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MEMORIAIS - GRUPO 2 - TURMA B

Caso 04 - Categorias de Direito Tributário

Bruno Menin de Oliveira, nº USP: 11200974, 192-23

Carolina Oliveira, nº USP: 11289473, 192-23

Gabriel Almeida Mazanoff, nº USP: 11265809, 192-23

Giovanni Pifaneli de Medeiros, nº USP: 11368467, 192-23

Lívia Barbutti Felippe Toledo, nº USP: 11265201, 192-24

Lourenço Franco Costa Pinto, nº USP: 11201248, 192-23

Lukas Tenzin Carvalho, nº USP: 11264767, 192-24

Vinicius Maul Escudeiro Leite, nº USP: 11265820, 192-24

I - Introdução

No presente caso, discute-se a legalidade da cobrança de IPTUs para imóveis não


residenciais nos anos de 2020, 2021 e 2022. O restaurante Traçados, localizado no Município
de São Paulo, possui três imóveis situados na Rua Nova Iorque, ns. 1.239, 1.251 e 1.271, que
são utilizados para a realização de suas atividades.

O restaurante afirma que, a partir de 22 de março de 2020, em razão da decretação da


pandemia e da proibição de atendimento presencial de clientes em restaurantes decorrente do
Decreto fictício n. 1.234/2020, passou a realizar apenas a atividade de atendimento por
delivery, operando apenas na cozinha localizada no imóvel da Rua Nova Iorque n. 1.251,
mantendo seus outros dois imóveis inutilizados. Contudo, alega que, em 31 de dezembro de
2020, aumentou sua cozinha e passou a ocupar também o imóvel n. 1.239, mesmo que
parcialmente. Somente em 01 de janeiro de 2022, por meio do Decreto fictício n. 4.321/2022,
o atendimento presencial dos clientes voltou a ser permitido e, então, o Traçados passou a ser
estruturado da seguinte maneira: (i) a cozinha localizada no imóvel da Rua Nova Iorque n.
1.251 e em parte do imóvel n. 1.239; e (ii) o atendimento presencial dos clientes passou a ser
realizado nos imóveis da Rua Nova Iorque n. 1.271 e em parte do imóvel de n. 1.239.
A presente ação judicial discute os débitos tributários referentes aos IPTUs não pagos
dos imóveis localizados na Rua Nova Iorque, ns. 1.239 e 1.271. Requer-se a anulação parcial
do tributo, sob alegação de que a alíquota aplicada sobre o valor venal dos imóveis estaria
incorreta, portanto, o Traçados requer a cobrança da alíquota de 1,0% sobre o valor venal do
imóvel (referente a imóveis residenciais) e não de 1,5% (referente a imóveis comerciais), pois
entende que os imóveis localizados na Rua Nova Iorque, ns. 1.239 e 1.271 não foram
utilizados para atividades comerciais no período citado, mesmo que seus cadastros junto à
Secretaria Municipal indiquem a “atividade comercial de restaurante”.

A ação foi julgada parcialmente procedente, reconhecendo a procedência com relação


ao imóvel da Rua Nova Iorque n. 1.271 para a cobrança de IPTU de 2021, e negou-se a
procedência em relação aos demais imóveis e períodos, pois estes foram utilizados para fins
comerciais.

Contudo, o que se pretende demonstrar é que não cabe a discussão a respeito de como
devem ser caracterizados os imóveis, caso desocupados, mas sim a respeito da legalidade da
cobrança da alíquota de 1,5% no período que se passou e que, portanto, a ação deve ser
julgada inteiramente improcedente.

II - IPTU e alíquotas de imóveis residenciais e não-residenciais

O IPTU, Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana, encontra-se


disciplinado entre os artigos 32 e 34 do Código Tributário Nacional. Conforme referido artigo
32, o IPTU é imposto de competência municipal e tem como fato gerador a propriedade, o
domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física localizado na zona
urbana do Município. A base de cálculo do imposto, de acordo com o artigo 33, é o valor
venal do imóvel, ou seja, a estimativa de preço para a propriedade de que se trata. E, por fim,
o contribuinte do IPTU é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil, ou o seu
possuidor a qualquer título, como dispõe o artigo 34 do CTN.

Para o presente caso, é importante ressaltar mais uma característica do IPTU: é um


tributo classificável, normalmente dividido em IPTU residencial e IPTU comercial. A
principal diferença entre essas duas categorias do IPTU consiste na finalidade da propriedade
ou da posse do imóvel que será tributado. Exemplificativamente, quando o imóvel é utilizado
para fins residenciais, o IPTU a ser cobrado é o residencial, enquanto que nas hipóteses em
que o imóvel é utilizado para fins comerciais, o IPTU a ser cobrado é o comercial.
Tal divisão do IPTU pode ser observada nos artigos 1° e 2° do Decreto fictício n.
01/1989. O art. 1° do referido Decreto dispõe que o IPTU calcula-se à razão de 1,0% sobre o
valor venal do imóvel para imóveis utilizados exclusiva ou predominantemente como
residência, enquanto que o artigo 2° dispõe que o referido imposto calcula-se à razão de
1,5% sobre o valor venal do imóvel para imóveis construídos com utilização diversa da
referida no artigo 1°, como atividade comercial.

Inclusive, neste caso específico dos artigos 1° e 2° do Decreto fictício, percebe-se que
o legislador não dividiu o IPTU exatamente como residencial e comercial, mas sim como
residencial e não-residencial. O uso das expressões “para imóveis construídos com utilização
diversa da referida no artigo 1°” e “como atividade comercial” evidencia que o legislador
quis tributar com maior alíquota todos aqueles imóveis que não são utilizados como
residências, incluindo como exemplo os que possuem como finalidade a atividade comercial.

III - Da interpretação do Decreto n. 01/1989

A problemática do caso gira em torno justamente da aplicação dos artigos 1º e 2º do


Decreto fictício n. 01/1989. Cabe, portanto, interpretar as disposições legais a fim de entender
melhor sua aplicação ao caso. Dispõe o decreto em questão:

Art. 1° O imposto calcula-se à razão de 1,0% sobre o valor venal do imóvel, para
imóveis utilizados exclusiva ou predominantemente como residência.

Parágrafo único. Para os efeitos de enquadramento na alíquota estabelecida no


"caput" deste artigo, considera-se de uso residencial a vaga de garagem não
pertencente a estacionamento comercial, localizada em prédio utilizado exclusiva
ou predominantemente como residência.

Art. 2° O imposto calcula-se à razão de 1,5% sobre o valor venal do imóvel, para
imóveis construídos com utilização diversa da referida no artigo 1°, como atividade
comercial.

Da leitura do artigo 1º entende-se que, apenas para imóveis utilizados exclusiva ou


predominantemente como residência, é aplicada a alíquota de 1,0%. Tal alíquota é também
aplicável a vagas de garagem, desde que não pertencentes a estacionamento comercial e que
estejam localizadas em prédios utilizados exclusiva ou predominantemente como residência.

Inicialmente, cabe entender qual o sentido que o legislador buscou dar ao termo
“residência”. Por residência, é possível compreender o local onde a pessoa mora com intuito
permanente. Quando o legislador diferencia estabelecimento comercial e residência, fica clara
sua intenção de privilegiar o imóvel da entidade familiar, bem como efetivar os direitos
sociais fundamentais do cidadão, como seu direito à moradia. A cobrança com base em
alíquota menor é, portanto, um esforço realizado para garantir que tais direitos sejam
preservados. Em segundo lugar, pode-se entender que a alíquota maior para estabelecimentos
comerciais é baseada no fato de que a capacidade contributiva destes estabelecimentos é
maior do que a de uma residência, afinal, existe aqui o potencial de auferir renda.

Da leitura do artigo 2º, por sua vez, entende-se que para imóveis construídos com
utilização diversa da residencial como, por exemplo, a atividade comercial, cobra-se a
alíquota de 1,5%. Perceba-se que, novamente, existe maior atenção à residência,
diferenciando-a de qualquer outro tipo de utilização. Como exemplo de utilização diversa da
residencial, aponta-se novamente a utilização para fins de atividade comercial.

Tendo em vista a interpretação acima exposta, fica clara a impossibilidade de


enquadrar os imóveis do caso na alíquota de 1,0%, como pretende o contribuinte. Em
primeiro lugar, porque é cristalina a intenção de utilizar ambos imóveis para fins de atividade
comercial. Apenas tal finalidade circunstancial, por si só, já deveria enquadrá-los na alíquota
de 1,5%.

Não obstante, poderia o contribuinte alegar que o fato de a atividade comercial ter
sido atrapalhada pelo cenário pandêmico retira a justificativa de cobrança maior, uma vez que
se o imóvel não aufere renda, não existe aumento da capacidade contributiva e, com isso, a
cobrança da alíquota maior ficaria injustificada. Entretanto, tal argumento não se sustenta.

Primeiramente, cumpre ressaltar que a atividade comercial ali exercida não foi
totalmente interrompida. Ademais, ainda que os imóveis não pudessem ser utilizados para
atendimento presencial, como tinha sido a intenção inicial, ainda sim contribuíram para
estruturar a atividade comercial do restaurante, seja em forma de cozinha parcial, em forma
de escritório, depósito, ou até mesmo funcionando como garagem para estruturar a atividade
de delivery, entre outros.

Em segundo lugar, funcionando ou não, tais imóveis não deixam de ser voltados para
a atividade comercial. Dessa forma, a possibilidade de maior capacidade contributiva sempre
está presente, é inerente à propriedade, sendo que a qualquer momento tais estabelecimentos
poderiam voltar a ser utilizados para atendimento presencial dos clientes. Além disso, o fato
de que, em plena pandemia, o contribuinte precisou ampliar sua cozinha, também é forte
indicador de que sua maior capacidade contributiva não só se manteve como também
aumentou.
Por fim, ainda que os pontos acima sejam rechaçados, é inquestionável que os
imóveis em discussão nunca foram utilizados para fins residenciais. Assim, mesmo que se
alegue a falta de auferimento de renda ou a impossibilidade de realizar atividade comercial,
fato é que tais imóveis não poderiam ser enquadrados como residência e, portanto, nunca
fariam jus à alíquota de 1,0%. Seria até injusto, do ponto de vista social, que imóveis
constituídos como restaurantes fossem equiparados a residências, unidades essenciais para a
entidade familiar.

Caso o contribuinte não possua os meios para arcar com o imposto, poderia pleitear a
suspensão da cobrança do IPTU, alegando limitação substancial ao uso e gozo da propriedade
comercial, por exemplo. No entanto, não é isso que aqui se discute. A discussão é em torno
da alíquota aplicável, e não do dever ou não de pagamento do imposto. É possível discutir se
a restrição das atividades comerciais prejudica ou não o pleno exercício do direito da
propriedade de um imóvel comercial. Entretanto, fato é que não utilizar imóvel comercial
não o transforma automaticamente em residência.

IV - Da obrigação de regularizar o registro do imóvel

Um ponto merecedor de destaque é o registro dos imóveis em questão. Alega o


contribuinte que: “nada obstante o cadastro dos imóveis junto à Secretaria Municipal indique
a ‘atividade comercial de restaurante’, os imóveis não puderam ser plenamente utilizados
para esse fim, pelos fatos acima narrados”.

Nesse contexto, cumpre destacar julgado do TJDFT (Processo nº.


0717122-04.2019.8.07.0016), no qual restou entendido que o contribuinte também é
responsável pela atualização dos dados do imóvel junto ao Fisco. Ou seja, é de
responsabilidade do proprietário solicitar, por meio de processo administrativo, a alteração da
destinação do imóvel, a fim de mudar a alíquota aplicada na cobrança do IPTU. No âmbito de
tal processo, poderia o contribuinte pleitear a alteração das alíquotas e apresentar suas razões
para tanto.

A distinção da finalidade de um imóvel, por motivos práticos, não pode ser


averiguada pela prefeitura a cada ano, por isso, o registro do imóvel é de suma importância
para a determinação de qual alíquota é aplicável. Consequentemente, é inequívoco que o
contribuinte possui a obrigação de manter esse registro atualizado e cobranças efetuadas com
base em um registro, por mais que desatualizado, são válidas legalmente.
Afinal, se a jurisprudência adotar a postura de que a natureza do imóvel pode mudar
de forma tão fácil e fluida, todo ano, os tribunais brasileiros teriam que resolver centenas de
questões relativas a imóveis que buscam mudar o seu status de comercial para residencial
muitas vezes durante o mesmo mês. Qualquer dono de comércio que, por qualquer motivo,
tenha que interromper os seus negócios para, por exemplo, reformar o imóvel, poderia alegar
que durante aquele período, por não estar ocorrendo nenhuma transação comercial em sua
propriedade, o IPTU devido seria o residêncial. Para evitar problemas dessa natureza, é
importante manter o registro do imóvel atualizado antes da cobrança.

Esse posicionamento é corroborado pelo artigo 147 do CTN:

Art. 147. O lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de


terceiro, quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta à autoridade
administrativa informações sobre matéria de fato, indispensáveis à sua efetivação.

§ 1º A retificação da declaração por iniciativa do próprio declarante, quando vise a


reduzir ou a excluir tributo, só é admissível mediante comprovação do erro em que
se funde, e antes de notificado o lançamento.

É evidente que o fisco não pode se responsabilizar por erros cometidos pelo
contribuinte e que o registro do imóvel não pode ser alterado após a cobrança.

Com isso, entende-se que se o contribuinte, dispondo de todas as possibilidades para


realizar a alteração no cadastro, não o fez, não seria justo onerar a administração fazendária
por erro de fato a que não deu causa. A regularização tributária poderia ter sido feita muito
antes. Foi opção do contribuinte permanecer irregular em seus deveres tributários, sendo
quase de má-fé o pleito atual para anulação de um montante dos impostos devidos.

V - Conclusão

Desse modo, tendo em vista que é responsabilidade do contribuinte manter o registro


do imóvel atualizado, que o Fisco não pode se responsabilizar pelos erros cometidos pelos
contribuintes, que é incabível considerar que um imóvel meramente inutilizado se torna
residencial, que a atividade comercial do contribuinte em nenhum momento foi totalmente
interrompida, que os imóveis contribuíram para o desenvolvimento do negócio mesmo em
período pandêmico, que maior a capacidade contributiva sempre esteve presente, que os
imóveis nunca foram utilizados para fins residenciais, e que tampouco caberia qualquer
alegação de não dever de pagamento do imposto, requer-se que seja julgada improcedente a
ação.
Referências

COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 17. ed. rev. e atual.
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FIORANELL, Ademar; ANDRADE, Yulli Pereira de Castro. Fusão e unificação de imóveis -


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WANDERLEY, Maira Cauhi. A interpretação da norma tributária segundo o Código


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Você sabe qual é a diferença entre IPTU residencial e comercial? Entenda. [S. l.], 30 jan.
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