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Resumo

Livro: História Do Direito Geral E Brasil – Flávia Lages De Castro

Capítulo XV: Brasil Império

1. A Independência do Brasil e a Constituinte de 1823


Apesar de os ideais de independência ter sido muito citados e
reivindicados pela população na época, sabe-se hoje que o que desencadeou o
processo de independência foi à questão financeira e a sua subordinação a
Portugal. Era discutida pelas Cortes a possibilidade de recolonização e a
manutenção da sujeição a coroa portuguesa, em contra partida a opinião
pública via a posição das Cortes como uma afronta à limitada liberdade que já
se havia conquistado. Frente a independência, a elite brasileira esteve aliada à
formação de uma monarquia, para manter os moldes coloniais de latifúndio,
monocultura, exportação e escravismo
Foi convocada a Constituinte em três de junho de 1822, com o intuito de
preparar o contexto da proclamação de independência. Para evitar possível
oposição para o processo, foi excluída do direito de voto grande parte da
população brasileira e estabeleceu-se uma violente e repressiva perseguição a
todos que estivessem “tramando contra a ordem pública”, ficando inclusive
instituída a censura à imprensa por decreto. Dessa forma ficaram abertos
somente os jornais, os principais meios de propagação de ideias, que
estivessem de acordo com os interesses de D. Pedro.
Para poder continuar existindo, a Constituinte teve que se submeter á
vontade do Imperador, sendo dessa forma designada por muitos como
“Constituinte Consentida”. Foi preparado então o anteprojeto constitucional, em
setembro de 1823, quando foi discutido pela Constituinte. Com 272 artigos,
“refletia a situação política do momento, a presença de tropas portuguesas na
Bahia ainda lembrava o perigo da independência ser apenas um episódio.
Assim, propunha a restrição na participação de estrangeiros na vida política
nacional. Esta preocupação tinha em vista fundamentalmente os portugueses.”.
O anteprojeto ainda instituía o voto censitário, fixando a renda mínima
com farinha de mandioca, mercadoria de consumo corrente, como moeda, fato
que fez com que a constituição fosse apelidada de “Constituinte da Mandioca”.
Alegando estar trazendo graves perigos à nação, D. Pedro fechou a
Assembleia Constituinte e nomeou uma comissão de sua confiança para a
elaboração da constituição.

2. A Constituição Outorgada de 1824


A Comissão designada para a elaboração da constituição de D. Pedro I
era composta por seis ministros e quatro membros escolhidos pelo imperador e
foi denominada Conselho de Estado. Apesar de condenações a constituição foi
outorgada pelo imperador.

2.1 Alguns Pontos da Constituição de 1824


Frente ao contexto histórico da época, D. Pedro I não poderia instituir uma
monarquia com poder absoluto e centralizado, assim, a melhor solução seria
uma Monarquia Constitucional. “Art. 3º: O seu governo é monárquico,
hereditário, constitucional e representativo.”.
A Constituição Imperial sugeria quatro poderes; o executivo; o legislativo;
e, o judiciário, como aludia Montesquieu; e, ainda, o poder moderador. A este
cabia a função de harmonizar os demais poderes e era exercido
exclusivamente pelo Imperador. Tal poder rompe drasticamente com o princípio
de independência dos poderes e o objetivo de limitação de poder do
governante. “Art. 9º: A divisão e a harmonia dos poderes políticos é o princípio
conservador dos direitos dos cidadãos e o mais seguro meio de fazer efetivas
as garantias, que a Constituição oferece.”. “Art. 10º: Os Poderes políticos
reconhecidos pela Constituição do Império do Brasil são quatro: o Poder
Legislativo, o Poder Moderador, o Poder Executivo e o Poder Judicial.”.
O texto constitucional trazia uma dependência dos poderes para com o
moderador. O legislativo, e executivo e o judiciário, por indicações de cargos e
por necessidade de consentimento de governante para seu pleno exercício,
eram severamente submetidos ao quarto, ficando forçados a agirem de acordo
com a vontade do imperador. O legislativo, representado pela Assembleia
Geral, era vinculado a D. Pedro I por esta depender da sanção do Imperador
em suas decisões, dessa forma não era considerado um poder por si só. Além
disso, era formado por Câmara dos Deputados e Senado, este era vitalício e
seus senadores eram escolhidos pelo Imperador por via das listas tríplices.
O judiciário se vinculava ao governante por seus juízes serem todos
indicados pelo moderador, tal dependência agia violando o que se tem como
imprescindível nos dias de hoje, como a independência orçamentária,
vitaliciedade, irredutibilidade de subsídios e inamovibilidade do judiciário. Da
mesma forma, o executivo também tinha seus ministros indicados pelo
Imperador, e era-lhes exigido que referendassem tudo que era proposto pelo
moderador, para que pudesse ter execução.
Pontos destacados na Constituição que existiam por existir: questões
relacionadas à liberdade de imprensa, liberdade de religião e a cópia da
Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão no art. 179, que
contrastava com um país de cultura essencialmente escravocrata.

3. O Código Criminal de 1830


Depois da proclamação da independência era indispensável à criação de
códigos que regulassem a vida social, principalmente um civil e um criminal.
Em 1830, depois de passar por uma Comissão Bicameral, o projeto foi levado à
Câmara de Deputados e foi aprovado, entrando em vigor no início do ano
seguinte.
No Código Criminal de 1830 existia a divisão entre as partes geral e
especial. Seus 313 artigos são atribuídos:
I. dos crimes e das penas, art. 1º a art. 67;
II. dos crimes públicos, art. 68 a art. 178;
III. dos crimes particulares, art. 179 a art. 275;
IV. dos crimes policiais, arts. 276 a 313;

3.1 Alguns pontos do Código Criminal


Apesar de muitos serem contra e ter gerado muita discussão, foi
instaurada a pena de morte no Brasil, com do Código Criminal de 1830. No que
fazia referência a ela, o texto legal dizia que somente seria aplicada se não
houvesse a possibilidade de substituição. Penas mais brandas também eram
previstas, como a de Galés, prisão com trabalho, prisão simples, banimento, a
de degredo, a de desterro, e em sua maioria interrompiam os direitos políticos
dos condenados. Além disso, o código negava a penas que eram consideradas
cruéis, como a tortura.
Em relação a princípios, apesar das falhas, o Código Criminal de 1830
trazia o ideal de justiça muito bem estruturado, assim como inovava com o
Princípio da Legalidade. Para proteger o direito à justiça, às penas para os
juízes eram muito severas, tanto para subornos, quanto para cumprimento de
prazos. Punições severas também eram aplicadas para crimes sexuais, sendo
mais rígidas ainda para estupros de consideradas “mulheres de família”.
Deve-se ressaltar ainda que os menores de quatorze anos, os loucos de
todo o gênero e as pessoas que cometerem um crime levados por medo ou
força “irresistíveis” foram isentos de responsabilidade penal (art. 10), mas se
ficasse provado que haviam cometido crime ou delito estes deveriam apenas
reparar o mal causado, mas se fossem menores de 14 anos, agindo com
discernimento, seriam recolhidos a casas de correção, sendo que o período de
reclusão não poderia ser estendido após o réu completar dezessete anos (art.
13).
O Código é bastante rígido com Juízes, suas funções e obrigações, tanto
no que diz respeito ao recebimento de suborno para dar sentenças (art. 130),
quanto no não cumprimento de prazos (art. 180). Os crimes sexuais também
eram rigidamente punidos no Código Criminal do Império, mas esta punição
ocorreria de maneira mais contundente se a mulher, única vítima possível por
esta legislação, fosse considerada socialmente sendo “de família”, no caso de
ser prostituta a pena era mais leve (art. 222).
Ofendia a moral pública expressar-se religiosamente em público outra
religião ou culto que não fosse católico (art. 276).

4. O Código de Processo Criminal de 1832 e o Ato Adicional de 1834


Desde a dissolução da Assembleia Constituinte em novembro de 1823 e
a consequente implantação do absolutismo disfarçado em Poder Moderador,
vários setores desconfiavam seriamente de D. Pedro I. D. Pedro abdicou o
trono, com a crise que vivia seu Império, e como seu sucessor tinha apenas
cinco anos de idade, para que se cumprisse a Constituição, o Império foi
governado por uma Regência, escolhida entre os membros do Parlamento.
4.1. O Código de Processo Criminal
A Abdicação marcou a retomada do debate liberal que encontrou sua
maior expressão no Código Processual Criminal que deveria ser feito com
urgência visto que o Código Criminal não contemplava o processo. No Código
de Processo Criminal os municípios foram habilitados a exercer, por si
mesmos, atribuições judiciárias e policiais “num renascimento do sistema morto
desde o fim do século XVII”. O Código de Processo deu ao município
autonomia, reativando o juiz de paz com poderes de amplitude maior do que os
traçados pela Constituição, reconhecendo-o como agente conciliador de litígios
e pré-instância judicial, que tinha como função primordial aplainar divergências
e evitar conflitos. A primeira instância, pelo Código de Processo de 1832
dividiu-se em três circunscrições: o distrito, entregue ao Juiz de Paz com tantos
inspetores quanto fossem os quarteirões do município; o termo, que era
composto por um corpo de jurados, um juiz municipal, um escrivão das
execuções e os oficiais de justiça; a comarca, que era composta por um a três
juízes de direito, um deles com o cargo de chefe da polícia. Esta estrutura
trazia problemas gravíssimos, a eleição do juiz de paz era feita levando em
conta o desejo dos grandes latifundiários, que através deles, expunham todo o
seu poder que desta forma não tinha rivalidade.
Podemos destacar o surgimento de um instituto jurídico importantíssimo
para atual noção de justiça: o habeas corpus. Foi no Código de Processo
Criminal que ele foi expresso pela primeira vez. Em 1841 foi feita uma reforma
no Código de Processo Criminal, acabando com a descentralização.
4.2 O Ato Adicional
A reforma da Constituição de 1824 estava nos planos dos que
derrubaram D. Pedro I. Os Exaltados defendiam o federalismo, com autonomia
para as províncias. Os Moderados desejavam acabar com o Conselho de
Estado e a vitaliciedade do Senado. O Ato Adicional, promulgado em 6 de
agosto de 1834 dava maior importância e deveres aos Conselhos Provinciais,
que passavam a ser Assembleias Legislativas, o poder executivo, entretanto,
continuava a ser exercido, conforme determinava a Constituição de 1824, por
um presidente nomeado pelo Imperador. A marca do Ato, é uma mistura entre
centralização e descentralização que resulta em ingovernabilidade. O Poder
Moderador permaneceu, prova máxima de que descentralizar não era de fato o
objetivo. A permanência da tendência centralizadora se faz presente também
na mudança que o Ato efetuou de Regência Trina para Regência Una, eleita
com os votos dos eleitores de segundo grau com mandato de quatro anos, era
uma “experiência republicana”.
4.3 Outras Leis do Período Imperial
Depois do Código Criminal e do Código de Processo Criminal outras leis
foram promulgadas. Um marco histórico da codificação brasileira foi a
promulgação, em 1850, do Código Comercial. Marco estranho foi a Lei de
Terras de 1850, que explica a situação agrária do país até hoje.
5. Nascimento da Tradição Jurídica Brasileira
O Código Criminal de 1830 e o de Processo de 1832 foram balizas na
história jurídica do mundo. Depois da Independência e depois dos primeiros
grandes Códigos brasileiros entrarem em vigor cursos jurídicos começaram a
ser criados no Brasil. Os primeiros foram o de Olinda, o de Recife e o de São
Paulo. Nos anos de 1853 e 1854 inclui-se o estudo das “Institutas de Direito
Romano” e de “Direito Administrativo Pátrio”. Estas legislações também
transformaram as Academias Jurídicas em Faculdades de Direito que
concediam o grau de bacharel formado para os que frequentassem, com
aprovação, os cincos anos do curso e davam título de Doutor a quem
defendesse tese. Um outro marco importante para os advogados brasileiros foi
a fundação do Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiro em 7 de agosto de
1843, na cidade do Rio de Janeiro.
6. A Escravidão e a Lei: Condições e Abolição
Os escravos eram colocados no mesmo patamar de mercadoria, portanto
estavam sujeitos a inúmeras relações, como a alienação. Estavam destinados
a esta condição até a morte, devendo servir seus senhores em qualquer
circunstância. Todos os capturados na África e seus respectivos descendentes
se tornavam escravos. Inicialmente, as leis para os escravos só se faziam
presente no sentido de reger sua posição social e os negócios que envolviam o
comércio destes.
Casamentos, por exemplo, não eram bem aceitos para os senhores, e
somente perto da abolição a Igreja interveio concedendo o direito de
casamento em eles e com a população livre. Leis de cunho organizacional
também existiam, com disposições muito especificas. O escravo que matasse
seu senhor, por exemplo, era condenado à morte. No entanto, punições de
morte não eram muito bem aceitas entre os senhores, pois representava
prejuízo, diminuição de suas mercadorias: os escravos.
6.1 As Leis Abolicionistas
Baseadas nos ideais Iluministas e na pressão exercida por países
capitalistas que tinham a escravidão indo contra seus interesses econômicos,
as primeiras leis abolicionistas foram surgindo aos poucos e gradualmente.
Caminhava-se lentamente em direção à abolição.
6.1.1 A Lei Eusébio de Queiroz
Pressionado pela Inglaterra, em 1850, a Câmara dos Deputados aprovou
a Lei Eusébio de Queiroz. Ela dita que todas as embarcações brasileiras
encontradas em qualquer parte e as estrangeiras encontradas nos portos,
enseadas, ancoradouros ou mares territoriais do Brasil, com escravos ou já os
tendo desembarcados estariam cometendo um crime.
A lei foi facilmente aceita, devido ao fato de praticamente todos os
senhores já possuírem um número considerável de escravos e, portanto, não
precisarem se utilizar do tráfico negreiro para a obtenção de mais.
6.1.2 A Lei do Ventre Livre
Após a lei anterior, surgiu um grande surto industrial e de
desenvolvimento econômico no Brasil. Além dessa modernização, houve
também mudanças ideológicas. Amadureceu-se a ideia de abolição. Com a
abstenção em ações do Estado frente ao movimento abolicionista, este crescia
num ritmo significativo. Em face da pressão estrangeira, acentuada depois das
guerras de Secessão nos Estados Unidos e do Paraguai, e interna, foi posto
em pauta o projeto de lei que previa liberdade aos filhos das escravas: a Lei do
Ventre Livre.
O texto legal determinava que todos os filhos das escravas estariam
livres, porém só após os oito anos de idade, antes disso, ficariam sob tutelo do
senhor. Depois de oito anos completos, eram entregues ao governo que
indenizava os senhores. Ou então, o senhor poderia ficar com o “liberto” até
que o mesmo completasse vinte e um anos e depois disso ele seria obrigado a
trabalhar por seu sustento.
6.1.3 A Lei dos Sexagenários
O abolicionismo estava em seu auge e em todos os lugares poderia se
encontrar debates acalorados a respeito do tema. Frente a muitas
manifestações, o Ministério Dantas apresentou um projeto que pretendia
libertar os escravos idosos. A lei, aprovada, não tinha grandes efeitos, visto que
libertava a quase inexistente parte da população escrava que conseguia, sob
suas tristes condições, atingir seis décadas de vida. Porém, os senhores não
admitiam perder escravos sem a possibilidade de indenização por parte do
Estado, devido ao fato de terem, por muitos anos, investidos capitais em mão-
de-obra escrava. O que acentuou as disputas e manifestações das elites,
aumentando a pressão interna.
6.1.4 A Lei Áurea
Com o abolicionismo crescente, os escravos uniram-se aos que apoiavam
esse ideal e instauraram o caos, abandonando fazendas. A única saída era a
abolição, depois de, inclusive, terem tentado inserir o exército nas
perseguições aos fugitivos. Em 13 de maio de 1888, a Princesa Isabel, estando
regente frente à ausência de D. Pedro II, promulgou a lei que, singelamente,
aboliu a escravidão em nosso país.

Referências:
CASTRO, Flávia Lages de. História do Direito – Geral e do Brasil. 5. ed. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2007.

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