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Disciplina: Epidemiologia e Saúde Pública

Prof.: Marcus Nery

Unicausalidade e Multicausalidade

A causalidade dos eventos adversos à saúde é uma das questões centrais da


epidemiologia, mas também uma das mais complexas. A epidemiologia em seus primórdios
foi influenciada por conceitos unicausais da determinação das doenças, derivados
principalmente do desenvolvimento da microbiologia no final do século passado. De acordo
com essa concepção, a cada doença infecciosa deveria corresponder um agente etiológico
específico.
No entanto, já nas primeiras décadas do século XX, verificava-se que essa teoria
não se adequava à compreensão da maioria das doenças infecciosas ou não-infecciosas.
Progressivamente, firmava-se a percepção de que vários fatores, e não somente uma única
causa estava relacionada com a ocorrência das doenças. Incorporava-se, então, à
epidemiologia a concepção multicausal da determinação do processo saúde-doença.
A presença de um patógeno pode ser necessária para a ocorrência de uma doença,
mas sua presença pode não ser suficiente para que ela se desenvolva. Em situações como
essa a causa suficiente pode ser a quantidade do inóculo ou a presença de outros fatores
numa configuração favorável ao desenvolvimento da doença.
Geralmente, a causa suficiente abrange um conjunto de componentes (fatores de
risco), não sendo necessário identificá-los na totalidade para implementar medidas efetivas
de prevenção, uma vez que a eliminação de um deles pode interferir na ação dos demais,
naquilo que denominamos configuração favorável, e, portanto, evitar a doença.
A partir desses pressupostos, em epidemiologia pode-se definir como causa uma
multiplicidade de condições propícias que, reunidas em configurações adequadas,
aumentam a probabilidade (ou risco) de ocorrência de determinada doença ou evento
adverso à saúde.
Com alguma freqüência podemos identificar diferentes fatores de risco para uma
mesma doença, o que pressupõe a existência de uma rede de fatores ligados à causalidade.
A força de cada fator como determinante do agravo, pode ser variável. Da mesma forma,
existem fatores de risco associados a mais de uma doença.
Como exemplos podemos citar:
 A doença coronariana, que apresenta diferentes fatores de risco, entre eles o
estresse, o hábito do tabagismo, a hipertensão arterial, a vida sedentária, hábitos
alimentares;
 O tabagismo pode constituir fator de risco para mais de uma doença, o câncer
de pulmão e a doença coronariana.

História natural da doença e níveis de prevenção

História natural da doença é o modelo descritivo elaborado através das informações


capazes de explicar como e por que determinados eventos acontecem e participam do
processo de doença passando pela resposta do homem ao estímulo, até as alterações que
levam a um defeito, invalidez, recuperação ou morte.
Tríade epidemiológica

Agente: Todas as substâncias, elementos ou forças, animadas ou inanimadas, cuja


presença ou ausência pode, mediante contato efetivo com um hospedeiro suscetível,
constituir estímulo para iniciar ou perpetuar um processo doença (biológico, físico, químico e
nutricional).
Hospedeiro: organismos passíveis de abrigar ou sofrer influências dos fatores
causais capazes de provocar agravos à sua saúde (idade, sexo, estado civil, ocupação,
escolaridade, características genéticas, histórico patológico, estado imunológico e estado
emocional).
Ambiente: Podem ser biológicos, nutricionais, físicos, químicos, mecânicos ou psico-
sociais (determinantes físico-químicos como temperatura, umidade, poluição, acidentes;
determinantes biológicos como acidentes, infecções e determinantes sociais como
comportamentos, organização social).
Incidência: A incidência expressa a freqüência de casos novos de uma enfermidade
em um determinado espaço de tempo, dando a idéia dinâmica do desenvolvimento do
fenômeno.
Prevalência: Expressa a freqüência de casos (novos e antigos) de uma enfermidade
em um momento determinado.
Período de incubação: Período durante o qual ocorre a instalação, e eventual
multiplicação dos agentes etiológicos no hospedeiro, sem que seja verificada sintomatologia
da doença (doenças transmissíveis).
Relacionamento Harmônico: evolução inaparente ou subclínica
Relacionamento Desarmônico: incompatibilidade entre o hospedeiro e o parasita,
forma aparente da doença.
A evolução da doença pode ser:
Convalescença: recuperação total ou parcial do hospedeiro.
Cronicidade: quase sempre prejudicial ao hospedeiro.

Período de pré-patogênese

O primeiro período da história natural é a própria evolução das inter-relações


dinâmicas, que envolvem, de um lado, os condicionantes sociais e ambientais e, do outro, os
fatores próprios do suscetível, até que chegue a uma configuração favorável à instalação da
doença. É também a descrição desta evolução. Envolve como já as inter-relações entre os
agentes etiológicos da doença, o suscetível e outros fatores ambientais que estimulam o
desenvolvimento da enfermidade e as condições sócio-econômico-culturais que permitem a
existência desses fatores.
As pré-condições que condicionam a produção de doença, seja em indivíduos, seja
em coletividades humanas, estão de tal forma interligadas e, na sua tessitura, são tão
interdependentes, que seu conjunto forma uma estrutura reconhecida pela denominação de
estrutura epidemiológica. Por estrutura epidemiológica, que tem funcionamento sistêmico,
entende-se o conjunto formado pelos fatores vinculados ao suscetível e ao ambiente,
incluindo aí o agente etiológico conjunto este dotado de uma organização interna que define
as suas interações e também é responsável pela produção da doença. É, na realidade, um
sistema epidemiológico. Cada vez que um dos componentes sofrer alguma alteração, está
repercutirá, e atingirá os demais, num processo em que o sistema busca novo equilíbrio. Um
novo equilíbrio trará consigo uma maior ou menor incidência de doenças, modificações na
variação cíclica e no seu caráter, epidêmico ou endêmico.

Período de patogênese

A história natural da doença tem seguimento com a sua implantação e evolução no


homem. É o período da patogênese. Este período se inicia com as primeiras ações que os
agentes patogênicos exercem sobre o ser afetado. Seguem-se as perturbações bioquímicas
em nível celular, continuam com as perturbações na forma e na função, evoluindo para
defeitos permanentes, cronicidade, morte ou cura.

Níveis de prevenção

Classicamente, a história natural da doença vai desde as primeiras manifestações


até o êxito (cura, seqüelas, morte, cronificação), incluindo todos os sintomas. Clark & Leavell
ampliaram esse conceito. A partir disso, a história natural da doença é dividida em período
pré-patogênico e patogênico. É no pré-patogênico que surgem as principais idéias sobre a
prevenção da doença. O período pré-patogênico é composto de fatores chamados de
estrutura epidemiológica que se relacionam ao agente, aos hospedeiros e ao ambiente. Pelo
ambiente se entende: o físico, o social e o biológico. O agente é classificado em: físico,
químico, biológico e psicológico. Quanto ao hospedeiro existe a susceptibilidade ou
resistência ao agente. Ainda incluímos imunodepressão, e as características individuais
como sexo, idade, grupo étnico, ocupação, renda e outros.
O período patogênico se caracteriza por: 1) início do reconhecimento clínico e 2)
doença avançada (morte, recuperação, incapacidade).
A tentativa de alterar o período pré-patogênico é realizar prevenção. Enquanto
que no período patogênico é tentar curar, tentar recuperar o estado de saúde.
Prevenção Primária: é a prevenção da ocorrência da doença. Por exemplo: as
vacinas, combate aos vetores. A prevenção primária pode ser dividida em promoção da
saúde e proteção específica. A promoção de saúde se refere a melhoria do padrão
alimentar, as boas condições de trabalho, habitação e vestuário, saneamento básico e
medida de melhoria das condições ambientais. Quanto a proteção específica são:
imunizações, saneamento básico, profilaxia medicamentosa, controle de vetores, higiene
pessoal, proteção contra agentes cancerígenos e proteção contra acidentes.
Prevenção Secundária: é a prevenção da evolução da doença. Ela compreende: 1)
diagnóstico precoce e tratamento imediato com exames médicos periódicos, tratamento
precoce, busca e exame de comunicantes, métodos educativos sobre a importância do
diagnostico precoce; 2) recuperação e limitação da incapacidade: tratamento adequado.
Prevenção Terciária: é a reabilitação da doença: provisão de recursos hospitalares e
comunitários para readestramento e educação visando ao máximo o aproveitamento da
capacidade remanescente, educação do público e das indústrias para utilização de
reabilitação.
Leavell & Clark (1976) colocam cinco procedimentos da promoção de saúde: bom
padrão procedimentos nutricional; atendimento das necessidades para desenvolvimento
ótimo da personalidade; educação sexual e aconselhamento pré-nupcial; moradia adequada;
recreação e condições agradáveis no lar e no trabalho, além de orientação sanitária em
exames periódicos.

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