Resenha: “Condições encontradas e suficientes para a mudança de
personalidade” - Carl Rogers
O recorte do texto faz parte da Teoria da Personalidade e das Relações
Interpessoais, desenvolvida por Rogers, com o intuito terapêutico na tentativa de estabelecer em termos formais uma teoria de psicoterapia da personalidade e das relações interpessoais que pudesse conter os fenômenos de sua própria experiência, contando também com a experiência de colegas – chegando a conclusão que não oferece certeza sobre tal, aberto a uma série de hipóteses podendo se confirmar ou serem refutadas. Rogers traz a tentativa de explicar a mudança terapêutica ou uma mudança construtiva de personalidade que por ele, são necessárias condições existentes e que persistam ao longo de um período, onde é necessário que o terapeuta e o paciente estejam interligados e que o paciente esteja em um estado de incongruência que se refere a uma discrepância entre a experiência real e a imagem do selfie do indivíduo até o ponto em que esta representa aquela experiência ou num estado de vulnerabilidade ou ansiedade. Segundo o recorte do livro (1995), são seis condições para que esta mudança possa ocorrer: 1. Que duas pessoas estejam em contato psicológico; 2. Que a primeira, a quem chamaremos cliente, esteja num estado de incongruência, estando vulnerável ou ansiosa; 3. Que a segunda pessoa, a quem chamaremos de terapeuta, esteja congruente ou integrada na relação; 4. Que o terapeuta experencie consideração positiva incondicional pelo cliente; 5. Que o terapeuta experencie uma compreensão empática do esquema de referência interno do cliente e se esforce por comunicar esta experiência ao cliente; 6. Que a comunicação ao cliente da compreensão empática do terapeuta e da consideração positiva incondicional seja efetiva, pelo menos num grau mínimo.
Sobre a relação, é importante o estabelecimento do vínculo/confiança.
Ambos precisam estar integrados, possuindo uma consideração/atenção positiva e incondicional ao paciente. Aceitando como ele é, em todos seus aspectos, dificuldades, cristalizações, sentimentos, culpas, negações – compreendendo que a relação empática é estritamente necessária para haver uma comunicação sobre as referências internas do esquema, de uma forma mais objetiva sobre os seus aspectos, conscientes e presentes de fato na relação de cliente e terapeuta. Sobre o estado do cliente, segundo Rogers (1995), é necessário que o cliente esteja em um estado de incongruência, estando vulnerável ou ansioso – sendo assim discrepância (que apresenta discordância/divergência) – entre a experiência real do organismo e a imagem de self do indivíduo - até o ponto em que ele simula a experiência – quando apresenta um problema/conflito diante de uma situação, sendo assim a causa e o efeito e como mediar isso. Sobre o terapeuta na relação com o cliente, é quando o terapeuta é apenas ele mesmo, sem máscaras, a partir de uma escuta atenta, foco no que faz e como faz – pautado sempre na teoria. Temos sentimentos, mas eles não devem ser mais altos do que a fala do cliente – nossas experiências também são importantes mais o foco é o cliente. O texto traz o termo Consideração Positiva Incondicional, que é a aceitação incondicional entre terapeuta e cliente – a aceitação é incondicional, ela não leva em conta se a pessoa tem apenas “coisas boas” ou só tem “coisas ruins” – é ouvir de fato, entender e acolher, se colocar no lugar do outro – cuidando com as projeções e introjeções. Se fala tanto sobre empatia e na verdade nem se quer muitos de nós, no curso de psicologia sabemos o que é de fato, até porque o que sempre pensamos quando ouvimos a palavra empatia é se colocar no lugar do outro. Mas se colocar no lugar do outro é uma coisa irreal, não dá para se colocar no lugar do outro e sentir o que ele está sentindo de fato - seja bom ou ruim. O correto é “como se” tivesse sido/acontecido comigo, “como se” se fosse comigo – Jamais seremos capazes de sentir o que o outro sente, então se engana muito quem diz: “Eu sei o que você está passando! Aconteceu igualzinho comigo!” – Não, não aconteceu igualzinho com você, pode ter acontecido algo semelhante, mas as pessoas são diferentes, os contextos, épocas – totalmente diferentes. Você/o terapeuta pode ter tido uma situação muito semelhante, mas a maneira como ele lidou ou lida, é totalmente diferente, suas experiências são suas – a do cliente, é dele; sua história de vida e experiências são necessárias e importantíssimas, mas elas são suas – não se confunda e sua régua não pode medir o outro. Ouvi uma frase do Mário Sergio Cortella, em um vídeo, um tempo atrás e não me recordo se é dele, ou se ele parafraseou alguém, mas é sobre você ver as coisas sobre os seus olhos e não pelos olhos dos outros. Volto a falar novamente, precisamos das nossas experiências sim, elas são a base para o nosso trabalho. Acredito que podemos saber a teoria e até usá-la como se fosse uma receita de bolo, falando bem grosseiramente, pois todas as teorias têm fundamentos, você acreditando ou não sobre, mas o fato é que, não podemos ver só com os nossos olhos, mas também não podemos ver só com os olhos do paciente/cliente. Sentiremos a raiva que ele está sentindo, mas levaremos em conta todo o contexto que talvez ele não esteja vendo/percebendo e temos que de fato estarmos atentos se realmente o que temos de teoria e experiência é suficiente para uma intervenção – é normal julgarmos e sentirmos raiva ao ver uma criança aos berros no meio do mercado ou do shopping... olhar a mãe e a mesma está parada olhando para a birra do filho sem fazer nada – Mas você não é mãe, não tem ideia do que é passar pela fase da birra, que todos os pais passam e você não vais ser o ser supremo que faria diferente ao ponto daquilo não acontecer e ainda soltar a frase que sempre ouvimos por aí: “Ahh, mas se fosse comigo!” – mas não é com você! Não sabe por que a mãe está parada apenas olhando. – Sofrimento ou qualquer sentimento não pode ser medido, ainda mais pela sua régua, compreender é uma coisa, medir e achar que sabe como é, é outra. Devemos também ter discernimento do que somos capazes ou não de trabalhar, que talvez nossa teoria não seja suficiente para aquela situação. Em algumas situações pode-lhe faltar teoria ou experiência de trabalho ou ainda de vida e aí cabe o encaminhamento do paciente, devemos ter condições, clareza e humildade de vermos que somos falhos e independente da abordagem nem sempre poderemos trabalhar. Para o bem do paciente e seu/terapêuta, as vezes é melhor o encaminhamento – não queira por exemplo ajudar uma pessoa com um luto semelhante ao seu, se você mesmo se esquivou e não foi capaz de lidar com a sua perda ou trabalhar com crianças se você não passou pela experiência de ser mãe/pai – será que o atendimento terapêutico seria eficiente ou deficitário? De tudo que li sobre o texto e o que penso que adquiri de conhecimento até o momento, acredito que esses trechos são incríveis e fazem total sentido – independente da abordagem. Se não houver a conexão, do vínculo, não há nada – não haverá mudanças, se não houver confiança, se o terapeuta não demostrar interesse ou estar com atento a escuta – com uma escuta atenta, se não tiver base teórica e vivências, se não tiver empatia – “como se” fosse com ele, sem aceitação e sem julgamentos, simplesmente não haverá mudança terapêutica ou mudança construtiva da personalidade – lembre-se sempre que é um outro ser humano na sua frente, é uma pessoa que necessita ser ouvida e acolhida, sem isso, nem pense em teoria/abordagem.
Referências Rogers, C. (1995). As condições necessárias e suficientes para a mudança de personalidade. Em JK Wood, Abordagem centrada na pessoa. Vitória: UFES. (págs. 157-179)