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GRANDE DO SUL
CURSO DE PEDAGOGIA
ANDRESSA MARCHIORI
SANTA ROSA, RS
2018
ANDRESSA MARCHIORI
SANTA ROSA, RS
2018
RESUMO
Este Trabalho de Conclusão de Curso tem como objetivo refletir sobre a infância e sua
singularidade. Pretende discutir a criança e a chamada cultura infantil, refletindo sobre o
significado dos adultos (família e escola) cuidar/educar as crianças como sujeitos que criam
cultura. Enfatiza as contradições da sociedade contemporânea no que se refere aos papeis dos
adultos no desenvolvimento e formação das crianças e aponta a necessidade dos adultos
olharem o mundo a partir do ponto de vista das crianças entendendo-a como produto e
produtora de cultura. A metodologia privilegiou uma pesquisa bibliográfica e uma pesquisa de
campo. A primeira objetivou a ampliação dos conceitos de criança, infância, cultura infantil e
do papel do adulto enquanto mediador da inserção da criança no mundo em que vive. Esta
pesquisa explorativa caracterizou-se pelo diálogo com pesquisadores e educadores da
infância, entre os quais se destacam Fensterseifert (2008), Friedmann (2013), Franco (2002),
Savater (2000) entre outros. A pesquisa de campo, visando a busca de confirmações, tensões,
contradições e/ou ilustrações das leituras realizadas, se caracterizou como uma observação de
uma turma de crianças da pré-escola de 4 e 5 anos em uma Escola Infantil do município de
Alecrim e de entrevistas com crianças, pais e professora com intuito de compartilhar seus
entendimentos, preocupações e perspectivas acerca do mundo, e a relação entre eles e a
sociedade em que vivem. Considera-se que as crianças são fortalecidas quando família e
escola desempenham seus papeis em conjunto, família fazendo papel de educação para que as
crianças consigam se socializarem na escola. Assim a escola consegue atender todas as
demanda que a sociedade lhes impõe.
INTRODUÇÃO
São muitas as questões que me inquietam e me instigam a estudar de forma mais
aprofundada sobre a cultura infantil e o papel do adulto no processo formativo da criança, na
perspectiva de construir um referencial/suporte teórico que me possibilite uma atuação,
enquanto educadora da infância, mais segura.
O que é ser criança? O que é ser adulto? O que uma criança não sabe ou pode fazer
sem um adulto? Quais são os adultos que a criança mais gosta e mais convive? O que é ser
Adulto? Qual é o papel do adulto na educação de uma criança? Qual é o papel dos pais? E da
escola? É importante a família participar na escola? Como deve ser a participação da família
na escola? O que os pais acham que uma criança aprende com a professora? Que
aprendizagens a criança aprende com uma professora além daquilo que ela ensina?
instituições formadoras em que a criança interage e recebe informações inicias acerca de si,
do outro e do mundo. Em razão disso, são fortes constituidoras de identidades e
subjetividades. Neste sentido, seria importante que as mesmas fossem aliadas/parceiras no
desenvolvimento de suas atribuições, afinal os sujeitos são os mesmos e as atribuições/papéis
são complementares. O correto (ou ético) seria que ambas pautassem seus procedimentos
formativos sob os mesmos entendimentos e princípios e dialogassem entre si. Isso,
evidentemente não ocorre. Caso ocorra, são iniciativas pontuais. Não ocorre, principalmente
pelo fato de haver conflito, contradições e tensões entre as concepções e interesses.
Parti do princípio de que a primeira convivência que o ser humano tem no mundo é
com a família. Ela é que faz determinações iniciais sobre o modo de viver. Em seguida, ou
atualmente, quase que simultaneamente, as pessoas são inseridas ou “colocadas” na escola
para aprenderem aqueles conhecimentos pretensamente necessários para se tornarem cidadãos
e poderem conviver na sociedade, que diga-se de passagem, bastante complexa. Sendo que os
papeis destas instituições serem complementares e dizerem respeito ao desenvolvimento e
educação das crianças e adolescentes, é preciso estabelecer uma sintonia entre os papeis e
para isso faz-se necessário um diálogo e um trabalho conjunto.
Para refletir sobre as questões até aqui postas, o presente trabalho foi organizado em
três capítulos, objetivando enfatizar em cada capítulo as seguintes reflexões:
No primeiro: Criança pede respeito, traz uma reflexão acerca da questão que está
inquietando os que atuam na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental:
“de que infância nós falamos? Enfatiza um entendimento mais alargado de criança e infância,
procurando entender as infâncias e as crianças na sociedade contemporânea, de modo a
compreender a necessidade de a cultura infantil ser referência nas práticas educativas.
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Atualmente se fala muito mais sobre a criança do que se falava no passado. Mas,
mesmo assim, ainda escutamos falar muito pouco a respeito dos direitos das crianças, direitos
esses que, são garantidos por leis, iniciando pela Constituição Federal da República (1988)
quando cita, pela primeira vez, a criança com ser de direitos. O Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA) criado no ano de 1990 através da Lei 8.069. Esse Estatuto regulamenta os
direitos das crianças e dos adolescentes inspirados pelas diretrizes fornecidas na Constituição
Federal de 1988. Vale lembrar a definição de criança e adolescente: É considerada criança a
pessoa com idade inferior a doze anos e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de
idade.
O Estatuto da Criança e Adolescente – ECA em seu art. 4.º determina que é dever
da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta
prioridade, a efetivação dos direitos à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao
lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, à convivência
familiar e comunitária, entre outros mais que asseguram a criança e adolescentes de ter seu
desenvolvimento na sociedade em que vive.
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Em razão disso, é possível perceber que nem sempre as políticas educacionais para a
criança foram pautadas na lógica das mesmas, pelo contrário, pois suas práticas eram muito
mais para adequá-las aos interesses de uma ideologia que passava muito distante das
necessidades e demandas da criança.
tornou a visão mais sensível sobre a criança, embora, infelizmente ainda ocorrerem processos
de adultização, de aceleração, erotização da infância.
Em muitas culturas, ainda não há espaço para este novo olhar, pois estas têm a criança
como mão de obra ou como um ser que não pensa. A sensibilidade pela criança que também
faz parte do contexto da sociedade é fundamental para o desenvolvimento de cada uma delas e
da própria sociedade
As crianças estão conquistando cada dia mais espaço, na sociedade, que é seu por
direito e é muito positivo. O que é preciso ser potencializado é a aproximação dos adultos
próximos com as crianças, principalmente os pais e professores em relação aos entendimentos
do que é ser criança, quais suas demandas, como se desenvolvem, como aprendem e definir
com clareza qual o papel de cada um no seu processo de formação.
Durante a conversa com um pai – sujeito da pesquisa- relatou que por estar pouco
tempo com seu filho “eu deixo fazer o que quer, pois meu tempo com ele já é pouco e ai ainda
vou ficar dizendo não a todo o momento, fica chato”. Este pai deixa bastante claro que não
convive muito com seu filho: não brinca com seu filho por falta de tempo e para não parecer
autoritário, acaba abrindo mão de seu papel de pai ou de adulto, este pai não é caso isolado.
Ouvindo duas mães conversando e uma delas falou de que seu filho ao completar 4 anos não
pôde mais frequentar a escola em turno integral e isso lhe criou um problema, pois não sabe o
que fazer com ele. O jeito, segundo ela, é ligar a Netflix e deixar ver filminhos.
precisa de adultos desejosos a proporcionar os desafios e mediadores necessários para que ela
possa viver intensamente seu tempo-criança com aquelas atividades/linguagens expressivas,
como o brincar, desenhar, conversar, cantar que lhes são peculiares.
PERROTTI (1990, p.12) questiona este entendimento e afirma que a criança não é
simplesmente organismo em mudança, não é apenas uma quantidade de anos, um dado etário,
mas algo bem mais complexo e completo. A criança vive na sua infância uma construção
social e de sua própria história. Todas estão em um espaço de convívio com características
diferenciadas, por isso cada uma possui sua própria história de acordo com seu ambiente
social e este convívio fará uma grande diferença na constituição de sua identidade.
FRIEDMANN (2005, p.17) alerta sobre o risco das práticas educativas se pautarem na
“criança ideal- padrão. A autora afirma que as crianças mais “idealizadas”, bem alimentadas,
limpas, educadas, que estão inseridas em uma família tradicional (pai, mãe, irmãos): são
referenciadas pela escola e pela mídia em geral. E alerta que esta postura faz-se presente nos
currículos escolares, quando ignoram/silenciam:
Com esta perspectiva, faz-se necessário a contextualização das crianças para que
entendamos as transformações históricas, o desenvolvimento infantil e ter um panorama mais
próximo da realidade de vida de cada uma, pois assim como apontado nos tópicos anteriores
pode-se perceber que os contextos são inúmeros e cada criança vai se desenvolver mediante o
que é lhes proporcionado. Estas informações sobre a infância se fazem necessárias para uma
compreensão mais ampla e aprofundada dela e proporcionar a produção e o desenvolvimento
de novas práticas educativas e pedagógicas pautadas neste princípio. Resgatar a pluralidade de
culturas que contribuíram para a formação da criança e da própria sociedade brasileira, é um
desafio!
Na atual sociedade podemos perceber que a criança é um ser ativo, mas rodeada pelos
adultos acaba por ser silenciada. Como produtora da sua própria cultura a criança ainda
precisa ser vista como intérprete do mundo e que possui pensamento próprio. Os adultos
precisam fazer com que as crianças criem significado para as informações, e não, somente
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reproduzem o que os demais a sua volta fazem. As crianças são capazes de reconstituir as
culturas que consomem, e nessa reconstrução que produzem sua própria cultura.
Cumpre destacar que a interação com as crianças não se caracterizou como uma
entrevista- pergunta e resposta, pois isso viria contradizer a própria compreensão que
construímos da pesquisa sobre a criança. Pautamo-nos em FILHO (2005, p.14) quando
sustenta a necessidade de se rever as posturas das investigações sobre as crianças e propõe um
olhar que as considere como sujeitos empíricos, com voz, vez, e expressões próprias. FILHO,
citando SARMENTO (2013), defende que são as crianças nossos referentes empíricos no
estudo da infância, é preciso escutá-las a partir de si próprias. FILHO (p.14), que se sustenta
na teoria de SARMENTO, afirma de que por intermédio deste enfoque:
Pautada nestas e outras reflexões, o encontro com as crianças se constituiu como uma
conversa informal. Para tal, foi organizado um ambiente descontraído e, ao mesmo tempo
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instigante. Neste contexto há um recorte das falas, enfatizando o entendimento que as crianças
têm de criança. Ao serem questionadas sobre o seu entendimento de criança, as respostas,
embora parecidas, revelaram as suas singularidades, construídas pelas mediações
recebidas/vividas com os adultos, seus pares e meio sociocultural. Todas as crianças com
palavras diferentes explicitaram entendimentos parecidos. J afirma que ser criança é “ser mais
pequeno que o pai, mãe, pai, professora...(adulto)”. M. prontamente responde: com outra
pergunta: “Ser criança? Porque tu quer saber? Eu sô criança!...Ué...é brincar, é fazer
bagunça”. L. interrompe a fala de M e defende de que “ser criança é não poder fazer muita
coisa. Lá em casa tudo é difícil. Lá em casa tudo fica alto... Só pode brincar, chorá...” J.
retruca dizendo: “Eu não choro”... L e M riem.... T. só fica escutando, mesmo sendo desafiada
a participar da conversa não responde e fica manuseando um brinquedo. T é da mesma idade
das outras crianças, mas com condições financeiras menos favorecidas e geralmente fica mais
afastada dos demais. No entanto, durante as brincadeiras e desenhos, T resolve participar e
diz: “ criança é chato porque não pode comprá o que gosta. E, emenda: quando eu crescer vou
ganhá bastante dinheiro para comprá um monte de coisa, pro pai, prá mãe, pro meu irmão...”.
A cultura de cada criança é forte influenciadora no desenvolvimento de conceitos/concepções,
e assim, chegam à vida adulta entrelaçadas na cultura familiar, muitas vezes. com dificuldade
para desenvolver a sua própria cultura.
Esta pesquisa, também objetivou chamar atenção para as formas de constituição das
crianças, pois segundo FILHO (2005, p.13) [...] traços e retratos que as justificam e as
diferenciam, pois essas não existem no singular, sendo mais apropriado falarmos em crianças,
que juntas em sua pluralidade, formam a categoria infância. E acrescenta:
Não gostamos de contar nossas coisas aos adultos, talvez porque eles
estão sempre com pressa quando falamos com eles. Sempre parece
que não estão interessados, que vão responder qualquer coisa, para se
verem livres logo. Está certo: eles têm os seus problemas importantes,
e nós os nossos. KORCKZAK (1981, p.37)
Em razão disso, a criança é a que tem o maior tempo de dependência, ou de ser criança
em relação as demais espécies. Senão pensemos no tempo em que somos crianças. Se um
animal, assim que nasce já consegue andar, se alimentar... a criança tem um tempo muito
maior para emancipar-se do adulto, o que implica que sua presença seja imprescindível para a
que mesma- a criança- se humanize. SAVATER (2000, p. 43) lembra que “A principal
matéria que os homens ensinam uns aos outros é em que consiste ser homem”. Neste caso
podemos afirmar que qualquer adulto é capaz de ensinar alguma coisa, mas nem todos podem
ensinar “qualquer coisa”. Inicialmente eram assim que acontecia a inserção da criança no
mundo: interagindo com adultos e outras crianças em todos os espaços e eventos, o que
proporcionava, segundo ARENDT (2000, p. 233) um relacionamento natural entre adultos e
crianças, o qual, entre outras coisas, aconteciam ensinos e aprendizagens recíprocos sobre o
mundo e mostrava para a criança ao mesmo tempo o fato de que ela é um ser humano em
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desenvolvimento, de que a infância é uma etapa temporária, uma preparação para a condição
adulta.
Vive-se uma crise, entre outras, de autoridade nas famílias, não sabem os limites,
como dizem. Conversando com uma mãe de um filho de quatro anos ela afirma: “vivo em
conflito: por um lado não quero ser uma mãe autoritária como minha mãe foi não deixando a
criança fazer nada, dizendo não para tudo, reservando uma peça da casa para a bagunça
fazendo com ela não se senta pertencente ao resto da casa. Por outro lado, não posso permitir
que meu filho se tornasse num pequeno déspota.” Esta mãe tem formação superior e encontra-
se em conflito e afirma que muitas vezes pensa em assumir a “autoridade” e mandar ficar
quieto e tomar umas atitudes mais drásticas.
O que se pode observar que as crianças têm pouco contato com os pais. Na escola em
que fiz minhas observações a maioria das crianças passa na escola em tempo integral. Ficam
mais com a professora do que com familiares. As crianças que frequentam a escola apenas um
turno, encontrei crianças que, em turno inverso, fazem outras atividades como natação e as
demais, conforme depoimento das próprias mães que ficam em casa assistindo “filminhos”. E
em meio a tantas turbulências como as crianças vivem a sua infância? Elas têm a rotina criada
por seus pais e precisa ser seguida para que eles possam trabalhar. Os conflitos são diários,
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pois a falta de entendimento está bastante presente na vida adulta em relação à criança. O que
fazer? A realidade está mostrando a necessidade da emergência de nova cultura e uma ética
familiar, a qual precisa ser assumida com coragem por todos e nesta busca a pareceria família,
escola é imprescindível.
Atualmente, muitas crianças, antes mesmo não tendo ainda noção de que é uma pessoa
e que as demais crianças são outras pessoas, já estão frequentando uma escola e convivendo
com outras crianças e... com pelo menos um adulto que marcará sua história: a professora, ou
o professor.
O papel da professora (adulta) , enquanto parceira é fundamental, pois ela passa (ou
não) segurança, a ajuda a reconhecer e explorar o ambiente e os desafios que o mesmo
proporciona, as relações que neste ambiente se estabelecem... Cabe à professora, enquanto
alguém maior e mais experiente, estabelecer mediações que desafiem as linguagens, pois são
elas que subsidiarão a interlocução e a interação da professora com a criança e a criança com
as demais. Assim se manifestam SILVA E COSTA (1998, p. 43):
A professora precisa estar preparada para cada reação que a criança venha apresentar,
pois cada uma delas possui uma cultura diferenciada e forma singular de ver o mundo. Nem
sempre o reconhecimento é feito da mesma maneira por todos e muito menos conforme o
olhar da professora.
Para a professora poder interagir com estas crianças precisa desenvolver a capacidade
de compreendê-las acolhendo e desafiando todas a utilizar suas linguagens num ambiente
propício cheio de oportunidades de intercâmbio de linguagens, mensagens, percepções,
criação, recriação de imagens e imaginações. FRIEDMANN, destaca a importância da roda,
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pois segundo ela (p154 e 156) todos são iguais e, ao mesmo tempo, cada integrante mantém
sua singularidade:
Os desafios da professora, junto aos demais atores socias da escola são muitos e
complexos. Cada criança chega à escola por razões e expectativas distintas. O importante é
compreender e acolher á todas, reconhecendo que, independendo de sua história, possuem
modos próprios de compreender e interagir com o mundo, cabendo á escola (e não apenas a
professora/professor), favorecer a criação de um ambiente no qual a infância possa ser vivida
em toda sua plenitude, assim como defende NASCIMENTO (p.31) “um espaço e um tempo
de encontro entre os seus próprios espaços e tempos de ser criança dentro e fora da escola”.
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A citação, bem mostra o quanto se faz necessária a emergência de uma nova cultura (e
ética) escolar. Precisamos de uma escola que acolha, reconheça a criança como sujeito de
direitos que tem um saber que precisa ser considerado no momento de produzir práticas
pedagógicas. O saber da criança não é superior e nem inferior em relação ao saber do adulto.
É apenas um saber diferente. Faz-se necessário, ao mesmo tempo, que a escola assuma, com
coragem, o seu papel de ensinar e educar as novas gerações. Ensinar, não transmitindo
conhecimentos, impondo regras, ditando de que cor a criança precisa pintar o mar.... e sim,
um ensinar como mediação cognitiva, social e cultural dos conhecimentos adequados e
necessários que permitam a criança viver sua condição de criança e, ao mesmo tempo
ampliar, alargar e aprofundar o conhecimento de si, dos outros e do mundo. Isso não é tarefa
fácil diante da diversidade cultural e das demandas postas à escola pela sociedade.
O contexto e a diversidade cultural em que a escola está inserida exige uma nova
demanda de informações e conhecimentos dos professores, pois não basta dominar e
transmitir determinados conhecimentos e sim, saber selecionar, ordenar aquelas
aprendizagens necessárias para que a criança vá construindo em processo, sua subjetividade,
As crianças estão inseridas em uma sociedade em que lida com muitas informações e
mudanças ao mesmo tempo. Considerando que os adultos mais presentes na vida das delas
são os professores, precisam, para atendê-las, estar atentos à realidade e construir sua
formação buscando novos conhecimentos a todo o momento, com o cuidado de não atrelar-se
a modismos e interesses ideológicos que depõem contra os direitos das crianças e nem cair no
espontaneismo, onde a criança sabe o que quer.
É na escola que as crianças desenvolvem seus potenciais e tudo começa na educação
infantil. Nesse tempo vai conhecendo espaços diferentes, novas pessoas, culturas e modo de
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ser e fazer. Este tempo- educação infantil passa rápido, pois em pouco tempo terão que se
readequar a um novo tempo (sem ela perceber/pedir/entender/concordar) e passar para o
Ensino Fundamental.
Para os adultos, diga-se de passagem, uma transição “normal” Para a criança, nem
tanto, pois trata-se de uma fase de transição muito complexa e contraditória, pois na verdade,
está indo em direção de um contexto diferente. Ocorre uma transição muito forte repentina.
Passam muito rápido do brincar para ler e escrever. Pergunta-se, qual o problema? Ler e
escrever não se constituem aprendizagens importantes, lúdicas e necessárias? Todos
concordam que sim. E é, com absoluta certeza! E é o que a criança mais quer: avançar. No
entanto, ao observarmos a forma como esta passagem da Educação infantil para o Ensino
Fundamental ocorre, é preocupante. Dá a impressão de que o tempo de infância acabou. Para
alguns professores- infelizmente nem tão poucos- que atuam no Ensino Fundamental, as
crianças deixam de ser, ou melhor, são impedidas de viver sua condição de criança ao chegar
nesse novo tempo/espaço. É sabido que ainda são crianças e continuam a gostar/necessitar de
se expressar e se comunicar pelas diferentes linguagens expressivas. FRANCO (2002)
defende a necessidade de respeitar o ciclo da infância, potencializando este tempo e jamais
acelerando-o. Traz um dizer de KISHIMOTO (2000, p.3) pertinente: Ser criança é ter direito à
educação, ao brincar, aos amigos, ao conhecimento, mas principalmente, à liberdade de
escolha. O que a autora mais defende é a necessidade de os adultos respeitarem a criança, pois
respeitando-a, estarão defendendo a continuidade da civilização, da sociedade democrática.
Respeitar os direitos da criança, não é deixá-la solta, sem amparo, acolhimento e orientação
(pois é esta a função do adulto), mas respeitar é ouvir/acolher/considerar nas práticas
pedagógicas estas escolhas. Ser protagonista não é determinar, é participar é ouvir e ser
ouvida, dar voz e vez para as crianças e romper com a ideia da Escola Infantil ser um lugar
para abrigar e cuidar das crianças enquanto os pais trabalham.
de tardinha buscam, geralmente atrasados e reclamando ao saberem que seu filho dormiu
muito durante à tarde, o que o fará acordado até tarde.
FRANCO (2002), afirma também, que infelizmente, a formação dos professores ainda
deixa que isso aconteça, pois em muitas das creches o lugar de cuidado ganha espaço e o
pedagógico fica de lado. Isso é tão evidente que que as crianças não veem diferença de suas
casas para as creches. As escolas e creches precisam desenvolver mais a parte pedagógica e
sensibilizar os pais a entenderem a função dos mesmos enquanto família na educação de seus
filhos e qual é a função da escola. Somente assim as crianças não estarão em meio às
turbulências dos adultos.
Quando a criança brinca, a criança dança, fala com seu corpo e sua
expressão. O que seu olhar diz? Ela quer nos dizer algo ou ela diz, por
que ela vive, simplesmente? Ela é a autora da sua própria vida. Pés
bem enraizados no chão, conectando-se através do seu centro
emocional que gira em torno da sua cintura e ventre, peito-coração
abertos, olhar profundo, com uma dimensão universal e arquetípica do
brincar que propicia sua expressão mais completa.
. A escola precisa se adaptar as crianças, e não as crianças à escola. Fazendo com que se
tornam seres pensantes. Mas o mais importante é que a escola caminhe junto com as
mudanças da sociedade (sem atrelar-se a elas), pois essas mudanças interferem no pensamento
e, consequentemente, na cultura do povo. Nesta perspectiva é que os pesquisadores da
infância defendem o protagonismo da criança, pois é através deste protagonismo que a criança
poderá viver com maior plenitude sua infância e construir sua autonomia. Por isso o
protagonismo da criança precisa ser prioridade para que saibam em qualquer tempo, seja
presente ou futuro, fazer diferentes interpretações e fazer escolhas próprias.
Tive o privilégio de observar e interagir com uma turma da Educação Infantil- 4-5
anos, e perceber o protagonismo infantil, ou seja, evidenciei, num cotidiano o quanto isso é
possível. Pude perceber/comprovar a capacidade e o entusiasmo/envolvimento das crianças
desta idade relacionar-se com o meio em que está quando a professora tem como o maior
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Este capítulo tem, ou tinha como objetivo, trazer elementos para se pensar uma
pedagogia para a infância. Em processo acabei trazendo questões que, exatamente entravam
ou dificultam esta construção. Estas reflexões não foram em vão, pois permitiram ver em
quais questões precisamos nos centrar. Então voltemos para a projeção de possibilidades e,
defendo neste contexto que o protagonismo se dá no momento que a criança vive sua
condição de criança e que se autorize a manifestar-se, mostrando do que precisa, do quer e
sabe ou deveria saber. É preciso que o adulto acredite na importância de estar atento às vozes
infantis e na necessidade de se aprofundar na sua elucidação, pois é aí que reside a pedagogia
da e para a infância. FRIEDMANN (2013, p. 13) afirma:
É assim que a professora das infâncias precisa se colocar, como uma pesquisadora de
tesouros e isso ela encontrará, principalmente, ao observar uma criança brincando, pois onde
há uma criança brincando há um tesouro escondido que só um achadouro de infâncias
encontrará. .Esta voz é de uma criança... Quem a escuta? Quem a lê? Quem se importa e
significa sua prática educativa em função destas perguntas?
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Sabemos que as escolas possuem uma forte influência na produção da cultura pela
criança. Elas são importantes e necessárias pois, para muitas crianças o ambiente escolar é o
único lugar espaço organizado em que a criança pode produzir e viver a sua cultura- a cultura
infantil - em interação com seus pares, com sua professora e outras pessoas da comunidade
escolar. Muitas crianças valorizam a sua ida à escola para conversar! A criança necessita
imperiosamente do grupo de iguais e onde elas podem encontrar este grupo, se não na escola?
principalmente na infância, que família e escola não trabalhem juntas. Faz-se necessário um
amplo debate para que cada instituição redefina, ou resgate o seu papel principal neste
processo. Já não cabe mais a cultura da culpalização, responsabilização exclusiva, mas uma
cultura de parceria. Cabe à escola produzir sua cultura pautada, também na cultura infantil.
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