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A DOR NA CRIANÇA

DOR

É uma experiência sensorial e emocional desagradável e


complexa, associada a lesão tecidual real ou potencial, ou
É uma das expressões mais dramáticas da doença,
descrita em termos desta lesão.
sendo muitas consequências de procedimentos
É de forma inquestionável, uma sensação em parte ou partes realizados à criança.
do corpo, mas também sempre desagradável, sendo também
uma experiência emocional.

Estudos sugerem que o sub-tratamento da dor na criança está A exigência da dor na criança é influenciada por:
relacionado com: ▪ Idade da criança
• Práticas inconsistentes na avaliação da dor ▪ Nível de desenvolvimento
• Administração de analgésicos em níveis sub-terapêuticos ▪ Causa da dor

• Intervalos prolongados entre medicamentos ▪ Natureza da dor


▪ Capacidade da criança em expressar, de forma
• Falta de acompanhamento e avaliação sistemática da dor
significativa, a sua dor

Orientações da DGS:

1. A dor é uma experiência pessoal, multidimensional, 3. A gestão adequada da dor nos serviços de saúde é,
desagradável, com grande variabilidade na sua perceção atualmente, considerada pelas entidades acreditadoras,
e expressão, sem indicadores específicos e que a nível internacional, como padrão de qualidade, e passa
acompanha, de forma transversal, a generalidade das pela necessidade de implementação de programas de
situações que requerem cuidados de saúde. melhoria contínua da avaliação da dor nas crianças.
2. A avaliação da dor permite identificar e reconhecer a 4. O controlo da dor, cujo sucesso depende da sua
criança com dor, objetivar um fenómeno por natureza avaliação e reavaliação sistemáticas, é um dever dos
subjetivo, uniformizar a linguagem dentro da equipa de profissionais de saúde e um direito das crianças
saúde facilitando a tomada de decisões homogéneas, consignado, entre outros, na Carta da Criança
adaptar de forma personalizada o seu controlo e avaliar a Hospitalizada.”
eficácia das intervenções e sua correção em tempo útil.

RECOMENDAÇÕES: PERCEÇÃO DA DOR:

⇒ A dor na criança apresenta uma enorme variabilidade na Semanas de


Desenvolvimento do SNC
forma como se expressa, devido às especificidades de Gestação
cada grupo etário. Recetores sensoriais na região
⇒ À experiência de dor nas crianças estão frequentemente perioral, palmas das mãos e 7ª – 11ª – 15ª
associados o medo e a ansiedade, fatores que dificultam pernas
não só a avaliação da dor, mas também a tomada de Mielinização das fibras nervosas A partir da 22ª
decisão dos profissionais de saúde quanto à intervenção.
Mielinização do nervo
2ª e 3ª trimestre
⇒ É importante que os enfermeiros, em parceria com os nociceptivo na espinal medula e
da gestação
pais, saibam avaliar e interpretar o estado emocional da SNC
criança, de forma a intervir corretamente. Vias principais através das quais
as mensagens são transmitidas 30ª – 37ª
⇒ Reconhecer a individualidade da dor na criança e a sua
para o encéfalo
variabilidade, quer na perceção, quer na manifestação,
quer ainda nas respostas conseguidas, leva os Desenvolvimento do neocórtex 8ª
enfermeiros a prestar cuidados diferenciados, ajudando Substância P. gene da calcitonina 8ª – 10ª
a criança a lidar com cada situação de dor, facilitando a Segregação das Endorfinas 12ª – 14ª
sua expressão e planeando intervenções individualizadas
no sentido do autocontrolo.
MANIFESTAÇÕES DE DOR AGUDA

RECÉM-NASCIDO

Respostas Fisiológicas Respostas Comportamentais


Sinais Vitais – observar variações: Vocalização (quantidade, periocidade e duração)
‣ ↑ da FC ‣ Choro
‣ ↑ da TA ‣ Gemido
‣ Respiração rápida e superficial ‣ Lamentos

Oxigenação Expressão facial (características, tempo, orientação


‣ ↓ da Sat. Transcutânea do O2 (tcPO2) dos olhos e da boca)
‣ ↓ da Sat. Arterial do O2 (SaO2) ‣ Esgar (contração da boca ou rosto)
‣ Sobrancelhas franzidas
Pele (cor e características) ‣ Tremor no queixo
‣ Palidez ou rubor ‣ Olhos fechados fortemente
‣ Diaforese ‣ Boca aberta e em forma de quadrado
‣ Saudação palmar
Movimentos corporais e postura (tipo, quantidade,
Outras: qualidade, falta e relação com outros fatores)
‣ ↑ Tónus muscular ‣ Retraimento dos membros
‣ Pupilas dilatadas (midríase) ‣ Batimentos
‣ ↓ Tónus nervoso vagal ‣ Rigidez
‣ ↑ da pressão intracraniana ‣ Flacidez
‣ Hiperglicémia ‣ Punhos cerrados
‣ pH baixo
Mudanças de estado (sono, apetite, atividade)
‣ ↑ Corticosteroides
‣ Mudanças de sono – ciclos de vigília
‣ `` ao nível alimentar
‣ `` na atividade
‣ Inquietação, irritabilidade
‣ Apatia

LACTENTE (1os meses) LACTENTE

‣ Resposta corporal generalizada com rigidez, com ‣ Resposta corporal localizada com afastamento
afastamento local reflexo da área estimulada deliberado da área estimulante
‣ Choro forte ‣ Choro forte
‣ Expressão facial de dor: ‣ Expressão facial de dor ou raiva
▫ Sobrancelhas franzidas e juntas
‣ Resistência física (empurra o estímulo para fora
▫ Olhos fechados com força
▫ Boca aberta em forma de quadrado depois de aplicado)

‣ Não está demonstrado estímulos de aproximação


associados a dor subsequente
ESCOLAR

PRÉ–ESCOLALR ‣ Comportamentos do pré-escolar, durante os


‣ Choro forte procedimentos e não antecipadamente
‣ Expressões verbais (”au”, “ai”, “dói”) ‣ Comportamento de adiamento (ex: “espere só
mais 1 minuto”)
‣ Bater com os membros
‣ Rigidez muscular:
‣ Tentativas de afastar o estímulo antes de aplicado
▫ Punhos fechados
‣ Falta de cooperação (é necessária contenção física)
▫ Nós dos dedos esbranquiçados
‣ Exige o fim do procedimento ▫ Dentes cerrados
‣ Agarra-se aos pais, enf. ou pessoas significativas ▫ Membros contraídos
‣ Solicita apoio emocional (abraços, …) ▫ Rigidez corporal
‣ Pode ficar agitado e irritável com continuação da dor ▫ Olhos fechados
‣ Comportamentos antecipados ao procedimento doloroso real ▫ Testa enrugada
ADOLESCENTE ‣ Protestos vocais menores
‣ Menos atividade motora
‣ Mais expressões verbais (“dói”, “estás a magoar-me”)
‣ Tensão muscular e controlo corporal aumentado

AVALIAÇÃO DA DOR NA CRIANÇA

Orientações da DGS para uma BOA PRÁTICA:


▪ Acreditar sempre na criança que refere dor ▪ Acreditar sempre na criança que refere dor
▪ Privilegiar a autoavaliação a partir dos 3 anos, ▪ Privilegiar a autoavaliação a partir dos 3 anos,
sempre que possível sempre que possível
▪ Dar tempo à criança para expressar a sua dor ▪ Dar tempo à criança para expressar a sua dor
▪ Ter sempre presente o comportamento habitual da ▪ Ter sempre presente o comportamento habitual da
criança ou de uma criança sem dor da mesma idade criança ou de uma criança sem dor da mesma idade
▪ Dialogar com a criança (a partir dos 3 anos), ▪ Dialogar com a criança (a partir dos 3 anos),
pais/cuidador principal, observar a criança e utilizar pais/cuidador principal, observar a criança e utilizar
um instrumento de avaliação da dor um instrumento de avaliação da dor

ORIENTAÇÕES ESPECÍFICAS – DGS

Histórias da Dor.. Avalização da Intensidade da Dor..


Colheita de informação que permite orientar a avaliação e o Quantificação da sensação dolorosa através de
controlo da dor, utilizando fontes de informação instrumentos válidos, seguros e clinicamente sensíveis,
documentais, associada à observação e à entrevista dos tendo em conta o tipo de dor, situação clínica e idade da
pais/cuidador principal e da criança a partir dos 3 anos, criança. De acordo com a idade e por ordem de prioridade,
considerando determinados parâmetros recomenda-se a utilização dos seguintes instrumentos:
- Características da dor – localização, intensidade, • Recém-Nascidos
qualidade, duração, frequência e sintomas associados - Échelle de Douleur et d’Inconfort du Nouveau-Né
- Fatores de alívio e de agravamento (EDIN), referência para Unidades de Cuidados
- Uso e efeito de medidas farmacológicas e não Intensivos Neonatais
farmacológicas - Neonatal Infant Pain Scale (NIPS), mais apropriada
para prematuros e recém-nascidos de termo
- Formas de comunicar/expressar a dor
- Premature Infant Pain Profile (PIPP), útil para a
- Experiências anteriores traumatizantes e medos avaliação da dor em procedimentos
- Habilidades e estratégias para enfrentar a dor e - Neonatal Pain, Agitation & Sedation Scale (N-
outros problemas de saúde PASS), útil para recém-nascidos em ventilação
- Comportamento da criança e ambiente familiar assistida.
- Efeitos da dor na vida diária • Crianças < 4 anos ou sem capacidade para verbalizar
- Impacto emocional e socioeconómico - Face, Legs, Activity, Cry, Consolation (FLACC)
• Crianças entre 4 e 6 anos
- Face Pain Scale - Revised (FPS-R), válida a partir
dos 4 anos
- Escala de Faces de Wong-Beker, válida a partir dos
A avaliação deve ser feita de forma regular e sistemática 3 anos
a todas as crianças, desde o primeiro contacto. No caso
da criança internada, a avaliação deve ser feita, pelo • Crianças a partir dos 6 anos
menos, uma vez em cada turno (8 horas). - Escala Visual analógica (EVA)
- Escala Numérica (EN)
- Face Pain Scale - Revised (FPS-R)
- Escala de Faces de Wong-Beker
• Crianças com multideficiência
- Face, Legs, Activity, Cry, Consolation Revised
(FLACC-R)
INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM

As intervenções devem ser pautadas pelo respeito e garantia dos direitos das crianças, sendo elas:

• Ter atenção à idade da criança e ao seu desenvolvimento


cognitivo • Não utilizar expressões com as quais a criança se possa
• Negociar a presença do pai/mãe ou de alguém significativo sentir humilhada, tais como: «pareces um bebé a
chorar» ou «um homem não chora», comparando-a
• Facilitar a segurança e proteção pelos pais
com outras crianças
• Permitir que os pais decidam o tipo de colaboração que
• Ajudar a criança a participar no controlo da sua dor
pretendem dar, tendo em conta o papel parental desejado
no momento • Atribuir à criança algum controlo sobre o tratamento
• Sempre que possível, assegurar que os procedimentos • Proporcionar o «falar consigo próprio
sejam executados pelo enfermeiro com quem a criança/ • Dar feedback positivo
família já tem uma relação de confiança estabelecida • Permanecer junto da criança após um procedimento
• Dar informação à criança de forma simples e exata sobre o doloroso
que irá ser feito • Planear os cuidados de forma a manipular/incomodar
• Nunca usar procedimentos médicos ou de enfermagem o menor número de vezes possível
como ameaça • Agrupar os procedimentos ou terapêuticas dolorosas e
• Ser honesto providenciar que sejam feitos com analgesia
• Ajudar a criança a fazer perguntas e exprimir sentimentos
• Não dar à criança falsa confiança e tranquilidade em relação
ao procedimento doloroso, dizendo que “não vai doer nada”

1. Toma como foco de atenção a dor na criança e adota as estratégias ao seu alcance para prevenir e
controlar a dor em todas as situações que provoquem sofrimento sensorial e/ou emocional.

2. Critérios:
• Recolhe informações sobre a história da dor • Informa a criança e família sobre estratégias de
• Valoriza os relatos de dor controlo da dor
• Avalia a dor nas crianças pré-verbais ou com incapacidade, • Utiliza estratégias de controlo de dor de acordo com
utilizando escalas de heteroavaliação a situação
• Ensina a criança sobre a utilização de escadas de avaliação • Utiliza estratégias não farmacológicas em
complementaridade com as farmacológicas no
• Diagnosticada a dor
controlo da dor
• Planeia intervenções, incorporando a informação sobre a
• Envolve a família nas estratégias de controlo da dor
história de dor
• Reporta alterações do diagnóstico de dor
• Adota estratégias para prevenir a dor
• Documenta o resultado das intervenções
• Monitoriza a intensidade da dor com recurso a escalas
adequadas
• Avalia sinais fisiológicos e comportamentais de dor

CONTROLO E GESTÃO DA DOR


No controlo e a gestão da dor na criança devem utilizar-se mais
do que um processo e recorrer à combinação de diferentes
métodos farmacológicos e não farmacológicos

Intervenções Interdependentes Intervenções Autónomas


INTERVENÇÕES NÃO FARMACOLÓGICAS

RECÉM-NASCIDO
• Redução da incidência da luz e do ruido ambiental • Contacto físico dos pais com o RN (mãe)
• Preservação dos períodos mais longos de sono e repouso • Método canguru
• Posicionamento adequado do RN • Sucção não nutritiva
• Concentração das manipulações • O leite materno
• Massagem terapêutica • Administração de sacarose a 24%
• Embalo “colinho”
Os cuidados devem ser orientados para as necessidades do
RN, promovendo o seu conforto, estabilidade, reduzindo o
stress e as eventuais consequências das intervenções
ambientais e terapêuticas

CRIANÇA E ADOLESCENTE

Intervenções Intervenções Intervenções


Cognitivas Comportamentais Cognitivo-Comportamentais

Fornecimento de informação antecipatória Distração comportamental - promover combinam pelo menos uma
Distração - técnica que direciona a a realização de exercícios (a realização intervenção cognitiva e uma
atenção para situações não relacionadas de atividades físicas antes dos comportamental
com o procedimento doloroso. procedimentos dolorosos deixa a criança Estas intervenções visam modificar
mais relaxada e menos preocupada. os processos cognitivos da criança
Reforço positivo - técnica que promove o
Relaxamento muscular - estratégia que de forma a atenuar a sua perceção
elogio da criança ou recompensa após
prepara a criança para uma situação de dor, com base no pressuposto
procedimentos dolorosos, quando utilizou
estressante ou desagradável, como é o de que as cognições ou avaliações
estratégias positivas para o alívio da dor
caso das situações dolorosas, ajudando- da pessoa acerca de determinados
Imaginação guiada - técnica em que se eventos ou situações influenciam o
a a controlar a ansiedade associada ao
procura obter uma sensação de bem-estar modo como ela sente e percebe
acontecimento.
e relaxamento através da indução de um tais procedimentos
estado de concentração, intensificado - Exercícios de respiração
numa ideia ou imagem particular. diafragmática
- Exercícios de relaxamento muscular
Simulação ou modelação - demonstração
progressivo
e/ou simulação do procedimento por
outra criança ou adulto, demonstrando - Exercícios de relaxamento ativo
comportamentos de confronto positivo da
situação.

INTERVENÇÕES FARMACOLÓGICO

Dor Ligeira a Moderada


Fármacos Dosagem
• Estão indicados os medicamentos não opiódes, incluindo o
10-15mg/kg/dose a cada 4-6h
paracetamol e ao anti-inflamatórios não esteroides Acetaminofeno Não mais de 5 doses em 24h ou
• Atuam sobre o Sistema Nervoso Periférico 75mg/kg/dia por via oral

Trissalicilato Crianças <37kg: 50mg/kg/dia


dividido em 2 doses
de colina e
Dor Moderada a Severa Fármacos Crianças >37kg: 2250mg/kg/dia
magnésio
dividido em 2 doses
• Estão indicados opiódes Morfina Crianças >6 meses: 5-
• Atuam sobre o Sistema Nervoso Ibuprofeno 10mg/kg/dose a cada 6-8h, não
Fentanil
Central mais de 40mg/kg/dia
Codeína
Crianças: >2anos: 5,7mg/kg/dose
Hidromorfona Naproxeno
a cada 8-12h
Hidrocodona e Crianças: >2anos: 5,7mg/kg/dose
Tolmetim
acetaminogeno a cada 6-8h

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