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Nota Prévia:

Estes são os apontamentos de DIREITO ADMINISTRATIVO, disponibilizados pela


Comissão de Curso dos alunos do 2o ano da licenciatura em Direito da Faculdade de
Direito da Universidade do Porto, para o mandato de 2022/2023.

Foram elaborados pela aluna Francisca Ribeiro, tendo por base as aulas e documentos
disponibilizados pela docente Juliana Coutinho. Salienta-se que estes apontamentos são
apenas complementos de estudo, não sendo dispensada, por isso, a leitura das obras
obrigatórias e a presença nas aulas.

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Índice:

Informações relevantes ......................................................................................................5

Administração Pública ≠ administração pública ...............................................................5

Administração Pública ...................................................................................................5

administração pública ....................................................................................................6

Discricionariedade .............................................................................................................9

Fontes de Direito Administrativo ....................................................................................11

Qualificação dos Sistemas de Direito Administrativo e de Administração Pública........13

Acórdão Francovich, 19 de novembro de 1991 ...............................................................15

Casos Práticos – Grupo I .................................................................................................17

Caso Prático nº1 ...........................................................................................................17

Princípios Gerais da Atividade Administrativa ...............................................................18

Caso prático nº2 ...........................................................................................................21

Caso prático nº3 ...........................................................................................................25

Caso prático nº4 ...........................................................................................................26

Caso prático nº5 ...........................................................................................................27

Mecanismos Preventivos da Garantia da Imparcialidade ................................................28

Caso prático nº6 ...........................................................................................................31

Organização Administrativa ............................................................................................33

Administração Pública do Estado ................................................................................34

Administração Pública Municipal................................................................................36

Caso Prático nº6 ...........................................................................................................38

Casos Práticos – Grupo II ................................................................................................40

Pergunta 1 e 2...............................................................................................................40

Pergunta 3 ....................................................................................................................42

Pergunta 4 ....................................................................................................................43

Pergunta 5 ....................................................................................................................43

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Pergunta 6 ....................................................................................................................44

Pergunta 7 ....................................................................................................................44

Pergunta 8 ....................................................................................................................45

Pergunta 9 ....................................................................................................................45

Pergunta 10 ..................................................................................................................46

Pergunta 11 ..................................................................................................................46

Caso Prático nº1 ...........................................................................................................49

Delegação e Subdelegação de Poderes ............................................................................50

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Aula 06.10

Informações relevantes:

• A professora colocará, nos sumários de cada aula, a bibliografia necessária para


essa aula.
• É muito importante ler, para além da bibliografia obrigatória e recomendada,
jurisprudência.
• Dia 20 de outubro não haverá aula prática – data de reposição a ser definida ainda.

Administração Pública ≠ administração pública


Administração Pública – sentido orgânico e subjetivo, tendo por referência o conjunto
de pessoas coletivas que integram a administração pública e exercem o Direito
Administrativo.

Estas pessoas que integram a administração pública são:

• O Estado – pessoa por excelência


• As Regiões Autónomas
• As Autarquias Locais – municípios, freguesias e regiões administrativas
• As Fundações Públicas – como a Universidade do Porto
• Os Institutos Públicos
• As Empresas Públicas – Ordem dos Advogados, Área Metropolitana do Porto
• As Empresas Locais – detidas pelos municípios, em conjunto ou individualmente

As empresas públicas são empresas privadas com influência pública dominante. A


influência pública dominante é um conceito legal, que se traduz na detenção por uma
pessoa coletiva pública da maioria do capital social (isto é, pelo menos 51%) de uma
empresa, ou a titularidade do direito de designar ou destituir a maioria dos membros do
Conselho de Administração e Fiscalização de uma empresa.

Um exemplo de uma empresa local é a Porto Vivo, SRU – Sociedade de Reabilitação


Urbana do Porto S.A., uma empresa local cujo capital social está distribuído pelo
município do Porto, que detém 60% do mesmo, e pelo Estado, que detém os restantes

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40%. Se o Estado tivesse mais capital social do que o município, esta já seria uma empresa
pública.

Podemos organizar estas pessoas coletivas por:

• Pessoas coletivas públicas


o Estado
o Regiões Autónomas
o Autarquias Locais
o Fundações Públicas
o Institutos Públicos
o Autoridades Reguladoras Independentes
o Associações Públicas

• Pessoas coletivas privadas, sujeitas a influência pública dominante


o Empresas Locais
o Empresas Públicas

As empresas públicas podem constituir a forma de:

I. E.P.E. – Entidades Públicas Empresariais, uma empresa que constitua esta forma,
é uma pessoa coletiva pública, como por exemplo, o Hospital de São João.
II. S.A. – Sociedade Anónima, são pessoas coletivas privadas sob influência pública
dominante.

administração pública – sentido material, corresponde à atividade desempenhada pelas


entidades que exercem a Administração Pública.

Todas as entidades que integram a Administração Pública exercem a função


administrativa. Podem existir, no entanto, pessoas coletivas que exerçam a função
administrativa, mas que não correspondem a entidades que integram a Administração
Pública, porque não são pessoas coletivas públicas nem pessoas coletivas privadas
sujeitas a influência pública dominante, são as pessoas coletivas privadas. São exemplos

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de pessoas coletivas privadas as concessionárias (como a BRISA), ou os IPSS
(Instituições Particulares de Solidariedade Social, não se podem qualificar como fins de
interesse público, mas têm fins relevantes para a prossecução de fins de interesses
públicos, e também possuem regimes específicos).

Para além dos sujeitos que a integram, é relevante perceber no que se traduz a atividade
da administração pública. A administração pública, em sentido material, traduz-se, para
além da atividade administrativa, na prática de:

I. Atos Jurídicos – são atos que produzem efeitos jurídicos. Podemos agrupá-los em
três categorias fundamentais, mas que não esgotam os atos jurídicos, ou seja, são as
três categorias principais, mas não são as únicas:
a. Ato Administrativo – ato concreto, a produção dos seus efeitos jurídicos
acontece em situações individuais e concretas. O seu regimento está explicito no
CPA. Alguns exemplos são a decisão dos SASUP quanto ao requerimento da
bolsa de estudos; uma licença de construção; uma contraordenação estradal.
b. Regulamento Administrativo – normas gerais e abstratas, emanadas no
exercício da função administrativa.
c. Contrato Administrativo – negócios jurídicos com, pelo menos, dois sujeitos,
em que pelo menos um dele é contraente (não é necessário ser uma pessoa
coletiva pública, pode ser uma pessoa coletiva privada com influência pública
dominante), e é regido por normas de Direito Administrativo. Essas normas de
DA podem ser as que estão regidas no Código dos Contratos Públicos ou não,
dependendo do contrato. São exemplos de contratos administrativos os contratos
de trabalho dos funcionários públicos.

II. Atos Não Jurídicos – atos que não produzem efeitos jurídicos, apesar de poderem
ser juridicamente relevantes. Um exemplo é uma ordem de demolição que não é
cumprida pelo proprietário do edifício, mas ocorre a operação de demolição – a
operação é um facto não jurídico, embora se funde num ato jurídico anterior, mas
pode ser juridicamente relevante se, no exercício da operação, alguém for atingido
com uma pedra caída do edifício durante a demolição.

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O exercício da função administrativa é controlado pelo exercício da função jurisdicional,
em especial pelos tribunais de função administrativa e fiscal, sobretudo, mas não
exclusivamente. À partida, os litígios que respeitam as relações jurídico administrativas,
ou seja, relações jurídicas que dizem respeito à ordem administrativa, chegam aos
Tribunais Administrativos, mas encontramos um conjunto de situações pontuais que se
reportam a outros tribunais. Este regime está previsto no artigo 212º, nº3 da CRP e no
artigo 4º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF).

Os tribunais fiscalizam a legalidade da administração pública, ou seja, de todas as


suas normas, regras e princípios jurídicos (internos – leis, em sentido formal, mas também
regulamentos; e externos – normas de Direito Internacional Público e Direito da União
Europeia), mas esta não representa a única forma de fiscalização. Existe, desde logo, a
possibilidade de fiscalização por parte dos administrados, feita através de
requerimentos para que a administração pública fiscalize os atos por ela própria
praticados.

Exemplo: a bolsa de estudo dos SASUP é indeferida, podemos reclamar ao autor do ato
de indeferimento ou ao seu superior hierárquico uma segunda revisão do pedido, e não
recorremos diretamente aos tribunais.

Por outro lado, é possível que a administração pública fiscalize o seu próprio trabalho,
sem intervenção externa, no caso, por exemplo, de um funcionário se aperceber que um
determinado regulamento que costuma aplicar é ilegal.

Também pode existir, ainda, controlo de uma pessoa coletiva pública a outra, através
de dois mecanismos:

• Tutela – controlo a posteriori, faz-se relativamente à atividade que já foi


executada, como por exemplo, a tutela de mera legalidade, exercida pelo Estado
às autarquias locais, realizando um conjunto de inspeções onde se procura
verificar se, no exercício da sua atividade, foi cumprido o principio da legalidade.
• Superintendência – controlo antes ou na pendência do exercício da atividade a que
se dirigem.

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Aula 13.10

Discricionariedade
A diversidade de entidades cria dificuldades no âmbito da aplicação do Direito
Administrativo, obrigando a uma articulação entre critérios orgânicos e subjetivos e entre
critérios materiais e funcionais. Existe uma vinculação total no que diz respeito aos
meios e fins no exercício da atividade administrativa, sem prejuízo da escolha do
legislador lhe fornecer espaço de ação, dependente de uma previsão da lei.

A discricionariedade, prevista na lei, é uma concessão dada pelo legislador à


administração pública, que permite um “espaço de manobra”, de acordo com os critérios
definidos na Constituição da República Portuguesa (CRP). As competências que são
atribuídas aos órgãos das pessoas coletivas que exercem administração pública também
estão previstas na lei, sendo que estas podem ser vinculadas ou discricionárias: quando
são vinculadas, podem resumir-se a um estrito exercício de aplicação; são discricionárias
quando o legislador define e configura nesse sentido.

NOTA: o professor Pacheco de Amorim tem uma conceção diferente no que toca a
conceitos indeterminados e discricionariedade.

Esta relação entre o exercício da função administrativa e a administração pública, é uma


relação muito particular, que não existe quando falamos de relações jurídico privadas,
porque a vinculação não é tão intensa.

Quais são as premissas que devemos considerar para decidir entre a aplicação de um
regime de Direito Administrativo ou um regime de Direito Privado?

I. Quando está em causa o exercício da função administrativa por pessoas coletivas


públicas que desempenham atividade de caráter não empresarial ou atividade
de administração pública em sentido clássico, o regime jurídico regra aplicável é
um regime de Direito Administrativo.

Existem, inclusive, autores que defendem uma reserva constitucional de Direito


Administrativo para estes casos, em que o legislador ordinário na definição dos estatutos
de pessoas coletivas públicas não pode inverter esta regra, ou seja, é inconstitucional a
sujeição de pessoas coletivas públicas que desempenhem atividade de caráter não

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empresarial a um regime regra que não seja o regime de Direito Administrativo, porque
existe uma indicação de Direito Constitucional nesse sentido.

Exemplo: a Universidade do Porto é uma pessoa coletiva pública com regime de Direito
privado. O legislador por vezes autoriza a optar pela aplicação de normas de Direito
Administrativa ou normas de Direito privado, não lhe impondo a aplicação, apenas
concedendo essa possibilidade. Estas exceções são, nomeadamente, gestão de recursos
humanos (como a contratação de funcionários) e a gestão financeira e patrimonial.

II. Quando estão em causa entidades que desempenham atividade de caráter


empresarial (operadores económicos), independentemente da sua identidade
jurídica ser de caráter público ou privado, temos de fazer uma distinção entre
diferentes domínios:

a. Numa relação entre empresas públicas ou locais e os seus fornecedores e


clientes (outros operadores económicos num contexto de mercado
concorrencial), o Direito aplicável é o Direito privado. Não poderia ser de outra
forma, uma vez que decorre do direito da concorrência imposto pela União
Europeia.

b. No que diz respeito ao relacionamento que se estabelece entre uma empresa


pública e uma empresa local com a pessoa pública que a constituiu, ou seja,
o Estado e um município, que possuem poderes de controlo efetivo sobre estas
empresas, o Direito aplicável é o Direito Administrativo. Este regime
aplicável está definido no Decreto-Lei 133/2013, de 3 de outubro, para as
empresas públicas, e no Decreto-Lei 50/2012, de 31 de agosto, para as empresas
locais.

Pode suceder que as empresas públicas e as empresas locais exerçam poderes


públicos de autoridade. Isso é meramente eventual e depende da delegação prévia
da conceção de poderes públicos de autoridade a essas empresas, porque, como são
empresa, não lhes é inerente a capacidade jurídica para praticar atos de autoridade.
Isto coloca-se mesmo no caso das EPE.

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Quando falamos de poderes públicos de autoridade falamos da capacidade de
elaborar regulamentos e praticar atos administrativos. Quando a empresa beneficia
de poderes públicos de autoridade para a prática de atos administrativos, é lhe
aplicado o regime de Direito Administrativo, mais concretamente o estabelecido
no Código de Procedimento Administrativo (CPA). Desta forma, se do ato
administrativo praticado resultarem prejuízos geradores de responsabilidade civil
extracontratual, o regime aplicável não é o estabelecido no Código Civil (CC), mas
o da Lei 67/2007, de 31 de dezembro.

III. Pessoas coletivas privadas desprovidas de qualquer influência pública


dominante, que façam administração pública, como acontece com as
concessionárias. A atividade das concessionárias é regida, essencialmente, por
Direito privado, e só lhes são aplicadas normas de Direito Administrativo no que se
refere ao contrato de concessão celebrado e à execução desse contrato.

Essas normas de Direito Administrativo são as previstas no Código dos Contratos


Públicos, que podem ser concedidos no âmbito do contrato de concessão (CPA) e
quando haja lugar a responsabilidade civil extracontratual associada à prática destes
poderes públicos de autoridade, caso em que lhes é aplicado o regime da Lei
67/2007.

Sempre que esteja em causa o exercício da função administrativa, independentemente da


pessoa coletiva e do tipo de regime jurídico aplicável, existe uma vinculação da entidade
que atua aos princípios gerais da atividade administrativa, previstos no artigo 266º
da CRP e nos artigos 3º e seguintes do CPA.

Fontes de Direito Administrativo

1. Fontes internas
• CRP
• Lei em sentido formal – Lei, Decreto-Lei e Decreto Legislativo Regional

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• Regulamentos administrativos – têm competência para os elaborarem, para além
do Estado, os municípios, as freguesias, as autoridades reguladores
independentes, os institutos públicos, as associações publicas e as fundações
públicas

2. Fontes externas
• Direito Internacional Público
• Direito da União Europeia

O Direito Internacional Público e o Direito da União Europeia relacionam-se com o


Direito interno nacional infraconstitucional, nos termos do artigo 8º da CRP. O
Direito da União Europeia é o que apresenta mais relevância no Direito
Administrativo, através do Princípio da Cooperação Leal dos Estados membros
com a União Europeia, previsto no artigo 4º do Tratado da União Europeia (TUE).
Este princípio refere que, no relacionamento entre normas, concretiza-se o Princípio
do Primado ou do Efeito Útil do Direito da União Europeia, que ao longo dos anos
foi densificado pelo Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) sob vários
subprincípios:

a. Subprincípio do Efeito Direito – os cidadãos de qualquer Estado membro


podem invocar direitos que lhe são reconhecidos por normas de Direito da
União Europeia perante outros cidadãos, perante o Estado ou perante a
Administração Pública. Podemos reconhecer o efeito direito horizontal, quando
acontece entre particulares, e o efeito direito vertical, quando é um particular a
invocá-lo perante o Estado ou a Administração Pública.
b. Subprincípio da Prevalência da Aplicação ou Aplicação Prevalente – impõe à
Administração Pública e aos tribunais que, quando verifiquem a existência de
uma norma nacional que é desconforme com uma norma de Direito da União
Europeia, desapliquem a norma de Direito interno e apliquem a norma de
Direito da União Europeia. Este é um exercício que se impõe tanto à
Administração Pública como aos tribunais.
c. Subprincípio da Interpretação Conforme – através da aplicação dos critérios
interpretativos chegamos a um certo sentido, sendo vários os sentidos possíveis.

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No caso de uma norma plurissignificativa, o intérprete, de acordo com este
princípio, é obrigado a escolher o sentido que é mais conforme com o Direito
da União Europeia.
d. Subprincípio da Aplicação Uniforme – as normas de Direito da União Europeia
são aplicadas da mesma forma em todos os Estados membros. Isto consegue-se
através do mecanismo denominado como Reenvio Prejudicial, previsto no
artigo 267º do TFUE. Segundo este critério, no caso da redação das normas não
ser clara, o juiz deve fazer reenvio prejudicial para o TJUE, tendo de aceitar a
decisão tomada por este. Se o juiz estiver obrigado a fazer reenvio prejudicial e
não o fizer, está sujeito a responsabilidade civil extracontratual pelo exercício
da função jurisdicional por erro grosseiro – artigo 13º da Lei 67/2007.

Se o legislador nacional violar normas de Direito da União Europeia,


aprovando leis em sentido formal desconformes com este Direito, pode haver
lugar a uma ação de incumprimento junto do TJUE, e também a
responsabilidade civil extracontratual do Estado pelo exercício da função
legislativa – artigo 15º da Lei 67/2007.

Para além disto, se a Administração Pública aplicar uma norma de Direito


nacional desconforme com uma norma de Direito da União Europeia, também
há lugar a responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos.

Estes subprincípios não estão presentes em nenhum artigo ou norma concreta, têm
como base jurisprudência do TJUE.

Qualificação dos Sistemas de Direito Administrativo e de Administração Pública

• Sistema de tipo judiciário – influência britânica


• Sistema de tipo executivo – influência francesa

Por influência do Direito da União Europeia, existe uma aproximação do Direito


Administrativo nacional dos Estados membros, pelo que houve uma aproximação entre

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estes dois sistemas, o que levou a que os diversos critérios de distinção que existiam
inicialmente, como o da organização administrativa, se fossem atenuando e perdendo
relevância, mantendo-se apenas dois. Portanto, atualmente, a distinção entre os dois
sistemas faz-se com base em dois critérios:

1. Unidade ou Dualidade de Jurisdições – no sistema de tipo britânico, existe


uma unidade de jurisdições, ou seja, um tipo de tribunais que decidem e aplicam
todo o Direito, inclusive o Direito Administrativo. Por outro lado, no sistema de
tipo francês, existe uma dualidade de jurisdições, a jurisdição dos tribunais
comuns e a jurisdição dos tribunais administrativos, que têm competência para
diminuir litígios no âmbito das relações administrativas nos termos dos artigos
203º, nº3 da CRP e 4º do ETAF.
2. Princípio Geral do Privilégio da Execução Prévia – em face do incumprimento
espontâneo de um ato administrativo pelo seu destinatário, o privilégio permite
proceder imediatamente à execução coerciva desse ato administrativo sem
necessidade de recorrer previamente aos tribunais. No sistema de tipo britânico,
esta possibilidade de execução imediata é a exceção, ou seja, à partida é
necessário recorrer aos tribunais perante o incumprimento voluntário do
destinatário. No sistema de tipo francês, em regra, pode proceder-se
imediatamente à execução coerciva do ato que não foi cumprido
voluntariamente pelo destinatário e, apenas quando a lei o exige, é necessário
recorrer aos tribunais.

Em Portugal existe uma dualidade de jurisdições, pelo que se inseria no sistema francês.
Mas, no que se refere ao privilégio da execução prévia, ele continua como principio geral
ou é exceção?

Para responder a esta questão, consultar: artigo 176º do CPA; artigos 6º e 8º do Decreto-
Lei 4/2015 que aprova o CPA em anexo; artigo 149º do CPA de 1991 – para discussão
na próxima aula.

Aula 27.10

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Em Portugal existe uma dualidade de jurisdições, pelo que se inseria no sistema francês.
Mas, no que se refere ao privilégio da execução prévia, ele continua como principio
geral ou é exceção?

De forma a responder à questão colocada, temos de analisar os artigos referidos.

Artigo 176º do CPA -» a menos que se trate de obrigações pecuniárias, casos onde é
sempre possível a execução prévia, ou sem prejuízo de serem invocadas razões de
interesse público. Quando se invoca a necessidade urgente, também se pode executar
coercivamente o ato administrativo.

Artigo 176º
Legalidade da Execução

1. Sem prejuízo do disposto no nº2 do artigo anterior, a satisfação das obrigações e o respeito
por limitações decorrentes de atos administrativos só podem ser impostos coercivamente
pela Administração nos casos e segundo as formas e termos expressamente previstos na lei,
ou em situações de necessidade pública, devidamente fundamentada.
2. A execução coerciva de obrigações pecuniárias é sempre possível, nos termos do artigo 179º.

Nos demais casos, a norma remete para outras leis e, desta forma, parece ser excecional.
Assim, é necessário articular com outros artigos.

Apesar do artigo 176º consagrar com exceção o privilégio da execução prévia, a


legislação de que depende este segmento não foi aprovada, logo aplica-se o artigo 149º
do CPA de 1991, que prevê o privilégio da execução prévia como princípio geral.
Atualmente, é possível executar coercivamente os atos sem necessidade prévia de recorrer
aos tribunais, apenas acontecendo se existir uma norma especial.

Acórdão Francovich, 19 de novembro de 1991


Esta diretiva prevê um auxílio remuneratório a trabalhadores que tenham um vinculo
laboral com empresas que, entretanto, tenham entrado em situação de insolvência.

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Assim que há uma diretiva europeia, para os Estados membros resulta um dever de
transposição, que é satisfeito pela função legislativa. No entanto, pode acontecer
devido ao subprincípio do efeito direito que, mesmo antes de uma diretiva seja transposta
para o ornamento jurídico nacional, haja possibilidade de particulares junto a particulares
ou perante a Administração Pública, recorrerem aos tribunais e invocarem uma diretiva
que ainda não foi transposta. Mas, para tal, é necessário que as normas que conferem
esses direitos sejam claras e precisas nessa configuração, e que esse Direito esteja
suficientemente concretizado de forma a ser invocado pelos cidadãos dos Estados
membros antes da transposição.

Neste caso, sucedia que o direito a receber uma remuneração a título compensatório
depois da insolvência, não estava na diretiva suficientemente concretizado, de forma a ser
invocado perante os Estados membros. Isso torna essencial a transposição da diretiva,
associando à não transposição danos na esfera jurídica desses trabalhadores, porque não
podem invocar o direito a serem compensados nos tribunais nacionais pela empresa
insolvente.

Por causa disto, invocaram uma ação por incumprimento do Estado junto do TJUE, sendo
que esse incumprimento foi o da não transposição da diretiva. O TJUE considerou este
incumprimento como precedente e condenou o Estado italiano a responsabilidade civil
extra contratual pela não transposição deste diretiva. Uma vez verificada esta
responsabilidade do Estado italiano por incumprimento de Direito da União Europeia,
este Estado foi condenado, também, ao pagamento de uma indemnização aos
trabalhadores desta empresa.

Independentemente da função que o Estado esteja a exercer, existe lugar a


responsabilidade civil extracontratual por incumprimento de Direito da União
Europeia, por força do princípio do primado ou da efetividade do Direito da União
Europeia, prevista pela Lei nº 67/2007.

NOTA: Diretiva vertical, quando atua contra o Estado ou Administração Pública; Diretiva
horizontal, quando atua contra particulares.

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Casos Práticos – Grupo I
O Código de Procedimento Administrativo é o regime geral, complementado por um
conjunto de normas especiais de Direito Administrativo que devem ser articuladas com o
CPA (como, por exemplo, o procedimento tributário, a expropriação de propriedade
pública, etc.), de acordo com o artigo 2º do CPA.

Competências são poderes funcionais atribuídos a um órgão, com vista na


prossecução de fins dessa pessoa coletiva, que há de ser um fim de interesse público.
Uma expressão equivalente a fim é atribuição.

As competências não se presumem, estão sempre presentes em normas. Neste caso,


no artigo 36º do CPA. Quando queremos perceber se uma competência é originária ou
discricionária, temos de ter sempre em consideração a norma habilitante, que prevê essa
mesma competência.

A discricionariedade é o espaço jurídico previsto pela norma a favor da Administração


Pública, no qual se antecipa a impossibilidade de, em abstrato, se prever a melhor solução
para o caso concreto. Se na Administração Pública existissem apenas competências
vinculadas teríamos uma má Administração Pública.

Caso Prático nº1


Artigo 89º do RJUE

1 – É o proprietário o sujeito desta alínea. Não é prevista nenhuma competência à câmara


municipal, apenas é imposto ao proprietário.

2 – Está prevista uma competência da câmara municipal, um poder discricionário, porque


o legislador utiliza o termo “pode”, o que confere à câmara a possibilidade de determinar
ou não a execução de obras necessárias à correção de más condições de salubridade ou
obras de conservação necessárias à melhoria do arranjo estético. Os aspetos
discricionários que podem ser previstos na norma são:

1. A possibilidade de exercer ou não essa competência – está aqui prevista


2. A possibilidade de exercer essa competência agora ou mais tarde – também está
aqui previsto “pode a todo o tempo”
3. Conteúdo e sentido da decisão propriamente dita do órgão

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Não são aspetos cumulativos, podem existir todos ou apenas um para a norma ser
discricionária.

Conceitos indeterminados neste numero:

1. O que são as obras necessárias


2. O que são más condições de segurança

Estes conceitos atribuem à norma uma estrutura aberta. O professor Pacheco de Amorim
entende que os conceitos indeterminados atribuem discricionariedade ao órgão. No
entanto, há doutrina que entende o contrario e considera que isso apenas excecionalmente
acontece porque, à partida, o que eles conferem é a interpretação da norma e a sua
aplicação ao caso concreto – ler Freitas do Amaral.

Independentemente da posição que se siga, o que acontece aqui é que a avaliação deve
ser feita por peritos ou implica a consulta por parte destes. Não é qualquer funcionário
que pode ordenar o proprietário a demolir um edifício. Existe um conjunto de
conhecimentos técnicos necessários para a verificação dos pressupostos da norma.

Assim, para se averiguar a existência das condições previstas no artigo 89º, nº2, tem de
existir um relatório de um perito. O preenchimento destes conceitos é preenchido através
de conhecimentos técnicos (discricionariedade técnica) que, no fundo, não são
discricionariedade porque acabamos por ter uma possibilidade de atuação em função da
avaliação técnica, e não múltiplas possibilidades.

3 – O mesmo se aplica a este número, ou seja, a “câmara municipal pode”, demonstra


possibilidade de exercer ou não essa competência. Desta forma, também é um poder
discricionário.

Princípios Gerais da Atividade Administrativa


Os princípios gerais da atividade administrativa são relevantes quando a competência é
ou não discricionária, mas são especialmente relevantes quando é discricionária porque
funcionam como parâmetro.

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Os princípios gerais da atividade administrativa não são os únicos princípios gerais que
devemos considerar:

1. Princípios de Organização Administrativa – artigos 6º e 267º da CRP


a. Principio da descentralização – criação de novas pessoas coletivas.
b. Principio da desconcentração – tem a ver com a distribuição de competências
entre órgãos de uma pessoa coletiva (“lá dentro”).
c. Principio da unidade de ação – funciona como limite à descentralização e
desconcentração, não o podemos fazer como se fosse um fim em si mesmo,
devemos perceber os benefícios para a Administração Pública.
d. Principio da autonomia local – respeita as autarquias locais, que têm
autonomia prevista no artigo 6º da CRP, o que significa que estão sujeitas a
uma tutela de legalidade por parte do Estado.
e. Principio da simplicidade da aproximação às populações – ideia de que deve
existir aproximação da Administração Pública ao cidadão, também na
dimensão eletrónica.

2. Princípios Gerais do Procedimento Administrativo – princípios que


disciplinam o procedimento administrativo, seja especial ou geral. Toda a
atividade administrativa é procedimentalizada. Este procedimento pode ser
disciplinado pelo CPA como regime geral e por outros diplomas em especial.
a. Principio da colaboração ou boa fé procedimental (artigo 60º) – colaboração
entre os sujeitos do procedimento, os particulares devem colaborar com a
Administração Pública, por exemplo, não apresentando documentos falsos,
não a induzindo em erro, comparecendo nas audições, etc.
b. Principio do inquisitório (artigo 58º) – fundamental de qualquer
procedimento administrativo. Qualquer tomada de decisão pressupõe que se
conheçam os verdadeiros pressupostos de facto para que não seja induzido
em erro. É na fase de instrução que a Administração Pública estabelece com
exatidão os pressupostos de facto que serão base da decisão a tomar,
procedendo à prova, que constitui um dever da própria Administração
Pública. A esta atitude procedimental ativa chama-se princípio inquisitório –
tem especial relevância nos artigos 115º e 116º.

19
c. Principio da audiência previa – os interessados devem ser sempre ouvidos de
forma a evitar surpresas – exemplos nos artigos 121º e 122º.
d. Principio da transparência – é servido de diversos mecanismos, sendo um
deles o direito à informação procedimental, ou seja, os interessados podem
requerer informações e consulta de documentos, e passagem de servidões
para o caso em que são interessados, de acordo com os artigos 82º a 85º do
CPA.

3. Princípios da Atividade Administrativa – projetam-se na forma como a


competência é exercida, ou seja, o ato jurídico a praticar no exercício de
determinada competência. Alguns deles estão previstos no artigo 266º da CRP, e
nos artigos 3º a 19º do CPA.

Uma das questões que se coloca quanto a este princípio é relativa ao seu âmbito de
aplicação, e a resposta desta pergunta é dada pelo artigo 2º do CPA.

Os princípios gerais de Direito Administrativo aplicam-se sempre,


independentemente do regime jurídico aplicável e da pessoa jurídica? Ver artigo
2º, nº2 do CPA.

O CPA divide-se em 4 partes. Os princípios gerais estão na primeira parte, mas não a
esgotam.

20
Artigo 2.º
Âmbito de aplicação

1 - As disposições do presente Código respeitantes aos princípios gerais, ao procedimento e


à atividade administrativa são aplicáveis à conduta de quaisquer entidades,
independentemente da sua natureza, adotada no exercício de poderes públicos ou
regulada de modo específico por disposições de direito administrativo.
2 - A parte II do presente Código é aplicável ao funcionamento dos órgãos da Administração
Pública.
3 - Os princípios gerais da atividade administrativa e as disposições do presente Código que
concretizam preceitos constitucionais são aplicáveis a toda e qualquer atuação da
Administração Pública, ainda que meramente técnica ou de gestão privada.
4 - Para efeitos do disposto no presente Código, integram a Administração Pública:
a) Os órgãos do Estado e das regiões autónomas que exercem funções administrativas a
título principal;
b) As autarquias locais e suas associações e federações de direito público;
c) As entidades administrativas independentes;
d) Os institutos públicos e as associações públicas.
5 - As disposições do presente Código, designadamente as garantias nele reconhecidas aos
particulares, aplicam-se subsidiariamente aos procedimentos administrativos especiais.

Aula 03.11

Caso prático nº2


Artigo 70º Código da Estrada – contraordenação por não pagamento de estacionamento

São as câmaras municipais quem define as zonas de estacionamento sujeitas ao


pagamento de taxas, através de regulamento administrativo. A cobrança da coima
correspondente ao não pagamento da taxa de estacionamento corresponde a um ato
administrativo também. Porém, não cabe aos tribunais administrativos apreciarem a
legalidade destes atos, apenas apreciam a legalidade de contraordenações tributárias, e de
ordenamento do território e de urbanismo – artigo 4º, nº1, L) do ETAF.

21
Toda a atividade administrativa é procedimentalizada. Como vimos, este
procedimento pode ser disciplinado pelo CPA, como regime geral, e por outros diplomas,
como regime especial, como é o caso da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas.

De acordo com esta lei, existe a possibilidade de serem aplicadas diferentes penas
disciplinares. Portanto, o procedimento disciplinar termina com:

• Decisão de arquivamento do procedimento disciplinar, quando não houve por


parte do trabalhador nenhum ilícito disciplinar.
• Ato administrativo que aplica uma determinada sanção disciplinar ao trabalhador,
quando se verifica ilícito disciplinar.

O legislador prevê um conjunto de sanções disciplinares diferentes, que têm em


consideração alguns critérios e alguns princípios de Direito Administrativo. Estas sanções
estão previstas no artigo 180º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, e são:

→ Repreensão escrita – apenas uma nota, do género dos avisos que os professores
enviavam para os encarregados de educação na escola.
→ Multa – pagamento de uma quantia pecuniária, sem que o trabalhador deixe de
exercer funções. Normalmente esta quantia é descontada no salário do
trabalhador.
→ Suspensão do exercício de funções – o trabalhador suspende o exercício de
funções e não recebe qualquer retribuição pelos dias em que não exerce.
→ Despedimento disciplinar ou demissão – ou seja, despedimento sem justa causa.
Não pode ser requerido por parte do trabalhador qualquer sanção remuneratória,
como o subsidio de desemprego.

A entidade empregadora deve, ao analisar o caso concreto, ter em atenção o principio da


proporcionalidade, consagrado no artigo 266º, nº2 da CRP e no artigo 7º do CPA.
Este princípio desdobra-se em três dimensões:

i. Necessidade da medida
ii. Adequação
iii. Exigência de que não seja excessiva face ao fim que se procura prosseguir

22
Neste caso, a medida aplicada parece ser manifestamente excessiva e, por isso, houve
violação do princípio da proporcionalidade.

A violação de princípios gerais da atividade da Administração Pública, afeta o ato


administrativo em causa de um vício que é material, e cuja consequência jurídica é, em
principio, a anulabilidade.

Os vícios podem ser:

• Invalidantes – afetam a validade do ato jurídico.


o Inexistência jurídica – mais grave. É residual, são raros os casos de
inexistência jurídica. A administração tem entendido que os atos são
inexistentes juridicamente se não cumprirem os requisitos mínimos do
artigo 155º, nº2 do CPA.
o Nulidade – previsto no artigo 161º do CPA, onde são previstos os atos
jurídicos praticados pela administração publica que o legislador considera
a nulidade como consequência jurídica.
o Anulabilidade – menos grave. O vicio invalidante regra é a
anulabilidade (se nada for dito contra), e isto resulta do artigo 163º, nº1
do CPA.

• Não invalidantes – não afetam a validade do ato jurídico.


o Vícios de ineficácia – o ato jurídico é válido, mas não produz os efeitos a
que tende porque não está preenchido um pressuposto de eficácia. Como
a ata (para atos de órgãos colegiais), a notificação (artigo 160º do CPA),
publicação.
o Irregularidade – é absolutamente excecional, só se verifica quando
prevista na lei. Um exemplo é o artigo 48º, nº2 do CPA – é um vicio de
irregularidade que tem consagrado o efeito que o legislador lhe atribui.

Primeiro, temos de considerar a norma violada e o tipo de norma que esta a ser
violada, para tentarmos perceber se o vício é orgânico/de competência, material ou
formal/procedimental. Esta distinção prende-se com o tipo de norma que está a ser violada
e a sua interpretação, ou seja, se em causa estiver a violação de uma norma de

23
competência é um vicio orgânico, se for uma norma procedimental é um vicio formal, e
se for uma norma que não se reconduz nem a uma norma de competência nem a uma
norma procedimental, estamos perante um vicio material.

Esta situação vale para tudo o que sejam atos da Administração Pública, a não ser
que sejam regulamentos administrativos, porque para estes, a distinção faz-se de outra
forma.

Para os regulamentos administrativos, os vícios são organizados por (artigo 143º):

• Inconstitucionalidade – quando viola uma norma da CRP.


o Material
o Formal
o Orgânico
• Ilegalidade reforçada – quando viola uma norma legal de valor reforçado, nos
termos do artigo 112º, nº3 da CRP.
o Material
o Formal
o Orgânico
• Ilegalidade simples – quando viola uma norma legal que não tem valor reforçado,
ou um outro regulamento administrativo a que deva obedecer por lhe ser
hierarquicamente superior (equivale aqui as normas de direito da união europeia).
o Material
o Formal
o Orgânico

Esta distinção entre vício formal, material ou orgânico, quando falamos em regulamentos
administrativos é relevante por causa do prazo. É importante perceber que regime
temos em cada caso, como está previsto nos artigos 143º e 144º do CPA.

Os regulamentos estão sempre sujeitos a um requisito de eficácia, que é a publicação


em Diário da República, nos termos do artigo 139º do CPA. Nos termos do artigo 140º
do mesmo diploma, os regulamentos entram em vigor na data estabelecida nos
regulamentos ou, se nada for dito, no quinto dia após a sua publicação.

24
Retomando a hipótese prática, há lugar à violação do principio da proporcionalidade
porque a sanção é excessiva relativamente ao ilícito praticado pelo trabalhador.

É um vicio material, invalidante, por isso aplicar-se-ia a anulabilidade, de acordo com o


163º, nº1 do CPA, ou aplicar-se-ia a nulidade, de acordo com o artigo 161º, nº2, d) do
CPA. A professora aceitaria as duas respostas, desde que devidamente justificado em que
medida o direito ao trabalho é posto em causa.

NOTA: A alínea d) do número 2 do artigo 161º do CPA deve ser lida de forma rigorosa,
sobre pena de tudo ser considerado um direito fundamental.

Caso prático nº3 (nº2 na ficha atual)

O contrato de arrendamento é um negocio jurídico entre, pelo menos, dois contraentes,


sendo que, neste caso, um dos contraentes é um município, isto é, uma pessoa coletiva
pública. Pelo facto de um dos contraentes ser um contraente público, trata-se de um
contrato público. Dentro dos contratos públicos, temos de distinguir:

• Contratos públicos de Direito privado – sujeitos a regime de direito privado,


designadamente pelo código civil.
• Contratos públicos administrativos – sujeitos a regime de Direito
Administrativo. Essas normas de DA podem estar previstas no código de contratos
públicos ou em legislação de direito administrativo que não se reconduza ao
código dos contratos públicos.

Esta distinção resulta dos artigos 200º e 202º do CPA.

Neste caso, como o enunciado nada nos diz, admitimos que é um contrato público regido
por normas de Direito privado, nomeadamente as normas previstas no código civil.

Aqui está em causa o princípio da boa fé, consagrado no artigo 10º do CPA e no 266º,
nº2 do CPA. A Administração impõe uma atuação correta e leal para com os

25
administrados, funciona como um padrão de conduta a respeitar pela Administração
Pública, que a impede:

• A adoção de comportamentos contraditórios


• De defraudar a confiança legitima depositada pelos administrados face a
comportamentos anteriormente adotados – para podermos falar em confiança
legitima, é necessário um comportamento determinado que permita razoavelmente
ao seu destinatário depositar confiança nesse mesmo comportamento, e é
necessário que exista comportamento concludente que leva a que se deposite
confiança nesse mesmo comportamento (as perspetivas psicológicas não são
juridicamente relevantes, é mesmo necessário esse comportamento concludente).
• Venire contra factum proprium, ou seja, de criar uma situação desconforme com a
lei, para depois de aproveitar dela ou tirar partido do comportamento ilegal
anteriormente adotado.

A violação do princípio da boa fé afeta a validade do contrato privado, porque, nos


termos do artigo 2º, nº1 e nº3 do CPA, os princípios gerais são aplicáveis sempre que haja
lugar ao exercício da função administrativa e sempre que se faça administração pública,
independentemente da natureza jurídica da entidade e do regime jurídico aplicável.

Assim, apesar de este contrato ser regulado por um regime de direito privado, não deixam
de ser aplicados os princípios gerais – isto é reafirmado pelo artigo 202º, nº2 do CPA.

No que diz respeito ao restante enquadramento, ao que acontece quanto à validade deste
contrato por violação dos princípios da atividade administrativa e ao direito do Joaquim
ser ressarcido pela confiança depositada, o regime a aplicar seria um regime de Direito
Civil. O vício do contrato de arrendamento, que é um contrato de Direito privado, resulta
da violação de um princípio geral de Direito Administrativo. Desta forma, viola-se o
princípio da boa fé e as consequências inerentes são de Direito privado.

Caso prático nº4

26
NOTA: princípio da transparência; direito à informação procedimental – artigos 82º e 85º
do CPA; direito à informação não procedimental.

Existe aqui um conflito de direitos: o direito de os dados das crianças não serem acedidos
por terceiros e o direito à informação.

Está aqui presente o princípio da proporcionalidade, ou seja, deve disponibilizar-se


apenas a informação necessária, adequada e relevante para a salvaguarda do interesse
legítimo.

Aula 10.11

Caso prático nº5


Neste caso, está aqui presente o princípio da legalidade, que entendemos em lato sensu,
abrangendo todas as fontes de Direito interno, de Direito externo e de Direito da União
Europeia. O Direito Administrativo é a concretização do princípio da legalidade, que
prevê mecanismos de garantia a favor dos administrados, seleciona, através da
programação da atividade administrativa, os espaços discricionários e vinculados, zela e
define os fins do princípio público a que a atividade administrativa está subordinada. É,
portanto, um princípio basilar do Direito Administrativo.

À Administração Pública impõe-se que atue em conformidade com o princípio da


legalidade. Desta forma, impõe-se a proibição da construção de marquises e de estruturas
ficas em prédios construídos em propriedade horizontal, e a sujeição dessa construção a
autorização prévia da câmara municipal e do condomínio. Não cumpridos estes
requisitos, esta é uma ilegalidade que habilita a câmara municipal a adotar as medidas
necessárias, nomeadamente a ordenar a retirada da estrutura. Quando esta ordem de
retirada de estrutura não for cumprida, a câmara municipal pode executar coercivamente
essa ordem de remoção.

A questão aqui levantada é: será que podemos levantar o princípio da igualdade (artigo
13º da CRP e artigo 6º do CPA) para persistirmos na ilegalidade em que incorremos,
porque é isso que acontece em situações idênticas? O que se conclui é que o princípio da
igualdade não pode ser levantado no contexto de ilegalidade, ou seja, não pode valer

27
em situações de ilegalidade, face à inercia da administração pública, com fundamento de
uma questão de tratamento diferenciado em questões idênticas.

Mecanismos Preventivos da Garantia da Imparcialidade

A imparcialidade é um principio geral material da atividade administrativa, consagrado


no artigo 266º, nº2 da CRP e no artigo 9º do CPA. Deste principio, resultam para os órgãos
e agentes da Administração Pública:

1. Obrigação de tratamento equidistante face a interesses privados ou face a


outros interesses públicos que não aquele que lhes cabe prosseguir numa
determinada circunstância concreta.
2. Dever de ponderar todos os interesses públicos e privados relevantes para a
prossecução de um interesse publico em especifico. Este dever manifesta-se
principalmente na fase de instrução do procedimento administrativo.

A fase de instrução é dirigida ao apuramento dos factos relevantes e à produção de prova


quanto aos factos, de modo que sejam determinados os factos verdadeiros, que serão o
pressuposto de facto ao ato jurídico a praticar. Desta fase, resulta, por decorrência do
princípio da imparcialidade, para os órgãos e agentes da Administração Pública uma
obrigação de considerarem todos os interesses públicos e privados relevantes, e de o
fazerem na mesma medida, sem privilegiar uns em detrimento de outros, produzindo a
prova necessária para atingir a verdade procedimental (que deve coincidir com a real).

Está aqui associado o dever de completude do material instrutório, ou seja, o órgão


não pode selecionar os factos relevantes, enquanto condicionado por determinados
interesses. O órgão deve averiguar todos os factos relevantes e estabelecer os pressupostos
de facto com exatidão.

O princípio da proporcionalidade atua na fase de instrução, impondo a consideração


de todos os interesses e factos relevantes, e projetando-se no momento da tomada de
decisão. Mas ao serviço do principio da proporcionalidade está um conjunto de medidas
preventivas, que visam evitar, por referência à pessoa responsável pela vontade
administrativa, as potenciais situações de conflito de interesses a que ela possa estar
interligada, evitando-as. Estas estruturas preventivas pretendem obstar a que os

28
interesses, as preferências e a vontade psicológica da pessoa influenciem a vontade
administrativa e os atos administrativos a praticar.

Estas garantias preventivas são:

i. Previsão de incompatibilidades de exercício de funções – as situações de


incompatibilidade reportam-se a uma avaliação feita pelo legislador, quanto à
possibilidade de acumulação de determinadas funções pela mesma pessoa, e
às situações de conflito de interesses que podem resultar dessa acumulação. As
incompatibilidades têm de estar previstas em Lei da AR ou Decreto Lei autorizado
do Governo, porque constituem uma restrição ao direito fundamental de liberdade
de escolha de profissão (artigo 165º, nº1, b) CRP e artigo 269º, nº4 e 5 CRP). Estas
incompatibilidades estão previstas em legislação especial, como o Estatuto dos
Eleitos Locais (Lei 29/87, de 30 de junho).

As incompatibilidades referem-se, portanto, a evitar conflitos de interesses, limitando-se


o exercício de determinadas funções num determinado período temporal, o chamado
“período de nojo”.

ii. Situações que os órgãos ou agentes administrativos se podem encontrar e que


podem gerar conflitos de interesses. Estas garantias preventivas são as previstas
nos artigos 69º e seguintes do CPA. O artigo 69º consagra um elenco taxativo,
ao passo que o artigo 73º consagra um elenco meramente exemplificativo.

As situações de impedimento são situações das quais resulta para o órgão ou agente
administrativo o dever de comunicação da mesma ao respetivo superior hierárquico ou
ao presidente do órgão colegial, consoante o caso – artigo 70º, nº1 do CPA. A
inobservância deste dever constitui uma infração disciplinar grave, nos termos do artigo
76º, nº2. Portanto, uma das pessoas que está colocada numa das situações previstas no
artigo 69º tem o dever de comunicar e, se não o fizer, incorre numa infração disciplinar
grave. Contudo, sem prejuízo do dever de comunicação, o impedimento também pode ser
invocado pelo próprio órgão colegial, pelo próprio superior hierárquico ou até
mesmo por um terceiro. A partir do momento em que a situação de impedimento é
comunicada pelo órgão ou agente, ou arguida pelo superior hierárquico, órgão colegial

29
ou terceiro, abre-se um procedimento do administrativo em relação ao qual o
impedimento se coloca.

Um incidente é uma questão lateral ao procedimento administrativo, que surge devido ao


procedimento, sendo relevante para o mesmo e cuja decisão influencia a prossecução do
procedimento. A partir do momento em que o próprio comunica o impedimento ou este
é arguido, abre-se um procedimento do qual resulta a proibição automática em relação
ao órgão ou agente sobre o qual é colocado o impedimento, sendo que este fica
automaticamente impedido de proceder naquele procedimento administrativo.

Assim sendo, procede-se a uma tomada de decisão:

a) Declaração de impedimento – conclui-se que a pessoa está impedida e o órgão


ou agente continua a não poder intervir naquele procedimento administrativo
(artigo 72º do CPA).
b) Chega-se à conclusão de que o impedimento não se verifica e, neste caso, a
pessoa pode voltar a intervir no procedimento administrativo.

Verificado o impedimento, a simples intervenção da pessoa inquina a decisão que


vier a ser tomada, mesmo que essa seja a melhor para o interesse público. O facto de
uma pessoa ter sido declarada como impedida e ter participado na mesma nesse
procedimento inquina a decisão tomada, presumindo-se que o princípio da ilegalidade
tenha sido violado.

Situação diferente é se não for invocado nenhum impedimento porque não existia ou,
tendo sido, não foi declarado como tal. Se isso acontecer, não significa que a decisão
final seja conforme ao principio da imparcialidade, o que significa é que não houve
um conflito de interesses em relação às pessoas que intervêm no caso.

O legislador prevê esta possibilidade claramente no artigo 76º, nº4 do CPA.

Para além das hipóteses enumeradas no artigo 69º, temos ainda as situações meramente
exemplificativas, previstas no artigo 73º, que constituem fundamento de escusa ou de
suspeição: escusa quando é apresentada pelo próprio órgão ou membro do órgão colegial,
que alerta para a ocorrência de uma das situações elencadas no artigo 73º; quando são
levantadas por um terceiro, diz-se que este levanta suspeição.

30
Olhando para o artigo 73º do CPA, o nº1 descreve algumas das situações que podem criar
conflitos de interesses.

Verificada uma destas situações previstas no elenco exemplificativo ou uma outra que se
considere caber numa cláusula geral, DEVE apresentar escusa (é um dever, muito
embora o legislador não lhe faça prever falta disciplinar grave como acontece na situação
de impedimento), sem prejuízo da possibilidade de um terceiro levantar a suspeição.
De seguida, é levantado um incidente, sendo que, neste caso, não decorre para a pessoa
que levantou a escusa ou em relação à qual foi arguida a suspensão, um dever de
suspender a intervenção no procedimento administrativo, mesmo antes deste ter sido
decidido. Se o órgão ou agente que estão reunidas condições para continuar a intervir no
procedimento administrativo até à decisão, pode fazê-lo, porque a lei assim o permite.

Há um incidente que terá de ser decidido, nos termos do artigo 75º do CPA, onde está
previsto um conjunto de remissões (têm de ser lidas com muita atenção). No caso de se
considerar que a situação determinante da escusa ou suspensão se verifica por incidente,
conclui-se com a declaração de escusa ou suspensão, da qual resulta a proibição de
intervenção da pessoa a quem se dirige naquele procedimento administrativo, e a
possibilidade de se substituir essa pessoa por outra, conforme as necessidades. Em
alternativa, pode acontecer que o incidente seja decidido na não declaração de escusa
ou de suspeição e, neste caso, o órgão ou agente pode intervir no procedimento
administrativo, sem prejuízo de que, nos termos do artigo 76º, nº4, se possa concluir
que, apesar de não se verificar nenhuma situação de escusa ou suspeição, a decisão em si
mesma viole o principio de imparcialidade – são situações distintas.

Caso prático nº6


Lei 169/99, de 18 de setembro, estabelece o quadro de competências, bem como o regime
jurídico dos órgãos municipais e das freguesias – é uma lei que teve a maior parte dos
seus artigos revogados pela Lei 65/2013, de 27 de agosto. A câmara municipal é
constituída pelo presidente e pelos vereadores, sendo que, no Porto e em Lisboa, existe
um número fixo de vereadores, enquanto nos demais municípios, o número de vereadores
que compõem a câmara municipal depende do número de cidadãos eleitores da respetiva
circunscrição concelhia.

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Sendo um órgão colegial de uma pessoa coletiva pública, a câmara municipal está
sujeita a um conjunto de regras e princípios específicos de funcionamento e organização,
previstos na parte II do CPA (mais especificamente, artigos 20º e seguintes). No entanto,
pode acontecer, como acontece neste caso, que exista legislação especial para
determinados tipos de órgãos, como acontece com os órgãos das autarquias locais.
Portanto, a organização e funcionamento dos órgãos das Autarquias Locais e, portanto,
da câmara municipal que é um órgão do município, está prevista na Lei 75/2013 e na
Lei 169/99, aplicando-se o CPA a titulo subsidiário, nos termos do nº5 do artigo 2º do
CPA.

NOTA: Em termos de analise, devemos começar sempre pelo elenco taxativo, presente
no artigo 69º -» começar sempre pelas exceções do elenco taxativo e, se não estiverem lá
elencadas, passar para o elenco exemplificativo.

a) Esta situação constitui um caso de impedimento previsto na alínea b) do nº1 do


artigo 69º do CPA. Pelo que, caberia ao vereador comunicar este impedimento ao
presidente do órgão colegial, que é o presidente da câmara municipal, nos termos do
nº1 do artigo 70º do CPA, sem prejuízo deste mesmo impedimento poder ser arguido
por qualquer um dos outros membros da câmara municipal, ou até mesmo por
terceiros. O não cumprimento deste dever por parte do vereador, constitui falta grave
em termos disciplinares nos termos do 76º, nº2 do CPA.

Suscitado o impedimento, abre-se um incidente a decidir, neste caso, pelo presidente da


câmara municipal – artigo 70º, nº1 e nº4. Por outro lado, a partir do momento em que o
vereador suscita este impedimento, está impedido de intervir no procedimento
administrativo, de acordo com o artigo 71º, nº1. Este impedimento pode ser decidido num
de dois sentidos e, havendo lugar à declaração de impedimento, é lhe aplicado o disposto
no artigo 72º, nº2, por se tratar de um órgão colegial.

O artigo 76º do CPA diz-nos várias coisas, entre elas que, se o vereador teve uma
intervenção após o momento em que invoca o impedimento (não pode enquanto o
incidente é decidido), a essa intervenção, que teve quando não podia, está associado um
vício invalidante cuja consequência, nos termos do nº1 do artigo 76º é a anulabilidade.

32
Se não houve lugar à declaração de impedimento, não invalida que possam ser suscitadas
duvidas relativamente à decisão, e se chegar à conclusão que foi violado o princípio da
imparcialidade, temos uma consequência que, à partida, será a anulabilidade. No
entanto, pode acontecer que ocorra uma situação em que a violação do princípio da
imparcialidade é de tal ordem que o ato em vez de prosseguir o interesse público que
deveria prosseguir, satisfaz interesses privados e, deste modo, existe desvio de poder e a
consequência é, de acordo com o artigo 161º, nº2, e) do CPA, é a nulidade.

Aula 17.11

Organização Administrativa
O ponto de partida é perceber que a ideia de organização administrativa portuguesa
parte dos artigos 6º e 267º da CRP, que orientam as tomadas de decisão e organização
administrativa.

A organização administrativa prevista na CRP é policêntrica, ou seja, é uma organização


administrativa que pressupõe a existência de pessoas coletivas públicas territoriais
para além do Estado – as Regiões Autónomas e as Autarquias Locais. Entre nós,
atualmente, temos 308 municípios e 3092 freguesias. As opções que vão sendo feitas são
opções de organização administrativa que se regem pelos princípios gerais de organização
administrativa previstos nos artigos 6º e 267º da CRP, principalmente no que toca à
autonomia local e à unidade de ação. A descentralização e a desconcentração não
constituem um fim em si próprias, isto é, não se deve descentrar e desconcentrar só
porque sim, estas constituem um meio para potenciar uma melhor, mais eficiente e mais
eficaz realização do interesse público pela Administração Pública. Só faz sentido
descentralizar e desconcentrar quando a tomada destas decisões auxiliem o exercício
dessa atividade.

Atualmente, a organização administrativa portuguesa é fortemente descentralizada


e desconcentrada. A opção que foi tomada ao nível da descentralização passa por
descentralizar sem regionalizar, ou seja, não existe uma base territorial distinta entre as
autarquias locais e o Estado, existem órgãos que se dedicam a estas funções, mas não há
um meio termo a nível de regionalização territorial, pois, se assim fosse, existiriam
regiões administrativas.

33
Administração Pública do Estado – o Estado é uma pessoa coletiva pública primária
de base territorial e fins genéricos, ou seja, ao Estado cabe desempenhar todos os fins
de interesse público que, de acordo com a CRP, constituam uma incumbência sua.

• Desconcentração – distribuição de competências por órgãos e não diferentes


pessoas coletivas. Essa distribuição faz-se por uma de duas vias:
o Desconcentração Originária – diretamente por lei
o Desconcentração Derivada (artigos 44º e seguintes do CPA) – com base numa
norma de habilitação, articulada com a prática do marco de delegação ou
subdelegação de competências.

Resulta daqui a administração direta do Estado. A administração direta do


Estado é constituída por órgãos que podem desempenhar funções executivas, de
fiscalização ou de coordenação, podem operar numa escala regional ou nacional,
e estão sujeitos, por parte do ministério onde se integram, a um poder de direção.
A delegação de poderes propriamente dita, não resulta da lei que disciplina a
desconcentração no interior de um determinado ministério, mas resulta de opções
tomadas por parte dos membros de esses órgãos quanto à forma que pretendem
ver distribuídas as competências. O que se transfere não é a titularidade, é o
exercício.

• Descentralização – o Estado procedeu à constituição de pessoas coletivas.


Quando falamos em descentralização, falamos essencialmente na criação de novas
pessoas coletivas, que podem ser pessoas coletivas públicas ou pessoas coletivas
públicas com influência pública dominante.

o Pessoas coletivas públicas – terá sempre necessariamente fins específicos, ao


contrário do Estado e será necessariamente uma pessoa coletiva pública
derivada, porque é constituída pela pessoa coletiva originária que é o Estado,
de fins específicos. No entanto, entre esta nova pessoa pública derivada de
fins específicos e o Estado, podem estabelecer-se diferentes relações
intersubjetivas, dependendo desta relação intersubjetiva, a pessoa coletiva

34
pública criada constitui uma forma de administração indireta,
administração independente, e administração autónoma.

Tipos de relações intersubjetivas:

§ Relação de tutela, que pode ser de mérito ou de legalidade – a tutela é


o controlo a posteriori sobre a atividade desempenhada, que pode
incidir apenas sobre a legalidade dessa atividade ou então também
sobre a oportunidade e conveniência da mesma. Também pode ser
inspetiva, quando a pessoa coletiva pública instituidora se limita a
controlar e verificar o cumprimento da legalidade e/ou a conveniência
e oportunidade da decisão, e integrativa, quando a produção de efeitos
praticados por determinados atos da pessoa instituída depende de um
determinado ato da pessoa que a instituiu.

• Institutos públicos de regime comum – pessoas coletivas


públicas de base institucional que constituem formas de
administração indireta do Estado e, por causa disso, estão
sujeitos a tutela de mérito e legalidade, e a superintendência.
• Institutos públicos de regime excecional – embora sejam
institutos públicos, integram a administração independente ou
a administração autónoma, ou seja, estão sujeitos a uma tutela
de mera legalidade por parte do Estado (Lei Quadro dos
Institutos Públicos – artigo 48º).
São institutos públicos de regime comum, as fundações públicas
de direito público e de direito privado, sem prejuízo de existirem
institutos públicos de regime excecional, como as autoridades
reguladoras independentes, porque fazem parte da administração
independente, e acrescem ainda, no caso das universidades que
sejam estabelecimentos públicos, os estabelecimentos públicos
universitários que não têm forma fundacional porque, de acordo
com o artigo 76º da CRP, são uma forma de administração
autónoma, sujeitas a tutela de mera legalidade.

35
• Associações públicas – pessoas coletivas públicas de substrato
pessoal, ou seja, regem-se em função de pessoas, os seus
associados. Fazem parte da administração autónoma e estão
sujeitas a uma tutela de mera legalidade.
• Autoridades reguladoras independentes

§ Relação de superintendência – não é um controlo a posteriori, traduz-


se em orientações dadas pela pessoa coletiva publica instituidora
quanto ao modo como a atividade deve ser desempenhada.

o Pessoas coletivas privadas sujeitas a influência pública dominante

Administração Pública Municipal:

• Desconcentração
o Originária
o Derivada

Administração direta – serviços municipalizados, ou seja, serviços que estão


desprovidos de personalidade jurídica, mas têm autonomia para tomarem decisões
e são dirigidos por um Conselho de Administração, designado pelo município.

• Descentralização – capacidade dos municípios para constituírem pessoas


coletivas públicas e pessoas coletivas privadas sob influência pública dominante.

o Pessoas coletivas públicas – não podem constituir institutos públicos nem


autoridades públicas independes, mas podem constituir fundações
municipais e associações públicas. As fundações municipais, no que se
referem à relação intersubjetiva, constituem uma forma de
administração indireta, sujeitas a tutela de mérito e legalidade, e de
superintendência. Também se podem constituir associações públicas,
constituídas pelos município, com autonomia relativamente ao Estado,
onde o Estado só pode exercer uma tutela de mera legalidade, e os

36
municípios ocupam a função de associados destas associações (como, por
exemplo, as áreas metropolitanas, as comunidades intermunicipais e as
associações de municípios e freguesias de fins específicos).
o Pessoas coletivas privadas sob influência pública dominante

Pessoas coletivas privadas sob influência pública dominante: influência pública


dominante é um conceito legal, previsto no DL 133/2013 ou na Lei 50/2012, e prende-se
com a detenção da maioria do capital social por uma pessoa coletiva pública ou na
possibilidade de uma pessoa coletiva pública nomear ou destituir da maioria dos
membros do concelho de administração ou fiscalização de uma pessoa coletiva privada.
Isto dá à pessoa coletiva pública poderes de controlo efetivo da gestão sob a pessoa
coletiva privada.

Pessoas que encontramos sujeitas a influência pública dominante:

• Empresas públicas – as empresas públicas (esta questão não se coloca em relação


às empresas locais) podem ser constituídas de uma de duas formas:

o S.A. – são disciplinadas pelo Decreto Lei 133/2013. Estas empresas são
constituídas pelo Estado, ou seja, é este o seu acionista maioritário ou
quem é capaz de nomear ou destituir a maioria dos membros do seu
concelho de administração ou fiscalização. Constitui uma forma de
administração indireta, o que significa que está sujeita a uma tutela de
mérito e legalidade e, para além disso, de superintendência.

o E.P.E. – também regidas pelo Decreto Lei 133/2013. São pessoas


coletivas públicas cujo acionista maioritário e único é o Estado, ou seja,
o capital social é integralmente participado pelo Estado. Constituem uma
forma de administração indireta, estando sujeitas a uma tutela de mérito
e legalidade, e de superintendência.
O Professor Pacheco de Amorim diz que são pessoas coletivas públicas
de caráter institucional, que desempenham atividades empresariais.

37
NOTA: a definição funcional de empresa pública serve para aplicar a duas formas
distintas o mesmo regime, o previsto no Decreto Lei 133/2013.

• Empresas locais – têm sempre uma forma única de organização, a forma de


S.A. O legislador, na Lei 50/2012, configura as empresas locais com um tipo
societário muito semelhante às sociedades anónimas. Constituem uma forma de
administração indireta do município que é seu acionista, ou dos municípios,
porque também podemos ter uma empresa local que tem como sócios vários
municípios.

Existe um princípio fundamental que serve de limite à desconcentração e à


descentralização, o principio de unidade de ação da Administração Pública. Tem de
haver, na tomada de decisão de desconcentração e descentralização, a consideração do
Estado das coisas, porque pode ser contrária à desconcentração ou à descentralização
novamente.

NOTAS:

• Legislação atualizada a ser utilizada nas aulas – Lei 75/2013 e Lei 169/99; artigo
20º CPA; delegação poderes dos artigos 44º e seguintes;
• Analise crítica da legislação atual – a professora vai indicar as páginas nos
sumários;
• Estudo – a professora vai dar o link e as páginas necessárias no sigarra (é o
necessário para perceber a organização administrativa atual, não vale a pena
perder tempo com coisas desatualizadas e desnecessárias)

Aula 24.11

Caso Prático nº6 (complementação da anterior resolução)

Lei 75/2013 – artigo 33º: elenco de competências da Câmara Municipal. Olhando para o
número 1 do artigo 33º, encontramos, nas alíneas dd) e qq), as competências relacionadas
com a matéria mencionada no caso.

38
Um órgão colegial como a Câmara Municipal toma deliberações, mas para percebermos
de que forma o faz, temos de a enquadrar. A Câmara Municipal é um órgão da pessoa
pública município (artigos 250º e seguintes da CRP), que é um tipo de autarquia local.
Para ser uma autarquia local, tem de cumprir os requisitos previstos nos artigos 235º e
236º da CRP:

→ Base territorial
→ Dirigem-se à satisfação dos interesses públicos da população respetiva
→ Os seus órgãos são eleitos

É competência da AR nos termos da alínea n) do nº1 do 164º da CRP tomar a decisão de


extinguir ou constituir uma autarquia local – as autarquias locais são os municípios, as
freguesias e as regiões administrativas.

No artigo 250º da CRP temos elencados os órgãos do município: a câmara municipal e


a assembleia municipal. No entanto, também se tem considerado o presidente da câmara
municipal como um órgão, porque possui competências próprias. Nos artigos seguintes
ao artigo 250º estão mencionadas algumas características destes órgãos, como o facto da
câmara municipal ser o órgão executivo colegial do município (artigo 252º).

Existem dois diplomas legislativos sobre esta matéria, a Lei 169/99 e a Lei 75/2013. Na
Lei 169/99 está presente, nos artigos 56º e seguintes, um conjunto de disposições quanto
à composição da câmara municipal. O artigo 56º diz a composição da câmara municipal
e o artigo 57º refere o número de vereadores, no caso:

→ 16 vereadores em Lisboa
→ 12 vereadores no Porto
→ 10 vereadores nos municípios com 100000 ou mais eleitores
→ 8 vereadores nos municípios com entre 50000 e 100000 eleitores
→ 6 vereadores nos municípios com entre 10000 e 50000 eleitores
→ 4 vereadores com 10000 ou menos eleitores

O Código do Procedimento Administrativo, nos artigos 20º e seguintes disciplina a


organização e funcionamento dos órgãos colegiais de pessoas coletivas públicas –

39
este é um regime geral, que só é aplicado perante a ausência de um regime especial. É o
que acontece neste caso, em que o regime especial é a Lei 75/2013.

Nos artigos 44º e seguintes deste diploma, está presente um conjunto de disposições
atribuídas aos órgãos das autarquias locais. No artigo 54º, números 1 e 2, está definido o
quórum de funcionamento e o quórum de aprovação, sendo esta uma exceção ao que
resulta do CPA, que define uma maioria absoluta.

NOTA: fazer remissão do artigo 54º da Lei 75/2013 para o artigo 161º, nº2, h) do CPA.

O artigo 161º, nº2, h) do CPA define que a inobservância da maioria de aprovação


culmina na nulidade do ato que vier a ser praticado nestes termos. Desta forma, temos um
vício formal invalidante, que tem como consequência jurídica do ato.

Existe um requisito de eficácia do ato praticado por um órgão colegial, que é a redação
da ata, prevista no artigo 57º, nº4 e no artigo 58º da Lei 75/2013.

A redação da ata é muito importante pelo voto vencido, ou seja, se somos membros e não
concordamos com a decisão tomada, por a considerarmos inoportuna ou inconveniente,
ou porque a entendemos como ilegal, no caso desta ser aprovada, devemos registar em
ata o voto vencido e as respetivas razoes justificativas. O registo na ata do voto vencido
isenta-nos da responsabilidade civil extracontratual que poderá resultar da deliberação
(artigo 58º da Lei 75/2013).

Casos Práticos – Grupo II


Pergunta 1 e 2:

As pessoas coletivas públicas são em regra constituídas por lei da Assembleia da


República ou por decreto lei do Governo. No que se refere a algumas associações
publicas, são constituídas por contrato.

40
Quando o legislador, no ato legislativo que constitui uma pessoa coletiva, expressamente
a qualifica como pública, essa qualificação legal expressa não pode ser contrariada
nem afastada, a menos que se verifiquem os pressupostos da interpretação corretiva.

Tendo em consideração a aplicação destes elementos, se concluirmos que um deles nos


leva a identificar uma situação de antinomia, isto é, se uma pessoa coletiva pública é, à
partida, constituída por ato legislativo e o legislador a qualificar expressamente como
pública, devemos respeitar essa qualificação, a menos que pela interpretação da
norma, em especial pelo elemento sistemático, nos leve a identificar uma situação de
conflito entre normas. Assim sendo, temos de questionar qual norma deve ceder perante
a outra.

Para além da qualificação legal expressa de uma pessoa coletiva, importa ter em
consideração o seu regime regra previsto, na medida em que, se a pessoa coletiva for
designada como pública e desempenhar uma atividade pública de cariz não empresarial,
mas o seu regime regra for de Direito privado, ou temos um problema de
inconstitucionalidade, ou a qualificação legal expressa está errada, porque essa pessoa é,
na verdade, uma pessoa coletiva privada.

Por outro lado, quando as pessoas coletivas são constituídas por contrato
interadministrativo, esse contrato celebrado é um contrato que assenta numa norma
legal habilitante, ou seja, o contrato dá execução a uma norma legal habilitante que
permite a constituição de uma pessoa coletiva públicas. Assim, sujeita essa constituição
à celebração de um contrato administrativo.

Neste caso, a norma legal não é suficiente para constituir essa pessoa coletiva pública,
é ainda necessária a celebração de um contrato administrativo que se funda e esta
vinculado por essa norma. É o que acontece com a situação de algumas associações
públicas (como as comunidades intermunicipais).

Os critérios sobre os quais a doutrina fala para a qualificação de determinada pessoa


coletiva como pública ou como privada só servem para serem utilizados pelo intérprete
quando não há qualificação legal expressa. Neste caso, não é possível qualificar uma
pessoa coletiva como publica com base num único critério, é necessária a articulação de
diferentes critérios:

41
• Critério da iniciativa – diz que só as pessoas coletivas públicas (pessoas
coletivas públicas primárias – Estado, AL e Regiões Autónomas) é que podem
constituir outras pessoas coletivas públicas;
• É necessário que a pessoa coletiva criada se dirija à prossecução de um fim de
interesse público;
• É necessário que seja titular de poderes públicos de autoridade;
• O regime regra a que esteja sujeito seja um regime regra de Direito
Administrativo.

Estes critérios valem para pessoas coletivas que não estejam qualificadas pelo legislador
como públicas ou privadas. A questão das EPE não é relevante, porque estas já estão
classificadas pelo legislador como públicas.

Pergunta 3:

Estabelecem-se relações intersubjetivas. Estas relações intersubjetivas podem ser:

• Relações Jurídicas Intersubjetivas Verticais – temos a tutela (de mérito e ou de


legalidade) e a superintendência.

Constituem formas de administração autónoma – sujeitas a tutela de mera


legalidade por parte do Estado, exercida pelo Governo:
o Autarquias Locais
o Associações Públicas
o Regiões Autónomas

Constituem formas de administração independente – sujeitas a uma tutela de


mera legalidade por parte da Assembleia da República:

o Autoridades Reguladoras Independentes

Constituem formas de administração indireta – sujeitas a tutela de mérito e de


legalidade, e de superintendência:

42
o Empresas Públicas
o Empresas Locais
o Institutos Públicos de Regime Comum

Institutos públicos que não são formas de administração indireta:

o Constituem formas de administração autónoma (como as universidades


públicas, independentemente de serem constituídas sob a forma de
instituto público ou fundação pública, estão sujeitas a tutela de mera
legalidade – artigo 76º CRP).
o Administração independente (como as autoridades reguladoras
independentes, que estão sujeitas a tutela de mera legalidade exercida pela
AR).

• Relações Jurídicas Intersubjetivas Horizontais – são relações de cooperação e de


colaboração. Estas relações correspondem à lógica de funcionamento em rede da
Administração Pública anteriormente falada, e podem ser:

o Institucionalizadas – pessoa coletiva que está pensada apenas para


garantir o exercício articulado da função administrativa.
o Não institucionalizadas

Aula 15.12

Pergunta 4:

Não, porque existem institutos públicos com forma independente, como as autoridades
reguladores independentes, e as universidades públicas, que são fundações públicas ou
institutos públicos que, independentemente da forma, constituem sempre uma forma de
administração autónoma (artigo 76º da CRP).

Pergunta 5:

43
Não, as Universidades Públicas podem também ter sido constituídas como fundações
públicas de Direito privado, podem ter sido convertidas a Direito privado, e podem ainda
ser constituídas sob a forma de instituto público.

Pergunta 6:

A Lei-Quadro das Fundações não é aplicável às Universidades Públicas. O número 8 do


artigo 6º da Lei 24/2012, que aprova em anexo a Lei Quadro das Fundações, claramente
exclui as Universidades Públicas do seu âmbito de aplicação. Desta forma, estão sujeitas
ao regime jurídico do Ensino Superior.

Pergunta 7:

Quando falamos da relação que se constitui e que é constituída, falamos em relações


verticais. Para além destas relações, que são relações intersubjetivas verticais de tutela
ou de superintendência, existem outras relações que se estabelecem através de
mecanismos de cooperação ou colaboração horizontal, em que não são atribuídos, a
uma pessoa em relação a outra, mecanismos de controlo e de tutela.

Estas relações estabelecem-se sem que se tenha de instituir uma pessoa coletiva nova,
como por exemplo nos casos de celebração de contratos interadministrativo, conferências
interprocedimentais entre entidades que estão envolvidas na tomada de várias decisões
relacionadas, ou em consenso prévio na tomada de decisão mútua. São relações não
institucionais.

Existem ainda formas de cooperação institucionalizadas, em que a cooperação implica a


constituição de uma pessoa coletiva, integrada por pessoas coletivas distintas, com vista
à prossecução de um fim público comum (como, por exemplo: associação pública
constituída por entidades públicas ou entidades privadas com influência pública
dominante com vista à reabilitação de centros históricos; áreas metropolitanas;
comunidades intermunicipais; associações públicas de freguesias e municípios de fins
específicos – Lei 75/2013, artigos 63º e seguintes, sofrendo uma tutela de mera legalidade
por parte do Estado – artigos 6º e 241º da CRP; entidades financiadas pelo Estado e pelos
municípios; etc.).

44
Pergunta 8:

Não, porque a CRP prevê, nos artigos 235º e 236º, um princípio da tipicidade
relativamente às autarquias locais, que vincula o legislador ordinário, neste caso, a AR,
que tem competência legislativa sobre a matéria, ao abrigo do artigo 164º, alínea m).

O princípio da tipicidade consiste na proibição de constituição de outras pessoas coletivas


públicas com as características que a CRP faz corresponder às autarquias locais. O
legislador ordinário está vedado a atribuir a denominação de autarquia local a uma pessoa
coletiva pública que não tenha características para o ser.

O Acórdão do Tribunal Constitucional nº 296/2013, surgiu a propósito da aprovação da


Lei 75/2013, onde se aprova um decreto enviado para o Tribunal Constitucional, e que
este tribunal declarou que colocava em que causa o princípio da tipicidade das autarquias
locais (em relação a determinadas características das comunidades intermunicipais que
estavam a ser criadas).

Pergunta 9:

A distribuição de competências por órgãos faz-se através de decisões de


desconcentração, através de leis, sem necessidade de um ato administrativo para a
atribuição de competências (como uma lei orgânica do Governo), ou através de delegação
de poderes (descontração derivada), onde se exige uma norma legal ou regulamentar que
permita a delegação de competências, juntamente com a possibilidade de exercer essa
determinada competência (artigos 44º e seguintes do CPA).

Estes órgãos relacionam-se entre si através de relações interorgânicas de hierarquia,


em que um órgão é superior hierárquico e o outro é subalterno (poderes de controlo,
supervisão e disciplinares) – artigo 271º da CRP. Se o subalterno desrespeitar alguma
ordem do superior, em princípio, responderá em sede disciplinar (no caso de a ordem
constituir a prática de um crime ou não for dada em matéria de serviço, o subalterno não
está obrigado a respeitar a ordem; se existirem dúvidas sobre a legalidade da ordem, o
subalterno para que não tenha de responder disciplinarmente, deve requerer a ordem por
escrito).

45
Por vezes, sucede que os órgãos que se instituem como órgãos independentes, como as
entidades administrativas independentes desprovidas de personalidade, isto é, órgãos que
não estão sujeitos a um poder hierárquico e funcionam com independência (comissão de
eleições, comissão de proteção de menores, comissão de proteção de dados, comissão de
acesso a documentos administrativos).

Pergunta 10:

Os ministérios são órgãos da pessoa coletiva pública Estado. No entanto, como essa
pessoa coletiva pública tem atribuições genéricas muito diversificadas, tornou-se
necessário para a sua prossecução que o Governo se organize por matérias ou
atribuições. Esta organização corresponde aos ministérios, que têm a especificidade de
serem órgãos com competências, mas também com atribuições. Se um órgão violar a
competência de outro órgão, fazendo eles parte da mesma pessoa coletiva, a consequência
jurídica é a anulabilidade. Por outro lado, se for o contrário, também é um vício orgânico,
mas a consequência jurídica é a nulidade, ao abrigo do artigo 161º, nº2 alínea b) do CPA.

Pergunta 11:

a) Direção Geral dos Impostos (DGCI) – é um órgão resultante de opções de


desconcentração ao nível do Ministério das Finanças. Faz parte da administração
direta do Estado, regida pela Lei 04/2004, e está, por isso, sujeita a poderes de direção
(artigo 199º, alínea d) da CRP). No artigo 11º, nº2, está definido que os serviços de
administração direta do Estado podem ser definidos, de acordo com a sua função
dominante em serviços executivos (alínea a)), serviços de controlo, auditoria e
fiscalização (alínea b)), e serviços de coordenação (alínea c)).

b) Inspeção-Geral das Atividades Culturais – é um órgão resultante de opções de


desconcentração ao nível do Ministério da Cultura. A administração direta do Estado
é regida pela Lei 04/2004 e está, por isso, sujeita a poderes de direção (artigo 199º,
alínea d) da CRP).
Podemos distinguir serviços centrais de serviços periféricos. De acordo com o artigo
11º da Lei 04/2004, ambos os serviços são centrais porque têm competências que se

46
estendem por todo o território nacional. Órgãos de coordenação (comissões de
coordenação e desenvolvimento regional, que se qualificam como serviços periféricos
uma vez que existem 3 por zona).

c) Instituto de Empreso e Formação Profissional, I.P. (IEFP) – é um instituto


público, mais concretamente uma pessoa coletiva pública de base institucional, que
resulta de uma opção de descentralização indireta, sujeita a poderes de tutela e
superintendência por parte do Estado. Rege-se pelos seus estatutos e pela Lei 03/2004.

d) Hospital de São João, E.P.E. – é uma entidade pública empresarial, pessoa coletiva
pública de caráter empresarial, resultante de uma opção de descentralização, que
integra a descentralização indireta do Estado, estando sujeita a meios de tutela de mera
legalidade e superintendência. Rege-se pelos seus estatutos, por legislação especial e
pelo Decreto-Lei 133/2013.

e) Porto Vivo, Sociedade de Reabilitação Urbana da Baixa Portuense, S.A. – de


acordo com os estatutos da Porto Vivo, é uma pessoa coletiva privada, constituída por
capital integralmente público, detido em 60% pelo Estado e 40% pelo Município do
Porto (influência totalmente pública). Como é uma empresa pública, aplica-se o
Decreto-Lei 133/2013. Constitui uma forma de administração indireta do Estado,
estando sujeita a uma tutela de mérito, de legalidade e de superintendência.

f) Área Metropolitana de Lisboa – associação pública de municípios de constituição


obrigatória, regida pela Lei 75/2013 (artigos 63º e seguintes). Constitui uma forma de
administração autónoma e está sujeita a uma tutela de mera legalidade (prevista na
Lei 27/96).

g) Ordem dos Advogados – associação pública de entidades privadas (pessoa coletiva


pública de caráter associativo constituída por privados). As ordens são associações
profissionais regidas pela Lei 2/2013, e estão sujeitas a uma tutela de mera legalidade
(administração autónoma).

h) Comissão Nacional de Eleições – entidade administrativa independente, desprovida


de personalidade jurídica.

47
i) Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos – entidade administrativa
independente, desprovida de personalidade jurídica.

j) ICP – Autoridade Nacional de Comunicações (ICP – ANACOM) – autoridade


reguladora independente, ou seja, entidade administrativa independente com
personalidade jurídica.

k) Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) – autoridade reguladores


independente, ou seja, entidade administrativa independente com personalidade
jurídica.

NOTA (para as alíneas h), i), j) e k)): podem existir entidades com personalidade
jurídica, como as autoridades reguladores independentes (Lei 67/2013), e entidades sem
personalidade jurídica, como os órgãos, que têm a especificidade de prosseguirem fins
de proteção e garantia dos Direitos Fundamentais e dos Direitos, Liberdades e Garantias,
e terem autonomia financeira, não estando sujeitos a poderes de direção (são
independentes). São sujeitas a um controlo de mera legalidade pela Assembleia da
República, e ambas constituem formas de administração independente. A Comissão
Nacional de Eleições, por exemplo, é um órgão independente, ao passo que a Autoridade
e a Comissão Nacional de Valores são pessoas coletivas independentes.

l) Provedor de Justiça – é um órgão independente, que exerce funções de garantia de


legalidade e de constitucionalidade. Está prevista no artigo 23º da CRP (órgão
constitucional), designado pela AR e junto da qual os particulares podem apresentar
queixas quanto ao exercício dos poderes públicos.

m) Universidade do Porto – fundação pública, constituída por um património


institucional. Constitui uma forma de Direito privado e de administração autónoma,
estando sujeita a um controlo de mera legalidade. Resulta de uma opção de
descentralização.

n) Empresa concessionária de um determinado serviço público – empresa privada


constituída sob a forma de sociedade comercial, desprovida de influência pública

48
dominante, mas exerce uma certa tarefa pública prevista no seu contrato de concessão
(contrato administrativo, regido pelo código dos contratos públicos). Estas empresas
fazem administração pública, mas não integram a Administração Pública.

Caso Prático nº1


Pergunta 1:

Temos a Câmara Municipal, o Ministro da Saúde e a Assembleia Municipal:

• Câmara Municipal – é um órgão do município, de acordo com os artigos 250º a 252º


da CRP. Este órgão é constituído, nos termos dos artigos 56º e 57º da Lei 169/99,
pelo presidente e pelos vereadores. As suas competências estão previstas no artigo
33º da Lei 75/2013.
• Ministro da Saúde – é o titular do órgão Ministério da Saúde, que integra a
administração direta do Estado e está sujeito a poderes de direção (Lei 4/2004).
• Assembleia Municipal – é um órgão do município, de acordo com os artigos 250º a
252º da CRP. As suas competências estão previstas no artigo 25º da Lei 75/2013, e
aplica-se o CPA subsidiariamente.

O município é uma pessoa coletiva pública de base territorial e fins genéricos,


constituindo um dos tipos de autarquias locais previstos na CRP (artigos 235º e 236º). Os
municípios constituem o resultado de descentralização em sentido próprio, sujeito a uma
tutela de mera legalidade (artigos 6º e 242º da CRP), que é exercida nos termos da Lei
27/96 (administração autónoma).

Pergunta 2:

O CPA prevê o quórum e a maioria de aprovação, mas só é aplicado subsidiariamente.


Desta forma, é aplicado o regime estabelecido pelo artigo 54º da Lei 75/2013. Quer esta
exigência quer a maioria, são requisitos de validade que, não sendo respeitados, incorrem
numa invalidade por vício de forma, cuja consequência é a nulidade (artigo 161º, nº2,
alínea h) do CPA). Para além disso, existe necessidade de redução a ata, ao abrigo do
artigo 57º, nº4 da Lei 75/2013, que corresponde a um requisito de eficácia.

NOTA: fazer remissão do artigo 54º do CPA para o artigo 161º.

49
Pergunta 3:

Para a resolução desta questão, necessitamos do artigo 242º da CRP (tutela de mera
legalidade), do artigo 165º do CPA (revogação e anulação) e da Lei 27/96 (regime jurídico
da tutela administrativa).

Nos termos do artigo 242º, esta é uma tutela de mera legalidade, seja qual for a atuação
dos órgãos responsáveis por essa tutela (Lei 27/96). Esta lei define o objeto da tutela,
como é que esta tutela se faz e quem é que a realiza. Quem a realiza é a inspeção geral de
finanças e a inspeção geral das autarquias locais, que pertencem aos Ministério da
Administração Interna. Esta tutela procede de acordo com o artigo 6º da Lei 27/96
(inspeções, inquéritos e relatórios).

Assim, o Ministro da Saúde não tem competência para exercer tutela de mera legalidade
sobre as autarquias locais, pelo que qualquer ato que exerça nestes termos corresponde a
um ato inválido.

Pergunta 4:

A Lei 75/2013 atualizou a Lei 169/99, revogando alguns dos seus preceitos. Entre a
Assembleia Municipal e a Câmara Municipal, não existe responsabilidade pública.

Esta assistência e intervenção não podem ser efetuadas nestes termos, dado que o artigo
49º, números 4 e 5 proíbem estas expressões, tipificando-as como contraordenações, a
elas associada a aplicação de uma coima.

Pergunta 5:

O que está aqui em causa é a delegação da competência do Presidente e da Assembleia


da Câmara Municipal – artigo 34º da Lei 75/2013.

Delegação e Subdelegação de Poderes:

As competências dos órgãos não se presumem, estão previstas em normas.

50
A delegação de poderes está prevista nos artigos 44º e seguintes do CPA.

De acordo com o artigo 36º do CPA, a nulidade de uma delegação implica a nulidade de
todas as subdelegações, ao passo que a revogação de um ato de delegação implica a
revogação dos respetivos atos de subdelegação.

Avocar significa chamar a si, e é feito quanto a procedimentos específicos ou concretos.


A relação de delegação suspende a relação de hierarquia entre os órgãos hierarquicamente
diferentes. Não é possível recorrer ao recurso hierárquico, mas há lugar a um recurso
administrativo especial do artigo 199º.

Os atos administrativos que são praticados ao abrigo de um ato de delegação inválido ou


ineficaz padece de um vício orgânico de incompetência absoluta ou relativa,
dependendo se a delegação é em relação a órgãos hierárquicos ou não – é absoluta se a
competência exercida pertence de outra pessoa coletiva, e é relativa se pertence à mesma
pessoa coletiva.

Requisitos de validade:

a. Para que possa delegar a competência de que é titular, é necessário que exista uma
norma que habilite essa delegação.
b. Prática de um ato de delegação de poderes – artigo 45º (poderes indelegáveis) e
artigo 47º (conjunto de requisitos que o ato de delegação deve cumprir).

Pergunta 5:

(continuação)

Os requisitos para que a delegação de poderes seja efetuada estão previstos no artigo 34º,
como norma de habilitação (com as exceções previstas no nº1 deste artigo).

Uma vez que a competência prevista na alínea y) não está prevista nas exceções do artigo
34º, nº1, aplicam-se os requisitos do artigo 45º e seguintes do CPA. Há necessidade de
menção do ato habilitante.

Quanto à subdelegação, temos uma norma de delegação específica, que deve respeitar os
artigos 45º e 46º do CPA.

51
NOTA: para a matéria de delegação e subdelegação de poderes, ver os documentos que
a professora colocou no sigarra.

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