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INTRODUÇÃO A QUÍMICA FARMACÊUTICA E

MEDICINAL
PROF. CRISTIAN ALEX DALLA VECCHIA
QUÍMICA MEDICINAL – QUÍMICA FARMACÊUTICA

Química Medicinal preocupa-se com a invenção, descoberta, planejamento,


identificação e preparação de compostos biologicamente ativos, com o estudo do seu
metabolismo, com a interpretação do seu modo de ação em nível molecular e com a
construção das relações entre a estrutura e a atividade.

Definição recomendada pela IUPAC (1996) elaborada por: C. G.Wermuth, C. R. Ganellin, R. Imhof, P. Lindberg e L. Mitscher
EHRLICH DESCOBRIU QUE CERTOS COMPOSTOS QUÍMICOS
APRESENTAVAM TOXICIDADE SELETIVA CONTRA
DETERMINADOS AGENTES INFECCIOSOS.
Introduziu o princípio da chave-fechadura

Emil Fisher Estabeleceu grande vínculo entre biologia, química


1854-1915 e estereoquímica.
Nobel 1902
EHRLICH DESCOBRIU QUE CERTOS COMPOSTOS QUÍMICOS
Tintas –TOXICIDADE
APRESENTAVAM “Compostos SELETIVA
corados com
CONTRA
DETERMINADOS AGENTES
afinidade seletiva INFECCIOSOS.
pelos tecidos
biológicos”

Corpora non agunt nisi fixata

Paul Ehrlich Uma substância não irá funcionar, a não


ser que esteja ligada.
1854-1915
Nobel 1908 Receptores que “fixam” o corante.

Arsfenamina – “Salvarsan” - 1907.


LINHA DO TEMPO...
Gertrude Elion
Anestésicos locais sintéticos

1ª Sulfonamida útil
HORMONAL TRANSPORTE
ENZIMÁTICA DEFESA COAGULAÇÃO SANGUÍNEA
QUÍMICA MEDICINAL, UMA CIÊNCIA INTERDISCIPLINAR...

Química
Medicinal

Físico-química; Espectroscopia; Bioquímica; Farmacologia;


Cristalografia; Biologia molecular; Imunologia;
Química Orgânica e Inorgânica; Toxicologia; Parasitologia;
Matemática; Computação. Microbiologia; Hematologia.
ASPECTOS GERAIS DE CLASSIFICAÇÃO DA AÇÃO DOS FÁRMACOS

Princípio de Ferguson

EXOBIOFASE (Fluídos Extracelulares) - BIOFASE (Local de Ação)



[ ] do Fármaco nestas fases = Atividade termodinâmica.

Desta forma, Ferguson permitiu determinar se a atividade de um determinado fármaco


deve-se diretamente as suas Propriedades Físico-químicas ou a sua Estrutura Química.
ASPECTOS GERAIS DE CLASSIFICAÇÃO DA AÇÃO DOS FÁRMACOS

Considerando os distintos modos de interação do fármaco com a biofase ou ambiente


fisiológico podemos classificá-los de maneira genérica em dois grandes grupos.

1. Estruturalmente inespecíficos

2. Estruturalmente específicos
FÁRMACOS ESTRUTURALMENTE INESPECÍFICOS

Dependem apenas de suas propriedades físico-químicas para promover o


efeito biológico.

Mec. ação: complexação com macromoléculas da biofase


(interações de Van der Walls)
CARACTERÍSTICAS GERAIS

1) Atuam em altas doses;

2) Estruturas químicas variadas mas, com atividade biológica semelhante;

3) Pequenas variações na estrutura química não resultam em alteração acentuada na


atividade biológica.
FÁRMACOS ESTRUTURALMENTE INESPECÍFICOS

EXCECÃO: Em alguns casos, a alteração das propriedades físico-químicas em


função de modificações estruturais de um fármaco pode alterar seu mecanismo de
interação com a biofase.
FÁRMACOS ESTRUTURALMENTE ESPECÍFICOS

- Compreendem a maioria dos fármacos


- O efeito biológico deve-se à interação do fármaco com o receptor biológico. (O
receptor reconhece o fármaco por meio de sua estrutura química).
- Para explicar este fenômeno Emil Fischer postulou o modelo Chave – Fechadura.
CHAVE - FECHADURA
CHAVE - FECHADURA
PRINCÍPIOS FARMACODINÂMICOS

MODELO CHAVE-FECHADURA
 As propriedades FQ de determinados grupos funcionais são
de fundamental importância na fase farmacodinâmica da ação
dos fármacos.

Grupo farmacofórico - conjunto de


características estéreo-químicas e elétricas que
A afinidade de um fármaco
caracterizam um ou mais grupos funcionais ou pelo seu bioreceptor é
subunidades estruturais, necessários ao melhor
reconhecimento molecular pelo receptor e, dependente do somatório das
portanto, para o efeito farmacológico desejado.
forças de interações dos
grupamentos farmacofóricos
com sítios complementares
da biomacromolécula.
Evento bioquímico
CARACTERÍSTICAS GERAIS

1) eficientes em concentrações pequenas;

2) Todos os fármacos de grupos farmacológicos comuns possuem características


químicas semelhantes;

3) Pequenas variações nas estruturas químicas podem alterar sua atividade biológica e
até produzir um efeito antagônico.
DEFINIÇÕES E CONCEITOS...

REA/SAR - Relações entre a Estrutura e Atividade.


 Descrevem o efeito das estruturas moleculares em
relação a um dado parâmetro biológico, relacionando
esses efeitos a variação na estrutura (modificação
estrutural).
 As REAs podem ser melhor entendidas e avaliadas em
séries de moléculas com pequenas modificações
moleculares. Quando as SARs podem ser quantificadas
de forma padronizada, essas se tornam relações
quantitativas entre a estrutura e atividade (QSAR).
DEFINIÇÕES E CONCEITOS...

Molécula Bioativa (Hit) - Composto ativo identificado em uma triagem biológica ou


através de planejamento molecular.
 Estrutura confirmada e pureza elevada;
 Extratos de produtos naturais não são considerados hits. São espécies ativas, mas
que requerem etapas adicionais de purificação e isolamento para identificação dos
hits (moléculas bioativas);
 Desenvolvimento de curvas concentração x resposta;
 Viabilidade de otimização molecular;
 Estabelecimento de SAR preliminar.
DEFINIÇÕES E CONCEITOS...

Composto líder (Lead Compound) - Desenvolvido a partir de uma série de


compostos análogos de um hit (síntese e avaliação biológica).
 Possui propriedades otimizadas: potência, afinidade e seletividade (algumas
propriedades farmacocinéticas);
 Tem perfil apropriado para a descoberta de uma NCE com potencial de
desenvolvimento clínico.
DEFINIÇÕES E CONCEITOS...

NCE (protótipo) - Desenvolvida a partir de um composto líder (química medicinal e


otimização múltipla).
 Possui propriedades desejáveis para um candidato a novo fármaco: ótima
farmacodinâmica e farmacocinética;
 Exibe perfil apropriado para o desenvolvimento clínico (eficácia e segurança em
modelos experimentais in vivo).
DE ONDE VEM NOSSAS DROGAS?

1. Ao acaso...
2. Triagem empírica...
3. Extração de fontes naturais...
4. Modificação Molecular...
5. Planejamento Racional...
1. AO ACASO...

 O uso do óxido nitroso e éter como gas narcótico usado em cirurgias resultou da
observação que pessoas que inalavam estes gases em festas não sentiam dor, após
machucar-se.

 O efeito de vasodilatação da nitroglicerina foi descoberto por químicos que sentiam


fortes dores de cabeça depois de respirar pouca quantidade deste composto.

 A penicilina foi descoberta por Fleming que contaminou suas placas bacterianas com
um fungo.
2. TRIAGEM EMPÍRICA...

Triagem de alta produção de


drogas sem prévia informação
3. EXTRAÇÃO DE FONTES NATURAIS

V B
S*/NM
10%
3% 12% Na contemporaneidade observa-
S* N
4% 5% se que os produtos naturais
S/NM (plantas medicinais, micro-organismos
10% e minerais) continuam sendo
ND
23%
utilizadas pela população, cerca de
52%.
S
33%

Cragg e Newman, 2020.


Morfina
(Hipnoanalgésico
)

Separação de princípios ativos

➢ Friedrich Serturner (1804) isolou a Morfina (Morphium) da


Papaver somniferum
EXEMPLOS DE PRODUTOS NATURAIS COMO DROGAS OU
COMPOSTOS LÍDER
 Cardiac glycosides, morphine, quinine, salicylic acid, taxol, camptothecin, penicillin,
cyclosporin A, etc…

HO
OH
N O O 3
N N
O N 11 N 2 N 4
10 1
N O H O O
O O HN
O
9 8
H 7
5 O
N 6 N O
RO N N
H
O O HO OMe
R = H: Morphine
OH
R = Me: Codeine O
CO2H
CO2H
Cyclosporine A N
HO
O N O HO
(pain killer) N O
O O
S
H H O OH
NH2 O O OMe
Ampicillin Clavulanic acid
(antibiotic) (-lactamase inhibitor) O OH

Augmentin Clarithromycin
(antibiotic) (antibacterial)
4. MODIFICAÇÃO MOLECULAR

 Consiste em tomar uma substância química bem determinada e de ação


biológica conhecida como modelo ou protótipo e sintetizar análogos estruturais.

 Quase toda modificação dos neurotrasmissores dopamina, serotonina, histamina,


acetilcolina resulta em compostos com atividade modificada e seletiva.

Se não obtivermos um novo fármaco, os dados


obtidos serão relevantes para elucidar REA.
Simplificação ou disjunção
4. MODIFICAÇÃO MOLECULAR – MECANISMOS DE MODIFICAÇÃO molecular

Processos gerais

Conjunção ou associação
molecular

Modificação
Molecular
Alterações que aumentam
ou diminuem a
flexibilidade de uma
molécula

Processos especiais

Alterações das
propriedades físico-
químicas
4. MODIFICAÇÃO MOLECULAR – PROCESSOS GERAIS

1) DISJUNÇÃO, DISSECÇÃO, SIMPLIFICAÇÃO ou DISSOCIAÇÃO MOLECULAR.


 EXEMPLO 1: a benzocaína, procaína, e tetracaína (anestésicos locais), cujo protótipo é a cocaína.

Síntese de compostos
análogos a compostos
protótipos
conhecidos, cada vez
mais simples.
4. MODIFICAÇÃO MOLECULAR – PROCESSOS GERAIS

 EXEMPLO 2: Síntese do Etinilestradiol.


4. MODIFICAÇÃO MOLECULAR – PROCESSOS GERAIS

2) CONJUNÇÃO ou ASSOCIAÇÃO MOLECULAR


 2.1 Replicação Molecular: succinilcolina (bloqueador neuromuscular), associação de
duas moléculas de acetilcolina.

Síntese de compostos análogos a compostos protótipos


conhecidos, cada vez mais complexos, por adição
molecular, replicação molecular e hibridação
molecular.
4. MODIFICAÇÃO MOLECULAR – PROCESSOS GERAIS

2) CONJUNÇÃO ou ASSOCIAÇÃO MOLECULAR


 2.2 Adição molecular: Dimenidrinato, associação de difenidramina e 8-cloroteofilina.
4. MODIFICAÇÃO MOLECULAR – PROCESSOS GERAIS

2) CONJUNÇÃO ou ASSOCIAÇÃO MOLECULAR


 2.3 Hibridação Molecular: paracetamol (analgésico e antipirético), associação de
anidrido acético e p-aminofenol.
4. MODIFICAÇÃO MOLECULAR – PROCESSOS ESPECIAIS

3) Alterações que aumentam ou diminuem as dimensões e a flexibilidade da molécula


 3.1 Fechamento ou abertura do anel;
Fechamento e abertura de anéis,
introdução de ligações duplas, introdução
ou retirada de grupamentos volumosos.

Fisiostigmina Neostigmina
4. MODIFICAÇÃO MOLECULAR – PROCESSOS ESPECIAIS

3) Alterações que aumentam ou diminuem as dimensões e a flexibilidade da molécula


 3.2 Formação de homólogos mais altos ou mais baixos
4. MODIFICAÇÃO MOLECULAR – PROCESSOS ESPECIAIS

3) Alterações que aumentam ou diminuem as dimensões e a flexibilidade da molécula


 3.3 Introdução de ligações duplas

Morfina Nalorfina
4. MODIFICAÇÃO MOLECULAR - PROCESSOS ESPECIAIS
3) Alterações que aumentam ou diminuem as dimensões e a flexibilidade da molécula
 3.4 Introdução, retirada ou substituição de grupos volumosos.
4. MODIFICAÇÃO MOLECULAR - PROCESSOS ESPECIAIS
3) Alterações que aumentam ou diminuem as dimensões e a flexibilidade da molécula
 Isômeria Espacial – Isômeria óptica
4. MODIFICAÇÃO MOLECULAR - PROCESSOS ESPECIAIS

3) Alterações que aumentam ou diminuem as dimensões e a flexibilidade da molécula

Caracterizada pelo desvio que os


compostos químicos apresentam quando
expostos a um plano de luz polarizada
Dextrogira - A luz pode ser desviada para a direita.
Levogira - A luz pode ser desviada para a esquerda.

Enantiômero - se comporta das duas formas.


Mistura Racêmica – partes iguais de
compostos dextrogiros e levogiros de
enantinômeros (atividade óptica inativa) .
4. MODIFICAÇÃO MOLECULAR
3) Alterações que aumentam ou diminuem as dimensões e a flexibilidade da molécula
 3.5 Introdução de centros opticamente ativos.

Apresenta atividade 700 vezes Isômero dextrogiro ou (R) responsável pelas propriedades
maior do que seu isômero. farmacológicas, isômero levogiro (S) tóxico.
4. MODIFICAÇÃO MOLECULAR - PROCESSOS ESPECIAIS

4) Alteração de propriedades físicas e químicas através da introdução de novos grupos


ou substituição de determinados grupamentos por grupos diferentes.

Substituição isoestérica, mudança de


posição de grupos, introdução de
grupos alquilantes.
BIOISOSTERISMO

 Bioisosteros – substituintes ou grupos com similaridades química ou física que


produz propriedade biológica similar. Pode atenuar toxicidade, modificar
atividade do protótipo, e alterar sua farmacocinética.
BIOISOSTERISMO

Mudanças resultantes de substituição bioisostérica


Tamanho, forma, distribuição eletrônica, liposolubilidade, hidrosolubilidade, pKa,
reatividade química, pontes de hidrogênio.

 Efeitos resultantes:
1. Interações de receptores;
2. Farmacocinética;
3. Metabolismo (substituição bioisosterica permite modificações de parâmetros pra
aumentar potencia ou reduzir toxicidade).
4. MODIFICAÇÃO MOLECULAR - PROCESSOS ESPECIAIS
4. MODIFICAÇÃO MOLECULAR - PROCESSOS ESPECIAIS
4. MODIFICAÇÃO MOLECULAR
5. PLANEJAMENTO RACIONAL
DESENHO RACIONAL DE DROGAS

1. Inibidores enzimáticos
 Muitos inibidores enzimáticos foram desenvolvidos por mimetizarem os estado
de transição das enzimas correspondentes. Inibidores de proteases começaram a
partir de petídeos clivados.
Ex: Metildopa/dopadescarboxilase
Alopurinol/xantina oxidase
Tranilcipromina/IMAO Atualmente, modelagem computacional de complexos enzima
substrato tornaram-se muito importantes no desenho racional
de drogas e interpretação de resultados de relação estrutura
atividade.
Fase I: 20-80 voluntários saudáveis. Analisar a segurança,
tolerabilidade e farmacocinética;

Fase II: 100-300 pacientes. Testar eficácia nas situações


clínicas e, se está for confirmada, estabelecer a dose a ser
usada na fase III;

Fase III: Ensaios clínicos definitivos, aleatórios e duplo-


cegos. 1000-3000 pacientes, estudo multicêntrico. Compara
novo fármaco com o referência.Anos para execução;

Fase IV: Farmacovigilância. Acompanhamento pós-


comercial obrigatório. Longo prazo. Milhares de pacientes.
Pode ocorrer retirada do fármaco do mercado. Ex: Kava-
kava, Descon® (2003),Vioxx® (2004).

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