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Anestesia local

A cocaína foi o primeiro anestésico local disponível na pratica. Foi introduzida em 1884 na
pratica clínica, mas devido aos seus efeitos tóxicos, como no tecido cardíaco e SNC causando
excitação e consequentemente dependência forte.

Em 1892 foi sintetizado o primeiro anestésico local, a procaína, com uma estrutura química
similar à da cocaína, composta de uma parte hidrofílica e outra hidrofílica separada por uma
ligação tipo éster ou amida, sendo essa estrutura característica dos anestésicos locais. Essa
estrutura química confere aos anestésicos características hidrofílica e hidrofóbica fundamentais
no mecanismo de ação e para atingir seu local de ação. Atuam na fibra nervosa, levando a um
bloqueio temporário e localizado da condução nervosa. Atuam na fibra nervosa periférica, de
tal forma que diminua a sensibilidade e dor do local.

São utilizados por via subcutânea na maioria dos casos, no qual o objetivo é administrar o
anestésico local próximo a fibra nervosa para que promova o bloqueio. Se ligam aos canais de
sódio voltagem dependentes, promovendo bloqueio desses, fazendo com que os canais de sódio
fiquem mais tempo na forma inativada (intimamente relacionada com o período refratário do
potencial de ação), e mesmo que ocorra um estimulo, a fibra nervosa não vai conseguir deflagrar
o potencial de ação. Consequentemente promove o bloqueio da condução pela fibra nervosa.
Para bloquearem esses canais, devem ultrapassar a membrana da fibra nervosa, chegando no
citoplasma, onde bloqueia os canais de sódio VD de dentro para fora. Alguns desses anestésicos
locais podem provocar bloqueio desses canais quando estão ultrapassando a membrana
plasmática, causando uma mudança conformacional e promovem também o bloqueia de canais
de Sódio VD.

Os anestésicos locais são distribuídos na forma de sal, e quando administrado, possui uma parte
ionizável (sal) e não-ionizável que estão em equilíbrio. A parte não ionizável é lipossolúvel o
suficiente para atravessar a membrana plasmática, chegando ao meio intracelular, onde pode
ser ionizado novamente e essa forma de sal vai bloquear os canais sódio VD de dentro para fora.
Por isso ter uma parte hidrofílica e hidrofóbica é importante.

O bloqueio da fibra nervosa vai se dar de forma diferenciada dependendo das características da
fibra nervosa, como diâmetro da fibra, mielinização e frequência de disparos vão interferir na
velocidade de bloqueio das fibras. É necessário um ajuste de dose, dependendo dos nervos alvos
no local de aplicação.

 Quanto menor o diâmetro das fibras, mais rápido essa fibra nervosa será bloqueada
ex: fibras tipo C, que são finas;
 Fibras com bainha de mielina são bloqueadas pelo anestésico local de forma mais,
rápida, pois o bloqueio vai ser dado apenas nos nodos, dessa forma se tem necessidade
de bloqueio de apenas uma pequena extensão de nódulos de Ranvier para se ter
bloqueio total da fibra
 Quando maior a frequência de disparos, mais facilmente essa fibra será bloqueada em
função justamente do mecanismo de ação de ação dos anestésicos locais. Se tem mais
tempo na forma aberta, e se tem maior probabilidade de o anestésico local alcançar o
canal de sódio na forma aberta. Promovendo bloqueio da fibra nervosa.

A porção lipofílica está relacionada com a potência, duração de ação e sua toxicidade. O
tamanho da molécula vai influencia na taxa de dissociação do anestésico local. A maioria deles
possui pKa entre 8-9;
Exemplos anestésicos locais: Lidocaína, Mepivacaína, Prilocaína, benzocaína, etc.;

Anestésicos tipo éster: Cocaína (não utilizada), Procaína, benzocaína (uso apenas tópico), e
tetracaína;

Anestésicos tipo amida: Lidocaína, Mepivacaína, Bupivacaina, Ropivacaína, Articaína


(procedimentos odontológicos);

Lidocaína: tempo início rápido (10min), Duração de 1-2h;

Buprocaina: Início ação 30 min, duração de 3-6h

Anestesia tipo amida possuem alta ligação a glicoproteína acida alfa-1, já os neonatos têm baixa
interação com essa proteína, podendo levar a toxicidade, logo deve-se ter cuidado com a dose
administrada. Os anestésicos locais têm índice terapêuticos relativamente baixo, e quando
administrado em alta dose ou de forma incorreta, podendo atingir um vaso sanguíneo de forma
rápida, causando um quadro de intoxicação facilmente.

Os ésteres são biotransformados por pseudocolinesterases, tendo tempo de meia vida menor;

Os anestésicos Locais tipo amida sofrem transformação por via hepática;

A Prilocaína (tipo amida) produz um metabolito que é a orto-toluidina, que quando associada a
hemoglobina pode gerar meta-hemoglobina, promovendo cianose. Caso ocorra, deve-se
administrar ácido ascórbico para reverter o quadro.

A excreção dos anestésicos gerais é dada por via renal.

Os anestésicos locais podem ser administrados associados a vaso constritores, como a


adrenalina, com objetivo de diminuir a absorção sistêmica, evitando a disseminação do
anestésico, prolongando o efeito em torno de 30%. Se diminui o risco de toxicidade, pois a
absorção sistêmica vai se dar de forma lenta, dando tempo de ser biotransformados e eliminado.
Em algumas formulações esses dois fármacos já vêm juntos para a aplicação. Deve se ter
cuidado para não anestesiar locais com baixo fluxo sanguíneo com essa combinação, pois fazer
vaso constrição em locais pouco irrigados pode levar a necrose. Deve se ter cuidado com a
absorção sistêmica de adrenalina, pois podem promover os efeitos adversos desse
neurotransmissor, principalmente em gestantes e hipertensos descompensados.

Principais Vasoconstritores: Adrenalina, fenilefrina e felipressina (não atuam em alfa-2, e sim


nos receptores de vasopressina)

Efeitos adversos dos anestésicos locais:

Os anestésicos do tipo éster, como a procaína, podem gerar dermatite alérgica, crise asmática
ou choque anafilático.

Os tipos amidas possuem metil-parabeno como conservante podendo gerar reações alérgicas.
Outros efeitos adversos estão relacionados a estimulação do sistema nervoso central, gerando
inquietação, tremores e convulsões. Em doses mais altas podem gerar depressão do SNC que
vai gerar insuficiência respiratória, podendo levar o paciente a óbito. Para prevenir ou
interromper possíveis convulsões, podem ser administrados barbitúricos ou
benzodiazepínicos, como o diazepam.
No sistema cardiovascular, podem causar cardiotoxicidade pelo bloqueio dos canais de sódio
VD. A Bupivacaina é o anestésico locais mais cardiotóxico, e deve-se controlar bem a dose e
forma de administração.

No musculo liso, reduzem a contração do trato gastrointestinal reduzindo peristaltismo,


também reduz contração a nível vascular e bronquiolar. Raramente causa depressão das
contrações uterinas durante o parto. Os efeitos adversos dependem da dose.

Lidocaína: quando se tem 5 microgramas por ml no plasma, o indivíduo começa a apresentar


zumbido, alterações da fala e gosto metálico. Com 7 microgramas por ml o indivíduo apresenta
sedação, confusão mental, ansiedade, tremores, aumento da frequência e da Pressão arterial.
Com 9 microgramas por ml, o indivíduo apresenta abalos, pode ter inconsciência e arritmias. 12
microgramas por ml podem causar convulsão, coma, insuficiência renal aguda, hipóxia, choque
e concentrações maiores podem causar parada cardíaca e chegar ao óbito. A lidocaína quando
usada em doses mais baixas que como anestésicos locais tem função antiarrítmica
principalmente para o controle de arritmias supraventriculares. Essa utilização é divido ao
bloqueio dos canais de sódio VD nos miócitos.

Existem formulações tópicas, como em geleia (uso em mucosas), solução de lidocaína de 4-10%
(mucosas), cremes de lidocaína associado Prilocaína que tem alta penetração pela epiderme.
Existem formulações injetadas na forma de sal (cloridrato de lidocaína, cloridrato de
bupivacaina), que podem ou não estar associado a vaso constritores.

Podem ser utilizados de forma tópica em mucosa e pele, na anestesia infiltrativa subcutânea,
bloqueio de nervos periféricos, bloqueio de plexo braquial, anestesia peridural e raquidiana e
no tratamento de arritmia usando lidocaína em dose baixa.

Na anestesia superficial e tópica pode-se anestesiar nariz, boca, trato urinário, mucosas, que
podem ser utilizados lidocaína 2-10%, tetracaína 2% ou benzocaína, o risco de toxidade
sistêmica é reduzido, a não ser que seja feito a administração de uma grande quantidade por
via tópica. Existem soluções oftálmicas de proparacaina e tetracaína para procedimentos
oftálmicos.

A anestesia por infiltração é quando se faz a injeção do anestésico diretamente no tecido sem
levar em consideração o trajeto dos nervos cutâneos. Utilizado em pequenas cirurgias, como
procedimentos odontológicos, onde se faz administração de forma subcutânea. Nessas
situações são mais utilizados lidocaína e procaína 0,5-10%, Buprocaina com ou sem epinefrina.
A grande vantagem é que não se interfere com outras funções fisiológicas, e a desvantagem é
que mesmo de forma local, deve se ter consciência da quantidade administrada, pois pode-se
ter absorção sistêmica e efeitos adversos.

Em regiões inflamadas se tem a produção prótons, em função do processo inflamatório, e esse


meio mais ácido pode deixar o anestésico mais em sua forma protonada, e desta forma, ele
não terá lipossolubilidade suficiente para atravessar as membranas para desencadear seus
efeitos. Deve-se tratar o processo inflamatório antes do uso do anestésico.

A anestesia em bloqueio regional é feita de forma subcutânea, e distal ao local onde se vai fazer
o procedimento, cobrindo uma grande área cutânea. Tem a vantagem que se utiliza menor
quantidade de fármaco para uma maior área de bloqueio.
A anestesia em bloqueio nervoso é quando se administra anestésico local próximo aos troncos
nervosos ex: plexo braquial, anestesiando todo o braço do indivíduo por exemplo. O início é
lento, e o bloqueio pode ser mais prolongado.

Também vão ser utilizado em anestesia peridural e raquidiana. Na peridural o anestésico será
administrado na região que reveste a dura-máter e na raquidiana no espaço subrraquidiano
entre a L3-L4 ou L4-L5. Nesse tipo de anestesia, pode-se administra-lo associado a glicose, como
por exemplo Bupivacaina 1/2% pesada com glicose 8%. O objetivo dessa associação é fazer com
que a difusão fique condicionada a inclinação do paciente. Quando é administrado na região
lombar no espaço subarraquinoide, o objetivo é que se faça anestesia da cintura para baixo, e
não se deseja que o indivíduo tenha anestesia da cintura para cima. A bupivacaina ficará mais
retida na porção lombar e sacral, dificultando a difusão dela para porções mais superiores, e isso
pode variar de acordo com a inclinação da mesa de cirurgia. Existe risco de bradicardia e
hipotensão, além da depressão respiratória e cefaleia (em menor proporção hoje em dia) em
função de aumento da pressão intracraniana. É comum se ter retenção urinária pôs cirurgia.
Utilizado a raquianestesia em cirurgias da região abdominal, extremidades inferiores, cirurgias
obstétricas.

A anestesia peridural vai ser administrada no espaço epidural, entre L3-L5, fazendo um bloqueio
das raízes espinais. Geralmente se utiliza lidocaína ou bupivacaina. Os efeitos adversos são
semelhantes aos da raquianestesia, porém menos pronunciados devido a menor propagação
do anestésico local. Também vai ser utilizados em anestesias que se deseja anestesiar da cintura
para baixo (cirurgia abdominal, extremidade inferiores e cirurgias obstétricas). A escolha entre
anestesia peridural ou raquidiana depende da experiência do anestesista, e cabe a ele decidir
qual utilizar. Só devem ser realizadas por anestesistas, pois dependem de um treinamento
específico para que não se atinja nenhuma fibra nervosa no procedimento, podendo gerar uma
lesão incapacitante.

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