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Enzimologia

Clínica

Professora Jane Maciel Almeida Baptista

Disciplina de Bioquímica Clínica II

Departamento de Análises Clínicas e Toxicológicas

Faculdade de Farmácia da UFMG

Jane Maciel Almeida Baptista Faculdade de Farmácia da UFMG 1


Enzimologia Clínica

I. Introdução
A enzimologia clínica é a aplicação da ciência das enzimas ao diagnóstico e ao
acompanhamento de doenças. É uma das mais importantes contribuições da bioquímica
clínica contemporânea à clínica médica. Atualmente os ensaios enzimáticos correspondem
a cerca de 20 a 25% das dosagens executadas nos laboratórios de análises clínicas
hospitalares com, aproximadamente, 12 a 15 enzimas diferentes sendo analisadas.
A enzimologia clínica se originou da observação de que o nível das atividades enzimáticas
nos líquidos biológicos refletia a integridade dos diferentes órgãos. Cada tecido é equipado
de enzimas relacionadas com as suas funções, na sua maioria; determinada pela natureza
das reações químicas, que aí se processam. Assim, uma lesão tecidual provocará a
liberação, para os líquidos biológicos, de enzimas características deste tecido lesado. Este
“poder informativo” faz destas moléculas uma ferramenta indispensável ao diagnóstico e
ao prognóstico de numerosas patologias.
O início da aplicação das enzimas como marcadores tissulares data de 1908, quando
Wohlgemuth determinou a atividade da amilase na urina, aplicando-a ao diagnóstico da
pancreatite aguda. A medida da atividade enzimática sérica se iniciou com os estudos de
King, Kay, Bodansky e Roberts, entre 1920 e 1930, sobre a fosfatase alcalina nas doenças
ósseas e hepáticas. Após a cristalização da urease, em 1926, por Sumner, as pesquisas em
enzimologia clínica não cessaram de se multiplicar em benefício, em particular, da
biotecnologia e da saúde.
Os objetivos deste capítulo são:
 definir os conceitos básicos sobre atividade enzimática;
 conhecer os fatores que interferem sobre a atividade enzimática e como evitar a
interferência;
 caracterizar as enzimas de interesse diagnóstico;
 mostrar os métodos práticos para a determinação das atividades enzimáticas;
 estudar as patologias nas quais a determinação da atividade enzimática tem valor
diagnóstico.

II. Conceitos Básicos com Relação às Propriedades das


Enzimas

1. Enzima:

É uma proteína produzida pelos seres vivos, com efeitos catalíticos sobre uma dada reação
química, devido a uma ação ativadora. As enzimas são efetivas em pequenas quantidades,
permanecem inalteradas durante todo o tempo da reação e não alteram o equilíbrio de uma
reação reversível porém, aumentam a velocidade da reação para alcançar este equilíbrio. O
aumento da velocidade das reações químicas é cerca de 109 a 1020 vezes, permitindo que
uma molécula de enzima, na temperatura ambiente, transforme de 10 a 1.000 moléculas de

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substrato por segundo. A presença de enzimas em uma reação química faz com que a
reação se processe mais rapidamente porque diminui a energia de ativação que a molécula
de substrato precisa atingir, para que possa ser transformada. O gráfico abaixo mostra a
variação de energia observada numa reação química catalisada por enzima e numa reação
química sem a presença de enzima.

Energia X Reação

7
Ea1
6
Ea2 E
5

3 S
Energia

2
F
1
P
0
0 1 1,4 2,8 3 3,8 4 5 5,2

Reação

S = Substrato
P = Produto
Ea1= Energia de ativação necessária para uma reação química sem enzimas
Ea2 = Energia de ativação necessária para uma reação química com enzimas
E = Variação de energia de ativação entre Ea1 e Ea2
F = Variação de energia livre entre S e P

2. Estrutura da enzima:
As enzimas são macromoléculas de natureza essencialmente proteica e de arquitetura
globular e são formadas pelas seguintes estruturas:
 estrutura primária: ditada pela seqüência de aminoácidos presentes na cadeia
polipeptídica;
 estrutura secundária: constituída pelas pontes de hidrogênio internas, entre grupos CO e
NH dos aminoácidos, que conferem uma conformação helicoidal à molécula;
 estrutura terciária: representada pela disposição espacial dos aminoácidos, através de
reações bissulfito e iônicas, formando uma estrutura tridimensional;
 estrutura quaternária: corresponde à composição de grandes moléculas a partir da união
de subunidades, formando uma molécula protéica oligomérica (p.ex. LDH é um
tetrâmero, CK é um dímero).

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Na estrutura globular tridimensional de uma enzima evidencia-se uma zona limitada,
geralmente situada na parte hidrofóbica da molécula, denominada de sítio ativo. É através
do sítio ativo que a enzima se liga ao substrato e é esta capacidade que determina uma
propriedade fundamental das enzimas, a especificidade por um dado substrato ou seja, o
reconhecimento de uma molécula de substrato.
Muitas enzimas contêm um grupo prostético ligado à sua estrutura e imprescindível para a
atividade catalítica. Este grupo prostético pode ser uma molécula inorgânica, que
proporciona à enzima uma conformação estrutural que permita a sua ligação com o
substrato. Neste caso o grupo prostético é chamado cofator. Um exemplo, é o cloreto que é
um cofator para a amilase. O grupo prostético pode ser, também, uma grande molécula
orgânica, que atua como receptor ou doador de grupos químicos, formados durante a
reação química. Neste caso o grupo prostético é chamado de coenzima e pode ser uma
vitamina (biotina, ac. ascórbico) ou um nucleotídeo (NAD, NADH, FAD). Como exemplo
cita-se o NAD para a LDH:
COOH COOH
 PP 
LDH
CHOHPPPPPPP PPPPPC=O
 
CH3 NAD NADH + H+ CH3
ácido lático ácido pirúvico
Quando a enzima necessita de um grupo prostético ela é chamada de holoenzima e a parte
proteica é denominada de apoenzima.
Algumas vezes as enzimas se associam com outros elementos orgânicos produzindo
formas enzimáticas atípicas que, freqüentemente, apresentam elevada massa molecular e
são denominadas de macroenzimas. A associação pode ser feita com lipoproteínas,
geralmente  e pré-; com imunoglobulinas, IgG ou IgA; com substratos; com fragmentos
de membrana plasmática ou ainda associações como formas auto-agregáveis, formando
complexos multienzimáticos. A interpretação do significado fisiopatológico das
macroenzimas ainda é questionável. Com relação à ligação com imunoglobulinas parece
que processos imunológicos estariam envolvidos. Considerar que a presença dessas
macroenzimas pode estar associada a patologias específicas ainda não está completamente
esclarecido pois, com relação à amilase, 1% dos soros normoamilasêmicos apresentam a
macromilase, que também está presente em 2 a 4% dos soros hiperamilasêmicos. As
macroenzimas mais detectadas nos LAC são: amilase, CK, LDH, GGT e PAL.

2. Classificação das Enzimas:


A União Internacional de Bioquímica (IUB) estabeleceu um sistema de classificação e
nomenclatura das reações catalisadas por enzimas. De acordo com tal classificação as
enzimas se dividem em seis classes:
Classe 1 - Oxiredutases: são enzimas que transferem hidrogênio de um doador para um
receptor, catalisam as reações de oxidação-redução. Ex:
 Lactato desidrogenase (LDH), E.C.1.1.1.27
ácido pirúvico + NADH + H+ ácido lático + NAD
LDH

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Classe 2: Transferases: são enzimas que transferem grupos químicos ou radicais, de uma
molécula para outra, sem que o grupo transferido fique livre no meio da reação. Ex:
 Aspartato aminotransferase (AST), E.C.2.6.1.1
ácido aspártico + ácido -cetoglutárico ácido glutâmico + ácido oxalacético
AST
Classe 3: Hidrolases: são enzimas que catalisam as reações de hidrólise do substrato,
rompem uma ligação química mediante a introdução de uma molécula de água. Ex:
 Amilase (AMS), -1,4 glucan glucano hidrolase, E.C.3.2.1.1
amido AMS
 dextrinas + maltoses + glicose
Classe 4: Liases: são enzimas que catalisam as reações de remoção de grupos de um
substrato, sem que ocorra hidrólise, deixando duplas ligações na estrutura do produto. Ex:
 Aldolase (ALD), D-frutose-1,6 difosfato-D-gliceraldeído-3-fosfato-liase, E.C.4.1.2.13
frutose 1,6-difosfato ALD
 fosfato de dihidroxiacetona + gliceraldeído 3-fosfato
Classe 5: Isomerases: são enzimas que catalisam o rearranjo intramolecular do substrato ou
seja, a interconversão de isômeros. Ex:
 Glicose 6-fosfato isomerase (GPI), E.C.5.3.1.1
glicose 6-fosfato GPI
 frutose 6-fosfato
 Classe 6: Ligases: são enzimas que catalisam a união de duas moléculas de substrato
com o concomitante rompimento de ligações pirofosfato. Ex: Piruvato carboxilase
(PIC), E.C.6.4.1.1
piruvato + ATP PIC
 oxoloacetato + ADP + Pi
A Comissão Internacional para a Nomenclatura Bioquímica (CINB) foi encarregada pela
IUB de fixar para cada enzima conhecida a correspondente nomenclatura, classificação,
unidade e símbolo. Para exemplificar esta classificação a enzima conhecida vulgarmente
como creatina quinase será usada:
 reação catalisada:
creatina + ATP ADP + creatina-P
 nomenclatura: creatina N-fosfotransferase
 símbolo: CK
 classificação: E.C. 2. 7. 3. 2
Enzyme Comission
Classe Transferase
Sub-Classe Fosfotransferase
Sub-Sub-Classe Fosfotransferase que contém N como receptor
Número da enzima na Sub-Sub-Classe
Como nome vulgar a E.C. aconselha:
 nome do substrato com o sufixo “ase”: lipase, amilase

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 nome da reação + “ase” + nome do substrato: desidrogenase lática
 nome do substrato + nome da reação + “ase”: creatino quinase

3. Atividade Enzimática:
A atividade enzimática é definida como sendo a capacidade de uma enzima de transformar
um substrato em um determinado tempo e não serem consumidas neste processo. Para
atuarem as enzimas formam com o substrato a ser transformado um complexo enzima-
substrato. O substrato se liga à enzima em um local específico, o sítio ativo. Durante um
determinado tempo a enzima age sobre o substrato, transformando-o em um produto e,
sendo liberada, pode se ligar a outra molécula de substrato. Esta reação pode ser
exemplificada pelo seguinte esquema:

Enzima + Substrato Complexo E-S  Produto + Enzima


O estudo da atividade enzimática foi muito desenvolvido por Michaelis e Menten (1913) e
é exemplificado pela seguinte equação:
Vm  [s]
V
km  [s]
e pela curva da velocidade da reação x concentração do substrato:

Velocidade da Reação X Concentração


do Substrato

4,5
Velocidade da reação

4 V max
3,5 Reações de ordem zero
3
2,5
2 V max/2
1,5
1
0,5
0
0 1 2
Km 3 4 6 7 8
Concentração do substrato (mol/L)

Pelo gráfico se observa que a velocidade da reação enzimática se eleva com o aumento da
concentração do substrato, até um certo ponto no qual a concentração do substrato não é
fator limitante para o aumento da velocidade da reação. Neste ponto é atingida a velocidade
máxima da reação (Vmax) e a quantidade de substrato presente não mais influi sobre ela.

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As reações enzimáticas que ocorrem nestas condições são chamadas de “reações de ordem
zero”. Esta é a condição, em termos de concentração de substrato e velocidade de reação,
utilizada em bioquímica clínica para a determinação das atividades enzimáticas pois, a
velocidade máxima é alcançada em pouco tempo de incubação.
Este gráfico permite o cálculo de uma importante constante de utilização prática, a
constante de Michaelis-Menten, simplificadamente denominada de Km. Esta constante é
característica para cada reação enzima-substrato e é numericamente igual à concentração
do substrato, em mol/litro, quando a velocidade da reação atinge a metade da velocidade
máxima. Em bioquímica clínica a concentração de substrato utilizada nas medidas das
determinações enzimáticas é sempre em excesso e deve ser superior a cerca de 10 vezes o
valor do Km. A constante de Michaelis-Menten mede a afinidade da enzima pelo seu
substrato. Um Km elevado significa que a velocidade máxima da reação é atingida com
uma concentração elevada de substrato. Neste caso a enzima não tem uma boa afinidade
para o substrato pois, a velocidade máxima da reação é atingida com substrato muito
concentrado.

4. Unidades de medida da atividade enzimática:


Segundo a CINB uma unidade de atividade catalítica de uma enzima é definida como
sendo a quantidade de enzima que catalisa a transformação de um micromol de substrato
ou a formação de um micromol de produto, por minuto e por litro de material biológico,
nas condições padrão recomendadas, e é denominada de Unidade Internacional (UI):
1 UI = 1 µmol/minuto/Litro (1 UI = 1 µM/min/L)
Atualmente, para padronizar as condições experimentais de acordo com o sistema
internacional de medidas, a CINB sugere o emprego da unidade de atividade catalítica,
denominada de catabilidade ou Katal, com o símbolo kat. O Katal é definido como sendo a
quantidade de enzima que produz uma velocidade de catálise de um mol de substrato, por
segundo, por litro de material biológico, nas condições padrão recomendadas.
1 kat = 1 mol/segundo/Litro (1 kat = 1 M/s/L)
Na prática utiliza-se o µkat (10-6 kat) ou o nkat (10-9 kat). Para transformar UI em kat,
considera-se que 1 UI corresponde a 16,67 nkat.
1 UI = 16,67 nkat
No início das experiências para o desenvolvimento das metodologias empregadas nas
determinações enzimáticas, cada pesquisador definia as suas condições experimentais.
Desta maneira, muitas metodologias ainda estão em prática e são denominadas de
“unidades clássicas”. Ao trabalharmos com estas unidades, devemos transformar a
atividade encontrada em “unidade clássica” para a Unidade Internacional (UI) e para a
Unidade Catalítica (Katal).
Ex: Determinou-se a atividade da amilase em um soro de um paciente, pelo método de
Somogy e foi encontrado o valor de 53 US. Transformar em UI e kat.
 1 Unidade Somogy é definida como sendo a quantidade de amilase que catalisa a
formação de 1 mg de glicose, durante 30 minutos em 100 mL de soro.
1 US = 1 mg glicose - 30 min - 100 mL e
1 UI = 1 µmol glicose - 1 min - 1000 mL

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 Transformar 1 mg de glicose em µmol de glicose
PM glicose = 180 g
1 Mol = 180 g  1 µmol = 180 x 10-6 g = 180 x 10-3 mg
1 mol  180  10-3mg
x = 5,56 mol
x  1 mg
 Calcular o fator que transforma US em UI
1 US 5,56  m ol  30 min  100 m l
1 U I  1  m ol  1 min  1000 m l

5,5611000
F=  1,85
130100
 1 US = 1,85 UI
 Transformar US em UI
1 US  1,85 UI
x = 98 UI/L
54 US  x
 Transformar UI em Katal
1 UI  16,67 nkat
x= 1634 nkat ou 1,6 kat/L
98 UI  x
 Assim, 53 US/100 mL = 98 UI/L = 1,6 µkat/L

5. Fatores que afetam a velocidade das reações enzimáticas:


Para que uma reação enzimática se processe normalmente e de acordo com as leis de
Michaelis-Menten é necessário que as condições de temperatura, pH, concentração do
substrato, presença de ativadores e inibidores, concentração do coenzima e tempo da reação
sejam padronizadas e controladas. Caso contrário cada um destes elementos influenciará na
alteração da atividade enzimática, introduzindo erros. Assim, esses fatores influenciarão a
velocidade da reação enzimática da seguinte maneira:
a) Concentração do substrato:
A formação do complexo enzima-substrato pode ser esquematizada como a seguir:

+
+
Enzima + Substrato Complexo Produto + Enzima
[E-S]

A enzima se apresenta com o seu centro ativo onde se instala o substrato. O complexo [E-
S] é formado e, em um determinado tempo o produto da reação é liberado e o centro ativo
da enzima, livre, pode ligar-se a outra molécula de substrato. Em concentrações baixas de
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substrato a enzima é envolvida, apenas, por um pequeno número de moléculas de substrato
e a probabilidade de que uma molécula encontre um centro ativo livre é menor do que a
uma concentração elevada de substrato. Com o aumento da concentração de substrato, o
tempo para que uma nova molécula encontre um local de ligação livre é diminuído. Em
concentração elevada de substrato a enzima fica envolvida por tantas moléculas que
qualquer ponto de ligação fica imediatamente ocupado, formando-se rapidamente o
produto da reação. Nestas condições a enzima está “saturada” de substrato e a velocidade
da reação atinge um máximo, dependendo apenas do tempo que a enzima precisa para
transformar o substrato.

Baixa [S] Elevada [S]


É importante citar, novamente, que a concentração de substrato ideal para o processamento
das reações enzimáticas, em bioquímica clínica, é igual a 10 vezes do valor do Km, para
cada reação enzima-substrato, e em condições de reação de ordem zero.
b) Concentração da enzima:
A velocidade da reação é proporcional à quantidade de enzima presente na solução, dentro
de certos limites. Quando a enzima está presente em altas concentrações ocorre a perda da
linearidade e a reação enzimática vai se processar fora das condições ideais. A enzima em
alta concentração transforma o substrato rapidamente, em menos tempo do que o
necessário estipulado pela metodologia. Nestas condições o substrato é todo consumido e
ainda resta enzima. Isto deve ser observado e cada método enzimático padronizado indica
qual é a linearidade da reação enzimática. Quando, após a reação enzimática, observa-se
que a atividade da enzima ultrapassou a linearidade do método, deve-se fazer uma nova
reação, com o material biológico diluído, para que a condição de substrato elevada seja
mantida.

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Velocidade da reação x concentração da
enzima

6
Velocidade da

Reação linear
4
reação

2 Reação sem
linearidade
0
0 1 2 3 4 5
Concentração da enzima

c) Temperatura:
c) Temperatura:
Para que o complexo E-S se forme é necessária uma quantidade de energia, em forma de
calor. A temperatura exigida, para a maioria das enzimas, oscila em torno de 37ºC e é
chamada de temperatura ótima. Em condições de temperatura abaixo da temperatura ótima
a velocidade da reação diminui, observando-se um efeito acelerador até que a temperatura
ótima seja atingida, acima desta temperatura observa-se, novamente, uma diminuição da
velocidade da reação, devido a um efeito desnaturante. A temperatura crítica, de
desnaturação da enzima, é característica de cada enzima e está em torno de 50 a 60 ºC. A
inativação térmica depende, também do tempo em que a enzima é exposta a tal
temperatura.

Velocidade da reação x Temperatura

6
Velocidade da reação

Efeito
5 Efeito desnaturante
acelerador
4
3 Temperatura
2 ótima
1
0
o
0 0,5 1 1,5 2 2,5
37 3C 3,5 4 4,5 o 5 5,5 6
50
Temperatura C

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d) pH:
A principal ligação química envolvida na formação do complexo enzima-substrato é a
ligação iônica, que permite a interação de uma carga negativa do centro ativo da enzima
com uma carga positiva do substrato. Isto ocorre se a concentração hidrogeniônica do meio
for propícia à dissociação dos grupos químicos envolvidos. O pH nos quais estas interações
eletrostáticas, da enzima com o substrato, ocorrem com maior intensidade e portanto a
velocidade da reação enzimática é máxima, é chamado de pH ótimo da enzima. Outra
ligação química importante, na formação do complexo enzima-substrato e que, também, é
afetada pelo pH do meio, são as pontes de hidrogênio. O pH ótimo é característico para
cada enzima. Ex: a fosfatase ácida prostática age em pH de 4 a 7; a fosfatase alcalina em
pH variando de 8,5 a 10,5 e as aminotransferases em pH 7,4.

Velocidade da reação x pH

6
Velocidade da reação

2 pH
ótimo
1

0
0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5 4 4,5 5 5,5 6
pH

e) Concentração e natureza do tampão:


As reações catalisadas por enzimas se processam em meio tamponado, suficientemente
forte para impedir as variações de pH que possam ocorrer durante a reação e para conservar
o pH ótimo da atividade enzimática. A natureza do tampão é também importante para a
manutenção de uma velocidade de reação ideal. Ex: o tampão fosfato tem a vantagem de,
nas reações de transferência, inibir a GLDH, eventualmente alterada, que poderia consumir
o substrato ácido -cetoglutárico, da aminotransferase; o tampão Tris (Tris-hidroximetil-
aminometano) usado para as reações catalisadas por oxidases, tem a função de estabilizar o
coenzima NADH presente e inibir o crescimento microbiano.
f) Presença de efetores:
Efetores são substâncias químicas que, presentes numa reação catalisada por enzimas
alteram a velocidade da reação. Eles interagem com a enzima ligando-se ao seu sítio
alostérico ou sítio modulador. Os efetores são ativadores quando se unem à enzima e
provocam um aumento da velocidade da reação. Como exemplo se pode citar alguns íons
metálicos, como o Cl- que ativa a amilase, o Mg++ que ativa as enzimas que convertem o
ATP e o Mn++, Zn++ e Co++ que ativam as peptidases. Os efetores são inibidores quando, ao
se unirem à enzima, dificultam a interação desta com o substrato, diminuindo, assim, a
velocidade da reação enzimática. Por exemplo o EDTA inibe a PAL, o oxalato inibe as
aminotransferases, o fluoreto inibe as enzimas da via glicolítica e o cianeto inibe a
peroxidase.

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g) Tempo da reação:
As metodologias empregadas para a determinação das atividades enzimáticas já
determinam o tempo ótimo de reação, que é característico para cada ensaio enzimático e é,
normalmente limitado a um consumo de 10% do substrato. A velocidade de uma reação
enzimática pode decrescer devido a um tempo de reação prolongado. Pode ocorrer inversão
da reação devido ao acúmulo do produto, inativação da enzima, formação de substâncias
inibidoras ou o simples esgotamento do substrato.
h) Concentração do coenzima:
O coenzima atua, na reação catalisada por enzimas, como receptor ou doador de grupos
químicos formados durante a reação. Ele está firmemente ligado à enzima e será
modificado de um modo estequiométrico, como o substrato. A quantidade de coenzima
presente no meio deve ser controlada para que a velocidade da reação seja mantida. Ex:
variação da atividade da GLDH em função da concentração de NADH (coenzima).

Atividade de GLDH x Concentração de


NADH

15
Atividade da
GLDH (UI/L)

10

5 Concentração ideal

0
0 0,1 0,2 0,25 0,3 0,4 0,5 0,6
Concentração de NADH (mmol/L)

6. Principais causas de erro nas determinações enzimáticas:


Erros podem ser inseridos numa determinação enzimática desde a coleta do material até a
avaliação do resultado. É importante conhecer estes erros e evitá-los para a garantia de um
resultado correto.
a) Erros na coleta da amostra: uma amostra coletada e separada perfeitamente é
indispensável para a obtenção de uma atividade enzimática confiável. Durante a coleta,
manuseio, processamento e transporte da amostra as enzimas serão influenciadas por
fatores que podem alterar suas atividades:
 Uso de anticoagulantes: o material biológico, de escolha, para ser utilizado nas
determinações enzimáticas é o soro, porque não contém substâncias estranhas. Os
anticoagulantes ao serem adicionados à amostra, para a obtenção de plasma, podem inibir
as enzimas. Ex: o oxalato inibe as aminotransferases, o EDTA a PAL e a heparina a LDH.
 Hemólise: uma amostra hemolisada não pode ser utilizada para a determinação da
atividade enzimática pois, a lise das hemácias e/ou dos elementos figurados do sangue vai
provocar a liberação de substâncias intracelulares que contaminarão o soro, provocando
erros no resultado final. Ex: LDH e PAC estão presentes nas hemácias e plaquetas, em caso
de hemólise ocorre contaminação do soro com estas enzimas e elevação destas atividades
enzimáticas no soro a ser processado; a hemoglobina, presente no soro hemolisado, inibe a
atividade da lipase.

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 Estase venosa: a demora na coleta do sangue provoca hipóxia, falta de O2, o que
aumenta a permeabilidade das membranas das células sangüíneas e a liberação do conteúdo
intracelular para o plasma. Ex: liberação de PAC, LDH e AST para o plasma devido à
estase venosa prolongada e aumento da atividade das enzimas no soro a ser processado.
 Coagulação: a separação do soro deve ser feita rapidamente após a coleta pois, a
coagulação provoca a desintegração de plaquetas e eritrócitos, provocando a contaminação
do soro por elementos presentes nestas células.
 Emprego de soro lipêmico: o soro que contêm alta concentração de lípides,
normalmente é turvo e provocará turbidez na reação enzimática e criará um erro
fotométrico.
b) Erros na conservação da amostra: as amostras biológicas devem ser conservadas a 4ºC
e a determinação da atividade enzimática deve ser feita rapidamente. O congelamento do
soro deve ser evitado, pois a cristalização da água, presente no soro, provoca uma alteração
irreversível das ligações de hidrogênio da enzima e, portanto, a sua desnaturação. Algumas
enzimas são relativamente estáveis no soro, como a PAL e GGT, outras perdem a atividade
ao longo do tempo, devido a uma meia vida característica. Um cuidado especial se deve ter
com PAP, pois a atividade desta enzima decresce rapidamente, em poucas horas após a
coleta, devido à alcalinização do soro, por perda de O2. Para manter a atividade desta
enzima se deve acidificar o soro, logo após a coleta, utilizando o tampão acetato 5M, pH
5,0, e adicionando 0,02 ml de tampão, para cada 1 ml de soro. O envelhecimento do soro
provoca a proteólise, a perda de estruturas terciárias e o bloqueamento dos grupos -SH das
enzimas, com conseqüente perda de atividade enzimática. A Tabela abaixo mostra a
variação da atividade de enzimas, com relação ao tempo de conservação.

Enzima 24 horas 48 horas 3 dias 5 dias 7 dias


Temperatura
(oC)

AST 4 2% 5% 8% 10% 12%


25 2% 6% 10% 11% 13%
ALT 4 2% 5% 10% 14% 20%
25 8% 12% 17% 19% 39%
LDH 4 0% 4% 8% 9% 12%
25 0% 1% 2% 10% 15%
CK 4 0% 0% 2% - 2%
(NAC) 25 2% - 7% - 19%
PAL 4 0% 0% 0% 0% 0%
25 0% 2% 3% 6% 10%
GGT 4 0% 0% 0% 0% 0%
25 0% 0% 0% 0% 0%
AMS 4 0% 0% 0% 0% 0%
25 0% 0% 0% 0% 0%
PAP 4 0% 0% 0% 0% 0%
(pH 5,0) 25 0% 0% 0% 0% 0%

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c) Erros nas medidas da atividade enzimática: para evitar erros é imprescindível um
controle do tempo da reação estipulado pela metodologia, do pH das soluções, da
temperatura da reação, da concentração do substrato, da estabilidade dos reagentes, da
pipetagem e da limpeza da vidraria. O espectrofotômetro a ser utilizado deve estar em boas
condições e, se a metodologia exige comprimento de onda na faixa do ultravioleta para a
leitura fotométrica, o espectrofotômetro deve ter sensibilidade para esta faixa.
d) Erros na avaliação do resultado: o objetivo dos analistas é a obtenção de resultados
corretos em uma análise. Para isto é necessário trabalhar com muito critério para não
incorrer em erros e o controle de qualidade deve ser uma aplicação obrigatória no LAC,
como, por exemplo, a utilização de amostras controle e a participação em um programa de
controle externo de qualidade. Além disto, ao se avaliar o resultado obtido, a observação
da linearidade da reação é obrigatória, como também dos valores de referência do método.

7. Metodologias utilizadas para a determinação das atividades enzimáticas:


Devido à natureza proteica, à baixa concentração no soro e a dificuldade para sua
purificação, as enzimas, na maioria dos métodos utilizados em bioquímica clínica, não são
dosadas diretamente. Determina-se a sua atividade, isto é a quantidade de enzima que
catalisa a transformação de uma determinada quantidade de substrato, durante um
determinado tempo, em um volume determinado de material biológico. Três processos
gerais são utilizados para a determinação da atividade das enzimas:
a) Métodos Colorimétricos: são aqueles que possibilitam a determinação da atividade
enzimática através de uma reação colorimétrica. A determinação da atividade pode ser feita
através da medida da quantidade de produto formado ou através da medida da quantidade
de substrato consumido:
 Medida da quantidade de produto formado:
 Produto formado é um composto corado:
ex: Mét. Bessey-Lowry para PAL (1µmol/60 min/1 mL)
PAL
p-nitrofenil-fosfato p-nitrofenol + Pi
(incolor) (amarelo)
Mede-se a intensidade de cor amarela final, que é proporcional à atividade da PAL.
 Produto formado é transformado em um composto corado, através de uma reação
química:
Ex: Mét. Somogy para determinação da amilase (1 mg/30 min/100 mL)
amido AMS
 glicose + ortotoluidina (incolor)
 BM 100 o C - 5 min
glicosil - ortotoluidina (verde)
A intensidade de cor verde, medida ao final da reação, é proporcional à atividade
da AMS.

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 Medida da quantidade de substrato consumido:
 Substrato não consumido é transformado em um composto corado através de uma
reação química:
Ex: Mét. Caraway para determinação da amilase (1 mg/30 min/100 mL)
amido AMS
 glicose + maltose + amido
 + Iodo
complexo coloidal
(azul)
A intensidade de cor azul, medida ao final da reação é inversamente proporcional à
atividade AMS.
b) Métodos Cinéticos: realizam-se várias medidas da absorbância, em idênticos
intervalos de tempo, para a obtenção de dados sobre a velocidade da reação química. Nos
métodos cinéticos pode-se medir a variação da concentração da coenzima que participa da
reação ou a variação da concentração do produto corado formado.
 Medida da variação da concentração da coenzima:
Ex: Mét. Wacker para determinação da LDH (UI)
LDH
ácido lático ácido pirúvico
NAD NADH+H+ .

Mede-se o aumento de absorbância, em 340 nm, devido à formação de NADH, que é


proporcional à atividade da LDH.
A aplicação deste método veio do conhecimento de que as formas oxidadas das coenzimas
NAD e NADP apresentam espectros de absorção distintos das formas reduzidas, NADH e
NADPH. O princípio da medida se baseia em que as coenzimas reduzidas absorvem a luz
UV em um determinado comprimento de onda, enquanto que as formas oxidadas não
apresentam esta absorção. Isto é exemplificado pelos espectros de absorção apresentados
pelas duas formas, no quadro abaixo:

Espectro de Absorção

1,4
1,2
Absorbância

1
0,8 NAD
0,6 NADH
0,4
0,2
0
0

0
2

0
2

Comprimento de onda (nm)

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As enzimas que precisam dos coenzimas NAD ou NADP para exprimirem sua atividade
podem ter suas atividades medidas com a ajuda da diminuição ou do aumento da
absorbância, relativa ao NAD ou NADP, na região do ultravioleta próximo (334,340,366
nm). A diminuição ou o aumento da absorbância, verificado por minuto é diretamente
proporcional à atividade da enzima, pois a reação química se processa
estequiometricamente; para cada mol de coenzima consumido, um mol de substrato
também é consumido.
 Medida da formação do produto corado:
Ex: Mét. de Szass para determinação da GGT (UI/L):
gama-glutamil p-nitroanilida GGT gama-glutamil glicilglicina
+ glicilglicina + p-nitroanilina
(incolor) (amarelo).
Mede-se o aumento de absorbância, em 420 nm, devido à formação de p-nitroanilina de cor
amarela. A quantidade desta substância liberada é diretamente proporcional à atividade da
GGT.
c) Métodos Otimizados: foram propostos pela Associação Alemã para a Química
Clínica com o objetivo de se obter resultados comparáveis nas determinações enzimáticas.
Estes métodos apresentam uma sensibilidade elevada e excelente reprodutibilidade. Além
de uma temperatura padrão de 25 ºC, são também padronizadas as outras condições como o
tipo e a concentração do tampão, o pH das soluções, a concentração do substrato, a
concentração da coenzima, a presença de cofatores e efetores. As recomendações são
válidas para as seguintes enzimas: AST, ALT, GLDH, CK, LDH, -HBDH, PAL E LAP.
d) Outros métodos: vários tipos de métodos são descritos para a determinação da
atividade enzimática, entretanto, a aplicações no LAC é restrita devido a exigência de
aparelhos especiais e metodologias onerosas e complexas que limitam a utilização na rotina
laboratorial. Ex: métodos fluorimétrico, eletroquímico, isotópico, cromatográfico, etc.

8. Cálculos para a determinação da atividade enzimática pelos métodos cinéticos:


Nos métodos cinéticos realizam-se várias medidas da absorbância, em intervalos de tempo
idênticos, para se obter dados sobre a velocidade da reação. O aumento ou a diminuição da
absorbância é linear em função do tempo, de acordo com o gráfico:

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Para a medida da absorção da substância a ser medida partimos da fórmula da Lei de
Lambert-Beer:

A = abc
A = absorbância
a = coeficiente de extinção molar da substância a ser medida (cm2/M)
b = trajetória de energia radiante (espessura da cubeta) (cm)
c = concentração (atividade) UI/L
Para calcular a atividade:
A
c =
ab
Como a absorbância é medida em vários tempos, calcula-se o A/min:
A / min
c =
ab
Para que a fórmula seja usada deve-se ainda considerar a diluição da substância a ser
medida no sistema e a quantidade de amostra usada:
A/min Vol u me t o ta l
c= 
ab Vol u me da a mo stra
A atividade enzimática é expressa em Unidade Internacional (UI), que corresponde à
quantidade de enzima que catalisa a transformação de 1 µmol de substrato, por minuto, por
litro de material biológico. Assim, deve-se multiplicar por 106, para transformar Mol em
µmol e por 103, para transformar cm3 (mL) em litro:
c= A/ min  Vt ( mL)  106  103
a ( cm2/M)  b (cm) Va (mL)

 Mol/ min/Litro Mol 106   Mol


cm2  cm = cm3 = mL mL  103  Litro

Portanto, para calcular a determinação da atividade enzimática pelos métodos cinéticos se


utiliza a seguinte fórmula:
A / min Vt
c =   106  103
ab Va

Exemplo: Calcular a atividade da LDH, pelo método de Wroblewsky, sendo dados:


 reação: ácido pirúvico + NADH + H+  ácido lático + NAD
 volume de substrato: 3,0 mL
 volume de soro: 0,1 mL

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 coeficiente molar do NAD em 340 nm = 6,25  106 cm2/M
 espessura da cubeta = 1 cm
 absorbâncias obtidas:
tempo Absorbâncias
t0  A0 = 0,482
t1  A1 = 0,409
t2  A2 = 0,334
t3  A3 = 0,260
1º) Cálculo de A:
A1 = A 0 - A1 = (0,482 - 0,409) = 0,073
A 2 = A1 - A 2 = (0,409 - 0,334) = 0,075
A 3 = A 2 - A 3 = (0,334 - 0,206) = 0,074
 A = 0,222  3 = 0,074
A / min = 0,074 / min
2º) Cálculo da atividade:
A / min Vt 0,074 / min 3,1
c =   106  103 =   106  103
ab Va 6,25  10 cm / M  1 cm
6 2
0,1
c = 367 mol / min / l = 367 UI / l

III. Aspectos Biológicos das Enzimas

1. Origem das enzimas circulantes:


A maior parte das enzimas detectadas nos fluidos corporais é sintetizada por células
teciduais e é liberada, posteriormente, para os líquidos corporais. As enzimas encontradas
nas células, são aquelas necessárias para que a célula realize suas funções, o que é
determinado pela natureza das reações químicas que se desenvolvem no seu interior. Desta
maneira as enzimas circulantes são classificadas em:
 Plasma-específicas: são enzimas que se encontram no plasma em concentração
apreciável. Elas são sintetizadas pelo fígado e liberados para a circulação sangüínea,
onde os seus substratos estão presentes e onde, então, elas exercem suas funções: Ex:
Colinesterase (CHE) e enzimas da coagulação (fatores V, VII e X).
 Plasma-inespecíficas: são enzimas sintetizadas pelas diferentes células do organismo e
exercem suas ações dentro das células, somente aparecem no plasma, em concentração
apreciável, quando liberadas pelas mesmas, em decorrência de transtornos da função
celular. Ex: AST, ALT, GLDH, CK, etc…
Dentro das células as enzimas se localizam em diferentes locais. O conhecimento de sua
localização tem interesse fundamental em patologia. Quanto à localização intracelular as
enzimas são classificadas em:

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Uniloculares: ocupam somente uma posição dentro da célula, por exemplo, dentro de uma
só organela. Ex: GLDH é de localização 100% mitocondrial.
Biloculares: ocupam duas posições dentro da célula, isto é, se localizam em duas organelas
diferentes. Ex: AST está presente no citoplasma (60%) e nas mitocôndrias (40%).
O conhecimento desta localização é importante pois caracteriza o tipo de lesão celular. As
enzimas presentes nas membranas celulares e no citoplasma são liberadas precocemente
quando ocorre uma lesão celular, são, portanto, indicadoras de uma lesão aguda; como
exemplo pode-se citar a elevação da GGT, PAL e ALT na hepatite aguda. As enzimas
presentes em organelas, são liberadas para a circulação, mais tardiamente são, portanto,
indicadoras de uma lesão crônica, como exemplo pode-se citar a elevação da GLDH e AST
na hepatite crônica.

Localização de algumas enzimas:


 membranárias: PAL, 5’NUT, GGT
 citoplasmáticas: LDH, ALT, CK, AST (60%)
 mitocondriais: GLDH, AST (40%), CK
 lisossomais: PAC
 microssomais: GGT

2. Localização Tissular:
Cada tecido possui enzimas relacionadas com a sua função. As proteínas enzimáticas são,
portanto, marcadores tissulares. Entretanto, esta organoespecificidade não é absoluta, a
AST e a LDH encontram-se em quantidades comparáveis em diferentes tecidos (coração,
fígado, músculos esqueléticos) mas a ALT é um bom marcador hepático e a CK é também
um bom marcador para o músculo cardíaco e o músculo esquelético. O quadro seguinte
mostra a atividade relativa das enzimas nos tecidos em relação ao soro:

Enzimas Soro Eritrócitos Fígado Coração Músculo


Normal Esquelético
AST 1  15  7.000  8.000  5.000
ALT 1 7  3.000  400  300
LDH 1  300  1.500  1.000  700
CK 1 <1  < 10  10.000  50.000
Neste quadro observa-se o extraordinário gradiente de concentração entre o tecido, onde as
enzimas exercem a sua atividade de catálise biológica e o soro, onde elas só aparecerão
devido a diferentes processos fisiológicos ou patológicos. Este gradiente de concentração
determina a excelente sensibilidade diagnóstica que constitui a medida das atividades
enzimáticas séricas para testemunhar uma alteração tissular.

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3. Liberação Celular das Enzimas:
Os mecanismos de liberação celular das enzimas estão relacionados ao estado energético de
uma célula. Em um nível energético intracelular normal, a célula ocupa um espaço
definido. As bombas iônicas membranárias, ATP-dependentes, determinam este volume
através da integração de potássio e a excreção de cálcio, sódio e água. Se o ATP
intracelular baixar em concentração, as bombas iônicas são perturbadas e a célula aumenta
de volume. A concentração intracelular do cálcio eleva-se paralelamente ao aumento de
volume celular. O cálcio ativa os filamentos contráteis dispostos do lado interno da
membrana celular e formam-se, desta maneira, os poros na membrana. Este é o estado
reversível de sofrimento celular onde ocorre um aumento de permeabilidade celular. As
enzimas podem se liberar da célula através destes poros. Quando a célula está totalmente
privada de ATP, a integridade membranária não é mais mantida, este é o estado irreversível
de necrose celular. A célula libera todo o seu conteúdo no meio onde ela está localizada,
inclusive as enzimas.

4. Difusão das enzimas para o compartimento sangüíneo:


Uma vez liberadas pelas células, as macromoléculas enzimáticas vão chegar à circulação
através de diversas vias. No meio celular habitual, a proximidade entre células e capilares
sangüíneos e a espessura da membrana basal destes capilares são variáveis de acordo com o
tecido. Estes dois parâmetros vão condicionar a difusão das enzimas dos tecidos para os
compartimentos sangüíneos.
Quando a membrana basal é espessa, as macromoléculas enzimáticas não podem atravessar
esta membrana para chegar ao sangue e são obrigadas a seguir a via linfática.
Os diferentes modos de difusão podem ser exemplificados como a seguir:
PARÂMETROS MODO DE DIFUSÃO EXEMPLOS
 Membrana basal muito permeável Diretamente no sangue Fígado
 Células muito próximas dos capilares Baço
sangüíneos
 Membrana basal semipermeável Passagem parcial ou total Coração
das enzimas pela linfa
 Células distantes dos capilares Pâncreas
Próstata
 Membrana basal espessa e impermeável Passagem obrigatória pela Músculos
às macromoléculas linfa esqueléticos
 Células bastante distantes dos capilares

A conseqüência direta é o distanciamento constatado entre o momento da alteração celular


e a elevação das atividades enzimáticas no sangue. Uma hipóxia experimental sobre o
fígado leva a uma elevação enzimática sérica após sete minutos. Nas patologias cardíacas,
pancreáticas e prostáticas passam-se várias horas entre a alteração celular e as elevações
séricas das enzimas. As variações enzimáticas que acompanham o esforço muscular podem
se estender por vários dias após o fim do esforço.

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5. Eliminação:
A eliminação das enzimas do organismo é feita pela captação das enzimas circulantes no
sangue pelo fígado, rins e intestino. Os macrófagos do sistema retículo endotelial
participam também desta eliminação progressiva das enzimas. A vida média das enzimas
no soro é mais curta que outras proteínas.
Em conclusão, três etapas sucessivas determinam as atividades enzimáticas medidas no
sangue: liberação celular, distribuição e difusão através dos compartimentos anatômicos e a
eliminação do organismo.
Cada medida de atividade enzimática, efetuada em um instante preciso é a resultante destas
três etapas. Medidas de atividades enzimáticas repetidas, em intervalos fixos, permitem a
apreciação da evolução do fenômeno patológico.

6. Alterações da atividade enzimática:


A atividade das diversas enzimas no plasma pode se alterar devido a diversos fatores
fisiológicos. As alterações observadas são:
a) Aumento da atividade enzimática: várias patologias orgânicas ou mesmo fatores
fisiológicos aumentam a quantidade de enzimas que se libertam para o exterior da célula e
serão provocados por:
 Alteração da membrana celular com aumento da permeabilidade desta membrana, ex:
 hepatites agudas  liberação de enzimas membranárias ou citoplasmáticas: ALT,
PAL elevadas no plasma;
 distrofia muscular: CK elevada no plasma;
 Necrose celular:
 infarto agudo do miocárdio: CK, AST, LDH elevadas no plasma;
 pancreatite aguda: AMS, LPS elevadas no plasma;
 Causas iatrogênicas: produzidas por procedimentos médicos ou cirúrgicos:
 injeções intramusculares de volume superior a 1,0 ml elevam os valores séricos de
CK até 3 a 5 vezes os níveis normais;
 cirurgias extensas elevam os valores de CK devido ao trauma muscular associado;
 administração de opióides (morfina e outros) eleva os valores séricos de AMS, pois
causam constrição do esfíncter de Oddi e dos ductos pancreáticos, com conseqüente
elevação da pressão nestes ductos e regurgitamento de AMS para o soro.
 Diminuição da excreção das enzimas: por alterações nos mecanismos de excreção
enzimática, as enzimas terão a sua atividade elevada no plasma por ficarem retidas:
 colestase: elevação plasmática de PAL, LAP, GGT, 5’NT;
 insuficiência renal: elevação plasmática de AMS.
b) Diminuição da atividade enzimática: algumas patologias provocam a diminuição da
atividade de enzimas, que podem ser devidas a:
 Diminuição da síntese enzimática:

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 doenças hepáticas crônicas: diminuição da atividade plasmática da CHE.
 Aumento da excreção das enzimas:
 nas nefroses, onde ocorre um aumento da excreção urinária observa-se a diminuição
da atividade plasmática da ceruloplasmina.

7. Formas múltiplas das enzimas:


Termo preconizado pela União Internacional de Bioquímica (IUB) para designar todas as
proteínas enzimáticas diferentes, provenientes de espécies diferentes ou de um mesmo
indivíduo mas, de tecidos diferentes ou de compartimentos celulares diferentes, que
catalisam uma mesma reação química. Exemplo: a LDH do homem e a LDH do coelho são
provenientes de espécies diferentes, mas catalisam a mesma reação química; a GGT circula
sob formas diferentes, ligada a apoproteínas ou lipoproteínas ou livre, e catalisa a mesma
reação.
O termo “isoenzima” é recomendado para as formas múltiplas provenientes de uma
modificação genética na estrutura primária da proteína. Portanto, as isoenzimas são
formadas, devido a existência de mais de um locus genético codificando para a estrutura da
proteína enzimática. As isoenzimas distinguem-se umas das outras por:
 estrutura primária diferente;
 distribuição quantitativa na molécula da enzima;
 diferente velocidade de migração na eletroforese;
 diferente troca iônica na cromatografia;
 diferentes reações, quando há processo de ativação e inativação como temperatura e
produtos químicos;
 diferentes especificidades para substratos químicos semelhantes.
Como exemplo pode-se citar a LDH e a CK:
 LDH  formada por um tetrâmero que se decompõe em duas espécies de subunidades
denominadas H e M. Uma LDH ativa é formada por quatro subunidades, portanto
existem 5 possibilidades de agrupamento de subunidades para formar as 5 isoenzimas:
LDH1 = HHHH LDH4 = HHHM
LDH2 = HHHM LDH5 = MMMM
LDH3 = HHMM
 CK  é uma enzima dimérica, formada por duas subunidades, denominadas de B
(brain) e M (muscle), cada uma com um peso molecular em torno de 40.000 daltons,
codificadas por loci específicos dos cromossomos 14 e 19, respectivamente. Estas duas
subunidades podem combinar-se de três formas, formando as três isoenzimas da CK :
CK1 = CK-BB
CK2 = CK-MB
CK3 = CK-MM
A existência das isoenzimas tem uma importante aplicação no estudo das patologias
humanas. Sabe-se que as isoenzimas estão presentes em tecidos diferentes, portanto uma
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lesão em determinado tecido causará uma elevação sérica da isoenzima específica deste
tecido. As isoenzimas são, portanto, marcadores muito mais específicos de uma alteração a
nível tissular, celular ou sub-celular, do que a própria enzima. Exemplo:
 a LDH é subdividida nas isoenzimas 1 a 5 e cada uma delas está presente em um órgão
diferente:
 LDH1 = miocárdio>cérebro>rins>músculos esqueléticos>fígado
 LDH2 = miocárdio>cérebro>rins>músculos esqueléticos>fígado
 LDH3 = músculos esqueléticos, cérebro, rins>fígado, miocárdio
 LDH4 = fígado, músculos esquelético, cérebro, rins> miocárdio
 LDH5 = fígado>músculos esquelético> rins>cérebro, miocárdio
 a CK está presente nos seguintes tecidos:
- Músculo esquelético : 97% CK-MM e 3% CK-MB
- Músculo cardíaco : 80% CK-MM e 20% CK-MB
- Cérebro : 100% CK-BB
Na necessidade do diagnóstico de uma doença cardíaca é preferível a determinação da
atividade da LDH1 e da CK2, do que a determinação da LDH Total e CK Total, pois LDH1
e CK2 são mais específicas do tecido cardíaco.

IV. Enzimas de Interesse Clínico

As atividades enzimáticas são atualmente determinadas, nos laboratórios de análises


clínicas, com finalidades diagnósticas, prognosticas e no acompanhamento de tratamentos
das doenças pancreáticas, cardiovasculares, hepáticas, musculares, ósseas, renais e de
outros tecidos, como também para as doenças malignas.

A- DIAGNÓSTICO ENZIMÁTICO DAS DOENÇAS DO PÂNCREAS :


O pâncreas é o órgão responsável pela produção do suco pancreático, rico em enzimas
digestivas que degradam os alimentos. Ele secreta enzimas que degradam o amido
(Amilase), as gorduras (Lipase) e as proteínas (Tripsina e Quimotripsina, que se
apresentam na forma inativa, e Elastase). Devido a sua posição profunda na cavidade
abdominal e por seu tamanho reduzido, a exploração funcional pancreática, por técnicas
não invasivas, é complicada. Na pancreatite crônica e nas alterações neoplásicas do
pâncreas as elevações das atividades enzimáticas são inconstantes ou pouco significativas.
No entanto, estas elevações são muito úteis para o diagnóstico da pancreatite aguda.

1- -AMILASE :
- Símbolo : AMS
- Nome : -1,4-glucan-4-glucano hidrolase
- Classificação : E.C.3.2.1.1.
- PM : 45.000 daltons
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- pH ótimo : 7,0  0,1
- Ativadores : íons Cloreto
- Inibidores : íons metálicos (Cu2+, Hg+, Ag+, Pb++), uréia, EDTA, citrato, fluoreto,
oxalato, NaCl > 10mmol/L
- Isoenzimas : existem duas formas, a pancreática (p-amilase, 1/3 do total) e a salivar
(s-amilase, 2/3 do total)
- Macroenzima : identificada em 1964 (Wilding e col.) corresponde a uma proteína de alto
peso molecular (100.000 daltons), resultante da complexação da amilase com
imunoglobulinas (IgG ou IgA) e/ou com seus substratos (glicoproteínas e polissacarídeos).
A macroamilase pode estar presente em 2% dos soros normoamilasêmicos e em 2 a 4% dos
soros hiperamilasêmicos. A sua importância clínica está relacionada à investigação da
pancreatite. A macroamilase é encontrada somente no soro, pois seu alto peso molecular
não permite a filtração renal, nem o clareamento. Assim, uma elevação da amilasemia pode
ser devida a presença desta macroenzima. Para um correto diagnóstico da pancreatite é
necessária a determinação da atividade da enzima no soro e na urina. A amilase estará com
sua atividade elevada, nestas duas amostras biológicas, nos casos de pancreatite.
- Fontes : pâncreas, parótidas, fígado, músculos, intestino, estômago e tecido adiposo.
- Reação catalisada : A AMS catalisa a reação de hidrólise das ligações -1,4-glicosídicas
do amido e glicogênio. A enzima atua sobre estes polissacarídeos promovendo a ruptura
progressiva das moléculas, que vão sendo fragmentadas em unidades menores. Assim o
amido se desdobra em dextrinas, estas são rapidamente hidrolisadas, liberando unidades
menores como maltose e glicose.
-Métodos de determinação da atividade :
a) Método Amiloclástico: A AMS hidrolisa o amido, liberando dextrinas, maltose e
glicose. O amido restante, não hidrolisado, forma um complexo coloidal azul, com a
solução de iodo adicionada. A intensidade de cor formada é medida
espectrofotométricamente e é inversamente proporcional a atividade da AMS.
-Valor de referência: - soro : 60 a 160 Unidades Caraway /100 mL
- urina : 140 a 1400 Unidades Caraway / 24 horas
b) Método Sacarogênico: A AMS hidrolisa o amido, liberando dextrinas, maltose e glicose.
A glicose liberada é dosada por um método específico. A intensidade de cor final é
diretamente proporcional a atividade da AMS.
-Valor de referência : - soro : 80 a 180 Unidades Somogy/100 mL, 150 a 340 UI/L
- urina : 65 a 700 Unidades Somogy/24 horas, 120 a 1300 UI/24 h
c) Método Cinético :
AMS
 Maltotetraose 2 maltose
maltose fosforilase
 2 maltose 2 glicose + 2 glicose 1-P
fosfoglicomutase
 2 glicose 1-P 2 glicose 6-P
G6PDH
 2 glicose 6-p + 2 NADP 2 6-P-gliconato + 2 NADPH + H+

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O aumento de absorbância a 340 nm, devido ao NADPH formado, é proporcional a
atividade da AMS.
- Interpretação Clínica : o principal valor clínico da determinação da AMS é no
diagnóstico da pancreatite aguda. As elevações enzimáticas são constatadas entre 4 e 6
horas após o início da crise. Os valores máximos de atividade estão entre 20 e 30 horas,
quando são alcançados valores superiores a 10 vezes o valor de referência do método
utilizado, podendo chegar a 50 vezes. A normalização se efetua entre 2 e 8 dias (4 a 10
dias). A vida média da enzima no plasma é em torno de 12 horas. A hiperamilasúria é mais
tardia, com uma variação de 5 a 6 horas após a hiperamilasemia, persistindo alguns dias,
mesmo após a normalização da amilasemia.

Atividade da AMS x Tempo

20
Atividade (UI/L)
Aumento da

15
10

5
0
0 5 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
Tempo (horas)

O aumento dos níveis séricos de AMS pode ocorrer também nas seguintes patologias:
úlceras duodenais, perfuração de úlcera gástrica, obstrução intestinal, trombose entérica,
ruptura de trompa uterina, doenças malignas do trato genital, parotidite, insuficiência renal,
tumores do trato respiratório, apendicite aguda e uso de opióides. Nestas situações, os
valores de atividade de AMS estão inferiores aos observados na pancreatite aguda, não
ultrapassando, em geral, duas a três vezes o valor de referência do método utilizado para
mensurá-la. A diminuição da atividade da AMS pode ser encontrada nas hepatopatias
crônicas, como na cirrose e carcinoma hepático.

2- LIPASE :
- Símbolo : LPS
- Nome : Triacilglicerol acil-hidrolase
- Classificação : E.C.3.1.1.3
- PM : 40.000 daltons
- pH ótimo : 3,5 a 7,0
- Ativadores : Cl, Ca, Mg, albumina, colipase
- Inibidores : hemoglobina, Zn, Co, Fe +++, EDTA
- Isoenzimas : aliesterase, lipase e lipoproteína lipase

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- Fonte : pâncreas, mucosa gástrica e intestino
- Reação catalisada : a LPS catalisa a hidrólise de ésteres, na posição de -triglicerídeos,
produzindo monoglicerídeos e ácidos graxos, como ilustrado abaixo:

CH2-O-CO-R1 CH2OH
 
CH-O-CO-R2 + H2O LPS
CH-O-CO-R2 + 2 ácidos graxos
 
CH2-O-CO-R3 CH2OH
Triacilglicerol 2-monoglicerol

- Métodos de Determinação da Atividade: a LPS age somente em meio heterogêneo, sob


substrato emulsionado, o que dificulta a obtenção de reprodutibilidade nas medidas de sua
atividade. O método rotineiro utiliza, como substrato, uma emulsão de trioleína, em tampão
Tris, na presença de ativadores e de colipase, absolutamente indispensável para a ação da
LPS. A medida da atividade é turbidimétrica e a diminuição da turbidez, medida em 340
nm é proporcional à atividade da LPS.
-Valor de Referência : 10 a 40 UI/L (até 60 anos) ; 18 a 180 UI/L (acima de 60 anos)
- Interpretação Clínica : a determinação da atividade da LPS tem valor clínico para o
diagnóstico da pancreatite aguda. Devido às dificuldades técnicas de sua determinação, ela
é medida principalmente para a avaliação da cura ou do agravamento da situação. A LPS
tem uma meia vida longa, portanto, permanece com valores alterados, dobrados em relação
ao normal, pelo menos, durante duas semanas. Pelo fato da LPS não existir nas glândulas
salivares, ela auxilia no diagnóstico diferencial entre problemas pancreáticos e salivares,
pois nesses dois casos a AMS estará com atividade elevada. A LPS também apresentará
atividade elevada nas seguintes patologias: úlcera péptida perfurada, fibrose cística,
peritonite, íleo paralítico, trombose mesentérica e cirrose hepática.

3- ELASTASE :
- Símbolo : ELS
- Classificação : E.C.3.4.21.11
- PM : 25.000 a 30.000 daltons
- Isoenzimas : existem duas formas, a ELS-1, aniônica com PM de 30.000, que existe no
soro, e a ELS-2, catiônica com PM de 25.000.
- Reação catalisada: a ELS catalisa a hidrólise da elastina, uma escleroproteína, que é a
base do tecido conjuntivo.
125
- Método de dosagem: é um método de RIE, que utiliza a I-elastase-1 e o anticorpo
contra elastase-1.
- Valor de referência : 1,3 a 4,3 g/L
- Interpretação clínica: a ELS-1 está com atividade elevada nas pancreatites agudas e nas
pancreatites crônicas recidivantes, em grau mais elevado que a AMS. A elevação persiste
por longo tempo e reflete o curso clínico da doença, melhor que AMS e LPS. Além disto,

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em casos de hiperamilasemia de origem não pancreática, a ELS-1 estará normal ou pouco
elevada.

4- VALOR CLÍNICO DA ATIVIDADE DAS ENZIMAS NAS DOENÇAS


PANCREÁTICAS:
A pancreatite aguda é um quadro de autodigestão com necrose do parênquima pancreático
podendo ocorrer devido aos fatores etiológicos descritos no quadro abaixo. Os sintomas
clínicos são dores abdominais, náuseas, vômitos e sinais de peritonite. As principais causas
da pancreatite aguda são o alcoolismo crônico e as doenças do trato biliar (colelitíase), que
são responsáveis por 50-85% dos casos, traumatismo abdominal, infecções (parotidite,
viroses, parasitoses, salmonelose), problemas metabólicos (hiperlipidemia tipos I e V,
hiperparatireoidismo, uremia), problemas vasculares (choque, lupus eritematoso, embolia),
gravidez, familiares (autossomia dominante) e farmacológicos (corticoesteróides, tiazidas,
contraceptivos orais, sulfonamidas, isoniazidas, tetraciclina, acetaminofen, rifampicina,
etc). Na pancreatite aguda as lesões iniciais envolvem ativação intracelular de precursores
das enzimas, geração de radicais livres e uma resposta inflamatória aguda.
Aproximadamente 25% dos pacientes apresentam insuficiência da função pancreática e de
outros órgãos e a taxa de mortalidade varia de 5 a 10%.
Na pancreatite aguda, a autólise das células acinosas, libera as enzimas celulares no tecido
intersticial e elas chegam a circulação. As enzimas liberadas são a -amilase e a lipase. As
duas têm baixo peso molecular e pequeno tamanho, são, portanto, filtradas pelo glómerulo
renal. A lipase é reabsorvida pelos túbulos renais, enquanto que uma parte da -amilase
(2/3) sofre reabsorção e catabolisação pelos túbulos renais e outra parte é excretada pela
urina. Assim, a determinação da amilasúria é freqüentemente associada à determinação da
amilasemia e lipasemia para o diagnóstico da pancreatite aguda. A elastase é relativamente
recente na clínica médica. A curva evolutiva de atividade das três enzimas por ocasião de
uma pancreatite aguda é a seguinte:

Atividade x Tempo
Atividade (UI/L)

4000

3000
Amilase
2000 LPS
ELS
1000

0
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24
Tempo (dias)

Em casos de urgência, são feitas as medidas da atividade da amilase sérica e urinária. Para
o estudo da evolução da doença a lipase sérica aprecia melhor a cura ou o agravamento da
situação, já que permanece por mais tempo alterada. A introdução da elastase na rotina

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laboratorial auxilia, também na avaliação do prognóstico da doença, pois demora mais de
vinte dias para voltar aos valores de referência. Várias evidências sugerem que a elastase é
a enzima mais específica para o diagnóstico da pancreatite aguda entretanto, o método
disponível para a sua dosagem (RIE) limita a utilização na rotina laboratorial. Na
pancreatite crônica a atividade das enzimas pancreáticas está quase sempre normal,
podendo se elevar nos surtos agudos, neste caso são feitas as provas funcionais do pâncreas
exócrino: Prova de Estimulação com Secretina e Pancreozimina para o diagnóstico. No
carcinoma pancreático, que corresponde a cerca de 3 a 4% de todos os tumores malignos,
as atividades das enzimas AMS e LPS raramente estarão alteradas. Nos carcinomas da
cabeça do pâncreas a atividade da ELS e da galactosil transferase, isoenzima II estarão
elevadas. O diagnóstico dos tumores pancreáticos é feito por exames de imagens e
endoscópicos. Nesta patologia é indicativo uma elevação da GGT, com AST e ALT
normais ou pouco aumentadas, LDH pouco aumentada e CHE diminuída.
B- DIAGNÓSTICO ENZIMÁTICO DAS DOENÇAS DO CORAÇÃO:
A doença cardíaca, na qual a determinação das atividades enzimáticas tem maior valor
clínico, é o infarto agudo do miocárdio (IAM). Este acidente vascular é particularmente
freqüente nos países industrializados e os fatores etiológicos são o estresse, a obesidade, a
idade, a hipertensão, a hiperlipemia e a diabete.
As alterações eletrocardiográficas (ECG) no paciente com IAM, são, quase sempre, mais
precoces do que os aumentos das atividades enzimáticas. Entretanto, os sinais típicos de
alteração do ECG só podem ser observados um a vários dias após o infarto. Em cerca de 30
a 50% dos pacientes com IAM não é possível o diagnóstico com o ECG, pois não são
demonstráveis as correspondentes alterações eletrocardiográficas. Assim, o ECG, a
determinação das atividades enzimáticas e as dosagens de outros marcadores de lesão
cardíaca, completam-se e, em conjunto, fornecem ótimas possibilidades de diagnóstico e
prognóstico para o IAM.
O mecanismo fisiológico que leva ao IAM, é a isquemia do miocárdio e a cronologia das
alterações que se sucedem à isquemia, é a apresentada no quadro seguinte:

TEMPO 0  ISQUEMIA DO MIOCÁRDIO

Disfunção das bombas iônicas Liberação de íons intracelulares:


+ ++ 3- ++
membranárias K , Zn , PO4 , Mg ,etc

Desregulação do metabolismo Liberação dos metabólitos intracelulares:


intracelular lactato, adenosina, etc.

TEMPO 60 MINUTOS 

Alteração das membranas Liberação de macromoléculas


celulares intracelulares : mioglobina, enzimas

Necrose celular Perda de todo conteúdo celular

A cronologia do aparecimento no sangue, dos constituintes celulares, após o IAM é


demonstrada no quadro abaixo. Enquanto os íons e os metabólitos ganham a circulação
rapidamente, as proteínas enzimáticas se liberam, primeiramente, nas vias linfáticas,
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devido a espessura das membranas basais dos capilares que irrigam o miocárdio. Os
mecanismos de regulação das concentrações intravasculares dos eletrólitos e dos
metabólitos, levam ao rápido retorno ao normal destas moléculas. Estes mecanismos não
existem para as enzimas, que persistem mais tempo. Assim, as variações efêmeras e não
específicas dos íons e dos metabólitos, se opõem às variações enzimáticas séricas, mais
duráveis e mais específicas do tecido cardíaco, fazendo destas macromoléculas as
substâncias mais utilizadas para o diagnóstico do IAM.

Aparecimento no sangue dos


constituintes celulares após IAM

4
concentração
Variação da

3 Íons Metabólitos
2 Macromoléculas

1
0
0 2 4 6 8 10 12 14 16 20 22 24
Horas

As enzimas mais utilizadas para o diagnóstico do IAM, são a CK, e sua isoenzima CK-
MB, a AST, a LDH e a sua isoenzima 1 (HBDH).

1- CREATINO QUINASE:
- Símbolo : CK
- Nome : Creatino N-fosfotransferase
- Classificação : E.C.2.7.3.2.
- PM : 81.000 daltons
- pH ótimo : depende do sentido da reação, para a formação de ATP o pH é 6,8 ; para a
fosforilação da creatina o pH é 9,0.
- Ativadores : Mg++, Mn++, Ca++
- Inibidores : EDTA, citrato, oxalato, fluoreto, heparina, Zn++, Cu++, ADP em excesso,
NAD e a luz ( a CK é fotossensível).

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- Isoenzimas : existem 3 isoenzimas, e 5 isoformas, distribuídas da seguinte maneira :
-CK-MM  tipo muscular - 3 isoformas : MM1, MM2, MM3
- CK-MB  tipo cardíaca - 2 isoformas : MB1, MB2
- CK-BB  tipo cerebral
- Macroenzimas : - Macro CK tipo 1 = CK-BB + IgG e CK-MM + IgA
- Macro CK tipo 2 = CK-Mitocondrial
- Reação catalisada: a CK tem a função de transferir, reversivelmente, o grupo fosfato da
fosfocreatina ao difosfato de adenosina, formando trifosfato de adenosina e creatina:

Fosfocreatina + ADP  creatina + ATP

- Características: a CK é uma enzima dimérica, formada por duas subunidades,


denominadas de B (brain) e M (muscle), cada uma com um peso molecular em torno de
40.000 daltons, codificadas por loci específicos dos cromossomos 14 e 19,
respectivamente. Estas duas subunidades podem combinar-se de três formas, formando as
três isoenzimas da CK, a CK-BB (CK1), a CK-MB (CK2) e a CK-MM (CK3). Existe uma
quarta isoenzima, CK-Mt, localizada nas mitocôndrias e que, no coração corresponde a
15% da atividade da CK-Total. A sua síntese é codificada no cromossomo 15. Além das
isoenzimas a CK apresenta isoformas, oriundas da quebra da ligação peptídica terminal da
subunidade M, por carboxipeptidases séricas (B ou N), com liberação de lisina, formando
as isoformas CK-MM1, CK-MM2, CK-MM3, CK-MB1 e CK-MB2. A perda desta carga
positiva, da lisina, produz uma molécula mais carregada negativamente, com grande
mobilidade anódica. Estas isoenzimas e isoformas estão demonstradas no quadro abaixo:

Subunidade B CK-BB

Subunidade M ISOENZIMAS CK-MB

CK-MM

ISOFORMAS
Carboxipeptidases séricas Quebra ligação peptídica terminal (Lys)

CK-MM1 CK-MB1
L L L
CK-MM2 CK-MB2

L
CK-MM3

Formas macromoleculares da CK são também encontradas no soro, a macro-CK tipo 1


corresponde à CK-BB complexada à IgG e, raramente citada, a CK-MM complexada à
IgA. A prevalência destas formas é em torno de 0,8 a 2,3. Todas estas formas da CK
podem ser separadas por eletroforese de alta-voltagem, como demonstrado abaixo:
CK CK-MM Macro CK-MB CK-BB
Mitocondrial CK

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+ 30
- Localização: a CK é uma enzima citosólica, estando associada também às estruturas
miofibrilares. A macro CK-tipo 2 está localizada do núcleo e nas membranas das
mitocôndrias. A CK é encontrada em concentrações elevadas nos músculos esquelético e
cardíaco e no cérebro. Nos rins ela está presente em pequena quantidade e o fígado e os
eritrócitos são essencialmente desprovidos desta enzima. Cada uma das isoenzimas está
presente em quantidades distintas em vários órgãos. A CK-BB predomina no cérebro,
próstata (59-95%), intestino, pulmão, bexiga, útero, placenta (46-80%) e tireóide. A CK-
BB é a principal isoenzima da musculatura esquelética fetal (1o a 2o mês de gestação),
sendo gradualmente substituída pela CK-MM, tanto que o recém-nascido contém CK-MM
em seus músculos. A CK-MM e a CK-MB estão presentes nos músculos, tanto cardíacos
quanto esqueléticos. O quadro abaixo mostra a localização das isoenzimas em
determinados órgãos:
LOCALIZAÇÃO CK-BB CK-MB CK-MM
% % %
Músculo esquelético 0 1 99
Miocárdio 1 535 436
Cérebro 100 0 0
Cólon 96 1 3
Íleo 96 1 3
Estômago 95 2 3
Bexiga 92 6 2
Tireóide 73-96 0-1 4-26
Localização tissular das isoenzimas da CK
- Ensaios: para se determinar a atividade da CK o Método de Rosalki modificado é
utilizado:
CK
1. Creatina-P + ADP Creatina + ATP
HK
2. ATP + glicose Glicose 6-P + ADP
G6PDH
3. glicose 6-P + NADP Ácido 6-P-glicurônico + NADPH + H+
O aumento da absorbância, medida em 340 nm, devido à formação de NADPH é
proporcional à atividade da CK.
As seguintes recomendações devem ser contabilizadas:

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 Amostra biológica: o soro é o material biológico de escolha e deve ser obtido no
máximo 2 horas após a coleta; pode ser armazenado a 4oC em tubo hermeticamente
tampado e protegido da luz. Nestas condições a CK-BB é estável por 1 dia, a CK-MB
por 5 dias e a CK-MM por 2 semanas;
 São adicionados aos reagentes os seguintes produtos:
 O MgCl2 que estabiliza a reação, pois o verdadeiro substrato da reação é
[Mg-ATP]2-;
 O EDTA que se complexa ao cálcio, presente na amostra biológica, o qual
inibe a reação catalisada pela CK; além disto o EDTA aumenta a estabilidade dos
reagentes utilizados no ensaio;
 N-acetil cisteína (NAC) que previne a oxidação de grupos tiol presentes no
sítio ativo da CK, evitando a inativação da enzima;
 Diadenosina pentafosfato e AMP que inibem o efeito da adenilato quinase, a
qual catalisa a reação: 2ADP  ATP  AMP
Se esta enzima não for inibida pode haver consumo do ADP, substrato presente no
ensaio da CK.
- Valor de referência: em indivíduos normais a atividade da CK é influenciada por vários
fatores, tais como idade, sexo, raça, massa corporal e atividade física. As crianças têm
valores superiores ao dos adultos; nos homens os valores superam os das mulheres e os
negros apresentam valores superiores aos de outras raças. O valor de referência utilizado
para a população caucasiana, pelo método CK-NAC-EDTA, feito a 37oC é 26-140 U/L
para mulheres e 38-174 U/L para homens. Entretanto, cada laboratório deve determinar os
seus valores de referência levando em consideração a população atendida e as condições de
trabalho. Inclusive é importante a avaliação de um valor prévio por paciente, pois presença
de hipertrofia miocárdica e doença coronariana aumentam os valores de referência da CK;
indivíduo de pequena estatura e sedentário tem valor de CK menor, como também é
conhecido que a mulher idosa tem valores aumentados de CK.
- Cinética enzimática após IAM:
 Elevação: 4 a 10 horas após início da dor
 Pico máximo: 18 a 24 horas
 Retorno: 36 a 48 horas
- Meia-vida: 16  4 horas (CK-MM: 10-20h; CK-MB:7-17h; CK-BB:3h)
- Eficácia diagnóstica: 13 a 18 horas após início dos sintomas
- Interpretação Clínica: a atividade da CK-Total estará elevada nas seguintes condições
patológicas:
a) Infarto Agudo do Miocárdio: o que caracteriza a atividade da CK-T no IAM é a sua
precocidade e pouca durabilidade no sangue. É a primeira enzima a se elevar;
b) Lesões cardíacas: miocardites (elevação superior a 40% do valor de referência superior),
arritmias graves, angina, contusão cardíaca, cirurgias cardíacas;

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c) Procedimentos terapêuticos: cardioversão (eletrochoque), ressuscitação cardiopulmonar,
cateterização, angioplastia, injeção intramuscular (eleva 4 a 5 vezes em relação ao valor de
referência superior);
d) Lesões e doenças da musculatura esquelética: fadiga muscular, traumas, estado de
choque, ataques apopléticos, miopatias, hipertermia maligna, dermatomiosites,
polimiosites, rabdomiólises, distrofias musculares (na Doença de Duchenne a atividade da
CK eleva em 50 vezes; as mulheres portadoras do gene deficitário, apresentam atividade da
CK de 3 a 6 vezes mais elevada);
e) Lesões cerebrais: acidente vascular cerebral, trombose, infarto, embolia, neoplasias,
isquemia, lesões na cabeça, encefalopatias (Síndrome de Reye eleva em 70 vezes a
atividade da CK-BB);
f) Lesões do trato gastrointestinal: infarto, necrose, tumores;
g) Doenças da tireóide: já foi demonstrado que a atividade da CK tem relação inversa com
a atividade da tireóide. Em torno de 60% dos pacientes hipotireoideos apresentam elevação
da CK, em torno de 5 a 50 vezes os valores de referência, sendo predominante a fração
MM e 13% da atividade da total correspondendo à CK-MB. No hipertireoidismo os valores
encontrados estão abaixo dos valores de referência;
h) Doenças pulmonares: pneumonia, infecções causadas por Legionella, deficiência
respiratória, hipoxemia, lesões no epitélio alveolar, asma;
i) Uso de drogas:
 Em dose terapêutica: ácido aminocapróico, anfotericina B, clofibrato, halotano,
lidocaína, quinidina, etc;
 Abuso de drogas: amitriptilina, anfetamina, barbitúricos, etanol, heroína,
imipramina, feniciclidina, glutetimida;
j) As isoenzimas da CK são encontradas em outras situações, tais como:
 CK-BB: gravidez (placenta), recém-nascidos, tumores pulmonares, prostáticos, de
bexiga, testiculares, renais, mama, ovários, de útero, SNC, leucemias, linfomas e
sarcomas;
 Macro CK-Tipo1: Esta macroenzima está associada com doenças gastrointestinais,
adenoma ou carcinoma, doenças vasculares, doenças do miocárdio, e outras doenças
terminais. Freqüentemente é encontrada em mulheres com idade superior a 50 anos;
 Macro CK-Tipo 2: Esta macroenzima é encontrada em adultos gravemente doentes
com infecções, doenças malignas, hepáticas (cirrose), musculares e cardíacas e em
crianças com doenças do miocárdio.

 CK-MB
A isoenzima MB da CK é considerada o marcador bioquímico de referência para o
diagnóstico do IAM, devido à sua localização, correspondendo a 22% da CK-Total, no
músculo cardíaco. Esta porcentagem é variável, depende do local do coração, ela pode ser
de 8 a 22% do total. Isto explica a variabilidade de alteração da atividade da CK-MB em
pacientes com IAM. No músculo esquelético encontra-se cerca de 1% de CK-MB.
Entretanto, após lesões ou regenerações musculares a atividade da CK-MB pode aumentar,

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transitoriamente, de 7 a 12%, em relação à CK-T, em corredores de maratona e 10 a 15%
em lesões musculares crônicas (Doença de Duchenne). A placenta e certos tecidos tumorais
podem também conter CK-MB, menos de 5% do total. Estas localizações diferenciadas
contribuem para diminuir a especificidade diagnóstica desta isoenzima.
- Ensaios:
 Eletroforese: a separação eletroforética das isoenzimas da CK em gel de agarose, sob alta
voltagem e quantificação por densitometria é um método trabalhoso e demorado.
Apresenta a vantagem de detectar todas isoenzimas e isoformas. Certos compostos
fluorescentes, como bilirrubina e drogas, que se ligam à albumina, podem interferir neste
método, pois migram próximo à banda da CK-MB. Isto pode ocorrer em pacientes com
insuficiência renal crônica;
 Cromatografia de troca iônica: método rápido, não é afetado pelas macros CKs.
Entretanto, como mede atividade da subunidade B, mede atividade de ambas isoenzimas,
CK-MB e CK-BB. Também sofre influência da CK-MM e das formas atípicas. Mede
atividade falsamente elevada de CK-MB quando é utilizado plasma heparinizado;
 Imunoinibição: o mais comum é o que utiliza o anticorpo anti-subunidade M que inibe a
atividade da CK-MM e da fração M da CK-MB. Entretanto, é medida a atividade da
subunidade B da CK-BB e das macros CKs;
 Imunoinibição-Imunoprecipitação: retira interferentes do método anterior. Entretanto,
altas concentrações de CK-MM e CK-BB podem interferir no método;
 Radioimunoensaio: mede a concentração da CK-MB utilizando um anticorpo radioativo.
A interferência de CK-BB e macros CKs pode ocorrer, dependendo da especificidade do
anticorpo;
 Imunoensaios: medem a concentração por técnica tipo “sandwich” que utiliza dois
anticorpos monoclonais com afinidade para diferentes partes da CK-MB. Método mais
específico, sensível e rápido. Entretanto pode sofrer interferência devido a presença de
anticorpos heterófilos, em certos pacientes. Ex: MEIA (Microparticle Enzyme
Immunoassay), Quimioluminescência, ICON (Immunoconcentration assay).
- Valores de Referência:
 Eletroforese: 5 a 20 U/L
 Imunoinibição: 5 a 24 U/L
 Imunoensaio (massa): 5 a 10 g/L
Numa tentativa de aumentar a especificidade cardíaca da CK-MB, pode ser calculado o
“Índice Relativo”, com a seguinte equação:
CK  MB
Indice Re lativodeCK  MB  100  ( )
CK  Total
Este índice permite verificar, em termos percentuais, a elevação da CK-MB em relação à
CK-Total. Quando a relação é inferior a 5% indica lesão da musculatura esquelética;
superior a 5% indica comprometimento da musculatura cardíaca e acima de 25% indica
possível interferência de CK-BB ou macros-CK.
- Cinética enzimática após IAM:

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 Elevação: 4 a 6 horas após início da dor
 Pico máximo: 24 horas
 Retorno: 72 horas
É importante esclarecer que CK-MB atividade eleva-se entre 4,0 e 6,5 horas (média de 5
horas) e CK-MB massa eleva-se entre 2,0 e 3,5 horas (média de 3,0 horas)
- Meia-vida: 7 a 17 horas
- Eficácia diagnóstica: 0 a 18 horas após início dos sintomas
- Interpretação Clínica:
a) Infarto Agudo do Miocárdio: a atividade da CK-MB é semelhante à da CK-Total e
com maior precocidade;
b) Lesões cardíacas: miocardites, traumas, angina instável, cirurgias cardíacas,
taquicardia, falha cardíaca congestiva causam pouca elevação;
c) Procedimentos terapêuticos: cardioversão (eletrochoque), ressuscitação
cardiopulmonar, cateterização, angioplastia;
d) Lesões e doenças da musculatura esquelética: nas distrofias e miopatias, 6% da
atividade da da CK-total corresponde à CK-MB;
e) Insuficiência renal crônica: pacientes em diálise crônica têm metabolismo protéico
alterado e sofrem de perda muscular, isto pode ser responsável pela elevação de
CK-MB, nestes pacientes;
f) Doenças da tireóide: no hipo e hipertireoidismo ocorre alteração no clareamento da
CK-MB sérica, pelo Sistema Reticuloendotelial, o que é causa de elevação de
atividade desta enzima, nestas doenças.
Tabela: Causas de elevação de CK-MB não associadas com IAM
 Trauma muscular (esmagamento,
queimadura, choque elétrico, cirurgias
não toráxicas, exercícios físicos)
 Ataques apopléticos
 Miopatias (Insuficiência renal crônica,
hipotiteroidismo, alcoolismo crônico)
Liberação de CK não miocárdica  Hipertermia e hipotermia
 Ressuscitação cardiopulmonar
 Defibrilação
 Injeção intramuscular(2 a 7  VRS)
 Contusão cardíaca traumática
 Cirurgias cardiotoráxicas
Lesões cardíacas
 Miocardites
 Exames (arteriografia)
Diminuição do clareamento  Hipo e hipertireoidismo (SRE)
 Insuficiência renal crônica (rins)

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 Gravidez (CK-MB placentária)
Outras  Produção ectópica(tumor de colo)
 Medicamentos(Teofilina,Procainamida)

 ISOFORMAS DA CK:
A CK apresenta isoformas, oriundas da quebra da ligação peptídica terminal da subunidade
M, por carboxipeptidases séricas, a Carboxipeptidase B ou N (arginina carboxipeptidase).
Esta hidrólise provoca a liberação de lisina, formando as isoformas CK-MM1, CK-MM2,
CK-MM3, CK-MB1 e CK-MB2. A perda desta carga positiva, da lisina, produz uma
molécula mais carregada negativamente, com grande mobilidade anódica. Este
conhecimento possibilitou a interpretação de que as isoformas CK-MM1 e a CK-MB1 são
as formas encontradas dentro das células cardíacas, os cardiomiócitos, e que as formas CK-
MM2, CK-MM3 e CK-MB2 são as formas circulantes no soro, que sofreram, portanto, a
hidrólise pelas carboxipeptidases séricas. No caso de um IAM, as formas séricas seriam
encontradas em maior concentrações no soro, do que as formas celulares. Por esta razão
são utilizadas as relações abaixo, para se ter uma avaliação sobre o IAM, utilizando as
isoformas da CK:
Relação MB2/MB1 e Relação MM3/MM1
Em indivíduos normais a relação MB2/MB1 está em torno de 1,5 e a relação MM3/MM1 é
igual a 0,33. Frente a um IAM estas relações estarão aumentadas. Trabalhos experimentais
demonstram que a relação MB2/MB1 eleva-se entre 2,0 e 4,0 horas após o IAM (média de
3,0 horas) e a relação MM3/MM1 eleva-se entre 2,0 e 4,75 horas após o IAM (média de 3,0
horas). Portanto, as elevações ocorrem mais precocemente do que o aumento da atividade
da CK-MB e aumento de concentração de CK-MB massa. A sensibilidade do método,
eletroforese em alta voltagem, para a relação MB2/MB1 é cerca de 60%, 90%, 100%, nas 2-
4 horas, 4-6 horas e 6-8 horas após o IAM, respectivamente. Pelos métodos convencionais
para a detecção da CK-MB estes valores são, 20%, 50% e 70%, respectivamente, nos
mesmos períodos.A sensibilidade diagnóstica média para a relação MB2/MB1 é de 95,7% e
a especificidade é de 93,9%. Entretanto, o ensaio para as isoformas requer técnicas
especiais como a eletroforese com gel de agarose em alta voltagem, HPLC, nefelometria ou
cromatofocalização, que são mais complicadas para manutenção em rotina laboratorial.

2- ASPARTATO AMINOTRANSFERASE
- Símbolo : AST, TGO
- Nome : Aspartato aminotransferase, Transaminase glutâmico oxalacética
- Classificação : E.C.2.6.1.1.
- PM : 110.000 daltons
- pH ótimo : 7,4
- Inibidores : oxalato, fluoreto
- Isoenzimas : a separação eletroforética demonstra a presença de cinco componentes.
Duas isoenzimas são mais distintas e têm maior valor patológico, a citoplasmática (60% do
total) e a mitocondrial (40% do total). As isoenzimas são similares em relação a sequência
de aminoácidos (50%) e na posição do sítio ativo. Cada isoenzima possue duas unidades
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com a mesma cadeia polipeptídica. A forma mitocondrial corresponde a 12% da atividade
sérica.
- Macroenzima : AST + Imunoglobulinas (IgA ou IgG)
- Fontes : coração> fígado> músculo esquelético> rins> pâncreas
- Reação catalisada : a AST catalisa a transferência do grupamento amina de um -
aminoácido (ácido aspártico) para um -cetoácido (ácido -ceto glutárico), produzindo
ácido oxaloacético e ácido glutâmico, conforme ilustrado abaixo:

COOH COOH COOH COOH


   
CH2 (CH2)2 AST CH2 + (CH2)2
+
   
CH-NH2 C=O C=O CH-NH2
   
COOH COOH COOH COOH
ácido aspártico ácido -ceto glutárico ácido oxaloacético ácido glutâmico

-Métodos de Determinação da Atividade :


a) Método colorimétrico : Método de Reitman e Frankel
1-ácido aspártico + ácido -ceto glutárico AST
ácido oxaloacético + ácido glutâmico
2- ácido oxaloacético + 2,4-dinitro fenilhidrazina hidrazona do ácido oxaloacético
3- hidrazona do ácido oxaloacético + NaOH COR VINHO
A intensidade de cor vinho final é proporcional a atividade da AST.
b) Método Cinético : Método de Karmen
AST
1-ácido aspártico + ácido -ceto glutárico ácido oxaloacético + ácido glutâmico
MDH
2-ácido oxaloacético + NADH + H+ ácido málico + NAD
O decréscimo da absorbância, em 340 nm, devido a formação de NAD, é proporcional à
atividade da AST.
-Valor de Referência : 0 a 40 URF/mL , 0 a 20 UI/L
- Interpretação Clínica :
a) Infarto Agudo do Miocárdio : a elevação da atividade da AST começa de 6 a 12 horas
após o início dos sintomas, atinge o pico máximo de atividade em 48 horas, o grau de
elevação aparenta ser proporcional a extensão da lesão; após 3 a 5 dias os valores retornam
ao normal. A manutenção de atividade elevada, além deste prazo, indica uma complicação,

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que pode ser a recidiva de um enfarto, uma insuficiência cardíaca aguda ou progressiva,
arritmia ou embolia pulmonar. A atividade da AST é a segunda a se elevar após o IAM.
b) Doenças Cardíacas : arritmias, pericardite, falha cardíaca congestiva, angina.
c) Doenças Hepáticas : a AST é uma enzima indicadora de síndrome de citólise hepática,
em fase crônica, podendo elevar-se nas seguintes condições :
- Hepatite aguda : AST < ALT
- Hepatite tóxica : AST < ALT
- Hepatite crônica : AST > ALT
- Cirrose hepática : AST > ALT < 300 UI/L
- Carcinoma : AST > ALT
- Viroses que atacam o fígado como Monucleose, CMV, Febre amarela, Dengue
d) Doenças musculares : distrofia muscular, dermatomiosites, polimiosites, choque
muscular.
3- LACTATO DESIDROGENASE
- Símbolo : LDH
- Nome : L-lactato NAD-oxido redutase
- Classificação : E.C.1.1.1.27.
- PM : 140.000 daltons
- pH ótimo : depende do sentido da reação, para formação de ácido pirúvico o pH varia de
8,8 a 9,8 e para a formação de ácido lático o pH varia de 7,4 a 7,8.
- Inibidores : ácido pirúvico, oxalato, EDTA, heparina, Zn
- Isoenzimas : a LDH é formada pela união de subunidades, existem 2 subunidades (H e
M), a enzima cataliticamente ativa é um tetrâmero, assim existem 5 possibilidades de se
formar uma enzima ativa :
Iso tetrâ % Mi Estabilida Especificidade mio fíga mús cére rins
en mero gra
to de cár do cu bro
zima ção
tal 65oC 4oC [S] uréia AHB dio lo
1 H4 18- rápi +++ 30 +++ não ++ +++   ++ +
30 d +
2 H3 28- ++ 10 ++ - +++   ++ +
M 40 d
3 H2 18- + 10 ++ - + + ++ ++ ++
M2 30 d
4 H 6- + inst + -  ++ ++ ++ ++
M3 16
5 M4 2- lent - inst + inib -  +++ +++  ++
13 a e + +
Diferenciação das isoenzimas da LDH
- Fontes : é largamente distribuída nos vários tecidos, mas existe principalmente nos
músculos, coração, fígado, rins, hemácias e leucócitos.
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- Reação catalisada : a LDH atua na via glicolítica catalisando a conversão reversível do
ácido lático a ácido pirúvico, através da seguinte reação :
COOH COOH
 
CHOH + NAD LDH C = O + NADH + H+
 
CH3 CH3
ácido lático ácido pirúvico

- Métodos de Determinação da Atividade : os métodos utilizados na rotina laboratorial


são métodos cinéticos, baseados na reação catalisada pela enzima:
a) Método de Wacker : -Valor de Referência : 30 a 110 UI/L
ácido lático + NAD LDH ácido pirúvico + NADH + H+
pH = 8,8 a 9,8
O aumento de absorbância, em 340 nm, devido à produção de NADH, é proporcional a
atividade da LDH.
b) Método de Wroblewsky : -Valor de Referência : 85 a 185 UI/L
ácido pirúvico + NADH + H+ LDH ácido lático + NAD

pH = 7,4 a 7,8
A diminuição da absorbância, em 340 nm, devido à formação de NAD, é proporcional a
atividade da LDH.
- Interpretação Clínica : devido a sua distribuição nos diversos tecidos, a determinação
isolada da LDH é de pouco valor clínico. Porém, com a avaliação, em conjunto, de outras
enzimas e também de suas isoenzimas é de grande utilidade para o diagnóstico de várias
patologias :
a) Infarto Agudo do Miocárdio : provoca elevação da atividade da LDH1 e LDH2. A
determinação da atividade da LDH é muito útil para o diagnóstico tardio do IAM. Seus
valores se elevam a partir da 8a hora após a isquemia, o pico máximo de atividade situa-se
entre 48 e 72 horas e a normalização ocorre entre 10 e 14 dias após o evento, devido a uma
meia vida mais longa.
Para o diagnóstico do IAM pode-se determinar também a atividade da LDH1. Esta
isoenzima é também conhecida como desidrogenase hidroxibutírica (-HBDH) e a
determinação é feita pelo seguinte método cinético :
ácido -cetobutírico + NADH + H+ -HBDH ácido -hidroxibutírico + NAD
O decréscimo de absorbância medido em 340 nm, devido à produção de NAD, é
diretamente proporcional a atividade da HBDH
-Valor de Referência : 60 a 140 UI/L
b) Doenças Hepáticas : provocam elevação da atividade da LDH4 e LDH5, que
apresentam-se alteradas nas hepatites agudas, cirrose e icterícia obstrutiva, mas são pouco
específicas.

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c) Doenças do Sistema Nervoso Central : provocam elevação da atividade da LDH2 e
LDH3, como nas meningites e tumores malígnos.
d) Doenças malignas :provocam elevação da atividade da LDH2, LDH3 e LDH4, que
estarão extremamente elevadas quando ocorre metástase.
e) Elevações moderadas da atividade da LDH são encontradas na distrofia muscular, na
mononucleose e nas anemias hemolíticas, perniciosa e megaloblástica.

4- VALOR CLÍNICO DA DETERMINAÇÃO DA ATIVIDADE DAS ENZIMAS NO


INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO
Para o diagnóstico do IAM, procede-se a:
1-Anamnese do paciente;
2- Eletrocardiograma;
3- Dosagem de marcadores de lesão miocárdica: Troponina I, Troponina T e Mioglobina;
4- Determinação da atividade seriada das enzimas no soro. São particularmente importantes
a determinação da CK (total e isoenzima CK-MB), AST e LDH (total e -HBDH). Para o
controle da doença deve-se monitorizar o paciente e é aconselhável a determinação das
atividades nos seguintes tempos : logo após a queixa do paciente e em seguida em 2 horas,
4, 6, 8 12, 24 e 48 horas e depois em intervalos de 1a 2 dias, durante, pelo menos 5 dias.
A evolução das atividades enzimáticas após o IAM é muito característica, e é apresentada
no seguinte quadro :

Cinética enzimática após IAM


9

8
Variação da atividade (xVR)

6 CK
5 AST
4 LDH
3

0
2

8
2
6
0

2
4
8

20
44
68

92
1

4
7
9
1
1
1

Horas após IAM

Os elementos determinantes são:


- elevação precoce e pouco durável da CK total e CK-MB;
- elevação menos precoce e mais durável da AST;

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- elevação tardia e mais durável da LDH e LDH1.
Enzima Elevação Pico Máximo Normalização
CK (CK-MB) 4 horas 24 horas 2- 4 dia
TGO 6-12 horas 48 horas 3 -5 dia
LDH (LDH1) 8 horas 48-72 horas 10 -14 dia
O poder informativo dos parâmetros enzimáticos no diagnóstico e no prognóstico do IAM
é, atualmente, admitido por todos os especialistas e a utilização simultânea das variações
precoces e tardias das atividades enzimáticas é uma prática corrente nos laboratórios de
análises clínicas e dos clínicos em geral. Mais recentemente, com a inclusão de proteínas
estruturais da musculatura cardíaca como marcadores de lesão do órgão, se aumentou a
sensibilidade e especificidade diagnóstica desta lesão. Estes marcadores são os seguintes:

 MIOGLOBINA
A mioglobina é uma hemoproteína ligadora de oxigênio, de peso molecular de 17.600
daltons, que está localizada no citoplasma das células dos músculos estriados esqueléticos
e cardíacos, correspondendo a 5 a 10% das proteínas citoplasmáticas destes tecidos. Esta
localização e seu baixo peso molecular a caracterizam como um marcador precoce do IAM,
pois a lesão celular que ocorre, provoca a sua rápida liberação para a circulação sanguínea.
A sua durabilidade no plasma é efêmera, rapidamente, entre 12 e 24 horas, ela é retirada da
circulação pela filtração glomerular.
- Cinética enzimática após IAM:
 Elevação: 1 a 3 horas após início da dor
 Pico máximo: 4 a 9 horas
 Retorno: 24 a 36 horas (20 horas)
- Meia-vida: 3,3 a 16,9 horas (média de 6,3 horas)
- Interpretação Clínica: devido a sua localização nos músculos esquelético e cardíaco, a
dosagem da mioglobina perde em especificidade diagnóstica. A sua elevação no sangue
após o IAM pode ser detectada 1 a 1,5 horas após início dos sintomas, sendo que 25% dos
pacientes apresentam elevação após 2 horas e 90% dos pacientes apresentam elevação após
4 horas. Elevações de 10 a 20 vezes o valor de referência superior são descritos em casos
de IAM. Devido ao seu baixo peso molecular ela aparece precocemente e é clareada
rapidamente do plasma, entre 12 a 24 horas. São relatadas duas isoformas no músculo
cardíaco, entretanto ainda faltam estudos que demonstrem a presença de uma mioglobina
cardíaca específica em humanos. As metodologias disponíveis não diferenciam a
mioglobina cardíaca da mioglobina esquelética, portanto a dosagem da mioglobina não é
específica. Elevação de mioglobina no sangue são descritas nas seguintes situações: IAM,
lesões da musculatura cardíaca, lesões da musculatura esquelética (exercícios físicos
vigorosos, trauma, injeção intramuscular, cirurgias, convulsões, distúrbios metabólicos,
miopatias), doença renal e intoxicações por drogas ou toxinas. Um mecanismo que pode

Jane Maciel Almeida Baptista Faculdade de Farmácia da UFMG 41


ser utilizado para validar os valores elevados de mioglobina, na suspeita de IAM é a
associação com a determinação da anidrase carbônica III (ACIII). O músculo esquelético é
rico nesta enzima, que catalisa a hidratação do CO2, formando bicarbonato e um próton.
Ela está envolvida na regulação do pH, transporte de íons, balanço de água e eletrólitos e
no metabolismo de carboidratos, uréia e lípides. Nas lesões da musculatura esquelética a
atividade da ACIII estará elevada, acompanhando a elevação da mioglobina. A ACIII não é
encontrada no músculo esquelético, portanto, no IAM a atividade da ACIII não se altera.
- Valor de referência: < 90g/L

 TROPONINAS
As troponinas formam um complexo de três subunidades, localizado nos filamentos finos
das fibras musculares, ocupando espaço nos sulcos produzidos pelo entrelaçamento dos
monômeros de actina e associado com o sistema regulatório contrátil muscular. As três
troponinas são polipeptídeos envolvidos na contração da musculatura, tanto esquelética,
quanto cardíaca. Elas são denominadas de Troponinas C, I e T e se caracterizam por:
 A Troponina C (TnC) tem grande afinidade por íons Ca++, ligando-se a quatro destes
íons no momento da contração muscular e possui um peso molecular de 18.000 daltons. A
TnC não é estrutura específica cardíaca.
 A Troponina T (TnT) liga-se fortemente à Tropomiosina, mantendo a união do
complexo de troponinas e possui peso molecular de 37.000 daltons. Existem três tipos de
TnT, a cardíaca, codificada por um gene separado; a da fibra muscular esquelética tipo I, de
contração lenta e a da fibra muscular esquelética tipo II, de contração rápida. A forma
cardíaca existe em dois compartimentos intracelulares, 6% está no citosol e a maior parte
está ligada ao filamento fino do sarcômero. As três formas têm 90% de seqüência
homóloga. A forma cardíaca difere da esquelética por 6 a 11 aminoácidos residuais, o que
permite que a forma cardíaca (cTnT) e a forma esquelética (eTnT) possam ser
diferenciadas por anticorpo monoclonal. É importante esclarecer que pacientes com
insuficiência renal apresentam expressão de cTnT no músculo esquelético. Isto está
associado a uma maior concentração de cTnt no sangue destes pacientes e é devido à
miopatia periférica que estes pacientes apresentam e/ou a reexpressão do gene fetal. Valor
de referência: 0 a 0,1 g/L
 A Troponina I (TnI) cobre o sítio ativo da actina e atua como inibidor da contração na
ausência de cálcio, possui peso molecular de 21.000 daltons. Existem três tipos de TnI,
codificadas por três genes distintos, a cardíaca, a da fibra muscular esquelética tipo I, de
contração lenta e a da fibra muscular esquelética tipo II, de contração rápida. A forma
cardíaca tem aproximadamente 40% de seqüência homóloga às formas esqueléticas e
apresenta 31 aminoácidos a mais na extremidade N-terminal, em relação às formas
esqueléticas. Portanto, as formas cTnI (cardíaca) e eTnI (esquelética) podem ser
diferenciadas por anticorpo monoclonal. Resultados falso-positivos para cTnI são raros, o
mais provável é um falso positivo analítico. Elevação de 10 a 100 vezes os valores de
referência são descritos no IAM. Valor de referência: 1 a 3 g/L.
- Cinética enzimática após IAM:
 TnT:
 Elevação: 4 a 8 horas após início da dor

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 Pico máximo: 48 horas (pode ocorrer em 4 dias)
 Retorno: 7 a 14 dias (em alguns pacientes pode se manter elevada até três
semanas)
 TnI:
 Elevação: 3 a 6 horas após início da dor
 Pico máximo: 10 a 22 horas
 Retorno: 7 a 10 dias
- Meia-vida:
 TnT: 2 horas
 TnI: 2 horas

As enzimas utilizadas para o diagnóstico do IAM são as mesmas que se encontram


elevadas nos casos de esforço físico prolongado e nas doenças musculares. A cinética
enzimática apresentada após um esforço físico é a apresentada no quadro seguinte. A
enzima mais específica é a CK, envolvida com o metabolismo energético do músculo.

Cinética enzimática após esforço físico


prolongado

150
% do aumento
de atividade

100
CK
50 AST
LDH
0
1 5 11 19 29 43 53 67
-50
Horas

C- DIAGNÓSTICO ENZIMÁTICO DAS DOENÇAS HEPÁTICAS

O fígado é um órgão que possui muitas enzimas, cerca de 2/3 das proteínas hepáticas são
macromoléculas enzimáticas, que catalisam perto de 1.000 reações químicas diferentes.
Esta característica contribui para que uma patologia hepato-biliar seja muito rica em
variações de atividades enzimáticas séricas.
Para se obter um diagnóstico seguro e correto, recomenda-se, além de uma anamnese exata,
uma combinação de estudos clínicos, laboratoriais, imunológicos, morfológicos e
radiológicos.
Dentre as enzimas, de interesse clínico nas hepatopatias, se pode citar :

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1- Enzimas celulares : indicadoras de lise celular
- fase aguda : ALT, OCT
- fase crônica : AST, GLDH, ICD
2- Enzimas ligadas à membrana : indicadoras de colestase : GGT, PAL, 5'NT, LAP
3- Enzimas específicas do plasma : indicadora da diminuição de síntese hepática : CHE
4- Enzimas indicadoras de tumor hepático : PAL (H-Mr-PAL) e GGT (frações I', II, II' )
A determinação da atividade das enzimas hepáticas é o teste cuja sensibilidade supera a de
todos outros exames laboratoriais. No caso de uma hepatopatia é importante a
determinação de um perfil hepático para se distinguir a fase da doença e a presença ou não
de colestase.

C-1- ENZIMAS INDICADORAS DE LISE CELULAR

1- ALANINA AMINOTRANSFERASE
-Símbolo : ALT, TGP
-Nome : Alanina aminotransferase, Transaminase glutâmico pirúvica
-Classificação : E.C.2.6.1.2.
-PM : 101.000 daltons
-pH ótimo : 7,4
-Inibidores : oxalato, fluoreto
-Isoenzimas : no soro é encontrada uma fração de origem 100% citosólica. Nos tecidos
duas frações.
-Macroenzima : ALT + Imunoglobulinas (IgA e IgG)
- Fontes : fígado > rins > coração > músculo esquelético > pâncreas > baço > pulmão
- Reação catalisada : a ALT catalisa a transferência do grupamento amina da alanina para
o ácido -cetoglutárico, formando ácido pirúvico e ácido glutâmico:

CH3 COOH CH3 COOH


   
CHNH2 + C=O ALT C=O + CHNH2
   
COOH (CH2)2 COOH (CH2)2
 
COOH COOH
alanina ácido -cetoglutárico ácido pirúvico ácido glutâmico
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- Métodos de Determinação da Atividade :
a) Método Cinético : Método de Wroblewsky e La Due
1- alanina + ácido -cetoglutárico ALT ácido pirúvico + ácido glutâmico
2- ácido pirúvico + NADH + H+ LDH ácido lático + NAD
A diminuição da absorbância, em 340 nm, devido à formação de NAD, é proporcional a
atividade da TGP.
b) Método Colorimétrico : Método de Reitman e Frankel
1- alanina + ácido -cetoglutárico ALT ácido pirúvico + ácido glutâmico
2- ácido pirúvico + 2,4-DNFH hidrazona do ácido pirúvico
3- hidrazona do ácido pirúvico + NaOH COR VINHO
A intensidade de cor é proporcional a atividade da ALT.
- Valor de Referência : 0 a 35 URF/mL, 0 a 17,5 UI/L
-Interpretação Clínica :
a) Doenças Hepáticas : o fígado é particularmente rico em TGP e a sua determinação é
fundamentalmente utilizada para indicar um episódio agudo de lise celular.
-Na hepatite virótica aguda : ALT > AST
-Nas hepatopatias crônicas : ALT < AST
b) Pancreatite : pouco elevada
c) Infarto Agudo do Miocárdio : pouco elevada e pouco específica.

2- GLUTAMATO DESIDROGENASE
- Símbolo : GLDH
- Nome : L-glutamato NAD-oxidoredutase
- Classificação : E.C. 1.4.1.3.
- PM : 2.200.000 daltons
- pH ótimo : 8,5-8,6
- Inibidores : Ag+, Hg++, Zn++, Fe++
- Fontes : fígado, coração e rins. Sua localização subcelular é 100% mitocondrial.
- Reação catalisada : a GLDH catalisa a reação de aminação redutiva do ácido glutárico,
tendo como coenzima o NAD :
ácido 2-oxoglutárico + NADH + H+ GLDH ácido glutâmico + NAD
- Método de Determinação da Atividade :
a) Método Cinético : Método de Schmidt
2-oxoglutarato + NADH + NH4+ GLDH L-glutamato + NAD+ + H2O

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O decréscimo de absorbância,em 340 nm, devido à formação de NAD, é proporcional a
atividade da GLDH.
- Valor de Referência : Homens : até 4 UI/L ; Mulheres : até 3 UI/L
- Interpretação Clínica : a elevação da atividade da GLDH indica lesão grave do
hepatócito, com característica de fase crônica. Sua determinação é importante para o
diagnóstico diferencial entre doença hepática e doença cardíaca.

3- DESIDROGENASE ISOCÍTRICA
- Símbolo : ICD
- Nome : D-isocitrato NADP-oxidoredutase
- Classificação : E.C.1.1.1.42.
- PM : 58.000 daltons
- pH ótimo :7,0-7,5
- Reação catalisada : a ICD é uma enzima que atua no ciclo do ácido cítrico, catalisando a
seguinte reação :
ácido isocítrico + NADP+ ICD ácido oxoglutárico + NADPH + H+
- Método de Determinação da Atividade :
a) Método Cinético :
D-isocítrato + NADP+ ICD 2-oxoglutarato + NADPH + H+
O aumento de absorbância, em 340 nm, devido a produção de NADPH, é proporcional a
atividade da ICD
- Valor de Referência : 1 a 11 UI/L
- Interpretação Clínica : a ICD é de localização mitocondrial, é, portanto, indicadora de
lesão hepática crônica. Existe dificuldade em determiná-la por estar inativa no plasma.

4- ORNITINA CARBAMOIL TRANSFERASE


- Símbolo : OCT
- Classificação : E.C.2.1.3.3.
- Reação catalisada :
ornitina + carbamoil fosfato OCT citrulina
- Valor de Referência : < 10 UI/L
- Interpretação Clínica : a OCT é uma enzima hepatoespecífica e indicadora de lesão em
fase aguda, por estar presente no citosol.

C-2- ENZIMAS INDICADORAS DE COLESTASE

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1- FOSFATASE ALCALINA
- Símbolo : PAL
- Nome :Ortofosfórica monoester fosfohidrolase
- Classificação : E.C.3.1.3.1.
- PM : 70.000 a 120.000 daltons
- pH ótimo : 8,5 a 10,3
- Inibidores : EDTA, oxalato, citrato e Ca++.
- Ativadores : Mg++, Zn++
- Isoenzimas : biliar, hepática, óssea, intestinal, placentária
- Macroenzima : é conhecida como fração H-Mr-PAL, tem alto PM e corresponde à fração
hepática ligada a fragmentos da membrana plasmática.
- Fontes : a PAL está presente em todos os líquidos corporais e no endotélio vascular,
principalmente nas células hepáticas, vesícula biliar, ducto biliar, pulmões, intestino,
placenta, rins, pâncreas e medula óssea. Está presente no tecido ósseo, onde participa da
mineralização deste tecido.
- Reação catalisada : a PAL catalisa a hidrólise de ésteres fosfóricos orgânicos,
produzindo fosfato inorgânico, numa faixa de pH variando de 8,5 a 10,3, de acordo com a
seguinte reação:
OH OH
 
HO - P - O - R + H2O PAL HO - P = O + R- OH
 pH 8,5 a 10,3 
O OH
Éster fosfórico fosfato inorgânico
-Métodos de Determinação da Atividade :
a) Método de Roy mod.:
1-Timolftaleína monofosfato PAL timolftaleína + Pi
-
2-Timolftaleína OH COR AZUL
A intensidade de cor final é medida em 590 nm e é proporcional a atividade da PAL.
b) Método de Referência : indicado pela AACC por ter alta sensibilidade e precisão .
4-nitrofenil fosfato + H2O PAL 4-nitrofenol (AMARELO)
Mede-se a velocidade de formação do 4-nitrofenol, por minuto, em 405 nm, que é
proporcional a atividade da PAL.
- Valor de Referência : -Adultos : 13 a 43 UI/L
-Crianças : 56 a 156 UI/L
- Interpretação Clínica : a PAL foi a primeira enzima aplicada ao estudo clínico. A
determinação de sua atividade é usada para o diagnóstico diferencial das doenças hepáticas
e ósseas. Valores aumentados fisiológicos são encontrados na gravidez, nas crianças em

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fase de crescimento e na recuperação de fraturas ósseas. Valores alterados e elevados são
encontrados nas :
a) Doenças hepato-biliares : esta enzima é indicadora de colestase por obstrução hepato-
biliar, com as seguintes causas : cálculos biliares, hepatites, cirrose hepática, tumores
pancreáticos e tumores hepáticos. A macroenzima (H-Mr-PAL) é considerada como
hepatoma-específica, já que ocorre em 30% dos hepatomas. Ela está presente no soro de
pacientes com obstrução biliar e com metástase hepática de tumores sólidos.
Com o intuito de detectar alterações precoces após o transplante hepático como, sinais de
rejeição e/ou infecção por CMV, realiza-se a isoeletrofocalização da PAL. As isoenzimas
hepática, biliar e H-Mr estarão com atividades elevadas no início da rejeição e/ou na
infecção por CMV. Este sinal é mais precoce que a alteração morfológica observada pela
biópsia hepática.
b) Doenças ósseas : nestas patologias a PAL tem a sua atividade elevada, devido ao
aumento de atividade dos osteoblastos ou a lesão dos mesmos com liberação da enzima.
Ex: osteítes, Doença de Paget (osteíte deformante), raquitismo, osteomalácia (osteoporose
devido a diminuição de absorção de cálcio pelo intestino, causada por deficiência de
vitamina D), sarcoma osteogênico, metastáses ósseas e hiperparatireoidismo.
c) Doenças renais : por aumento de atividade da TNSPAL. Ex: insuficiência renal crônica e
pacientes submetidos a hemodiálise.
A atividade da PAL estará diminuída nas seguintes patologias : hipofosfatasia, deficiência
de vitamina C e cretinismo.

2- GAMA GLUTAMIL TRANSFERASE


- Símbolo : GGT
- Nome : gama- glutamil transferase
- Classificação : E.C.2.3.2.2.
- PM : 82.000 daltons
- pH ótimo : 8,0 a 8,5
- Inibidores : oxalato, fluoreto, citrato (causam ligeira inibição, cerca de 15%)
- Isoenzimas : três frações foram isoladas, mas a enzima circulante no soro é de origem
exclusivamente hepato-biliar.
- Macroenzima : possui PM igual a 200.000 daltons, formada devido a ligação com
lipoproteínas e fragmentos de membrana.
- Fontes : é encontrada em todos os tecidos, devido a sua função de transporte de
aminoácidos através das membranas celulares. O fígado, os ductos biliares intra e extra
hepáticos, o pâncreas e os rins têm o mais alto teor da enzima.
- Reação catalisada : a GGT quebra a ligação peptídica terminal de um péptide, no grupo
carboxílico livre, e transfere o grupamento liberado para outro péptide ou mesmo para um
aminoácido, de acordo com a seguinte reação:
-Glutamil cisteinilglicina + aminoácido GGT -Glutamil aminoácido +
cisteinilglicina

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- Métodos de Determinação da Atividade :
a) Método Cinético : Método de Szasz
-Glutamil p-nitroanilida + glicilglicina GGT -Glutamil glicilglicina + p-
nitroanilina
(INCOLOR) (AMARELO)
Mede-se o aumento de absorbância, em 405 nm, devido a formação de p-nitroanilina, que é
proporcional a atividade da GGT .
- Valor de Referência : - Homem : 8 a 37 UI/L ; 11 a 67 x 10 -8 Kat/L
- Mulher : 5 a 24 UI/L ; 6 a 42 x 10 -8 Kat/L
- Interpretação Clínica :
a) Doenças hepato-biliares : a GGT é um excelente marcador de inflamação do fígado e
das vias biliares. A elevação de sua atividade pode ser devida a alteração da permeabilidade
da membrana ou ao aumento da síntese hepática da enzima. Ela é utilizada principalmente
para o diagnóstico de duas situações : síndrome de colestase e hepatites viróticas ou
tóxicas. Em pacientes com doenças hepato-biliares, a eletroforese em gel de poliacrilamida,
mostra 13 bandas de GGT. Destas bandas, três (I', II, II') parecem ser altamente específicas
para hepatoma, sendo detectadas em 50% dos pacientes com tumores hepáticos.
b) Alcoolismo crônico : o álcool estimula a biossíntese hepática da GGT , por esta razão,
os pacientes alcoólatras apresentam uma alta atividade da enzima. Ela é utilizada para a
avaliação do uso do álcool, nos pacientes em tratamento de desintoxicação.
c) Doenças renais : algumas patologias renais, nas quais ocorre lesão do epitélio tubular
observa-se aumento da atividade da GGT na urina. Esta enzima está localizada nas
mitocôndrias das células tubulares e a citólise vai provocar a liberação da enzima no
líquido intratubular.

3- LEUCINA AMINOPEPTIDASE
- Símbolo : LAP
- Nome : Leucina aril-amidase
- Classificação : E.C.3.4.1.1.
- pH ótimo : 7,2 a 7,5
- Inibidores : EDTA
- Isoenzimas : duas frações foram isolada, a enzima circulante no soro é de origem
hepato-biliar.
- Fontes : o fígado, os ductos biliares intra e extra hepáticos e o pâncreas têm o mais alto
teor da enzima.
- Reação catalisada : a LAP é uma aminopeptidase que hidrolisa péptides no grupamento
carboxílico terminal da L-leucina.
- Métodos de Determinação da Atividade :
a) Método Cinético : Método de Nagel e col.

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Leucil p-nitroanilida LAP leucina + p-nitroanilina (AMARELA)
Mede-se o aumento de absorbância, em 405 nm, devido à formação de p-nitroanilina, que é
proporcional a atividade da LAP.
- Valor de Referência : 8 a 22 UI/L
- Interpretação Clínica :
a) Doenças hepato-biliares : o aumento da atividade enzimática deve-se as lesões celulares
com liberação da enzima ou por obstrução do fluxo biliar, causado por hepatites,
colestases, cirrose e tumores hepáticos.
b) Doenças pancreáticas : na pancreatite aguda encontra-se elevada na urina.
c) Linfomas, leucemias linfocítica crônica e monocítica aguda : a LAP encontra-se com
atividade elevada

4- 5'- NUCLEOTIDASE
- Símbolo : 5'NT
- Nome : 5'-ribonucleotídeo fosfohidrolase
- Classificação : E.C.3.1.3.5.
- Inibidores : EDTA, concanavalina
- Isoenzimas : são isoladas 3 frações, NTP1, NTP2, NTP3, as frações 1 e 3 estão envolvidas
com as doenças hepatobiliares, principalmente com colestase.
- Fontes : a 5'NT participa do catabolismo dos ácidos nucleicos, portanto está presente em
todos os tecidos. A sua localização sub-celular é intrínseca à membrana glicoprotéica.
- Reação catalisada : a 5'NT participa da quebra de nucleotídeos, com liberação de fosfato
inorgânico e produção de adenosina.
- Método de Determinação da Atividade : Método Cinético :

Inosina 5'-monofosfato 5'NT Pi + Inosina


nucleosídeo
fosforilase
Ácido úrico Xantina Hipoxantina
xantina oxidase xantina oxidase
H2O2
peroxidase
Cromógeno incolor Cromógeno colorido
- Valor de Referência : < 11 UI/L ; < 18,4 x 10 -8 kat/L
- Interpretação Clínica :
a) Doenças hepato-biliares : enzima indicadora de colestase, é ultra-sensível e específica
das vias biliares, encontrando-se elevada nas obstruções biliares por colestases, hepatites,

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tumores hepáticos. É utilizada principalmente para o diagnóstico diferencial entre doença
hepática e doença óssea, quando PAL está aumentada.

C-3- ENZIMA INDICADORA DE DIMINUIÇÃO DE SÍNTESE HEPÁTICA

1- COLINESTERASE
- Símbolo : CHE
- Nome : acil colina acil-hidrolase
- Classificação : E.C.3.1.1.8.
- pH ótimo : 7,8 a 8,6
- Isoenzimas : existem de 7 a 12.
- Fontes : soro, fígado, cérebro, rins, intestino, pâncreas
- Reação catalisada : a CHE catalisa a hidrólise da acetil colina em ácido acético e colina,
de acordo com a seguinte reação:
CH3 CH3 OH
  
C=O CHE C=O (CH2)2
  
(CH2)2 O- +N (CH3)3

+N (CH3)3 acetato colina
Acetil colina
Existem duas enzimas que catalisam a hidrólise da acetil colina, a "colinesterase
verdadeira", que existe nos eritrócitos e no tecido nervoso, e a "pseudo colinesterase" do
plasma.
- Métodos de Determinação da Atividade :
a) Método Cinético : Método de Rapaport, Fischl e Pinto

CHE
Acetil colina colina + ácido acético
m-nitrofenol
colorido incolor

O decréscimo de absorbância, em 420 nm, devido a acidificação do meio pelo ácido acético
formado, é proporcional a atividade da CHE.
- Valor de Referência : 40 a 80 UR/mL ; 0,8 a 2,0 x10-4 kat/L
- Interpretação Clínica :
 diminuição de atividade da CHE :
a) Doenças hepáticas crônicas : a atividade da CHE estará diminuída porque o fígado não é
capaz de sintetizá-la, ocorre então deficiência de síntese hepática da enzima. Uma
diminuição de 30 a 40% da atividade é observada na hepatite aguda e hepatite crônica de

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longa duração. Diminuição de 50 a 70% ocorre na cirrose avançada e no carcinoma
hepático.
b) Envenenamento por inseticidas organofosforados : estes inseticidas são inibidores da
CHE, por inativação da enzima pelo grupo fosfato. Neste tipo de intoxicação ocorre
acúmulo de acetil colina, estímulo dos impulsos nervosos no sistema parassimpático e o
conseqüente aumento de contração muscular. Uma diminuição de 40% da atividade é
observada após os primeiros sintomas da intoxicação; com diminuição de 80% da
atividade, começam os sintomas neuromusculares.
 aumento de atividade da CHE :
a) Recuperação do dano hepático
b) Síndrome nefrótica : devido a grande perda de albumina, observa-se um aumento de
síntese hepática de proteínas em geral.

C4- VALOR CLÍNICO DA DETERMINAÇÃO DA ATIVIDADE DAS ENZIMAS


PARA O DIAGNÓSTICO DAS DOENÇAS HEPÁTICAS :
1- HEPATITE AGUDA :
São determinadas no LAC, rotineiramente, as enzimas indicadoras de síndrome de citólise
hepática (AST e ALT) e também as indicadoras de colestase (PAL e GGT). As seguintes
características são observadas, quando não ocorrem complicações :
Elevação das enzimas  Valor de Referência: 15 a
Diagnóstico citoplasmáticas: 150 
1a etapa  ALT > AST
ALT e AST Pouca relação com
gravidade
precede a fase ictérica
Elevação das enzimas  V R: 2 a 4 
Diagnóstico membranárias: tem relação com a colestase
2a etapa PAL e GGT hepática
Evolução Normalização das enzimas  em 3 a 5 semanas
citoplasmáticas

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Cinética enzimática na hepatite aguda

400
Atividade (UI/L)

350
300 ALT
250 AST
200 PAL
150 GGT
100 GLDH
50
0
0 1 2 3 4 5 6 7
Semanas após icterícia

2- HEPATOPATIAS CRÔNICAS
Nas lesões crônicas determinam-se as atividades das mesmas enzimas usadas para o
diagnóstico das doenças agudas, além da determinação da GLDH. São observadas as
seguintes características :
ENZIMAS Hepatite crônica persistente Hepatite crônica agressiva
AST e ALT 2 a 5  Valor de Referência até 10  Valor de Referência
Relação AST/ALT 1 >1
GLDH  
GGT  moderada 
PAL normal normal ou 

Padrão enzimático nas hepatopatias crônicas

10
8
atividade (X)
Aumento de

6
4 Hepatite
Crônica
2 Cirrose
0
-2
AST ALT GLDH GGT CHE

3- COLESTASES
As colestases são provocadas por qualquer fator que impeça a excreção da bile, assim,
nestas alterações fisiológicas se observa um aumento da atividade das enzimas ligadas à

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membrana celular, que, de uma maneira geral, são excretadas pela bile. Serão determinadas
a GGT, a PAL, a 5'NT e a LAP.

Diagnóstico Elevação das enzimas  Precede icterícia


membranárias:
 Colestase intra-hepática 
GGT, PAL, 5'NT
Colestase extra-hepática 
Evolução Normalização das enzimas  Desaparecimento da causa
membranárias da colestase

Cinética enzimática na colestase

600
Atividade (UI/L)

500
ALT
400 Cólica AST
biliar
300 PAL
200 GGT
GLDH
100
0
0 1 2 3 4 5 6 7
Dias

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D - OUTRAS ENZIMAS DE INTERESSE CLÍNICO :

1- FOSFATASE ÁCIDA PROSTÁTICA


- Símbolo : PAP
- Nome :Ortofosfórica monoester fosfohidrolase
- Classificação : E.C.3.1.3.2.
- PM : 100.000 daltons
- pH ótimo : 4,8 a 6,0
- Inibidores : oxalato, fluoreto, heparina, Cu++, detergentes. A fração eritrocitária é
inibida por formaldeído e a prostática por tartarato.
- Ativadores : Mg++, Zn++
- Isoenzimas : prostática, eritrocitária, plaquetária
- Fontes : principalmente próstata e hemácias e, também nas plaquetas, fígado, baço, rins,
ossos e medula óssea
- Reação catalisada : a PAP catalisa a hidrólise de ésteres fosfóricos orgânicos,
produzindo fosfato inorgânico, numa faixa de pH variando de 4,8 a 6,0 , de acordo com a
seguinte reação:
OH OH
 
HO - P - O - R + H2O PAP HO - P = O + R - OH
 pH 4,8-6,0 
O OH
Éster fosfórico fosfato inorgânico

-Métodos de Determinação da Atividade :


a) Método de Roy mod.: é o método de referência da AACC
1- Timolftaleína monofosfato PAP timolftaleína + Pi
2- Timolftaleína OH- COR AZUL
A intensidade de cor final, medida em 590nm é proporcional a atividade da PAP
- Valor de Referência : 0,15 a 0,56 UI/L
- Interpretação Clínica : o interesse em se conhecer a taxa sérica da PAP está ligado ao
diagnóstico do câncer de próstata. Nesta patologia a enzima se apresenta com atividade
elevadíssima, principalmente quando ocorre metástase. Ela se eleva também, mas não com
tanta exuberância, nas hiperplasias prostáticas, após o toque prostático, na prisão de ventre
e em alguns casos de câncer de mama.

2- N-ACETIL -D- GLICOSAMINIDASE URINÁRIA


- Símbolo : NAG
- Classificação : E.C.3.2.1.30.

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- Interpretação Clínica : recente no plano medico, é uma enzima lisossomal, abundante
no túbulo contornado proximal. Sua elevação na urina indica uma lesão aguda da célula
tubular renal, sinal precoce e específico. Toda insuficiência renal aguda é precedida de uma
elevação maciça da NAG urinária.

3- ALANINA AMINO PEPTIDASE URINÁRIA


- Símbolo : AAP
- Classificação : E.C.3.4.11.2.
- Interpretação Clínica : recente no plano medico, é uma enzima que se localiza na
membrana de borda em escova das células do túbulo contornado proximal. Sua elevação na
urina indica alterações nos túbulos proximais observadas nas tubulopatias, nefrites e
nefroses.

4- ALDOLASE
- Símbolo : ALS
- Classificação : E.C.4.1.2.13.
- Reação catalisada :
Frutose 1,6-di P ALS dihidroxiacetona-P + gliceraldeído -P
- Valor de Referência : 4 a 14 UI/L
- Interpretação Clínica : os níveis de ALS sérica estão muito elevados na distrofia
muscular de Duchenne, sendo mais elevados nos estados precoces e decrescendo
progressivamente com o avanço do processo patológico. Ela se eleva devido a um aumento
de permeabilidade das células musculares. A ALS se eleva também nos estágios
preliminares da hepatite virótica ou tóxica; na presença de tumores com crescimento ativo
e, no IAM, acompanha a atividade da AST.

5- ENZIMA DE CONVERSÃO DA ANGIOTENSINA


- Símbolo : ECA
- Classificação : E.C.3.4.15.1.
- Nome : dipeptidil carboxipeptidase (angioconvertase)
- Reação catalisada :
Angiotensina I ECA Angiotensina II
(decapeptídeo) pulmão (octapeptídeo)
- Valor de Referência : 35 a 90 UI/L
- Interpretação Clínica : esta enzima é sintetizada pelo endotélio capilar pulmonar,
interessa, portanto, à pneumologia. A enzima se encontra com atividade elevada na
sarcoidose mediastino-pulmonar (80 a 90% dos casos), em relação com a intensidade da
reação granulomatosa, e nas pneumopatias imunoalérgicas. É utilizada para o diagnóstico e
monitorização do tratamento da sarcoidose e possui utilidade para a monitorização de

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pacientes hipertensos e diabéticos com microalbuminúria, que fazem uso de medicamentos
inibidores da ECA, tais como Enalapril, Captopril, Lisinopril e Ramipril.

6- ADENOSINA DEAMINASE
-Símbolo : ADA
-Classificação : E.C.3.5.4.4.
-Reação catalisada :
Adenosina ADA inosina + amônia
-Valor de Referência : -soro: 11 a 30,5 UI/L
-líquor: 4,6 a 18 UI/L
-Interpretação Clínica : esta enzima é uma hidrolase presente na maioria dos tecidos
animais, especialmente na mucosa intestinal, baço e nos leucócitos, notadamente nos
linfócitos, donde advém sua importância diagnóstica. A principal função biológica da ADA
está relacionada com a proliferação e diferenciação dos linfócitos. As doenças envolvendo
estimulação, proliferação e ativação linfocitária são acompanhadas de elevados níveis da
ADA. Esta enzima é importante no diagnóstico do derrame pleural tuberculoso, da
meningite tuberculosa, da mononucleose e da AIDS. Quando a atividade da ADA está
acima de 60 UI/L, no líquido pleural, indica tuberculose pleural ativa, com sensibilidade de
100% e especificidade de 91,4%.

BIBLIOGRAFIA
a) HENRY, JB. Diagnósticos clínicos e tratamento por métodos laboratoriais. 18a edição,
Editôra Manole, 1995
c) BURTIS, CA & ASHWOOD, ER. Tietz Textbook of Clinical Chemistry. 2a edição,
Filadélfia, WB Saunders Company, 1994
d) MOSS, DW & ROSALKI, SB. Enzyme Tests in Diagnosis. 1a Edição, Londres,
Arnold, 1996
c) CALBREATH, DF. Clinical Chemistry. A Fundamental Textbook. 1a edição, Filadélfia,
WB Saunders Company, 1992
d) ADOLPH, L. Diagnóstico enzimático das doenças do coração, fígado e pâncreas.
Basiléia, S. Karger, 1980
e) JOHNSON, PJ & MC FARLANE, IG. The laboratory investigation of liver diseases. 1a
edição, Londres, Bailliére Tindall, 1992.

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