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Cantigas de Amigo

As cantigas de amigo possuem um carácter tradicional popular e são de


origem galaico-portuguesa. Trata-se, pois, de uma poesia sincera e afectiva,
cujo ambiente é rural e doméstico: o campo, o lavadouro, a fonte, a romaria, a
praia, o baile, o rio, etc.
O emissor destas cantigas é uma rapariga jovem e solteira, a donzela,
que dedica os seus sentimentos ao namorado, o amigo. Estabelece-se um
plano de igualdade no relacionamento entre ambos, donde brota um
sentimento amoroso espontâneo e verdadeiro.
As danças primaveris tradicionais; a saudade provocada pela ausência do
namorado (que se demora na guerra ou que a trocou por outra mulher); a
donzela que vai ao rio lavar os cabelos ou a roupa, na esperança de ver o
amigo; a natureza, a(s) amiga(s); a(s) irmã(s) ou a mãe como confidente(s) da
donzela; a alegria de amar e ser amada, são, entre outros, os temas versados
pelas cantigas de amigo.
Este tipo de cantigas são classificadas, segundo os seus temas e
ambientes, em bailadas ou bailias, cantigas de romaria, marinhas ou
barcarolas, albas ou alvoradas (pouco cultivadas entre nós) e pastorelas.
As pastorelas, embora surjam aqui inseridas nas cantigas de amigo,
apresentam igualmente características das cantigas de amor, pois, apesar do
seu ambiente rústico, a verdade é que são imbuídas do artificialismo formal
próprio das cantigas de amor.
As cantigas de amigo ora se apresentam sob a forma de um diálogo, em
que a donzela se dirige à natureza, à(s) amiga(s), à(s) irmã(s) ou à mãe para
lhes falar do amigo; ora são monólogos em que a moça exprime os seus
sentimentos pelo namorado.
A nível da estrutura formal, estas cantigas são muito simples,
caracterizando-se essencialmente pelo refrão e pelo paralelismo perfeito.
Este consiste na repetição do 2º verso da 1ª copla, no 1º verso da 3ª copla; do
2º verso da 2ª copla, no 1º verso da 4ª copla; e assim sucessivamente, como
se pode ver no exemplo a seguir:

Ondas do mar de Vigo, Se vistes meu amigo,


se vistes meu amigo! o por que eu suspiro!
e, ai Deus, se verrá çedo! e, ai Deus, se verrá çedo!

Ondas do mar levado, Se vistes meu amado,


se vistes meu amado! por que ei gran cuidado!
e, ai Deus, se verrá çedo! e, ai Deus, se verrá çedo!

Martim Codax (CV 884 / CBN 1278)

Saliente-se, ainda, o processo de leixa-prem que consistia em repetir, no


início de uma nova estrofe, todo ou parte do último verso da estrofe anterior.
O simbolismo nas Cantigas de Amigo
Água – As significações simbólicas da água podem reduzir-se a três
temas dominantes: fonte de vida, meio de purificação, centro de
regenerescência. Estes três temas encontram-se nas tradições mais antigas e
formam as combinações imaginárias mais díspares, ao mesmo tempo que mais
coerentes.
As águas, massa indiferenciada, representam a infinidade dos possíveis,
contêm todo o virtual, o informal, o germe dos germes, todas as promessas de
desenvolvimento, mas também todas as ameaças de reabsorção.

Cabelos – Pensa-se que os cabelos mantêm, tal como as unhas e os


membros de um ser humano, relações íntimas com este ser, mesmo depois de
separados. Simbolizam as suas propriedades ao concentrarem espiritualmente
as suas virtudes: estão unidas a ele por uma ligação de simpatia. Daí o culto
das relíquias dos santos e principalmente de uma mecha dos seus cabelos,
culto que não compreende não só um acto de veneração, mas também um
desejo de participação nas suas próprias virtudes. Daí o hábito, em muitas
famílias, de conservar os caracóis e os primeiros dentes de leite. Estas práticas
significam mais do que a perpetuação de uma recordação, revelam como que
uma vontade de fazer sobreviver o estado da pessoa a quem pertenciam esses
cabelos.
Na cabeleira feminina, o facto de estar à mostra ou escondida, atada ou
desatada é frequentemente um sinal de disponibilidade, de entrega ou de
reserva da mulher.

Cervo – Pela sua alta cornadura, que se renova periodicamente, o cervo


é muitas vezes comparado à arvore da vida. Simboliza a fecundidade, os
ritmos de crescimento, os renascimentos.

Flor – Apesar de cada flor ter, pelo menos secundariamente, um símbolo


próprio, a flor, em geral, não deixa de ser um símbolo do princípio passivo. O
cálice da flor é, tal como a taça, o receptáculo da Actividade celeste, entre
cujos símbolos devemos citar a chuva e o orvalho. Além disso, o
desenvolvimento da flor a partir da terra e da água (lótus) simboliza o da
manifestação a partir desta mesma substância passiva.

Fonte – O simbolismo da fonte de água viva é expresso principalmente


pela nascente que jorra no meio dum jardim, ao pé da Árvore da Vida, no
centro do Paraíso terrestre, e que, seguidamente se divide em quatro rios que
correm em direcção ás quatro direcções do espaço. Esta é, segundo as
terminologias, a fonte da vida, ou da imortalidade, ou ainda, a fonte do
ensinamento. É uma tradição constante dizer que a fonte da juventude nasce
ao pé de uma árvore. Pelas sua águas sempre novas, a fonte simboliza, não a
imortalidade, mas sim o perpétuo rejuvenescimento. As bebidas divinas ou
sacrificiais (ambrosia, soma, hidromel), são fontes de juventude. Quem delas
bebe ultrapassa os limites da condição temporal e obtém, assim, graças a uma
juventude sempre renovada, a longevidade que, por sua vez, produz o elixir da
vida dos alquimistas.
Vento - O simbolismo do vento tem vários aspectos. É, por causa da
agitação que o caracteriza, um símbolo de vaidade, de instabilidade, de
inconstância. É uma força elementar que pertence aos Titãs: é o que basta
para dizer da sua violência e da sua cegueira.
O vento é entendido como um ser fecundador das éguas, daí a velocidade
dos potros nascidos desta união.

Assunto – O simbolismo nas Cantigas de Amigo


Data de Realização – 2/1/02
Bibliografia – CHEVALIER, Jean e GHEERBRANT, Alain, Dicionário dos
Símbolos, Editorial Teorema, 1982, Paris

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