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Ao estudar direito administrativo aprendemos que ele sofre uma influência de alguns
institutos que são relevantes para o direito público, mas não são tão relevantes assim para
o direito privado.
Assim, podemos dizer que as normas são um conjunto de regras e princípios integrantes
do sistema normativo de determinado Estado (MENDES; BRANCO, 2014).
Mas o que diferencia um princípio e uma regra, já que ambos são normas jurídicas?
Dois critérios têm sido utilizados para diferenciar uma regra de um princípio. Para o
critério quantitativo (chamado de tese fraca), os princípios têm alto grau de abstração, o
que os difere das regras, pois estas têm baixíssimo grau de abstração e alta
determinabilidade. Veja que é denominado de critério quantitativo porque estamos
falando em quantidade de abstração. Se tiver muita abstração, é um princípio; se houver
pouca abstração, tem alto grau de determinabilidade e é uma regra. Por outro lado,
modernamente, está ganhando espaço o critério qualitativo (chamado de tese forte),
para o qual não é a abstração que diferencia um princípio de uma regra, mas sim a
solução a ser dada quando houver colisão entre dois princípios ou entre duas regras.
Segundo esse critério, as regras se aplicam com base no “tudo ou nada”, e, havendo
colisão entre duas regras, a solução estará no plano de validade, aplicando-se apenas uma
delas ao caso concreto. Já os princípios, por sua vez, não trazem soluções definitivas na
norma que os consagra e apresentam diferentes “graus” de aplicação, consistindo em
verdadeiros mandamentos de otimização (sendo aplicados da melhor maneira possível).
Havendo colisão entre princípios, deve ser feita uma ponderação, sem que isso signifique
a invalidação de um ou de outro, podendo, inclusive, aplicar os dois princípios que
aparentemente eram colidentes na mesma situação.
Nesse sentido, com a distinção apresentada no parágrafo anterior, fica mais fácil entender
o conceito de regime jurídico administrativo como: conjunto de princípios expressos e
implícitos que conduzem a atuação da Administração Pública em busca do interesse
público, conferindo, para o exercício desse poder-dever, de um lado, prerrogativas e, de
outro, sujeições.
3. Princípios em espécie
Imagine como seria se a Administração Pública fosse interditar um restaurante que não
atende aos mínimos requisitos sanitários e que, mesmo preenchidos os requisitos para a
interdição do estabelecimento, os proprietários pudessem se opor dizendo que não
gostariam que o estabelecimento fosse fechado?
O interesse privado estaria se sobrepondo ao interesse público e, no exemplo, colocando
em risco a saúde pública.
O mesmo ocorre quando o setor responsável de um município não concede a licença para
construir um imóvel porque o projeto não atende às normas municipais de planejamento e
utilização do solo urbano.
O objetivo é buscar o interesse público. Se não foi concedida a licença para construir, é
porque, em tese, a fiscalização entendeu que esse projeto não cumpre as condições
necessárias estabelecidas pela administração com a finalidade de atender ao interesse
público e que o atendimento ao interesse do particular (neste caso) violaria esse princípio,
já que a ordenação do solo urbano ocorre justamente em benefício da coletividade.
Por fim, deve haver a ressalva de que a supremacia do interesse público sobre o privado
não confere “carta branca” à Administração, que está sujeita a uma série de restrições, as
quais devem ser respeitadas, sob pena de ilegalidade ou ilegitimidade em sua atuação.
Muito importante!
Por esta razão, não se pode dizer que toda vez que o interesse público estiver em jogo ele
prevalecerá sobre o interesse privado. Atente-se que o interesse privado faz parte do
interesse da coletividade.
Peter Häberle, em sua obra Öffentliches Interesse als juristisches Problem (1970), reflete
o interesse público como um problema jurídico, defendendo que, na realidade, não existe
um conflito entre interesses público e privado. O que existe é um conflito interno; não há
dois lutadores, cada um de um lado do ringue. O interesse privado é uma parte de um
todo. Por exemplo, se um sequestrador escondeu uma criança em algum lugar e só ele
sabe onde ela está, a polícia não pode, sob tortura, obrigar o criminoso a revelar o
esconderijo. Se houvesse uma supremacia do interesse público, não teríamos dúvidas que
seria legítimo torturar o sequestrador para revelar o local onde deixou a vítima.
Este ainda é um tema que levanta muita polêmica. Também é de extrema importância ao
direito administrativo, pois serve de fundamento para diversos institutos como
desapropriação, poder de polícia etc. Portanto, não é raro ainda encontrarmos a aplicação
de um instituto da seara administrativista com base na supremacia do interesse público
sobre o interesse do particular.
Compondo o outro lado do regime jurídico administrativo, lado este das sujeições, está o
princípio da indisponibilidade do interesse público.
O gestor público administra bens de todos, da coletividade e, assim, não pode, por
exemplo, alienar um imóvel público sem que haja autorização em lei (a exigência de
autorização está, inclusive, expressa no art. 17 da Lei nº 8.666/1993 – Lei de Licitações).
Veja, por exemplo, o parágrafo único do art. 10 da Lei nº 10.259/2001 (Lei dos Juizados
Especiais Federais – JEF), que assim dispõe:
Os representantes judiciais da União, autarquias, fundações e empresas
públicas federais, bem como os indicados na forma do caput, ficam
autorizados a conciliar, transigir ou desistir, nos processos da
competência dos Juizados Especiais Federais.
Todavia, em 2015, a Lei nº 13.129 alterou a Lei nº 9.307/1996 (que dispõe sobre
arbitragem) e foi adicionada ao art. 1º, de maneira genérica, a possibilidade de a
Administração Pública Direta e Indireta utilizar-se da arbitragem para dirimir conflitos
relativos a direitos patrimoniais disponíveis, desde que seja de direito, não permitindo a
arbitragem de equidade para a Administração Pública.
Enfim, a Lei nº 13.140/2015 dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de
solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da
Administração Pública.
O Novo Código de Processo Civil (NCPC) segue a linha e trata sobre a solução
consensual de conflitos no âmbito administrativo (art. 174, do CPC).
Com o surgimento do Estado de Direito, esse princípio passou a ser largamente estudado
e considerado de extrema importância.
A Constituição Federal de 1988 (CF/1988), por exemplo, dispõe, no art. 5º, II, que
“ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.
Esse artigo está no título “Dos direitos e garantias fundamentais” e no capítulo “Dos
direitos e deveres individuais e coletivos”. Trata-se, portanto, de típico direito
fundamental de primeira dimensão em que se exige uma postura de respeito por parte do
Estado à liberdade individual. Senão quando expressamente aprovado pelo poder
legislativo (nossos representantes), o povo não será obrigado a fazer o que não queira,
como também não se exigirá sua abstenção quando queira fazer algo. Apenas por meio de
lei (repita-se, aprovada pelo próprio povo por meio de seus representantes), poderá criar
obrigações para o povo.
Daqui se extrai o que, em direito civil, se denomina autonomia da vontade. Você, eu, seus
amigos, todos nós somos livres. Esse princípio serve como um direito, uma garantia de
que o Estado não irá nos obrigar a algo ao seu bel-prazer. Nós teremos que consentir
previamente (com a aprovação de lei).
Todavia, deve ser feita a ressalva de que a referência à lei, no princípio da legalidade,
é feita em sentido amplo e não, apenas, lei em sentido estrito. A atividade
administrativa deve estar em conformidade com o direito.
Muito importante!
Há casos em que o legislador nada previu sobre uma matéria e, mesmo assim, o
administrador fica obrigado a atuar praeter legem. Um exemplo disso pode ser extraído
de quando o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) adotou a sua resolução nº 7, proibindo a
contratação de parentes no âmbito do judiciário brasileiro, momento no qual esta conduta
já era vedada no âmbito federal por expressa previsão legal. Alguns Estados
questionaram a norma do CNJ, alegando que no âmbito daqueles estados não havia lei
proibindo a contratação de parentes, de modo que a resolução estaria violando a
autonomia dos entes da federação.
Este caso foi levado à apreciação do Supremo Tribunal Federal (STF) que decidiu a Ação
Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 12, declarando a constitucionalidade da
Resolução nº 7 do CNJ, dizendo basicamente que o que o Conselho fez foi unicamente
dar densidade normativa ao texto constitucional, de modo que temos aqui uma brecha na
jurisprudência do Supremo para o administrador (considera-se o CNJ como administrador
público, por ser órgão de controle de administração, sendo, portanto, órgão
administrativo, não jurisdicional) atuar no sentido de ir além do texto legal. Isso porque,
se pensássemos desta forma tradicional, a Resolução nº 7 teria invadido a competência
dos estados criando obrigação não prevista em lei, o que não faz o menor sentido.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE, AJUIZADA EM PROL DA RESOLUÇÃO
Nº 07, de 18.10.05, DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. ATO NORMATIVO QUE
“DISCIPLINA O EXERCÍCIO DE CARGOS, EMPREGOS E FUNÇÕES POR PARENTES,
CÔNJUGES E COMPANHEIROS DE MAGISTRADOS E DE SERVIDORES INVESTIDOS EM
CARGOS DE DIREÇÃO E ASSESSORAMENTO, NO ÂMBITO DOS ÓRGÃOS DO PODER
JUDICIÁRIO E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS”. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. 1. Os
condicionamentos impostos pela Resolução nº 07/05, do CNJ, não atentam
contra a liberdade de prover e desprover cargos em comissão e funções
de confiança. As restrições constantes do ato resolutivo são, no rigor
dos termos, as mesmas já impostas pela Constituição de 1988, dedutíveis
dos republicanos princípios da impessoalidade, da eficiência, da
igualdade e da moralidade. 2. Improcedência das alegações de
desrespeito ao princípio da separação dos Poderes e ao princípio
federativo. O CNJ não é órgão estranho ao Poder Judiciário (art. 92,
CF) e não está a submeter esse Poder à autoridade de nenhum dos outros
dois. O Poder Judiciário tem uma singular compostura de âmbito
nacional, perfeitamente compatibilizada com o caráter estadualizado de
uma parte dele. Ademais, o art. 125 da Lei Magna defere aos Estados a
competência de organizar a sua própria Justiça, mas não é menos certo
que esse mesmo art. 125, caput, junge essa organização aos princípios
“estabelecidos” por ela, Carta Maior, neles incluídos os constantes do
art. 37, cabeça. 3. Ação julgada procedente para: a) emprestar
interpretação conforme à Constituição para deduzir a função de chefia
do substantivo “direção” nos incisos II, III, IV, V do artigo 2º do ato
normativo em foco; b) declarar a constitucionalidade da Resolução nº
07/2005, do Conselho Nacional de Justiça (ADC nº 12, rel. Min. CARLOS
BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 20.08.2008, DJe-237 DIVULG
17.12.2009 PUBLIC 18.12.2009 EMENT VOL-02387-01 PP-00001 RTJ VOL-00215-
01 PP-00011 RT v. 99, nº 893, 2010, p. 133-149).
Portanto, cada vez mais, torna-se necessário que o administrador analise as regras de
acordo com o texto constitucional, e não o inverso. A partir da Constituição extraímos
valores muito importantes para a fundamentação do que vem abaixo. Se uma lei esbarra
em uma inconstitucionalidade flagrante não tem como cumpri-la.
ii) Estado de defesa e estado de sítio: para o professor Celso Antônio Bandeira de Mello
(2010), o princípio da legalidade também é excepcionado nos casos de estados de defesa
e de sítio. Aqui, do mesmo modo, entende-se que não se trata de exceção ao princípio da
legalidade administrativa, e isto porque tais atividades estão mais relacionadas às funções
de governo (funções políticas) do que propriamente às funções administrativas
(BORTOLETO, 2018).
Por fim, deve-se destacar que o art. 22 da Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro (LINDB) trata do primado da realidade, que não pode servir de obstáculo à
realização do Direito, mas sim para considerar a circunstância de exigência de
cumprimento da determinação contida no texto legal (NOHARA, 2018).
Do dicionário Aurélio extraímos que impessoal é quem não se dirige ou aquele que não
se refere a uma pessoa em especial, mas a todas as pessoas em geral (FERREIRA, 2004).
Isso porque a impessoalidade tem sido estudada sob dois vieses: um primeiro, que trata
da relação da Administração Pública com o administrado; e um segundo, que se detém na
impessoalidade em relação à própria administração.
O que pretende o texto constitucional é proibir tratamento desigual entre pessoas que se
encontrem na mesma condição, distinguindo a igualdade material da igualdade
meramente formal. Privilegiando aquele cerne da igualdade (material), encontramos
decisão importantíssima do STF ratificando o sistema de cotas raciais como política de
inclusão social (STF, Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF nº
186/DF, julgada em 26.04.2012). No mesmo sentido, a Lei nº 12.990/2014, que reserva
20% dos cargos públicos federais aos candidatos que se autodeclararem negros ou pardos
no ato de inscrição do concurso (art. 2º).
Por sua vez, sob o outro enfoque da impessoalidade, quer se dizer que a Administração
Pública deve ser impessoal em relação a ela mesma, não sendo suficiente ser
impessoal em relação aos administrados, de modo que quando um prefeito determina a
realização de uma obra pública, quem o faz juridicamente é a pessoa jurídica de direito
público do município, e não o prefeito.
Nessa perspectiva, devemos destacar, também, a teoria do órgão, de modo que o ato
praticado não é imputado à pessoa que o praticou, mas à pessoa jurídica à qual pertence o
órgão em que o servidor está lotado.
Ademais, se afirmamos que a prática do ato é imputada à pessoa jurídica a que pertence o
agente, não poderíamos responsabilizar diretamente o agente público que o pratica. Isso
também é a impessoalidade em relação à própria administração. Nesse sentido, o STF
tem adotado a orientação de que a CF/1988 consagra a tese da dupla garantia:
(...) uma em favor do particular, possibilitando-lhe ação indenizatória
contra a pessoa jurídica de direito público, ou de direito privado que
preste serviço público, dado que bem maior, praticamente certa, a
possibilidade de pagamento do dano objetivamente sofrido. Outra
garantia, no entanto, em prol do servidor estatal, que somente responde
administrativa e civilmente perante a pessoa jurídica a cujo quadro
funcional se vincular (STF, RE nº 327.904/SP, julgado em 15.08.2006).
Muito importante!
Por exemplo, um prefeito de uma cidade que tem uma autorização legal para comprar
viaturas oficiais de representação da chefia do executivo municipal, bem como dos
secretários, resolve adquirir modelos de veículos Jaguar, não obstante a situação de
penúria financeira pela qual passa a cidade. Em tal circunstância argumenta que a lei não
o proíbe, que tem discricionariedade e o Jaguar é mais confortável. Isso não faz o menor
sentido, em que pese não ser ilegal, pois é imoral.
Com efeito, no exemplo dado, apesar de estar atuando dentro da autorização da lei, o
nível de reprovabilidade é até majorado, tendo em vista a completa inobservância de
parâmetros éticos minimamente aceitáveis pela sociedade.
Deve-se ficar atento porque essa vedação alcança os servidores ocupantes de cargo em
comissão, não alcançando aqueles ocupantes de cargo efetivo.
Igualmente, no Agravo Regimental (AgR) na medida cautelar na Reclamação (Rcl) nº
6.650/PR, julgado em 2008, foi fixado entendimento no sentido de que o teor sumular
estaria restrito aos cargos administrativos, não aplicando a vedação quando se tratar de
agentes políticos, a exemplo dos ministros de estado, secretários de estado e município.
Essa abertura, todavia, não deve ser vista como uma liberdade absoluta ao presidente,
governadores e prefeitos para nomearem parentes com total desvio de finalidade, como
aquelas nomeações que são frutos de troca de favores ou nos casos em que é nítida a
inaptidão para o cargo (Rcl nº 7.590/PR).
Trata-se de princípio expresso no art. 37 da CF/1988, mas que também pode ser inferido
em várias passagens do texto constitucional e, por exemplo, já no seu art. 1º consta que o
Brasil é um Estado Democrático de Direito.
Democracia, dizia Abraham Lincoln, é o “governo do povo, pelo povo e para o povo”,
significando, respectivamente, que o povo é a genuína fonte do poder; que o governo se
fundamenta no consenso popular; e que deve beneficiar o próprio povo, livrando-o de
governantes arbitrários que cuidam dos próprios interesses (SILVA, 2007, p. 44). Nessa
toada, é inconcebível que um Estado democrático seja sigiloso. É possível que
determinadas situações sejam acobertadas pelo sigilo, mas isso é exceção.
Vários exemplos podem ser citados, começando pelos editais de concurso público, editais
de licitação, e portais de transparência nos sites de órgãos e entidades.
Todavia, a publicidade não é absoluta, isto é, a regra é que os atos administrativos sejam
publicados, mas pode haver exceção. Nesse sentido, estabelece o art. 5º, XXXIII, que:
todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu
interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão
prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas
aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do
Estado.
Regulamentando esse dispositivo, há a Lei de Acesso à Informação (Lei nº
12.527/2011), aplicável à Administração Direta e Indireta da União, dos estados, do
distrito federal e dos municípios. Trata-se de lei nacional, não aplicável apenas à
Administração Federal. Todos os entes políticos e órgãos públicos devem respeitá-la. De
acordo com o seu art. 5º, “É dever do Estado garantir o direito de acesso à informação,
que será franqueada, mediante procedimentos objetivos e ágeis, de forma transparente,
clara e em linguagem de fácil compreensão”.
Em seu bojo, estão as formas de acesso à informação, os deveres dos órgãos públicos
para promoção do referido acesso, a explicação do que é informação, documento, e, além
de muitos outros temas, uma classificação muito interessante e que objetiva conciliar os
interesses do Estado e o direito à informação. Assim, a depender do teor e de sua
imprescindibilidade à segurança da sociedade ou do Estado, a informação poderá ser
classificada como ultrassecreta, secreta e reservada. As informações ultrassecretas
poderão ser franqueadas aos interessados após 25 anos; já as informações secretas, após
15 anos; enfim, as informações reservadas, após cinco anos (art. 24, § 1º, III, da Lei nº
12.527/2011). Todos esses prazos são contados da data da produção daquilo que se
pretende o acesso.
Este é um princípio que não constou na redação original do texto constitucional. Foi
incluído no art. 37 por meio da Emenda Constitucional (EC) nº 19/1998. A inclusão nesse
dispositivo apenas tornou expressa a necessidade de eficiência na Administração Pública
e, mesmo antes da mencionada emenda, era possível inferir esse princípio, por exemplo,
do art. 74, II, da CF/1988.
Nessa época, ganhava força a ideia de uma administração menos burocrática, que não
fosse deficiente. Concebia-se um plano gerencial para a Administração Pública, algo
mais aproximado da gestão privada, no qual os resultados são sempre importantes. A
existência de obras públicas há décadas inacabadas, de desperdício de dinheiro público e
do aumento da corrupção fez surgir a necessidade de uma administração gerencial,
preocupada com a relação de custo-benefício.
i) Em relação ao desempenho da atividade pelo agente público, que deve executar sua
tarefa da melhor maneira possível.
ii) Em relação à organização administrativa, que deve ser estruturada de maneira racional,
buscando resultados que atendam ao interesse público.
Muito importante!
Muito importante!
Nesta linha doutrinária, a razoabilidade teria outro sentido, seria um instituto capaz de
afastar a previsão normativa que em um caso concreto não deve ser aplicada, pois se
mostraria irrazoável. Por exemplo, se uma pessoa vai a um restaurante em que na porta
está escrito que é proibida a entrada de animais. Por sua vez, uma criança entra
carregando um peixe ornamental dentro de um saco plástico. Não é razoável deixar a
criança de fora, assim, a regra não será aplicada neste caso, pois ela exorbita os limites da
razoabilidade, ela não foi criada para este caso. A mesma coisa ocorre com o cão guia,
pois o cego não deixará de entrar no restaurante por conta da vedação à entrada de
animais pela norma.
Por não ser princípio expresso no ordenamento brasileiro, o STF tem entendido que o
princípio da razoabilidade tem sua sede material no art. 5º, LIV, da CF/1988, onde consta
o postulado do devido processo legal.
Nesse sentido, é bem mais fácil de visualizar a aplicação desse princípio nos atos
discricionários (aqueles em que o administrador tem a possibilidade de escolha) do que
nos atos vinculados, em relação aos quais a atuação do administrador é exatamente o
comando que está na lei, sem avaliação de conveniência e oportunidade.
A autotutela nada mais é do que uma função que o administrador possui de, sob a ótica da
legalidade e/ou do mérito administrativo, rever suas decisões.
No Brasil adota-se o sistema de jurisdição única. Isso não quer dizer, entretanto, que
apenas o poder Judiciário pode decidir sobre a legalidade dos atos administrativos. A
própria administração, no exercício ou no poder da autotutela pode controlar seus atos
administrativos. Assim, pode a administração, independentemente de anuência de outro
poder, revogar seus próprios atos, quando inconvenientes, ou anulá-los, quando ilegais.
i) Mérito: aqui o exercício de autotutela recai sobre atos válidos, legais, mas que se
tornaram inconvenientes e inoportunos e deixaram de atender ao interesse público,
podendo ser revogado pela administração.
ii) Legalidade: diante de um ato ilegal, a Administração Pública deve anulá-lo, pois
somente assim estaria observando o princípio da legalidade.
Sabemos que a Administração Pública atua diretamente, quando o próprio ente político,
por meio de seus órgãos, presta a atividade administrativa, ou indiretamente, criando
pessoas jurídicas para a prestação das diversas atividades administrativas.
Quando a administração cria uma pessoa jurídica, não existe relação de subordinação
entre ambas. Existe apenas vinculação.
Nesse sentido, pelo princípio da tutela, deve a administração direta controlar, isto é,
fiscalizar as atividades desempenhadas pela administração indireta. É um controle de
finalidade, em que é verificado se a administração indireta está cumprindo o objeto para o
qual foi criada.
i) Greve dos servidores: se o serviço público é ininterrupto, como ficaria a greve dos
servidores públicos? Pensando nisso, a CF/1988 estabeleceu que a greve dos servidores
públicos seria exercida nos termos e nos limites definidos em lei específica (art. 37, VII).
Essa lei tem o dever de estabelecer as diretrizes da greve dos servidores públicos,
compatibilizando o direito de greve com o princípio da continuidade do serviço público.
Ocorre que essa lei ainda não existe. Não obstante, o STF entendeu legítima a greve dos
servidores públicos e decidiu que, enquanto não houver lei específica, a Lei nº
7.783/1989 (lei de greve da iniciativa privada) será aplicável aos servidores públicos civis
(Mandado de Injunção – MI – nº 670/ES e MI nº 712/PA).
No que tange aos militares, a CF/1988 estabeleceu que são proibidas a sindicalização e a
greve (art. 142, § 3º, IV). Essa proibição do texto constitucional foi dirigida aos militares.
Todavia, o STF entendeu que a carreira policial é essencial para a segurança pública e
definiu a seguinte tese com repercussão geral: “O exercício do direito de greve, sob
qualquer forma ou modalidade, é vedado aos policiais civis e a todos os servidores
públicos que atuem diretamente na área de segurança pública” (STF, Plenário, ARE nº
654.432/GO, rel. Min. Edson Facchin, rel. para o acórdão Alexandre de Mores, julgado
em 05.04.2017).
Assim, o direito de greve no serviço público deve ser ponderado com o princípio da
continuidade do serviço público.
E o que ocorre se o devedor do serviço concedido for o poder público? O que acontece
quando o poder público não paga sua conta de energia elétrica, por exemplo? Pode haver
a interrupção?
Desse modo, por força desse dispositivo legal, identifica-se a mitigação da exceção de
contrato não cumprido no âmbito da Administração Pública, em razão do princípio da
continuidade do serviço público. Quer dizer, mesmo não recebendo pelo serviço prestado,
desde que nos limites que a lei estabelece, o contratado continuará a realizar o serviço.
iv) Ocupação temporária de bens vinculados a serviços essenciais: na forma do art.
58, V, da Lei nº 666/1993, o regime jurídico administrativo confere à administração a
prerrogativa de:
(...) nos casos de serviços essenciais, ocupar provisoriamente bens
móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato,
na hipótese da necessidade de acautelar apuração administrativa de
faltas contratuais pelo contratado, bem como na hipótese de rescisão do
contrato administrativo.
Pelo princípio da especialidade, sempre que possível, é melhor que seja criada uma
entidade específica para desempenhar uma atividade determinada (MAZZA, 2011).
Se a administração somente pode fazer aquilo que a lei autoriza, presume-se que, quando
atua, o faz com respeito ao princípio da legalidade, e, portanto, tem presunção de
veracidade.
Não temos, aqui, um princípio absoluto. Trata-se de princípio relativo e que pode ser
infirmado se demonstrada a ilegalidade da conduta. Quer dizer, trata-se de presunção
relativa (iuris tantum), admitindo-se prova em contrário. Todavia, ocorre a inversão da
prova, cabendo ao administrado demonstrar a situação que contraria a presunção.
Além da inversão do ônus da prova, outro efeito desse princípio é que a administração
não precisa pedir autorização a outro poder para que seus atos sejam levados a efeito. Se
é presumido que ele foi praticado conforme a lei (em regra), poderá o ato ser executado
pela própria administração.
Ainda, pode ser apontado como efeito desse princípio que o ato administrativo produzirá
efeitos até que seja retirado do mundo jurídico, quer dizer, como existe a presunção de
que o ato está em conformidade com o ordenamento jurídico, uma vez praticado ele não
pode ser desconstituído somente pela alegação do interessado. Ou a própria
Administração ou o Poder Judiciário, no exercício da função jurisdicional, terá que
reconhecer que a presunção foi derrubada e que, em razão do ato ser ilegal, será anulado.
Para exemplificar, imagine um estabelecimento que tenha sido interditado por não
atender às condições de higiene para seu funcionamento. Mesmo que o ato de interdição
tenha vício, como existe a presunção de legitimidade, caberá ao interessado o ônus da
prova da ilegalidade e a interdição se manterá até que o ato seja anulado ou pela própria
Administração ou pelo Poder Judiciário.
3.14. Princípio do controle judicial dos atos administrativos
Esse princípio decorre do Sistema Inglês, aquele adotado pelo Brasil. Por esse sistema,
apenas o poder Judiciário pode decidir em definitivo sobre os atos praticados pela
Administração Pública. Esse princípio tem como corolário o princípio da inafastabilidade
do controle judicial de lesão ou ameaça a direito, consagrado expressamente no texto
constitucional como direito fundamental (art. 5º, XXXV, da CF/1988).
Na esfera administrativa, existe uma grande preocupação com a segurança nas relações
em que o poder público é parte. Isso porque, por força do regime jurídico administrativo,
em regra, a participação do poder público nas relações já é o bastante para gerar um
desequilíbrio, despontando uma verdadeira verticalidade entre os sujeitos, tudo em
benefício do interesse público. Porém, isso não despe o administrado de direitos, sejam
esses consagrados expressamente, sejam imanentes ao próprio ordenamento jurídico.
Por fim, merece destacar que a segurança jurídica ganhou ainda mais robustez com a Lei
nº 13.655/2018, inserindo os arts. 23, 24, 26 e 30 à LINDB:
Art. 23. A decisão administrativa, controladora ou judicial que
estabelecer interpretação ou orientação nova sobre norma de conteúdo
indeterminado, impondo novo dever ou novo condicionamento de direito,
deverá prever regime de transição quando indispensável para que o novo
dever ou condicionamento de direito seja cumprido de modo proporcional,
equânime e eficiente e sem prejuízo aos interesses gerais.
II – (VETADO);
IV– deverá prever com clareza as obrigações das partes, o prazo para
seu cumprimento e as sanções aplicáveis em caso de descumprimento.
§ 2º (VETADO).
Ainda, podem ser apontados (MELLO, 2010) o inciso II e o parágrafo único do art. 1º, e
o inciso XXXV do art. 5º, todos da CF/1988: o primeiro estabelecendo a cidadania como
fundamento da República Federativa do Brasil, o segundo enunciando que o poder emana
do povo e o último garantindo a inafastabilidade da jurisdição.
Muito importante!
Destarte, o inciso I, do art. 50, em verdade, torna muito clara a ideia de que,
em regra, os atos administrativos devem ser motivados. O mesmo art. 50, já
no seu § 1º, autoriza o que a doutrina denomina como motivação aliunde ou
per relationem, ou seja, aquela motivação feita por referência. Por exemplo,
quando se coloca que o ato está “de acordo com o parecer X nas fls. Y a A”.
O motivo está contido em outro ato administrativo e o ordenamento aceita
isso.
Salienta-se que, quando se fala de motivação, ganha relevância a teoria dos motivos
determinantes. De acordo com esta teoria, os motivos apresentados pelo administrador
que editou o ato administrativo são determinantes para a sua validade, chegando até a
vincular o ato administrativo.
A teoria dos motivos determinantes tem sido muito empregada pelo poder judiciário no
controle dos atos administrativos e, em especial, dos atos discricionários, pois, se o
administrador, a despeito de ter discricionariedade, apresenta os motivos no corpo do ato,
aquilo irá vinculá-lo. No entanto, se o motivo não ocorreu, o ato pode ser anulado pelo
judiciário.
Também, deve ser lembrado o art. 20 da LINDB, pois estabelece que a motivação deverá
demonstrar a necessidade e adequação da medida imposta, indicando se a alternativa
encontrada é superior às demais alternativas (NOHARA, 2018).
3.17. Princípio da hierarquia
Por este princípio, dentro da Administração Pública, existe uma relação de coordenação e
subordinação entre os diversos órgãos públicos existentes na mesma pessoa jurídica. É
um escalonamento vertical em que o superior tem o direito de fiscalizar o desempenho do
trabalho do subordinado, dar ordens, aplicar sanções, avocar e delegar atribuições. Ao
subordinado assiste o dever de cumprir os comandos de seu superior (desde que não
manifestamente ilegais, é claro).
O importante aqui é destacar que existe hierarquia apenas dentro de cada pessoa jurídica,
ou seja, no âmbito interno de cada pessoa jurídica (por exemplo: dentro de uma autarquia,
de uma fundação, do município), imperando uma relação de coordenação e subordinação.
No entanto, não existe hierarquia entre um município e sua autarquia, pois existe, nesse
caso, vinculação.
Assim, tem como elemento central a substituição da ideia de subordinação pela ideia
de coordenação, de consensualidade. Envolve a pluralização dos canais de participação
do administrado na consecução do interesse público (Diogo de Figueiredo). O particular
ou administrado deixa de ser encarado como súdito e passa a ser visto como parceiro,
colaborador, no atingimento do interesse público.