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IX Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Madrid, España, 2 - 5 Nov.

2004

Flexibilidade organizacional e adaptação à cultura setorial:


o caso das organizações sociais no Brasil

Flávio Carneiro Guedes Alcoforado


1. INTRODUÇÃO

Este artigo tem como objetivo expor e discutir sobre os mecanismos utilizados pelas
Organizações Sociais no Brasil que possibilitam a essas organizações adotarem formas de
gestão flexíveis e adaptáveis às suas culturas específicas e as vantagens que propiciam à
organização.

Para o desenvolvimento do trabalho foram utilizados os relatos das experiências do autor em


processos de implantação e gestão de Organizações Sociais e são utilizadas teorias
organizacionais e sobre flexibilidade e cultura.

A relevância do trabalho consiste na catalogação de experiências vivenciadas e na


observação das mesmas a partir de teorias consagradas, de forma a possibilitar aos
estudiosos e interessados no assunto o acesso a esse conhecimento.

O artigo está estruturado da seguinte forma: o capítulo 2 trata dos pressupostos da Reforma
do Aparelho do Estado no Brasil e das características da utilização do modelo de
Organizações Sociais; o capítulo 3 descreve os aspectos organizacionais e gerenciais que
são utilizados nessas Organizações e a sua flexibilidade; o capítulo 4 fala dos aspectos
culturais relevantes nas organizações e sua permeabilidade ao modelo de Organizações
Sociais; e o capítulo 5 conclui o artigo com recomendações e sugestões de futuras
pesquisas.

2. A reforma do Estado no Brasil e o modelo de Organizações Sociais

Com a reforma do aparelho do Estado iniciada na década passada, o Estado brasileiro


passou a adotar modelos diferentes para as organizações, de acordo com a natureza das
atividades ou serviços que as mesmas desenvolvem, de acordo com a divisão prevista no
Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (1995), conforme Quadro 1.

O Estado organizado sob essa nova forma, a partir de então, passou a ser dividido em
setores de acordo com a atividade ou serviço prestado e área de atuação. O Núcleo
Estratégico é composto pelos Poderes Legislativo e Judiciário, pelo Ministério Público e, no
Poder Executivo, pelo Presidente da República, Ministros e Assessores diretos. É ele o
responsável pela condução do Governo e o que define as Leis e as políticas públicas.

Outro setor é o das Atividades Exclusivas de Estado, compreendendo aquelas atividades que
somente o Estado pode realizar através de seu poder extroverso: as de regular,
regulamentar, fiscalizar e fomentar. É o setor através do qual o Estado interfere no Setor
Privado. Este setor compreende as agências reguladoras, as agências de fomento, os
órgãos de fiscalização, a Polícia, a Previdência, dentre outros.

Outro setor é o de Serviços Não-exclusivos, que compreende a prestação de serviços


prestados pelo Estado que já se encontram ofertados à população por entidades públicas
não estatais e privadas, cuja proposta de modelo adotado é o das organizações sociais.

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E o último setor, o de Produção de Bens e Serviços para o Mercado, é aquele em que o


Estado esteve presente em diversas áreas enquanto o mercado não atuava ou era deficiente
e havia grande necessidade da população pelo bem ou serviço. Nesse setor o modelo
proposto é a privatização, com a conseqüente regulação por entidade estatal.

O modelo de Organizações Sociais como formato organizacional, foi idealizado e implantado


para os serviços públicos até então prestados diretamente pela sua Administração Direta ou
Indireta, considerados não-exclusivos. Nesse bojo estão considerados vários serviços
sociais, como: Atividades Culturais, Ciência e Tecnologia, Formação e Meio-Ambiente.

Devido às especificidades culturais de cada setor e os métodos de trabalho de cada grupo de


especialistas dessas organizações, o formato de Organizações Sociais propicia a
flexibilidade de gestão necessária a uma melhor atuação, devido à possibilidade de
incorporar as práticas de gestão próprias de cada campo ou setor, o que facilita, dado o
respeito a tais peculiaridades, a obtenção de ganhos de produtividade nos serviços e de
maior satisfação na prestação dos serviços públicos.

A Organização Social é um tipo de organização do Terceiro Setor, que pode ser constituída
sob a forma de Associação Civil ou Fundação, que assume a execução de determinados
serviços públicos.

Até hoje, no Brasil, só foram qualificadas Associações como Organização Social. Talvez a
predominância desse modelo dê-se pela própria característica da Associação que é
constituída pela união de pessoas em torno de um objetivo comum, o que combina mais
adequadamente com um modelo de organização em que se pressupõe auto-gerida pela
própria comunidade interessada no assunto de seu objetivo social. Isto não impede ou
prejudica a adoção do modelo de Fundação para as atividades de organizações sociais,
apenas restringe um pouco a prática da auto-gestão, já que, neste caso, o Conselho de
Administração é indicado pelas entidades que tem assento garantido estutariamente. Nas
associações a Assembléia Geral de Associados é quem elege os membros do Conselho de
Administração.

O Estado deve focar seu papel em funções estratégicas de elaboração, definição de políticas
e fiscalização. Os serviços sociais não precisam ser executados por organizações estatais
que, em geral, tem pouca flexibilidade e são mais burocratizadas, principalmente em virtude
de ter que se utilizar obrigatoriamente de regras rígidas que prevêem ritos muitas vezes
extensos e demorados para a sua gestão (Brasil, 1997).

A Organização Social é apropriada para a execução dos serviços sociais que requerem
flexibilidade de gestão e agilidade, sem ter que se submeter às leis de licitação públicas, nem
a contratação de pessoal por concurso. Isto não quer dizer que a organização não disponha
de controles. Ao contrário, existem regras que se adequam às atividades desenvolvidas pela
organização, mas que não acarretem demora, nem utilizem etapas que venham a dificultar
ou atrasar a prestação do serviço público à população. Além disso, a Organização Social
utiliza controles de empresa privada, principalmente em relação às áreas contábil, financeira,
suprimentos e recursos humanos (BRASIL, 1997)

Além disso, toda a avaliação do serviço prestado pela organização social é monitorado

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permanentemente por uma comissão da Entidade Supervisora, no caso o órgão público que
contrata os serviços da Organização Social através do Contrato de Gestão. Essa comissão
de avaliação tem por objetivo acompanhar o desempenho da organização, baseando-se nos
indicadores de gestão, qualidade e produtividade que são previstos no Contrato de Gestão
estabelecido pela Administração Pública com a organização.

Através do Contrato de Gestão, o Estado transfere recursos para a Organização Social


executar os serviços que anteriormente eram por ele prestados. Além disso, a organização
se obriga a captar mais recursos no mercado a fim de ampliar a oferta dos serviços à
população. Esses recursos podem ser captados através de venda de bilheteria, projetos
culturais com incentivos fiscais, doações ou mesmo contribuições de associados e
empresas, dentre outras fontes (Brasil, 1997).

Em geral, no Contrato de Gestão são previstos 3 tipos de metas para as Organizações


Sociais:

Metas Organizacionais – são aquelas que dizem respeito à gestão da organização e medem
a eficiência dos administradores que a conduzem. São importantes para a profissionalização
dos serviços prestados. Incluem-se os indicadores econômico-financeiros, de organização
interna e as metas de captação de recursos próprios.

Metas de Produção – são as relacionadas diretamente à atividade fim da organização e


medem a capacidade da mesma em alcançar índices adequados de prestação dos serviços
a que se propõe.

Metas Sociais – são aquelas que promovem a difusão e o acesso democrático dos serviços
públicos executados pela organização a parcelas mais carentes da população e podem ser
beneficiados com o acesso, promovendo inclusão social. Dependendo do serviço público
prestado, podem-se estabelecer parcerias com entidades educacionais ou mesmo
filantrópicas para seu alcance.

3. Aspectos organizacionais e gerenciais

Dentre as funções administrativas necessárias ao funcionamento de qualquer organização,


pode-se identificar algumas que apresentam uma grande possibilidade de flexibilização, de
forma a se adequar ao modo próprio de funcionamento da atividade da Organização Social,
em virtude da natureza do serviço prestado.

Todas as organizações existem com um propósito definido e as Organizações Sociais,


embora gozem da possibilidade de terem formas e regras flexíveis, também tem propósitos
definidos, que são os previstos no Contrato de Gestão. Segundo Bowditch e Buono (1992, p.
166):

“As organizações existem com um propósito. Embora os seus integrantes e grupos possam
ter metas diferentes das da organização, e a organização por si pode ter diversas metas, as
organizações existem para atingir um certo fim.”

No quadro 2, estão enumeradas algumas características específicas que são aplicadas às


Organizações Sociais, relacionadas a alguns processos internos.

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Em relação à administração da Organização Social, esta é realizada por uma Diretoria


Executiva que, como empregada contratada, atua para a consecução dos objetivos
institucionais e a execução do plano de trabalho, utilizando como parâmetro o Contrato de
Gestão estabelecido pelo Poder Público com a entidade e outras regras acertadas com o
Conselho de Administração.

A Organização Social pode adotar diversas formas de contratação de sua mão-de-obra,


conforme o caso específico e suas necessidades, podendo recorrer a contratos pela CLT –
consolidação das Leis do Trabalho, por meio de cooperativas, pessoas jurídicas ou mesmo
autônomos. Além disso, poderá vir a adotar regras próprias para os seus recursos humanos,
relacionadas ao processo de recrutamento e seleção, remuneração e benefícios, e carreira.

Os contratos e compras podem ser realizados diretamente pela organização, sem utilizar-se
de regras rígidas previstas para a Administração Pública, podendo-se ter regras específicas
e flexíveis para cada caso, desde que transparentes e justificáveis por critérios de mercado.

Em relação aos processos internos de controladoria e finanças, deve-se fazer valer de


sistema de custos para avaliar a eventual continuidade ou não de projetos. As despesas
podem ser realizadas de acordo com as necessidades da organização para execução do
plano de trabalho previsto no Contrato de Gestão, de forma que não existem rubricas
orçamentárias rígidas como na Administração Publica, mas um montante de recursos, tão
somente. As receitas podem ser aplicadas no mercado financeiro independente da origem.

Além disso, o próprio desenho das rotinas e processos de trabalhos, nas Organizações
Sociais, não precisam ser padronizados ou utilizar critérios predefinidos de racionalidade ou
burocracia, pois podem ser estabelecidos planejadamente, de modo a atender às
necessidades da atividade, ou mesmo ser construído de acordo com a prática da
organização.

Desta forma, como as regras, os métodos e os fluxos não são rígidos e podem ser
adaptáveis, inclusive, a necessidades emergentes, são mais flexíveis e abertos às
mudanças, os que pode vir a facilitar sobremaneira a capacidade de adaptação a mudanças.
Em relação a esse ponto, cabe citar Morgan (1996, p.241).

Mudanças no ambiente são consideradas como desafios aos quais a


organização deve responder. Embora haja grandes discussões a respeito de
qual deva ser o principal fator que influencia a sobrevivência, polemizando-se
entre adaptação e seleção, tanto os teóricos da contingência como os
ecologistas organizacionais são unânimes em acreditar que os principais
problemas que as organizações modernas enfrentam originam-se de
mudanças no ambiente.

Essa vantagem de adaptação da forma de funcionamento da Organização Social ao


ambiente em que atua deve ser encarada como uma importante mudança de paradigma da
atividade pública que vinha, anteriormente, sendo realizada por uma organização estatal.

A organização estatal é burocratizada, hierarquizada e sujeita a regras rígidas definidas e


aplicáveis a toda a Administração Pública, independente da natureza da atividade de cada

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organização. Isso incorre em que, muitas vezes, essas organizações estatais isolam-se das
especificidades de setor, e passam a encarar suas relações com outras entidades e setores
de maneira formal e padronizada, tratando e lidando com diferentes de modo igual.

Isto pode não ser um problema para as Organizações Sociais, que podem definir suas
diversas maneiras de inter-relacionamento com os diversos mundos organizacionais e
setores. Morgan (1996, p. 249), considera essas organizações que se fecham em relação à
adaptação ao mundo em que estão inseridas como egocêntricas.

Muitas organizações encontram sérios problemas em lidar com o mundo


exterior por não reconhecerem que são uma parte dos seus respectivos
ambientes. Consideram-se como entidades isoladas que deparam com o
problema de sobreviver contra os caprichos do mundo exterior que é
freqüentemente concebido como um lugar de ameaças e oportunidades. Isto
se torna ainda mais evidente nas práticas de empresas que denomino
organizações egocêntricas que possuem uma noção um tanto fixa daquilo que
podem ser e acham-se determinadas a impor ou sustentar a identidade a
qualquer preço.

Ainda sobre a flexibilidade organizacional necessária ou capacidade de adaptabilidade da


organização às mudanças, Morgan (1996, p. 261) diz:

Uma estratégia mais apropriada é aprender como mudar com a mudança,


influenciando e moldando o processo quando possível, mas estando sensível
para a idéia de que em tempos de mudança novas formas de organização do
sistema precisam ter liberdade para emergir. Este processo freqüentemente
depende da habilidade de perceber e evitar tendências destrutivas do sistema
que quase sempre residem nos círculos viciosos criados pelas relações de
feedback positivo, além de se criar espaço onde aprendizagem e padrões de
co-evolução podem ocorrer.

Um outro aspecto a ser destacado nas Organizações Sociais é a possibilidade de utilização


de formas de gestão que incluam a participação dos funcionários no planejamento das
atividades da organização, assim como a adoção de métodos de gerenciamento mais
eficazes que dêem maior espaço à tomada de decisão desburocratizada ou, até mesmo,
descentralizada, conforme a natureza da atividades, as práticas aplicáveis a cada setor e os
valores das pessoas que fazem parte da organização. Tenório (2000, p. 191) fala sobre a
evolução da sociedade e necessidade das organizações se adaptarem, acrescenta sobre o
assunto:

Da especialização do trabalhador (taylorismo) à qualificação versátil; da


produção em massa (fordismo), as organizações agora devem atuar em
função das demandas diversificadas do mercado; da gestão tecnoburocrática
a um gerenciamento mais participativo; do gerenciamento implementado em
“espaços privados” para o gerenciamento desenvolvido em “espaços
públicos”. Portanto, a idéia central é passar: a) de uma gestão organizacional
rígida, burocratizada, na qual o processo de tomada de decisão é
centralizado, para uma flexível, desburocratizada, na qual o processo
decisório será descentralizado; b) de uma gestão monológica ou estratégica
para uma gestão dialógica ou comunicativa.

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Entretanto, não há que se confundir essa grande possibilidade de flexibilização da gestão e


de seus instrumentos nas Organizações Sociais com um desenvolvimento das atividades
sem regras ou instrumentos. A flexibilidade de gestão nas organizações sociais está
principalmente no fato de a organização pode vir a se utilizar mecanismos mais adaptáveis à
natureza das suas atividades e aos valores e práticas do setor em que se insere e com quem
vai interagir. É importante que a organização tenha regras e controles, mas a grande
vantagem está na possibilidade dessas regras e controles não serem imutáveis e também
não estarem acima da consecução dos objetivos de cada situação.

4. Aspectos culturais

As diversas organizações que existem, assim como os diversos grupos de pessoas e os


mais variados setores do mercado têm particularidades que as diferenciam umas das outras
e que as faz adquirir uma identidade própria. Essas particularidades terminam por estar,
também, relacionadas às pessoas que compõem essas organizações e, conseqüentemente
à sua respectiva lógica de funcionamento. Schein (2001, p.243), fala que a cultura influencia
diretamente a forma como são realizados os trabalhos nas organizações.

Quando você pensa em cultura, há chances de que identifique alguns


aspectos de como as pessoas na sua organização se relacionam umas com
as outras e de como elas executam seus trabalhos – “o jeito como fazemos as
coisas por aqui”. A visão mais comum é a de que a cultura está ligada aos
relacionamentos humanos dentro da organização.

Essa cultura de cada grupo ou organização influencia diretamente em seu modelo de


organização interna, nas suas rotinas e processos, na sua forma de se relacionar com o
ambiente externo. Sendo composta pelo conjunto de significados das coisas que estão
postas no mundo, que são compartilhados pelo grupo de pessoas organizado. Segundo
Schein (2001, p. 45):

“A cultura é a soma de todas as certezas compartilhadas e tidas como corretas que um grupo
aprendeu ao longo de sua história. É o resíduo do sucesso.”

A importância de se observar a cultura como um elemento que possibilite mais facilmente a


utilização de determinados instrumentos ou modelos organizacionais é relevante à medida
que se adotam sistemas de regras e uma lógica de funcionamento que não conflite com os
valores de cada setor específico. Schein (2001) fala dos conhecimentos específicos a um
dado setor, que são compartilhados por seus integrantes, pessoas que atuam nesse ramo.
Segundo Schein (2001. p. 29) sobre a importância da cultura:

“A cultura importa porque é um poderoso e muitas vezes ignorado conjunto de forças


latentes que determinam o comportamento, a maneira como se percebem as coisas, o modo
de pensar e os valores tanto individuais como coletivos.”

Um outro aspecto relevante da cultura organizacional é que ela é estável e difícil de mudar,
portanto não se deve impor regras ou instrumentos, além de métodos de trabalho que vão ao
seu encontro, pois afetam diretamente os valores e o significado de êxito de um grupo de
pessoas, assim como, muito provavelmente, influenciarão no resultado dos trabalhos da
organização. Conforme Schein (2001, p. 36):

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As implicações dessa maneira de pensar a cultura são profundas. Em primeiro


lugar, começamos a perceber que a cultura é estável e difícil de mudar porque
representa o aprendizado acumulado de um grupo – as formas de pensar, de
sentir e de perceber o mundo que fizeram o sucesso do grupo.

Estar atento aos aspectos culturais de uma organização é importante, para se moldar a
forma de se atingir objetivos, pois o desafio está em se adaptar os métodos e sistemas de
administração a uma determinada organização com suas crenças e valores estabelecidos e
compartilhados. Segundo Porter (2002, p.53):

A questão não é saber se a cultura desempenha ou não um papel; é entender


esse papel no contexto das determinantes mais amplas da prosperidade. (...)
O modo de tratar o papel da cultura na prosperidade econômica tende a
concentrar-se nos atributos culturais genéricos que se consideram desejáveis,
como a capacidade de trabalho, a iniciativa, a crença no valor da educação, e
em fatores tirados da macroeconomia, como a propensão a economizar e
investir.

Dessa forma, o modelo de Organizações Sociais possibilita uma permeabilidade da cultura


aos instrumentos de gestão, de forma a que o administrador possa utilizá-los para a melhor
realização dos trabalhos e o atingimento dos objetivos organizacionais propostos. Argyris
(1968, p. 63) fala da necessidade de se conhecer as características tanto dos indivíduos
como da organização formal para a elaboração da estrutura a ser implantada na
organização.

“A estrutura não pode ser elaborada sem que se conheçam as características de dois
componentes básicos fundamentais: o indivíduo e a organização formal.”

A possibilidade de utilização das práticas do setor do mercado, referentes à contratação de


pessoal, compras, controles, organização da produção e do próprio marketing é um
diferencial importante para essas atividades que, anteriormente estatais, passaram a ser
executadas pelas Organizações Sociais.

5. Conclusão

Diante das explanações e conceitos levantados na elaboração deste artigo, pode-se concluir
que as Organizações Sociais são um modelo em que se pode utilizar, de forma adaptável ao
meio específico de cada setor, as características culturais próprias como meio de se adaptar
os instrumentos gerenciais e de controle, às especificidades da organização, a fim de se
estabelecer um menor conflito dos indivíduos que a compõem com a estrutura implantada.

Além disso, o modelo de Organizações Sociais propicia uma maior flexibilidade na utilização
de instrumentos de gestão e de modos de seu funcionamento, podendo contemplar as
práticas já utilizadas no setor específico.

É recomendável às Organizações Sociais já implantadas e às que estiverem em processo de


implantação que leve em consideração os aspectos culturais locais e do setor em que a
atividade está inserida, de forma a possibilitar uma melhor adequação dos seus recursos
humanos às necessidades organizacionais de controle e quanto ao estabelecimento de seus

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ritos próprios.

Como sugestão de investigações futuras, podem ser feitas pesquisas e estudos sobre os
aspectos culturais das Organizações Sociais já existentes e como se deu a implantação de
suas estruturas, assim como o grau de adaptabilidade dessas organizações às práticas
consagradas para a sua atividade específica.

BIBLIOGRAFIA

ARGYRIS, Chris. Personalidade e organização. Rio de Janeiro: Programa de Publicações


Didáticas – Agência Norte-Americana para o Desenvolvimento Internacional – USAID, 1968.

BOWDITCH, James L. e BUONO, Anthony F. Elementos de comportamento


organizacional. Tradução de José Henrique Lamendorf. São Paulo: Pioneira, 1992.

BRASIL. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado / Secretaria da Reforma


do Estado. Organizações Sociais. / Secretaria da Reforma do Estado. Brasília: Ministério da
Administração e Reforma do Estado, 1997.

CÂMARA DA REFORMA DO ESTADO, Ministério da Administração e Reforma do Estado.


Plano diretor da reforma do aparelho do Estado. Brasília: Presidência da República, 1995.

MORGAN, Gareth. Imagens da organização. Tradução de Cecília Whitaker Bergamini,


Roberto Coda. São Paulo: Atlas, 1996.

PORTER, Michael E. Atitudes, valores, crenças e a microeconomia da prosperidade. In:


HARRISON, Lawrence E. e HUNTINGTON, Samuel P. Tradução de Berilo Vargas. Rio de
Janeiro: Record, 2002.

SCHEIN, Edgar H. Guia de sobrevivência da cultura corporativa. Tradução de Mônica


Braga. Rio de Janeiro: José Olympio, 2001.

TENÓRIO, Fernando Guilherme. Flexibilização organizacional, mito ou realidade? Rio de


Janeiro: Editora FGV, 2000.

RESENHA BIOGRÁFICA

Flávio Carneiro Guedes Alcoforado é Mestre em Gestão Empresarial pela EBAPE /


Fundação Getulio Vargas – RJ, onde elaborou a Dissertação: Um desafio para a regulação
do mercado de assistência à saúde no Brasil: a escolha do consumidor de planos de saúde,
em 2003; é Especialista em Gestão Empresarial pelo IAG /Pontifícia Universidade Católica
do Rio de Janeiro; e Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco;
Professor de Administração da Universidade Cândido Mendes, onde leciona as disciplinas:
Teoria Geral da Administração, Ética, e Modelos Empresariais. É Consultor da Fundação
Getulio Vargas, na área organizacional; Consultor do PNUD – Programa das Nações Unidas
para o Desenvolvimento, coordenando pesquisas nas áreas de fiscalização de mercados e
satisfação do consumidor. Consultor da FUNDAP – Fundação de Desenvolvimento
Administrativo para a implantação das Organizações Sociais da área da Cultura do Estado
de São Paulo.

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Desenvolveu trabalhos nas seguintes organizações sociais:


ACERP – Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto, mantenedora da TVE
Brasil e Rádio MEC, no Rio de Janeiro;
IACC – Instituto de Arte e Cultura do Ceará, que gere o Centro Cultural Dragão do Mar;
FUNTELC – Fundação de Telecomunicação do Ceará, mantenedora da TV educativa do
Estado do Ceará – em processo de implantação;
Associação de Amigos do Projeto Guri, que gerirá as atividades de formação em música para
crianças e adolescentes, em São Paulo – em processo de implantação;
Associação dos Amigos da Arte, que passará a gerir as atividades da rede de teatros do
Estado de São Paulo – em processo de implantação;

QUADROS, TABELAS E GRÁFICOS

Quadro N° 1: Setores do Estado e formas de propriedade


Forma de Propriedade Forma de
Administração
Estatal Pública Não Privada Burocrátic Gerencial
Estatal a
NÚCLEO ESTRATÉGICO
Legislativo, Judiciário,
Presidência, Cúpula dos
Ministérios, Ministério
Público
ATIVIDADES EXCLUSIVAS
Regulamentação,
Fiscalização, Fomento,
Segurança Pública,
Seguridade Social Básica
SERVIÇOS NÃO – Publicização
EXCLUSIVOS
Universidades, Hospitais,
Centros de Pesquisa,
Museus
PRODUÇÃO PARA O Privatização
MERCADO
Empresas Estatais
Fonte: Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (1995, p. 59)

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Quadro N° 2 – processos gerenciais internos para Organizações Sociais


• Associação civil de direito privado, formada por grupo de
Gestão Organizacional – pessoas da área;
alta Direção • Alta flexibilidade de gestão, sob delegação do Conselho de
Administração – órgão soberano que rege a entidade.
• Pode haver condicionantes previstas no Contrato de Gestão
firmado com o Poder Público, em relação aos objetivos e
resultados;
• Utiliza regras próprias de compras, RH, finanças e
suprimentos – aprovadas pelo Conselho de Administração;
• Executa programa de trabalho com indicadores previstos em
contrato de gestão.
Recursos Humanos • Pode ter servidores públicos cedidos de órgãos da
Administração Pública
• Pode ter empregados contratados pela CLT;
• Pode adotar política de terceirização de atividades;
• Pode contratar especialistas por empreitada, através de
Pessoa Jurídica ou Cooperativa;
• Pode ter plano de cargos, salários e carreiras próprio.
Logística e Suprimentos • Pode contratar diretamente os serviços e produtos
relacionados à sua área de atuação, previstos no seu
planejamento/ orçamento;
• Utiliza-se de processo próprio de compras e contratações,
adequados para a sua atividade.

Controladoria e finanças • Pode utilizar-se de sistemas de gestão e controle próprios,


adquiridos no mercados ou desenvolvido para as suas
atividades;
• Pode realizar aplicações financeiras de suas receitas,
independente da origem;
• Utiliza-se de regras de contabilidade privada para a
apropriação de suas receitas e despesas, investimentos e
financiamentos;
• Deve utilizar-se de sistemas de custos que possibilitem uma
melhor gestão de seus serviços e produtos.

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