando presentes, as
lesões pré-neoplásicas.

DICAS

Para uma melhor compreensão do ciclo ovariano, assista ao seguinte vídeo:


https://www.youtube.com/watch?v=ymNSJcVNkFY.
Para ajudar a compreender melhor a anatomia do sistema reprodutor feminino, assista
também ao vídeo sobre o ciclo ovariano: https://bit.ly/3C3XpvZ.

4 COMPONENTES NORMAIS DO EXAME CITOPATOLÓGICO


DE COLO DE ÚTERO
No contexto dos elementos que compõem um exame citológico do colo
uterino, veremos os componentes celulares e microbiológicos presentes na rotina
da citologia.

4.1 CÉLULAS EPITELIAIS


Compõe principalmente um esfregaço e são alvos da avaliação de células
epiteliais descamadas por esfoliação durante a coleta. São divididas em células
escamosas, glandulares e metaplásicas, dispostas no colo uterino (como observado
na Figura 5). Respondem ao estímulo de estrógenos (estradiol) e progesterona
(BRASIL, 2012).
141
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

O colo uterino pode ser dividido em ectocérvice, no qual está presente o


epitélio escamoso estratificado não queratinizado, e em endocérvice, que conta
com a presença de epitélio colunar simples mucossecretor. Em determinado mo-
mento, ocorre a transição do epitélio escamoso para o epitélio colunar, região que
é chamada de junção escamocolunar (JEC) (BRASIL, 2012; KOSS; GOMPEL, 2006).

4.1.1 Células escamosas


A coleta na região ectocervical permite vislumbrar células do tipo esca-
moso, dispostas em camadas (epitélio estratificado, Figura 8) e que podem se
apresentar em diferentes níveis de maturação. São as principais células avaliadas
no exame citopatológico do colo uterino, sendo a sua presença critério para satis-
fatoriedade da amostra (GAMBONI, 2013).

FIGURA 8 – ESTRATO ESCAMOSO DO COLO UTERINO: CÉLULAS SUPERFICIAIS (S); CÉLULAS


INTERMEDIÁRIAS (I); E CÉLULAS PROFUNDAS (P)

FONTE: Adaptada de IARC (2004)

Células escamosas podem ser encontradas em três estágios de maturação


com características distintas:

• Célula escamosa superficial (Figura 9): é a célula em sua máxima maturação,


normalmente presente na fase proliferativa do ciclo menstrual, quando ocorre
o pico estrogênico; tem como características citoplasma amplo e cromatina
altamente condensada, conferindo ao núcleo um tamanho pequeno (retraído)
e coloração eosinófila ou, em alguns casos, basófila. Dessa forma, apresenta
baixa relação entre núcleo e citoplasma (N/C).

142
TÓPICO 1 — ANATOMIA, HISTOLOGIA E FISIOLOGIA DO COLO UTERINO

FIGURA 9 – CÉLULA ESCAMOSA SUPERFICIAL: NÚCLEO PICNÓTICO COM CROMATINA


ALTAMENTE CONDENSADA (A); CITOPLASMA AMPLO (B)

FONTE: Os autores

• Célula escamosa intermediária (Figura 10): como o nome sugere, está em


sua fase intermediária de maturação durante a fase secretora do ciclo. Nesse
caso, revela cromatina mais frouxa, núcleo discretamente maior do que as
superficiais e citoplasma também amplo e basófilo.

FIGURA 10 – CÉLULAS ESCAMOSAS INTERMEDIÁRIAS: NÚCLEO PEQUENO COM CROMATINA


MAIS FROUXA (A); CITOPLASMA AMPLO (B)

FONTE: Os autores

143
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

• Células escamosas profundas ou parabasais (Figura 11): são as células mais


imaturas, estão localizadas próximas à lâmina basal, não estão presentes em
epitélio hormonalmente maduro. Apresentam cromatina compacta, núcleo
amplo e citoplasma pequeno, que, na coloração de Papanicolaou, comumente
aparenta coloração azulada.

FIGURA 11 – CÉLULAS PROFUNDAS/PARABASAIS: NÚCLEO VOLUMOSO COM CROMATINA


COMPACTA (A); CITOPLASMA DENSO E ARREDONDADO (B)

FONTE: Os autores; <https://bit.ly/3lXO7vH>. Acesso em: 29 ago. 2021.

4.1.2 Células glandulares endocervicais


Esse tipo celular está presente na endocérvice, região mais interna do canal
cervical; são mucossecretoras que auxiliam na lubrificação do canal endocervical.
Seu citoplasma apresenta-se em azul-claro e o núcleo é condensado e basofílico.
Estão dispostas em monocamada diretamente acima da lâmina basal, sendo
assim, representam o epitélio colunar simples. Na citologia, são observadas em
duas posições (Figura 12):

FIGURA 12 – CÉLULAS GLANDULARES ENDOCERVICAIS: GRUPO EM FAVO DE “MEL” (A);


GRUPO EM “PALIÇADA” (B)

FONTE: Os autores

144
TÓPICO 1 — ANATOMIA, HISTOLOGIA E FISIOLOGIA DO COLO UTERINO

• Em paliçada: nesse caso, as células estão alinhadas lateralmente e o núcleo está


localizado na base do citoplasma, aparentando uma “cerca”.
• Em “favo de mel”: quando observadas da posição apresentada na Figura
12A, identificamos os núcleos mais centralizados com escasso citoplasma,
organizados de forma semelhante ao “favo de mel” construído por abelhas.

4.1.3 Metaplasia escamosa


Gamboni (2013) explica que a metaplasia escamosa é o processo em que
uma célula madura do tipo cilíndrico mucíparo (glandulares endocervicais) se
transforma em outro tipo celular, também madura (escamoso estratificado).
Segundo Os autores, este processo começa com a proliferação de células de
reserva (Figura 13), as quais deslocam o epitélio cilíndrico para cima. Aos poucos,
elas sofrem transformações que as diferenciam em metaplasia madura, em nada
distintas das células escamosas.

Portanto, metaplasia é um processo de adaptação do epitélio diante de


agressões ou estados fisiológicos modificados, como o aumento do pH vaginal.
As características que as diferem durante seu processo de maturação e que
permitem identificá-las são (Figura 14): alta relação núcleo-citoplasma, núcleo
amplo e cromatina frouxa e citoplasma basofílico denso com projeções – que
alguns autores descrevem como “células aranha” (BRASIL, 2012).

FIGURA 13 – LOCALIZAÇÃO DAS CÉLULAS DE RESERVA

FONTE: <https://bit.ly/3g0sHuH>. Acesso em: 13 ago. 2021.

FIGURA 14 – CÉLULAS METAPLÁSICAS

FONTE: Os autores; adaptada de <https://bit.ly/3jqRYzU>. Acesso em: 29 ago. 2021.

145
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

4.1.4 Células endometriais


As células endometriais (que revestem o endométrio) podem estar pre-
sentes nos esfregaços citológicos até o décimo dia do ciclo menstrual e, nesse
caso, são consideradas componentes normais (Figura 15). O sistema de nomen-
clatura Bethesda, de 2014, preconiza que sejam relatadas apenas se presentes em
mulheres acima de 45 anos de idade.

O revestimento epitelial do endométrio, como já visto anteriormente, é


composto por células colunares, portanto, seguem um padrão citomorfológico se-
melhante, apresentando núcleo denso e hipercromático, citoplasma escasso e, em
condições normais, ausência de nucléolos (BRASIL, 2012; KOSS; GOMPEL, 2006).

FIGURA 15 – CÉLULAS ENDOMETRIAIS

FONTE: <https://bit.ly/3xg23o7>. Acesso em: 1 ago. 2021.

4.2 COMPONENTES NÃO EPITELIAIS


Apesar do objeto de estudo da citopatologia ser as células e suas alterações,
em um esfregaço, podemos encontrar outros componentes, de forma frequente,
que não constituem necessariamente uma situação de risco – a eles, damos o
nome de componentes não epiteliais. A seguir, conheceremos os mais frequentes.

4.2.1 Hemácias
Hemácias (Figura 16) podem estar presentes no esfregaço citológico do
colo de útero, apresentam-se em tom laranja. Seu significado clínico é pouco
importante, uma vez que sua presença pode decorrer de um trauma durante a
coleta. Atenção maior se dá quando as hemácias se apresentam lisadas e, nesse
caso, podem indicar necrose tumoral. Contudo, é importante frisar que esse
quadro não é fator para diagnóstico (BRASIL, 2012; KOSS; GOMPEL, 2006).

146
TÓPICO 1 — ANATOMIA, HISTOLOGIA E FISIOLOGIA DO COLO UTERINO

4.2.2 Leucócitos
Os leucócitos são as células de defesa do corpo que eliminam patógenos
diretamente pela fagocitose ou produzindo anticorpos (por exemplo, IgM, IgG
etc.). São células abundantes no sangue e presentes também nos tecidos, em
maior ou menor quantidade, variando conforme a necessidade de uma resposta
imunológica (ABBAS; LICHTMAN; PILLAI, 2015). Como é possível notar, são
agentes importantes da fisiologia, estando, portanto, presentes também nos
materiais de citologia do colo uterino.

4.2.3 Neutrófilos polimorfonucleares (PMN)


Os neutrófilos são o tipo leucocitário circulante de maior abundância.
Podem estar presentes na sua forma madura, com o núcleo polissegmentado, daí
o nome polimorfonuclear (Figura 16), ou, em situações agudas, estão presentes em
sua forma mais imatura, na qual o núcleo é em formato de bastão, e, nesse caso,
são chamados rotineiramente de bastonetes ou simplesmente bastões (ABBAS;
LICHTMAN; PILLAI, 2015).

Comumente, estão presentes em pouca quantidade no esfregaço e não


indicam inflamação. Em mulheres pós-histerectomizadas, estão praticamente
ausentes, uma vez que sua maior concentração se dá na endocérvice. Em situações
de inflamações agudas e na presença de alguns micro-organismos, apresentam-se
em grande quantidade, podendo, em alguns casos, tornar a amostra inviável para
análise (BRASIL, 2012).

FIGURA 16 – PMN E HEMÁCIAS: NEUTRÓFILOS POLIMORFONUCLEARES (SETAS PRETAS);


HEMÁCIAS (SETAS VERDES)

FONTE: Os autores

147
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

4.2.4 Linfócitos e histiócitos


Apresentam-se em condições de cervicites crônicas e a presença de vários
estágios de maturação confirma o diagnóstico de cervicite crônica folicular. Já
os histiócitos podem representar menopausa, inflamação crônica, radioterapia
ou nenhuma condição específica. Podem ter formato ovalado, fusiforme ou
redondo, geralmente com o citoplasma espumoso e o núcleo excêntrico em forma
de “feijão”. Em alguns casos, eles se fundem, formando o histiócito gigante
multinucleado (Figura 17) (BRASIL, 2012; GAMBONI, 2013).

FIGURA 17 – HISTIÓCITO GIGANTE MULTINUCLEADO: HISTIÓCITO NORMAL (SETA PRETA);


HISTIÓCITO GIGANTE MULTINUCLEADO (SETA VERDE)

FONTE: Os autores

148
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• Anatomicamente, o sistema reprodutor feminino é dividido em ovários, tubas


uterinas e útero.

• O ciclo menstrual dura, em média, 28 dias e é regulado por uma série de hor-
mônios que preparam o endométrio para a recepção de um óvulo fecundado.

• Em um exame citopatológico de colo de útero, temos componentes epiteliais e


não epiteliais.

• Leucócitos estão presentes no exame, mas nem sempre estão relacionados com
alguma doença ou processo inflamatório.

149
AUTOATIVIDADE

1 O sistema reprodutor feminino passa a ser maturado a partir da primeira


menstruação, momento em que o ciclo hormonal ovariano passa a estar
presente, permitindo que a mulher esteja preparada para uma gestação.
Sobre os hormônios envolvidos nesse ciclo, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) GnRH em nível hipotalâmico, FSH e LH em nível hipofisário e


estrógeno e progesterona em nível ovariano.
b) ( ) GnRH (hipotálamo), estrógeno e progesterona (hipófise) e FSH
(ovários).
c) ( ) O ciclo é regido somente por hormônios secretados pelos ovários,
sendo eles estrógeno e progesterona.
d) ( ) O hormônio GnRH é responsável pela maturação do epitélio
endometrial, sendo o alvo da maioria dos contraceptivos orais.

2 O útero é composto anatomicamente pelo corpo uterino, que se subdivide


em perimétrio, miométrio, endométrio e colo uterino, este subdividido em
endocérvice e ectocérvice, uma ligada, respectivamente, com o endométrio
e outra, com o canal vaginal. Analise as sentenças a seguir

I- Na endocérvice, encontra-se o epitélio escamoso estratificado queratinizado. 


II- O endométrio não sofre ação hormonal, permanecendo constante durante
toda a vida da mulher.
III- Na ectocérvice, está presente o epitélio escamoso estratificado não quera-
tinizado, que sofre ação hormonal, podendo se apresentar em diferentes
níveis de maturação no esfregaço citológico.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.


b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 Ao avaliar um material oriundo do colo de útero, é possível deparar-se com


inúmeros componentes, alguns chamados epiteliais e outros não epiteliais.
Assinale V para as verdadeiras e F para as falsas:

150
( ) Hemácias fazem parte dos componentes não epiteliais. Sua presença,
quando íntegras, não indicam nenhuma situação especial.
( ) Neutrófilos polimorfonucleares, quando presentes, são indicativos de
inflamação aguda.
(  ) São componentes epiteliais células escamosas, metaplásicas, glandulares
endocervicais e endometriais.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.

4 O ciclo menstrual é finamente regulado por uma sequência hormonal que,


ao final, resulta em descamação do endométrio, caso não haja implantação
de um óvulo fecundado. Esses hormônios são produzidos e secretados
por glândulas e órgãos específicos em uma sequência hierarquicamente
disposta. Descreva o ciclo e os hormônios envolvidos.

5 A ectocérvice é composta por epitélio estratificado não queratinizado, que


sofre ação hormonal, induzindo sua maturação. Descreva os níveis de
maturação celular e suas características.

151
152
TÓPICO 2 —
UNIDADE 3

CITOLOGIA INFLAMATÓRIA E MICRO-ORGANISMOS

1 INTRODUÇÃO

Além dos componentes descritos anteriormente, na rotina da citopato-


logia de colo de útero, pode-se deparar com outras situações de importância
clínica, como a presença de micro-organismos patogênicos, oriundo de infec-
ções sexualmente transmissíveis (ISTs) ou de desequilíbrios de microbiota. A
habilidade de identificar esses agentes patológicos é de extrema importância,
uma vez que eles também fazem parte do laudo e sua presença pode gerar um
processo inflamatório. Portanto, demonstraremos os aspectos inflamatórios na
citologia, que envolvem critérios celulares específicos para guiam o citopatolo-
gista na sua decisão.

A microbiota vaginal é rica em micro-organismos e sua maioria é incapaz


de gerar danos à saúde da mulher, muito pelo contrário, mantém o equilíbrio
do pH, impede a disseminação de micro-organismos potencialmente lesivos e
permite as condições ideais para o deslocamento do espermatozoide. Entretanto,
em situações de mudança de pH, por exemplo, esse equilíbrio é rompido,
ocasionando o que chamamos de desvio de microbiota.

Quando falamos em desvio de microbiota, não necessariamente falamos


em inflamação. Para chamar um quadro de inflamatório, são necessárias
características celulares específicas que demonstram uma reação epitelial a
situação. É possível, nesse contexto, a presença de inflamação sem a presença de
um agente específico. Vistas essas situações, conheceremos melhor como ocorrem
esses processos inflamatórios.

2 CITOLOGIA INFLAMATÓRIA
Kumar et al. (2010) descrevem o processo inflamatório como:

Essencial para a sobrevivência dos organismos é sua habilidade para


ficar livre dos tecidos danificados ou necróticos e invasores estranhos,
tais como micro-organismos. A resposta do hospedeiro que executa
esses objetivos é chamada de inflamação. Esta é uma resposta funda-
mentalmente protetora, destinada a livrar os organismos da causa
inicial da injúria celular (p. ex., micro-organismos, toxinas) quanto
das consequências de tal injúria (p. ex., células e tecidos necróticos).

153
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

Essa resposta pode gerar um processo conhecido como retroplasia, ou


seja, a redução dos processos metabólicos das células. Tais lesões também com-
prometem a troca de água entre as células e o meio em que vivem, ocasionando
acúmulo de água intracelular. Esse acúmulo gera vacuolização no citoplasma. A
diluição das proteínas pelo excesso de água gera palidez no citoplasma quando
corado, perdendo a afinidade tintorial e, muitas vezes, assumindo tons acinzenta-
dos ou avermelhados (pseudoeosinofilia). Além disso, em alguns casos, ao redor
dos núcleos, podem-se notar pequenos halos bem delimitados (BRASIL, 2012).

No núcleo, podemos observar a diminuição do seu volume e pregueamen-


to da membrana. Sua afinidade pelo corante também é alterada, devido à degene-
ração de proteínas ligadas ao DNA, resultando em hipercromasia ou hipocroma-
sia. Também ocorre alteração na solubilidade das proteínas, levando a um aspecto
borrado, pela perda de definição entre cromatina e para-cromatina (BRASIL, 2012).

2.1 VACUOLIZAÇÃO DO CITOPLASMA


Vacúolos indicam degeneração, que pode resultar de um processo infla-
matório ou por apoptose. Para saber do que se trata, é necessário entender o con-
texto da lâmina. A Figura 18 demonstra vacuolização degenerativa inflamatória
(KUMAR et al., 2010).

2.2 HALO PERINUCLEAR


Processos inflamatórios podem ocasionar retração do núcleo, devido ao
desequilíbrio hidroeletrolítico, gerando pequenos halos (Figura 18). Devemos
ficar atentos a essa formação para que não se faça confusão com os halos causados
pelo papilomavírus humano (HPV) (BRASIL, 2012; GAMBONI, 2013).

FIGURA 18 – VACÚOLOS CITOPLASMÁTICOS E HALO PERINUCLEAR INFLAMATÓRIO:


VACÚOLOS CITOPLASMÁTICOS (A); HALOS PERINUCLEARES (B)

FONTE: Os autores

154
TÓPICO 2 — CITOLOGIA INFLAMATÓRIA E MICRO-ORGANISMOS

2.3 PSEUDOEOSINOFILIA
A pseudoeosinofilia é uma característica em que o citoplasma das células
se cora de laranja, devido a alterações bioquímicas. Na Figura 19, é possível
observar nitidamente células escamosas superficiais que naturalmente se coram
em azul, tingidas de laranja. O caso reforça nitidamente o contexto de inflamação,
uma vez que reúne todos os critérios citados até o momento (BRASIL, 2012).

2.4 CERVICITE FOLICULAR E VAGINITE ATRÓFICA


O termo cervicite induz o entendimento de “inflamação da cérvice”,
sendo uma das formas de inflamação a cervicite folicular ou linfocítica, que
consiste na presença de numerosos linfócitos, em diferentes níveis de maturação
e macrófagos no exame citológico (GAMBONI, 2013).

Anteriormente, vimos a influência hormonal no epitélio da ectocérvice,


maturando as células escamosas. Quando o ciclo hormonal é modificado ou
interrompido, como ocorre na pós-menopausa, temos um quadro conhecido
como atrofia (Figura 19). O epitélio atrofiado é mais fino, menos resistente e,
ainda, contribui para a modificação da microbiota vaginal. Esse conjunto de
situações permite uma maior susceptibilidade a processos inflamatórios. Quando
ocorre inflamação em um quadro atrófico, temos a presença de vaginite atrófica
(GAMBONI, 2013).

Por ser um fenômeno natural do envelhecimento, é comum encontrar


atrofia na prática da citologia. Nesses casos, é comum encontrar alterações
regenerativas/degenerativas, eosinofilia, alterações cromatínicas e, em alguns
casos, nucléolos (GAMBONI, 2013).

FIGURA 19 – VAGINITE ATRÓFICA: PRESENÇA DE CÉLULAS IMATURAS COM ALTA RELAÇÃO


N/C, EVIDENCIANDO ATROFIA

FONTE: Os autores

155
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

2.5 HIPERQUERATOSE E PARAQUERATOSE


São alterações celulares ligadas a irritações crônicas, prolapso uterino, tra-
tamentos com alça diatérmica ou laser e até reação secundária a hipoestrogenismo.

Hiperqueratose caracteriza-se pela presença de camada granular e


pela formação de queratina – o epitélio escamoso da ectocérvice/vagina é não
queratinizado –, sendo que as células, nesse caso, apresentam-se como células
maduras anucleadas ou com núcleos fantasma, e citoplasma de tonalidade
alaranjada (Figura 20). Quando essas células apresentam núcleo, é denominado
paraquetose.

FIGURA 20 – HIPERQUERATOSE: NOTA-SE A AUSÊNCIA DO NÚCLEO E A TONALIDADE


EOSINOFÍLICA

FONTE: Os autores

3 REPARO TECIDUAL
Uma vez que o processo é essencialmente protetor (KUMAR et al., 2010),
precisamos entender que essa proteção não é apenas voltada à eliminação de
agentes patogênicos, mas que, findando o estímulo nocivo, há necessidade de
reparar o tecido lesado, seja qual for o motivo da lesão. Nesse ponto, normalmente
ao fim da cascata inflamatória.

Quando há perda de tecido, neutrófilos são recrutados ao local da injúria,


em conjunto com macrófagos, com o objetivo de eliminar células mortas e
demais detritos. A regeneração inicia quando ocorre no epitélio escamoso, com a

156
TÓPICO 2 — CITOLOGIA INFLAMATÓRIA E MICRO-ORGANISMOS

proliferação de células basais, e, quando em endocérvice, ocorre a proliferação de


células de reserva. Esse movimento tem a finalidade de cobrir o local da lesão, e
essas células imaturas seguem se desenvolvendo até que alcancem a maturação
(BRASIL, 2012).

Ao mesmo passo, fibroblastos são recrutados e se proliferam, inicial-


mente, ao lado de células inflamatórias e próximo a novas formações vascula-
res. Conforme os fibroblastos se proliferam, o tecido novamente é reestruturado
até que, ao final do processo, o estroma está regenerado e funcional (BRASIL,
2012; KUMAR et al., 2010).

É possível observar, na Figura 21, as células envolvidas na regeneração,


que têm como característica uma boa coesão (estão “juntas”), formando uma
monocamada; os núcleos são de tamanho médio, podendo ou não conter nuclé-
olos e todos eles parecem estar apontando para a mesma direção. A cromatina é
granulosa e bem distribuída e o contorno nuclear (borda) é livre de endentamen-
tos e discretamente espessado. O citoplasma é delicado e pálido (BRASIL, 2012).

FIGURA 21 – CÉLULAS DE REPARO

FONTE: <https://bityli.com/1QBHI>. Acesso em: 29 ago. 2021.

Podemos observar que, apesar das semelhanças entre si, é possível


diferenciar e precisar o sítio de cada tipo de epitélio. Cada um deles tem sua
função e especificidade dentro do contexto fisiológico ao qual respondem;
portanto, saber as características de cada tipo celular é fundamental para um bom
desempenho na rotina laboratorial.

157
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

4 MICRO-ORGANISMOS
O contato com o exterior torna o canal cervicovaginal propício a infecções
e agressões. Contudo, observa-se que há um complexo ecossistema, que atua
de forma dinâmica – em outras palavras, ocorre um equilíbrio entre germes
saprófitos e os mecanismos de defesa locais. A simples presença desses micro-
organismos não constitui inflamação; para que ocorra um processo inflamatório,
é necessária a presença de agentes patogênicos, como vírus, fungos, bactérias,
protozoários e, raramente, parasitas oriundos de contaminação (GAMBONI,
2013; KOSS; GOMPEL, 2006).

A anatomia da zona vulvar faz com que os pequenos lábios vaginais


atuem como uma barreira física, impedindo a ascensão dos germes, auxiliando
na manutenção da temperatura e do pH. A produção constante de muco forma
uma barreira entre o canal cervical e o corpo uterino, ele também atua como
fator umidificador, uma vez que na sua composição estão presentes água,
mucopolissacarídeos, glicorinidases e eletrólitos. Tais elementos contribuem para
o desenvolvimento da microbiota saprófita do local, principalmente os bacilos
de Döderlein (lactobacilos acidófilos), que também atuam na manutenção do pH
através da produção de ácido láctico (BRASIL, 2012; GAMBONI, 2013).

Em um microssistema dinâmico, devemos entender que há presença de


diversos micro-organismos convivendo em harmonia, portanto, é correto dizer
que estamos diante de um poli microbiota, na qual, segundo Gamboni (2013),
estão presentes:

• Aeróbios Gram-positivos: lactobacilos, Corynebacterium, estreptococos não


hemolíticos, enterococos, Staphylococcus epidermidis e Staphylococcus aureus.
• Aeróbios Gram-negativos: Escherichia coli, Gardnerella vaginalis.
• Anaeróbios: Clostridium, Peptostreptococcus, Bacteroides e Fusobacterium.

A citologia não é o padrão-ouro para detecção dos micro-organismos


patogênicos, porém, em determinados casos, é possível determinar qual é o
micro-organismo presente e que possa ser causador da doença, devido a seu
aspecto morfológico.

4.1 BACTÉRIAS
Entre os micro-organismos patogênicos, a seguir, destacamos os principais
tipos de bactérias.

4.1.1 Bacilos de Döderlein (lactobacilos)


São os mais abundantes e não configuram infecção, ou seja, fazem parte da
microbiota normal da vagina. São produtores de enzimas que causam a lise das
células intermediárias, um processo chamado de citólise, o qual resulta na liberação
158
TÓPICO 2 — CITOLOGIA INFLAMATÓRIA E MICRO-ORGANISMOS

de glicogênio, metabolizado em ácido láctico. Esse processo é o mantenedor do


pH vaginal, que gira em torno de 3 a 4,2. A citólise é reconhecida na lâmina pela
presença de núcleos soltos (núcleos desnudos), que podem, clinicamente, estar
relacionados com corrimento translúcido (BRASIL, 2012). Morfologicamente, são
identificados pelo formado em bastão alongado de coloração azulada, devido ao
tingimento pelo corante hematoxilina (Figura 22).

FIGURA 22 – LACTOBACILOS. OBSERVA-SE O FORMATO ALONGADO EM FORMA DE “BASTÃO”

FONTE: Os autores

4.1.2 Gardnerella vaginalis


São coco bacilos Gram variáveis, que se proliferam em condições
de desequilíbrio da microbiota, por exemplo, com a alcalinização do meio.
Cerca de 40% das mulheres que apresentam esse quadro microbiológico são
assintomáticas, ou seja, não apresentam nenhuma alteração clinicamente visível.
Contudo, quando há presença de sinais e sintomas, podemos listar: corrimento
acinzentado, fluido, homogêneo e com odor de peixe estragado, por vezes, se
apresenta com aspecto bolhoso. O odor desagradável se deve à ação das enzimas
cadaverina e putricina, que metabolizam aminas voláteis (BRASIL, 2012).

Esses micro-organismos se aderem ao citoplasma celular, cobrindo-o total


ou parcialmente, formando um aspecto de “areia” sobre a célula (Figura 23). Esse
achado denomina-se de célula-guia ou clue cell (BRASIL, 2012; GAMBONI 2013).

159
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

FIGURA 23 – “CÉLULA-GUIA” NA PONTA DA SETA; OBSERVA-SE O ASPECTO DE GRÃOS DE


AREIA SOBRE A CÉLULA, EVIDENCIANDO A PRESENÇA DE GARDNERELLA VAGINALIS

FONTE: Os autores

4.1.3 Cocos e bacilos


Além dos micro-organismos vistos anteriormente, com frequência,
também podemos encontrar na rotina uma microbiota composta, sobretudo,
por cocos e bacilos (Figura 24). Nesse caso, chamamos de microbiota mista. A
presença dessas bactérias pode ou não configurar um quadro patológico – caso
ocorra esse padrão de microbiota em mulheres jovens, pode ser uma alteração
patológica da microbiota, uma vez que, até os 45 anos de idade, esperamos a
presença de lactobacilos (BRASIL, 2012).

Contudo, se a presença desse padrão ocorre em mulheres com idade


superior a 45 anos, pode-se entender como normal, devido à virada hormonal
na pré-menopausa, menopausa e pós-menopausa, ao modificar o padrão celular,
permite também a modificação da microbiota (GAMBONI, 2013). É importante
atentar para uma diferença crucial entre a microbiota mista de cocos/bacilos, em
que as bactérias permanecem ao “fundo da lâmina”, e a Gardnerella vaginalis, na
qual as bactérias recobrem as células.

4.1.4 Actinomyces
Trata-se de uma bactéria filamentosa, Gram-negativa. Comum em
esfregaços citológicos de mulheres usuárias de dispositivos intrauterinos (DIU),
normalmente identificadas como estruturas condensadas no centro com as boras
em aspecto filamentoso, vulgarmente conhecidos como cotton balls, ou bolas

160
TÓPICO 2 — CITOLOGIA INFLAMATÓRIA E MICRO-ORGANISMOS

de algodão. Após coradas, assumem tons que azulados. Sua presença causa
processo inflamatório intenso, com leucócitos polimorfonucleares e vacúolos
citoplasmáticos característicos (KOSS; GOMPEL, 2006) (Figura 24).

FIGURA 24 – ACTINOMYCES

FONTE: <https://bit.ly/2Z95mlj>. Acesso em: 29 ago. 2021.

4.2 MICOSES (FUNGOS)


Entre os micro-organismos patogênicos, a seguir, veremos alguns
exemplos de fungos.

4.2.1 Candida sp
O ambiente rico em glicogênio, umidade e temperatura constantes é ideal
para o desenvolvimento de fungos. No caso da região urogenital feminina, a maior
propensão é o desenvolvimento de Candida sp, fungo que é parte da microbiota,
porém, em situações de equilíbrio, não é capaz de se desenvolver a ponto de
causar sintomas, ou seja, de se tornar patogênica. Entretanto, em momentos
ideais, com desequilíbrio do pH, aumento da disponibilidade de glicogênio,
temperatura e umidade mais elevadas, queda na imunidade ou alterações
hormonais que possam alterar o microambiente, a Candida sp multiplica-se de
forma mais eficiente e ocasiona sinais clínicos relevantes (GAMBONI, 2013).

Pode se apresentar em duas formas: esporos ou pseudo-hifas (Figura 25),


ambas são relatados no laudo. Quanto aos sinais, durante a análise da região
genital, o profissional ou paciente pode verificar a presença de inchaço da vulva e/
ou lábios vaginais, corrimento branco com grumos ocasionais, colo hiperemiado.
Já os sintomas podem ser sensibilidade ao toque, ardência ao urinar e coceira
regional. Esse quadro é conhecido como vaginite micótica ou, mais popularmente,
candidíase (BRASIL, 2012).

161
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

FIGURA 25 – CANDIDA SP: PRESENÇA DA FORMA FILAMENTOSA (PSEUDO-HIFAS) (A); FORMA


LEVEDURIFORME (B)

FONTE: Os autores

4.3 PROTOZOÁRIOS
Entre os micro-organismos patogênicos, mais especificamente os
protozoários, destacamos o Trichomonas vaginalis, conforme descrito a seguir.

4.3.1 Trichomonas vaginalis


O Trichomonas vaginalis é um protozoário flagelado, encontrado com
frequência no trato genital feminino. Trata-se de uma infecção sexualmente
transmissível (IST) emergente e que não faz parte da microbiota natural feminina.
Apesar de a transmissão ser frequentemente por via sexual, o compartilhamento
de toalhas ou roupas íntimas com uma pessoa infectada também pode gerar
infecção (KOSS; GOMPEL, 2006).

Quanto aos sinais e sintomas, algumas pacientes podem ser assintomáticas


ou apresentar sintomas intermitentes, mas, quando ocorrem, demonstra
corrimento verde-acinzentado, fétido e bolhoso. O colo de útero apresenta
petéquias (pontilhados hemorrágicos), situação conhecida como colpite macularis,
que alguns autores também denominam como colo em aspecto de morango.
Quando presente, a infecção este microrganimo é facilmente identificado nos
exames a fresco de urina e secreção, nos quais ele se movimenta livremente
(GABONI, 2013; KOSS; GOMPEL, 2006).

Nos esfregaços citológicos ele se apresenta, geralmente, de forma ovalada,


corado palidademente em azul com núcleo excêntrico (Figura 26). Quando o
material é bem fixado, é possível identificar o flagelo (KOSS; GOMPEL, 2006).

162
TÓPICO 2 — CITOLOGIA INFLAMATÓRIA E MICRO-ORGANISMOS

FIGURA 26 – TRICHOMONAS VAGINALIS

FONTE: Os autores

4.4 INFECÇÕES VIRAIS


Entre os micro-organismos patogênicos, também estão as infecções virais.

4.4.1 Herpes vírus


O herpes vírus é um vírus de DNA, representado por uma molécula de
dupla fita de DNA, envolta por um capsídeo icosaédrico apresentando envelope
(STEINER, 2018). Tipicamente dividido em herpes vírus simples 1 e 2 (HSV-
1 e HSV-2), a diferenciação é realizada de forma sorológica, embora sejam
geneticamente semelhantes. O curso infeccioso se dá por uma infecção aguda,
a qual é representada clinicamente pelo aparecimento de vesículas (bolhas)
repletas de líquido hialino ou amarelado. Na remissão da doença, entra em estado
de latência por prazo indeterminado, até ser reativado e novamente agudizar.
A região pode ficar dolorida, edemaciada e avermelhada, em decorrência da
resposta inflamatória (KUMAR et al., 2010).

Essas lesões iniciais se dão na epiderme, que é o local de entrada do vírus,


após se disseminam para os neurônios sensoriais presentes nesse primeiro local
da infecção. Pelos axônios nucleocapsídeos virais, são transportados até os corpos
neuronais, onde entra em estado de latência. O HSV-1 e HSV-2 são transmitidos,
principalmente, pelo contato com outra pessoa infectada e com lesões ativas, tendo
sua maior incidência nas mucosas orais e genitais, sendo, então, classificadas
como infecções sexualmente transmissíveis (IST) (KUMAR et al., 2010).

163
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

Apesar de o HSV, na maioria dos casos, não causar maiores complicações


no hospedeiro imunocompetente, acaba sendo alvo de diagnósticos frequentes
nos laboratórios de análises clínicas e citologia. É importante conhecermos o seu
curso infeccioso e como ele se apresenta nas células, para que não haja confusão
com lesões pré-neoplásicas e neoplásicas de colo de útero.

Na citopatologia do colo uterino, encontramos alterações na morfologia


celular características pela infecção do HSV. Os principais critérios são (BRASIL,
2012):

• citomegalia (células gigantes);


• cariomegalia (núcleos grandes);
• cromatina rarefeita, gerando um aspecto de “vidro fosco”;
• borda nuclear espessada;
• multinucleação e amoldamento.

Podemos observar todos os critérios expostos na Figura 27.

FIGURA 27 – HERPES VÍRUS SIMPLES

FONTE: <https://bit.ly/3iUWbe3>. Acesso em: 22 jul. 2021.

4.4.2 Papilomavírus humano (HPV)


É o mais importante patogênico relacionado com o colo uterino, pois, em
especial, tem alto poder, não só de infectar, mas de causar câncer do colo do
útero. Por isso, será amplamente estudado, para entendermos e relacionarmos as
lesões precursoras do câncer de colo do útero e a morfologia celular apresentada,
que sofre alterações diretamente relacionadas com a presença do HPV.

164
TÓPICO 2 — CITOLOGIA INFLAMATÓRIA E MICRO-ORGANISMOS

Os HPVs apresentam material genético composto por DNA e são


subtipificados conforme sua sequência de DNA. Também são segregados em
dois grupos: de baixo risco oncogênico e alto risco oncogênico. É interessante
ressaltar que existem mais de 100 tipos de HPVs, porém poucos estão diretamente
relacionados ao câncer de colo de útero (BRASIL, 2012; GAMBONI 2013).

Entre os subtipos de alto risco, o HPV-16 e HPV-18 são os mais incidentes,


estando presentes em mais de 60% dos casos de câncer invasivos e 50% dos
adenocarcinomas, ambos do colo uterino. Já os HPVs de baixo risco estão
presentes em 90% dos condilomas (verrugas) (GAMBONI, 2013).

Genomicamente, apresentam estrutura semelhantes. Ressalta-se que os


subtipos de baixo risco oncogênico estão presentes na forma epissomal, ou seja,
não se integram ao DNA do hospedeiro, enquanto os HPVs de alto risco oncogê-
nico integram seu DNA ao do hospedeiro, causando, assim, uma desestruturação
proteica no material genético. O DNA dos HPVs é dividido em três regiões: as duas
primeiras denominadas regiões de leitura aberta precoce “E” (early) e como “L”, de
“late” (tardio), já a terceira parte é um código regulatório que não expressa proteí-
nas. Durante seu ciclo vital, as proteínas E1 a E7 ficam responsáveis pela replicação
viral, enquanto as L1 e L2 codificam proteínas estruturais (GAMBONI, 2013).

A ação desses genes pode ser resumida em: hiperexpressão de E6 e


E7, somada à inativação da E2, leva à ativação da telomerase, à instabilidade
genômica, à imortalização das células e à proliferação desregrada, constituindo
todos os elementos necessários para o desenvolvimento de um fenótipo maligno
da célula (GAMBONI, 2013).

Em sua maioria, o HPV é transmitido pelo contato íntimo desprotegido,


sendo, então, uma IST de extrema importância e relevância na saúde pública.
Alguns fatores de risco para a contração do HPV são múltiplos parceiros sexuais e
promíscuos, e início precoce das relações sexuais (BRASIL, 2012). Além do uso de
preservativos nas relações sexuais, manter um comportamento mais cuidadoso
auxilia na diminuição da exposição ao risco de infecção, diminuindo o risco de
desenvolver câncer de colo de útero.

A grande maioria das mulheres infectadas pelos HPVs de baixo risco


oncogênico não tem uma lesão progressiva, ou seja, não correm o risco de
desenvolver câncer de colo uterino. Por outro lado, as mulheres acometidas pelos
HPVs de alto risco oncogênico têm cerca de 75% de chances de não desenvolver
lesões, porém, entre as que apresentarão lesões no colo uterino, 33% regridem,
41% serão persistentes e 25% progridem. Entre os casos progressivos, 10%
evoluem para carcinoma in situ e 1% para câncer invasivo (BRASIL, 2012).

Clinicamente, o HPV apresenta tropismo por células epiteliais cutâneas


e mucosas, resultando em condilomas (verrugas) visíveis a olho nu, geralmente
observadas na região ano-genital. Também é capaz de ficar em estado de latência
e, nesse caso, as técnicas convencionais de detecção (citologia e/ou biópsia) não são

165
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

capazes de identificar a presença sendo necessário utilizar técnicas moleculares


como reação em cadeia da polimerase (PCR), capturando, assim, o DNA do
vírus no material. Em 70% dos casos, temos a condição de infecção subclínica
conhecida como condiloma plano, na qual a área acometida só é visualizada com
a aplicação de ácido acético durante a colposcopia e no exame citológico de rotina
e nas biópsias (BRASIL, 2012).

Devido à importância da detecção da infecção pelo HPV, é primordial que


o citopatologista saiba identificar os sinais (Figura 28) que demonstram a ação
desse agente patogênico no epitélio. São características citológicas da infecção
pelo HPV:

• Coilocitose: efeito específico da infecção pelo HPV, porém presente apenas


em cerca de 30% dos casos. Trata-se de uma alteração em células escamosas
superficiais e intermediárias. A célula apresenta aspecto descorado, lembrando
uma cavitação com bordas bem delimitadas na região perinuclear, bem como
aumento do núcleo e hipercromasia. Em alguns casos, ocorre também a
granulação da cromatina. Essas características são resultado da expressão da
proteína viral E4, que age desestabilizando o citoesqueleto (ZIMMER; TONET;
MEZZOMO, 2019).
• Disqueratose: está relacionada com a alteração no padrão de queratinização da
célula, ficando evidente a coloração alaranjada e densa.
• Macrocitose: em alguns casos, as células podem sofrer alteração no tamanho
e se tornar “gigantes”, com alteração do padrão de coloração do citoplasma.

FIGURA 28 – EFEITOS CITOPÁTICOS DO HPV: COILÓCITOS (A), NOTA-SE O HALO PERINUCLEAR


COM BORDAS ESPESSAS E NÚCLEOS AUMENTADOS DE TAMANHO; DISQUERATOSE (B),
CITOPLASMA DENSO DE COLORAÇÃO ALARANJADA, FICANDO EVIDENCIADAS ALTERAÇÕES
NUCLEARES (HIPERCROMASIA E CONDENSAÇÃO DA CROMATINA)

FONTE: Os autores

166
TÓPICO 2 — CITOLOGIA INFLAMATÓRIA E MICRO-ORGANISMOS

Ao conhecer esses sinais e saber encontrá-los em uma amostra, o


citologista contribui amplamente com a saúde da mulher, uma vez que, detectada
uma lesão, a paciente será acompanhada pelo sistema de saúde em todos os
processos, impedindo a progressão da lesão até que se torne um câncer, não
sendo preciso falar no sofrimento e no desgaste físico e emocional poupados. Do
lado administrativo, temos a economia de recursos aplicados, gerando, assim,
melhores investimentos nas campanhas.

Sabendo a importante correlação entre os HPVs e o câncer de colo uterino,


surgiram pesquisas para o desenvolvimento de vacinas, a fim de prevenir o
aumento de casos dessa doença. No Brasil, existem dois tipos de vacinas contra o
HPV, ambas registradas e aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa). Em 2014, o Sistema Único de Saúde (SUS) incluiu, com atualização em
2017, a vacinação de meninas com idade entre 9 e 14 anos e meninos entre 11 e
14 anos – faixas etárias escolhidas com base em ensaios clínicos, com resultados
apontando que, nelas, a produção de anticorpos é mais eficiente e pela exposição
ao vírus ser menor nessa fase de vida (INCA, 2021).

As vacinas disponíveis no SUS são da Merck Sharp & Dohme (Gardasil),


que é tetravalente, conferindo proteção contra os subtipos virais HPV-6, HPV-11,
HPV-16 e HPV-18, e a bivalente da empresa GlaxoSmithKline (Cervavix), a qual
confere proteção contra os subtipos HPV-16 e HPV-18 (alto risco oncogênico)
(INCA, 2021).

Desse modo, conclui-se as características inerentes à inflamação, quando


vista sob a ótica da citologia oncótica, seus efeitos celulares e compostos do
esfregaço. Conhecemos também os principais micro-organismos encontrados na
rotina e de relevância clínica, como o HPV, responsável pela quase totalidade dos
casos de câncer do colo de útero.

DICAS

A Organização Mundial da Saúde, com o objetivo de disseminar informações


sobre o câncer de colo de útero e o exame preventivo, desenvolveu um atlas digital,
disponível em: https://screening.iarc.fr/atlascyto.php?lang=4.

167
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• Os processos inflamatórios evidenciam características específicas nas células


do colo uterino.

• Além do estudo celular, a citopatologia do colo uterino diagnostica infecções


por fungos, protozoários, vírus e bactérias.

• O papilomavírus humano (HPV) é o principal causador isolado das lesões de


colo uterino.

• Existem vacinas profiláticas contra o HPV disponíveis no SUS.

168
AUTOATIVIDADE

1 Sabendo que o processo inflamatório faz parte do nosso sistema de defesa e


que age de forma essencialmente protetora e reparativa, não há necessidade
de alarde quando identificado em lâmina. Contudo, essa segurança só é
possível quando estamos respaldados em critérios sólidos e bem definidos.
Considerando os critérios inflamatórios que ditam a presença de inflamação
no material examinado, marque a alternativa CORRETA.

a) ( ) As células epiteliais, ao reagirem a um processo inflamatório, podem


apresentar aumento do núcleo e citoplasma bizarro, configurando um
quadro de inflamação exacerbada.
b) ( ) Os critérios inflamatórios celulares são descritos como núcleo
discretamente aumentado, podendo ou não apresentar pequenos
halos na região perinuclear.
c) ( ) As células epiteliais não reagem a processos inflamatórios, cabendo às
células do sistema imunológico fazê-lo.
d) ( ) Citologia inflamatória não é o foco do diagnóstico, sendo dispensável
descrever inflamação nos laudos.

2 O papilomavírus humano (HPV) é o principal agente isolado causador


de câncer de colo do útero e de lesões benignas da região anogenital.
Constitui um risco presente na vida de homens e mulheres com vida sexual
ativa, requerendo cuidados extensivos para reduzir sua disseminação e,
consequentemente, evitar o aumento de cânceres de colo de útero. Sobre os
fatores de risco e as medidas profiláticas contra o HPV, analise as sentenças
a seguir:

I- Uso de álcool e drogas psicotrópicas favorecem a infecção pelo HPV,


devido ao tropismo desse vírus pelo neuroepitélio periférico. O uso dessas
substâncias reduz a atividade metabólica dos neurônios, permitindo a
entrada do vírus por pinocitose.
II- Comportamento de risco como múltiplos parceiros sexuais e início
precoce da vida sexual são os principais fatores de risco de infecção pelo
HPV. Contudo, o uso de preservativos e a vacinação auxiliam na proteção
contra esse agente patológico.
III- A maioria das mulheres infectadas pelos subtipos HPV-6 e HPV-11,
obrigatoriamente, sofrerá a progressão da lesão para câncer, pois se trata
de subtipos de alto risco oncogênico.

Assinale a alternativa CORRETA:

169
a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 Diversos micro-organismos causam doenças importantes na região genital,


sendo muitos deles infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) e causando
sintomas como corrimentos e dispareunia, que podem até evoluir para
situações mais graves. Classifique V para as sentenças verdadeiras e F para
as falsas:

( ) Trichomonas vaginalis é um protozoário presente nas amostras citológicas


com baixa frequência. Clinicamente, apresenta corrimento branco e
grumoso, edema da vulva e coceira.
( ) Alguns micro-organismos vivem em equilíbrio constituindo a microbiota
vaginal. No entanto, alterações no pH ou baixa imunidade podem
permitir que alguns deles se desenvolvam descontroladamente, gerando
alguns sintomas. Um exemplo de desvio de microbiota ocasionada por
desequilíbrio é a presença de Gardnerella vaginalis.
( ) Candida sp é um fungo comumente encontrado nas amostras e sempre
deve ser considerado normal, uma vez que é parte da microbiota
transitória da vagina.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.

4 Descreva as características citológicas e clínicas apresentadas em um


quadro de infecção pelo herpes vírus humano (HSV).

5 Existem mais de 100 tipos de HPVs, embora poucos subtipos estejam


fortemente ligados ao desenvolvimento das lesões e cânceres. Descreva
brevemente os principais subtipos envolvidos e seu risco para o
desenvolvimento de lesões.

170
TÓPICO 3 —
UNIDADE 3

LESÕES PRÉ-NEOPLÁSICAS E MALIGNAS DE COLO


DE ÚTERO

1 INTRODUÇÃO

Neste tópico, abordaremos o principal alvo da citologia oncótica para o


colo de útero: o rastreamento das lesões pré-neoplásicas e malignas, descrevendo
os aspectos citomorfológicos e correlacionando, sempre que possível, com a
histologia, a fim de demonstrar em todos os níveis o acometimento do epitélio.

Serão apresentados a lesão de baixo grau (LSIL), a lesão de alto grau (HSIL),
os carcinomas do colo uterino e os adenocarcinomas do colo de útero, importantes
quadros que fazem parte do dia a dia do analista, sempre acompanhados de
comentários clínicos a respeito das situações e as condutas preconizadas pelo
Ministério da Saúde.

Por fim, trataremos da produção e padronização dos laudos, uma vez que,
sabendo identificar cada situação, faz-se necessária clareza na comunicação com
o médico, para que não haja ambiguidade nas informações prestadas.

2 ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS
O câncer de colo de útero é o mais incidente em escala global, sendo um
importante fator de mortalidade e morbidade feminino, atrás apenas do câncer
de mama. Nos países em desenvolvimento que não existem programas de
rastreamento ou em que há baixo investimento, a incidência é sensivelmente mais
alta, levando muitas mulheres à morte, que seria evitável se houvesse diagnóstico
precoce e educação da população (BRASIL, 2012).

No Brasil, em 2020, foram estimados cerca de 16.710 casos com mortali-


dade na faixa de 5,33 a cada 100 mil mulheres. Esses números colocam o país em
um patamar melhor do que os países em desenvolvimento, porém ainda abaixo
de países com programas de rastreamento bem estabelecidos (INCA, 2021).

Quando estratificamos os dados por região, a maior taxa de mortalidade


é vista na região Norte (26,24/100 mil), seguida das regiões Nordeste (16,10/100
mil) e Centro-Oeste (12,35/100 mil). A quarta e quinta taxas de mortalidade são
encontradas no Sul (12,60/100 mil) e no Sudeste (8,61/100 mil), evidenciando uma
melhor capacidade de detecção e tratamento (INCA, 2019).

171
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

FIGURA 29 – TAXA DE MORTALIDADE POR REGIÕES

FONTE: <https://bit.ly/3A0fsSn>. Acesso em: 16 jul. 2021.

3 LESÕES INTRAEPITELIAIS ESCAMOSAS DO COLO


UTERINO
As lesões intraepiteliais escamosas do colo uterino correspondem a
lesões proliferativas com perda de diferenciação em maior ou menor grau, as
quais podem ou não substituir toda a extensão do epitélio escamoso presente na
cérvice. Como já vimos anteriormente, o HPV é o principal agente na progressão
das lesões, podendo evoluir para câncer (BRASIL, 2012; GAMBONI, 2013).

Historicamente, a nomenclatura para as lesões pré-neoplásicas e malignas


do colo uterino sofreu diversas alterações. Em 1943, George N. Papanicolaou
descreveu um sistema de classes, que contava com uma graduação de I a V.
Posteriormente e devido a confusões, a OMS lançou uma nova nomenclatura,
proposta por Reagan, contemplando, de forma mais agrupada, as condições
citológicas. Nessa nomenclatura, eram utilizados os termos displasia leve,
displasia moderada e displasia acentuada/carcinoma in situ. Em 1967, Richart,
estudando a história do câncer do colo uterino, desenvolveu um novo conceito:
neoplasia intraepitelial cervical (NIC). Tal classificação se dá histologicamente
em NIC I, II e III, que correspondem, na citologia, à displasia leve, moderada e
acentuada, respectivamente (BRASIL, 2012).

Já em 1988, vendo a disseminação do método de Papanicolaou para


o rastreamento do câncer de colo uterino, houve a criação de um sistema
de nomenclaturas, para servir de padrão internacional, nasceu o Sistema

172
TÓPICO 3 — LESÕES PRÉ-NEOPLÁSICAS E MALIGNAS DE COLO DE ÚTERO

Bethesda de terminologia e classificação diagnóstica para amostras citológicas


cervicovaginais, tendo sido atualizado em 2014. Esse sistema determina que as
displasias leves são agrupadas como lesões intraepiteliais de baixo grau (LSIL); as
displasias moderadas em lesões intraepiteliais de alto grau (HSIL); e as displasias
acentuadas como carcinomas in situ (BRASIL, 2012).

QUADRO 1 – SISTEMA DE CLASSIFICAÇÃO DAS LESÕES PRÉ-NEOPLÁSICAS DO COLO UTERINO

OMS (1974) Richart (histologia) Bethesda (citologia)

Displasia leve NIC I Baixo grau

Displasia moderada NIC 2 Alto grau

Displasia acentuada/carcinoma
NIC 3 Alto grau
in situ

FONTE: Adaptado de Brasil (2012)

As graduações das lesões são baseadas em uma progressão histológica das


lesões e sua perda de diferenciação, por exemplo, quando o estrato mais superior
está acometido, temos uma lesão intraepitelial de baixo grau, uma vez que apenas
células maduras estão acometidas pela lesão. Conforme essa lesão avança para os
estratos mais próximos à lâmina basal e acomete células menos maduras, temos
uma lesão intraepitelial de alto grau (BRASIL, 2012). Na Figura 30, podemos
visualizar essa situação, que deve ser cuidadosamente analisada para esclarecer
o processo de evolução de uma lesão pré-neoplásica até malignidade.

FIGURA 30 – ILUSTRAÇÃO ESQUEMÁTICA DA EVOLUÇÃO DAS LESÕES PRÉ-NEOPLÁSICAS DE


COLO UTERINO

FONTE: Adaptada de Brasil (2012)

173
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

Segundo Kumar et al. (2010, n.p.), o conceito de diferenciação celular é


“O termo diferenciação refere-se à extensão com que as células do parênquima
neoplásico lembram as células parenquimatosas normais correspondentes, tanto
morfologicamente quanto funcionalmente, a falta de diferenciação é denominada
anaplasia”.

Portanto, em uma lesão intraepitelial de baixo grau (LSIL, sigla do inglês


low squamous intraepitelial lesion), temos células bem diferenciadas semelhantes ao
epitélio escamoso original, ao passo que, em lesões de alto grau (HSIL, sigla do
inglês high squamous intraepitelial lesion), essas características se perdem, devido
às grandes alterações a nível molecular. Observando-se a Figura 30, é importante
reparar que a diferenciação ou maturação celular parte da lâmina basal e,
conforme a célula sofre ação hormonal, adquire características diferentes – como
representado, podemos citar um citoplasma maior e um núcleo reduzido. Assim,
notamos que as alterações na LSIL (NIC I) ocorrem no terço superior apenas, já
nas HSIL (NIC II, III) essas alterações acometem o terço médio e inferior.

NOTA

A correlação cito/histopatológica nem sempre é possível na rotina do


citologista, uma vez que é possível que o laboratório que diagnosticou a citologia pode
não fazer o exame da biópsia.

3.1 CRITÉRIOS CITOMORFOLÓGICOS DAS LESÕES


INTRAEPITELIAIS DE BAIXO GRAU (LSIL)
Como exposto, as LSILs estão relacionadas com o epitélio maduro que
compõe o terço superior do tecido. As células presentes nesses locais apresentam
citoplasma amplo, núcleo picnótico ou vesiculoso (GAMBONI, 2013). Contudo,
quando há presença de alguma alteração sugestiva de neoplasia, assumem outras
características (Figura 31):

• o núcleo aumenta de tamanho, podendo facilmente superar três vezes a área


de uma célula intermediária normal;
• a cromatina passa a ser granulosa e mal distribuída;
• ocorre a hiperqueratinização citoplasmática;
• binucleação em alguns casos;
• presença de coilócitos.

174
TÓPICO 3 — LESÕES PRÉ-NEOPLÁSICAS E MALIGNAS DE COLO DE ÚTERO

FIGURA 31 – LSIL: PRESENÇA DE “CAVITAÇÃO” PERINUCLEAR (A E B), NÚCLEO


AUMENTADO DE TAMANHO E CROMATINA GRANULOSA; PRESENÇA DE BINUCLEAÇÃO E
HIPERQUERATINIZAÇÃO DO CITOPLASMA (C); HISTOLOGIA EVIDENCIANDO ALTERAÇÕES
APENAS NO TERÇO SUPERIOR O EPITÉLIO (D)

FONTE: Os autores

Essas características citomorfológicas conferem a presença da ação do HPV


nas células. A remissão espontânea ocorre em 80% dos casos e não progride para
lesões mais graves. Tais alterações estão ligas aos HPVs de baixo risco oncogênico
(BRASIL, 2012; GAMBONI, 2013).

3.1.1 Conduta médica recomendada após resultado


Para cada categoria diagnóstica, há uma conduta médica sugerida pelo
Ministério da Saúde. No caso de LSIL, as pacientes devem repetir o exame
citológico após seis meses, porque a taxa de remissão da doença nessa idade é alta
(INCA, 2016). Se a citologia de repetição for negativa por duas vezes consecutivas,
a paciente volta ao rastreamento anual. Caso seja novamente positiva, ela é
encaminhada para a unidade de referência para exame colposcópico e, se mostrar
alterações no colo uterino de maiores graus, para biópsia (INCA, 2016).

175
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

3.2 CARACTERÍSTICAS CITOMORFOLÓGICAS DAS


LESÕES INTRAEPITELIAIS DE ALTO GRAU (HSIL)
Se, por um lado, falamos em baixo grau, quando o epitélio acometido
está restrito a células maduras no terço superior do epitélio cervical, por outro,
vemos a progressão da lesão para as camadas mais inferiores, acometendo células
imaturas, quadro que chamamos de HSIL. No caso das HSIL, o núcleo é o maior
aliado ao diagnóstico, pois tem uma relação de proporcionalidade com o grau
da lesão, ou seja, quanto mais displásico, mais grave será a lesão (BRASIL, 2012).
Podemos, então, descrever os critérios da seguinte forma:

• células do tipo metaplásicas, profundas (redondas ou ovais) com citoplasma


escasso, referindo-se à imaturidade;
• citoplasma pode ser denso, delicado ou queratinizado;
• cariomegalia;
• alta relação núcleo-citoplasma;
• irregularidade nas bordas nucleares (endentamentos);
• cromatina grosseiramente granulosa e mal distribuída;
• células isoladas ou em grupamentos.

A Figura 32 permite identificar os critérios descritos.

FIGURA 32 – HSIL: NÚCLEOS DISMÓRFICOS COM CROMATINA GROSSEIRAMENTE


GRANULOSA E MAL DISTRIBUÍDA, CITOPLASMA ESCASSO E DELICADO EVIDENCIANDO
IMATURIDADE CELULAR (A E B)

FONTE: Os autores

O quadro citológico de uma lesão intraepitelial de alto grau, em quase


totalidade dos casos, apresenta ação do HPV de alto risco oncogênico. O HPV
tem tropismo por células imaturas, uma vez, dentro da célula, passa a se replicar.
Os subtipos de alto risco oncogênico têm a capacidade de se integrar com o DNA
do hospedeiro, causando importantes alterações nucleares, como a inibição da
p53. A célula lesada perde sua capacidade de diferenciação e funcionalidade,
tornando-se maligna (GAMBONI, 2013).

176
TÓPICO 3 — LESÕES PRÉ-NEOPLÁSICAS E MALIGNAS DE COLO DE ÚTERO

3.2.1 Conduta médica recomendada após resultado


No caso de citologia positiva para HSIL, a paciente deve ser imediatamente
encaminhada para a unidade de referência para colposcopia. É importante
ressaltar que a repetição citológica é inaceitável como conduta primária. O exame
colposcópico compatível com NIC II/II deve ser encaminhado para a biópsia; caso
não seja compatível, repete-se o exame citológico (INCA, 2016).

3.3 ATIPIAS EM CÉLULAS ESCAMOSAS (ASC)


Há uma terceira classe diagnóstica que envolve o epitélio escamoso:
as atipias em células escamosas (ASC, sigla do inglês: atypical squamous cells),
divididas em atipias em células escamosas de significado indeterminado (ASC-
US, sigla do inglês atypical squamous cells of undermined significance) e atipias em
células escamosas não podendo afastar lesão de alto grau (ASC-H, sigla do inglês
atypical squamous cells, cannot exclude a high-grade lesion) (GAMBONI, 2013).

3.3.1 Atipias em células escamosas de significado


indeterminado: ASC-US
Principal diagnóstico diferencial com LSIL, o quadro de ASC-US é parte
de uma classe diagnóstica de um processo incerto. Em outras palavras, temos
alterações que variam entre inflamação e LSIL, porém sem características
confirmatórias, mas suspeitas. É uma classe diagnóstica que deve ser evitada,
uma vez que exprime incerteza quanto ao quadro. Elevadas taxas de diagnósticos
de ASC podem expor fragilidade no conhecimento do citologista (BRASIL, 2012;
GAMBONI, 2013).

Com relação à conduta médica recomendada após resultado de ASC-US,


se a paciente tiver idade abaixo de 24 anos de idade, pode-se repetir a citologia
em três anos, entrando para condutas especiais apenas se o resultado se repetir
positivo. Em pacientes maiores de 25 anos, a citologia deve ser repetida em um
ano (BRASIL, 2016).

3.3.2 Atipias em células escamosas não podendo afastar


lesão de alto grau: ASC-H
Também é usado em situações incertas, mas, dessa vez, oscilando acima
da inflamação e próximo a HSIL; são alterações importantes em células meta-
plásicas ou escamosas imaturas, que conferem características comuns a lesões
(Quadro 2), porém, são qualitativa e quantitativamente insuficientes. Esse qua-
dro diagnóstico é delicado e deve ser relatado com cautela, mas jamais deve ser
ignorado (BRASIL, 2012).

177
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

QUADRO 2 – DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL ENTRE REATIVIDADE, ASC E LESÕES INTRAEPITELIAIS

FONTE: Adaptado de Gamboni (2013)

Como podemos reparar no Quadro 2, as diferenças entre ASC-US e LSIL


são sutis, assim como entre ASC-H e HSIL. Basicamente, devemos observar a
qualidade da cromatina, a borda nuclear e a organização celular, cujas diferenças
podem ser vistas na Figura 33.

FIGURA 33 – DIFERENÇAS ENTRE ASC E LESÕES INTRAEPITELIAIS

FONTE: Adaptada de IARC (2004)

A conduta médica recomendada após o resultado de ASC-H é encaminhar


a paciente para a unidade de referência para colposcopia, a fim de procurar
indícios de lesões importantes do colo uterino. Se houver a presença de lesões
sugestivas de HSIL ou outra lesão de alto grau, deve-se encaminhar a paciente
para biópsia (INCA, 2016).
178
TÓPICO 3 — LESÕES PRÉ-NEOPLÁSICAS E MALIGNAS DE COLO DE ÚTERO

3.4 CARCINOMA ESCAMOSO


O carcinoma escamoso representa cerca de 75% dos cânceres do colo de
útero. Como amplamente citado, a presença do HPV é o principal fator de risco
para o desenvolvimento da doença, pois progride de lesões precursoras (LSIL/
HSIL) não tratadas até carcinoma, podendo romper a lâmina basal (invasivo).
Trata-se de um tumor de desenvolvimento lento e que, se diagnosticado em
fases iniciais, tem altas taxas de sucesso no tratamento (BRASIL, 2012; KOSS;
GOMPEL, 2006).

A paciente pode apresentar sintomas como sangramento vaginal anor-


mal, dor irradiada, perda de peso, edema, dor retal e hematúria. Visualmente, po-
dem ocorrer lesões exofíticas, polipoides ou lesões ulceradas, bem como regiões
granulosas discretamente elevadas, friável e sangrante ao toque (BRASIL, 2012;
KUMAR et al., 2010).

3.4.1 Características citológicas e subclassificação


Por ser uma progressão das HSIL, o carcinoma de colo uterino preserva a
maioria das características, embora se apresentem de forma mais acentuada. As
HSIL se limitam à porção epitelial, não ultrapassando a lâmina basal, e, para que
isso ocorra, demanda-se muito tempo (GAMBONI, 2013).

Em um esfregaço citológico (Figura 34), encontraremos células isoladas


ou conglomerados frouxos, acentuada anisocitose acompanhada de alto grau
de variabilidade na qualidade da cromatina e da morfologia nuclear, bem como
hipercromasia acentuada e irregularidade na membrana nuclear, que podem
estar presentes nucléolos proeminentes de tamanhos irregulares, múltiplos ou
únicos, alterações queratóticas, como hiper ou paraqueratose, e, por fim, uma
condição conhecida como diátese tumoral (BRASIL, 2012; GAMBONI, 2013).

A diátese tumoral representa a resposta do hospedeiro. Trata-se de detritos


celulares oriundos da inflamação causada pelo tumor e é uma das chaves para
o diagnóstico de carcinoma, uma vez que dificilmente os materiais citológicos,
nesses casos, será de fundo limpo (GAMBONI, 2013).

Quanto à classificação dos carcinomas de colo uterino podem ser: não


queratinizantes, queratinizantes, verrucosos, adenoescamoso e carcinoma pouco
diferenciado de pequenas células. No Sistema Bethesda, não há a necessidade de
diferenciar os tipos de carcinomas no laudo (BRASIL, 2012).

179
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

FIGURA 34 – CARCINOMA ESCAMOSO DO COLO UTERINO

FONTE: Adaptada de IARC (2004)

O esquema da Figura 35 demonstra o fluxo das condutas preconizadas


após resultados positivos para lesões pré-neoplásicas e neoplásicas escamosas.

FIGURA 35 – CONDUTAS APÓS RESULTADOS ALTERADOS

FONTE: Adaptada de Brasil (2016)

180
TÓPICO 3 — LESÕES PRÉ-NEOPLÁSICAS E MALIGNAS DE COLO DE ÚTERO

3.5 TUMORES MENOS FREQUENTES


Com menor frequência, pode ser encontrado outros tipos tumorais no
colo uterino que não oriundos do epitélio escamoso ou tumores escamosos raros.
Segundo Gamboni (2013), podem estar presentes:

• Sarcomas: menos de 1% dos tumores malignos do colo uterino. Podem ter


origem tanto no corpo uterino quanto em ovários, tubas uterinas e ovários
e se apresentam como sarcoma do estroma endometrial, leiomiossarcoma,
rabdossarcoma e tumor mülleriano misto maligno.
• Melanomas: entre 5 e 10% dos melanomas malignos do trato genital feminino
tem origem na vulva e vagina.
• Linfoma: pode comprometer o colo uterino, como metástase ou sítio primário.

É possível perceber que a diferenciação dos tipos de lesões que acometem


o colo do útero requer conhecimento de critérios e muita atenção. Além disso,
a importância do correto diagnóstico é essencial, como se pode observar, para
o bom prognóstico da paciente. No que diz respeito às alterações escamosas,
sarcomas, melanomas e linfomas são os mais frequentes.

4 LESÕES GLANDULARES DO COLO UTERINO


Até o momento, falamos exclusivamente de lesões que acometem o epitélio
escamoso do colo uterino e, relembrando a anatomia, temos também, no canal
endocervical, células glandulares mucossecretoras, que também são acometidas
pelo HPV e evoluem para lesões cancerosas.

4.1 ASPECTOS GERAIS


Neoplasias malignas que acometem o epitélio glandular são chamadas de
adenocarcinomas, que compõem o segundo tipo mais frequente de neoplasia ma-
ligna que acomete o colo do útero, apenas atrás do carcinoma escamoso. Sua etio-
logia está relacionada com a infecção pelos HPV-16 e HPV-18, e alguns estudos
demonstram maior presença do subtipo HPV-18. O diagnóstico citológico ainda é
o método mais eficiente, porém, devido à limitação de coleta, muitas lesões glan-
dulares podem ser subdiagnosticadas. Isso se deve à localização desse epitélio,
mais adentro do canal e, por vezes, recoberto por metaplasia, não podendo des-
camar essas células e não havendo possibilidade de rastreamento (BRASIL, 2012).

Assim como nas lesões escamosas, as glandulares apresentam diferentes


quadros diagnósticos, que devem ser cuidadosamente avaliados pelo citopatolo-
gista. Os principais quadros diagnósticos são: atipias glandulares de significado
indeterminado (AGC), que, por sua vez, é subagrupado em atipia sem outras
especificações (SOE/NOS), atipia favorecendo neoplasia (AGC-NEO), além de
adenocarcinoma in situ e adenocarcinoma invasor (BRASIL, 2012; GAMBONI,
2013; MIRANDA et al., 2020).
181
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

4.1.1 Atipia em células glandulares: AGC


Dentro da classificação AGC, temos um quadro citológico insuficiente
para adenocarcinomas, podendo ser apenas reativas (AGC-SOE) ou, devido a
características mais marcantes, sugerir a presença de malignidade (AGC-NEO)
– decisão que deve ser baseada em critérios citomorfológicos bem estabelecidos
(GAMBONI, 2013).

Os critérios para diagnóstico de AGC-SOE são presença de grupos celulares


sobrepostos minimamente e discreta hipercromasia, presença de grupos 2D ou
3D com discreta perda da polarização dos núcleos. Esses grupamentos podem
apresentar discreta variação nos tamanhos nucleares, pouco aumento da relação
núcleo citoplasma e nucléolos evidentes. Nesses casos, a cromatina é finamente
granulosa e bem distribuída (Figura 36).

FIGURA 36 – CÉLULAS GLANDULARES ATÍPICAS SEM OUTRAS ESPECIFICAÇÕES.


OBSERVAM-SE AS ALTERAÇÕES DISCRETAS EM CROMATINA, TAMANHO DO NÚCLEO,
PRESENÇA DE NUCLÉOLOS E DISCRETA PERDA DA RELAÇÃO N/C

FONTE: <https://bit.ly/2Ziq4z5>. Acesso em: 29 ago. 2021.

Contudo, em quadros de atipias em células glandulares favorecendo


neoplasia (AGC-NEO) temos a presença de grupos bi ou tridimensionais,
hipercromático, “rosetas”, tiras pseudoestratificadas e projeção dos núcleos para
a periferia (inversão da polaridade). A cromatina é mais grosseira e o núcleo perde
transparência. Também é notado o espessamento da borda nuclear com discretas
irregularidades e aumento da relação N/C (GAMBONI, 2013) (Figura 37).

182
TÓPICO 3 — LESÕES PRÉ-NEOPLÁSICAS E MALIGNAS DE COLO DE ÚTERO

FIGURA 37 – AGC FAVORECENDO NEOPLASIA

FONTE: <https://bit.ly/2Ziq4z5>. Acesso em: 29 ago. 2021.

As pacientes com citologia positiva para AGC devem ser encaminhadas


para colposcopia e, durante o exame, deve ser coletado novo material para
reavaliação citológica e, caso sejam encontradas quaisquer alterações, a paciente
deve ser biopsiada (BRASIL, 2016).

4.2 ADENOCARCINOMA IN SITU (AIS)


O adenocarcinoma de colo uterino é dificilmente diagnosticado na citolo-
gia oncótica, em um primeiro momento, pela sua raridade, representando apenas
1% das neoplasias malignas do colo uterino e pelo difícil diagnóstico citológico.
Contudo, suas características estruturais e citológicas já são bem estabelecidas
(GAMBONI, 2013).

No AIS, ocorre descamação em grandes grupos celulares, tiras


pseudoestratificadas, plumagem, rosetas, núcleos alongados “em charuto”,
cromatina bem distribuída, citoplasma delicado e ausência de diátese tumoral
(Figura 38). A chave para o diagnóstico das lesões glandulares é saber identificar
esses critérios (GAMBONI, 2013).

183
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

FIGURA 38 – AIS: NA LINHA PONTILHADA, O CRITÉRIO “PLUMAGEM” (A-D); “ROSETA” (B); PERDA
DA POLARIDADE E ORGANIZAÇÃO ARQUITETÔNICA DO GRUPAMENTO (C). NOTA-SE QUE, EM
TODOS OS CASOS, OCORREM NÚCLEOS ALONGADOS COM CROMATINA BEM DISTRIBUÍDA

FONTE: <https://bit.ly/3pqyRJT>. Acesso em: 29 ago. 2021.

4.3 ADENOCARCINOMA INVASIVO


O adenocarcinoma invasivo apresenta todas as características do AIS,
sendo o diagnóstico diferencial pouco provável pela citologia. Um aspecto
importante é que invasão está relacionada com o rompimento da membrana basal
e consequente invasão do estroma pelo epitélio neoplásico. Entretanto, mesmo
que compartilhem das mesmas características, temos nos adenocarcinomas
invasores a intensificação dos critérios. Os núcleos são muito mais alterados,
maiores, com cromatina grosseira, marginalizada e macronucléolos associados
à diátese tumoral franca ou inflamatória (BRASIL, 2012; GAMBONI, 2013). A
Figura 39 ilustra o adenocarcinoma invasivo.

FIGURA 39 – ADENOCARCINOMA INVASIVO DO COLO UTERINO: OBSERVAR A


INTENSIFICAÇÃO DOS CRITÉRIOS (A-C); AO FUNDO DO GRUPAMENTO, É POSSÍVEL OBSERVAR
A DIÁTESE TUMORAL NA PRESENÇA DE HEMÁCIAS, LEUCÓCITOS E DETRITOS CELULARES (D)

184
TÓPICO 3 — LESÕES PRÉ-NEOPLÁSICAS E MALIGNAS DE COLO DE ÚTERO

FONTE: Adaptada de <https://bit.ly/3aZIHKj>. Acesso em: 29 ago. 2021.

Toda paciente com diagnóstico citológico positivo para AIS ou adenocar-


cinoma invasivo deve ser encaminhada para colposcopia e biópsia.

DICAS

Para aprofundar seus conhecimentos sobre os seguimentos clínicos para


pacientes com laudos positivos, acesse: https://bit.ly/3b6d0io.

Como é possível notar, o estudo do diagnóstico citopatológico das lesões


pré-neoplásicas e malignas do colo de útero se baseia em observação e aplicação
de critérios citomorfológicos. Entretanto, é interessante saber correlacionar esses
achados com as informações clínicas da paciente, a fim de direcionar o clínico
da melhor forma possível. É importante lembrar que se deve atuar em prol da
saúde humana e as atitudes do citologista devem ser criticamente pensadas
nesse sentido. A seguir, falaremos sobre a estrutura do laudo citopatológico e a
padronização da comunicação.

4.4 LAUDO CITOPATOLÓGICO DO COLO DE ÚTERO


Após a finalização da leitura da lâmina, o citologista deve emitir um lau-
do contendo todas as informações daquela amostra. Para que não haja confusão
ou falha na comunicação, foi criado um sistema para relatos, conhecido como
Bethesda, que leva esse nome por ter sido desenvolvido em uma convenção na
cidade de Bethesda, nos Estados Unidos (KOSS; GOMPEL, 2006). Trata-se de
uma padronização internacional de termos, que são padrões de uso obrigatório,
embora seja um guia para montagem da estrutura do laudo, e não uma obrigato-
riedade. No SUS, a estrutura do laudo (Figura 40) é baseada na versão Bethesda

185
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

de 2011, apesar de, em 2015, ter sido publicada uma revisão do sistema, algumas
entidades brasileiras já se posicionaram sugerindo a alteração aos laboratórios
particulares. Quanto à atualização dos laudos no SUS, em 2020, o Instituto Na-
cional de Câncer (Inca) fez uma consulta pública acerca da mudança proposta,
seguindo, então, para a implementação do novo layout.

FIGURA 40 – LAUDO CITOPATOLÓGICO DE COLO DE ÚTERO

FONTE: <https://bit.ly/3C5BfZX>. Acesso em: 29 ago. 2021.

186
TÓPICO 3 — LESÕES PRÉ-NEOPLÁSICAS E MALIGNAS DE COLO DE ÚTERO

Utilizaremos o laudo SUS (Figura 40) como base para a explicação das
seções necessárias na avaliação, uma vez que cada laboratório pode personalizar
seus laudos particulares, porém o laudo proposto pelo SUS é de uso obrigatório
e padrão de todos os prestadores de serviço.

4.4.1 Avaliação pré-analítica


Nessa parte do laudo, marcamos os motivos pelos quais a amostra foi
rejeitada pelo laboratório. Por exemplo, uma lâmina pode não conter uma
requisição, o que é um bom motivo para que o laboratório não dê seguimento ao
processamento da amostra. Portanto, nesse campo, deve ser informada a rejeição
da amostra por parte do laboratório. Entre as possibilidades de rejeição, temos:

• ausência ou erro na identificação da lâmina, frasco ou formulário;


• lâmina danificada ou ausente;
• causa alheias ao laboratório (por exemplo, perda do material no transporte);
• outras causas.

No entanto, se não houver nenhuma intercorrência pré-analítica, essa


seção não deve ser preenchida.

4.4.2 Adequabilidade do material


Deve-se informar se o material coletado estava apto para a produção de
um laudo fidedigno; caso tenha havido algum impedimento para a leitura do
material citológico, devemos preencher após análise microscópica:

• Satisfatório: deve sempre ser marcada se foi possível realizar a análise.


• Alguns motivos de insatisfatoriedade são:
○ Material acelular ou hipocelular em menos de 75% do esfregaço: marca-
se essa opção caso a quantidade de células presentes na lâmina não era
representativa.
○ Sangue, piócitos, artefatos de dessecamento, contaminantes ou sobreposição
celular em mais de 75% da lâmina.
○ Outros: qualquer outro motivo que tenha impedido a avaliação do material.

4.4.3 Epitélios representados na amostra


Nesse campo, deve-se marcar quais epitélios estavam presentes na
amostra:

• escamoso;
• glandular;
• metaplásico.

187
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

É considerada satisfatória a amostra que contenha apenas epitélio


escamoso, mas insatisfatória uma amostra composta apenas por epitélio glandular.

4.4.4 Dentro dos limites da normalidade


As opções dessa seção são apenas “sim” e “não”. Marcando “sim”,
confirma-se que não havia alterações dignas de nota, restringindo-se ao que é
normal do sítio anatômico. Ao marcar “não”, deve-se informar o que estava fora
da normalidade no material examinado.

Ao marcar a opção “não” na normalidade do material, é preciso informar


as situações averiguadas, sendo elas:

• inflamação;
• metaplasia escamosa imatura;
• reparação;
• atrofia com inflamação;
• radiação;
• outros.

4.4.5 Microbiologia
Como vimos anteriormente, a citologia do colo uterino auxilia na
descrição da microbiota vaginal, relatando qual ou quais micro-organismos
estavam presentes na amostra. É necessário um cuidado especial no tocante às
bactérias e, sabendo que a microbiota vaginal é polimicrobiana, deve-se informar
no laudo aquela que está em maior quantidade. Por exemplo, é possível observar
a presença de lactobacilos junto a cocos, descrevendo-se a predominante. As
opções são:

• Lactobacillus sp.
• Cocos.
• Sugestivo de Chlamydia sp.
• Actinomyces sp.
• Candida sp.
• Trichomonas vaginalis.
• Efeito citopático compatível com vírus do grupo herpes.
• Bacilos supracitoplasmáticos (Gardnerella vaginalis, Mobiluncus sp).
• Outros bacilos.
• Outros: especificar e descrever parasitas.

4.4.6 Alterações celulares


O próximo passo do laudo é descrever se havia alguma lesão escamosa ou
glandular, informando ao médico a presença de:
188
TÓPICO 3 — LESÕES PRÉ-NEOPLÁSICAS E MALIGNAS DE COLO DE ÚTERO

• ASC-US.
• ASC-H.
• LSIL.
• HSIL.
• Carcinoma.
• Adenocarcinoma.
• AGCs.

Há também um campo para informar a presença de atipias em células de


origem indefinida e se são ou não neoplásicas.

4.4.7 Observações
O laudo conta com um campo aberto para comunicação do citologista
com o clínico. Podem ser descritas informações importantes, notas educativas
ou solicitações, embora seja um capo que deve ser utilizado com moderação e
critério, para que ele não seja banalizado.

DICAS

A Sociedade Brasileira de Citopatologia publicou o seguinte material que


contém a atualização da nomenclatura brasileira para laudos de citopatológicos do colo
uterino: https://bit.ly/3B74dYn.

189
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

LEITURA COMPLEMENTAR

SEGUIMENTO DAS ATIPIAS ESCAMOSAS E AVALIAÇÃO DAS CONDUTAS


SEGUNDO AS RECOMENDAÇÕES DO MINISTÉRIO DA SAÚDE

Mateus F. Delabeneta
Dayane B. Costa
Jacqueline Plewka
Maiara Aline Santos
Maurício Turkiewicz

INTRODUÇÃO

O câncer de colo do útero (ou câncer cervical) é considerado um


problema de saúde pública, pois é o quarto tipo de câncer mais frequente nas
mulheres em todo o mundo; 570 mil novos casos foram diagnosticados em
2018, representando 3,2% de todos os cânceres – 85% desses casos ocorrem em
países em desenvolvimento. No Brasil, é o terceiro tipo de câncer mais incidente
na população, sendo o segundo entre as mulheres, com estimativa de 16.590
casos para o triênio 2020-2022, com risco estimado 15,43 casos para cada 100 mil
mulheres. No Estado do Paraná, para o ano de 2020, a estimativa era de 990 casos.

As Diretrizes para a Detecção Precoce do Câncer do Colo do Útero


(2016) recomendam as condutas diante das alterações citológicas, colposcópicas
e histopatológicas detectadas no processo de rastreamento dessa neoplasia,
aumentando assim a eficiência do processo de prevenção do câncer do colo do
útero no SUS.

Segundo a Nomenclatura Brasileira para Laudos Citopatológicos (NBLC,


2012), as alterações no epitélio escamoso podem ser classificadas como células
escamosas atípicas de significado indeterminado (ASC-US); células escamosas
atípicas não podendo afastar lesão de alto grau (ASC-H); lesão intraepitelial de
baixo grau (LSIL); lesão intraepitelial de alto grau (HSIL); lesão intraepitelial
de alto grau não podendo excluir microinvasão (HSIL-micro); e carcinoma
epidermoide invasor (carcinoma).

ASC-US e ASC-H são as alterações mais comuns no exame citopatológico


do colo do útero. No Brasil, em 2019, elas representaram 45,9% e 11,7% das
incidências, e no Paraná, 46,7% e 12,8%, respectivamente. Essas categorias
abrangem critérios citológicos com alterações citomorfológicas mais significativas
do que as observadas em processos inflamatórios, porém insuficientes para
o diagnóstico de lesão intraepitelial, por isso a concordância entre citologistas
nessas alterações fica em torno de 35% a 45%.

190
TÓPICO 3 — LESÕES PRÉ-NEOPLÁSICAS E MALIGNAS DE COLO DE ÚTERO

O seguimento das mulheres com resultado de ASC-US é realizado devido


ao risco aumentado para lesões, em comparação com pacientes que apresentam o
exame citopatológico normal, bem como das mulheres com resultado de ASC-H,
nas quais existe a possível presença de lesões de alto grau.

O Manual de Gestão da Qualidade para Laboratório de Citopatologia


(MGQ, 2016) engloba os processos de monitoramento externo e interno da
qualidade – (MEQ) e (MIQ), respectivamente. O MIQ é realizado por meio da
avaliação de índices gerados pelos resultados dos laudos citopatológicos feitos
pelo próprio laboratório; a implantação e a manutenção da qualidade dos exames
são umas de suas responsabilidades. Esse processo ajuda a identificar as falhas
ou os desvios de qualidade no processo interno e permite estabelecer medidas
corretivas para garantir a qualidade e a confiabilidade dos exames citopatológicos.

O objetivo deste trabalho foi levantar as informações do seguimento


e a adesão às condutas preconizadas pelo MS nas mulheres atendidas no SUS
com resultado ASC-US e ASC-H no exame citopatológico do colo do útero, em
um município do oeste do Paraná, além de avaliar a qualidade desses exames
citopatológicos por meio da análise dos indicadores da qualidade da fase pós-
analítica do MIQ.

MÉTODOS

Estudo retrospectivo com base em resultados de exames citopatológicos


cervicais e histopatológicos realizados em um laboratório de citopatologia que
atende os municípios do oeste do Paraná. O trabalho foi aprovado pelo Comitê
de Ética em Pesquisa, sob protocolo número 892.452.

Foram selecionadas as mulheres que apresentaram resultados


citopatológicos cervicais alterados de ASC-US e ASC-H, entre 2016 e 2017, nas
requisições do MS e no Sistema de Informação do Câncer (SISCAN); informações
como data da coleta do exame e data de nascimento foram solicitadas.

Considerando os fluxogramas preconizados pelo MS/Instituto Nacional


de Câncer (Inca) nas diretrizes, as pacientes com resultado de ASC-US foram
estratificadas por faixa etária e tempo de repetição do exame citopatológico: 25
anos, com repetição do exame citopatológico em três anos; entre 25 e 29 anos, com
repetição em 12 meses; e ≥ 30 anos, com repetição em seis meses.

Verificamos se houve relação entre tempo de repetição citológica de ASC-


US e proporção de exames alterados. Nas mulheres com resultado de ASC-H, as
diretrizes do MS não recomendam fluxograma com situações especiais, portanto,
não houve estratificação em grupos.

Analisamos também o desempenho do laboratório que realiza os exames


citopatológicos para o SUS seguindo os cinco indicadores do MIQ, cujas fórmulas
para o cálculo dos indicadores são descritas a seguir:

191
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

• Índice de positividade (IP): razão do número de exames alterados pelo total


de exames satisfatórios × 100. Percentual de positividade esperada entre 3% e
10%; percentual baixo entre 2% e 2,9%; e percentual muito baixo abaixo de 2%.
• Percentual de células escamosas atípicas (ASC) entre os exames alterados: razão
do número de exames com ASC-US e ASC-H pelo total de exames alterados ×
100. O percentual de referência esperado é menor que 60%.
• Percentual de exames compatíveis com ASC entre os exames satisfatórios: razão
do número de exames ASC-US e ASC-H pelo total de exames satisfatórios ×
100. Espera-se, no máximo, que 4% a 5% de todos os exames sejam classificados
como ASC.
• Razão ASC/lesão intraepitelial escamosa (SIL): razão do número de exames
ASC-US e ASC-H pelo número de exames LSIL e HSIL. Recomenda-se que a
relação ASC/SIL não seja superior a três.
• Percentual de exames compatíveis com lesão intraepitelial de alto grau (HSIL)
entre os exames satisfatórios: razão do número de exames HSIL pelo número
de exames satisfatórios × 100. Recomenda-se que o valor seja superior a 0,4%.

Os dados foram tabulados e analisados no Microsoft Excel®; o cálculo


estatístico foi realizado no programa R estatística (https://www.rproject.org/).

RESULTADOS

Neste estudo, 42.478 exames citopatológicos do colo do útero foram


analisados entre 2016 e 2017. Em relação à adequabilidade do material
citopatológico, 98,95% (42.028) amostras foram avaliadas como satisfatórias e
1,05% (405), como insatisfatórias, para análise oncótica.

Considerando a relação entre ASC-US e testes satisfatórios, foram


encontrados 893 (2,12%) testes com resultados citopatológicos de ASC-US; o
percentual de resultados alterados foi de 33,65%. Ainda, 199 testes apresentaram
resultados de ASC-H, dos quais um teste foi satisfatório (0,47%); o percentual de
resultado da citopatologia alterada foi de 7,47%.

Segundo as orientações das diretrizes, na estratificação por faixas etárias,


16,3% (174) das mulheres com resultado de ASC-US tinham menos de 25 anos;
14,1% (98), entre 25 e 29 anos e 69,6% (621), ≥ 30 anos.

Em nosso trabalho, das pacientes com resultado de ASC-US, 73,2%


(654) repetiram o exame citopatológico; destas, 18,7% (122) permaneceram com
exame citopatológico alterado e 81,3% (532) dos resultados foram negativos para
malignidade na segunda análise citomorfológica.

Além disso, 536 mulheres repetiram o exame fora do período recomenda-


do pelo MS: para as mulheres com menos de 25 anos – 97,1% (100) antes do tempo;
1% (uma) no tempo e 1,9% (duas) depois do tempo recomendado; 71,6% (48), 7,5%
(cinco) e 20,9% (14), respectivamente, para pacientes entre 25 e 29 anos; e 34,1%
(165), 23,1% (112) e 42,8% (207), respectivamente, para mulheres ≥ de 30 anos.

192
TÓPICO 3 — LESÕES PRÉ-NEOPLÁSICAS E MALIGNAS DE COLO DE ÚTERO

Não houve relação entre tempo de repetição e proporção de exames


citopatológicos alterados: 1,44% das mulheres que repetiram o exame dentro do
tempo preconizado tinha os exames alterados; aquelas que o repetiram fora do
prazo preconizado e tinham os exames alterados totalizaram 0,93% (p < 0,009).

Atendendo às diretrizes do MS para atipias escamosas, 122 pacientes


cujo primeiro resultado foi de ASC-US também apresentaram o segundo exame
citopatológico alterado [ASC-US (28), LSIL (oito), HSIL (nove), ASC-H (duas) e
carcinoma (uma)]; 53,3% (65) delas fizeram exame histopatológico, conforme a
Tabela 1.

Considerando as mulheres com ASC-H, 34,7% (69) repetiram o exame


citopatológico e 13,5% (27) não realizaram ou não repetiram os exames; 51,8%
(103) realizaram o exame histopatológico, conforme recomendação do MS.

Das 103 mulheres que realizaram o exame histopatológico, 58,3% (60)


apresentaram resultados alterados: NIC I – 16,7% (28); NIC II – 31,7% (19); NIC III
– 20% (12); e carcinoma epidermoide invasor – 1,7% (uma). O tempo médio entre
o resultado do exame citológico de rastreamento e a realização do exame histo-
lógico das mulheres com resultado de ASC-H foi de aproximadamente 142 dias.

A Tabela 2 apresenta os indicadores de qualidade (MIQ) do laboratório


credenciado ao SUS recomendados pelo MS/Inca.

193
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

DISCUSSÃO

Em relação à adequabilidade do material citopatológico, 98,95% das


amostras foram satisfatórias para análise tumoral. Esses resultados corroboram
os dados encontrados na literatura, que variam de 92,2% a 99,6%. No Brasil, em
2014, o percentual de satisfatoriedade por região foi: Norte – 97,7%; Nordeste
– 98,92%; Sudeste – 99,3%; Sul – 99,59%; e Centro-Oeste: 99,07%. Encontramos
1,05% de amostras insatisfatórias; na literatura, os dados relatados variam de
0,4% a 7,8%16-20.

Ao analisarmos a prevalência de ASC-US entre os exames satisfatórios,


obtivemos o percentual de 2,12%, e 33,65% em relação aos resultados alterados.
Um estudo realizado na região Nordeste encontrou 1,96% de prevalência de
ASC-US entre os exames satisfatórios, e 36,94% entre os alterados. Já em um
trabalho realizado pelo Núcleo de Anatomia Patológica do Instituto Adolfo Lutz,
as prevalências foram de 4,71% de resultados satisfatórios e 3,26% de alterados.

Considerando os exames satisfatórios, encontramos o percentual de


0,47% nas mulheres com resultado de ASC-H, e 7,47% entre os exames alte-
rados. Em um estudo semelhante, a prevalência foi 1,27% entre satisfatórios e
23,89% entre alterados. Contudo, outros trabalhos apresentam diferentes pre-
valências quando os exames satisfatórios são considerados: 4,4%; 0,66%; 0,27%.

Encontramos 81,3% de resultados negativos para malignidade no total


de exames repetidos nas pacientes que apresentaram ASC-US anteriormente.
Dados semelhantes (83,3%; 77,7%; 77,5%) foram observados na literatura.

Nas mulheres abaixo de 25 anos, 97,1% repetiram o exame antes do


período preconizado (três anos). Essa conduta aumenta o número de diagnósticos
de LSIL – que apresenta grande probabilidade de regressão –, bem como o
número de colposcopias e a possibilidade de sobre tratamento. Além disso,
compromete o programa de prevenção dessa neoplasia devido à realização de
exames complementares fora das recomendações do MS para essa faixa etária.
Para mulheres acima dos 30 anos, 42,8% realizaram o exame após seis meses do
resultado inicial de ASC-US; nessas pacientes as chances de HSIL é maior, e, se a
lesão não for identificada a tempo, pode evoluir para quadros mais graves.

Em nossa casuística, verificamos que 53,3% das mulheres com resultado


de ASC-US realizaram o exame histopatológico, resultado superior ao
observado por Rosendo et al. (2018), de 28,8%. A maioria das pacientes (75,8%)
com resultado citológico de ASC-US apresentou exame histopatológico NIC
I, conforme dados da literatura. Esse tipo de alteração representa a expressão
citomorfológica de infecção transitória produzida pelo papilomavírus humano
(HPV) e possui alta probabilidade de regressão; não é considerada uma lesão
precursora do câncer cervical.

194
TÓPICO 3 — LESÕES PRÉ-NEOPLÁSICAS E MALIGNAS DE COLO DE ÚTERO

Destacamos também o achado de 9% de ASC-US com posterior exame


histopatológico de NIC II/III. Na literatura, as prevalências variam de 0,8% a
49,9%. Essas lesões precursoras (NIC II/III) normalmente são assintomáticas e
curáveis na maioria dos casos quando tratadas adequadamente.

Verificamos a presença de carcinoma em 0,1% dos exames citológicos


alterados. As diretrizes alertam para a presença de câncer em 0,1% a 0,2% das
mulheres com resultado citológico de ASC-US.

Alguns autores esperam encontrar maior probabilidade de lesão pre-


cursora do câncer cervical nas pacientes com resultado de ASC-H. Em no nosso
estudo, 51,8% das mulheres com ASC-H realizaram o exame histopatológico,
enquanto 37,7% repetiram o exame citopatológico. A repetição do exame cito-
patológico acarreta atraso na confirmação do diagnóstico e, conse­quentemente,
no tratamento, além de gerar gastos desnecessários com a realização da citopa-
tologia de seguimento, já que o recomendado pelo MS é a colposcopia.

Das mulheres com ASC-H que realizaram o histopatológico, 51,8% delas


tiveram resultado NIC II/III, fato também observado em outros estudos, em que as
prevalências variaram de 12,2% a 68%. Detectamos a presença de um carcinoma
entre os exames histopatológicos (1,7%), resultado consistente com estudos que
demonstram câncer entre 1,3% e 3% nas mulheres com citologia de ASC-H.

Os exames citopatológicos devem ser realizados por profissionais


habilitados, qualificados e capacitados. Os resultados falso negativos variam
de 6% a 56% e ocorrem na fase pré-analítica e analítica. Com o objetivo de
reduzir os vieses da metodologia, programas de controle de qualidade devem
ser implementados, como o MIQ e MEQ, visando à diminuição e à correção de
erros no processo analítico. Verificamos que todos os indicadores de qualidade
avaliados do laboratório prestador de serviço para o SUS estavam dentro dos
valores referenciais propostos pelo MS/MGQ. Damos destaque principalmente
ao IP (6,3%), que expressa a prevalência de alterações celulares nos exames e
a sensibilidade do processo do rastreamento em detectar lesões na população
examinada. A HSIL (0,94%), lesão verdadeiramente precursora do câncer
cervical, é o principal objetivo da prevenção secundária desse câncer. Os valores
dos parâmetros estabelecidos pelo MGQ, bem como os observados por outros
autores são: IP 7%; 7,2% e 3,6%; HSIL 0,6%; 1% e 0,47%; todos os valores foram
registrados no Paraná, em 2019.

Os demais indicadores ASC/alterados, ASC/satisfatórios, ASC/SIL que


se apresentaram dentro dos parâmetros recomendados pelo MS demonstram
a capacidade que o laboratório tem ao definir os critérios citomorfológicos,
garantindo assim a qualidade e a confiabilidade dos resultados quanto às normas
estabelecidas pela literatura nacional e internacional.

195
UNIDADE 3 — CITOLOGIA GINECOLÓGICA

CONCLUSÃO

Das mulheres que tiveram ASC-US como resultado do primeiro exame


citopatológico, 73,2% repetiram o teste, porém, 81,9% o fizeram fora do período
recomendado pelo MS. No caso das pacientes com resultado de ASC-H, 42,8%
não seguiram as condutas recomendadas pelo MS no programa de prevenção do
câncer do colo do útero.

Todos os índices do MIQ do laboratório avaliado estavam de acordo com


as recomendações do MGQ/MS. Levando em consideração a história natural
dessa neoplasia, as diretrizes do MS e a realização de exames citopatológicos com
qualidade comprovada pelo MIQ dos laboratórios de citopatologia, de acordo
com o MGQ, são importantes ferramentas que auxiliam as ações de gestores
dos programas de prevenção desse câncer por meio da integração entre as fases
analítica e pós-analítica.

FONTE: Adaptada de DELABENETA, M. F. et al. Seguimento das atipias escamosas e avaliação das
condutas segundo as recomendações do Ministério da Saúde. J. Bras. Patol. Med. Lab., v. 57, 2021.
Disponível em: https://www.scielo.br/j/jbpml/a/NYZqH7SMKdq7tgfn3gmzsHF/?lang=pt#>. Acesso
em: 13 ago. 2021.

196
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• Historicamente, houve alterações na nomenclatura das lesões pré-neoplásicas


e neoplásicas do colo uterino.

• Existem situações que precedem o câncer de colo uterino, que podem ser
identificadas no exame de Papanicolaou. Para cada uma delas, existe uma
conduta de seguimento preestabelecida pelo Ministério da Saúde.

• As lesões presentes podem ser a nível de epitélio escamoso ou glandular e


quase a totalidade delas é induzida pelo HPV.

• O profissional deve seguir um padrão de laudo, para que não haja falhas na
comunicação entre o laboratório e o clínico.

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197
AUTOATIVIDADE

1 Em um laboratório especializado citopatologia, um profissional se deparou


com células de citoplasma amplo e poligonal, núcleo aumentado de
tamanho em três vezes, discretamente hipercromático e com uma área
bem delimitada e transparente ao redor do núcleo, se assemelhando a uma
cavitação. Diante dessas características, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) O profissional estava diante de células imaturas displásicas, portanto


sua conclusão foi favorável para HSIL.
b) ( ) Trata-se apenas uma condição inflamatória, sem alterações dignas
de nota.
c) ( ) As características encontradas eram fortemente sugestivas de displasia
em células maduras com presença do HPV, portanto, o profissional
concluiu que se tratava de uma LSIL.
d) ( ) Havia presença uma possível lesão em células do tipo glandular,
sugerindo um adenocarcinoma in situ.

2 Segundo estudos epidemiológicos e testes laboratoriais baseados em hibri-


dização, ficou constatado que o HPV é o principal causador das neoplasias
malignas do colo uterino. Também é demonstrado que, apesar de existirem
vários subtipos virais, apenas alguns têm risco para o desenvolvimento das
lesões. Analise as sentenças a seguir:

I- Os HPV-6 e HPV-11 não estão envolvidos com a progressão para câncer.


A maioria dos casos envolve apenas a presença de condilomas e alterações
celulares reversíveis.
II- Nos adenocarcinomas, há intensa presença do subtipo HPV-18.
III- Apenas a presença do HPV não é fator predisponente ao desenvolvimento
de câncer, portanto, é possível que uma mulher adquira o vírus e jamais
ocorra qualquer tipo de complicação.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Todas as sentenças estão corretas.


b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 Existe, na nomenclatura padrão para laudos citopatológicos do colo uterino,


uma classe diagnóstica para alterações suspeitas. Com base em quando
essa classe deve ser usada, classifique V para as sentenças verdadeiras e F
para as falsas:

198
( ) As alterações não são conclusivas para lesões pré-neoplásicas, mas estão
acima do grau de inflamação.
( ) Há presença de um ou mais critérios citomorfológicos para lesões pré-
neoplásicas, mas são quantitativamente insuficientes para conclusão
do laudo.
( ) O citologista não souber como tomar uma decisão, deve utilizar essa
classe como saída.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – V – F.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.

4 O exame citopatológico do colo uterino se baseia em descamação das


células, por meio da abrasão feita por espátula e escova especiais. Após
a coleta, o material é disposto em uma lâmina de vidro, fixado e enviado
ao laboratório. Sabendo da anatomia do colo uterino e a disposição do
epitélio, explique porque o exame de Papanicolaou tem baixa eficácia do
rastreamento das lesões do epitélio endocervical.

5 Cada classe diagnóstica gera uma conduta médica, por isso o citologista
deve ter certeza do que está liberando em cada resultado. Sabendo disso,
descreva brevemente quais são as condutas tomadas após laudos positivos
para ASC-US, LSIL, HSIL e carcinoma.

199
REFERÊNCIAS
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