Você está na página 1de 59

Noções Fundamentais de Direito

Diário da República: https://dre.pt/sug/1s/diplomas.asp

Código de Processo Civil:


http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=1959&tabela=leis

Aula 5

Relações entre Estado e Direito.

Estado → sociedade politicamente organizada, fixa em determinado território que lhe


é privativo e tem como características a soberania (poder do Estado) e independência.
Nação politicamente organizada.

O exercício do poder pelo Estado implica a definição de uma ordem jurídica e


constitucional que estabeleça um conjunto de competências para o Estado. Essas
competências deram origem às suas funções jurídicas e não jurídicas.

Nas funções jurídicas inserem-se a Legislativa, a Executiva e a Judicial.


A função Legislativa permite a construção de uma ordem jurídica (Direito), ou seja, um
conjunto de normas jurídicas constituídas pelas leis constitucionais e pelas leis
ordinárias (que têm que respeitar as primeiras). Esta é desempenhada pelos órgãos
legislativos que são então aquelas que possuem competência para formular leis.
A função Executiva prende-se com a concretização das leis e execução das resoluções
tomadas pela Administração Pública. Esta é executada pelo Governo.
A função Judicial consiste na administração da justiça de acordo com a lei, sendo
desempenhada pelos tribunais. Estes órgãos asseguram a defesa dos direitos dos
cidadãos, reprimem a violação da legalidade e resolvem os conflitos de interesses
públicos e privados.

O sistema de normas que regulam a vida em sociedade é, então, ditado por órgãos
com poder jurídico legislativo que pertencem ao Estado e aplicado pelos órgãos com
poder executivo e judicial. As entidades do Estado português que têm poder legislativo
para fazer leis são: a Assembleia da República e o Governo. O Tribunal Constitucional
não tem poder legislativo pois não emite leis, tem poder jurídico (?) sendo a sua
função a de conferir, ou não, constitucionalidade conforme estas estejam, ou não, de
acordo com a Constituição da República Portuguesa. Este órgão serve então para aferir
se as leis são aplicáveis e em que termos. As leis ordinárias têm sempre que respeitar
as leis constitucionais. Os tribunais têm poder jurídico judicial porque atuam mediante
o incumprimento da lei.

Artigo 204º (Constituição)


Apreciação da Inconstitucionalidade: nos feitos submetidos a julgamento, os tribunais
Mas,
nãonem todo
podem o Direito
aplicar se resume
normas a leis.o disposto na Constituição ou os princípios nela
que infrinjam
consignados.
1
Noções Fundamentais de Direito

Direito não pode confundir-se com Estado ou órgãos legislativos pois o que existe é
uma relação entre eles uma vez que, o Estado é regulado pelo Direito que ele próprio
define na medida em que formula e aprova as leis. Exemplos: é o Direito que define os
órgãos de soberania, quais as suas competências, como são eleitos, ect. Todas as
normas sobre o funcionamento do Estado estão escritas na Constituição da República
(aprovada em 1976 mas já alvo de algumas revisões).
O Direito define então o que é o Estado e como funciona, assumindo o papel de o
legitimar e condicionar, tendo o Estado que obedecer a todas as normas sendo assim
limitado por algo que ele próprio define. O Estado é também condicionado por ele
próprio e por outros Estados (Direito Internacional). Independentemente de estar ou
não condicionado pelo Direito, há que saber se o Estado tem monopólio de detenção
do Direito, ou seja, todo o Direito é Estatual (ou seja, definido pelos órgão de
soberania do Estado)? NÃO.

Por exemplo, o Direito Internacional (Público) rege as relações entre Estados sendo
produto de acordos, tratados, organizações internacionais (como a UE) e não do
próprio Estado.

O Direito Internacional não é produto da actividade legislativa


Artigo 8º (Constituição)
portuguesa.

Relativamente à Soberania… Artigo 228º (Constituição)


Existe Governo Regional das regiões autónomas da Madeira e dos Açores, no entanto,
estas não possuem soberania independente pelo que não são um Estado, são Governo
autónomos que têm que obedecer às normas do Estado português.

Existem também as Confederações de Estados (caso dos EUA) em que os estados


federados podem ter órgãos próprios mas obedecem ao Estado federal.
Quando os indivíduos se sentem parte integrante de uma comunidade adoptam as
suas normas como coercíveis como se fizessem parte do Direito mesmo que se tratem
apenas de normas sociais ou culturais.

Relação entre o Direito e o uso da força: Coação e Sanção.

Não se pode confundir Direito com uso da força, apesar de este recorrer ao uso da
força para se tornar eficaz (coercibilidade), usando então coações (imposições) e
sanções (punições). Contudo, não pode confundir-se com o uso da força pois esta,
enquanto regulada pelo Direito, pode ser considerada violência.

2
Noções Fundamentais de Direito

O sistema jurídico funciona mediante a existência da hetero-tutela dos direitos. Não


deve fazer-se justiça “pelas próprias mãos” pois o Direito possui normas que evitam
isso através das coações, na medida em que impede as pessoas de fazer algo, e das
sanções que consistem em castigar quem incumpriu uma norma. O Direito recorrer à
força para impor normas, no entanto, o seu intento é evitar o recurso ao uso da força
em determinados casos, para que a vida em sociedade se processe normalmente. Por
exemplo, “impede” que alguém mate outra pessoa só porque não está de acordo com
ela ou porque fez algo que a outra considera ofensivo. Assim, o Direito precisa da força
para ser aplicado mas não devem confundir-se.

Coercibilidade distingue-se de sanção pois a segunda é o castigo aplicado a quem não


cumpra uma norma enquanto que a primeira se refere à possibilidade de uso da força
para levar as pessoas a cumprir as normas, sendo então aplicada a sanção caso nas a
cumpram. Esta aplicação do “castigo” deve-se à coercibilidade sendo a sanção uma
consequência sua, ou seja, só há sanção porque existe coercibilidade por parte das
normas (obrigação ao seu cumprimento).

Aula 6

Direito Intra-estatual → regiões autónomas


Direito Supra-estatual → Direito Internacional, por ex: UE

Fins do Direito: Justiça e Segurança


Os fins do Direito não são o objectivo primeiro da sua existência pois esse é a
regulação da vida em sociedade através de normas coercíveis, aplicáveis e obrigatórias
para todos.
Justiça e Segurança, os fins do Direito, são objectivos que se pretende alcançar de
modo a assegurar que se cumpre o objectivo primordial que é regular a vida em
sociedade para que esta se processe com normalidade.

Por vezes o valor Justiça compromete o valor Segurança e vice-versa uma vez que se
pratica uma em detrimento da outra. Por exemplo, se uma pessoa for presa por matar
outra, consegue-se segurança no entanto não pode dizer-se que haja realmente
justiça. Deste modo, há que distinguir Justiça formal de Justiça material.

Justiça formal → refere -se à legalidade, ou seja, aplicação de uma sanção pelo
incumprimento da lei
Justiça material → refere-se a justiça moral, em termos da acção praticada (se uma
pessoa matasse devia ser morta também).

3
Noções Fundamentais de Direito

Assim, se um Tribunal resolve um caso de acordo com a lei que existe para a resolução
daquele caso, a decisão foi justa do ponto de vista jurídico, no entanto, a lei pode não
se traduzir numa solução absoluta não sendo suficientemente adequada para o caso e
sendo assim considerada injusta.

Artigo 13º (Constituição)


Princípio da Igualdade: segundo este princípio todos os cidadãos são iguais perante a lei, não
podendo tratar-se de forma diferente casos análogos nem de forma igual casos diferentes.

Igualdade não é tratar todos da mesma maneira, é sim “Não tratar de forma igual os
desiguais nem de forma igual os desiguais”. Ou seja, não aplicar um tratamento
discriminatório a casos análogos nem tratar de forma diferente casos idênticos, nas
mesmas circunstâncias. Por exemplo, os doentes mentais têm a mesma dignidade que
as outras pessoas no entanto, a lei não as pode tratar da mesma forma em caso de
incumprimento das normas devido à sua incapacidade. Doentes mentais, idosos e
crianças têm um tratamento diferente em certas circunstâncias.
Ninguém pode ser beneficiado ou prejudicado devido a factores como a raça, etnia,
religião, etc. para se evitar a discriminação. Mas por exemplo, mulheres grávidas e a
amamentar não podem exercer certos trabalhos devido à presença de substâncias
físicas e químicas que as podem afetar e prejudicar a criança e isso está estabelecido
em leis.
Todos os cidadãos têm os mesmos direitos e deveres (supostamente) mas, por
exemplo, os estrangeiros não podem executar cargos como o de Primeiro Ministro, o
que é um fator de diferenciação entre indivíduos. Pode dizer-se que não há uma
completa igualdade, no entanto, o que importa são as circunstâncias e são essas que
definem se se age da mesma maneira ou não, dependendo dos casos. O Princípio da
Igualdade implica, então, o tratamento diferenciado em casos diferentes e um
tratamento semelhante em casos análogos.
No entanto, muitas vezes existe incompatibilidade de normas. Tem que haver uma
relação entre o que se faz e a lei aplicada como consequência pois não se pode atribuir
a mesma sanção a quem mata e a quem dá um murro noutra pessoa ou rouba um
carro.

Nota: Características das normas jurídicas: generalidade e abstração.

Artigo 119º (Constituição): Publicidade dos actos

O Princípio da Publicidade das Leis afirma que estas devem ser conhecidas por todos
os cidadãos. (As leis são publicadas no jornal online Diário da República)

4
Noções Fundamentais de Direito

É necessário que as normas sejam apresentadas de forma clara e preciza de modo a


que todos as percebam. Como as leis só são aplicáveis após a sua publicação no Diário
da República, pressupõe-se que as pessoas as conhecem, porém, a maior parte das
pessoas nem sabe que existe este jornal online. No entanto, o desconhecimento ou má
interpretação das leis não pode ser invocado como justificação do incumprimento das
normas pelo que em nada invalida a sanção.
Artigo 6º (Cód. Civil): a ignorância ou má interpretação das leis não justifica o seu
incumprimento nem isenta as pessoas das sanções nelas estabelecidas

Já o Princípio da Legalidade das Leis refere as condições em que esta se aplica como
por exemplo: as leis só podem aplicar-se depois de serem publicadas para
conhecimento dos cidadãos e só podem aplicar-se a casos futuros à sua
implementação, nunca anteriores.

Aula 7

Publicidade das leis


As pessoas devem conhecer as normas que têm q cumprir e pressupõe-se que o façam
pois o desconhecimento não justifica o ato nem invalida a sanção. Há mesmo leis
relativas à divulgação das normas que devem ser publicadas no Diário da República.
As leis não podem ser aplicadas no “futuro” na medida em que ainda não tinham sido
divulgadas quando a acção ocorreu. Assim, a lei só pode ser aplicada a actos futuros,
nunca a crimes já ocorridos mesmo que ainda não tivessem sido condenados. Por
exemplo, um determinado comportamento passa a ser considerado crime, só pode ser
condenado como tal após a implementação e divulgação da lei, nunca podendo
condenar-se tais actos ocorridos anteriormente. Os crimes só podem ser condenados
segundo leis passadas.

Relação entre Segurança Jurídica e a Justiça é uma relação difícil podendo, por vezes,
entrar em conflito pois mesmo que uma pessoa seja presa por matar ou torturar outra
cumpre-se a Segurança, no entanto, não podem dizer-se que haja Justiça.

Artigo 300º e seg. (Cód. Civil)


Problema da Prescrição (dos direitos) → extintiva e aquisitiva
A prescrição alcança todos os direitos subjetivos patrimoniais de caráter privado,
escapando-lhe aos efeitos aqueles direitos que se prendem imediatamente à
personalidade ou ao estado da pessoa.
Extintiva → é como se o individuo “perde-se” um direito mas o que realmente
perde é o poder de exercício jurídico do direito, por exemplo: uma pessoa deve

5
Noções Fundamentais de Direito

dinheiro a outra, durante um certo período de tempo o credor pode recorrer à


justiça para recuperar o dinheiro, passado esse tempo, perde o direito a recebê-lo e
o devedor já não é obrigado a pagá-lo.
Aquisitiva → contrariamente à prescrição extintiva, na prescrição aquisitiva o
individuo ganha o direito a algo que antes não tinha. Por exemplo, se alguém
durante muito tempo cuidar de um terreno que não é seu, ao fim de 20 anos (prazo
prescritivo) esse imóvel passa a ser efetivamente seu, se não houver manifestações
por parte do proprietário.
Decorrida a prescrição, caso esta não seja presuntiva (?), não se pode recorrer à Justiça
para recuperar o direito, é como se o perdêssemos efectivamente. Se uma pessoa
pagar o que deve por livre vontade, passada a prescrição, não pode depois invocar o
direito para reaver o dinheiro que já não tinha a obrigação de pagar. Também nestes
casos Justiça e Segurança chocam pois não é justo que quem deve não pague só
porque passaram uns anos.
Se uma pessoa agir durante uns tempos como se fosse dona de algo, ou seja, detivesse
a sua propriedade, passa efectivamente a deter esse direito. O prazo para imóveis é de
20anos e para bens móveis é de 6anos. Nestes casos, o direito de propriedade é
conferido pela Ordem Jurídica.

Prescrição ≠ Caducidade
A prescrição refere-se à perda de exercício jurídico do direito enquanto que a
caducidade se refere à perda do direito efectivamente, devido à passagem do tempo.

Invalidez/invalidade da venda
Se uma venda for efetuada apenas verbalmente, sem um documento escrito (contrato
de compra e venda) onde se registe tal transacção, a venda não é considerada valida
pelo que, quem vendeu pode acusar a outra pessoa de roubo.
Registo – prioridade no registo
Um registo (predial, civil, automóvel, ect), faz publicidade à situação jurídica em que se
encontra uma pessoa ou um bem. Existe uma prioridade registral em que o que vale é
o primeiro registo efetuado para o caso de haver vários indivíduos a requerer a posse
de algo, por exemplo, se 10 pessoas tiverem comprado o mesmo carro este pertence
ao que efectuou o registo em primeiro lugar mesmo que não tenha sido o primeiro a
pagar. Em caso de alteração o registo válido é o ultimo, por exemplo, uma pessoa que
se divorcie tem que alterar o seu estado civil.

Relações jurídicas e não jurídicas


Existem relações entre as pessoas que não são reguladas pelo Direito como a amizade
e o namoro, designando-se relações não jurídicas. No entanto, podem existir leis com

6
Noções Fundamentais de Direito

isso relacionadas como a violência doméstica que, enquanto crime, difere da violência
exercida sobre uma pessoa com a qual não se mantem ligação.
No caso do casamento já se trata de uma relação regulada pela lei pelo que se designa
relação jurídica, havendo o registo de diversas acções tomadas por parte dos cônjuges
e leis que regulam a sua relação por exemplo no que respeita à partilha de bens e da
situação económica.
A união de facto é um caso especial que não pode ser considerado efectivamente uma
relação jurídica (pois o Direito não regula os intervenientes da relação) apesar de
existirem leis que regulam as acções dos sujeitos da relação face a terceiros ou no caso
da extinção da relação ou de um dos elementos (por separação ou morte). A união de
facto não é uma relação jurídica mas é uma situação jurídica que acarreta acções
jurídicas.
Relação jurídica (simples) → toda a relação da vida real que é regulada pelo
Direito e em que se atribui a uma pessoa um direito subjectivo – sujeito ativo –
e a outra a vinculação com um dever – sujeito passivo. Caso exista mais do que
uma pessoa numa das partes designa-se de relação jurídica complexa. Algumas
relações jurídicas estabelecem-se por um contrato, por exemplo, no caso de
compra e venda. Todo o contrato se refere a uma relação jurídica, no entanto,
nem todas as relações jurídicas se expressam por um contrato, por exemplo o
casamento.
Relação jurídica s. → sujeito ativo e sujeito passivo
Uma relação jurídica é composta por 4 elementos: sujeitos, objectos, factos e
garantia.

Código Civil → Relações Jurídicas


 Das pessoas
o Singulares
o Coletivas
 Coisas (objectos)
 Factos jurídicos
 Exercício da tutela dos direitos (Garantia)

Direito e Vinculação
Entre Direito e vinculação existe uma relação causal pois todo o direito tem uma
vinculação subjacente e a cada vinculação corresponde um direito. Se uma pessoa
detém um direito subjectivo, existe uma vinculação para com outra pessoa.

7
Noções Fundamentais de Direito

Por exemplo, se um individuo comprar algo, tem o direito de receber e quem vende
tem o dever de entregar algo em troca do dinheiro, havendo direitos e vinculações
para ambas as partes. Nesta caso temos uma relação jurídica de compra e venda que
corresponde a uma transacção de algo entre indivíduos mediante o pagamento de um
preço. Nesta relação os sujeitos são o comprador e o vendedor, mas como ambos
detêm direitos e deveres não se pode definir qual deles é o ativo e o passivo.
Artigo 874º (Cód. Civil): Compra e
Venda

Aula 8

Parte I – Relação Jurídica


Artigo 66º / 157º e seg. (Cód. Civil)
Elementos da relação jurídica - Sujeitos
Nas relações jurídicas intervêm, pelo menos, dois sujeitos pois para haver uma relação
tem que haver sujeitos. Deste modo, o Direito regula não só os sujeitos enquanto
cidadãos e pessoas individuais mas também as suas interações com os outros
indivíduos.
A palavra “sujeito” obtém diferentes significados conforme se apresente com sentido
comum ou sentido jurídico. No sentido comum, sujeito é um qualquer indivíduo; já no
sentido jurídico sujeito pode ser um indivíduo ou um grupo de indivíduos, ou seja, uma
organização. Pelo Direito ambos são considerados pessoas, com a distinção das
pessoas corresponderem a pessoas simples e as organizações a pessoas colectivas. Um
sujeito é então toda e qualquer entidade a que o Direito atribui personalidade
jurídica.

Capacidade Jurídica
A capacidade jurídica corresponde à possibilidade de se recorrer à Justiça para fazer
valer os direitos. Pode ser avaliada pela quantidade de direitos e vinculações que o
individuo pode deter designando-se capacidade de gozo. Esta refere-se então à
quantidade de direitos e deveres que a pessoa pode exercer de forma pessoal e livre
ou através de alguém por si designado, ou seja, um representante. Existem direitos
que não podem ser exercidos pela própria pessoa tendo mesmo de ser uma entidade
competente a responsabilizar-se pela sua prossecução. Os sujeitos podem ter, ou não,
capacidade de exercício jurídico e esta pode ser mais ou menos limitada conforme o
direito/vinculação de que se trata. Pode ter-se uma grande capacidade de gozo e uma
reduzida capacidade de exercício.
Pode também dizer-se que a capacidade jurídica corresponde à possibilidade de ser
sujeito de relações jurídicas. Esta não é igual ao longo de toda a vida, por exemplo, o
8
Noções Fundamentais de Direito

direito de voto só se adquire nãos 18 anos, e também não é igual para todas as
pessoas (como nos casos de incapacidade de exercício jurídico e o casos dos
estrangeiros que não podem exercer cargos políticos em Portugal).

Representação
Se uma pessoa não pode estar presente numa escritura de algo que lhe pertence pode
nomear outra pessoa para a representar e efetua uma procuração pois só assim se
considera a representação (voluntária) válida, uma vez que, este é o documento
através do qual alguém adquire direitos representativos. A representação voluntária
não é válida para todos os direitos e vinculações pois alguns só podem ser exercidos
pelo próprio indivíduo. No caso dos incapazes de exercício jurídico, a representação é
involuntária pois não é efetuada por sua escolha mas sim porque a lei assim o
estabelece.
Artigo 258º: Representação
Artigo 262º: Procuração (Cód. Civil)

Incapacidade
Existem também direitos e vinculações que não podem ser exercidos pela própria
pessoa de forma pessoal e livre o que, por vezes, não se prende com o próprio direito
ou vinculação mas sim com o estatuto do próprio indivíduo. É o caso dos menores,
interditos e inabilitados; estas pessoas designam-se incapazes do exercício jurídico
dos seus direitos e vinculações. Eles detêm personalidade e capacidade jurídica, só não
detêm capacidade de exercício.
No caso dos menores por serem menores; no caso dos interditos que se refere a
pessoas cegas, surdas, mudas ou com outro tipo de anomalia psíquica que as impeça
de reger a sua pessoa e o seu património; e por fim no caso dos inabilitados que são
pessoas que a lei nomeia como incapazes de governar só por si, ou seja de forma
autónoma, a sua pessoa e o seu património, por exemplo, um alcoólico. Nestes casos é
nomeado um representante legal (tutor) que, em primeira hipótese são os pais, caso
estes não estejam vivos ou presentes recorre-se a outra pessoa com ligação próxima.
Esse tutor representa o incapaz na sua atividade no plano jurídico. No caso dos
interditos representante revê todos os atos jurídicos em que a pessoa interfere.
Muitas vezes os pais deixam de ser apenas representantes parentais para serem
também representantes legais.
Interdição é para toda a vida, inabilitação pode não ser. Estas pessoas sofrem
restrições na sua vida jurídica pois a lei impede-as do exercício da sua capacidade
jurídica, no entanto, tenta suprir essa dificuldade concedendo esta tarefa a outras
pessoas. No caso dos menores quem fica responsável pelo exercício jurídico dos seus
direitos e vinculações são os pais, nos outros dois casos também se recorrer ao poder

9
Noções Fundamentais de Direito

parental em primeiro lugar mas caso este já não exista recorre-se a outra pessoa
próxima como o cônjuge.

Artigo 122º (Cód. Civil): incapacidade de menores

Artigo 138º (Cód. Civil): pessoas sujeitas a interdição

Artigo 152º (Cód. Civil): pessoas sujeitas a inabilitação

Pessoas Singulares (Cod. Civil, pág 22) Artigo 66º e seg. (Cód. Civil)

No caso das pessoas singulares, ou seja, dos indivíduos propriamente ditos, a


personalidade jurídica adquire-se no momento do nascimento completo e com vida.
No então, existem leis que protegem os direitos dos fetos apesar de estes ainda não
terem nascido e por isso não os possuírem efectivamente visto que não possuem
personalidade jurídica. Por exemplo, o aborto é considerado crime por se tirar a vida a
um ser humano em gestação. Já é permitido em certas circunstâncias mas noutras
continua a ser punível pelo que o Direito protege o direito à vida do feto.
A lei protege os direitos dos seres nascituros (que ainda não nasceram) que podem
ser:
o Em sentido restrito: o ser ainda não nasceu mas já está concebido
o Concepturo: existe a possibilidade de vir a ser gerado mas não a certeza

Os direitos dos nascituros dependem do seu nascimento.


Se este nascer com vida e morrer, obtém personalidade jurídica e os seus direitos
jurídicos pelo que, depois da sua morte, as heranças passam para os pais. Se este não
chegar a nascer com vida os direitos nunca chegam a ser do nascituro pelo que não
podem ser passados a outra pessoa, sendo entregues ao Estado. Por exemplo, no caso
de ser deixada uma herança a um neto que não se sabe se vai ser gerado ou não.

A personalidade jurídica das pessoas singulares cessa com a morte. Artigo 68º (Cód. Civil)
Já a das pessoas colectivas, ou seja, das organizações corresponde ao seu
encerramento ou extinção, em nada se relacionando com a personalidade jurídica dos
indivíduos que a compõem. Artigo 2033º (Cod. Civil) : Capacidade Sucessória

Outro caso em que se parece ir contra o pressuposto de que as pessoas só possuem


personalidade jurídica e direitos enquanto estão vivas é o facto de a lei proteger o
direito de respeito à memória de um falecido, considerando crime qualquer ofensa
que lhe seja feita.

10
Noções Fundamentais de Direito

Pessoas Coletivas (Cod. Civil, pág 35)


São consideradas pessoas colectivas as organizações que satisfaçam interesses
colectivos pelo que lhes é atribuída personalidade jurídica, direitos e vinculações.
Neste ramo inserem-se as associações, sociedades (civis, comerciais, etc) e fundações.
Os direitos e vinculações da organização não se aplicam aos seus membros, sendo a
personalidade jurídica da pessoa colectiva independente da personalidade jurídica das
pessoas singulares que a compõem. Direitos e vinculações das organizações diferem
consoante o objectivo a que esta se dedica. Só se se destinar a satisfazer interesses
colectivos é que se torna pessoa colectiva com personalidade jurídica.
O ato de constituição da organização define os aspectos da mesma. Artigo 167º (Cód. Civil)

Os direitos e vinculações de uma pessoa colectiva estão necessariamente relacionados


com a prossecução dos seus fins e apenas abrangem actos necessários e convenientes
à sua prossecução. Por exemplo: uma imobiliária não pode envolver-se no comércio de
sapatos pois cada organização só pode envolver-se em actividades que contribuam,
direta ou indiretamente, para a prossecução do seu objectivo. Os direitos e
vinculações de uma pessoa colectiva são exercidos pelos seus órgãos sociais ou pela
pessoa por eles responsável, ou seja, o titular.
Artigo 160º (Cód. Civil):
Princípio da Especialidade
Aula 10

 A) Personalidade Jurídica
 B) Capacidade Jurídica
 C) Esfera Jurídica
 D) Incapacidades Jurídicas
 E) Ilegitimidades Jurídicas

A) Personalidade Jurídica → aquisição (com o nascimento completo e com vida) e


perda (através da morte, nas pessoas singulares, e encerramento nas pessoas
coletivas)
Apesar da personalidade jurídica só ser adquirida no momento do nascimento
completo e com vida e cessar com a morte do indivíduo, existem leis que contrariam
um pouco este pressuposto como a Proteção da vida intra-uterina e a Proteção dos
direitos de personalidade depois da morte, uma protege um individuo que ainda não
nasceu e, como tal, ainda não tem direitos, e a outra protege a memória do falecido
que já não possui direitos.

11
Noções Fundamentais de Direito

Os sujeitos da relação jurídica são pessoas jurídicas. Diz-se sempre sujeitos da relação
pois esta pressupõe que existam, pelo menos, duas pessoas.

Para se ser pessoa jurídica é necessário ter personalidade jurídica que corresponde à
possibilidade de ter direitos e deveres. Não o têm apenas os indivíduos mas também
as organizações, desde que satisfaçam interesses colectivos. Dada a aquisição de
personalidade jurídica, põe-se a questão da capacidade jurídica.

B) Capacidade Jurídica → de gozo e de exercício



Corresponde à possibilidade de se recorrer à Justiça para fazer valer os direitos e
vinculações de outros. Pode ser avaliada em termos de quantidade e de possibilidade
de ser exercida.
Esta pode ser limitada ou retirada pela lei, surgindo assim os Incapazes de exercício
jurídico.

Direitos subjectivos e vinculações (deveres)

1. Direitos subjectivos:
I. Patrimoniais / pessoais
II. De conteúdo egoísta / altruísta
III. Absolutos / relativos
IV. Transmissíveis / intransmissíveis
V. Subjetivos em sentido restrito / potestativos

2. Vinculações:
i. Dever ou obrigação
ii. Estado de sujeição

1.1 Tipos de Direitos


O que é um direito subjectivo? É o poder ou faculdade atribuída a uma pessoa
para a realização de um interesse próprio ou alheio. Os direitos do homem e da
criança são comuns a todos. Alguns direitos diferem de umas pessoas para outras,
dai se dizer que são subjectivos pois diferem de pessoa para pessoa.

I. Um direito subjectivo é patrimonial se é avaliável em dinheiro; caso contrário,


diz-se que é pessoal, não podendo ser os dois ao mesmo tempo;
II. Consoante o interesse que está subjacente ao direito seja da própria pessoa
ou de outra, este é de conteúdo egoísta ou altruísta, respectivamente;

12
Noções Fundamentais de Direito

III. O direito será absoluto se for opunível por todas as pessoas e relativo se for
opunível apenas por parte de algumas pessoas;
IV. Se o direito for passível de ser transmitido, sob o ponto de vista jurídico, a
outras pessoas, em vida ou morte, é transmissível; caso contrário é
intransmissível. Não se considera transmissível um direito que com a morte se
inicia noutra pessoa se este não passar como se fosse herança.
V. Um direito subjectivo em sentido restrito corresponde ao poder ou faculdade
de se exigir ou esperar de outrem um comportamento, um direito subjetivo
potestativo é mais que isso, corresponde ao poder ao faculdade da pessoa,
por manifestação da vontade, produzir efeitos na esfera jurídica de outro
individuo que está submetido/sujeito às alterações que a primeira pode criar
na sua esfera jurídica. Ou seja, a pessoa manifesta a sua vontade e essa
manifestação afeta a esfera jurídica de outra pessoa não podendo esta opor-
se a tal manifestação. Nota: potestativo deriva do latim potestas que significa
poder.
O direito subjectivo em sentido restrito associa-se a vinculações de dever ou obrigação
da outra pessoa a adoptar os comportamentos que a primeira espera (por ex: uma
pessoa vende algo e espera que a outra pague, sendo esta obrigada a isso).
Já o direito subjectivo potestativo associa-se a vinculações relativas a estados de
sujeição.
Um direito é transmissível ou intransmissível consoante possa ser transmitido, sob o
ponto de vista jurídico, a outras pessoas ou não. Na generalidade, os direitos
patrimoniais são transmissíveis e os pessoais intransmissíveis, no entanto, existem
direitos patrimoniais que se extinguem com a morte tornando-se intransmissíveis. Por
ex: o direito de propriedade e de usufruto – uma pessoa doa algo a alguém, mas
restringe o seu usufruto a si mesmo, ou seja, o bem é da outra pessoa mas quem a usa
até à morte, ou até ao período estabelecido, é o sujeito que a doou; este direito ao
usufruto é intransmissível, no entanto, quando a pessoa morrer, o direito extingue-se
para ela e “nasce” para outro, neste caso, o novo dono. Outro exemplo: uma pessoa
adquire o diploma da sua licenciatura, este é um direito instransmissivel porque se
extingue com a morte, não podendo ser passado a outra pessoa.
As classificação dos direitos só é compatível no plano vertical, não o sendo no
horizontal, isto é, um direito pode ser pessoal, subjectivo em sentido restrito e relativo
mas não pode ser pessoal e patrimonial ao mesmo tempo.

C) Esfera Jurídica → conjunto dos direitos e deveres que a pessoa jurídica detém
Esfera jurídica patrimonial: conjunto dos direitos e deveres da pessoa jurídica que
podem ser avaliados em dinheiro.

13
Noções Fundamentais de Direito

Esfera jurídica pessoal: conjunto dos direitos e deveres da pessoa jurídica que não
podem ser avaliados em dinheiro.
Nota: Património → insolvente e (?)
Insolvência (falência) é quando o Passivo > Ativo e já não se consegue recorrer ao
crédito para solver o Passivo. Este caso pode levar a Incapacidade acidental
(momentânea) pois é retirado ao insolvente o direito de acesso ao crédito, para
proteger os credores, devido à sua condição financeira.

D) Incapacidade Jurídica (de exercício) → só se coloca a pessoas singulares e resulta da


menoridade, interdição, inabilitação ou imposição pela lei. É quando a pessoa detém
personalidade jurídica e como tal, possui direitos e vinculações, no entanto, não os
pode exercer por si própria devido à sua condição física e psíquica (menores e
interditos) ou porque a lei assim o determina (caso dos inabilitados, insolventes e
casados), sendo nomeado um representante. No caso de serem os pais é
representação parental (a que se recorre em primeiro caso) no caso de não poderem
ser estes, recorre-se à tutela em que um tutor, ou seja, um representante legal é
escolhido pela pessoa ou definido pela lei. Quem detém poder de representação,
atribuída pela lei, assume a tarefa de exercer os direitos e deveres do representado.
A capacidade de exercício é definida pela lei, podendo ser limitada ou retirada. Assim
surgem os incapazes de exercício jurídico onde se inserem os menos, interditos,
inabilitados, insolventes, entre outros. A incapacidade de exercício serve para direitos
e também para vinculações, por exemplo, as crianças não podem exercer os seus
deveres tendo que ser os pais.
Inabilitados → não conseguem reger o seu património
Interditos → não conseguem reger o património nem a própria pessoa

Incapacidade acidental: é momentânea e deve-se ao facto de a


Artigo 257º (Cód. Civil)
pessoa não estar em condições físicas e/ou psíquicas para atuar
Incapacidade acidental
no plano jurídico, por si própria.
A incapacidade acidental difere da inabilitação porque enquanto a primeira é
momentânea, a segunda apresenta um carácter duradouro ou vitalício.
Há que distinguir incapacidade de ação e ilegitimidade de acção. No primeiro caso, a
pessoa não pode exercer os seus direitos e deveres por si própria devido às suas
condições, já no segundo, não pode exercer porque seria considerado ilegal. Assim,
existem pessoas com incapacidade de ação (já vimos quais são) e pessoas com
ilegitimidade de ação, por exemplo, os casados não podem casar-se outra vez e não
podem realizar atos jurídicos sem o consentimento do cônjuge, caso isto aconteça o
ato jurídico é anulado. O casamento impede as pessoas de atuarem livremente no
plano jurídico pelo que origina casos de ilegitimidade jurídica (não de incapacidade).

14
Noções Fundamentais de Direito

Existem ilegitimidades matrimoniais, as acima descritas, e existem também


ilegitimidades nupciais que correspondem à impedição de exercer casamento com
certas pessoas, por exemplo do mesmo sexo (em alguns países), com familiares
próximos, interditos ou menores. Fora do plano da incapacidade existem outros
factores que impedem as pessoas de exercer o casamento sendo esses os casos
considerados de ilegitimidade de ação, por exemplo, o facto de a pessoa já ser casada.

Aula 11

Direito → permite a realização de um interesse

Vinculação → dever ou estado de sujeição que permite a realização do interesse de


outrem
Uma vez que, a cada direito corresponde uma vinculação e vice-versa, os direitos
subjectivos em sentido restrito associam-se a dever ou obrigação enquanto que os
direitos potestativos correspondem, no lado das vinculações, ao estado de sujeição.

15
Noções Fundamentais de Direito

Mesmo que não se fale numa das partes, a partir de uma nós subentendemos a outra,
por ex: se uma pessoa tem o direito de vender algo subentende-se que a outra tem a
obrigação de pagar; se um empregado tem o dever de obediência é porque o
empregador tem o direito de dar ordens.

Classificação dos direitos subjectivos – exemplo: direito ao respeito e intimidade da


vida privada (dever – guardar reserva da vida privada dos outros)
 Pessoal (no entanto pode acarretar consequências patrimoniais como
indeminizações)
 Conteúdo egoísta – pois visa proteger um interesse da própria pessoa
 Em sentido restrito – pois a pessoa tem o poder ou faculdade de exigir que os
outros respeitem a sua vida privada podendo então esperar este
comportamento por parte de outrem
 Absoluto – pois é opunível a toda e qualquer pessoa, pode fazer-se valer para
todas as pessoas
 Intransmissível – pois não passa de uma pessoa para outra nem em vida nem
com a morte (no entanto, todos os têm, nasce com a personalidade jurídica)

Compete aos pais administrarem os bens dos Artigo 1878º (Cód. Civil)
Conteúdo das responsabilidades parentais
menores
Os pais exercem os direitos que os filhos detêm (mas não podem administrar), sendo o
seu representante legal para que o direito seja concretizado. Também os representam
para execução dos seus deveres.
Caso os pais exerçam o direito ao crédito por parte dos filhos, pode classificar-se esse
direito como altruísta pois o interesse satisfeito é de outra pessoa (bebé) e não de
quem está a exercer o direito (pais); pode também ser classificado como transmissível
pois há o direito de cessão de crédito. O direito do pai representar o filho é pessoal
apesar de envolver acções e consequências patrimoniais (avaliáveis em dinheiro).
Outro exemplo, supondo que uma pessoa já não quer arrendar a casa a outra com
quem tinha um contrato: neste caso trata-se de um direito patrimonial (pois é
avaliável em dinheiro) e potestativo, uma vez que consiste no poder ou faculdade,
mediante a manifestação de vontade, de produzir efeitos na esfera jurídica de outrem
(com quem se assinou o contrato).

Elementos da relação jurídica – Objeto


Sob o ponto de vista jurídico, objecto é aquilo a que a relação jurídica diz respeito,
aquilo sobre o qual a relação incide.

16
Noções Fundamentais de Direito

Por exemplo: A arrenda ou vende a casa a B – o objecto é o mesmo (a casa) o


conteúdo da relação é que varia pois este diz respeito ao conjunto de direitos e
vinculações implicados na relação jurídica e atribuídos a cada um dos sujeitos.

O objecto pode ser imediato ou mediato.


O objecto imediato corresponde ao binómio (conjunto) direito-vinculação que é
atribuído a cada sujeito da relação; é então o Conteúdo da relação jurídica.
O objecto mediato é o objecto propriamente dito sobre o qual incide a relação jurídica.
Pode então dizer-se que o objecto mediato é o objecto do objecto imediato
(conteúdo).
O que pode ser objecto (mediato) das relações jurídicas? R.: As coisas e as prestações.
O Direito estabelece uma noção de “coisas” e
classifica-as por exemplo em: móvel/imóvel, Artigo 202º e seg. (Cód. Civil)
Coisas
consumível/inconsumível, composto, acessório,
infungível…

As prestações são de algo mas constituem, por si mesmas, um objecto mediato.


Noção de Obrigação → vinculo jurídico por virtude do qual uma pessoa é
adstrito/obrigado para com outra pessoa à realização de uma prestação que pode ser,
de facto, positiva ou negativa.
O objecto de uma relação jurídica é então uma coisa ou a prestação de uma coisa.

Aula 12

Elementos da relação jurídica – Facto


Facto jurídico, enquanto elemento da relação jurídica, é todo o acontecimento ou
evento que tem por efeito fazer nascer uma relação jurídica. É então o elemento
genético ou formativo da relação jurídica porque é o que a faz nascer.
Pode ser natural ou produto da vontade humana, por ex: um incêndio e uma compra.
Facto Jurídico → é qualquer acontecimento natural ou produto da vontade humana
que produza efeitos jurídico, ou seja, tudo o que aconteça e tenha importância sob o
ponto de vista jurídico.

17
Noções Fundamentais de Direito

Quanto aos seus efeitos, os factos jurídicos podem ser considerados Constitutivos,
Modificativos ou Extintivos conforme produzam, modifiquem ou cessem/eliminem
uma relação jurídica, respectivamente. Os primeiros (genéticos) fazem nascer uma
relação jurídica, por exemplo, o casamento e todos os outros contratos (casamento é
um deles). Como exemplo dos segundos temos a Separaçao de pessoas e bens no
casamento, que altera o conteúdo (direitos e
vinculações) da relação. A morte e o divórcio Artigo 1677º (Cód. Civil)
Separação de pessoas e bens
servem de exemplo aos últimos.
Só os factos jurídicos são tidos como elemento da relação jurídica porque a criam; os
factos jurídicos modificativos e extintivos NÃO são tidos como elemento da relação
jurídica apesar de a modificarem e extinguirem.

Quanto à sua estrutura, podemos considerar puros factos jurídicos (ou factos jurídicos
em sentido restrito) e actos jurídicos, o que os distingue é o facto de nos segundos
haver intenção humana (querer).
No caso dos primeiros, os puros factos jurídicos que são acontecimentos
independentes do conhecer, querer e agir humanos, estes podem ser completamente
exteriores à pessoa ou pode ser esta a produzi-los sem conhecimento ou intenção,
sendo neste caso, interiores. Como exemplo dos puros factos jurídicos exteriores
temos um incêndio, um terramoto ou o caso de uma pessoa ter um terreno inserido
noutro que não lhe pertence e que tem de atravessar para chegar ao seu. Já como
exemplo de p.f.j. interior temos uma pessoa que pinta um quadro ou escreve um livro
sem intenção de o vender, só por gosto, no entanto, torna-se autora desse

18
Noções Fundamentais de Direito

quadro/livro sendo esse o efeito jurídico do seu ato (que tem relevância sob o ponto
de vista jurídico). Assim, as pessoas podem nem saber que estão a produzir efeitos
jurídicos ou até podem saber mas não ter intenção de produzi-los, no entanto, o
Direito considera que estes ocorrem e se produzem. É um ato voluntário, sim, na
medida em que a pessoa sabe o que está a fazer, mas involuntário no caso de produzir
efeitos jurídicos pois não é essa a sua intenção.
Já no caso dos segundos, os actos jurídicos que são actos destinados à produção de
efeitos jurídicos, temos os simples (também chamados declarações quase negociais) e
os negócios jurídicos, que podem por sua vez ser uni, bi ou plurilaterais. Negócios
jurídicos são facilmente associados a contratos, no entanto, estes apenas constituem
os bi ou plurilaterais.
1. No caso dos actos jurídicos enquanto negócios jurídicos unilaterais temos o
exemplo do testamento, em que não há intervenção de outras pessoas, é
apenas estabelecida a vontade de quem se manifesta, ou seja, só interfere uma
parte* na declaração negocial.
*Mas há negócios jurídicos unilaterais unipessoais e pluripessoais, isto porque
a única parte que interfere na declaração negocial pode ser constituída apenas
por uma ou por mais pessoas; por exemplo, nas pessoas colectivas
(organizações) as decisões são tomadas por mais do que uma pessoa, em
assembleia ou deliberação, no entanto, a parte interveniente é apenas uma, a
vida da organização.
2. Já os actos jurídicos enquanto negócios jurídicos bi ou plurilaterais são
contratos que se estabelecem entre 2 ou mais pessoas. ATENÇÃO: Só nestes é
que se inserem os contratos efectivamente ditos. Todos os contratos são
negócios jurídicos, no entanto, nem todos os negócios jurídicos são contratos
(pois estes so se inserem nos bi ou plurilaterais e existem ainda os unilaterais).

Os atos jurídico podem ser lícitos (legais) ou ilícitos (ilegais) conforme respeitem a lei e
as normas ou não, respectivamente. Os primeiros são permitidos pelo Direito e pela
lei, já os segundos são proibidos pela lei e punidos pela justiça jurídica. Podem ser
ilegais por tratarem actividades ilegais ou por até serem legais mas executados de
forma ilegal. Como exemplo de ato jurídico ilícito temos a venda de droga ou uma
pessoa mandar matar outra, tanto é condenada a pessoa que matou como quem
mandou.
De acordo com o seu objecto, o contrato pode ou não Artigo 286/9º (Cód. Civil)
ser anulado. Nulidade e anulação

Exemplo: O nascimento de uma criança, enquanto facto jurídico, relativamente ao seu


efeito é considerado um facto jurídico constitutivo pois é criada uma nova

19
Noções Fundamentais de Direito

personalidade jurídica e também uma relação parental/de filiação e de representação


com os pais; relativamente à sua estrutura, este é um puro facto jurídico pois acontece
por lei da natureza e não porque a criança teve intenção de nascer, se a gravidez foi
intencional é interior se não foi, por ex. por violação, é exterior.

Aquele que descobrir algo de valor escondido ou enterrado


torna-se dono de metade do achado, a outra metade pertence Artigo 1324º (Cód. Civil)
ao dono do terreno onde estava o achado, que pode ser a Tesouros
mesma pessoa ou não.
O sujeito A encontrou um tesouro, isto é um facto jurídico constitutivo caso o terreno
onde o encontrou na seja seu pois será criada uma relação com o dono do terreno a
quem pertence metade do achado. Se o dono do terreno for ele próprio não se cria
relação nenhuma pelo que não é um facto jurídico constitutivo. É um puro facto
jurídico exterior se a descoberta for feita por acaso ou interior se a procura foi
propositada/intencional.

Elementos da relação jurídica – Garantia


A propósito dos elementos da Relação Jurídica falta estuda a Garantia.
Numa relação jurídica a Garantia são os meios ou mecanismos que a ordem jurídica
coloca à disposição do sujeito ativo para este fazer valer o seu direito subjectivo.
Corresponde então aos meios coercíveis normais para fazer valer os direitos.
Há então que falar nos diversos meios que a ordem jurídica fornece para fazer valer os
direitos dos cidadãos.
No Código Civil a Garantia é tratada na parte “Tutela e Pág. 67 (Cód. Civil)
Tutela e exercício dos Direitos
Exercício dos direitos”.

Aula 13

Elementos da relação jurídica – Garantia


Garantia → possibilidade do recurso à força para assegurar a relação jurídica e o
exercício dos direitos subjectivos; meios de tutela jurídica para a defesa dos direitos e
interesses legítimos dos seus titulares.

A nível da garantia podem ser feitas duas divisões, uma tendo em conta quem atua
para a concretização dos direitos – se for a própria pessoa trata-se de Auto-tutela, se
forem as autoridades competentes trata-se de Hetero-tutela – e outra a nível dos
meios utilizados para concretizar os direitos – meios preventivos, compulsivos e
repressivos.

20
Noções Fundamentais de Direito

Divisão quanto a quem atua:


A auto-tutela é exercida pelo próprio titular do direito subjetivo correspondendo à
possibilidade excepcional de as pessoas fazerem valer os seus próprios direitos. Mas o
que ocorre normalmente é a hetero-tutela que consiste no recurso aos meios jurídicos
preventivos, compulsivos ou regressivos para assegurar a concretização dos direitos.
O Direito impede as pessoas de fazerem justiça “pelas próprias mãos”, salvo raras
excepções estudadas a seguir, estabelecendo que o procedimento a seguir é recorrer
aos meios do Estado para fazer valer os seus direitos.
Artigo 1º (Cód. Do Processo Civil): Proibição de autodefesa
A ninguém é lícito o recurso à força com o fim de realizar ou assegurar o próprio
direito, salvo nos casos e dentro dos limites declarados na lei.

A garantia caracteriza-se pela Regra da Hetero-tutela que afirma que, no geral, não é
lícito (legal) assegurar o próprio direito, devendo as pessoas recorrer às autoridades
competentes (policia, tribunais…). A hetero-tutela serve para garantir a igualdade de
tratamento, sendo a tutela o processo de organização da sanção.
O Estado tem de assegurar a todos os cidadãos o acesso
Artigo 20º (Constituição)
aos meios coercivos normais que permitem a realização
Acesso de todos aos tribunais…
dos direitos.

Divisão quanto ao tipo de meios utilizados:


Os meios preventivos destinam-se a prevenir e evitar a violação dos direitos de
outrem, correspondendo a intervenções das autoridades públicas para fiscalizar as
actividades e atuações das pessoas. Por ex: a polícia, a guarda florestal e a ASAE
desempenham actividades de fiscalização e condicionamento das actividades dos

21
Noções Fundamentais de Direito

particulares para evitar a violação das normas (mas também atuam perante a sua
violação ? ).
As Providências Cautelares são tomadas quando as pessoas temem que o seu
direito/interesse não seja realizado e pedem ao Tribunal que tome as providências
cautelares necessárias para eliminar as condições que impedem a realização do
direito/interesse e assim garantir que estes se efectuam.

Artigo 328º (Código do Processo Civil): Providências cautelares


Quando uma pessoa mostre fundado receio de que outrem, antes da propositura da acção
ou na pendência desta, cause lesão grave e de difícil reparação ao seu direito, pode
requerer, se ao caso não convier nenhum dos procedimentos especialmente regulados neste
capítulo, as providências que julgue adequadas para evitar a lesão, nomeadamente a
autorização para a prática de determinados actos, a intimação para que o réu se abstenha
de certa conduta ou a entrega dos bens, mobiliários ou imobiliários, que constituem objecto
da acção, a um terceiro, seu fiel depositário.

Os meios compulsivos atuam perante a violação cometida para evitar que esta se
prolongue no tempo, levando o infractor da norma a adoptar o comportamento
devido. Nestes inserem-se:

Artigo 428º (Cód.Civil): Excepção do não cumprimento do contrato


Artigo 754º (Cód.Civil): Direito de retenção
Artigo 810º (Cód.Civil): Cláusula Penal
Artigo 829º (Cód.Civil): Sanção Pecuniária Compulsória

A Excepção do não cumprimento do contrato estabelece que uma das partes do


cumpre com os seus deveres quando a outra cumprir com os seus, ou seja, num
contrato entre duas pessoas, se uma faltar com os seus deveres a outra só
desempenhará os seus quando a primeira também o fizer. Uma pessoa só cumpre a
sua parte quando a outra cumprir a dela, isto para forçar cada uma a cumprir com a
sua.
Relativamente ao Direito de retenção, temos como exemplo uma pessoa que leve o
carro à oficina, o dono da oficina pode reter o carro até a pessoa pagar o serviço, só
devendo entregá-lo depois do pagamento estar efetuado.
No caso de incumprimento de um contrato, as partes podem chegar a um acordo
através da Cláusula Penal em que fica estabelecido a sanção que se impõe à pessoa
caso volte a faltar com os seus deveres, por exemplo pagar uma coima ou
indemnização, o que faz com que esta os cumpra (para evitar a sanção).

22
Noções Fundamentais de Direito

A Sanção pecuniária compulsória é um valor que o devedor tem que pagar por casa dia
em que se atrase no pagamento de algo para o qual ficou estabelecido um prazo, se se
atrasar 5 dias paga o que deve mais o valor correspondente aos dias de atraso.

Os meios repressivos aplicam-se como sanção já após a violação do direito ou da


norma ter sido efetuada, para evitar a sua repetição. Temos o exemplo das Medidas de
Segurança que podem ser privativas da liberdade caso consistam na interdição do
exercício de certas atividades ou não privativas da liberdade caso consistam noutra
tipo de medidas que não afetem a liberdade de atuação do sujeito. A nível das
medidas de segurança privativas da liberdade temos o internamento de doentes e
institucionalização de menores uma vez que estes não podem ser punidos
judicialmente como as outras pessoas.

Relativamente aos meios reconstitutivos, estes destinam-se a repor o bem ou direito


lesado pois têm em vista proporcionar ao titular do direito lesado, na medida do
possível, uma satisfação equivalente à que o seu direito lhe proporcionara.
Na reconstituição natural, a pessoa que provocou o dano tem a
obrigação de repor para a situação em que estaria se o dano Artigo 562º (Cod. Civil)
não tivesse ocorrido, isto quer dizer que, tem que pagar o Obrigação de indemnização
arranjo do estrago que provocou e de outros estragos
posteriores que não aconteceriam se o primeiro dano não se tivesse verificado. No
caso das coisas fungíveis (facilmente substituíveis em quantidade e qualidade) repõe-
se a coisa efectivamente, no caso de se tratar de uma coisa infungível paga-se uma
indemnização. Por exemplo, uma pessoa agride outra, para além de pagar as contas do
hospital tem que pagar uma indemnização à pessoa relativa às dores e marcas que lhe
provocou, apesar de estas não serem avaliáveis em dinheiro.
No caso de o devedor não ter dinheiro para pagar a sua
divida ao credor, ser-lhe-ão penhorados os bens ou o Artigo 817º (Cod. Civil)
ordenado, sendo estes entregues directamente ao Realização coativa da prestação
credor sem hipótese de manifestação do devedor.

Em casos excepcionais, que resultem de um conjunto de determinadas condições, o


Direito permite o exercício da auto-tutela dos direitos e fazem parte dessas excepções:

Artigo 336º (Cód. Civil): Ação direta

Artigo 337º (Cód. Civil): Legitima defesa

Artigo 339º (Cód. Civil): (Lesão por) Estado de Necessidade

23
Noções Fundamentais de Direito

A Ação Direta diz respeito a casos em que o sujeito se encontra numa situação que lhe
é alheia e que o Direito trata de resolver, por ex: uma pessoa tem uma casa num
terreno que fica no interior de outro terreno que não lhe pertence; como a pessoa tem
que chegar a casa, o Direito prevê que haja uma forma de atravessar o terreno que
não lhe pertence, mesmo que o dono não o queira; imagine-se que o dono desse
terreno veda a passagem, a pessoa tem o direito de quebrar a vedação para poder
passar para casa, ato que noutras condições seria punido pelo Direito.

No caso da Legitima Defesa, a pessoa prevê que vai ocorrer o desrespeito ou violação
de um dos seus direitos/interesses e atua premeditadamente, por exemplo: uma
pessoa percebe que vai ser assaltada e por isso bate no assaltante para se defender e
evitar que este a roube.

Artigo 32º (Cód. Penal): Legitima defesa


Constitui legítima defesa o facto praticado como meio necessário para repelir a agressão
actual e ilícita de interesses juridicamente protegidos do agente ou de terceiro.

A diferença entre a Ação direta e a Legitima defesa é que no primeiro caso a lesão dos
direitos do sujeito já ocorreu enquanto que no segundo ainda não ocorreu mas este
prevê que vá ocorrer e por isso age.

O Estado de necessidade corresponde a uma situação em que a pessoa age e pode


violar os direitos ou interesses de outra mas essa lesão é menor do que os danos que
ocorreriam se esta não fizesse nada, isto é, a lesão causada é menor pelo que o sujeito
não é recriminado pelos seus atos, que noutras circunstâncias seriam puníveis, porque
a sua intenção era a de salvaguardar um bem maior. Por ex: deflagra um incêndio na
casa do sujeito A e este parte a vedação da casa do vizinho e pisa-lhe o jardim para
esticar uma mangueira para apagar o fogo; os danos causados na casa do vizinho não
são punidos pois a lesão seria muito maior se o sujeito não tivesse agido daquela
forma e apagado o fogo, considerando-se por isso que agiu em estado de necessidade.
Outro exemplo é um individuo roubar um carro para levar outra pessoa de urgência a
um hospital, o sujeito fez isto para salvaguardar um bem maior, neste caso a vida da
pessoa, pelo que, não é recriminado por atos que noutras circunstâncias seriam
puníveis.

Artigo 35º (Cód. Penal): Estado de necessidade desculpante


1 - Age sem culpa quem praticar um facto ilícito adequado a afastar um perigo actual, e
não removível de outro modo, que ameace a vida, a integridade física, a honra ou a
liberdade do agente ou de terceiro, quando não for razoável exigir-lhe, segundo as
circunstâncias do caso, comportamento diferente.
2 - Se o perigo ameaçar interesses jurídicos diferentes dos referidos no número anterior,
e se verificarem os restantes pressupostos ali mencionados, pode a pena ser
especialmente atenuada ou, excepcionalmente, o agente ser dispensado de pena.
24
Noções Fundamentais de Direito

Aula 15 e seguintes

Parte II – Fontes do Direito


(Primeira matéria abordada no Código Civil)

As fontes do Direito são todos os modos através dos quais o Direito se manifesta e
organizam-se em 5 categorias:
A. Lei
B. Costume
C. Jurisprudência
D. Doutrina
E. Princípios Fundamentais do Direito
De entre todas destaca-se a Lei, na qual vamos abordar o processo legislativo
(formação e implementação da lei) e a cessação da vigência da lei.
Todas estas são apontadas pela Doutrina Clássica como fontes do Direito, à excepção
dos Princípios Fundamentais do Direito que só alguns autores consideram.

As fontes do Direito podem ser classificadas segundo diversos critérios em:

As fontes imediatas possuem força vinculativa própria, valem só por sim (lei, costume
e princípios fundamentais do Direito); as mediatas não têm força vinculativa própria,
não criam normas mas regulam a forma como estas devem ser interpretadas e
implementadas (jurisprudência e doutrina).
As voluntárias traduzem a vontade, intuito ou propósito de criação ou revelação do
Direito, referindo-se a atitudes no sentido de criar normas jurídicas ou revelar o seu
conteúdo (lei, jurisprudência e doutrina); já as involuntárias não correspondem a essa
vontade, surgem de forma espontânea (por ex: o costume surge de forma espontânea
nas sociedades, não havendo uma atitude deliberada de transformar esse
comportamento numa norma ou de manifestar o Direito).
Nas formais inserem-se os factos aos quais o sistema jurídico impõe o efeito dessas
normas passarem a ser Direito Positivo vigente (textos legais, diplomas legais que
contêm as normas do Direito); já as materiais correspondem aos factores ou poderes
que levam à criação de normas, ou seja, as fontes materiais são a razão da criação das
fontes formais. (?)

25
Noções Fundamentais de Direito

As fontes do Direito podem ainda ser agrupadas de acordo com a função que
desempenham: a lei e o costume relacionam-se com a formação de normas enquanto
a jurisprudência e a doutrina regulam as formas como o Direito se manifesta.
Há ainda autores que classificam as fontes do Direito em: gerais/comuns e específicas,
internacionais ou internas.

A) Lei
A lei é decidida e imposta por uma autoridade que tem capacidade legislativa para o
fazer num sistema jurídico. Esta é a mais importante das fontes do Direito pois num
sentido geral, por lei entendem-se as normas que devem ser respeitadas por todos e,
no funcionamento do sistema jurídico, todos os subsistemas têm que obedecer às
leis/normas do sistema jurídico.
Contudo, o termo “lei” pode ser utilizado com diversos sentidos:
No sentido formal, lei associa-se ao diploma legal ou conjunto de normas que provêm
de um órgão estatual com competência legislativa; é o texto normativo ou outro tipo
de texto que tem em vista tornar-se lei.
No sentido material, para além de ser um diploma legal tem que conter 2 ou mais
normas jurídicas para ser considerado lei.
Em sentido latíssimo (muito amplo) lei é sinónimo de Direito; isto acontece nos
sistemas anglo-saxónicos, por ex. em inglês que “law” significa lei e Direito.
Em sentido lato lei é corresponde a uma disposição genérica provinda de um órgão
estatual competente.
Em sentido intermédio lei refere-se aos diplomas legais que não constituem
regulamentos, ou seja, as leis formuladas pela Assembleia da República, os decretos-lei
emitidos pelo Governo (com autorização da A.República) e os decretos regionais
emitidos pelas Assembleias Regionais (ver Artigo 112º da Constituição).
Em sentido restrito lei refere-se apenas aos diplomas legais provenientes da
Assembleia da República, sendo este o sentido empregue no Diário da República onde
são publicadas todas as leis e decretos-lei porque todos se devem reger.

Assim, certos “textos” legais podem não ser considerados lei num sentido e sê-lo
noutro (mais abrangente), por ex: um decreto regional não é lei em sentido restrito
mas é lei em sentido intermédio. E, dependendo do sentido, lei pode ou não ser
entendida como fonte do Direito.

Lei Nº _ → emitida pela Assembleia da República


Decreto-lei Nº _ → emitido pelo Governo (com autorização da AR)
Decreto Regional Nº _ → emitido pelas Assembleias Gerais

26
Noções Fundamentais de Direito

Hierarquia da Leis
O valor das leis não é todo igual, umas valem mais que outras. Entre os diplomas legais
existe uma hierarquia em que as leis de nível inferior têm que respeitar sempre as de
nível superior:

1. Em primeiro lugar encontra-se a Constituição da República cujas normas


comandam todas as outras (contem as leis constitucionais a que devem
subordinar-se as leis ordinárias);
2. Em segundo plano está o Direito Internacional que compreende os tratados e
convenções internacionais, o Direito Comunitário e o Direito Comum ou Geral;

3. Em terceiro lugar estão as Leis e Decretos-lei com uma importante nuance*:


as leis e os decretos-lei têm igual valor à excepção dos decretos-leis emitidos
pelo Governo com autorização legislativa da A.República que estão abaixo das
leis emitidas por esta (é o que acontece quando a AR
* Artigo 112º (Constituição)
formula leis de bases gerais e o Governo emite decretos-
Actos normativos
lei que especificam essa norma);
4. Em quarto encontram-se os decretos legislativos regionais emitidos pelas
Assembleias Regionais como as das Regiões Autónomas;
5. Em quinto estão os Decretos regulamentares;
6. Em sexto os Decretos Regulamentares Regionais;
7. Em sétimo as Resoluções da Assembleia da República;
8. E por ultimo, as portarias e despachos.

Nota: alguns autores não consideram os últimos quatro (a partir dos Decretos
Regulamentares) como leis, encaixando-os nos actos administrativos.

Sempre que há incompatibilidade entre leis prevalece a que tem maior valor
hierárquico e em caso de ambas terem a mesma força hierárquica, prevalece a mais
recente.

Quando a Assembleia da República concede autorização legislativa ao Governo para


emitir decretos-lei, essas autorização especifica qual é a matérias a tratar, em que
sentido, em que extensão e por quanto tempo; se estes aspectos não forem
respeitados, os decretos-leis tornam-se inconstitucionais.

Os tribunais não podem aplicar normas que não


respeitem o disposto na Constituição. Artigo 277º (Constituição)
Fiscalização da Inconstitucionalidade

27
Noções Fundamentais de Direito

O Direito Internacional faz parte integrante do Direito Português e assume grande


importância na ordem jurídica interna. Existem assim, um conjunto de normas que se
aplicam em Portugal mas que não dependem nem resultam dos órgãos legislativos
Portugueses e as normas formuladas por estes órgãos não podem contrariar o
disposto nas normas do Direito Internacional em que se
Artigo 8º (Constituição)
inserem por ex: normas da UE, ONU, Conselho da Europa,
Direito Internacional
entre outros.
Este disposto está regulado na Constituição, no Artigo 16º que afirma que as leis
devem obedecer tanto à Constituição como às normas do Direito Internacional e que
devem ser formuladas em harmonia com os Direitos do Homem (este “conjunto” de
direitos fundamentais integra o Direito Internacional uma vez
que foi formulado por uma Organização Internacional, a ONU). Artigo 16º (Constituição)
Direitos fundamentais

B) Costume
Esta foi uma fonte do Direito muito importante até ao sec.XVIII porque era através dos
costumes que as sociedades se organizavam. A partir dessa altura entrou em declínio
porque passaram a ser formuladas e implementadas normas.
O termo “costume” no âmbito jurídico adquire um significado diferente da sua
conotação corrente.
No sentido corrente do termo, costume refere-se a um comportamento que é hábito,
ou seja, que é repetido frequentemente pela generalidade das pessoas numa dada
comunidade. Este sentido apenas contem o elemento material designado “corpus”.
No âmbito jurídico, costume associa-se a comportamentos tidos como obrigatórios
pela generalidade da população mesmo não estando regulados com normas mas as
pessoas sabem qual é o comportamento a tomar, verificando-se um sentimento de
obrigação como se essa fosse a açao prevista sob o ponto de vista jurídico, por ex: as
pessoas sabem que têm que respeitar a ordem das senhas de espera e caso estas não
existam sabem que devem ser atendidas pela ordem de chegada apesar de não haver
nenhuma norma que estabeleça tal comportamento. As próprias pessoas reconhecem
legitimidade a uma regra que surge espontaneamente da vida em sociedade e das
relações sociais. Neste sentido para além do “corpus” está também presente o
elemento psicológico designado “animus” pois há uma perspectiva psicológica de
obrigatoriedade (consciência por parte das pessoas de que aquele é o comportamento
a tomar) e não apenas um comportamento físico que é repetido só porque é hábito.
Existe até o Direito Consuetudinário (nacional ou estrangeiro) que é o direito
resultante do costume (em latim consuetudine) e que assume relevância no sistema
jurídico sendo, por vezes, analisado pelos tribunais.

28
Noções Fundamentais de Direito

C) Jurisprudência
Esta fonte clássica do Direito é hoje questionada por muitos autores. Consiste no
conjunto das orientações seguidas pelos Tribunais e outros órgãos competentes para
interpretar e implementar a lei a casos concretos.
Assim, podemos falar de um tipo mais restringido, a Jurisprudencial Judicial, se apenas
tivermos em consideração as orientações e fundamentos por que se regem os
tribunais na interpretação e aplicação da lei no julgamento de casos concretos. Esta é
uma visão redutora porque, apesar de serem os mais importantes, os tribunais não são
os únicos órgãos que aplicam a lei.
Deste modo, o conceito de jurisprudência não se aplica só aos tribunais mas também a
outros órgãos com competência para interpretar e aplicar a lei como os notários,
conservadores do registo (civil, predial, automóvel...) e ainda alguns órgãos
administrativos, que o podem fazer na sua respectiva esfera de competências. Esta
fonte do Direito adquire assim um sentido mais amplo, alargando não o conjunto de
orientações seguidas mas os órgãos que por elas se regem. Deve então entender-se
por jurisprudência o conjunto das orientações seguidas em matéria de interpretação
e implementação da lei por parte de todos os órgãos encarregues competentes quer
sejam Tribunais, notários ou conservadores. No entanto há que salientar que neste
ultimo caso, se as pessoas não concordarem com a aplicação da lei podem recorrer aos
Tribunais sendo destes a palavra final.
Estas orientações podem ser mais ou menos específicas, aplicando-se assim a um
menor ou maior número de normas e casos. Os próprios tribunais podem ser mais
genéricos ou dedicar-se a assuntos mais específicos pelo que o conjunto de normas
porque se regem vai diferir de uns para outros (os juízes de uns não podem atuar
noutros).
Na base da hierarquia temos Tribunais de primeira instância (aos que mais se recorre),
de seguida o Tribunal da Relação, e no topo o Supremo Tribunal de Justiça (é o mais
geral mas existem mais específicos como o Supremo T. da Adminstraçao, Tribunal do
Trabalho, Tribunal da execução de penas, Tribunal do Comércio, etc). Todos estes são
comandados por normas cuja valida e inconstitucionalidade são aferidas pelo Tribunal
Constitucional.
A jurisprudência não é a decisão do órgão mas sim o fundamento dessa decisão. Essa
decisão para ser tomada implica um processo composto por várias partes onde se
contam o relatório e a fundamentação. Na primeira fase descrevem-se os factos
fazendo o seu enquadramento normativo, apontam-se as normas que se aplicam
àquele. É na fase da fundamentação que entra a jurisprudência ao explicar como as
normas devem ser interpretadas e aplicadas para cada caso, dentro de um conjunto de
casos mais gerais aos quais as normas se aplicam.

29
Noções Fundamentais de Direito

Se não existirem normas para regular um determinado caso, deve aplicar-se uma
norma que regule casos análogos, ajustando-se ao caso que não estava previsto. Mas
pode não existir esse paralelismo que permite a aplicação analógica da lei. Então, se
nem sequer existir um caso semelhante procede-se à formulação de uma norma
específica para aquele caso. Mas esta será apenas válida para aquele caso, não se
inclui no sistema jurídico, pode é posteriormente ser usada para um caso semelhante,
nunca uniformizada e aplicada no geral, só sendo aplicada depois da analise caso a
caso o exigir. Para além de ser um caso excepcional, o Tribunal cria a norma mas sob
determinadas orientações pelo que não pode dizer-se que tenha capacidade
legislativa.
Como actualmente está tudo informatizado e há um elevado número de casos por
resolver, os juízes limitam-se a aplicar normas já existentes não procedendo a uma
análise mais cuidada e particular de cada caso, o que prejudica a qualidade do sistema
de Justiça. Este uso cada vez maior das normas já existentes reforça cada vez mais a
força e valor das orientações reguladoras em matéria de interpretação e
implementação da lei, também já existentes. Deste modo, a jurisprudência vê o seu
papel reforçado na medida em que as decisões dos tribunais se apoiam em muito
nestas orientações que constituem a base do fundamento da decisão final.
Supondo que para casos semelhantes um tribunal aponta uma solução e outro tribunal
aponta uma solução diferente, as partes podem recorrer da decisão. Se mesmo após
recorrerem da decisão continuar a haver incompatibilidade nas soluções apontadas,
até há uns anos suscitava-se a criação de um Assento em que o Tribunal superior
reunia todas as partes para decidir uma de entre as duas soluções que passaria a ser
aplicada a todos os casos; assim era conferida uma certa capacidade legislativa aos
tribunais pelo que esta acção foi considerada inconstitucional e abolida. O Artigo 2º do
Cod.Civil era relativo aos assentos e por isso foi revogado pelo Decreto-lei nº329-A/95
de 12/12.
Atualmente, perante um caso destes, o legitimador deve criar uma lei interpretativa
para se evitarem estes casos. Criou-se então um mecanismo designado “Acordos na
fixação da jurisprudência” que é proferido pelo Tribunal Supremo. Não é uma lei que
se vai aplicar a todos os casos, é uma orientação a seguir em caso de
incompatibilidade.
Atualmente só o Tribunal Constitucional pode ditar decisões gerais mas estas não
constituem normas, o seu intuito é impedir que sejam aplicadas normas e
desenvolvidas acções consideradas inconstitucionais.
(Relativamente à jurisprudência e ao Costume é relevante consultar o livro do prof.
Freitas do Amaral.)

30
Noções Fundamentais de Direito

D) Doutrina
Nesta fonte do Direito incluem-se as opiniões e pareceres expressos pelos especialistas
em matéria jurídica, sobre determinadas questões do Direito, por ex: a lei, sua
interpretação e implementação.

Esta não influencia a criação de normas ou leis mas apresenta um papel relevante
porque influencia o modo como o Direito é produzido pelo legislador e como é
aplicado pelos Tribunais. Muitas vezes os Tribunais fundamentam a forma como
analisam os casos em doutrinas de especialistas em matéria jurídica.

E) Principios Fundamentais do Direito


Esta fonte do Direito não é considerada por diversos autores.
Corresponde às exigências de legitimidade e aprovação de normas jurídicas
intemporais e universais; são uma espécie de princípios pré-existentes que regulam as
normas que são criadas que devem subordinar-se aos primeiros.
São regras com vocação universal e intemporal pelas quais se deve aferir a
legitimidade do Direito Positivo que se deve subordinar a estas regras e estar de
harmonia com elas. Entre eles contam-se os Direitos do Homem e os Princípios
Democráticos (ex: vence a maioria).
Artigo 16º (Constituição)
Direitos fundamentais: as normas legais do sistema jurídico devem ser interpretadas
e implementadas em harmonia com a declaração universal dos Direitos do Homem.

São princípios universais e intemporais que transcendem o Direito Positivo (vigente) e


o regulam, ou seja, independentemente do que estabeleça o Direito vigente existem
princípios que lhe são superiores e devem ser respeitados e tidos em conta aquando
da criação de normas, no entanto, isso nem sempre acontece. Esta situação pode ser
comparada a uma pessoa que conheça as regras da gramática e não as use, estando
por isso a expressar-se incorrectamente; o mesmo acontece quando o Direito vigente
não respeita os Princípios Fundamentais do Direito, representando-se aqui a
incompatibilidade entre Direito Natural e Positivo. (?)

Processo Legislativo
Estudadas as fontes do Direito, há agora que entender como funciona o sistema
jurídico português e o processo que decorre desde que um texto é criado até este se
tornar uma lei em vigor. Vamos então estudar o processo legislativo.

31
Noções Fundamentais de Direito

O processo legislativo é composto por 6 fases e basta não se cumprir uma delas para a
lei ser inconstitucional e não poder entrar em vigor.

1) Elaboração / Apresentação
2) Discussão e votação / aprovação
3) Promulgação
4) Referenda
5) Publicação
6) Entrada em vigor

Estas são as fases pelas quais um texto passa desde a sua criação até se uniformizar
como um texto legal com interpretação pela ordem jurídica ou sistema jurídico. Para a
lei se formular efetivamente e ser aplicada tem que passar por todas estas fases.

1) Elaboração / Apresentação
Para haver lei tem que existir um texto que lhe serve de
Artigo 167º (Constituição)
base. Este texto é denominado “iniciativa de lei” pois é Iniciativa de lei e referendo
elaborado com vista a tornar-se numa norma.
Não confundir referenda (fase do processo legislativo) com referendo pois este é
quando os cidadãos se organizam para modificar algo, é uma consulta popular em que
as perguntas do referendo têm que respeitar certos pressupostos senão considera-se
ilegítima a iniciativa e o próprio referendo que é chumbado pelo Tribunal
Constitucional.

Há que saber como é distribuída a competência legislativa no nosso sistema jurídico.


O artigo 167º da Constituição afirma que podem desenvolver iniciativas de lei os
deputados, os grupos parlamentares, o Governo, as Assembleias Legislativas Regionais
e ainda os grupos de cidadãos eleitores, nos termos e condições estabelecidas pela lei.
Dependendo de que órgão parte a iniciativa esta pode designar-se projecto de lei ou
proposta de lei.
 Projeto de lei parte
 Proposta de lei parte

 Como é feita a divisão da competência legislativa entre estes órgãos?


No caso da Assembleia da República e do Governo, a divisão é
feita por menção expressa na Constituição da República e por Artigo 164º (Constituição)
exclusão de partes, ou seja, se uma matéria não for da exclusiva Reserva absoluta da
nem relativa competência da Assembleia da República então é competência legislativa
porque pode ser tratada tanto por esta como pelo Governo.

32
Noções Fundamentais de Direito

As matérias que sejam de competência relativa da Assembleia da


Artigo 165º (Constituição)
República podem ser tratadas pelo Governo (24) com a devida
Reserva relativa de
autorização por parte da AR e as que são da exclusiva
competência legislativa
competência desta apenas podem ser legisladas por ela (21). Nos
pontos 2 a 5 do artigo 165º esclarecem-se aspectos importantes
sobre as autorizações concedidas pela AR ao Governo que Artigo 198º (Constituição)
Competências legislativa do
definem qual o objeto, o sentido, a extensão e por quanto
Governo
tempo este pode legislar sobre tal matéria. O Governo só pode
legislar nos termos dessa autorização, caso contrário a
Artigo 161º (Constituição)
legislação/delegação é considerada inconstitucional e ilegítima.
Competências da AR
A competência legislativa do Governo está definida no artigo
198º da Constituição, sendo da sua exclusiva competência a
matéria relativa à sua organização e funcionamento.
As competências da AR estão definidas no Artigo 161º.

Se nos perguntarem qual é o órgão responsável pela legislação de determinada


matéria, procura-se essa matéria nos artigos 164º (exclusiva da AR), 165º (AR e
Governo com autorização da AR) e 198º (só do Governo); se não constar em nenhum
deles então é porque pode ser legislada tanto pela AR como pelo Governo.

A nível dos grupos de cidadãos eleitores, estes podem desenvolver iniciativas


legislativas dentro dos termos e condições estabelecidos pela lei, estando a sua
iniciativa de lei regulada pela Lei nº 17/2003 de 4 de Junho que sofreu a alteração pela
Lei nº 26/2012 de 24 de Julho. Esta lei (primeira) estabelece que cidadãos podem
exercer iniciativa de lei, em que sentido e os pressupostos necessários para que esta
seja válida (consultar anexo).

Lei nº 26/2012 de 24 de Julho


São titulares do direito de iniciativa legislativa os cidadãos inscritos no
recenseamento eleitoral, quer no território nacional, quer no estrangeiro.

Os projectos de lei apresentados à AR pelos grupos de eleitores têm que ter no mínimo
35 000 assinaturas daí que sejam raros devido à sua grande dimensão.
Relativamente aos Deputados, a Resolução do Conselho de Ministros n.º 51/2013. (D.R.
n.º 152, Série I) de 2013-08-08 estabelece como funciona o Conselho de Ministros
sendo esta uma alteração (a primeira) à Resolução do Conselho de Ministros n.º
29/2011, de 11 de Julho. (mas isto NÃO sai)

33
Noções Fundamentais de Direito

2) Discussão e votação / aprovação


Esta fase do processo legislativo está regulada no Artigo 168º
Artigo 168º (Constituição)
da Constituição. A votação é feita pelos deputados e serve Discussão e votação
para aprovar (ou não) a lei, primeiro vota-se no geral
(relativamente ao âmbito global da lei) e depois no específico
(relativamente a cada “paragrafo” da lei). Certas leis só são aprovadas se obtiverem a
votação de mais de dois terços dos deputados presentes, tendo este numero que ser
superior à maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções. Uma lei pode
ser aprovada por completo ou apenas em certas partes, uma vez que na votação
específica podem ser aprovadas apenas algumas partes.

3) Promulgação
Quando uma lei é aprovada deixa de se designar projeto ou
Artigo 136º (Constituição)
proposta de lei e passa a chamar-se Decreto. Se uma lei for
Promulgação e veto
aprovada, ao cumprir a 2ª fase do processo legislativo, passa
para a fase da promulgação que é da responsabilidade do
Presidente da República. A lei passa pelo Tribunal Constitucional que afere se esta esta
de acordo com as normas ou não, se estiver o Presidente da República pode então
promulga-la, sendo obrigado a isso em certos casos (ver artigo 136º).

4) Referenda
Esta fase do processo legislativo gera alguma controvérsia na
Artigo 140º (Constituição)
medida em que alguns especialistas em matéria jurídica a Referenda ministerial
consideram desnecessária uma vez que esta corresponde à
ação do Governo ao dar referenda ao que na maior parte das
vezes é ele próprio que emite e se o faz é porque concorda com isso logo não há razão
para depois ter que aprovar o que ele próprio emitiu. No entanto, tal como as outras
fases do processo legislativo tem que ser cumprida, caso contrário a lei não se efectiva.

5) e 6) Publicação e entrada em vigor


Artigo 119º (Constituição)
Estas fases do processo legislativo podem ser tratadas em Publicidade dos atos
conjunto uma vez que são interdependentes e, por vezes,
quase simultâneas. Relativamente a estas fases convém Artigo 5º (Cód. Civil)
consultar os artigos indicados e a Lei nº 74/98 de 11 de Começo da vigência da lei
Setembro, republicada pela Lei nº 42/2007 de 24 de Agosto
que é relativa à publicação, identificação e formulário dos diplomas legais.

34
Noções Fundamentais de Direito

---------------------------------------------------------------------------------------------

Lei nº 74/98 de 11 de Setembro


Disciplina a publicação, identificação e formulário dos diplomas a inserir nas partes
A e B da 1.º Série do Diário da República e dispõe ainda sobre a admissibilidade
das rectificações, sobre as alterações e republicação integral dos diplomas.

A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.º da


Constituição, para valer como lei geral da República, o seguinte:

Artigo 1.º Publicação

1 - A eficácia jurídica dos actos a que se refere a presente lei depende da


publicação.
2 - A data do diploma é a da sua publicação.
3 - O Diário da República é distribuído no dia correspondente ao da sua data.

Artigo 2.º Vigência

1 - Os actos legislativos e os outros actos de conteúdo genérico entram em vigor no


dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o início da vigência verificar-se no
próprio dia da publicação.
2 - Na falta de fixação do dia, os diplomas referidos no número anterior entram em
vigor no 5.º dia após a publicação.
3 - A entrada em vigor dos mesmos diplomas ocorrerá, nas Regiões Autónomas dos
Açores e da Madeira, no 15.º dia após a publicação e, em Macau e no estrangeiro,
no 30.º dia.
4 - Os prazos referidos nos números anteriores contam-se a partir do dia imediato
ao da publicação do diploma, ou da sua efectiva distribuição, se esta tiver sido
posterior.

Artigo 4.º Envio dos textos para publicação

O texto dos diplomas é enviado para publicação no Diário da República, depois de


cumpridos os requisitos constitucionais ou legais, por intermédio dos serviços
competentes dos órgãos donde provenha.

Artigo 5.º Rectificações

Artigo 6.º Alterações e republicação

1 - Os diplomas que alterem outros devem indicar o número de ordem da alteração


introduzida e, caso tenha havido alterações anteriores, identificar aqueles diplomas
que procederam a essas alterações, ainda que incidam sobre outras normas.
2 - Quando a natureza ou a extensão da alteração o justificar, deve proceder-se à
republicação integral do diploma, em anexo. (é aqui que entra a alteração, ver site)

35
Noções Fundamentais de Direito

Artigo 7.º Identificação

1 - Todos os actos são identificados por um número e pela data da respectiva


publicação no Diário da República.
2 - Os actos normativos devem ter um título que traduza sinteticamente o seu
objecto.
3 - Os diplomas de cada uma das Regiões Autónomas têm numeração própria e são
ainda identificados pelas letras A (Açores) e M (Madeira), a acrescentar à indicação
do ano.
4 - Os diplomas que tenham a mesma designação genérica devem ser identificados
pela indicação da entidade emitente.

Artigo 8.ºNumeração

1 - Há numeração distinta para cada uma das seguintes categorias de actos.

Artigo 9.ºDisposições gerais sobre formulário dos diplomas


1 - No início de cada diploma indicam-se o órgão donde emana e a disposição da
Constituição ou da lei ao abrigo da qual foi aprovado e é publicado.
2 - Quando no procedimento tiverem participado, a título consultivo ou deliberativo,
por força da Constituição ou da lei, outro ou outros órgãos além do órgão de
aprovação final, ou tenha decorrido uma consulta aos cidadãos eleitores, faz-se
referência expressa a tal facto. (…)

Consultar: http://dre.tretas.org/dre/217741/
---------------------------------------------------------------------------------------------

A data que aparece nas leis é a data da sua publicação e não da sua aprovação, assim
pela designação da lei sabemos quando entrou em vigor. No entanto, o dia da
publicação não conta para a vigência da lei, no mínimo a lei entra em vigor no dia a
seguir à sua publicação, nunca no dia em que é publicada e dada a conhecer. No
próprio diploma fica definido o dia em que a lei entra efectivamente em vigor, caso
não seja definido, esta inicia a sua vigência no 5º dia após a publicação. O período
entre a publicação da lei e o começo da sua vigência designa-se período de entrada em
vigor.
Com todas estas fases conclui-se o processo legislativo e a lei passa a integrar a
ordem normativa e a ser implementada no sistema jurídico.

Cessação da vigência da Lei


Já falámos no processo de formação das leis, há agora que falar no processo que lhes
retira a vigência. A cessação da vigência da lei ocorre por caducidade ou revogação.

36
Noções Fundamentais de Direito

(esquema sobre a cessação de vigência da lei)

A cessação da vigência da lei está regulada no artigo 7º do


Artigo 7º (Cód.Civil)
Código Civil que afirma que se a lei não tiver vigência
Cessação da vigência da lei
temporária a sua vigência só cessa com a sua revogação por
outra lei.
A revogação pode resultar de declaração expressa, incompatibilidade entre as novas
disposições e as regras precedentes, ou caso a nova lei regule toda a matéria da lei
anterior. A revogação da lei revogatória não implica o renascimento da lei que esta
revogara, no entanto isso pode acontecer (processo de não repustinação).
A revogação pode ser total ou parcial conforme respeite a todo o âmbito da lei ou
apenas a certas partes, respectivamente. Pode também ser expressa, tácita ou de
sistema.
A revogação expressa é quando um órgão com competência legislativa expressa
declaradamente o intuito e propósito de revogar (alterar) determinada lei.
Revogação tácita é quando prevalece a lei de valor hierárquico superior e em caso de
este ser igual, prevalece a lei mais recente sobre a outra.
Revogação de sistema é quando a lei revoga toda a matéria que a anterior tratava (ex:
alterações no Código Civil).

A caducidade é quando o facto que tem por efeito fazer cessar a vigência da lei é o
decurso do prazo pelo qual a lei está em vigor, em caso de ter vigência temporária. As
leis com vigência temporária podem regular uma matéria que é ela própria temporária
ou regular uma matéria permanente só em circunstâncias temporárias.
A cessação da vigência da lei corresponde assim à ocorrência de um facto que tem por
efeito fazer cessar a vigência da lei e que só pode ser o decurso do prazo pelo qual a lei
se encontra em vigor ou a revogação por uma nova lei.

37
Noções Fundamentais de Direito

Existem autores que consideram que a caducidade pode ser invocada por outros
motivos que NÃO estão previstos na lei como:
o Desaparecimento do objecto da lei, ex: leis que se apliquem aos ex-
combatentes da Guerra Mundial, um dia já todos terão morrido e não faz
sentido a lei continuar a existir se já não existe o seu objecto
o Desuso (como não existem situações frequentes a que a lei se aplique esta
entra em desuso tornando-se irrelevante)
o Desaparecimento do fundamento da lei (leis cuja razão de ser já não faz
sentido, por ex, leis relativas ao que vestir na praia, hoje em dia cada pessoa
usa o que quer, não era uma lei que ia fazer as pessoas voltarem a usar fato de
banho)

Estes motivos invocadas para a caducidade das leis não estão previstos pela lei e por
isso não convém serem invocados porque apenas certos autores os indicam, não
havendo um consenso relativamente a estes.

Aula 20

Normas jurídicas
Já sabemos que lei corresponde a uma norma, regra, disposição ou preceito a ser
respeitado. Em certos casos, as normas podem ser designadas de leis.
A norma-tipo (padrão) é o modo mais vulgar como a norma se apresenta no sistema
jurídico. No entanto, existem normas que não correspondem ao padrão da norma
jurídica, apresentando-se noutros tipos com diferentes características das habituais.

Norma jurídica → representação de um acontecimento futuro e do comportamento a


ser adoptado nestas condições ou da sanção caso este não seja adoptado. (se
acontecer isto, deve fazer-se aquilo, caso contrário sucede tal).

Se perante a situação prevista não se adoptar o comportamento estipulado é aplicada


uma sanção. Esta serve para levar as pessoas a adoptar o comportamento estipulado.

A lei exige que para se realizarem determinados atos jurídicos os mesmos sejam
relatados por escrito, por exemplo, as ações de compra e venda têm que ser registadas
numa declaração de compra e venda.

38
Noções Fundamentais de Direito

Como está regulado no artigo 875º do Cód.Civil, este ato só é válido


Artigo 875º (Cód.Civil)
por escritura pública ou documento particular autenticado. Caso Compra e Venda
contrário o ato é anulado. Se uma venda for efetuada apenas
verbalmente, sem um documento escrito onde se registe tal
transacção, a venda não é considerada valida pelo que, quem vendeu pode acusar a
outra pessoa de roubo → Invalidez/invalidade da venda

Como está também previsto no artigo 220º, se uma declaração


Artigo 220º (Cód.Civil)
negocial não tiver a forma legalmente prevista e não houver uma
Inobservância da
sanção para esta situação, a mesma torna-se nula.
forma legal
Anulidade e Anulabilidade têm regimes diferentes mas podem ter
efeitos semelhantes, sobretudo em casos semelhantes.

Estrutura das normas jurídicas


Qualquer norma jurídica do tipo padrão é constituída por 3 partes:
o Previsão
o Estatuição
o Sanção
Alguns autores não consideram a sanção como uma parte das normas referindo que
esta é uma característica do sistema jurídico e não tendo que fazer obrigatoriamente
parte da norma.
A Previsão corresponde à ação ou situação futura que pode ocorrer.
Estatuição é o comportamento que deve ocorrer, que se deve adoptar, se a situação
da previsão se verificar (pode ser ação ou omissão).
A Sanção é a punição aplicada quando não se adopta o comportamento estabelecido
pela norma (na estatuição) em caso de a previsão se verificar. Estas podem ser
classificadas em jurídicas ou materiais (a anulabilidade é uma sanção jurídica, a pena
de prisão é uma sanção material ? )

As normas podem apresentar-se de diversas formas e raramente contêm


explicitamente as 3 partes.

Podem conter apenas a previsão e a sanção, da qual subentendemos a estatuição


(comportamento a adoptar). Ex: quem matar é condenado com pena máxima.
Subentende-se que o comportamento a adoptar é não matar.

Podem ser mais explícitas e conter a previsão e a estatuição. Ex: quem


Artigo 1323º (Cód.Civil)
encontrar um animal ou coisa móvel perdida deve entrega-la ao dono Animais e coisas móveis
ou avisa-lo caso o conheça, caso contrario deve comunicar o achado às perdidas
autoridades. Neste caso não se indica uma sanção mas sabe-se que se

39
Noções Fundamentais de Direito

não se adoptarem os comportamentos previstos, esta irá ser aplicada.

No Cód.Civil, no geral os artigos contêm a previsão e a estatuição não indicando a


sanção mas sim o comportamento a adoptar em determinada situação.

As normas mais explícitas são as que contêm as 3 fases. Ex: Quem


Artigo 1324º (Cód.Civil)
encontrar algo escondido ou enterrado, deve comunicar às autoridades Tesouros
o que achou; se não o fizer perde o direito de posse que podia vir a ter
(como não cumpre a lei, o que podia ir para si vai para o Estado).

Existem normas onde a previsão não está expressa, apenas contêm a


Artigo 877º (Cód.Civil)
estatuição e a sanção. Por ex: no caso da venda a filhos ou netos, esta
Venda a filhos ou netos
só pode verificar-se com o consentimento de todos os outros, caso
contrário não é válida, é anulada. Este artigo contém apenas a
estatuição e a sanção, a previsão subentendida é o desejo ou possibilidade de vender
algo a filhos ou netos. Nesta situação o comportamento a adoptar é pedir o
consentimento a todos os outros; se isto não se fizer a venda é anulada.

Características das normas jurídicas


Não há um consenso entre autores relativamente a este aspeto das normas jurídicas
tanto porque nem todos concordam com as clássicas e nem todos concordam com as
novas características despontadas por alguns autores.

As mais vulgares, que se encontram nas normas jurídicas padrão, são as invocadas pela
teoria clássica:
o Imperatividade – a norma contem um comando que se traduz na necessidade
de se adoptar um comportamento.
(Nota: normas deste tipo são posteriormente classificadas em outros tipos que
veremos mais à frente)
o Violabilidade – no plano da realidade ou dos atos, a norma é susceptível de
não ser cumprida ou seja, há tendência para ser infringida, apesar de haver
uma sanção, que reprime o seu incumprimento ou violação, que existe mesmo
para levar as pessoas a cumprir as normas através do recurso ao uso da força.
Alguns autores não consideram esta característica.
o Generalidade – a norma tem como destinatários a generalidade das pessoas
contidas na sua previsão, ou seja, afeta toda e qualquer pessoa, alguém, não
apenas uma pessoa em específico. Esta característica pode ser menos nítida ou
evidente quando se trata de uma norma que diz respeito a cargos uninominais
(que só podem ser desempenhados por uma única pessoa), por ex:

40
Noções Fundamentais de Direito

As normas relativas às competências do Presidente da República – o


destinatário é apenas o presidente da República, no entanto, este cargo pode
ser desempenhado por qualquer pessoa e não apenas por quem o ocupa a
dada altura. Assim as normas jurídicas tipo padrão referem-se sempre a um
leque de pessoas, que pode ser maior ou menor, mas nunca só a uma. Neste
caso, o leque de pessoas a que podem vir a aplicar-se as normas (ou seja, que
podem vir a desempenhar o cargo) é menor do que o leque de pessoa que
podem ser abrangidas por normas relativas a roubos (que afetam toda e
qualquer pessoa efectivamente).
Nota: Fora da característica acima apontada, normalmente as normas regulam
sempre mais do que uma pessoa porque regulam relações jurídicas no entanto
nem todas as normas são relativas à relação jurídica.
o Abstração – a norma não regula casos concretos mas sim categorias de casos,
ou seja, uma multiplicidade de casos que possam vir a ocorrer e que variam em
certos parâmetros mas no essencial se mantêm idênticos. A norma faz uma
previsão ou representação abstracta do padrão geral dos casos, excluindo
determinados parâmetros considerados menos relevantes.
o Coercibilidade – possibilidade de recurso ao uso da força para impedir ou
reprimir o incumprimento ou violação das normas, obrigando assim as pessoas
a fazer algo ou proibindo-as de fazer algo.

Uma característica menos vulgar e relativamente à qual não há consenso é a:


o Imputicidade – a norma só é aplicada se se verificarem os casos da sua
previsão, ou seja, a norma aplica-se a determinados casos apenas se estes
ocorrerem. É o mesmo que dizer que as normas só se aplicam se forem
aplicáveis (o que não faz muito sentido daí não haver consenso)

A vida social tem vindo a complexificar-se e consequentemente o Direito também, o


que o levou a subdividir-se em ramos específicos. Com o aparecimento desta espécie
de subsecções que não existiam, as novas normas criadas na maior parte das vezes não
cumprem com as características clássicas.
Posto isto, mais recentemente, têm sido apontadas por diversos autores novas
características das normas que contrariam em parte as características clássicas vistas
anteriormente:
o Mobilidade – actualmente, as normas estão constantemente a ser
modificadas/alteradas (por ex: no Direito do Trabalho, o Código do Trabalho é
frequentemente alvo de revisões e alterações, no que respeita às regras dos
contratos de trabalho, condições de trabalho, etc.)

41
Noções Fundamentais de Direito

o Dispersão – as normas não se concentram em Códigos (ex: Código do


Trabalho), muita vez são avulsas, constituindo uma legislação avulsa. Até 2003
não existia um Código do Trabalho mas existiam leis do trabalho que estavam
dispersas em vários documentos havendo então uma legislação dispersa do
trabalho, que é negativa porque reduz a interligação e articulação entre
normas. Posto isto, reuniram-se todas as normas relativas ao trabalho num
único diploma legal organizado e surgiu o Código do Trabalho, mas isto
também se tornou negativo porque surgiram mais normas a regular o próprio
código e outras matérias que não constavam nele. A tendência é então para o
avulso regular até o que está regulado conjuntamente.
o Carácter concreto – por oposição à abstracção das normas jurídicas padrão. As
normas vão-se particularizando em casos cada vez mais restritos perdendo
assim a sua abstracção (regulam casos específicos e concreto mas delimitam-
nos muito). Por ex: as normas relativas a grandes empresas, só se aplicam a
estas não a todo o tipo de empresas.
o Declínio das fontes clássicas do Direito – verifica-se um declínio da importância
da lei pela aplicação de outras regras aplicáveis a essa realidade por ex, através
da multiplicidade de regras encontradas em diversos dispostos e formas. Surge
então o Direito circular em que o cidadão não tem acesso à maior parte das
normas que o regulam porque estas encontram-se em directivas
administrativas, regulamentos ou decretos internos a que pouca gente tem
acesso.
o Declínio da Coercibilidade – porque a ideia de que o incumprimento da norma
leva à aplicação da sanção nem sempre funciona assim uma vez que se
multiplicam os mecanismos de prevenção para evitar a infracção, o que leva a
que não seja aplicada a sanção. As normas não se tornam obrigatórias tanto
pela sanção mas sobretudo pelos mecanismos de prevenção. Isto reflecte
então que muita vez são desencadeados outros mecanismos para se fazer
cumprir a lei que não são os mecanismos clássicos, onde se insere a sanção e
recurso ao uso da força.
Nota: estas “novas caracteristicas” não devem sair na freq.

Classificação das normas jurídicas


Quanto à ação que impõem, as normas podem ser classificadas em:
o Imperativas – impõem uma ação (as características clássicas (e emergentes?)
das normas só se aplicam às normas Imperativas)
o Permissivas – permitem uma ação mas não a impõem
o Remissivas – remetem para outras normas que completam parte da sua
estrutura

42
Noções Fundamentais de Direito

Por sua vez, as normas Imperativas podem ser subdivididas em perceptivas e


proibitivas.
Já as normas Permissivas subdividem-se em puramente facultativas (se é a pessoa que
decide o que fazer), interpretativas e supletivas (são como suplentes, só existem e se
aplicam quando as pessoas não afastem a sua aplicação ou não tenham decidido o que
fazer). Por exemplo, A e B querem fazer um contrato de compra e venda; se não
houver acordo ou não ficar estabelecido/convencionado quem paga as despesas do
contrato, quem as vai suportar é o comprador. Outro ex: no
Artigo 1717º (Cód.Civil)
casamento existe um regime de bens que regula as
Regime de bens supletivo
relações/acções patrimoniais dos cônjuges; se não ficar decidido
qual é este regime, afere-se que Regime de bens supletivo o que
está regulado pela lei no artigo 1717º do Cód.Civil.

Quanto ao âmbito de aplicação territorial as normas jurídicas podem ser:


o Universais/globais – aplicam-se a todo o sistema jurídico (ex: Portugal)
o Regionais – aplicam-se apenas a certas regiões (ex: Madeira)
o Locais – aplicam-se apenas a municípios locais

Quanto ao que definem, ou seja, ao seu regime, as normas jurídicas podem ser:
o Gerais – definem o regime regra (geral) ex: Cód.Civil
o Específicas – contêm regras específicas que têm em atenção as
particularidades das situações, desviando-se (um pouco) do regime regra.
o Excepcionais – contêm um regime que se encontra em plena/direta oposição
ao regime regra, contrariam-no (enquanto as especificas se desviam dele) ex: o
aluguer e arrendamento são regulados por normas gerais mas existem depois
normas especificas e até excepcionais para regular certos casos.

As normas jurídicas podem ainda ser classificadas em:


o Autónomas – se valem só por si, para se aplicarem não necessitam de recorrer
ou conjugar com outras (auxiliares).
o Não autónomas – só têm sentido completo quando conjugadas com outras
para as quais remetem (nestas enquadram-se então as normas remissivas).
o Disposições normativas incompletas – são definições gerais que não contêm
nada em concreto, socorrendo-se necessariamente de outras mais específicas.
o Formas interpretativas – interpretam outras normas. Podem ser formas
interpretativas de normas jurídicas ou de negócios jurídicos.

43
Noções Fundamentais de Direito

Aula - 7 de Maio

Sanções
A sanção é a punição, prevista pela lei, que se aplica em caso de incumprimento ou
violação das normas. Alguns autores interpretam-na como parte da norma, outros
referem-na como uma característica do sistema jurídico.

Normas completas ou perfeitas são as que contêm as 3 partes (previsão, estatuição e


sanção) mas, como já vimos, nem todas se apresentam nesta forma; em alguns casos a
sanção está contida noutra norma.

Sanção → a consequência desfavorável que resulta do incumprimento da norma.

As sanções podem ser classificadas em materiais e jurídicas, no entanto, todas as


sanções são jurídicas porque são previstas e impostas pela lei, esta classificação refere-
se é aos efeitos da sanção que podem manifestar-se no plano material (palpável) da
realidade ou dos factos (sanções materiais) ou no plano jurídico abstracto (sanções
jurídicas).

44
Noções Fundamentais de Direito

Sanções materiais (classificação 1)


1) Cumprimento coativo
Quando a coisa ou prestação é fungível, ou seja, facilmente substituída por outra do
mesmo género, quantidade e qualidade, a sanção por danificação é o cumprimento
coativo segundo o qual a pessoa é obrigada a repor algo igual ou
semelhante. Se não o fizer por livre vontade é obrigada pela lei, dai Artigo 207º (Cód.Civil)
Coisas fungíveis
se chamar cumprimento coativo. Esta sanção só se aplica a coisas e
prestações fungíveis.

2) Reintegração
No caso das coisas infungíveis (que não podem ser facilmente ou completamente
substituídas por outra do mesmo género, qualidade e quantidade) aplicam-se as duas
outras medidas – reintegração e reparação – em separado ou conjuntamente. Por ex:
se uma pessoa destruir um quadro de um pintor que já morreu, este n pode ser
substituído por outro igual uma vez que o seu autor já morreu e mesmo em vivo seria
difícil pintar outra completamente igual; deste modo as duas outras medidas.
No caso da reconstituição natural (2.1), o lesante é obrigado a pagar prestações
mediante as quais seja possível repor o que havia antes do incumprimento da norma
(para reparar o que causou e o que sucedeu posteriormente). Se uma pessoa partir um
vidro de uma janela, tem que repor esse vidro e os estragos causados devido ao
primeiro dano que são resultados indesejados resultantes do incumprimento da norma
(ex. inundação da casa); há que reparar todos eles para se voltar à situação inicial.
Sempre que a reconstituição natural não seja possível, ou seja,
Artigo 562 e 566º
quando de trata de coisas infungíveis, é fixada uma indemnização
(Cód.Civil)
em dinheiro, pelo que a medida aplicada é o sucedâneo
Indemnização
pecuniário(2.2). Segundo esta medida deve ser paga uma quantia
equivalente ao valor do que foi destruído.
No entanto, não devemos pensar nestas medidas como alternativas pois podem existir
em conjunto. Na maioria das vezes, o cumprimento coativo conduz à reconstituição
natural, pelo que as duas medidas só se aplicam a coisas fungíveis.

3) Reparação
Se não se puder aplicar nenhuma das duas anteriores então aplica-se a reparação (3) –
nas duas vertentes – pena e compensação. Ex: se uma pessoa matar outra não há
nada que se possa fazer que reponha a situação inicial e dê vida ao falecido, por isso o
assassino é condenado com uma pena de prisão e, para além disso, tem ainda que
pagar uma valor (que não é o da vida da pessoa porque essa não tem valor monetário)
mas que compense, em certa medida, a dor dos familiares sendo então obrigado a
pagar uma indemnização aos familiares próximos da vitima. Se a pessoa for apenas

45
Noções Fundamentais de Direito

agredida, o agressor tem que pagar as contas do hospital e da sua recuperação (o que
tem valores concretos em dinheiro) e ainda uma indemnização que compense as dores
(valor que se considera justo, não sendo avaliável em termos monetários). Neste caso
a indemnização não corresponde ao valor da coisa destruída mas sim a uma
compensação pelos danos causados, sobretudo morais (uma vez que os materiais são
quase sempre avaliáveis em dinheiro, excepto no caso das dores por ex).
Como já foi referido, a sanção não é alternativa, pode contemplar apenas uma
medidas ou varias em conjunto.

Sanções materiais (classificação 2)


A) Reconstitutivas
B) Compensatórias
C) Punitivas
D) Preventivas
E) Compulsórias

A) Nas reconsitutivas temos a reconstituição natural e a execução Artigo 827º (Cód.Civil)


específica (que pode conduzir à primeira). No caso de contrato- Execução específica
promessa, uma parte pode requerer o que a outra prometeu e não
cumpriu sendo essa obrigada, por lei, a faze-lo (artigo 830º).

B) As sanções compensatórias associam-se, em certa parte, à compensação contida na


reparação (outra classificação) pois são uma indemnização que não paga o valor
monetário de algo por não ser avaliável em dinheiro, mas corresponde a um valor que,
em certa medida, repara os danos materiais e morais causados. Ex: dores não têm
preço mas requerem uma indemnização. Na fixação do seu valor, deve ter-se em conta
não só os danos matérias e morais causados à própria
Artigo 564º (Cód.Civil)
pessoa mas também a outras próximas que têm direito à
Cálculo da indemnização
indemnização, e ainda os benefícios que a vitima deixou de
ter devido à lesão.

C) As sanções punitivas associam-se às penas que podem ser:


o Civis (multas e coimas)
o Criminais ou penais (pena de prisão ou perda do exercício de um direito)
o Disciplinares (sanções disciplinares como processos)
Nas civis pode referir-se o impedimento de exercer casamento com menores ou as
multas e coimas aplicadas em caso de contra-ordenação. A sanção pecuniária é como
uma multa mas recebe o nome de coima por corresponder a uma contraordenação,
por ex: circular em excesso de velocidade, não cumprir com as condições de trabalho,

46
Noções Fundamentais de Direito

higiene ou segurança estabelecidas. A coima é então uma punição em dinheiro, a


quantia a ser paga pelo incumprimento da norma.
Já nas criminais temos o exemplo de um herdeiro que perde o seu direito de posse por
tentar matar a pessoa de quem ia herdar algo, os familiares perdem o direito à
indemnização do seguro de vida se a pessoa se suicidar, são penas criminais. Mas estas
podem também assumir a forma de multas como alternativa à pena de prisão (paga-se
a multa e não se vai preso).
Por fim, nas disciplinares podem referir-se os processos disciplinares aplicados em caso
de desobediência do trabalhor para com o empregador, pois a lei do trabalho
determina que este pode agir disciplinarmente com sanções disciplinares sobre o
outro.

D) As sanções preventivas são as que previnem e evitam o incumprimento das


normas, sendo então “aplicadas” anteriormente, temos o exemplo das autoridades
que comunicam as operações de trânsito (ex. Páscoa e Natal), para que as pessoas
evitam cometer infracções. Nesta insere-se a liberdade condicional, em que próximo
do fim da pena a pessoa pode ir para casa mas se cometer alguma infracção volta
imediatamente para a prisão cumprir o resto e as que sejam atribuídas; e ainda o
internamento de pessoas inimputáveis (doentes e menores) que como não podem ser
condenados por lei a sanções como prisão e indemnizações, são internados em
instituições/estabelecimentos próprios para assim se evitar que voltem a violar as
normas.

E) Nas sanções compulsórias insere-se a sanção pecuniária


compulsória – que corresponde ao pagamento de juros Artigo 829-A (Cód.Civil)
S. Pecuniária Compulsória
acrescidos por cada dia de atraso no pagamento da prestação
estabelecida – e o Direito de retenção segundo o qual uma Artigo 754º (Cód.Civil)
pessoa tem o direito de reter algo da outra se esta não cumprir Direito de retenção
com a sua parte (ex: ter o carro na oficina ate que a pessoa
pague o arranjo). (Ver pág. 22 e 23 sobre meios do Direito)

São diversas as classificações e formulações sobre as sanções materiais, já as jurídicas


apenas são consideradas nesta divisão, por todos os autores.

Sanções jurídicas (classificação única)

47
Noções Fundamentais de Direito

As sanções jurídicas são aquelas cujos efeitos se fazem sentir no plano jurídico
abstracto, ou seja, na esfera jurídica da pessoa jurídica, quer seja ela singular ou
colectiva. Nestas contemplam-se a inexistência, invalidade (na segunda ainda se
inserem a nulidade e a anulabilidade).
Quando uma pessoa ao efectuar um acto jurídico infringe as normas, a punição pode
ser a invalidade (5) que se traduz na nulidade ou anulabilidade. Isto ocorre sempre
que o ato ou negocio jurídico não esta de acordo com as normas porque é ilegal ou
legal mas exercido de forma ilegal. Por ex: se um menor vender algo, como não tem
capacidade jurídica para o fazer, a punição do ato, que em si é legal, é a anulabilidade,
que destrói o negocio jurídico se houver prejuízos para o menor.

Nulo ≠ Anulado

Quando uma ato ou negócio jurídico, Se algum ato ou negócio jurídico for
por infringir as formalidades legais, é
anulado é porque era anulável e há
declarado nulo, há uma declaração de
uma declaração de anulabilidade.
nulidade

Os efeitos da nulidade e da anulabilidade são idênticos mas o seu regime é diferente.


Tanto a declaração de nulidade como a declaração de anulabilidade têm efeito
retroactivo “destruindo” o ato jurídico.
Enquanto a nulidade pode ser invocada por qualquer interessado, em qualquer altura
e declarada oficiosamente pelo tribunal, a anulabilidade só pode ser invocada pelos
interessados nomeados pelo tribunal (própria pessoa, tutores ou representantes
legais) e apenas no ano subsequente ao ato ou negocio jurídico, não podendo ser
declarada oficiosamente pelo tribunal, apenas se lhe for pedido por pessoas com essa
capacidade.
Artigo 286º (Cód.Civil) Artigo 287º (Cód.Civil) Artigo 289º (Cód.Civil)
Nulidade Anulabilidade Efeitos da nulidade e da anulabilidade

Há casos em que a prestação pecuniária não permite operar este tipo de


consequências como é o caso da invalidade do Contrato de Trabalho.
Em casos em que o ato desempenhado é ilícito, como tráfico de droga ou mandar
matar alguém, este é declarado nulo. Normalmente, quando o ato é declarado nulo
restitui-se o que foi transaccionado, mas no caso da violência não vão devolver-se
agressões e o patrão não pode restituir trabalho ao empregado, paga-lhe o salário
correspondente; neste caso, não se verifica o efeito da nulidade na medida em que
não se restitui directamente a actividade.
48
Noções Fundamentais de Direito

O ato desenvolvido pode ser ilícito, legal mas desempenhado de forma ilegal ou ainda
legal mas cujos efeitos são ilegais. Neste caso o objecto é legal
mas os vícios do objecto/vontade são ilegais pelo que se Artigo 280º (Cód.Civil)
aplicam sanções jurídicas. Vícios do objeto

O negócio simulado (com intuito de enganar terceiros) é nulo


Artigo 240º (Cód.Civil)
tal como o negócio cujo objecto seja física ou legalmente
Vícios da vontade
impossível, contrário à lei ou prejudicial para a população e os
bons costumes.

Os vícios da vontade (tentar enganar terceiros) e a incapacidade dos agentes


(incapazes de exercício jurídico) acarretam a anulabilidade como sanção.

A inexistência (4) e a ineficácia (6) não são referidas por muitos autores, como
sanções jurídicas. Relativamente à inexistência temos como exemplo o caso da
referenda, uma das fases do processo legislativo que apesar de não fazer grande
sentido tem que ser respeitado, caso contrario a lei não existe, pelo que a sanção por
não se cumprir as normas do processo de formação de leis é a
Artigo 137º e 140º
inexistência. Não é declarado nulo nem anulado porque isso só se (Constituição)
pode fazer a coisas que já existem e neste caso a lei não se chega a
formar, porque não se respeito o seu processo de formação.
Outro caso em que pode ser declarado inexistência são os Artigo 1628º (Cód. Civil)
casamentos, por ex: quando celebrados entre menores ou com Casamentos inexistentes
falta de vontade por uma das partes.

A ineficácia (6) aplica-se a casos em que o que se faz não é ilegal, não
podendo por isso ser declarado nulo ou anulado, não é inválido nem Artigo 268º nº1
(Cód. Civil)
inexistente, simplesmente não é eficaz, não produz efeitos. Por ex: se
Representaçao sem
alguém celebrar um negócio jurídico em nome de outra pessoa, sem
poderes
poderes de representação, o negócio é ineficaz se não for ratificado
pela outra pessoa (representada).

49
Noções Fundamentais de Direito

Aula - 8 de Maio

Divisões ou Classificações do Direito – Direito Público e Privado


Já estudámos diversas classificações como Direito Internacional ou Direito Interno e os
vários sentidos do termo direito. Como sabemos, o Direito Interno diz respeito às
regulações formuladas dentro do próprio Estado enquanto que o Direito Internacional
recai sobre as regulações formuladas entre Estados, em organizações internacionais e
por autoridades soberanas que regulam relações internacionais.
Vamos agora ver a divisão entre Direito Público e Direito Privado que, actualmente,
não assume grande relevância devido à falta de consenso que sobre ela recai.
Várias foram as concepções formadas acerca desta matéria ao longo dos tempos,
sendo utilizados diversos critérios para fundamentar esta divisão. Esta divisão e
classificação é hoje muito questionada, entrou em crise e a sua importância declinou,
sobretudo devido à evolução do Direito que tem que acompanhar a evolução da vida
social e dos sistemas jurídicos.

50
Noções Fundamentais de Direito

Esta divisão entre Direito Público e Privado é feita a nível do Direito Interno apesar de
no Direito Público se integrar o Direito internacional.
Esta integração serve apenas de referência porque existem dois tipos de Direito
Internacional: o que regula relações internacionais, o mais corrente que é o Público e
existe depois um tipo do Direito Internacional, o Privado, que só é usado em casos
excepcionais quando, em presença de conflito entre normas, é este
Artigo 14º a 24º
que determina qual a norma que deve reger o caso. Por ex: quando
(Cód. Civil)
duas pessoas de nacionalidades diferentes se casam num pais que
Direitos dos estran-
não é o de nenhuma delas, o casamento esta a ser regido por 3 geiros e conflitos de leis
ordens jurídicas diferentes; neste caso o Direito Internacional
Privado determinada qual a norma mais “forte” para reger o caso.
O Direito Internacional Privado não se insere em nenhuma ramo desta classificação
por fugir ao modo normal de funcionamento do Direito, uma vez que, não contem
regras de Direito material que ditem como se deve agir. Este apenas se destina a
eleger qual a lei que regula o caso pois é frequente haver conflitos entre normas
sempre que uma situação envolve mais do que uma ordem jurídica. Sempre que, por
alguma razão, as normas jurídicas de sistemas jurídicos diferentes entre em conflito,
recorre-se ao Direito Internacional Privado, mas isto é uma situação pouco frequente.
Exemplo: Artigo 35º do Cód.Civil, relativo à Declaração Negocial, nas alíneas nº 2 e 3
diz qual das leis regula o caso, a da residência habitual comum do declarante e do
destinatário e, na falta desta, a do lugar onde o comportamento se verificou.
Foram definidos critérios para efectuar esta divisão e classificação – Direito Público e
Privado – e “arrumar” em cada um deles os diversos ramos do Direito. No entanto,
com a evolução da vida social, que se complexificou, teve o Direito que evoluir e
surgiram imensos ramos do Direito interdependentes o que dificulta a integração
nesta divisão e a levou a ser discutida. Alvo de grandes discussões, esta divisão é
hoje pouco relevante.

Vamos então analisar a divisão e classificação segundo os diversos critérios:

A) Interesses
Segundo este critério, que se baseia nos interesses salvaguardados em primeira linha
pelas normas:
o Direito Público – corresponde ao conjunto de normas que em primeira linha
defendem e salvaguardam o interesse público (mesmo que depois se reflicta
no interesse privado).
Nota: o interesse público diz respeito à existência, conservação e
desenvolvimento da sociedade no seu conjunto.

51
Noções Fundamentais de Direito

o Direito Privado – subconjunto de normas que defendem e salvaguardam os


interesses privados, em primeira linha, mesmo que posteriormente isso se
repercuta no interesse público.
Como sabemos o Direito serve para regular a vida em sociedade, garantindo o seu
norma funcionamento, para assegurar segurança e bem-estar a toda a população, pelo
que, todo ele se destina a proteger o interesse público; no entanto, nem todas as
normas têm o interesse público como objecto de primeira ordem e as que não o têm,
integram-se no Direito Privado. Por ex: as normas que regem os casamentos, as
sucessões e as operações de compra e venda, protegem em primeira instancia os
interesses privados, inserindo-se no Direito Privado.
Este critério foi posto em causa/questão porque é difícil estabelecer a fronteira entre
as normas que protegem o interesse público e as que protegem interesses privados
até porque existem normas que protegem os dois simultaneamente.

B) Sujeitos
Como o critério dos interesses foi posto em causa, adoptou-se outro, relativo aos
sujeitos da relação jurídica. Segundo este:
o Direito Público – subconjunto de normas que regulam entidades públicas
(Estado e outros entes públicos) e as relações que se estabelecem entre elas.
o Direito Privado – normas que regulam as entidades particulares e as relações
que se estabelecem entre si.
Mas isto leva a uma simplificação radical porque não atende às circunstâncias em que
as entidades públicas se relacionam com as privadas, tanto no exercício da sua
autoridade pública (poder político) como noutras situações em que agem como se se
tratassem de entidades particulares. Posto isto, avançou-se para outro critério.

C) Posição dos sujeitos na relação jurídica


Como o critério relativo aos sujeitos fazia uma simplificação radical, não atendendo às
situações em que as entidades públicas se relacionam com as privadas, surgiu este
critério que atende à posição dos agentes (públicos e privados) na relação jurídica
destacando assim:
o Direito Público – normas que regem o Estado e outras entidades públicas e as
relações que estabelecem com os particulares, encontrando-se em posição de
supremacia face à entidade privada, por se encontrarem no exercício da sua
autoridade pública soberana. Normas que regulam o Estado e as suas relações
em que este se encontra munido da sua autoridade pública para exercício das
suas funções.

52
Noções Fundamentais de Direito

o Direito Privado – regula os particulares, as relações entre eles e as suas


relações com o Estado em que ambos se encontram em posição de igualdade,
ou seja, o Estado age como um agente privado tendo que respeitar as mesmas
normas que a entidade privada.
Ex: O Estado, ao atuar para cobrar impostos está a utilizar a sua autoridade pública
para exercício das suas funções tendo poder sobre os particulares, pelo que, as normas
relativas a esta ação e à relação que se estabelece entre este e as entidades privadas
se inserem no Direito Público.
Já nos atos de compra e venda ou contratação de serviços prestados por particulares,
o Estado age como se se tratasse de um particular pois tem de se subordinar às
normas que regulam esses atos e relações jurídicas.

7) Direito Privado Especial


Já relativamente ao Direito Privado Especial há que falar no Direito Comercial (Código
Comercial) e no Direito do Trabalho.
Relativamente aos atos comerciais definidos e regulados no Cód.Civil nos artigos (?), o
Código Comercial regula os contratos comerciais e as relações de natureza não
exclusivamente civil cujo contrário do próprio ato não resulta. Ex: um comerciante
casa-se, este é um ato de natureza exclusivamente civil que nada muda pelo facto da
pessoa ser comerciante por isso é regulado pelo Direito Civil e não comercial. Só os
atos comerciais são regulados pelo Código Comercial e isto implica saber quem é
comerciante e a lei diz que o é quem tem o poder de fazer comércio e assume isso com
profissão.
Já relativamente ao Direito do Trabalho, este regula os contratos e condições de
trabalho quando a entidade patronal é privada ou então se é pública mas tem que se
comportar como privada, não podendo usufruir da autoridade pública do Estado,
aplicando-se-lhe as mesmas normas que aos particulares. Quando o empregador é
uma entidade pública, as normas que regem a sua função inserem-se no Direito
Administrativo.
No entanto, o Direito do Trabalho já não regula apenas as relações entre empregador
e trabalhadores passando também a regulas as representações patronais, sindicatos,
órgãos de representação, condições de trabalho (higiene e segurança)…
Os inspectores de cada actividade (ex: ASAE) conferem se os empregadores respeitam
as condições de trabalho burocráticas (contratos) e não burocráticas (higiene e
segurança), caso não as respeitem é aplicada uma coima à contra-ordenação. Os
sindicatos, associações e confederações são pessoas colectivas sendo por isso
regulados pelo Direito Coletivo de Trabalho pois também neste ramo existe Direito
colectivo e privado. (?) Como existem normas que regulam as relações entre Estado e

53
Noções Fundamentais de Direito

particulares, também dentro do Direito de Trabalho temos o privado, o público e o


misto.

Aula 14 de Maio (24)

Interpretação da Lei
As normas, para poderem ser implementadas e aplicadas, têm que ser compreendidas
e interpretadas. Contudo, interpretar uma norma não é apenas lê-la pois o que diz na
norma é apenas um de quatro elementos necessários para a sua interpretação, para a
compreensão do seu sentido e alcance.
Todos nós temos que respeitar as normas, quer as conheçamos e entendamos ou não.
Só ler não chega, há que saber interpretá-las, sobretudo as normas relativas à nossa
actividade profissional porque na relação entre pessoas, o nosso bom sendo permite-
nos agir de acordo com a maior parte das normas mesmo sem as conhecermos.
No geral, normas são textos escritos que procuram transmitir um conteúdo de
pensamento. São criadas pelo legislador, este não é uma pessoa em específico mas
sim qualquer órgão com capacidade legislativa que formule leis. Apenas na Ditadura é
que o legislador é uma única pessoa que produz leis ao seu gosto e que todos têm que
respeitar. Assim, ao formular normas, o legislador procura transmitir conteúdos de
pensamento através de normas escritas e publicadas (no Diário da República) para
conhecimento público, que de destinam a serem interpretadas e implementadas.
A linguagem utilizada implica um emissor (dita a norma) e um receptor (obedece à
norma) que tem que entender o que é transmitido pelo legislador.
O intérprete é qualquer pessoa que leia e interprete a norma para entender o seu
conteúdo, quer o faça voluntariamente ou não; ex: os tribunais têm mesmo que as ler
e interpretar para as poder aplicar.
Nas relações normas, se o receptor não entender o que o emissor pretende transmitir,
o primeiro volta a explicar, de forma diferente, até que o receptor entenda, no caso
das leis e normas, não há ninguém que as reexplique. O intérprete tem que as
entender tal e qual como estão escritas (e mesmo que não entenda tem que lhe
obedecer), o que implica o uso de um conjunto de mecanismos, os elementos que
permitem fazer a interpretação da lei.
A norma funciona no plano abstracto mas destina-se a resolver situações concretas, o
que implica uma mediação entre a norma e a sua aplicação; a interpretação faz essa
mediação entre o texto e a situação concreta. Relativamente a esta
Artigo 9º (Cód. Civil)
matéria há que consultar o artigo 9º do Cód.Civil que regula a
Interpretação da lei
interpretação da lei.

54
Noções Fundamentais de Direito

A arrumação expositiva e didáctica ou formulação que os autores fazem a respeito


desta matéria pode variar, sobretudo no que respeita à terminologia.

As normas podem ser interpretadas segundo três critérios:


A) Fontes e Valor
B) Finalidade ou Métodos de interpretação
C) Resultado

Qualquer que seja o critério utilizado para interpretar a norma, têm que constar nele
os elementos de interpretação da lei que veremos mais à frente.

Para interpretar uma norma não basta lê-la, é necessário utilizar um conjunto de
elementos que permitem compreender efectivamente o seu sentido e alcance.
O conjunto de regras (cânones interpretativas) que rege a interpretação da lei designa-
se Hermenêutica. Este conjunto de regras permite interpretar a lei e fixar o seu
sentido e alcance.
A interpretação da lei não é fácil sobretudo devido à ambiguidade das palavras que
dificultam o entendimento do conteúdo da norma. Posto isto, é necessário conhecer
os vocábulos específicos, uma vez que, o Direito contém palavras próprias e por vezes
usa as correntes com um significado diferente (nestes casos prevalece o sentido
jurídico da palavra e não o corrente).

A) Interpretação segundo as Fontes e Valor


Logo à partida é feita uma divisão cerce relativamente a quem interpreta a lei e ao
valor dessa interpretação. Assim, consoante quem interpreta a lei existe:
o Interpretação autêntica – feita pelo próprio legislador (que fez a lei) através da
lei interpretativa que fixa o seu sentido e alcance; assume valor/força
vinculativa quando esta tenha valor igual ou superior ao da lei interpretada,
tendo assim que ser respeitada por todos; caso isto
não se verifique, apenas quem esta dependente Artigo 13º (Cód. Civil)
Leis interpretativas
hierarquicamente do legislador é que tem que a
respeitar.
o Interpretação doutrinal – feita pelos órgãos jurídicos (que interpretam e
implementam a lei) ou por qualquer cidadão.
o Interpretação Judicial – feita pelos Tribunais no exercício da sua função; aqui
inserem-se os Acordos para a fixação da Jurisprudência que impedem que
casos semelhantes tenham resoluções diferentes na medida em que exigem
uma explicação bem fundamentada para a aplicação de outra resolução.

55
Noções Fundamentais de Direito

B) Interpretação pela Finalidade ou Problemática dos Métodos de interpretação


Neste critério inserem-se quatro métodos que confrontam em pares:
o Subjetivismo e Historicismo;
o Objetivismo e Actualismo (opõe-se ao de cima).

O intérprete, na interpretação da lei, deve esclarecer qual é a sua finalidade, para além
da fixação do seu sentido e alcance.
Se o intérprete se basear na interpretação que o próprio legislador fez e tiver em
conta o contexto da época em que a lei/norma foi formulada, está a fazer uma
interpretação subjectivista e historicista (mens legislatoris – sentido do legislador).
Nesta a lei vale pelo seu sentido que tinha quando foi formulada pelo que o intérprete
tem que se reportar ao contexto de quando esta foi criada.
Se o intérprete adequar o sentido ou conteúdo da normal à actualidade e a
enquadrar no contexto em que ocorre a situação concreta a que se aplica, diz-se que
faz uma interpretação objectivista e actualista (mens legis – sentido da própria lei que
vale só por si, independente do sentido do legislador). Quando o intérprete procura
reconstruir e época de publicação da lei, reporta-se historicamente ao pensamento de
legislador quando formulou a lei.
Mas as leis não são peças tradicionais e históricas, estas devem resolver as situações
quando elas surgem, tendo em conta o contexto e circunstâncias em que ocorrem que
podem ser completamente diferentes de quando a lei foi criada dai que seja arriscado
adoptar essa interpretação. Temos que adequar o sentido da lei ao contexto de cada
situação porque o mesmo problema, em contexto diferentes, obtém resoluções
diferentes.
A interpretação objectivista e actualista da lei implica ter em conta os contextos
actuais, do momento da situação concreta que ocorre. Dai que o Actualismo isole os
contextos da situação do contexto em que esta foi criada, associando-se ao
objectivismo pois compreende-se a lei aplicadando-a àquela situação, não se adequa
o seu conteúdo subjectivamente à situação.
No entanto, a interpretação da lei de forma objectivista e actualista é muito radical
pois as pessoas não têm todas a mesma perspectiva o que gera interpretações
diferentes da própria lei e do contexto em que a situação ocorre, levando a resoluções
diferentes para o mesmo caso, uma vez que as pessoas têm visões diferentes acerca
do mesmo assunto e isto não pode acontecer, tem que haver igualdade na aplicação
da lei.
Em suma: o objectivismo actualista interpreta a lei à luz dos contextos actuais
enquanto o subjectivismo historicista interpreta a lei de acordo com o pensamento de
quem a criou, no contexto em que foi criada.

56
Noções Fundamentais de Direito

Fala-se num Subjetivismo Actualista em que o interprete deve tentar saber qual seria o
pensamento de quem criou a norma no contexto em que ocorreu a situação concreta (
e não no contexto em que foi criada).

A letra da lei – palavras e frases, o texto em si – nada nos diz, há que


Artigo 9º (Cód. Civil)
compreender o espírito da lei – o conteúdo que pretende transmitir.
Interpretação da lei
O artigo 9º do Cód.Civil afirma que a interpretação da lei não deve
cingir-se à letra da lei. Quando as expressoes tenham significados
correntes e juridicos diferentes prevalece o sentido juridico.

Por isso surgiram os Elementos de interpretação da lei que, quem faz a interpretação,
independentemente de quem for, tem que se socorrer deles.
o Elemento Gramatical ou Literário – considerado o ponto de partida, diz
respeito à letra da lei, ou seja, palavras e frases, o texto em si que não pode ser
usado isoladamente, há que atender aos outros elementos.
o Elemento Lógico – neste está em causa o espírito da lei, o conteúdo que está
por detrás da letra da lei; este pode subdividir-se em outros três:
- Elemento Racional ou Teológico – qual a razão da formação da lei, qual o
seu objectivo, porque e para que é que o texto foi feito; finalidade que se
pretende atingir (teologia).
- Elemento Sistemático – faz o enquadramento sistemático da lei, onde é
que esta aparece nas matérias do sistema/ordem jurídica.
- Elemento Histórico – relativo ao contexto da época em que a norma foi
formulada, para saber qual o seu significado, para que foi criada.

A primeira formulação estabelece uma fronteira nítida entre o que é a letra da lei
(elemento literário) e o que se aplica a essa letra (restantes elementos), daí que os
elementos que respeitam ao espírito da lei se integrem todos no Elemento Lógico.
Noutras formulações, em vez do segundo se subdividir em três, aparecem cinco todos
de igual valor.
Letra da lei e espírito da lei têm obrigatoriamente que se relacionar, tal como os
elementos gramatical e lógico. O elemento racional, aliado ao contexto de formação
da lei permite-nos perceber mais facilmente o seu sentido, conteúdo ou objectivo.

Nota: as normas são imperativos que exprimem a vontade da comunidade, do Estado ou do


legislador , na obtençao de comportamentos coincidentes com o prescrito (estabelecido) por
aquela vontade, para dada situação.

57
Noções Fundamentais de Direito

C) Interpretação pelos Resultados


Após realizar o processo interpretativo, tendo em conta os vários elementos de
interpretação, o intérprete chega a resultados, a conclusões acerca do seu sentido e
alcance. Na interpretação pelo resultado temos:
a) Interpretação declarativa
b) Interpretação restritiva
c) Interpretação extensiva
d) Interpretação enunciativa
e) Interpretação revogatória

a) Interpretação declarativa
Neste caso, o intérprete fixa à lei o sentido claramente contido nas leis.
Ex: o artigo 362º do Cód.Civil relatio à Declaração Negocial diz que “documento é
qualquer objecto elaborado pelo homem com o objectivo de reproduzir…”
Daqui o intérprete conclui que documento é qualquer objecto formulada
exclusivamente por um ser humano do sexo masculino, se estivesse escrito Homem, já
se referia a todos os seres humanos. No entanto, é essse o sentido da norma, mas a
interpretação feita é diferente, remete para o significado efectivo da palavra.

b) Interpretação restritiva
O intérprete conclui que o espírito da lei fica aquém da letra da lei, ou seja, o seu
sentido e alcance devem ser restringidos (reduzidos) pois se interpretarmos tudo à
letra a norma vai abranger mais casos do que realmente pretende.
Ex: Proibido circular veículos nesta área (no parque de um condomínio) – a lei refere
veículos mas não se refere a todos eles sem excepção pois em casos excepcionais pode
lá passar uma ambulância que também é um veículo. A palavra veículos tem um
sentido demasiado lato que não se aplica a esta norma.
Ex: Proibido estacionar em frente a portões de garagens – o dono da garagem pode
estacionar logo não é totalmente proibido, é mas não para todos.

c) Interpretação extensiva
Contrariamente à restritiva, o intérprete conclui que o espírito da lei vai para além da
letra da lei, ou seja, o seu sentido e alcance devem ser alargados pois se
interpretarmos tudo à letra a norma vai abranger menos casos do que realmente
pretende.
Ex: não se pode levar animais domésticos em transportes públicos – conclui-se que
não se pode também levar animais selvagens apesar de isso não estar explícito.

58
Noções Fundamentais de Direito

d) Interpretação enunciativa
Quando o intérprete retira de uma norma, através do raciocínio lógico-dedutivo,
outras normas nelas contidas virtualmente. Não existem explicitamente mas podemos
aferi-las através do conteúdo de outras.
Ex: só é permitido passar numa ponte entre as 8h da manha e as 8h da noite – conclui-
se que é proibido passar na ponte durante a noite.

b) Interpretação revogatória
Quando normas se contradizem, uma anula a outra, ou quando a norma é
contraditória, o texto anula-se a si próprio, diz-se que se faz uma interpretação
revogatória uma vez que o sentido da lei não esclarece com clareza mínima as
situações que pretende abranger.

Ver Word – inicio (sanções) e pág.22 e 30 (interpretação e integração da lei).

Aula 15 de Maio (25)

59

Você também pode gostar