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FUNDAMENTOS DE AÇÕES PREVENTIVAS EM SAÚDE

Unidade II
5 PROCESSO EPIDÊMICO E PREVENÇÃO DAS DOENÇAS TRANSMISSÍVEIS

5.1 Processo epidêmico

Uma das premissas básicas da epidemiologia é que as doenças não se distribuem aleatoriamente,
mas seguem padrões que refletem a atuação de processos de determinação subjacentes. Esses padrões
não apenas permitem projetar ocorrências futuras, mas também desempenham papel preponderante na
compreensão dos processos de produção das doenças e eventos de saúde e na formulação de estratégias
de prevenção e controle.

O padrão de distribuição das doenças e eventos de saúde na população é descrito pelas respostas
combinadas a três perguntas básicas: Quem é afetado? Quando a doença ocorre? Onde a doença ocorre?

Neste capítulo, observaremos um panorama das diversas abordagens, clássicas e contemporâneas,


utilizadas em estudos interessados em abordar como e por que fenômenos epidemiológicos variam de
acordo com tempo, espaço e grupos populacionais, buscando enfatizar também problemas e desafios
enfrentados no processo de construção do conhecimento epidemiológico.

5.2 Variações temporais dos fenômenos epidemiológicos

O monitoramento dos padrões de variação temporal de doenças e outros agravos à saúde é um dos
elementos mais importantes da vigilância epidemiológica. Três principais tipos de flutuações de acordo
com período ou tempo calendário (isto é, passagem de horas, dias, meses, anos etc.) são normalmente
identificados. O primeiro tipo consiste em variações que ocorrem em períodos relativamente curtos (dias,
horas ou meses), como as observadas em situações epidêmicas. O segundo diz respeito a variações que
ocorrem em um longo período de tempo (tendência secular ou histórica). Por fim, existem as variações
cíclicas (sazonais ou não).

5.3 Variações temporais que ocorrem em intervalos curtos de tempo

Mudanças bruscas na incidência de doenças que ocorrem no curso de dias ou mesmo horas são
frequentemente observadas em doenças infecciosas, mas podem, eventualmente, ocorrer devido a
exposições ambientais restritas temporalmente e que abrangem grandes contingentes populacionais,
como é o caso de desastres naturais e os aumentos súbitos na poluição atmosférica e na temperatura.
Um exemplo em doenças não transmissíveis é a onda de calor (heatwave) de 40 °C que atingiu Paris de
17 a 29 de julho de 2003, que esteve associada a um aumento de 190% das mortes quando comparado
com a média de óbitos observados nos três anos anteriores. No caso das doenças infecciosas, esses
fenômenos são mais tipicamente estudados sob o tópico de surtos e epidemias.
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5.3.1 Endemias e epidemias

A definição mais tradicional dos termos endemia e epidemia é aquela que predominou desde os
escritos hipocráticos, na Antiguidade, até a emergência da estatística e sua influência na epidemiologia,
já no século XIX, e que se baseia em uma diferença de qualidade entre doenças endêmicas e epidêmicas.

Tradicionalmente, foram classificadas como doenças endêmicas aquelas que apresentavam entre suas
características epidemiológicas a variação espacial, isto é, uma distribuição espacial peculiar associada
a determinados processos sociais ou ambientais específicos. Do mesmo modo eram classificadas como
epidêmicas as doenças que apresentavam variações no tempo, isto é, denotavam concentração de casos
em períodos determinados, sugerindo mudanças mais ou menos abruptas na estrutura epidemiológica.

A concepção quantitativa passou a considerar ocorrência endêmica aquela que corresponde ao


comportamento usual da enfermidade em uma população específica em um determinado momento
histórico, e ocorrência epidêmica uma alteração significante, brusca e temporária no número de casos
de uma doença em uma determinada população em certo período histórico.

As epidemias sempre fizeram parte da história da humanidade, intensificando-se nas épocas de


transição entre os modos de produção e nos momentos de crise social. Inúmeros são os relatos de
epidemias durante a Antiguidade e a Idade Média, entretanto, é no período de transição entre o modo de
produção feudal e o modo de produção capitalista (mercantilismo) que as “pestes” assumem proporções
devastadoras. A peste negra, pandemia de peste bubônica do século XIV, por exemplo, provocou grande
impacto na população dos países europeus, dizimando em torno de 20 milhões de vidas.

O termo “epidemia” tem sua origem nas palavras gregas epi (sobre, perto de) e demos (povo,
pessoas) e indicaria algo como “uma ameaça que paira sobre as pessoas”. No entanto, é somente no
século XVII que o termo passa a ser mais frequentemente utilizado da forma com que hoje em dia
em geral se define epidemia: a ocorrência de uma determinada doença ou evento relacionado com
a saúde claramente em excesso em relação ao que seria esperado para uma determinada população.
Nesse sentido, uma epidemia não representaria necessariamente a ocorrência de grande número de
casos, mas sim um número acima do usual, tendo em vista a frequência esperada (ou habitual) para um
certo local e tempo. Como efeito, a ocorrência de um único caso autóctone em uma região onde nunca
tenha ocorrido ou que esteja há muitos anos livre de uma determinada doença já seria suficiente para
caracterizar uma epidemia.

Uma variedade de termos relacionados é utilizada para definir aspectos peculiares da ocorrência
espaçotemporal de doenças. O termo “endemia” é usado, em geral, em contraposição à epidemia,
indicando a presença constante de doença, agente infeccioso ou agravo em uma população específica,
ou, em termos mais quantitativos, à prevalência usual da doença em um determinado local ou grupo.
Em situações ou doenças específicas, como no caso da malária, há diferentes termos mais quantitativos
para a prevalência usual da doença em um determinado local ou grupos. Em situações ou doenças
específicas, como no caso da malária, diferentes termos são utilizados para indicar variações nos níveis
endêmicos da doença. A expressão “holoendêmico” é usada para situações em que a transmissão é
contínua e intensa, afetando proporcionalmente mais crianças do que adultos. O termo “hiperendêmico”
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é usado para situações de alta transmissão, mas com flutuações sazonais, afetando de forma similar
todas as faixas etárias. Já os termos “mesoendêmico” e “hipoendêmico” são reservados para caracterizar
regiões com grande variabilidade nos níveis de transmissão da doença ou com níveis de transmissão
baixos ou irregulares, respectivamente.

Em relação à abrangência geográfica, utiliza-se o termo “pandemia” para caracterizar epidemias


que afetam todo o mundo ou grandes áreas geográficas, atravessando fronteiras internacionais e, em
geral, atingindo um grande número de pessoas. “Surto”, por outro lado, é frequentemente utilizado para
se referir a um tipo de epidemia em que os casos se restringem a uma área geográfica pequena e bem
delimitada ou a uma população institucionalizada (creches, quartéis, escolas etc.).

Por fim, a palavra “epizootia” é usada para definir epidemias em populações de animais e, no
âmbito epidemiológico em particular, usada para as zoonoses, infecções de animais vertebrados que
eventualmente podem ser transmitidas para provocar doenças em humanos (por exemplo, peste
bubônica, leptospirose, leishmaniose visceral e raiva).

Existem dois principais modelos ou tipos de epidemias, as de fonte comum e as propagadas ou


progressivas. As epidemias de fonte comum são provocadas pela exposição de grupos de pessoas a uma
única fonte de contaminação, enquanto as propagadas resultam de transmissão direta ou indireta do
agente infeccioso entre hospedeiros suscetíveis.

Epidemia por fonte comum

A principal característica das epidemias desse tipo é a veiculação do agente infeccioso, físico ou
químico por meio de uma única fonte de contaminação, sendo a transmissão de uma pessoa a outra, em
geral, inexistente ou pouco importante para a geração de casos de doença. A epidemia é caracterizada
por um aumento rápido no número de casos, daí ser também denominada epidemia maciça ou explosiva.
Dois padrões de duração são comumente descritos na dependência da persistência do veículo ou fonte
da epidemia por um tempo mais ou menos longo.

Quando a fonte é restrita no espaço e no tempo, basicamente toda a população é exposta


simultaneamente (fonte pontual), levando a que todos os casos apareçam dentro de um intervalo
compatível com um período de incubação da doença. Nesse tipo de epidemia, após o período mínimo
de incubação da doença, os casos começam a aparecer rapidamente até aproximadamente o tempo
mediano de incubação da doença, quando o número de casos deverá decrescer. Pode-se apreender
retrospectivamente o tempo mediano de incubação observando-se o tempo necessário para se acumular
cerca de 50% dos casos. Essa informação é importante, pois permite restringir um período de tempo no
qual mais provavelmente se deu a exposição e pode auxiliar na identificação do agente etiológico, na
medida em que diferentes microrganismos têm associados a eles distintos períodos de incubação.

Por outro lado, se o veículo ou a fonte da epidemia (por exemplo, alimentos, água) permanecer
no ambiente por um tempo mais longo (fonte persistente), então a curva epidêmica deverá refletir as
múltiplas exposições que ocorrem enquanto a fonte de contaminação permanecer ativa. O resultado é
que a duração da epidemia será maior e o declínio dos casos, mais lento.
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Um surto de gastrenterite cuja fonte de contaminação é restrita a um local (como alimentos


contaminados pela bactéria Staphylococcus aureus servidos em uma festa) é um exemplo típico de
epidemia por fonte comum pontual. Por outro lado, na epidemia persistente, a fonte comum tem
existência duradoura, como no caso de um lote de hambúrgueres contaminado pela bactéria toxigênica
Escherichia coli O157: H7 distribuído a várias filiais de uma rede de lanchonetes.

A epidemia progressiva (ou propagada) é mais lenta, indicando que o mecanismo principal de
transmissão é entre indivíduos, e não a partir da exposição simultânea a um determinado agente. Nesse
caso, a transmissão pode dar-se de forma direta entre indivíduos da mesma espécie (por exemplo, contato
sexual na sífilis, por meio de secreções oronasais no sarampo) ou de espécies diferentes (mordida de animais
na raiva), ou, ainda, de forma indireta também entre indivíduos da mesma espécie (por meio de vetores
do gênero Anopheles na malária), entre indivíduos de espécies diferentes (transmissão da leishmaniose
visceral do cão para humanos por meio de vetores do gênero Lutzomyia) ou por meio de veículos (água
contaminada com Vibrio cholerae na cólera). A maior parte das doenças envolvidas em epidemias
propagadas costuma provocar epidemias lentas e progressivas, mas em situações específicas, em particular
quando o número de suscetíveis é muito grande e o potencial de transmissão da infecção é muito alto,
epidemias explosivas podem ocorrer. Esse é o caso da malária, por exemplo, em que a introdução de um
único indivíduo infectante em áreas propícias à transmissão (população suscetível e vetores competentes e
capazes de transmitir o microrganismo) pode gerar de oitenta a cem novos casos e estes irão, por sua vez,
dar continuidade à cadeia de transmissão, levando a epidemias de grande magnitude.

5.4 Detecção de epidemias

Uma das funções primordiais da vigilância epidemiológica é a detecção precoce de epidemias e a


implementação oportuna de medidas de controle. Intervenções em situações de epidemia de doenças
infecciosas podem envolver imunização em massa, remoção de lotes de alimentos contaminados do
mercado, vacinação ou profilaxia de contactantes, isolamento e tratamento de infectantes, entre outras.
O fundamental é que essas intervenções sejam implementadas rapidamente, tão logo a epidemia seja
detectada. Para isso, é importante haver um sistema de detecção de epidemias que consiga identificá-las
logo no início, quando o número de casos ainda é pequeno.

Na maioria das vezes, sistemas de detecção de epidemias se baseiam na identificação de um “evento


aberrante”, isto é, quando o número de casos notificados supera os níveis esperados. Esses eventos são
denominados “aberrantes” porque indicam apenas a existência potencial de uma epidemia, devendo-se
considerar também que esse alarme pode ser falso, devido ao acaso (variações aleatórias na incidência
da doença) ou a artefatos produzidos pelo sistema de notificação.

Considerando essas questões, o problema crítico passa a ser a caracterização de qual seria o nível
esperado de incidência de uma doença em uma região e o estabelecimento de um mecanismo de decisão
para julgar quando o número de casos notificados supera significativamente esse nível. Assim, a maior
parte dos sistemas de detecção de epidemias envolve o cálculo de limites para as taxas de incidência ou
contagem de casos com base em dados históricos. Quando o número de casos notificados (ou as taxas
de incidência) supera esse limite, então ações de investigação epidemiológica são desencadeadas com
vistas a confirmar (ou descartar) a epidemia e implementar medidas de controle.
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Lembrete

Surtos alimentados por transmissão de pessoa para pessoa são


chamados de surtos propagados.

5.5 Prevenção das doenças transmissíveis

Para iniciar o assunto, serão destacadas algumas definições importantes.

• Controle: redução da incidência, prevalência, mortalidade ou morbidade de determinada


doença a um patamar aceitável como resultado de ação ou ações deliberadas. Geralmente ações
continuadas são necessárias para a manutenção do controle.

• Eliminação da doença: redução da incidência de uma doença a zero em determinada área


geográfica, como resultado de ações deliberadas. Geralmente ações continuadas são necessárias
para a manutenção do controle.

• Eliminação da infecção: redução da incidência de uma infecção a zero em determinada área


geográfica, como resultado de ações deliberadas. Geralmente ações continuadas são necessárias
para a manutenção do controle.

• Erradicação: redução permanente a zero da incidência mundial de determinada infecção como


resultado de ações deliberadas. Ações continuadas de controle não são necessárias.

• Extinção: significa que o agente etiológico não existe mais, nem mesmo em laboratório. Essa
situação ainda não ocorreu.

O conceito clássico da prevenção e do controle das doencas, consagrado por Leavell e Clarke na
década de 1950, subdivide as medidas de prevenção e controle em três níveis: primário, secundário
e terciário.

O nível primário refere-se às medidas gerais, visando mais à promoção da saúde do que propriamente
à prevenção ou ao controle de doenças. Exemplos disso são as medidas de saneamento ambiental,
em que o fornecimento de água potável e o esgotamento sanitário criam condições que levam, por
decorrência, ao controle das doenças de transmissão hídrica, como a febre tifoide.

De nível secundário seriam as medidas de proteção específicas contra determinada doença. Um


exemplo clássico é a vacinação.

No nível terciário, temos as ações dirigidas ao indivíduo doente, transmissor em potencial da doença.
Nessa categoria estão as medidas de controle da tuberculose, da hanseníase e da aids, doenças para as
quais o diagnóstico precoce e o tratamento eficaz são medidas importantes para o controle.

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5.5.1 Medidas de proteção individual

Desde o desenvolvimento da microbiologia, com a compreensão dos mecanismos de transmissão das


doenças infecciosas, as medidas de proteção individual, ou medidas de intervenção sobre o indivíduo,
foram se tornando cada vez mais populares. Estas podem ser subdivididas didaticamente, como
apresentado a seguir.

5.5.2 Imunização ativa (vacinação)

É sem dúvida a grande história de sucesso da saúde pública brasileira. O marco simbólico do
sucesso desse programa foi o declínio e a subsequente erradicação da poliomielite no país, a partir de
1981, pela implantação de um programa de campanhas nacionais de vacinação, bianuais, em junho
e em agosto. Não causa espanto o fato de que a base de dados de vacinação é uma das melhores e
mais atualizadas das existentes.

Saiba mais

As informações sobre a incidência das doenças preveníveis por


imunização e sobre doses aplicadas de cada uma das vacinas, assim
como da cobertura vacinal, podem ser facilmente visualizadas. Para
saber mais, acesse:

http://www.datasus.gov.br

A vacinação é, de fato, uma das medidas de saúde pública com a melhor relação custo-benefício e
que tem apresentado resultados mais significativos. A experiência brasileira nas últimas duas décadas
mostra muito bem esse fato.

5.5.3 Imunização passiva

A imunização passiva é hoje apenas uma medida excepcional, aplicada em circunstâncias específicas,
geralmente quando a imunização ativa não pode ser empregada. Um exemplo é o uso de imunoglobulina
específica contra a varicela em gestantes ou em pessoas imunossuprimidas.

5.5.4 Quimioprofilaxia

Muitas vezes eficaz, apresenta problemas quando utilizada em larga escala: indução de resistência
no microrganismo, ocorrência de efeitos colaterais aos medicamentos, custo muitas vezes elevado e
dificuldades logísticas.

A tentativa de empregar a quimioprofilaxia em massa para o controle da malária com cloroquina


na Amazônia brasileira na década de 1950 acabou levando à resistência do Plasmodium falciparum. A
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quimioprofilaxia, no entanto, é de elevado valor em situações restritas, como nos casos da quimioprofilaxia
para o controle da transmissão intradomiciliar ou intrainstitucional da Neisseria meningitidis.

5.5.5 Medidas de barreira química ou física

Essas medidas, não obstante sua grande eficácia em muitas situações, são, com exceção da vacinação,
de difícil implementação em saúde pública, dado que exigem, na maioria das vezes, intervenção
individual continuada, frequentemente dependente de iniciativa do indivíduo. Exemplo disso é o uso de
preservativos nas relações sexuais para proteção contra as DSTs. Essa medida, ainda que antiga, ganhou
importância nas últimas décadas devido à pandemia de aids. Considerada altamente eficaz, quando
usada como medida de saúde pública, encontra sérias barreiras.

5.5.6 Diagnóstico precoce e tratamento

Meios de intervenção bastante empregados, principalmente quando inexiste vacina ou outra


medida de intervenção mais eficaz. Tuberculose, hanseníase e aids são doenças cujo controle depende
de diagnóstico precoce e tratamento dos pacientes, de modo não só a curá-los, ou pelo menos melhorar
suas condições, mas também a torná-los não infectantes.

O que transforma o diagnóstico e o tratamento de uma doença em medida de controle é a existência


de ações programáticas bem definidas, diagnóstico e tratamento padronizados, avaliações frequentes e fácil
acesso dos pacientes aos meios de diagnóstico e tratamento.

5.5.7 Medidas de intervenção no ambiente

Essas medidas ainda podem ser subdivididas em duas categorias, as específicas e as gerais. As
primeiras visam interromper a transmissão de determinada doença, como o uso de inseticidas com o
intuito de controlar anofelinos, reduzindo ou interrompendo a transmissão da malária. As medidas de
ordem geral podem ser tomadas com determinado objetivo em mente, mas acabam tendo impacto
sobre a transmissão de uma série de doenças. As medidas de saneamento, água potável e esgotamento
sanitário são provavelmente as mais importantes desse grupo.

5.5.8 Vigilância

Entre as medidas recomendadas para controle ou mesmo erradicação das doenças infecciosas,
destaca-se a vigilância epidemiológica.

Ela é hoje a ferramenta metodológica mais importante para prevenção e controle de doenças em
saúde pública. É consensual no discurso de todas as entidades de saúde pública em todo o mundo,
desde as de âmbito internacional até as de abrangência local. Destaca-se que não existem ações de
prevenção e controle de doenças com base científica que não estejam estruturadas sobre sistemas de
vigilância epidemiológica.

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Vigilância e investigação de doenças infecciosas, assim como de seu controle, sejam casos isolados,
sejam surtos, são inseparáveis em conceito e em ação, uma inexiste na ausência da outra. Constituem,
sem dúvida, as ações imprescindíveis de qualquer conjunto de medidas de controle de doenças infecciosas
e hoje possuem grande valor.

Antes do início da discussão, cabe lembrar que serão consideradas doenças de notificação
compulsória como um conceito, e não como uma listagem de doenças. Isso ocorre porque, para
alcançar o status de notificação compulsória, é vital que exista uma política pública de controle ou
de ações com relação à doença, sob o risco de se incorrer em erro grave. É totalmente desprovida de
senso lógico a notificação de uma doença sem que isso deflagre ou pelo menos subsidie um conjunto
de medidas de saúde pública.

Decorrência inevitável da definição citada é a afirmação inicial de que vigilância e investigação


são uma só.

Não cabe aqui discorrer sobre a história da vigilância epidemiológica. Os motivos para a vigilância
epidemiológica variaram ao longo dos séculos, mas sempre tiveram como objetivo proteger a saúde
pública, ainda que muitas vezes de maneira inadequada, porém sempre bem-intencionada.

Na primeira metade da década de 1960, consolidou-se, internacionalmente, uma conceituação mais


abrangente de vigilância epidemiológica, em que eram explicitados seus propósitos, funções, atividades,
sistemas e modalidades operacionais. Vigilância epidemiológica foi, então, definida como:

O conjunto de atividades que permite reunir a informação indispensável


para conhecer, a qualquer momento, o comportamento ou a história
natural das doenças, bem como detectar ou prever alterações de seus
fatores condicionantes, com o fim de recomendar oportunamente, sobre
bases firmes, as medidas indicadas e eficientes que levem à prevenção e ao
controle de determinadas doenças (ROUQUAYROL; SILVA, 2013, p. 47).

No Brasil, esse conceito foi utilizado inicialmente em alguns programas de controle de doenças
transmissíveis coordenados pelo Ministério da Saúde, como a Campanha de Erradicação da Varíola (CEV),
de 1966 a 1973. A experiência da CEV motivou a aplicação dos princípios de vigilância epidemiológica
a outras doenças evitáveis por imunização, de modo que, em 1969, foi organizado um sistema de
notificação semanal de doenças, baseado na rede de unidades permanentes de saúde e sob a coordenação
das secretarias estaduais de saúde. As informações de interesse desse sistema passaram a ser divulgadas
regularmente pelo Ministério da Saúde, por meio de um boletim epidemiológico. Esse processo propiciou
o fortalecimento de bases técnicas que serviram, mais tarde, para a execução de programas nacionais de
grande sucesso na área de imunizações, com destaque para a erradicação da transmissão autóctone do
poliovírus selvagem na região das Américas.

Em 1975, por recomendação da 5a Conferência Nacional de Saúde, foi instituído o Sistema


Nacional de Vigilância Epidemiológica (SNVE). Esse sistema, formalizado por meio da Lei n. 6.259, do
mesmo ano, e do Decreto n. 78.231, que a regulamentou em 1976, incorporou o conjunto de doenças
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transmissíveis consideradas de maior relevância sanitária no país. Buscava-se, na ocasião, compatibilizar


a operacionalização de estratégias de intervenção desenvolvidas para controlar doenças específicas,
mediante programas nacionais que eram escassamente interativos.

A promulgação da Lei n. 8.080, que instituiu em 1990 o SUS, teve importantes desdobramentos na
área de vigilância epidemiológica (BRASIL, 1990).

Lembrete

Quando está disponível tratamento antimicrobiano efetivo, a infecção


pode ser tratada para prevenir doença, e o tratamento, completo ou
parcial, pode modificar o risco de doença.

6 FONTES DE DADOS DEMOGRÁFICOS E DE MORBIDADE: INDICADORES DE SAÚDE

6.1 Dados de registro contínuo

Agências e órgãos governamentais são responsáveis pela geração de estatísticas oficiais sobre
nascimentos e óbitos, cujos dados provêm de atestados e certidões emitidas pelos cartórios de registro
civil. O uso desses dados para fins epidemiológicos é limitado ao tipo de informação disponível
relacionada com os eventos, em geral, restritas às variáveis: sexo, idade, local de residência e de
ocorrência do evento. No caso dos nascimentos, dada a frequência importante de registros feitos em
anos posteriores ao evento, é preciso considerar o registro tardio. As estatísticas vitais baseadas
em registros de nascimentos e óbitos são de responsabilidade nacional do IBGE. Essa instituição, que
realiza os censos populacionais, responde também por todos os dados demográficos oficiais brasileiros e
por outras informações socioeconômicas e ambientais de interesse, sendo responsável pela coordenação
do Sistema Estatístico Nacional de acordo com a Lei n. 6.183, de 1974. Entretanto, com a ampliação
dos sistemas de informação do Ministério da Saúde e a realização de inquéritos, há dados de interesse
em saúde obtidos pelo IBGE e por outros órgãos governamentais, não se constituindo ainda no país um
sistema nacional de informações em saúde que possibilite uma visão abrangente e integrada de todos
os dados do setor.

O registro contínuo de dados sobre doenças ou agravos de notificação compulsória, no Brasil e


na maioria dos países, é de responsabilidade do Ministério da Saúde. Contudo, a seleção das doenças
e agravos que são considerados de notificação obrigatória varia de país para país. No caso brasileiro,
fazem parte dessa seleção quase quarenta tipos de doenças transmissíveis que são objeto das atividades
de vigilância epidemiológica. Do Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica participam órgãos do
Ministério da Saúde (Secretaria de Vigilância em Saúde) e das secretarias de saúde de todos os estados
e municípios. O registro é feito pelo Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) a partir
de dois documentos com uma variável identificadora única:

• Ficha Individual de Notificação (FIN), que contém um conjunto padronizado de dados para cada
doença (identificação do caso, dados sobre a unidade assistencial notificadora, informações
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mínimas sobre o agravo de notificação etc.) e que é encaminhada pelas unidades de saúde a partir
da suspeita clínica da ocorrência de algum dos agravos notificáveis.

• Ficha Individual de Investigação (FII), que se configura, na maior parte das vezes, como um roteiro
de investigação epidemiológica, distinto por tipo de agravo.

Informações valiosas para os epidemiologistas, como a causa básica dos óbitos ou as circunstâncias
em que ocorreram os nascimentos, podem ser obtidas, no Brasil, a partir de consultas aos dados do
Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) e do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos
(Sinasc), ambos sob responsabilidade do Ministério da Saúde e que também são de registro contínuo.
No SIM, os dados provêm de cópia das declarações de óbito (DO) emitidas por médicos e captadas nos
cartórios de registro civil e pelas secretarias de saúde em grande parte dos municípios (há municípios com
outros fluxos de dados). Além da especificação da causa básica e das causas associadas do óbito, e das
características de óbitos fetais, é possível encontrar dados sobre idade, sexo, raça/cor da pele, ocupação,
local de ocorrência e de residência dos indivíduos que faleceram e, mais recentemente, informações
sobre sua escolaridade. No Sinasc, os dados originais constam da declaração de nascido vivo (DN),
feita na grande maioria dos casos pelas maternidades e encaminhadas às secretarias de saúde. Entre as
informações coletadas na DN constam dados da mãe (idade, raça/cor da pele, estado civil, escolaridade,
ocupação, município de residência, número de filhos vivos e mortos); dados da gestação (semanas de
gestação, tipo de gravidez, número de consultas de pré-natal; data do nascimento); e dados da criança
(peso, raça/cor da pele e presença de malformação congênita). Além disso, são coletados dados do
estabelecimento de saúde onde foi realizado o parto, incluindo o endereço completo e o código do local,
bem como sobre o responsável pelo preenchimento da declaração (nome, função, identidade, órgão
emissor e data de emissão).

Além dos dados citados, são de registro contínuo dados sobre outros agravos e doenças como:
neoplasias, acidentes de trabalho e benefícios da previdência social por motivos de saúde, acidentes de
trânsito e intoxicações e envenenamentos, entre outros. Em cada um desses existem registros mantidos
por órgãos governamentais com graus diferenciados de cobertura nacional, disponibilização e acesso.
No caso das neoplasias, há duas bases importantes: o Registro de Câncer de Base Populacional e o
Registro Hospitalar de Câncer, sob a coordenação do Instituto Nacional do Câncer (Inca), do Ministério
da Saúde. Enquanto o primeiro é orientado para uma abordagem epidemiológica considerando os casos
existentes em determinada área geográfica, o registro hospitalar contém informações relacionadas com
a qualidade da atenção hospitalar.

6.2 Censo populacional e sua evolução no Brasil

Desde a Antiguidade, a contagem populacional é considerada essencial, tendo em vista o planejamento


das políticas públicas e as respectivas ações. Para tanto, com o uso da estatística, iniciou-se a realização
de censos populacionais, a fim de identificar o perfil das populações.

Os censos populacionais produzem informações importantes para a definição de políticas públicas


e a tomada de decisões. Os dados podem ser provenientes dos diversos níveis de governo ou da
iniciativa privada, e constituem fonte de referência sobre a situação de vida da população, segundo
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espaço geográfico e divisão administrativa de cada município, como distritos, bairros e localidades,
rurais ou urbanas. O diagnóstico de cada realidade depende da atualização dos dados, portanto, dos
resultados do censo.

A realização de um levantamento como o censo demográfico representa um desafio importante


para um instituto de estatística, sobretudo em um país de dimensões continentais como o Brasil, com
8.514.215,3 km2, composto de 27 Unidades da Federação e 5.507 municípios.

6.3 Sistemas de informação em saúde

6.3.1 Dados

Para pensar e realizar a atenção à saúde, as informações são imprescindíveis, tanto para o atendimento
aos indivíduos como ao coletivo; também é importante para refletir quais os programas necessários e as
políticas que devem ser desenvolvidas para melhorar a saúde da população.

Os sistemas de informação ajudam a construir o conhecimento em saúde. Os registros feitos na rotina


dos serviços são inseridos em sistemas de informação, que geram informação quanto à mortalidade
(do que as pessoas morrem) e à morbidade (do que as pessoas adoecem). Os censos e os inquéritos
(levantamentos de informações) também são valiosas fontes de informação.

Após realizar a ação, é necessário avaliar se ela foi efetiva. Veja a matriz a seguir, que aponta o fluxo
para análise e ação em saúde.

Situação da saúde

Avaliação

Dados Informação Conhecimento Decisão Ação

Figura 3 – Fluxo para análise e ação em saúde

O dado é o componente básico do processo de produção de informação. É o elemento quantitativo


ou qualitativo, em forma bruta, que por si só não conduz à compreensão de determinado fato ou
situação. Dado é a matéria-prima sobre a qual trabalhamos juntando-os, contrapondo-os, para produzir
informações que traduzam um conhecimento.

Quando processamos os dados, relacionando os fatos por eles descritos, e encontramos significado
naquilo que se observa, geramos a informação, que é o produto obtido a partir de determinada
combinação e interpretação de dados. Informação é o dado útil – produto da análise dos dados
obtidos, registrados, classificados, organizados e relacionados dentro de um contexto. É um importante
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recurso para subsidiar o processo de tomada de decisão, de planejamento, de execução e de avaliação


das ações desencadeadas.

O conhecimento é construído a partir da acumulação de informações, consolidando-se por meio


de permanente atualização, confrontando antigas e novas informações, adquiridas a todo momento. O
valor da informação está relacionado à capacidade que ela tem de alterar o estado do conhecimento.

Um grande conjunto de indicadores pode ser calculado a partir desses dados, e pode ser aplicado em
estudos e pesquisas que ampliam o conhecimento em epidemiologia.

Um sistema de informação em saúde é um conjunto de componentes que permite o armazenamento


e a seleção dos dados para transformá-los em informações úteis, que permitam monitorar as condições
de saúde da população.

6.4 Definição de indicador

É a representação numérica de determinados eventos, que nos permite produzir informações com o
objetivo de elaborar um conhecimento sobre determinada situação, com o propósito de tomar decisões
e agir para transformar a realidade compreendida no espaço e no tempo determinados.

6.5 Morbidade: importância no diagnóstico de saúde da coletividade

Para assegurar as condições para tomada de decisões (por exemplo, eficácia de vacinas, exames
preventivos para a redução da ocorrência do câncer de colo de útero) ou apoiar ações específicas
necessárias ao controle de um agravo ou doença (redução dos acidentes de trânsito, tratamento da
hanseníase etc.), consultam-se os indicadores de morbidade, discriminados em coeficientes ou taxas de
incidência e de prevalência, considerados como a expressão quantitativa do adoecimento na população.
Esses registros interessam, no campo da saúde, ao planejador, ao administrador, ao pesquisador, ao
epidemiologista e a toda a comunidade da área da saúde. Sua aplicação inclui também a clínica, a
prevenção de agravos à integridade física, o planejamento de seguros de vida e todos os campos em
que a variável saúde seja o foco de interesse. Em síntese, quando o objetivo for o controle de riscos,
doenças e agravos, as estatísticas de morbidade se constituirão nas informações basilares. Além do seu
potencial descritivo, essas são essenciais às análises epidemiológicas para saber se há uma associação
de causa e efeito.

Denomina-se morbidade a ocorrência de doenças e agravos à saúde em uma dada população. Assim,
para compreendê-la como fenômeno, é necessário apreender alguns conceitos essenciais. Em primeiro
lugar, morbidade sempre será referida a uma população predefinida tomada como grupo exposto
ao risco de adoecer. Assim, na morbidade por acidentes de trabalho, por exemplo, entende-se como
população o conjunto dos trabalhadores que exercem determinada atividade profissional, em um espaço
e tempo determinados. Em segundo lugar, ao se nomear a doença cuja morbidade se pretende estudar,
devem ficar bastante claras a sua conceituação e também os meios que levaram ao seu diagnóstico,
considerando que não há uniformidade de termos e conceitos. A OMS recomenda a uniformização na
denominação das doenças e causas de morte e propõe a adoção, em nível internacional, da Classificação
66
FUNDAMENTOS DE AÇÕES PREVENTIVAS EM SAÚDE

Internacional de Doenças (CID), atualmente em sua décima revisão. Serão estudados em seguida o
cálculo e a interpretação dos coeficientes de morbidade.

A morbidade identifica as causas que determinam o adoecimento da população. Os estudos de


dados de morbidade são essenciais para as análises de causa/efeito. Os coeficientes de morbidade
permitem realizar diagnóstico em saúde, e a prevalência e a incidência das doenças demonstram o seu
comportamento, se há aumento ou diminuição dos casos.

Os coeficientes de morbidade auxiliam na tomada de decisão em saúde pública e em diversas áreas.


Os gestores do sistema de saúde, os pesquisadores e os epidemiologistas utilizam esses indicadores para
analisar a situação de saúde e tomar as respectivas decisões. Desde a medicina clínica até a indústria de
seguros de saúde ou de veículos utilizam os indicadores de morbidade para análise de risco.

6.6 Obtenção de dados de morbidade

Existem várias formas utilizadas para obter dados de morbidade, desde os registros de rotina até
levantamentos ocasionais. Observe algumas delas:

• Registro de atendimento a doentes: esses registros são realizados em todos os serviços de


saúde, tanto públicos como privados. O registro de internações hospitalares, colhido por meio da
Autorização de Internação Hospitalar (AIH), referente a internações da rede pública e conveniada,
é um exemplo.

• Inquérito: apesar de ser um tipo de levantamento caro e que apresenta dificuldades para ser
desenvolvido, os inquéritos são realizados quando os dados existentes não são de boa qualidade ou
quando há dúvida da qualidade desses dados. Esse tipo de estudo pode ser realizado por amostra
da população por meio de entrevista ou por registro sistemático de informações pelas instituições.
Alguns exemplos de inquérito são as próprias pesquisas de mercado, feitas na rua ou por telefone.

• Vigilância epidemiológica: para realizar a vigilância, são utilizados os sistemas de informação


apresentados, nos quais são armazenados dados que permitem gerar informações. A vigilância
ainda realiza a programação e a avaliação das medidas de controle de doenças e situações de
agravos à saúde, prioritariamente das doenças de notificação compulsória, a fim de permitir a
tomada de medidas de controle e de planejamento de saúde nos diferentes níveis de atuação. O
SUS define a vigilância epidemiológica como

um conjunto de ações que proporcionam o conhecimento, a detecção ou


prevenção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes
de saúde individual e coletiva com a finalidade de recomendar e adotar as
medidas de prevenção e controle das doenças e agravos (BRASIL, 1990).

• Registros policiais: as estatísticas sobre mortes violentas, acidentes de trabalho e homicídios


podem ser colhidas nos serviços de medicina legal, vinculados às secretarias de segurança pública
dos estados.
67
Unidade II

6.6.1 Análise dos indicadores de morbidade: fontes de dados

Mensurar doenças e agravos à saúde exige análise apurada e instrumentos mais sofisticados que os
utilizados para a mortalidade. Enquanto o óbito é um evento único e diferenciado do ponto de vista
legal, moral e social, com um único registro em todo o mundo, o registro de doenças e agravos à saúde
depende de muitos fatores. Uma pessoa pode apresentar várias doenças e agravos ao longo da vida, que
serão registrados na dependência da valorização que o indivíduo dá aos seus sintomas, da sua procura
por assistência médica e das possibilidades existentes de diagnóstico.

As informações sobre morbidade podem ser provenientes de dados primários ou secundários. Dados
primários são os coletados por pesquisadores em investigação específica, em que a padronização, a
coleta e a análise estão sob controle dos autores. Os dados primários são muito utilizados na prática
clínica em nosso meio. No entanto, em razão do alto custo material e humano, esse procedimento é
realizado esporadicamente, para uma questão bem delimitada, em geral para um grupo populacional
específico, e condicionada, geralmente, a apoio financeiro. Os dados secundários são aqueles obtidos em
grandes bases de dados, elaboradas para atender a diversos tipos de interesses e produzidas na rotina
dos serviços por um grande contingente de profissionais.

Pela sua abrangência e validade, as bases de dados secundários têm sido cada vez mais utilizadas,
nas literaturas internacional e nacional, para análise da situação de saúde das populações e avaliação
do impacto das ações de saúde.

Existem, no Brasil, vários tipos de bases de dados secundárias, e as mais usadas para análises clínicas e
epidemiológicas são as informações do Sistema de Vigilância Epidemiológica de Doenças de Notificação
Compulsória e os dados produzidos pelos Registros de Câncer, de base populacional e hospitalar.

O Sistema de Vigilância Epidemiológica de Doenças de Notificação Compulsória é um sistema


rotineiro de informação e está centrado em uma lista nacional publicada pelo Ministério da Saúde, que é
revisada anualmente. Para a elaboração dessa lista, existe um sistema de informação, decisão e controle,
que tem como objetivo identificar, notificar e investigar todos os casos dessas afecções e de agravos
inusitados. Esse sistema registra os casos identificados de doenças de notificação compulsória. O grau
de cobertura dessas informações varia segundo as regiões, sendo mais consistente para os quadros mais
graves e agudos. Assim, o grau de cobertura chega a um índice que varia de 85% a 90% dos casos nas
doenças de notificação com evolução crônica, como a aids e a tuberculose, e mais de 95% nos casos de
meningites e tétano (JAMAL; MOHERDAUI, 2007, p. 107).

Os registros de câncer de base populacional, localizados em dezesseis capitais brasileiras, consolidam


os dados sobre os casos novos com diagnóstico firmado de câncer (neoplasia maligna de qualquer
localização) nos indivíduos que residem no município. Fornecem, portanto, dados de incidência de câncer
para esses municípios. Com base nesses registros, o Inca estima o número de casos novos e o coeficiente
de incidência no Brasil dos principais tipos de câncer em cada sexo e publica essas informações em
relatórios rotineiros, disponíveis na internet.

68
FUNDAMENTOS DE AÇÕES PREVENTIVAS EM SAÚDE

Saiba mais

Para aprofundar seus conhecimentos sobre o tema, acesse o site do Inca:

www.inca.gov.br

Os inquéritos de morbidade podem ser de morbidade diagnosticada ou referida. No primeiro caso, a


partir de uma definição clínica precisa e por meio de instrumentos calibrados, determina-se o coeficiente
de prevalência da afecção estudada no grupo populacional, seja por pesquisa em todos os indivíduos,
seja em uma amostra. Nos inquéritos de morbidade referida, são realizadas entrevistas em amostras
representativas da população de estudo, com o propósito de coletar informações sobre a prevalência de
doenças em um espaço de tempo definido.

Saiba mais

Alguns inquéritos populacionais, como a Pesquisa Nacional por Amostra


de Domicílios (Pnad), do IBGE, realizada com periodicidade anual, inclui
em alguns anos perguntas sobre morbidade. O estudo de 2003 pesquisou
fatores de risco e doenças crônicas e está disponível na internet:

IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2003. v. 24.


IBGE, 2003. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/
periodicos/59/pnad_2003_v24_br.pdf. Acesso em: 7 jan. 2020.

As unidades hospitalares e ambulatoriais, públicas e privadas, vinculadas ao SUS possuem vários tipos
de registros sobre os atendimentos prestados. Esses registros são consolidados pelos sistemas de controle
dos pagamentos efetuados com os recursos do SUS para os serviços de saúde: Sistema de Informações
Hospitalares (SIH/SUS) e Sistema de Informações Ambulatoriais (SIA/SUS). Nos hospitais vinculados ao
SUS, existem, ainda, os registros hospitalares de câncer, que consolidam as informações sobre os casos de
câncer que foram diagnosticados e/ou atendidos nos hospitais. Os dados desses sistemas fornecem apenas
frequências das doenças registradas nos atendimentos. Não é possível avaliar a morbidade com base
nesses dados, entre outros motivos pelo fato de as informações hospitalares, por exemplo, referirem-se
ao evento “internação”, e não a pessoas internadas. Outro importante fator é que a morbidade registrada
nos atendimentos hospitalares e ambulatoriais encontra-se fortemente influenciada pela forma em
que as atividades são organizadas nos serviços e os tipos de classificação adotados no registro dos
casos, tornando-se mais ou menos sensíveis a problemas e patologias especificadas. Em relação ao
câncer, também não é possível construir coeficientes de incidência ou prevalência com base em registros
hospitalares. É possível apenas conhecer a frequência dos tipos de câncer e respectivos estadiamentos
identificados nos pacientes atendidos nos serviços.

69
Unidade II

6.7 Acesso e qualidade das estatísticas de saúde

O Ministério da Saúde é o principal responsável pelas estatísticas de saúde do Brasil. A qualidade


dessas estatísticas depende fundamentalmente da qualidade dos registros primários dos dados, e o
papel mais importante é o dos profissionais de saúde e, sobretudo, do médico. Os principais registros
primários do Ministério da Saúde que alimentam os sistemas de informação de mortalidade são a
declaração de óbito (DO) e a declaração de nascido vivo (DN), padronizados nacionalmente. Todos
os profissionais de saúde são responsáveis pelo completo e correto preenchimento desses registros,
cabendo exclusivamente ao médico o dever de preencher a parte médica de ambas as declarações.
Os dados desses registros são consolidados e trabalhados pelo Departamento de Informática do SUS
(Datasus), por meio do SIM e do Sinasc. O médico também é responsável pelas informações dos casos
de doenças de notificação compulsória e pelos registros de diagnósticos das pessoas atendidas no SUS.

Em que pese a grande evolução na qualidade e na melhoria do acesso às informações que esses
sistemas vêm propiciando, muitos problemas ainda persistem. Particularmente importantes são os
relacionados às estatísticas de mortalidade, uma vez que a mortalidade é o único dos indicadores
epidemiológicos anteriormente discutidos que é universal e contínuo.

Os indicadores de saúde correspondem às formas de medir as condições de saúde. O indicador, como
o próprio nome diz, aponta quais as causas de morte, de doença ou de agravo.

Valores absolutos

Os dados colhidos diretamente de sistemas de informação ou gerados por observações controladas


são dados absolutos, não trabalhados. Esse tipo de dado é muito utilizado por administradores de saúde
para estimar vagas a serem oferecidas, leitos necessários e previsão de medicamentos.

Para comparar os dados de mortalidade e de morbidade, é necessário transformá-los em valores


relativos; as variáveis dependentes não são mais frequências absolutas e passam a ser coeficientes e
índices. Os indicadores medem o risco, a probabilidade de se adoecer por determinada doença.

Os indicadores mais usados em saúde pública são os de mortalidade geral, prevalência, incidência,
mortalidade infantil, mortalidade materna e o percentual de casos de óbitos no total dessas ocorrências
por variáveis específicas como idade, lugar, entre outras.

Os indicadores de morbidade mais usados são incidência – relacionados a casos novos – e prevalência
– relacionados ao total de casos.

6.8 Indicadores de morbidade

6.8.1 Incidência

A incidência corresponde ao número de casos novos de determinado agravo ou doença. Pode-se


dizer que corresponde à intensidade com que acontece a morbidade, com que se desenvolvem os casos
70
FUNDAMENTOS DE AÇÕES PREVENTIVAS EM SAÚDE

da doença. A frequência absoluta de novos casos corresponde à incidência simples, ou seja, o número de
casos novos correspondentes a um período de tempo.

O coeficiente de incidência corresponde à relação entre o número de casos novos e o total da população
exposta, o que permite realizar estudos comparativos de diferentes épocas e de diferentes populações,
cidades ou países. O coeficiente de incidência mede a velocidade com que novos casos são agregados
àqueles existentes. A variação é gerada pelos novos casos diagnosticados, imigrantes doentes e recidivas.

O cálculo é feito dividindo-se o número de casos novos de uma doença – em um intervalo de tempo,
período e área determinada – pela população exposta ao risco de adquiri-la e multiplicando o resultado
por 100.000. Olhe a fórmula a seguir:
CI = Número de casos novos na população residente em determinado período e área considerada x 100.000
População residente na área e no mesmo período

Em doenças como a gripe, a incidência aponta a velocidade com que os casos se propagam. Nesse
caso, é importante a diferenciação entre o número de gripes e de pessoas acometidas, pois cada pessoa
pode apresentar a doença mais de uma vez ao ano. Quando o coeficiente de incidência aumenta muito,
pode apontar para uma epidemia.

Para análise epidemiológica, a utilização do número de indivíduos acometidos por certa doença,
como numerador, indica a probabilidade de as pessoas adquirirem a doença. Quanto ao denominador,
deve ser restrito à população que está em risco de contrair a doença ou de sofrer o agravo. Por exemplo,
para a incidência de tétano neonatal, a população de risco são os nascidos vivos.

Veja a diferença:

• Endemia: casos dentro do limite esperado, não sendo influenciada por variantes como épocas do
ano e temperatura.

• Epidemia: elevação brusca, temporária e significativamente acima do esperado para a incidência


de uma determinada doença.

• Pandemia: aumento de número de casos que atinge dimensões continentais, com vários países
ao mesmo tempo.

6.8.2 Prevalência

A prevalência aponta o total de casos de determinada doença; já o coeficiente de prevalência


estabelece relação entre o total de casos e a população que tem risco de ter essa doença. Portanto,
o coeficiente permite comparação ao longo do tempo de uma mesma cidade ou país e, também, de
diferentes espaços, ou seja, diferentes cidades e países. Esse indicador permite comparar grupos etários,
sexo, ocupação e etnia, pois as doenças podem se manifestar de forma diferente nos distintos grupos.

71
Unidade II

O coeficiente de prevalência é calculado dividindo-se o número de casos conhecidos de uma dada


doença pela população, em um intervalo de tempo e área determinados, e multiplicando o resultado
por 100.000. Veja a fórmula:

Número de casos existentes (novos + antigos) na


CP = população residente em determinado período e área considerada x 100.000
População residente na área e no mesmo período

O número total de casos de uma determinada doença mede a sobrevivência dessa doença e
representa a soma dos casos antigos e novos. Esse número pode variar para cada doença, dependendo
de quantos sobrevivem, quantos morrem, quantos emigram e quantos casos novos são diagnosticados.
Por exemplo, quanto melhor e mais rápido for o diagnóstico, maior será a prevalência. O coeficiente de
prevalência sofre influência do tempo de duração de uma doença, portanto, as doenças crônicas (que
duram muito tempo, até a vida toda) provavelmente acumularam mais casos que as doenças agudas
(que se instalam repentinamente e apresentam cura mais rápida).

A prevalência pode variar de acordo com a instituição de novos tratamentos: as drogas que
aumentam a sobrevida determinam aumento da prevalência, e as drogas que diminuem a duração das
doenças, daquelas que têm cura, subtraem os coeficientes de prevalência. O aperfeiçoamento de exames
diagnósticos influencia a prevalência, pois eles podem detectar mais casos. A prevalência aumenta em
caso de doenças epidêmicas de baixa letalidade ou de baixo índice de cura, como aids, tuberculose,
hanseníase, hipertensão arterial e diabetes.

6.8.3 Expectativa de vida

A expectativa de vida, ou esperança de vida, se refere ao número médio de anos que um indivíduo
viverá a partir de seu nascimento. Essa média tem influência da mortalidade por idade de cada população,
que por sua vez é determinada pelas condições de vida a que se expõe essa população.

A expectativa de vida varia de acordo com as influências do meio, da tecnologia desenvolvida para
os cuidados com a saúde e da melhora das condições de vida. Há grandes diferenças de expectativa
de vida para os diferentes continentes, países, regiões e cidades relacionadas ao acesso aos serviços
essenciais (educação, saúde, habitação, saneamento básico etc.), à renda per capita, à desigualdade
social, enfim, às condições e à qualidade de vida de cada população.

Observação

Renda per capita mostra a renda média da população. Normalmente, os


países desenvolvidos têm PIB e renda per capita maiores que os dos países
em desenvolvimento.

Para o cálculo da esperança de vida ao nascer, leva-se em consideração o risco de mortalidade infantil
de um país ou região e todo o histórico de mortalidade de crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos.
72
FUNDAMENTOS DE AÇÕES PREVENTIVAS EM SAÚDE

A esperança de vida ao nascer é um indicador que mede o grau de desenvolvimento humano.


Considera-se mais desenvolvida a população com maior expectativa de vida, pois representa o direito a
uma vida longa e saudável, que foi possível devido às boas condições de vida disponíveis.

Em cada um dos grupos etários, os indivíduos estão sujeitos a diferentes riscos de mortalidade,
estabelecendo distintas causas principais de mortalidade.

A evolução desse indicador representa ganhos em anos de vida, o que evidencia um comportamento
contínuo e positivo. O aumento da expectativa de vida nas últimas décadas é, sem dúvida, uma
demonstração da melhora da qualidade de vida do brasileiro. “Em 1980, a esperança de vida ao nascer
era de 62,6 anos, passando para 70,5 anos em 2000 – aumento de oito anos em duas décadas; em 2005,
a esperança de vida passou para 71,9 anos” (GALLEGUILLOS, 2014, p. 51).

Apesar de todos os avanços, persistem as diferenças regionais, determinadas pelas diferenças de


condições de vida de cada região. As esperanças de vida em “2005 variaram de 66 anos em Alagoas a
74,9 anos no Distrito Federal, determinando um diferencial de praticamente nove anos. O indicador ainda
apresentou aumento e chegou a 73,1 em 2009” (GALLEGUILLOS, 2014, p. 51).

Os países desenvolvidos apresentam melhores índices determinados pelas condições de vida, pelo
acesso a serviços essenciais, pela distribuição de renda mais equitativa, entre outros fatores.

6.8.4 Taxa de fecundidade

O índice de fecundidade corresponde ao número médio de filhos por mulher em idade fértil, que,
por convenção, é considerada entre 15 e 49 anos. Há algumas mulheres que têm filhos fora dessa idade,
mas a maioria é considerada mulher em idade fértil (MIF) na idade apontada.

O cálculo é feito segundo a fórmula a seguir:

Número de filhos vivos de mães de determinada


CF = faixa etária residentes em uma área e ano considerados x 1.000
População de mulheres de referida faixa etária
residentes nessa área e ano

A redução da fecundidade é um fenômeno presente no Brasil nas últimas décadas. Isso representa
um número menor de crianças na população, o que geralmente propicia melhores condições de vida para
a sociedade, pois diminui o número de dependentes. Contudo, se persistir esse panorama, a população
com capacidade para o trabalho também vai diminuir, e, com o envelhecimento da população, o grau
de dependência aumentará, mas pelos idosos dependentes.

A razão de dependência e os custos sociais serão tanto maiores quanto mais rápida e acentuada for
a queda do nível da fecundidade e quanto mais tempo ela se mantiver em níveis baixos.

73
Unidade II

Segundo o IBGE, as taxas de fecundidade e de natalidade apresentam relação direta com as


transformações socioeconômicas e culturais, associadas ao processo de urbanização, inclusive ao
novo papel desempenhado pela mulher. Os contraceptivos, o melhor nível de educação e as melhores
condições de acesso à saúde são determinantes no número de filhos que cada mulher tem no Brasil e
que, consequentemente, difere nas diversas regiões do país.

Como exemplo, a probabilidade de o grupo etário mais jovem (15-19) ter um filho oscilou entre 70 e 95
para cada mil jovens, entre 1977 e 2006.

Em geral, as maiores mudanças em termos absolutos deram-se no grupo etário de 20-24 anos. A taxa
que se manteve em torno de 160 por mil, até aproximadamente antes de 2000, diminuiu para 130 por mil,
no quinquênio de 1997 a 2001, e para 108 por mil, no último período (BRASIL, 2009, p. 78).

Conforme a Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher (PNDS) de 2006,


isso significou uma redução superior a 30% na fecundidade de mulheres de 20 a 24 anos, em um
intervalo de dez anos, e nos grupos de 30-39 anos foi ainda mais acentuada, semelhante ao estimado
para a França em 2005, e inferior ao esperado para a média dos países da Europa Ocidental para 2010
(BRASIL, 2009, p. 78).

Em resumo, constataram-se níveis de fecundidade extremamente baixos para as idades acima de 30 anos
e uma taxa alta e estável entre mulheres menores de 24 anos.

Pode-se afirmar que as mulheres têm menos filhos no Brasil nos dias de hoje e que na faixa etária
de 20 a 24 anos a chance de ter filhos é maior. Vale ressaltar que o número de filhos está relacionado ao
grau de educação das mulheres e às condições socioeconômicas, portanto, ainda há grandes diferenças
no número de filhos que cada mulher possui segundo suas condições de vida e grau de educação.

6.9 Indicadores de mortalidade

Medidas de mortalidade têm como utilização preferencial a avaliação do nível de saúde e indicação
de medidas preventivas e de controle de caráter abrangente (saneamento básico, detecção precoce do
câncer de mama, redução do tabagismo, por exemplo) que objetivem melhorar o estado sanitário da
comunidade. Essa aplicação visa, por uma parte, sugerir ações que reduzam o risco de morrer por uma
determinada causa evitável e, por outra parte, indicar a necessidade de ações de controle sobre fatores de
risco de adoecer ou de sofrer agravos que se associem à alta letalidade. A avaliação da efetividade dessas
ações poderá ser feita pelo acompanhamento da evolução das medidas de mortalidade. Nesse sentido,
as atividades de vigilância do óbito, como no caso do óbito por causas obstétricas (óbito materno ou
mortes maternas) e dos óbitos infantis por causas evitáveis são exemplos do uso dessas medidas pelos
serviços de saúde. O cálculo dos coeficientes de mortalidade e os elementos aplicados à interpretação
dos seus resultados serão estudados em seguida.

74
FUNDAMENTOS DE AÇÕES PREVENTIVAS EM SAÚDE

Observação

A taxa de mortalidade infantil (TMI) é considerada um bom indicador


para descrever e analisar as condições de vida e saúde de uma população,
porque a criança pequena é mais sensível às condições socioeconômicas
que repercutem no meio ambiente onde vive. A evolução desse indicador
no Brasil em décadas recentes mostra variações que revelam as condições
de vida da população frente às crises econômicas.

Os indicadores de mortalidade podem ser organizados de acordo com diversos critérios, como sexo,
idade ou estado civil. Os óbitos ocorridos podem ser classificados segundo causa e lugar.

6.9.1 Mortalidade geral

A partir da mortalidade geral, é possível analisar os níveis de saúde da população de diferentes


regiões, países ou mesmo continentes, em um mesmo período, ou seja, referentes à mesma época. Os
dados para calcular a mortalidade geral são retirados do sistema de informação de mortalidade, que
resgata esses dados da declaração de óbito (DO), conhecida como atestado de óbito.

A qualidade dos dados não é igual para todas as regiões de um país nem para os diferentes países,
pois depende da organização dos serviços para notificar as mortes, assim como da qualidade do
preenchimento da DO.

Esse indicador dá um parecer geral das condições de vida da população, mas não revela as causas que
levaram à morte, portanto, não serve para planejar ações específicas capazes de prevenir a mortalidade.

Observe a seguir a fórmula para calcular a mortalidade geral:

CMG = Número de óbitos na população residente em determinado período e área considerada x 1.000
População residente na área no mesmo período

6.9.2 Mortalidade por causas

A mortalidade por causas permite identificar as causas que mais levam à morte, nas diferentes faixas
etárias, para os distintos sexos, e inclusive permite verificar se há diferenças regionais no país. No Brasil,
devido à sua diversidade cultural e de desenvolvimento, as diferentes causas de mortalidade diferem nas
diversas regiões. Nas regiões mais desenvolvidas, a mortalidade por doenças não transmissíveis, como
doenças cardíacas, prevalece, enquanto nas regiões menos desenvolvidas e mais pobres a mortalidade
por doenças infecciosas, como diarreias, permanece mais elevada que nas demais regiões.

Ter essas informações é muito importante para o planejamento das ações em saúde que precisam ser
aprimoradas. Ao saber a mortalidade segundo as diferentes causas, é possível planejar ações adequadas
às diferentes necessidades de cada região.
75
Unidade II

O coeficiente de mortalidade por causa é calculado dividindo o número de óbitos ocorridos por
determinada causa pela população exposta e multiplicando o resultado por 100.000, conforme a seguir:

Número de óbitos por determinada causa ocorridos


CMC = na população residente numa área e ano considerados x 100.000
População residente nessa área e ano

A mortalidade infantil tem sido um dos maiores desafios da saúde, tendo em vista que, se cuidamos
bem das gestantes e das crianças, espera-se que a maioria delas possam nascer saudáveis. Infelizmente,
não é isso o que ocorre, e só é possível identificar essa situação com o uso do coeficiente de mortalidade
infantil.

6.9.3 Mortalidade infantil

O coeficiente de mortalidade infantil mede o risco de morte para crianças menores de 1 ano. Calcula-se
dividindo o número de mortes de crianças menores de 1 ano pelos nascidos vivos naquele ano em uma
determinada área.

Número de óbitos por determinada causa ocorridos


CMC = na população residente numa área e ano considerados x 100.000
População residente nessa área e ano

6.9.4 Mortalidade materna

No Brasil, a mortalidade materna ainda é alta, o que reflete ineficiência dos serviços de saúde no
acompanhamento de todas as gestantes de forma adequada e o planejamento familiar não tem o
alcance que deveria. A morte materna pode ser evitada em cerca de 90% a 95% dos casos, tendo em
vista as tecnologias disponíveis na atualidade, mas é preciso que as gestantes tenham acesso a essa
tecnologia durante o acompanhamento da gestação. O coeficiente de mortalidade materna é uma
medida de risco relativa à mulher durante a gravidez.

O coeficiente é calculado dividindo-se os óbitos ligados à gestação, ao parto e ao puerpério numa


certa área e num certo período pelo número de nascidos vivos no mesmo local e período.

Medidas como o coeficiente de mortalidade infantil e o coeficiente de mortalidade materna são


fundamentais para o acompanhamento das metas nacionais e internacionais, que incluem a diminuição
da mortalidade infantil e materna.

Observação

É importante notar que, em geral, os níveis de saúde de populações e


grupos sociais são mensurados por meio de informações da “não saúde”, ou
seja, concernentes a doenças e morte.
76
FUNDAMENTOS DE AÇÕES PREVENTIVAS EM SAÚDE

Analisar a situação de saúde tem sido um dos objetivos primordiais da epidemiologia, a fim de
contribuir para a definição de políticas públicas. Ao medir o estado de saúde das populações, realiza-se
o diagnóstico, que permite analisar as intervenções a serem realizadas e avaliar o seu impacto.
Os trabalhadores de saúde devem estudar as mudanças sociais, econômicas e políticas ocorridas e os
respectivos impactos sobre a saúde da população.

Quantificar os eventos ocorridos em saúde é essencial, pois permite conhecer as principais doenças e
agravos à saúde que atingem uma determinada comunidade, os grupos mais vulneráveis, a faixa etária
mais acometida, os riscos mais relevantes e, inclusive, as ações para controlar as doenças e os agravos
de forma mais efetiva.

Medir a saúde real da população é uma tarefa difícil, por isso a forma de verificar mais utilizada está
relacionada aos dados de morte ou de doença. A obtenção de dados pode ser por intermédio de estatísticas
ambulatoriais e hospitalares, assim como por inquéritos. Os sistemas de informação têm contribuído
bastante para a realização dessas estatísticas, como o SIM; o Sistema de Informação Ambulatorial (SIA); o
Sistema de Informação da Atenção Básica (Siab); o Sistema de Informação Hospitalar (SIH); o Sinasc etc.

7 REGISTRO DE EVENTOS VITAIS E CLASSIFICAÇÃO INTERNACIONAL


DE DOENÇAS

7.1 Nascimentos

O Sistema de Nascidos Vivos, gerenciado pelo Centro Nacional de Epidemiologia (Cenepi), foi
oficializado em 1990 e tem por objetivo registrar os nascimentos com um documento básico,
padronizado nacionalmente, que deve ser gerado nos hospitais e em outras instituições de saúde onde
se realizam partos e nos cartórios de registro civil (no caso de partos em domicílio). Seu formulário
padrão, a declaração de nascido vivo, deve ser preenchido para todos os nascidos vivos no país.
Deve-se entender por nascido vivo, segundo conceito definido pela OMS, todo produto da concepção
que, independentemente do tempo de gestação, depois de expulso ou extraído do corpo da mãe,
respire ou apresente outro sinal de vida, tal como batimento cardíaco, pulsação do cordão umbilical ou
movimentos efetivos dos músculos de contração voluntária, estando ou não desprendida a placenta.

Saiba mais

Para visualizar uma certidão de nascido vivo, leia:

BRASIL. Ministério da Saúde. Manual de instruções para o preenchimento


da declaração de nascido vivo. Brasília: Ministério da Saúde, 2011. p.
23. Disponível em: http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2017/
junho/08/inst_dn.pdf. Acesso em: 10 jan. 2020.

77
Unidade II

A referência a seguir possui um modelo de atestado de óbito:

BRASIL. Ministério da Saúde. Manual de instruções para o preenchimento


da declaração de óbito. Brasília: Ministério da Saúde, 2001. p. 33. Disponível
em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_declaracao_obitos.
pdf. Acesso em: 10 jan. 2020.

Sua implantação ocorreu de forma gradual no país e, até 2001, em pelo menos um estado (Piauí)
não havia ocorrido de forma completa. Mesmo assim, vem apresentando um volume maior de registros
do que o publicado em anuários do IBGE, que trabalha com base nos dados de cartórios de registro civil.
Os formulários de declaração de nascidos vivos são pré-numerados, impressos em três vias e distribuídos
às secretarias estaduais de saúde pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa), do Ministério da Saúde.
Neles, existem campos para preenchimento que irão definir as condições do recém-nascido, bem como
aspectos relevantes da mãe e do parto.

Na figura a seguir, representa-se o fluxo das declarações de nascidos vivos, como recomendado
pelo Ministério da Saúde. Embora esse fluxo possa variar de estado para estado, a recomendação
é que a primeira via seja recolhida ativamente pelas secretarias estaduais ou municipais de saúde
para processamento, e a segunda e a terceira vias sejam entregues aos familiares.
Partos Partos
hospitalares domiciliares
Família/
Hospital Declarante

Preenche
Declara
Devolve
3a via
Cartório de
1a via registro civil
2a via
Emite
3a via
Guarda
1a via
Encaminha Família Família
2a via

Unidade de Cartório de 3a via


saúde registro civil
Encaminha Família
Secretaria de
saúde 2a via guarda
Secretaria de Unidade de
saúde saúde

Figura 4 – Fluxo das declarações de nascidos vivos

78
FUNDAMENTOS DE AÇÕES PREVENTIVAS EM SAÚDE

Conforme mencionado, o IBGE continua processando as informações oriundas dos cartórios de


registro civil, isto é, o antigo sistema permanece ativo, apenas englobado pelo novo. Os dados
de nascidos vivos podem ser obtidos nas seguintes fontes:

• Publicações do IBGE, impressas ou em meio eletrônico.

• Página do IBGE: www.ibge.gov.br

• Página do Datasus: www.datasus.gov.br

• Página do Sinasc da Funasa: www.funasa.gov.br

• Cd-roms fornecidos pela Funasa ou Datasus.

• Em sistemas locais, municipais ou estaduais, como a Fundação Seade, em São Paulo (www.seade.gov.br) e
no site da Secretaria de Saúde do Estado (em São Paulo, www.saude.sp.gov.br).

• Por solicitação direta feita a essas instituições.

7.2 Óbitos

O tradicional conceito de morte vem sendo revisto continuamente, sobretudo em consequência


do desenvolvimento dos transplantes de órgãos. A Sociedade Brasileira de Neurologia, entre outras
organizações, promoveu reuniões e debates específicos para essa discussão.

A definição tradicional de morte clínica tornou-se inadequada a partir dos avanços da medicina,
como a ressuscitação cardíaca, a circulação extracorpórea e os respiradores artificiais. Passou-se então a
aceitar como conceito de morte o da morte encefálica (ME), inclusive com o respaldo da maior parte das
autoridades civis e religiosas. Assim, em 1958, o papa Pio XII reconheceu que o pronunciamento sobre a
morte é responsabilidade da medicina, e não da Igreja, declarando o seguinte: “concerne ao médico dar
uma precisa e clara definição sobre morte e do momento em que ela ocorreu”. É interessante assinalar que
alguns autores consideram a morte como um processo, e não como um evento, portanto, não pode ser
determinada como ocorrendo em um momento definido; por isso, talvez determinada como ocorrendo em
um momento definido. Assim, talvez seja mais correto definir critérios de que a morte ocorreu.

O conceito vigente no Brasil, do ponto de vista legal, é o de morte encefálica, regulamentado pelo
Conselho Federal de Medicina pela Resolução n. 1.346/1991. O documento básico para o SIM é a declaração
de óbito. O modelo atual teve gradual evolução, desde os documentos antigos em via única, passando pelo
modelo de duas vias, de 1934 – fruto do empenho do médico sanitarista Geraldo Horácio de Paula Souza –,
quando uma via permanecia registrada em cartório e a outra seguia para os departamentos de estatística.

Desde 1950, o Brasil adota o modelo usado internacionalmente, o que possibilita comparações entre
países, além da troca de informações e críticas para o contínuo aperfeiçoamento. A partir de 1975,
juntamente com a criação do SIM, o documento foi padronizado nacionalmente, substituindo os mais de
quarenta tipos então em uso no país. No caso de perdas fetais, perdas fetais tardias (natimortos) e óbitos
de menores de 1 ano, há um bloco específico na declaração para abrigar informações sobre a mãe, suas

79
Unidade II

condições e condições do parto. Uma grande melhoria para o SIM foi a informatização ocorrida na década
de 1990. Não apenas a qualidade do registro das informações foi muito beneficiada, mas, sobretudo, o
registro eletrônico veio resolver outro entrave sério do sistema: a codificação da causa básica de morte.
Essa codificação exige profissionais especialmente treinados, raramente disponíveis nas diversas secretarias
municipais de saúde. Com o apoio contínuo do Centro Brasileiro de Classificação de Doenças (CBCD),
órgão colaborador da OMS localizado na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, foi
recentemente acoplado ao SIM um sistema informatizado de seleção da causa de óbito que permite o uso
em todos os níveis do sistema de saúde. Todas as secretarias municipais de saúde, gradativamente, devem
implantar e operar o novo sistema. O fluxo das informações obtidas com a declaração pode variar de
estado para estado, mas a recomendação do Ministério da Saúde é que a primeira via do documento seja
recolhida pelas secretarias de saúde (dos estados ou municípios) para processamento. As outras duas vias
devem ser entregues aos familiares da pessoa falecida, para registro em cartórios de registro civil.

O registro em cartório é obrigatório por lei, como visto no exame da Lei n. 6.015 de 1973, e
necessário para o sepultamento (art. 77). Mesmo assim, um grande número de óbitos não é registrado,
sobretudo nas regiões Norte e Nordeste, podendo atingir até 20% do total de mortes nessas regiões. O
processamento dos dados se dá nas secretarias estaduais, onde as causas básicas são codificadas e os
dados passam por críticas de consistência. Das secretarias, as informações seguem para o Ministério da
Saúde, que as reorganiza segundo o Estado de residência dos falecidos. O IBGE continua processando os
dados do registro civil com base nas informações dos cartórios, e as informações sobre óbitos podem ser
obtidas nas mesmas fontes citadas para as declarações de nascidos vivos.
Óbitos Óbitos
hospitalares domiciliares
Família/
Hospital Declarante

Preenche
Declara
Devolve
3a via
Cartório de
1a via registro civil
2a via
Emite

1a via
Encaminha Família

3a via
Cartório de
registro civil
Encaminha
Secretaria de 2a via
saúde 3a via Arquiva
arquivada Secretaria de
saúde
Encaminha

Figura 5

80
FUNDAMENTOS DE AÇÕES PREVENTIVAS EM SAÚDE

Ao obter informações em sistemas locais ou municipais, deve-se estar atento a possíveis imprecisões,
já que esses locais não fazem correções nos dados segundo a residência do falecido, o que é feito apenas
em nível estadual ou no IBGE.

7.3 Classificação Internacional das Doenças: importância nas taxas


de mortalidade

7.3.1 Mortalidade específica por causa

As taxas específicas de mortalidade por causa são calculadas pela divisão do número de óbitos
ocorridos por determinada causa e a população exposta, multiplicando-se o resultado por 100.000.
Assim como as medidas de mortalidade geral e mortalidade infantil, as várias taxas de mortalidade por
causas podem ser reveladoras das condições gerais de saúde da população.

Para esse indicador, é importante que se conheça um pouco do instrumento de registro de óbitos e da
causa de morte, a declaração de óbito (DO). No Brasil, a DO padronizada foi adotada em 1976 e implantada
pelo Ministério da Saúde em todo o território nacional. Seus dados são coletados pelo SIM. A partir de
1996, o Brasil adotou a 10a Classificação Internacional das Doenças (CID). Então, quando se analisa a série
histórica de óbitos para períodos que se iniciem antes de 1996, é necessário atentar para a comparabilidade
entre a 9a e a 10a revisões da CID. Mudanças importantes foram feitas nos capítulos I, III e VIII da 9a revisão
correspondentes aos capítulos I, IV e X da 10a revisão. Erros no preenchimento da causa básica do óbito na
DO ainda existem e comprometem a qualidade dos dados de mortalidade por causas.

Define-se como causa básica do óbito “a doença ou lesão que iniciou uma sucessão de eventos que
levaram à morte ou, no caso de acidentes ou violências, as suas circunstâncias”; deve ser declarada
na DO pelo médico assistente. Fontes e tipos de erros de preenchimento da DO incluem: diagnóstico
clínico errado; diagnóstico erroneamente registrado; ausência de registro de causa básica. A proporção
de óbitos em que a causa básica é classificada como “mal definida” é um dos indicadores da baixa
qualidade do preenchimento da DO. Dados do SIM para 2005 revelam que 10,4% dos óbitos foram
registrados com “causa mal definida”, que correspondem ao capítulo XVIII – Sintomas e achados
anormais de exames clínicos e de laboratório não classificados em outra parte da 10a Revisão da CID
e ao capítulo XVI – Sintomas, sinais e afecções mal definidas da 9a Revisão da CID. Notam-se grandes
diferenças nessa proporção entre regiões brasileiras: Norte (17,7%), Nordeste (17,2%), Sudeste (8,1%),
Sul (5,8%) e Centro-Oeste (5,2%). Essas diferenças revelam desigualdades nas condições de vida da
população e na qualidade e disponibilidade da assistência à saúde (OPAS, 2008).

7.3.2 Coeficiente de mortalidade geral

O coeficiente de mortalidade geral (CMG) diz pouco sobre a situação de saúde de uma população,
uma vez que nele estão incluídos indivíduos de todas as idades e ambos os sexos e que vieram a falecer
em razão de todas as causas de morte. Por isso, os coeficientes mais utilizados são os que especificam
a causa da morte e/ou a idade e/ou o sexo do indivíduo e/ou outras características dos indivíduos que
morreram. Esses dados são provenientes das declarações de óbito (DO), das quais a causa básica da
morte é codificada a partir do declarado pelo médico atestante, o qual é obrigado por lei a fornecer o
81
Unidade II

atestado seguindo determinação do Conselho Federal de Medicina. As causas declaradas nos atestados
de óbito são codificadas segundo regras estabelecidas pela OMS, utilizando a Classificação Estatística
Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde, atualmente na sua 10a Revisão (CID-10)
(Tabela II). São também registradas as variáveis de tempo (ano do óbito), local (residência e ocorrência)
e de características das pessoas (sexo, idade) (OPAS, 2008).

Um dos coeficientes de mortalidade mais utilizados para traçar o perfil epidemiológico de uma
população é o CME, segundo causa (ou grupos de causas de morte).

Utilizando esse coeficiente, é possível saber, por exemplo, que as três principais causas de morte, entre
as causas conhecidas da população geral no Brasil, são as doenças do aparelho circulatório, as neoplasias
e as causas externas de morte. Para o aprofundamento do diagnóstico de saúde, os coeficientes de
mortalidade específicos devem sempre ser analisados também segundo sua distribuição por sexo, idade
e tendência temporal para a identificação de riscos diferenciados.

8 PRINCIPAIS ÍNDICES, PROPORÇÕES E COEFICIENTES RELACIONADOS AO


NÍVEL DE SAÚDE DA POPULAÇÃO (GLOBAIS E ESPECÍFICOS)

8.1 Situação de saúde no mundo

A OMS realiza as estatísticas mundiais de saúde anualmente com base em mais de cem indicadores
de saúde relatados pelos 193 estados-membros da OMS e outras fontes confiáveis. Esses dados fornecem
um quadro instantâneo da situação da saúde global e suas tendências. No entanto, informações de saúde
rápidas e precisas são difíceis de serem obtidas em algumas partes do mundo, devido à precariedade dos
sistemas de informação de saúde de alguns países.

O relatório de Estatísticas Mundiais de Saúde 2011 da OMS (2011) destacou que vem aumentando o
número de países que enfrentam duas problemáticas em saúde, o aumento da incidência e da prevalência
dos fatores de risco para doenças crônicas, como o diabetes, as doenças cardíacas e o câncer, e ainda
lutam para reduzir a mortalidade materna e infantil causada por doenças infecciosas.

O envelhecimento da população, a globalização, a urbanização e, consequentemente, o aumento dos


fatores de risco determinaram o aumento das doenças não transmissíveis, como as doenças cardíacas,
os derrames, o diabetes e o câncer, que agora respondem por dois terços de todas as mortes no mundo.

O controle dos fatores de risco como o tabagismo, o sedentarismo, a má


alimentação e o uso excessivo de álcool se torna mais crítico. Os números
mais recentes da OMS mostram que cerca de quatro em cada dez homens
e uma em cada onze mulheres estão usando tabaco e cerca de um em cada
oito adultos são obesos (NOVO RELATÓRIO..., 2011).

Além da situação crítica relacionada aos hábitos de vida da população, os países em desenvolvimento
têm que enfrentar problemas de saúde como diarreia, pneumonia e malária, que têm maior probabilidade
de matar crianças com menos de 5 anos de idade.
82
FUNDAMENTOS DE AÇÕES PREVENTIVAS EM SAÚDE

Em 2009, 40% das mortes de crianças ocorreram entre os recém-nascidos


(com 28 dias ou menos). Há ainda muito a ser feito para alcançar os Objetivos
de Desenvolvimento para o Milênio até 2015, mas o progresso se acelerou:

– A mortalidade infantil diminuiu 2,7% por ano desde 2000, duas vezes
mais rápido do que na década de 1990 (1,3%). A mortalidade entre
crianças com menos de 5 anos caiu de 12,4 milhões em 1990 para
8,1 milhões em 2009.

– A mortalidade materna diminuiu 3,3% por ano desde 2000, quase duas
vezes do que durante a década de 1990 (2%). O número de mulheres
que morrem em consequência de complicações durante a gravidez e o
parto diminuiu de 546 mil em 1990 para 358 mil em 2008.

O relatório mostra também que mais dinheiro está sendo gasto em saúde e
que a expectativa de vida em 2009 era de 68 anos, acima dos 64 anos em
1990, mas a diferença dos gastos em saúde entre os países de alta e de baixa
renda continua a ser muito grande:

– Em países de baixa renda, as despesas de saúde per capita são


estimadas em 32 dólares (ou cerca de 5,4% do Produto Interno Bruto)
e, em países de alta renda, em 4.590 dólares (ou cerca de 11% do
Produto Interno Bruto).

– Países de alta renda têm, per capita, em média, dez vezes mais médicos,
doze vezes mais enfermeiros e parteiras e trinta vezes mais dentistas
do que países de baixa renda.

– Praticamente todos os partos em países de alta renda são atendidos


por pessoal de saúde qualificado, mas esse é o caso de apenas 40%
dos partos em países de baixa renda (NOVO RELATÓRIO..., 2011).

8.2 Indicadores de desenvolvimento social

8.2.1 Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)

O IDH é uma medida resumida do progresso ao longo do tempo, em três dimensões básicas do
desenvolvimento humano: renda, educação e saúde. Esse indicador amplia a análise de desenvolvimento
de um país para além do indicador econômico – PIB per capita –, que é muito utilizado. Criado por
Mahbub ul Haq, com a colaboração do economista indiano Amartya Sen, o IDH é uma medida geral
e sintética que amplia a perspectiva sobre o desenvolvimento humano, mas não abrange nem esgota
todos os aspectos de desenvolvimento.

83
Unidade II

O IDH é uma medida comparativa de riqueza, alfabetização, educação, esperança de vida, natalidade
e outros fatores para os diversos países do mundo. É uma maneira padronizada de avaliação e medida
do bem-estar de uma população, especialmente bem-estar infantil. É usado para distinguir se o país é
desenvolvido, em desenvolvimento ou subdesenvolvido, e para medir igualmente o impacto de políticas
econômicas na qualidade de vida.

8.2.2 Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH)

O RDH é reconhecido pelas Nações Unidas como um exercício intelectual independente e uma
importante ferramenta para aumentar a conscientização sobre o desenvolvimento humano em todo
o mundo. Com sua riqueza de dados, impacta as reflexões sobre o tema no mundo todo. Inclui o IDH,
apresenta dados e análises importantes para a agenda global e aborda políticas públicas voltadas para
enfrentar o desenvolvimento. O Programa Nações Unidas para o Desenvolvimento publica anualmente
um RDH global, com temas transversais e de interesse internacional, bem como o cálculo do IDH
de grande parte dos países do mundo. O IDH é bastante heterogêneo no mundo e está diretamente
relacionado à escolaridade, à expectativa de vida e à renda. Assim, quanto mais pobre é o país, pior o
IDH. Observe o mapa-múndi: as áreas mais escuras são as que apresentam o melhor IDH e correspondem
aos países desenvolvidos e com melhor condição social e econômica. Quanto mais clara é a área, pior
o IDH. Observe que a África é um dos continentes que apresenta o pior IDH e corresponde a uma das
regiões mais subdesenvolvidas e pobres.

8.2.3 Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) no Brasil

O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) criou mapas que apontam o grau de
desenvolvimento humano no Brasil, segundo municípios, para os anos 1991, 2000 e 2010.

Escala do IDHM Muito baixo Baixo Médio Alto Muito alto


0 0,499 0,5 0,599 0,6 0,699 0,7 0,799 0,8 1,0

1991 2000 2010

Figura 6

A evolução do IDH nos municípios brasileiros apresenta avanço significativo. O número de


municípios com muito baixo desenvolvimento humano reduziu significativamente. O baixo
desenvolvimento ainda aparece de forma importante, o médio e o alto desenvolvimento predominam

84
FUNDAMENTOS DE AÇÕES PREVENTIVAS EM SAÚDE

no país, sendo que o alto desenvolvimento se concentra nas regiões Centro-Oeste, Sul e Sudeste; e o
desenvolvimento muito alto se pulveriza de forma discreta nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste
– não causa impacto.

Nas regiões Sul e Sudeste, prevalece o alto desenvolvimento; nas regiões Centro-Oeste e Norte, o
médio desenvolvimento; e na região Nordeste, o baixo desenvolvimento. Evidencia-se a região Nordeste
como a mais vulnerável quanto ao grau de desenvolvimento.

Observe os dados do PNUD (2013):

• Sul: Alto (65%)

• Sudeste: Alto (52%)

• Centro-Oeste: Médio (57%)

• Norte: Médio (50%)

• Nordeste: Baixo (61%)

A evolução do IDHM segundo cada componente – Educação, Renda e Longevidade – de


1991/2000/2010 –, conforme o gráfico a seguir, demonstra impacto positivo nos três componentes,
tendo a educação apresentado maior variação, de 0,27 em 1991 a 0,63 em 2010. Quanto ao valor final,
a longevidade apresenta os melhores resultados em 2010: 0,81.
1991 2000 2010
1,000
0,900
0,816
0,800 0,739
0,727 0,727
0,700 0,692 0,662
0,637 0,647
0,612
0,600
0,493
0,500 0,456
0,400
0,300 0,279

0,200
0,100

0,000
IDHM IDHM educação IDHM renda IDHM longevidade

Figura 7 – Brasil: IDHM e seus subíndices em 1991, 2000 e 2010

85
Unidade II

Observe os dados do PNUD (2013) a respeito da evolução em proporções de 1991, 2000 e 2010 em educação:

• População adulta com Ensino Fundamental concluído: de 30,1% para 54,9%.

• Crianças de 5 a 6 anos frequentando a escola: de 37,3% para 91,1%.

• Jovens de 11 a 13 anos nos anos finais do Ensino Fundamental: de 36,8% para 84,9%.

• Jovens de 15 a 17 anos com o Ensino Fundamental completo: de 20% para 57,2% (sendo que
40% dos jovens nessa faixa ainda não têm Ensino Fundamental completo).

• Jovens de 18 a 20 anos com Ensino Médio completo: de 13% para 41% (a maioria desses jovens
ainda não possui Ensino Médio completo).

Conforme o PNUD (2013), a expectativa de vida cresceu no país 14% (9,2 anos) entre 1991 e 2010.

Entre os municípios, a variação é de 65 a 79 anos, diferença de 14 anos entre a mais alta e a mais
baixa esperança de vida ao nascer. Todos os municípios brasileiros estão na faixa de médio, alto ou muito
alto desenvolvimento humano no IDHM Longevidade (PNUD, 2013). Veja os dados a seguir:

• Entre 2000 e 2010, 39% dos municípios apresentaram crescimento acima da média de crescimento
nacional, com destaque para as regiões Norte e Nordeste.

• Em 2010, 42% dos municípios tinham IDHM Longevidade acima do Brasil (0,816); no Sul, chegou
a 76%, com destaque para SC.

• No Nordeste, 54% dos municípios ainda apresentavam IDHM Longevidade baixo.

Segundo o PNUD (2013), a renda per capita mensal dos brasileiros teve um ganho de R$ 346,31
entre 1991 e 2010.

Quadro 3 – Classificação de renda e faixas de desenvolvimento humano

Baixo Renda per capita entre R$ 180 e R$ 333


Médio Renda per capita aproximadamente entre R$ 333 e R$ 618
Alto Renda per capita aproximadamente entre R$ 624 e R$ 1.157

Adaptada de: PNUD (2013).

O maior IDHM Renda do país tem renda per capita de R$ 2.043,74, que é 21 vezes maior que a renda
per capita do mais baixo IDHM Renda do país, que é de R$ 96,25. Em 2010, apenas 620 municípios,
11% do país, tinham IDHM Renda superior ao do Brasil. Na região Norte, 90% dos municípios estão
na categoria de Baixo e Médio, e apenas quatro municípios, entre 449, têm IDHM Renda acima do
IDHM Renda do Brasil. Já na região Nordeste, 78% dos municípios estão na categoria Baixo, e apenas
86
FUNDAMENTOS DE AÇÕES PREVENTIVAS EM SAÚDE

12 municípios têm IDHM Renda acima do IDHM Renda do Brasil. Na região Sudeste, 38% dos municípios
estão na categoria de Alto e 51% no Médio. Na região Sul, 38% estão na categoria de Médio; e 60%,
no Alto. E na região Centro-Oeste, 50% dos municípios estão no Médio e 36%, no Alto (PNUD, 2013).

Entre 2000-2010, 72% dos municípios do Brasil tiveram crescimento acima da média de crescimento
nacional (PNUD, 2013).

8.3 Esperança de vida

A esperança de vida ao nascer para uma faixa etária definida é um indicador geral das condições de
vida e saúde e reflete o padrão de mortalidade de uma população. Seu cálculo é feito a partir de tábuas
de vida, determinando-se o tempo cumulativo vivido por uma geração de nascimentos e dividindo-se
esse pelo número de nascimentos dessa geração. Em estatística vital, a vida média ou esperança de vida
para uma idade ou faixa etária representa o número médio de anos que ainda podem ser vividos pelos
indivíduos que sobreviveram até aquela idade, dado que a probabilidade de morte empregada no cálculo
permanece constante. Esse indicador não se confunde com a duração máxima de vida, que constitui
um limite biológico da espécie. Em contrapartida, está sujeito às influências do ambiente e tem seu
valor modificado ao longo do tempo na medida em que se alterem as condições sociais, a aplicação de
tecnologias em saúde e o acesso a bens e serviços que promovem a qualidade de vida.

A vida média e as condições de saúde da população estão diretamente relacionadas. Essas condições
refletem a probabilidade de sobrevida ou, alternativamente, de morrer a cada ano vivido. Populações de
áreas econômica e socialmente desenvolvidas têm, em geral, melhores condições de saúde e, dessa forma,
conseguem atingir uma esperança de vida maior do que a das populações de regiões subdesenvolvidas.

Observa-se aumento na esperança de vida ao nascer da população brasileira, fenômeno este que
tem ocorrido em países de diferentes níveis socioeconômicos, embora em graus variados. Com efeito,
o notável aumento na sobrevida nas últimas décadas revela mudanças importantes nos padrões de
mortalidade, em especial pela redução da mortalidade infantil e pelo aumento da expectativa
de vida de indivíduos com idade igual ou superior a 50 anos. Na década de 1980, um ganho médio de
aproximadamente quatro anos na esperança de vida ao nascer resultou, em 1991, em 70,9 anos para
as mulheres e 63,2 anos para os homens. O aumento progressivo persistiu, embora em menor ritmo na
década de 1990, alcançando, em 2000, 74,4 anos nas mulheres, 66,7 anos nos homens. Desde então até
2006, ganhos médios de aproximadamente dois anos indicavam a melhoria progressiva das condições
de saúde que determinam as chances de sobrevida (PNUD, 2013).

Entretanto, permanece até hoje o diferencial por sexo nos valores desse indicador. Essa diferença é
observada em menor ou maior grau em regiões desenvolvidas e subdesenvolvidas, com maior sobrevida
das mulheres em relação aos homens. Atribui-se essa sobremortalidade masculina à maior exposição
dos homens a diferentes riscos de doenças e agravos à saúde, em especial às causas externas de óbito,
às doenças cardiovasculares e aos fatores socioeconômicos e culturais que aumentam a vulnerabilidade
desse grupo ao risco de morrer precocemente.

87
Unidade II

8.4 Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM)

Em 2000, a Organização das Nações Unidas (ONU), ao analisar os maiores problemas mundiais,
estabeleceu oito ODM, que deveriam ser atingidos por todos os países até 2015. No Brasil, são chamados
de 8 Jeitos de Mudar o Mundo. Essas metas tiveram o apoio de 191 nações e ficaram conhecidas como
Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM). Nos tópicos a seguir, estudaremos cada uma delas.

O texto a seguir destaca esses oito objetivos.

O Brasil e os ODM

Objetivo 1 – acabar com a fome e a miséria

A meta da ONU de reduzir a fome e a pobreza extrema até 2015 à metade do que
era em 1990 foi alcançada pelo Brasil em 2002. Em 2007, a meta nacional de reduzir a
porcentagem de pobres a ¼ da de 1990, apesar de mais ambiciosa, também foi cumprida e
superada em 2008.

O Brasil sem Miséria potencializou esse esforço. O programa pretende retirar mais de
16 milhões de brasileiros da extrema pobreza. A busca ativa para “encontrar” essas pessoas
conseguiu incluir no Cadastro Único, de junho de 2011 a março de 2012, 687 mil novas
famílias, que já estão recebendo o Bolsa Família. Em maio de 2012, o programa atendia a
13,5 milhões de famílias.

Outra iniciativa que integra o Brasil Sem Miséria é o Brasil Carinhoso, lançado em
maio de 2012. A meta é a superação da miséria em todas as famílias com crianças de
0 a 6 anos, além de ampliar o acesso à creche, à pré-escola e à saúde. O benefício para
superar a pobreza extrema é de pelo menos R$ 70 por pessoa, que é destinado a famílias
extremamente pobres com crianças nessa faixa etária. O início do pagamento, em junho de
2012, reduziu a extrema pobreza total em 40%.

Objetivo 2 – educação básica de qualidade para todos

Nos últimos anos, houve avanços significativos em termos de acesso e rendimento


escolar de crianças e jovens no Brasil. Em 2009, 95,3% da faixa etária de 7 a 14 anos
frequentavam o ensino fundamental. No mesmo ano, 75% dos jovens que haviam atingido
a maioridade concluíram o ensino fundamental.

O Brasil convive com uma baixa taxa de conclusão escolar, que pode ser explicada pelos
elevados índices de repetência e de evasão. No entanto, a educação básica brasileira já
atende a 98% da população: mais de 50 milhões de crianças e jovens. Da educação infantil
ao ensino médio, são 2 milhões de professores.

88
FUNDAMENTOS DE AÇÕES PREVENTIVAS EM SAÚDE

O investimento em educação básica foi R$ 114,3 bilhões em 2012, um aumento de


19,12% em relação a 2011. Também em relação a 2011, houve reajuste de 21,2% no valor
mínimo investido por aluno.

Objetivo 3 – igualdade entre os sexos e valorização da mulher

Superar as disparidades entre meninos e meninas no acesso à escolarização formal e


promover políticas que ofereçam oportunidades para mulheres ocuparem papéis cada vez
mais ativos no mundo econômico e política são ações essenciais para a superação das
desigualdades de gênero.

No que diz respeito ao acesso à educação, o Brasil já alcançou as metas previstas nos
Objetivos de Desenvolvimento do Milênio: meninas e mulheres já são maioria em todos os
níveis de ensino.

Mesmo que tenha havido melhorias nos indicadores, a desigualdade das mulheres em
relação aos homens ainda persiste no mercado de trabalho, nos rendimentos e na política. E
a violência doméstica continua atingindo milhares de mulheres brasileiras.

O Programa de Autonomia Econômica das Mulheres e Igualdade no Mundo do


Trabalho busca minimizar parte dos problemas ao promover ações de inserção no mercado
de trabalho, inclusão produtiva e geração de renda nos meios urbanos e rural, além da
responsabilização do Estado pelos cuidados e pela educação infantil.

O Brasil celebrou ainda um acordo federativo em torno do Pacto Nacional pelo


Enfrentamento à Violência Contra a Mulher, que abrange as dimensões de prevenção,
assistência, combate e garantia de direitos às mulheres. Atualmente, existem 1.011 serviços
de atendimento às mulheres em situação de violência.

Entre 2003 e 2011, a População Economicamente Ativa (PEA) feminina cresceu 17,3%,
enquanto a PEA masculina aumentou 9,7%. A participação das mulheres na PEA passou
de 44,4% em 2003, para 46,1% em 2011. No mesmo período, as mulheres aumentaram
sua participação na população ocupada, passando de 43,0% para 45,4%.

Diminuíram as diferenças entre os rendimentos do trabalho. Entre 2003 e 2011,


o rendimento real médio das mulheres cresceu 24,9%, variação superior à observada
entre os homens. A remuneração média das mulheres passou a corresponder a 72,3%
da masculina, em 2011, situação menos desigual que em 2003, quando essa proporção
equivalia a 70,8%.

Objetivo 4 – redução da mortalidade infantil

A taxa de mortalidade infantil (menores de 1 ano) por mil nascidos vivos passou de 29,7,
em 2000, para 15,6, em 2010. Essa taxa é menor que a meta prevista para 2015, de 15,7 por
89
Unidade II

mil nascidos vivos. A queda mais acentuada ocorreu na região Norte (-58,6%), que ainda
apresenta a taxa mais elevada do Brasil: 18,5 por mil nascidos vivos.

A taxa de mortalidade das crianças abaixo de 5 anos apresentou queda de 65% entre
1990 e 2010. O número de óbitos por mil nascidos vivos passou de 53,7 para 19 óbitos. Os
indicadores demonstram que tanto as taxas de mortalidade na infância (menores de 5 anos)
e infantil (menores de 1 ano) apresentaram forte queda entre 1990 e 2010. A mortalidade
infantil está concentrada nos primeiros meses de vida, no período neonatal precoce (0 a 6
dias) e neonatal tardio (7 a 27 dias).

Objetivo 5 – melhorar a saúde da gestante

Esse é o objetivo que o Brasil tem mais dificuldade de atingir. O país melhorou, mas
ainda não alcançou a meta de reduzir em ¾, entre 1990 e 2015, a razão da mortalidade
materna. Segundo estimativas da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde,
a razão da mortalidade materna era de 141 por 100 mil nascidos vivos em 1990 e declinou
para 68 por 100 mil nascidos vivos em 2010. Entre janeiro e setembro de 2011, a mortalidade
materna diminui 21%. Ocorreram 1.038 óbitos por complicações na gravidez e no parto,
contra 1.317 no mesmo período de 2010. A meta é atingir 35 óbitos por 100 mil nascidos
vivos em 2015.

O governo federal criou o Saúde Mais Perto de Você e o Rede Cegonha, que é composto
de quatro componentes: pré-natal; parto e nascimento; puerpério e atenção integral à
saúde da criança; e sistema logístico, com transporte sanitário e regulação.

Em 2011, a tendência de queda continuou, com a diminuição de 21% dos óbitos maternos
em relação a 2010. No primeiro semestre de 2011, foram notificados 705 óbitos por causas
obstétricas. No mesmo período de 2010 foram registrados 870. De 2003 a 2010, aumentou
em 125% o número de gestantes com sete ou mais consultas de pré-natal e a proporção
de mães brasileiras que não fizeram nenhuma consulta foi reduzida de 4,7% para 1,8%. Em
2011, mais de 1,7 milhão de gestantes fizeram no mínimo sete consultas de pré-natal.

Objetivo 6 – combater a aids, a malária e outras doenças

A experiência brasileira de combate à epidemia de HIV/aids se tornou uma referência


mundial. Desde o início da epidemia, em 1980, até junho de 2011, o Brasil registrou
608,2 mil casos de aids, mas a taxa de incidência passou de 20,0 por 100 mil habitantes em
2003 para 17,9 por 100 mil habitantes em 2010. Foram notificados, em 2010, 34.218 novos
casos da doença.

O Brasil tem conseguido controlar a malária. O número de exames positivos por mil
habitantes caiu de 33,2, em 1990, para 13,1 em 2010. A malária está concentrada na região
norte (Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima), com mais de 95% dos casos.

90
FUNDAMENTOS DE AÇÕES PREVENTIVAS EM SAÚDE

Também em relação à tuberculose, o Brasil tem conseguido alcançar a meta de reduzir


a incidência: o número de casos novos por 100 mil habitantes caiu de 51,8, em 1990, para
37,6, em 2010. O Brasil antecipou em cinco anos o cumprimento da meta dos ODM, que era
reduzir pela metade os óbitos pela doença entre 1990 e 2015.

Assim como no caso do HIV/aids, os gestores da saúde têm buscado estruturar a


vigilância epidemiológica para o enfretamento dessas e de outras doenças transmissíveis,
tais como a tuberculose e a dengue. O maior desafio é combater a dengue, pois a incidência
tem aumentado. No Brasil, de janeiro a abril de 2010, ocorreram 467 mortes causadas por
dengue. Já de janeiro a abril de 2012, foram 74 óbitos. Os casos graves de janeiro a abril
de 2010 foram de 11.485, contra 1.083 identificados de janeiro a abril de 2012. Houve uma
queda de 84% nos óbitos por dengue e redução de 91% nos casos graves.

Foram criados programas nacionais de controle da malária, da dengue e da tuberculose


para reduzir a incidência das doenças e o número de vítimas.

Objetivo 7 – qualidade de vida e respeito ao meio ambiente

A taxa de desmatamento da Amazônia entre agosto de 2010 e julho de 2011 foi a menor
registrada desde a primeira medição feita pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
(Inpe), em 1988. A área de 6.418 km² desmatada no período é 76,9% menor do que a
registrada em 2004, quando foi criado o Plano de Ação para a Prevenção e Controle do
Desmatamento na Amazônia Legal. Atualmente, 81,2% da floresta original da Amazônia
permanecem conservados.

Em relação aos compromissos de Copenhague, o Brasil já havia reduzido a emissão


de gases de efeito estufa em 19,2%, até 2011, apenas como efeito da diminuição do
desmatamento na Amazônia. É mais que a metade da meta voluntária, de 36,1%, a ser
alcançada em 2020. Quanto ao desmatamento, o compromisso é alcançar uma redução de
80% em relação à média anual registrada entre 1996 e 2005. A queda do desmatamento já
corresponde a 67% dessa meta.

O Brasil pode contar ainda com 75,1 milhões de hectares de Unidades de Conservação
Ambiental federais. A homologação de terras indígenas já atinge 109,77 milhões de hectares,
cerca de 12,9% do território nacional. As terras indígenas são responsáveis pela preservação
de 30% da biodiversidade brasileira.

Até maio de 2012, 23 mil famílias que vivem ou trabalham em florestas nacionais, reservas
federais extrativistas ou de desenvolvimento sustentável e assentamento ambientalmente
sustentáveis estavam recebendo o pagamento trimestral de R$ 300 para que continuassem
realizando a conservação de ativos ambientais.

O Brasil já atingiu as metas dos Objetivos do Desenvolvimento do Milênio relativas ao


abastecimento de água e ao esgotamento sanitário. De uma forma geral, o Brasil ruma à
91
Unidade II

universalização do acesso ao abastecimento de água no meio urbano, com aproximadamente


91,9% dos domicílios ligados à rede de abastecimento; se considerarmos o abastecimento
de água por poço também como adequado, a cobertura passa para aproximadamente
97,4% (Censo 2010). No semiárido foram entregues 83.258 cisternas em 2011. Até julho de
2012 foram entregues 40.033. As cisternas construídas em 2011 e 2012 estão beneficiando
123 mil famílias.

No caso do esgoto, no entanto, ainda estamos longe da universalização. O total ligado à


rede coletora ou à solução individual por fossa séptica é de 75,3% (Censo 2010).

Objetivo 8 – todo mundo trabalhando para o desenvolvimento

Alcançar o desenvolvimento é uma responsabilidade coletiva de toda a comunidade


internacional. No caso brasileiro, a implementação de políticas públicas é no sentido de
aumentar a inclusão social.

Em uma federação complexa como a brasileira, é necessário realizar esforços para tornar
a gestão municipal eficiente e eficaz e capaz de acelerar a execução dos investimentos
públicos, de manter as políticas sociais, de realizar ações de diversificação da economia
local, bem como de melhorar o ambiente de negócios e a qualidade do gasto público.

Sobre a pauta brasileira com outros países, deve-se destacar a intensificação da agenda
bilateral e o fortalecimento das relações com países da América Latina e Caribe.

Fonte: O Brasil... (s.d.).

O mundo apresenta muita heterogeneidade em relação ao grau de desenvolvimento econômico e


social dos diversos países. A meta de ampliar o desenvolvimento global objetiva diminuir as diferenças
entre os continentes e seus respectivos países.

8.5 Violência no campo da saúde

No ano de 2002, após um notável crescimento internacional da produção científica e dos acordos
políticos em torno dos direitos humanos e sociais, a OMS lançou seu Relatório Mundial sobre Violência
e Saúde. Com isso, a OMS tornou público tanto o problema quanto sua disposição de apoiar políticas
e intervenções contra a violência. Também provocou uma ampliação do debate, consolidando a
problemática como questão de caráter mundial, e não meramente de alguns países.

Não obstante, se é um problema comum, a violência não é sempre a mesma, não sendo um só
acontecimento, mas ocorrências muito diversas. A violência é, pois, algo plural: são múltiplas suas
situações, posto ser sempre uma questão culturalmente investida, e, portanto, com expressões distintas,
relativas aos contextos em que ocorre, seja entre países distintos, seja no interior de um mesmo país,
além de conformar-se distintamente nas diferentes relações que as pessoas estabelecem entre si, dentro
de uma mesma cultura e sociedade.
92
FUNDAMENTOS DE AÇÕES PREVENTIVAS EM SAÚDE

Exatamente por isso, embora a própria OMS postule uma definição bastante geral para que seja
comum aos países, ao mesmo tempo aponta e classifica a grande diversidade de expressão da violência.

Em particular para o campo da saúde, é preciso considerar três importantes questões:

• A imensa gama de consequências para a saúde das pessoas produzida pela violência.

• As repercussões que tais consequências acarretam no uso dos serviços de saúde.

• A grande invisibilidade da violência como questão para a saúde, seja em termos de prevenção da
violência, seja como assistência às pessoas vítimas das violências.

Saiba mais

Para obter mais informações a respeito da cultura de paz, leia:

BRASIL. Ministério da Saúde. Instrutivo para preenchimento da


ficha de notificação de violência interpessoal/autoprovocada. Brasília:
Ministério da Saúde, 2015. Disponível em: http://www2.ebserh.gov.br/
documents/222346/1207905/Instrutivo+VIVA.pdf/546a8a3e-f7fd-41d7-
9bf3-e0262d690a0b. Acesso em: 10 jan. 2020.

8.5.1 Mortalidade: o impacto fatal da violência

Estudos de mortalidade, por sua vez, mostram a consequência mais dramática da violência e
atualmente acentuam sua visibilidade ao destacarem as mortes violentas no interior dos dados sobre
as mortes por causas externas, mostrando a escalada dos genocídios, dos homicídios entre jovens,
sobretudo em países pobres, e a nova problemática dos suicídios nas sociedades contemporâneas.

Uma revisão feita pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP, 2019) mostrou que a
OMS estimava, para 2000, a taxa mundial ajustada por idade de 28,8 mortes violentas por 100 mil
habitantes, sendo 49,1% delas (14,5/100 mil habitantes) representados por suicídios, 31,3%
(8,8/100 mil habitantes) por homicídios e 18,6% (5,2/100 mil habitantes) resultado de guerras.
Esses índices variam muito por níveis de renda do país, definidos pela OMS por meio do Produto
Nacional Bruto (PNB) per capita referente a 1996 e classificados como renda baixa (<US$ 785), média
(US$ 786 a 9.635) e alta (> US$ 9.635). Nos dois primeiros casos (renda baixa e média) somados, as
mortes violentas são mais que o dobro da taxa dos países de alta renda, representando 91,1% do
total dessas mortes em taxas de 32,1 mortes violentas por 100 mil habitantes para os primeiros e de
14,4 por 100 mil habitantes para os países de renda alta (FBSP, 2019).

Em estudo publicado em 2007, Dahlberg e Krug acentuaram que há diferenças importantes entre
países de mesma região, tal como a Colômbia com relação ao México ou à Cuba, na América Latina,

93
Unidade II

apresentando-se os índices de homicídios entre homens, respectivamente, de 146,5, 32,3 e 12,6 para
cada 100 mil habitantes.

Dahlberg e Krug (2007) destacam que esses dados também variam por sexo e idade mundialmente.
Em homicídios, 77% ocorrem entre os homens, o que representa mais que três vezes a taxa encontrada
entre mulheres, concentrando-se esses óbitos na faixa etária de 15 a 44 anos: a faixa de 15 a 29 anos
responde por 19,4 mortes por 100 mil habitantes e a de 30 a 44 anos por 18,7 por 100 mil. Além disso,
existem variações por etnias e desigualdades sociais no interior de um mesmo país. Por exemplo, nos
Estados Unidos, em 1999, na faixa etária de 15 a 24 anos, o índice de homicídios entre afro-americanos
foi duas vezes maior que o encontrado entre hispânicos e mais de 12 vezes o das populações caucasianas
e não hispânicas, sendo respectivamente de 38,6, 17,3 e 3,1 mortes por 100 mil habitantes (DAHLBERG;
KRUG, 2007, p. 1170).

Observe o excerto a seguir:

Relativamente às crianças, chamam a atenção as altas taxas de mortalidade,


também desiguais pelos países e por sexo. A taxa de homicídio de zero a
quatro anos (5,2 por 100 mil) é mais que o dobro que aquela de crianças entre
cinco a 14 anos (2,1 por 100 mil). Para crianças menores que cinco anos, a
taxa de homicídio em países de alta renda é de 2,2 por 100 mil meninos e 1,8
por 100 mil meninas, sendo que em países mais pobres são duas a três vezes
maiores (6,1 por 100 mil meninos e 5,1 por 100 mil meninas). Reitera-se aqui
a ocorrência maior dessa violência em meninos (SCHRAIBER; D’OLIVEIRA;
COUTO, 2006, p. 115).

Quanto aos suicídios,

60% deles também ocorrem entre homens, taxa que aumenta com a idade,
sendo duas vezes maior entre homens, na faixa etária de 60 anos, e mais do
que entre as mulheres: 44,9 por 100 mil para os homens frente a 22,1 por
100 mil para as mulheres (SCHRAIBER; D’OLIVEIRA; COUTO, 2006, p. 115).

No caso do Brasil, conforme o sistema de informação de mortalidade do Ministério da Saúde (SIM/


Datasus), a principal fonte de informação para os dados que seguem, o país apresenta o perfil dos países
de menor renda na classificação da OMS, com os homicídios ocupando o primeiro lugar em termos de
frequência, relativamente a outros componentes das mortes por causas externas, tais como os acidentes
e os suicídios. As mortes violentas, portanto, participam decisivamente da diferença entre o perfil de
mortalidade no Brasil e o dos países de maiores rendas do mundo, estando nas Américas apenas abaixo
da taxa encontrada na Colômbia.

Segundo Macedo et al. (2001, p. 516), os homicídios e os suicídios distribuem-se diferentemente


pelas regiões, por idade, sexo, desigualdade social e raça/etnia. Na mortalidade por homicídios, entre
1977 e 1994 houve um aumento relativo de 160% no país, passando de 7,9 a 21,2 por 100 mil habitantes,
mantendo-se em curva ascendente até o ano de 2001. No diferencial entre as regiões brasileiras, nota-se
94
FUNDAMENTOS DE AÇÕES PREVENTIVAS EM SAÚDE

que o Sudeste e o Centro-Oeste apresentam as maiores taxas de homicídio, mas esses índices podem
variar dentro de uma dada região, como no Nordeste, que, em 2000, apresentou 11,83 homicídios por
100 mil habitantes em Salvador e 67,4 por 100 mil habitantes.

Indicadores desenvolvidos com dados do Sinasc

Um importante indicador é a cobertura de pré-natal, definida como a distribuição percentual


de mulheres com filhos nascidos vivos segundo o número de consultas de pré-natal, na população
residente em determinado espaço geográfico, no ano considerado. Assim, no Brasil, em 2008, 57,1% das
mulheres fizeram sete ou mais consultas de pré-natal, ao passo que 1,8% não fez nenhuma (OMS, 2011).
Atente-se para o fato de que esta última proporção tem decrescido em todas as regiões brasileiras nos
últimos anos. Em termos de serviços de saúde, deverá ocorrer, consequentemente, um ajuste na oferta
de assistência à gravidez, ao parto e ao puerpério que permita melhorar sua qualidade, uma vez que a
cobertura já é praticamente universal.

Outro indicador proveniente dos dados do Sinasc muito utilizado para avaliação e planejamento
de ações de promoção da saúde reprodutiva e infantil é a proporção de nascidos vivos de baixo peso
ao nascer. Conceituado como o percentual de nascidos vivos com peso ao nascer inferior a 2.500 g, de
mães residentes em determinado espaço geográfico, no ano consultado, esse indicador pode ser um
preditor da sobrevivência infantil, dado que a ocorrência do baixo peso ao nascer expressa retardo do
crescimento intrauterino ou prematuridade. Seu valor varia consideravelmente entre regiões e países
desenvolvidos e em desenvolvimento, sendo ao redor de 8% no Brasil.

Por meio dos dados provenientes do Sinasc e do indicador proporção de partos cesáreos, observa-se
também sua alta proporção (43% em 2005), bem acima dos patamares internacionais. Essa proporção
é maior nos hospitais privados, o que requer ações direcionadas à redução da cesariana desnecessária,
importante fator de risco relacionado à prematuridade, ao baixo peso ao nascer e à mortalidade
neonatal (OMS, 2011).

Resumo

Inicialmente, estudou-se o processo epidêmico. A dinâmica da distribuição


das doenças nas populações mostra que a transmissão pode ocorrer em
períodos epidêmicos, em períodos interepidêmicos ou esporádicos e
em períodos endêmicos.

Endemia é definida como a presença constante de uma doença em


uma população definida, em determinada área geográfica; pode também
referir-se à prevalência usual de uma doença em um grupo populacional
ou em uma área geográfica. As doenças parasitárias, em sua grande
maioria, são endêmicas no Brasil.

95
Unidade II

Epidemia é conceituada como a ocorrência de uma doença em uma


população, que se caracteriza por uma elevação progressiva, inesperada
e descontrolada do número de casos, ultrapassando os valores endêmicos
ou esperados. Algumas doenças endêmicas podem, eventualmente, se
manifestar em surtos epidêmicos.

Já pandemias são as epidemias que ocorrem ao mesmo tempo em vários


países, ou seja, são epidemias em nível mundial. A peste bubônica na Idade
Média e a gripe espanhola no início do século XX são exemplos de pandemias
que já afligiram a humanidade. Recentemente (2010), a infecção pelo vírus
H1N1 (gripe suína), por ser epidêmica em vários países, foi considerada pela
OMS uma pandemia.

Em relação às doenças transmissíveis, constatamos que as medidas de


prevenção e controle são primordiais, no entanto, muitas delas nunca serão
erradicadas em razão de suas características e da íntima relação com o
meio ambiente. Só conseguiríamos erradicar a malária, por exemplo, se
acabássemos com todos os mosquitos anopheles, o que é impossível.

A melhor forma de prevenção são as ações de vigilância em saúde,


com todos os subsistemas (vigilância sanitária, epidemiológica e ambiental)
trabalhando de forma integrada com atuação sobre os determinantes de
saúde e o envolvimento de todos os setores da sociedade.

Estudamos os principais indicadores utilizados para conhecer o


perfil epidemiológico de uma população. A interpretação dos diversos
indicadores permite a construção de um diagnóstico da saúde da
população sob análise e identificação dos problemas mais importantes,
contribuindo para a definição de suas necessidades e para as
prioridades de atuação dos profissionais de saúde inseridos nos serviços
e sistemas de saúde. Os indicadores epidemiológicos tradicionalmente
mais usados no campo da saúde são os de mortalidade (óbitos) e de
morbidade (doenças/agravos à saúde), que se apoiam nos diagnósticos
realizados pelos médicos. Utilizam-se também indicadores que procuram
medir condições gerais de vida e saúde, entre os quais se destacam os
relacionados à qualidade de vida.

Observamos que os coeficientes de morbidade indicam a probabilidade


de ocorrência do evento, relacionando o número de indivíduos com
determinada doença e a população sujeita ao risco de adquiri-la. Os
mais aplicados são os coeficientes de incidência e de prevalência.
Os coeficientes de prevalência são valiosos para o planejamento dos
serviços de saúde, ao expressarem demandas presentes e potenciais.
Já os coeficientes de incidência são medidas de risco, fundamentais
96
FUNDAMENTOS DE AÇÕES PREVENTIVAS EM SAÚDE

para estudos etiológicos e para o acompanhamento da dinâmica das


doenças nas populações. A medida de incidência é muito utilizada para
avaliar doenças agudas e é o instrumento usado para avaliar a existência
de aumento abrupto da ocorrência de agravos à saúde. A dengue, as
meningites e a pandemia de influenza de 2009 são exemplos de doenças
acompanhadas semanalmente pelo coeficiente de incidência nos locais
afetados. O monitoramento desse indicador possibilita identificar a
velocidade de progressão de um agravo.

O Ministério da Saúde é o principal responsável pelas estatísticas de


saúde do Brasil. A qualidade dessas estatísticas depende essencialmente
da qualidade dos registros primários dos dados, na qual o papel
mais importante é dos profissionais de saúde. Os principais registros
primários que alimentam os sistemas de informação de mortalidade
são: a declaração de óbito (DO) e a declaração de nascido vivo (DN),
padronizadas nacionalmente e distribuídas pelo Ministério da Saúde.
Todos os profissionais de saúde são responsáveis pelo completo e correto
preenchimento desses registros, cabendo exclusivamente ao médico
a responsabilidade do preenchimento da parte médica de ambas as
declarações. Os dados desses registros são consolidados e trabalhados
pelo Departamento de Informática do SUS (Datasus) mediante o Sistema
de Informações de Mortalidade (SIM) e o Sistema de Informações
Sobre Nascidos Vivos (Sinasc). O médico também é responsável pelas
informações dos casos de doenças de notificação compulsória e pelos
registros de diagnósticos das pessoas atendidas no SUS.

Por fim, foram expostos índices e coeficientes relacionados ao nível


de saúde da população, tanto globais como específicos. O Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH) é utilizado pela Organização das Nações
Unidas (ONU) como um parâmetro de bem-estar das populações de
188 países. Para o cálculo do IDH, considera-se a expectativa de vida
da população, educação e renda per capita. O conceito de qualidade
de vida também foi abordado e tem suscitado pesquisas. Cresce a sua
utilização nas práticas desenvolvidas nos serviços de saúde, sendo
necessário entender mais sobre esse conceito. Outro assunto pertinente
que desenvolvemos foi a relação de violência e saúde. É relevante dar
visibilidade à violência em termos da magnitude do problema e dos
impactos na saúde das pessoas e populações.

97
Unidade II

Exercícios

Questão 1. (Enem 2011) O mapa mostra a área de ocorrência da malária no mundo. Considerando-se
sua distribuição na América do Sul, a malária pode ser classificada como:

Áreas onde ocorre transmissão de malária


Áreas com risco limitado
Sem malária

Figura 8 - Incidência de malária

A) Endemia, pois se concentra em uma área geográfica restrita desse continente.

B) Peste, já que ocorre nas regiões mais quentes do continente.

C) Epidemia, já que ocorre na maior parte do continente.

D) Surto, pois apresenta ocorrência em áreas pequenas.

E) Pandemia, pois ocorre em todo o continente.

Resposta correta: alternativa A.

Análise das alternativas

A) Alternativa correta.

Justificativa: a malária na América do Sul é considerada endêmica, pelo fato de que ela está restrita
a regiões predeterminadas. A endemia difere da epidemia por ser de caráter mais contínuo e restrito a
uma determinada área.
98
FUNDAMENTOS DE AÇÕES PREVENTIVAS EM SAÚDE

B) Alternativa incorreta.

Justificativa: a peste é uma doença infecciosa aguda, transmitida principalmente por picada de
pulga infectada.

C) Alternativa incorreta.

Justificativa: uma epidemia irá acontecer quando existir a ocorrência de surtos em várias regiões.

D) Alternativa incorreta.

Justificativa: o surto acontece quando há um aumento inesperado do número de casos de


determinada doença em uma região específica. Em algumas cidades, a dengue, por exemplo, é tratada
como um surto, e não como uma epidemia, pois acontece em regiões específicas (como um bairro).

E) Alternativa incorreta.

Justificativa: a pandemia, em uma escala de gravidade, é o pior dos cenários. Ela acontece quando
uma epidemia se estende em níveis mundiais, ou seja, se espalha por diversas regiões do planeta. Em
2009, a gripe A (ou gripe suína) passou de uma epidemia para uma pandemia quando a OMS começou
a registrar casos nos seis continentes do mundo.

Questão 2. (FGV 2015) A situação das doenças transmissíveis no Brasil apresenta um quadro
complexo, que pode ser resumido em três grandes tendências: doenças transmissíveis com tendência
descendente, doenças transmissíveis com quadro de persistência e doenças transmissíveis emergentes e
reemergentes. Uma doença transmissível com tendência descendente é:

A) Malária.

B) Coqueluche.

C) Tuberculose.

D) Leptospirose.

E) Hepatites virais.

Resposta correta: alternativa B.

Análise das alternativas

A) Alternativa incorreta.

Justificativa: na malária há transmissão vetorial por mosquitos anofelinos, agente etiológico do


gênero Plasmodium sp.

99
Unidade II

B) Alternativa correta.

Justificativa: na coqueluche a transmissão se dá pelo ar, ela é imunoprevenível e declina pela vacina
DTP (difteria, tétano e pertussis). O agente etiológico da coqueluche é a bactéria Bordetella pertussis.

C) Alternativa incorreta.

Justificativa: a tuberculose é transmissível pelo ar e imunoprevenível apenas em casos graves pela


vacina BCG.

D) Alternativa incorreta.

Justificativa: a leptospirose é transmitida pelo contato da urina de roedores (contendo a bactéria do


gênero Leptospira sp.) com feridas abertas e mucosas ou por muito tempo de exposição da pele íntegra
a enchentes e lama, por exemplo.

E) Alternativa incorreta.

Justificativa: só há vacinas para as hepatites virais dos tipos A e B.

100
FIGURAS E ILUSTRAÇÕES

Figura 6

IMAGE. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/emdiscussao/edicoes/pacto-federativo/


infograficos-da-edicao/info_206_mapa-idhm-brasil/@@images/image/. Acesso em: 9 jan. 2020.

Figura 7

PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD). Atlas do Desenvolvimento


Humano no Brasil 2013. PNUD, 2013. p. 3.

REFERÊNCIAS

Textuais

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MARTINS, M. A. et al. (org.). Clínica médica. 2. ed. Barueri: Manole, 2016. v. 1.

BERNARDI, D. F. Fisioterapia preventiva em foco. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2010.

BRASIL. Lei n. 8.080/90. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde,
a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Brasília,
1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8080.htm. Acesso em: 7 jan. 2020.

BRASIL. Ministério da Saúde. Instrutivo para preenchimento da ficha de notificação de violência


interpessoal/autoprovocada. Brasília: Ministério da Saúde, 2015. Disponível em: http://www2.ebserh.
gov.br/documents/222346/1207905/Instrutivo+VIVA.pdf/546a8a3e-f7fd-41d7-9bf3-e0262d690a0b.
Acesso em: 10 jan. 2020.

BRASIL. Ministério da Saúde. Manual de instruções para o preenchimento da declaração de nascido


vivo. Brasília: Ministério da Saúde, 2011. Disponível em: http://portalarquivos.saude.gov.br/images/
pdf/2017/junho/08/inst_dn.pdf. Acesso em: 10 jan. 2020.

BRASIL. Ministério da Saúde. Manual de instruções para o preenchimento da declaração de óbito.


Brasília: Ministério da Saúde, 2001. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_
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BRASIL. Pesquisa Nacional de Demografia e Saúda da Criança e da Mulher 2006. Brasília: Centro
Brasileiro de Análise e Planejamento, 2009.

COURA, J. R. Dinâmica das doenças infecciosas e parasitárias. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005.

101
DAHLBERG, L. L.; KRUG, E. G. Violência: um problema global de saúde pública. Ciência & Saúde
Coletiva, v. 11, p. 1163-1178, 2007.

DECLARARÇÃO de Alma-Ata. In: CONFERÊNCIA INTERNACIONAL SOBRE CUIDADOS PRIMÁRIOS DE


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103
Unidade I – Questão 2: INSTITUTO BRASILEIRO DE GESTÃO E PESQUISA (IBGP). Processo Seletivo para
Técnico de Enfermagem: Saúde Pública. Questão 16.

Unidade II – Questão 1: INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO


TEIXEIRA (INEP). Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2011: Ciências da Natureza e suas
Tecnologias. Questão 64. Disponível em: http://download.inep.gov.br/educacao_basica/enem/
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Unidade II – Questão 2: FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS (FGV). Concurso Público para Analista
Judiciário – Enfermeiro 2015: Conhecimentos Específicos. Questão 68. Disponível em: https://arquivo.
pciconcursos.com.br/provas/23853843/50a42e25208a/analista_judic_apoio_especial_enfermeiro_
tipo_1.pdf. Acesso em: 10 jan. 2020.

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105
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107
108
Informações:
www.sepi.unip.br ou 0800 010 9000

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