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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO


COMARCA de Guarulhos
FORO DE GUARULHOS
5ª VARA CÍVEL
R. dos Crisântemos nº 29, 14º andar, sala 1405 - Vila Tijuco
CEP: 07091-060 - Guarulhos - SP
Telefone: (11) 2408-8122 - E-mail: guarulhos5cv@tjsp.jus.br

Para conferir o original, acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/sg/abrirConferenciaDocumento.do, informe o processo 1007198-83.2020.8.26.0224 e código 6183956.
SENTENÇA

Processo nº: 1007198-83.2020.8.26.0224


Classe - Assunto Procedimento Comum Cível - Tratamento médico-hospitalar
Requerente: João Lucca Pessôa Jeha e outro
Requerido: UNIMED DE GUARULHOS COOPERATIVA DE TRABALHO
MEDICO

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por ARTUR PESSOA DE MELO MORAIS, liberado nos autos em 27/05/2020 às 20:21 .
Juiz(a) de Direito: Dr(a). Artur Pessôa De Melo Morais

Vistos.

I – Relatório
Cuida-se de processo de conhecimento, pelo procedimento comum, ajuizado por
JOÃO LUCCA PESSÔA JEHA, representado por Thaís Pessoa Barbosa Jeha, contra
UNIMED DE GUARULHOS – COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO, através do qual
visa, em suma, à cobertura das sessões de tratamento médico especializado pelo método ABA-
DENVER que lhe foram prescritas. Narrou a parte autora, em síntese, ter sido diagnosticado como
portador de transtorno do espectro autista, razão pela qual faz uso de várias medicações. Disse que
lhe foi prescrito o tratamento ora perseguido, que inclui psicologia, fonoaudiologia, terapia
ocupacional, psicopedagogia, auxílio terapêutico e natação especializada. Alegou ter dado início
ao tratamento em clínica conveniada ao plano de saúde operado pela ré, mas sustentou que o
pagamento foi suspenso sob a justificativa de que teria sido atingida a cobertura mínima
obrigatória de 40 consultas/sessões por ano de contrato. Aduziu que a interrupção do tratamento
ensejará sinais de retrocesso no desenvolvimento do menor. Juntou documentos.
Manifestação ministerial às fls. 54/58.
Decisão de fls. 61/63 deferiu a tutela de urgência requerida.
Citada, a parte requerida, resistindo à pretensão autoral, apresentou contestação
(fls. 104/122). No mérito, sustentou não ser obrigada a fornecer tratamento médico de forma
ampla e irrestrita. Disse que o tratamento requestado encontra-se além da extensão da cobertura
prevista no rol de procedimentos obrigatórios divulgados pela Agência Nacional de Saúde.
Colacionou, ademais, documentos.
Réplica às fls. 267/286.
Parecer ministerial às fls. 293.
É, no que importa, o relatório.

II – Fundamentação
Verifica-se comportar, a demanda, julgamento antecipado, devido à
prescindibilidade de produção probatória em audiência, uma vez que a prova documental já

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anexada aos autos mostra-se suficiente para o deslinde da matéria, conforme autoriza o artigo 355,
inciso I, do Código de Processo Civil.
Nesse contexto, de bom alvitre destacar que, nos termos do parágrafo único do
artigo 370 do CPC/2015, “o Juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou
meramente protelatórias”, sem que tal implique cerceamento de defesa.
Tal regra tem razão de ser porque, conforme entendimento pacificado no âmbito
do Col. Superior Tribunal de Justiça, “O juiz é o destinatário final das provas, a quem cabe
avaliar sua efetiva conveniência e necessidade, advindo daí a possibilidade de indeferimento das

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diligências inúteis ou meramente protelatórias [...]. Por essa razão, inexiste nulidade quando o
julgamento antecipado da lide decorre, justamente, do entendimento do Juízo a quo de que o feito
encontra-se devidamente instruído com os documentos trazidos pelas partes” (AgInt no REsp
1602667/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/03/2017,
DJe 11/04/2017).
Não havendo nulidades a serem sanadas ou preliminares a serem analisadas, passo,
de logo, ao exame do mérito.
E, nesse contexto, de logo, observo tratar-se, o presente caso, de típica relação de
consumo, pelo que a resolução da lide deverá receber os influxos das normas que compõem o
microssistema de proteção ao consumidor. Isso porque a parte autora caracteriza-se como pessoa
física que adquiriu/utilizou produto/serviço como destinatária final (artigo 2º do Código de Defesa
do Consumidor), enquanto a parte ré é típica fornecedora, nos termos do artigo 3º, § 2º, do mesmo
diploma legal, e do Enunciado nº. 297 da Súmula do Col. Superior Tribunal de Justiça.
E, conforme dispõe o artigo 6º, inciso VIII, do CDC, constitui direito básico do
consumidor a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a
seu favor, no processo civil, quando, a critério do Juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele
hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências.
Na presente hipótese, observo que não recaiu controvérsia acerca da relação
jurídica havida entre as partes, nem sobre a prescrição, ao requerente, de tratamento médico
especializado pelo método ABA-DENVER.
Cumpre, portanto, analisar a obrigação do operador de plano de saúde de custear
integralmente o mencionado tratamento.
Pois bem.
O Código de defesa do Consumidor, em seu artigo 51, § 1º, inciso I, presume
exagerada a vantagem do fornecedor que “restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes
à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou o equilíbrio contratual”.
Além disso, destaco que a indicação do tratamento adequado a ser empregado
compete exclusivamente ao profissional da saúde, não cabendo ao plano de saúde imiscuir-se em
tal mérito, sendo irrelevante o fato de os procedimentos não constarem do rol da ANS, pois este
serve apenas como orientador, a prever a cobertura mínima obrigatória em lista não taxativa, já
que representa previsão genérica sem qualquer comprometimento com cada quadro de saúde
apresentado, além de não acompanhar com a mesma celeridade a evolução da medicina.
Nesse mesmo sentido, o entendimento sumulado deste Eg. Tribunal de Justiça é no
sentido de que "havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de
custeiode tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no

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rol de procedimentos da ANS" (Enunciado nº. 102).
No caso dos autos, é incontroversa a prescrição, pelo psiquiatra responsável pelo
acompanhamento do quadro de saúde do autor, do tratamento multidisciplinar melhor descrito no
relatório de fl. 43, tudo com vistas ao bom desenvolvimento do infante.
Além disso, em tal documento constou que o tratamento médico e terapêutico
deveria ser prestado sem intervalos, noa havendo previsão de alta.
Nessa ordem de ideias, revela-se abusiva a limitação quantitativa aludida pela

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operadora de plano de saúde-ré, de 40 (quarenta) sessões por ano, na medida em que, mais uma
vez, cabe o médico responsável, e não à OPS, estabelecer o número e a frequência das sessões
terapêuticas a que se submeterá o paciente.
Tal limitação, a toda evidência, além de vulnerar a função social do contrato, põe
em risco a eficácia do tratamento e a própria saúde do autor-paciente-beneficiário do plano de
saúde, de modo a frustrar o fim último do negócio jurídico havido entre as partes.
Nesse mesmo sentido, por oportuno, colaciono:

AGRAVO INTERNO. Plano de saúde. saúde. Ação de obrigação de fazer.


Sentença de parcial procedência. Inconformismo de ambas as partes. Paciente
menor portador de Síndrome de Down. Súmulas 96, 100 e 102 deste Egrégio
Tribunal. Negativa de tratamento com método ABA, Musicoterapia, TO
Integração Sensorial, Fono e Psicopedagogia. Alegação de exclusão contratual
que é abusiva. O rol da ANS é meramente exemplificativo e não restritivo.
Negativa não pode prevalecer, pois restringe direitos fundamentais inerentes à
natureza do contrato. Inexistência de cláusula de reembolso. Honorários
sucumbenciais mantidos. Agravo interno apresentado que insiste em questões que
foram superadas com o entendimento adotado pela decisão, cujo esgotamento da
matéria impõe, por corolário lógico, a rejeição da pretensão recursal da
agravante, razão pela qual o inconformismo não procede, devendo ser mantida a
decisão objurgada. Recurso a que se nega provimento. (TJSP; Agravo Interno
Cível 1043463-05.2019.8.26.0100; Relator (a): José Rubens Queiroz Gomes;
Órgão Julgador: 7ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional II - Santo Amaro -
4ª Vara Cível; Data do Julgamento: 26/05/2020; Data de Registro: 26/05/2020)
(grifei)

Apelação. Plano de saúde. Ação de obrigação de fazer c.c. antecipação dos efeitos
da tutela. Autor portador de transtorno do espectro autista. Negativa de cobertura
de tratamentos (metodologia ABA) prescritos por psiquiatra, pelo fato de não
constarem no rol da ANS. Abusividade se há expressa indicação médica.
Compete ao plano estabelecer quais doenças são cobertas, mas não o tipo de
tratamento que o paciente deve ser submetido. Aplicação das súmulas 96 e 102
deste TJSP. Necessidade do paciente incontroversa. Afronta à regra do artigo 51,
IV e § 1º, II, do CDC. Cobertura devida. Exclusão contratual que contraria a
própria função social do contrato de plano de saúde. Limitação ao número de
sessões que também se mostra abusiva. Pretensão de custeio integral de despesas
com profissionais não credenciados. Ausência de prova de que a rede credenciada

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à requerida é insuficiente para a prestação do tratamento necessário ao autor.
Optando por atendimento em clínica particular, os reembolsos deverão obedecer
aos termos do contrato. Sentença mantida. Recursos desprovidos. (TJSP;
Apelação Cível 1081364-41.2018.8.26.0100; Relator (a): Coelho Mendes; Órgão
Julgador: 10ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 18ª Vara Cível;
Data do Julgamento: 25/05/2020; Data de Registro: 25/05/2020) (grifei)

APELAÇÃO. PLANO DE SAÚDE. OBRIGAÇÃO DE FAZER. Negativa de

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cobertura para o tratamento pelo método ABA, além de fonoaudiologia, terapia
ocupacional, entre outras especialidades. Necessidade dos autores (menores
impúberes), eis que portadores de Transtorno do Espectro Autista. Sentença de
procedência. Recurso da operadora. Não acolhimento. Cabe ao médico que
acompanha os pacientes e não ao plano de saúde determinar a terapêutica
adequada para a solução da moléstia, de modo que, havendo prescrição médica
e sendo a doença abrangida pelo contrato, a exclusão do tratamento indicado
deve ser considerada ilegal. Evidente abusividade na negativa praticada pela
operadora. Alegação de que teria ocorrido condenação ao custeio de tratamento
pretérito (ou seja, anterior à propositura da ação). Ausência de condenação neste
sentido. Sentença mantida. RECURSO IMPROVIDO. (TJSP; Apelação Cível
1017033-69.2017.8.26.0008; Relator (a): Silvia Maria Facchina Esposito
Martinez; Órgão Julgador: 10ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional VIII -
Tatuapé - 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 21/05/2020; Data de Registro:
21/05/2020) (grifei)

O caso é, portanto, de procedência dos pleitos aqui deduzidos.

III – Dispositivo
Por essas razões, com base no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil,
resolvendo o mérito, acolho os pedidos autorais para, confirmando a tutela de urgência deferida
às fls. 61/63, condenar a parte requerida a custear global e integralmente, seja através de sua rede
credenciada, seja através de reembolso, o tratamento médico e terapêutico multidisciplinar pelo
método ABA-DENVER prescrito à parte autora pelo psiquiatra responsável por acompanhar seu
quadro de saúde, até que haja alta médica ou outra hipótese de cessação do tratamento, sob pena
de aplicação de multa de R$ 1.000,00 (um mil reais) por negativa, até o limite de inicial de R$
10.000,00 (dez mil reais).
Defiro a gratuidade à parte autora, nos termos do artigo 98, caput e § 1º, do CPC.
Condeno a parte requerida ao pagamento das custas e dos honorários
advocatícios, no importe de 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa (artigo 85, § 2º,
do CPC).
Ciência ao Ministério Público.
Por fim, de modo a evitar a interposição de embargos de declaração
desnecessários, registre-se que ficam preteridas todas as demais alegações das partes, por
incompatíveis com a linha de raciocínio ora adotada, observando que os pedidos foram apreciados

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e rejeitados nos limites em que formulados. Assim, ficam as partes, de logo, cientes de que a
oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com caráter meramente
infringente acarretará a imposição da multa prevista no artigo 1.206, § 2º, do CPC.
Em caso de recurso o valor de preparo deverá corresponder a 4% (quatro por
cento) do valor atualizado da causa, sob pena de a parte recorrente ter de proceder ao recolhimento
em dobro, conforme estabelece o artigo 1.007, § 5º, do Código de Processo Civil, vedada a
complementação. De igual modo, deverá ser recolhido valor devido a título de porte de remessa e
retorno para processos físicos.

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Certificado o trânsito em julgado, e não requerido o cumprimento de sentença em
30 (trinta) dias, na forma do Provimento nº. 16/2016 (DJe de 04/04/2016), os autos irão ao
arquivo, exceto se se tratar de autos digitais.
P.I.
Guarulhos, 27 de maio de 2020.

DOCUMENTO ASSINADO DIGITALMENTE NOS TERMOS DA LEI 11.419/2006, CONFORME


IMPRESSÃO À MARGEM DIREITA

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