Você está na página 1de 9

Capitulo I: Introdução

1.1.Aspectos teóricos

1.1.1. Definição e classificação


Enzimas são proteínas (ou RNA) que possuem propriedades catalisadoras de reacções
químicas, as quais, na sua ausência, dificilmente aconteceriam. São categorizadas, de
acordo com o tipo de reacção catalisada, em seis classes. Cada classe é dividida em
subclasses e um código (4 números) é dado a cada enzima, como, por exemplo, o
código E.C 3.2.1.21 atribuído à β-glicosidase, no qual o primeiro número indica a classe
principal hidrólases, o segundo indica a subclasse glicosilases, o terceiro número indica
que a enzima hidrolisa compostos O- ou S-glicosil e o último indica a ação na hidrólise
de resíduos terminais de β-D-glicosil não redutores, com liberação de β-D-glicose. Na
base de dados Brenda1, estão disponíveis a classificação das enzimas, a estrutura, a
sequência de peptídeos, o tipo de reacção catalisada, os substratos, os produtos, os
parâmetros cinéticos, entre outras informações.

1.2.Conceito
Enzimas são grupos de substâncias orgânicas de natureza normalmente proteica
(existem também enzimas constituídas de RNA, as ribozimas), com actividade intra ou
extracelular que têm funções catalisadoras, catalisando reacções químicas que, sem a
sua presença, dificilmente aconteceriam. Isso é conseguido através do abaixamento da
energia de activação necessária para que se dê uma reacção química, resultando no
aumento da velocidade da reacção e possibilitando o metabolismo dos seres vivos. A
capacidade catalítica das enzimas torna-as adequadas para aplicações industriais, como
na indústria farmacêutica ou na alimentar.

Em sistemas vivos, a maioria das reacções bioquímicas dá-se em vias metabólicas, que
são sequências de reacções em que o produto de uma reacção é utilizado como reagente
na reacção seguinte. Diferentes enzimas catalisam diferentes passos de vias metabólicas,
agindo de forma concertada de modo a não interromper o fluxo nessas vias. Cada
enzima pode sofrer regulação da sua actividade, aumentando-a, diminuindo-a ou mesmo
interrompendo-a, de modo a modular o fluxo da via metabólica em que se insere. Sem
as enzimas as reacções químicas do organismo seriam muito lentas, elas proporcionam
uma maior eficiência reduzindo a energia de activação sem deslocar o equilíbrio
exercendo assim seu poder catalítico.

Existem quatro tipos estruturais de enzimas: enzimas simples, enzimas alostéricas,


enzimas complexas (holoenzima) e as Iso enzimas.

O ramo da Bioquímica que trata do estudo das reacções enzimáticas é a enzimologia. É


comum ouvirmos falar sobre as enzimas, do quanto elas são importantes no nosso
organismo e da sua função catalisadora no nosso sistema biológico. Porém, de fato, o
que vem a ser uma enzima? Qual seu real papel e o que ela representa no nosso
organismo?

Normalmente nosso organismo se depara com um sistema orgânico lento e pouco


espontâneo, que depende exclusivamente do trabalho das chamadas enzimas para que
possa ter um funcionamento metabólico melhor, de maneira mais regular e específica.
Dizemos que essas enzimas funcionam como catalisadores celulares, pois elas facilitam
com que aconteçam certas reacções internas de nosso corpo, dando uma melhor
agilidade quando de certa forma as coisas costumam ocorrer mais devagar. Se não
fossem as enzimas, diversas reacções do nosso metabolismo aconteceriam de maneira
exageradamente lenta, o que iria prejudicar e muito o nosso sistema. Elas agilizam as
reacções químicas das células aumentando a velocidade com que elas trabalham, assim,
a sua actuação se torna mais eficaz, fazendo com que haja um melhor desempenho.

1.3. Localização
Podemos encontrar enzimas em quase todas as estruturas celulares e fluidos corporais.
Algumas têm uma localização específica, de tal modo que podem servir para indicar que
estamos em presença de um tal tecido, secreção ou fragmento celular se verificar a
actividade de uma dada enzima.

1.4.Historia
Era já sabido, entre o final do século XVII e início do século XVIII, que secreções
estomacais eram capazes de digerir a carne; era também conhecida a conversão de
amido a açúcares pela saliva e extractos vegetais. O mecanismo subjacente a estas
transformações não era, no entanto, conhecido.
As enzimas foram descobertas no século XIX, aparentemente por Pasteur, que concluiu
que a fermentação do açúcar em álcool pela levedura é catalisada por fermentos. Ele
postulou que esses fermentos (as enzimas) eram inseparáveis da estrutura das células
vivas do lêvedo. Pasteur declarou que "a fermentação alcoólica é um acto
correlacionado com a vida e organização das células do fermento, e não com a sua
morte ou putrefacção".

Em 1878, Wilhelm Kühne empregou pela primeira vez o termo "enzima" para descrever
este fermento, usando a palavra grega ενζυμον, que significa "levedar". O termo passou
a ser mais tarde usado apenas para as proteínas com capacidade catalítica, enquanto que
o termo "fermento" se refere à actividade exercida por organismos vivos.

Em 1897, Eduard Buchner descobriu que os extractos de levedo podiam fermentar o


açúcar até álcool e provou que as enzimas envolvidas na fermentação continuavam
funcionando mesmo quando removidas das células vivas.

Esta descoberta valeu-lhe o prémio Nobel de Química em 1907.

Restava determinar qual a natureza das enzimas. Alguns afirmavam que as proteínas,
associadas à actividade enzimática, apenas eram o suporte da verdadeira enzima, e, por
si próprias, incapazes de catálise. Em 1926, James B. Sumner purificou e cristalizou a
urease, mostrando tratar-se de uma proteína pura, e fez o mesmo, em 1937, para a
catalase. A prova final foi feita por Northrop e Stanley em 1930, com o estudo de três
enzimas digestivas, a pepsina, a tripsina e a quimiotripsina, pelo que receberam o
Prémio Nobel da Química em 1946.

J.B.S. Haldane escreveu um tratado intitulado "Enzimas", onde continha a notável


sugestão de que as interacções por ligações fracas, entre a enzima e seu substrato,
poderiam ser usadas para distorcer a molécula do substrato e catalisar a reacção.

A cristalização de enzimas purificadas permitiu que as suas estruturas moleculares


pudessem ser examinadas por cristalografia de raios X, o que aconteceu primeiro com a
lisozima, uma enzima que ocorre na saliva, lágrimas e na clara de ovo e destrói a parede
celular de bactérias, em 1965. Começaram assim a bioquímica e biologia estruturais,
que se esforçam por compreender o funcionamento das enzimas a nível atómico.
A tentativa de compreender o mecanismo da catálise enzimática a nível quântico tem
sido facilitada recentemente pelo aumento de capacidade aritmética dos computadores.

1.5. Estruturas e Mecanismos


As enzimas são proteínas, e podem ter um tamanho desde 62 resíduos de aminoácidos,
como é o caso do monómero da enzima 4-oxalocrotonato tautomerase, até um tamanho
de 2.500 resíduos, como é o caso da sintase de ácidos gordos. A actividade das enzimas
é determinada pela sua estrutura quaternária.

A maioria das enzimas são maiores do que o substrato sobre o qual atuam, e só uma
pequena porção da enzima (cerca de 3 – 4 aminoácidos) está envolvida na catálise.

A região que contém estes resíduos catalíticos, que se liga-se ao substrato e que
desempenha a reacção, é denominada de sítio activo. As enzimas também podem ter
sítios onde se ligam cofactores, que são necessários às reacções catalíticas. Algumas
enzimas também podem ter sítios de ligações para pequenas moléculas, que são
produtos ou substratos, directos ou indirectos, da reacção catalisada.

Estas ligações servem para aumentar ou diminuir a actividade da enzima,


providenciando um meio de regulação por feedback.

Tal como todas as proteínas, as enzimas são formadas por longas cadeias lineares de
aminoácidos que sofrem um enovelamento que tem como resultado um produto com
estrutura tridimensional. Cada sequência única de aminoácidos produz também uma
estrutura tridimensional única que tem propriedades específicas. Cadeias individuais de
proteínas podem por vezes agrupar-se para formar um complexo proteico.

A maioria das enzimas pode sofrer desnaturação, isto é, a sua estrutura pode sofrer
desagregação e inactivação pelo aumento de temperatura, o que provoca alterações na
conformação tridimensional da proteína. Dependendo da enzima, a desnaturação pode
ter efeitos reversíveis ou irreversíveis.

Como toda proteína, as enzimas também são sensíveis a variações de pH. O pH pode
alterar factores como a ligação do substrato à enzima, a actividade catalítica da enzima,
a ionização do substrato e a variação da estrutura da proteína.
As cadeias laterais dos aminoácidos no sítio activo das enzimas podem agir como
ácidos fracos ou bases com funções críticas para a manutenção de um estado ionizado
necessário para a actividade enzimática. A faixa de pH na qual a enzima sofre alterações
em sua actividade pode indicar inclusive o tipo de resíduo de aminoácido envolvido na
catálise.

Portanto, o pH da solução influencia a actividade enzimática, e, consequentemente, a


velocidade das reacções: se o pH está em sua faixa óptima para a acção de determinada
enzima, a velocidade da catálise será mais rápida. É importante ressaltar que a
velocidade e a eficiência da catálise enzimática são influenciadas por vários outros
factores, como temperatura, regulação da enzima, presença ou ausência de cofactores,
etc.

Relação entre os valores de pH e a velocidade da reacção e os valores do pH óptimos


para algumas enzimas.

1.6. Especificidade
As enzimas possuem normalmente uma alta especificidade em relação às reacções que
catalisam e aos substratos que estão envolvidos nessas reacções. A forma
complementar, carga e características hidrofílicas/hidrofóbicas, são responsáveis por
esta especificidade. As enzimas exibem também elevados níveis de
estereoespecificidade, regioselectividade e quimioselectividade.

Algumas das enzimas que apresentam maior especificidade e precisão, estão envolvidas
na cópia e expressão do genoma. Estas enzimas possuem mecanismos de proof-reading
(revisão). Um destes casos é a DNA polimerase, que catalisa uma reacção num primeiro
passo, para de seguida confirmar, num segundo passo, se o produto é o correcto.

Este processo em duas etapas resulta em médias de taxa de erro muito diminutas, na
ordem de uma para cem milhões de reacções, no caso de polimerases de mamíferos.
Mecanismos de revisão similares também podem ser encontrados na RNA polimerase,
na aminoacil-tRNA sintetases e em ribossomas.

Algumas enzimas que produzem metabolitos secundários são descritas como


promíscuos, visto que podem actuar num largo espectro de diferentes substratos. Tem
sido sugerido que este tipo de especificidade alargada é importante nos processos de
evolução de novas vias de biossíntese.

1.7.Modelo chave-fechadura (Não é mais utilizado)


As enzimas exibem uma elevada especificidade, e foi sugerido por Emil Fischer, em
1894, que esse facto era devido a que tanto as enzimas como os substratos apresentam
formas geométricas complementares, fazendo com que encaixem de maneira precisa
umas nos outros.

Este processo é muitas vezes referido como modelo chave-fechadura. No entanto,


apesar deste modelo explicar a especificidade das enzimas, falha em explicar a
estabilização dos estados de transição que as enzimas exibem.

1.8. Modelo do encaixe induzido


Em 1958, Daniel Koshland sugeriu uma modificação ao modelo de chave-fechadura:
uma vez que as enzimas exibem estruturas flexíveis, o sítio activo altera a sua forma de
maneira continuada através de interacções com o substrato, enquanto esse mesmo
substrato vai interagindo com a enzima.

Como resultado, o substrato não se liga simplesmente a um sítio activo que é rígido. As
cadeias laterais dos aminoácidos que formam os sítios activo sofrem um reorientação de
maneira a que as suas posições potenciem a acção catalítica da enzima. Em alguns
casos, como nas glicosidases, a molécula de substrato também sofre alterações de
conformação à medida que vai se aproximando do sítio activo.
O sítio activo continua a sofrer modificações até que o substrato esteja completamente
ligado e é neste momento em que a conformação final e a carga são determinadas.

1.9.Mecanismos

As enzimas actuam de diversas formas, todas elas baixando o valor de ΔG‡:

Baixando a energia de activação, através da criação de um ambiente no qual o


estado de transição é estabilizado (por exemplo, distorcendo a forma da molécula do
substrato — a enzima distorce o substrato, gastando energia neste passo, de modo a
baixar a energia do estado de transição da reacção catalisada, resultando numa
diminuição global da energia requerida para completar a reacção).
Providenciando uma via alternativa (por exemplo, reagindo com o substrato
formando um complexo enzima-substrato, de existência impossível sem a presença
da enzima).
Reduzindo a variação da entropia da reacção ao orientar os substratos de forma
correcta para facilitar a reacção. Na ausência de enzima, as moléculas colidem em
todas as direcções possíveis de forma aleatória, um processo menos eficiente que na
presença da enzima. Ao considerar-se ΔH‡ isoladamente, este aspecto é
negligenciado.

O mecanismo de regulação da actividade enzimática pode ser lento, quando a regulação


apresenta aumento ou diminuição de síntese de enzimas, ou rápido que é por meio
molecular, ou seja, por ligações de moléculas na enzima ou no substrato, podendo ser
também por ligações covalentes “fosforilação”.
1.10. Dinâmica e funções
Investigações recentes providenciaram novos conhecimentos sobre a ligação entre a
dinâmica interna de uma enzima e o seu mecanismo de catálise.

A dinâmica interna de uma enzima é descrita como o movimento de partes internas


(como aminoácidos individuais, grupos de aminoácidos, um laço da cadeia, uma hélice
alfa, folhas beta vizinhas ou até domínios proteicos inteiros) destas biomoléculas, que
podem ocorrer a diversas escalas de tempo, desde femtossegundos a segundos. Redes de
resíduos de aminoácidos de uma estrutura podem contribuir para a catálise através de
movimentos dinâmicos.

Os movimentos em proteínas são importantes para diversas enzimas mas o tipo de


reacção que elas catalisam determina que tipos de movimento são mais importantes:
pequenas e rápidas vibrações ou lentas e significativas alterações conformacionais.
Estes estudos têm consequências na compreensão dos efeitos alostéricos, na produção
industrial de enzimas e no desinadas moléculas. A modulação da actividade da enzima
pode ser directa, quando a molécula se liga directamente a um local de ligação na
enzima, ou indirecta, quando a molécula se liga a outras proteínas ou subunidades que
interagem com a enzima alostérica, influenciando então a sua actividade.

As enzimas alostéricas são também, em geral, maiores e mais complexas que as


enzimas simples. A maioria tem duas ou mais cadeias polipeptídicas ou subunidades.

A maioria das enzimas, em cada sistema, segue os padrões cinéticos já descritos. Em


cada sistema enzimático, entretanto, há pelo menos uma enzima que determina a
velocidade de toda a sequência, porque ela catalisa a reacção mais lenta ou a reacção
limitante da velocidade. Estas enzimas reguladoras têm sua actividade catalítica
aumentada ou diminuída em resposta a determinados sinais. Pela acção destas enzimas
reguladoras a velocidade de cada sequência metabólica é constantemente ajustadas as
mudanças que ocorrem nas necessidades de energia e de biomoléculas requeridas no
crescimento da célula e no seu auto-reparo.

A enzima alostérica possui, além do sítio activo específico, um sítio de ligação de


moléculas, denominado sítio alostérico. Nesse sítio pode se ligar os produtos da reacção
para realizar um “feedback” negativo da reacção e regulá-la melhor, podendo se ligar
também efetores (inibidores) que aumentam ou diminuem a afinidade da enzima e
substrato. O substrato pode se ligar ao sítio alostérico, denominado fenómeno de
cooperação, o que dá característica ao gráfico das enzimas alostéricas. Existem também
enzimas que atuam com o mesmo substrato realizando a mesma reacção, porém com
algumas diferenças. Essas possuem sítio activo específico para o mesmo substrato,
entretanto apresentam regulações alostéricas distintas, são denominadas isoenzimas.

Você também pode gostar