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UNIVERSIDADE ZAMBEZE
FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANIDADES
CURSO DE DIREITO
1. Noção
Os princípios são enunciados jurídicos que subjazem à ordem jurídica como suas grandes
orientações, estruturantes e valorativas, influindo na produção, no conteúdo e alcance das normas
jurídicas2. Comparativamente às normas jurídicas – comandos ou ordens que se dirigem a um certo
destinatário impondo obrigações, proibições ou permitindo condutas – os princípios jurídicos têm um
alcance mais abrangente, desempenhando por isso uma função reveladora que supera a da norma
jurídica(3)(4).
Os princípios gerais encabeçam – hic et nunc – o ramo do Direito Admnistrativo – complexo de
normas jurídicas a que a Administração Pública se subordina na sua actuação, funcionamento e relação
com particulares – como fundamento ou inspiração das “soluções relativas à interpretação e à
qualificação das normas jurídicas de acordo com uma perspectiva de coerência e de eficácia do
ordenamento jurídico5”.
Os princípios são tirados quer da tradição liberal - igualdade, liberdade, garantia –, quer das
necessidades da vida social – continuidade do serviço público, controlo superior dos actos dos
inferiores –, quer ainda dos imperaticos de equidade – enriquecimento sem causa6.
O Direito Constitucional, composto pelas normas contidas na lei fundamental, ou Constituição, não
se preocupa apenas em estruturar e organizar o Estado através da determinação dos seus órgãos de
soberania9. Também se presta à fixação de princípios fundamentais que fundam, ou que servem de
pilares básicos de toda a ordem jurídica estadual. Estes princípios irradiam todos os demais ramos do
Direito. A propósito, como observa Vital Moreira citado por Freitas do Amaral, “as constituições
inserem as «têtes de chapitre» dos demais ramos do Direito.
O Direito Administrativo como ramo de Direito não está isento deste encabeçamento dos seus
princípios pelo Direito Constitucional. Por outras palavras, e mais concreto, é preciso dizer que os
princípios que norteam a actuação da Administração Pública não fogem à regra. Encontram
consagração na Constituição da República.
Desde logo, a CRM abre o seu TÍTULO I com a epígrafe “princípios fundamentais” para
logo no art. 1.º definir a República de Moçambique como um “Estado independente, soberano,
democrático e de justiça social”. Note-se que os termos da definição acima são verdadeiros princípios
jurídicos que enunciam a consciência, o objectivo e fixa as traves mestras da ordem jurídica
moçambicana.
7 Cfr. Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado Matos, Direito Administrativo Geral, I..., p. 135 e Jean Rivero,
op.cit, pp. 86 e 87
8 Jean Rivero, op.cit.,p. 88
9
Para melhor compreensão do conceito de Direito Constitucional, vide Inocêncio Galvão Telles, Introdução ao
Estudo,..., p. 171
Colecção Textos de apoio para estudantes de Direito Administrativo (2013)
A partir daí, toda a construção das normas seguintes corresponde à imbricação dos já
enunciados princípios com os demais que vão sustentando a configuração do Direito moçambicano
no seu todo: o do Estado de Direito e Democrático com as suas refracções ou propagações.
Para a Administração Pública, a Constituição reservou-lhe o TÍTULO XII (Administração
Pública, Polícia, Provedor de Justiça e Órgãos Locais do Estado) e, neste, dedicou-lhe o CAPÍTULO
I (Administração Pública), começando no seu art. 249.º por se referir aos princípios fundamentais.
É importante notar que, neste aspecto, a CRM está preocupada primacialmente com a
prossecução do interesse público, que não pode alcançar-se sem PODER ADMINISTRATIVO, mas
limita e condiciona-o com o respeito pelas liberdades fundamentais dos cidadãos (n.º 1). No n.º 2 do
mesmo artigo, o legislador constituinte continua preocupado com a limitação do poder administrativo,
agora com os princípios da igualdade, imparcialidade, ética e justiça.
Como salienta Freitas do Amaral10, o único fim do Estado é a prossecução do interesse público.
Contudo, este desiderato não se materializa a bel prazer da Administração. Existem limites à acção
administrativa e estes encontram-se expressos como orientações-chave.
É dentro desse quadro em que nos orientaremos a partir deste momento.
10
Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, Vol. II,... p. 33
Colecção Textos de apoio para estudantes de Direito Administrativo (2013)
b) O princípio da proporcionalidade
Este princípio impele a administração a provocar uma menor lesão de interesses privados
compatível com a prossecução do interesse público em causa.
Dele se extraem três subprincípios, nomeadamente, o da adequação, o da necessidade e o da
proporcionalidade strictu sensu.
O primeiro ter-se-á por cumprido sempre que a medida adoptada seja idónea ou apta à obtenção
da finalidade eleita.
O segundo exige a opção pela medida que provoque um mínimo de interferência nos direitos,
interesses e bens jurídicos que se prevê poderem ser lesados.
O terceiro dispõe que a medida só é proporcional se dela decorrerem, de forma razoável ou
adequada, mais benefícios, tendo em vista a consecução do fim proposto, do que prejuízos para os
restantes direitos, interesses ou bens jurídicos em confronto.
Este princípio obriga a administração à ponderação entre os benefícios que as suas medidas têm
para o interesse público e as desvantagens que as mesmas acarrectam para a esfera jurídica dos
interessados.
O n.º 3 do art. 2.º da CRM abre a porta ao Estado de Direito dispondo que “o Estado subordina-
se à Constituição e funda-se na legalidade”. Salienta-se, a partir daqui, a subordinação jurídica de todos
– da colectividade e do poder político, no qual a administração – à lei (latu sensu).
O princípio da legalidade encerra o entendimento de que, por um lado, a administração não
deve contrariar o direito vigente e, por outro, a actuação administrativa deve fundar-se numa norma
jurídica11.
Com o que fica dito, ressalta que as actividades materiais ou operacionais da administração, as
decisões da administração, seja qual for a autoridade de que emanam estão totalmente vinculados às
normas jurídicas em geral, vigentes no ordenamento jurídico.
d) O princípio da imparcialidade
Este princípio visa assegurar que nas decisões administrativas se tenham em consideração todos
os interesses públicos e privados relevantes, de modo a evitar que um interesse público se confunda
com quaisquer interesses privados com que a actividade administrativa possa contender ou se possa
envolver12.
e) Princípio da igualdade
Este princípio determina que a administração deve tratar de modo igual todos os cidadãos que
se encontrem em situações objectivas iguais e desigualmente os cidadãos que se encontrem em
situações objectivas distintas.
Dele decorre o princípio da proibição do arbítrio e, por consequência, o do pagamento da justa
indemnização.
12 José Eduardo Figueiredo Dias e Fernanda Paula Oliveira, Noções de Direito Administrativo,... p. 121