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OBJETIVOS ESPECÍFICOS:

1) Descrever as causas de dor torácica, identificando as possíveis etiologias (cardíaca, pulmonar, paredetorácica, esofágica, aorta, etc.).
2) Descrever os mecanismos que levam à formação do trombo (relacionar com anticoncepção, processos inflamatórios sistêmicos, varizes, trauma, etc).
3) Descrever os mecanismos que levam à embolização e o trajeto a ser percorrido para o trombo alojar nos pulmões.
4) Definir TEP e citar sua epidemiologia.
5) Relacionar a fisiopatologia do TEP com o quadro clínico (sinais e sintomas - dor torácica, dispneia, hemoptise).
6) Descrever o plano propedêutico no TEP, identificando a importância dos Escores de avaliação de probabilidade pré-teste e de estratificação.
7) Interpretar exames laboratoriais e de imagem que auxiliam no diagnóstico e acompanhamento do paciente com TEP.
8) Descrever os protocolos de tratamento, racionalidade de recursos, efetividade e riscos das medidas farmacológicas utilizadas no paciente com TEP
9) Identificar as medidas para seguimento ambulatorial do paciente com TEP.
10) Enumerar as orientações de cuidados não farmacológicos (contexto de vida, mudanças de hábitos e fatores de risco) para o paciente com TEP.
11) Descrever o eletrocardiograma normal e as possíveis alterações eletrocardiográficas no paciente com TEP.
DESCREVER AS CAUSAS DE DOR TORÁCICA, IDENTIFICANDO AS POSSÍVEIS ETIOLOGIAS (CARDÍACA, PULMONAR, PAREDETORÁCICA, ESOFÁGICA, AORTA, ETC.).
DOR TORÁCICA
A dor torácica está entre as razões mais comuns que levam os pacientes a procurar assistência médica nas emergências
ou nos consultórios médicos. A avaliação da dor torácica não traumática é um desafio inerente, devido à variedade de causas
possíveis, uma minoria sendo condições potencialmente fatais que não devem passar despercebidas. É importante estruturar a
avaliação diagnóstica inicial e o rastreamento dos pacientes com dor torácica aguda em três categorias: (1) isquemia miocárdica;
(2) outras causas cardiopulmonares (doença pericárdica, emergências aórticas e condições pulmonares); e (3) causas não
cardiopulmonares. Embora a identificação rápida de condições de alto risco seja uma prioridade da avaliação inicial, as estratégias
que incorporam o uso liberal rotineiro de testes têm o potencial de implicar efeitos adversos de investigações desnecessárias.
EPIDEMIOLOGIA E HISTÓRIA NATURAL
A dor torácica é a terceira razão mais comum de idas a emergências nos Estados Unidos, resultando em 6 a 7 milhões
de consultas anuais a esses departamentos. Mais de 60% dos pacientes com esse problema são hospitalizados para a realização de
exames mais detalhados e o restante é submetido a uma avaliação adicional no próprio departamento de emergência. Apenas cerca
de 15% dos pacientes avaliados acabam recebendo o diagnóstico de síndrome coronariana aguda (SCA), com índices de 10 a 20%
na maioria das séries de populações não selecionadas e uma taxa de apenas 5% em alguns estudos. Os diagnósticos mais comuns
são causas gastrintestinais (Fig. 11-1), e menos de 10% são de outras condições cardiopulmonares potencialmente fatais. Em uma
grande proporção de pacientes com dor torácica aguda transitória, são excluídas a SCA ou outra causa cardiopulmonar, mas a causa
não é determinada. Portanto, os recursos e o tempo dedicados à avaliação da dor torácica na ausência de uma causa grave são
substanciais. Apesar disso, um número surpreendente de 2 a 6% de pacientes com dor torácica de etiologia presumivelmente não
isquêmica que têm alta da emergência depois são diagnosticados com infarto agudo do miocárdio (IAM). Pacientes cujo diagnóstico
de IAM passa despercebido correm um risco duas vezes maior de morrer em 30 dias em comparação com os que são hospitalizados.

FIGURA 11-1 Distribuição de diagnósticos definitivos na alta de pacientes com dor torácica aguda não
traumática. (Figura preparada com dados de P Fruergaard et al: Eur Heart J 17:1028, 1996.)
As histórias naturais da SCA, de doenças pericárdicas agudas, da embolia pulmonar e de emergências aórticas são
discutidas nos Capítulos 265, 268, 269, 273 e 274, respectivamente. Em um estudo realizado com mais de 350 mil pacientes com
dor torácica inespecífica presumivelmente não cardiopulmonar, a taxa de mortalidade 1 ano após a alta foi < 2% e não diferiu de
maneira significativa da mortalidade ajustada para a idade na população geral. A taxa estimada de eventos cardiovasculares
importantes por 30 dias nos pacientes com dor torácica aguda estratificada como baixo risco foi de 2,5% em um estudo baseado
em uma grande população, que excluiu pacientes com elevação do segmento ST ou dor torácica não cardíaca definida.
CAUSAS DE DOR TORÁCICA
As principais etiologias da dor torácica são discutidas nesta seção e estão resumidas na Tabela 11-1. Outros elementos
da anamnese, do exame físico e dos exames diagnósticos que ajudam a distinguir essas causas são discutidos em uma seção posterior
(ver “Abordagem ao paciente”).
TABELA 11-1 ■ Manifestações clínicas típicas das principais causas de dor torácica aguda
Sistema Condição Início/duração Qualidade Localização Características associadas
Cardiopulmonares
Cardíaco Isquemia Angina estável: Pressão, aperto, Retroesternal; em geral se Galope de B4 ou sopro de
miocárdica compressão, peso, irradia para o pescoço, a insuficiência mitral (raro) durante
Precipitada por queimação mandíbula, os ombros ou a dor; B3 ou estertores se
exercício, frio ou braços; às vezes houver isquemia grave ou
estresse; 2-10 min epigástrica complicação de infarto agudo do
miocárdio
Angina instável:

Padrão em
crescente ou em
repouso

Infarto agudo do
miocárdio:

Em geral > 30 min


Pericardite Variável; horas a Pleurítica, aguda Retroesternal ou em Pode ser aliviada se o paciente
dias; pode ser direção ao ápice cardíaco; sentar-se ereto e inclinar-se
episódica pode irradiar para o ombro para frente; som de atrito
esquerdo pericárdico
Vascular Síndrome Início súbito de Lacerante ou Tórax anterior, Associada a hipertensão e/ou
aórtica aguda dor implacável lancinante; em facada frequentemente distúrbio subjacente do tecido
irradiando-se para as conectivo; sopro de insuficiência
costas, entre as omoplatas aórtica; perda de pulsos
periféricos
Embolia Início súbito Pleurítica; pode Frequentemente lateral, no Dispneia, taquipneia, taquicardia
pulmonar manifestar-se com lado da embolia e hipotensão
embolia pulmonar
maciça
Hipertensão Variável; em geral Pressão Subesternal Dispneia, sinais de aumento da
pulmonar com exercício pressão venosa
Pulmonar Pneumonia ou Variável Pleurítica Unilateral, frequentemente Dispneia, tosse, febre,
pleurite localizada estertores, às vezes atrito
Pneumotórax Início súbito Pleurítica No lado do pneumotórax Dispneia, diminuição dos sons
espontâneo respiratórios no lado do
pneumotórax
Não cardiopulmonares
Gastrintenstinal Refluxo 10-60 min Queimação Subesternal, epigástrica Agravada por decúbito pós-
esofágico prandial; aliviada por antiácidos
Espasmo 2-30 min Pressão, aperto, Retroesternal Pode se parecer bastante com a
esofágico queimação angina
Úlcera péptica Prolongada; 60-90 Queimação Epigástrica, subesternal Aliviada por alimentos ou por
min após as antiácidos
refeições
Doença na Prolongada Intensa ou em cólica Epigástrica, quadrante Pode seguir-se a uma refeição
vesícula biliar superior direito; às vezes
para as costas
Neuromuscular Costocondrite Variável Intensa Esternal Às vezes edema, sensibilidade,
calor sobre a articulação; pode
ser reproduzida por pressão
localizada ao exame
Doença de Variável; pode ser Intensa; pode incluir Braços e ombros Pode ser exacerbada pela
disco cervical súbita dormência movimentação do pescoço
TABELA 11-1 ■ Manifestações clínicas típicas das principais causas de dor torácica aguda
Sistema Condição Início/duração Qualidade Localização Características associadas
Não cardiopulmonares
Trauma ou Geralmente Intensa Localizada na área de Reproduzida por movimento ou
estiramento constante estiramento à palpação
Herpes-zóster Geralmente Aguda ou em Distribuição por Exantema vesicular na área do
prolongada queimação dermátomo desconforto
Psicológico Transtornos Variável; pode ser Variável; em geral, se Variável; pode ser Fatores situacionais podem
emocionais ou transitória ou manifesta como aperto retroesternal precipitar os sintomas; história
psiquiátricos prolongada e dispneia com de ataques de pânico,
sensação de pânico ou depressão
morte iminente

ISQUEMIA/LESÃO MIOCÁRDICA
A isquemia miocárdica que causa dor torácica, denominada angina pectoris, é uma preocupação clínica primária em
pacientes que se apresentam com sintomas torácicos. A isquemia miocárdica é precipitada por um desequilíbrio entre a necessidade
miocárdica e o fornecimento miocárdico de oxigênio, resultando em fornecimento insuficiente de oxigênio para satisfazer as
demandas metabólicas cardíacas. O consumo miocárdico de oxigênio pode estar elevado por aumentos na frequência cardíaca,
estresse da parede ventricular e contratilidade miocárdica, enquanto o fornecimento miocárdico de oxigênio é determinado pelo
fluxo sanguíneo coronariano e pelo conteúdo de oxigênio arterial coronariano. Quando a isquemia miocárdica é grave o suficiente
e prolongada (mesmo que apenas 20 minutos), ocorre lesão celular irreversível, resultando em IAM.
A causa mais comum de cardiopatia isquêmica é uma placa ateromatosa que obstrui uma ou mais artérias coronárias
epicárdicas. A cardiopatia isquêmica estável (Cap. 267) em geral resulta do estreitamento aterosclerótico gradual das coronárias.
A angina estável caracteriza-se por episódios isquêmicos que costumam ser precipitados por um aumento superposto na demanda
de oxigênio durante exercício físico e aliviados com repouso. A cardiopatia isquêmica torna-se instável mais comumente quando
uma ruptura ou erosão de uma ou mais lesões ateroscleróticas desencadeia trombose coronariana. A cardiopatia isquêmica instável
é classificada clinicamente pela presença ou ausência de lesão miocárdica detectável e pela presença ou ausência de elevação do
segmento ST no eletrocardiograma (ECG) do paciente. Quando ocorre aterotrombose coronariana aguda, o trombo intracoronariano
pode ser parcialmente obstrutivo, em geral ocasionando isquemia miocárdica sem elevação do segmento ST. Acentuada por
sintomas isquêmicos em repouso, com atividade mínima ou em um padrão “em crescendo”, a cardiopatia isquêmica instável é
classificada como angina instável quando não há lesão miocárdica detectável e como IAM sem elevação do ST (IAMSEST) quando
há evidência de necrose miocárdica (Cap. 268). Quando o trombo coronariano causa obstrução aguda e completa, em geral segue-
se isquemia miocárdica transmural, com elevação do segmento ST no ECG e necrose miocárdica, levando a um diagnóstico de IAM
com elevação do ST (IAMEST, ver Cap. 269).
Os médicos devem lembrar que sintomas de isquemia instável também podem ocorrer predominantemente por
aumento da demanda miocárdica de oxigênio (p. ex., durante estresse psicológico intenso ou febre) ou por uma liberação menor de
oxigênio em decorrência de anemia, hipoxia ou hipotensão. No entanto, a designação de síndrome coronariana aguda, que abrange
angina instável, IAMSEST e IAMEST, em geral é reservada para a isquemia precipitada por aterotrombose coronariana aguda.
Para orientar as estratégias terapêuticas, um sistema padronizado de classificação do IAM foi ampliado para discriminar o IAM
que resulta de trombose coronariana aguda (tipo 1) do IAM que ocorre secundário a outros desequilíbrios do fornecimento e da
demanda miocárdicos de oxigênio (tipo 2; ver Cap. 268).
Outros fatores podem contribuir para a cardiopatia isquêmica estável e a instável, como disfunção endotelial, doença
microvascular e vasospasmo, sozinhos ou combinados com aterosclerose coronariana, e ser a causa dominante de isquemia
miocárdica em alguns pacientes. Além disso, processos não ateroscleróticos, inclusive anormalidades congênitas dos vasos
coronarianos, ponte miocárdica, arterite coronariana e coronariopatia induzida por radiação, podem acarretar obstrução coronariana.
Condições associadas a uma demanda miocárdica extrema de oxigênio e comprometimento do fluxo sanguíneo endocárdico, como
valvopatia aórtica (Cap. 274), miocardiopatia hipertrófica ou miocardiopatia dilatada idiopática (Cap. 254), também podem
precipitar isquemia miocárdica em pacientes com ou sem aterosclerose obstrutiva subjacente.
Características da dor torácica isquêmica As características clínicas da angina pectoris, em geral citada
simplesmente como “angina”, são altamente similares se a dor isquêmica for uma manifestação de cardiopatia isquêmica estável,
angina instável ou IAM; as exceções são diferenças no padrão e na duração dos sintomas associados a essas síndromes (Tab. 11-
1). Heberden inicialmente descreveu a angina como uma sensação de “aperto e ansiedade”. A dor torácica característica da isquemia
miocárdica é descrita geralmente como contínua, intensa, excruciante, esmagadora ou constritora. Entretanto, em uma minoria
substancial de pacientes, a qualidade da dor é extremamente vaga e pode ser descrita como um aperto leve ou meramente uma
sensação desconfortável, às vezes como dormência ou sensação de queimação. A localização da dor geralmente é retroesternal,
mas é comum ele irradiar-se para baixo da superfície ulnar do braço esquerdo; o braço direito, ambos os braços, o pescoço, a
mandíbula ou os ombros também podem estar envolvidos. Essas e outras características da dor torácica isquêmica pertinentes à
discriminação de outras causas de dor torácica são discutidas mais adiante neste capítulo (ver “Abordagem ao paciente”).
A angina estável em geral começa gradualmente e atinge sua intensidade máxima em questão de minutos antes de
dissipar-se vários minutos depois com o repouso ou a administração de nitroglicerina. É comum a dor ocorrer de maneira previsível
com um nível característico de exercício ou estresse psicológico. Por definição, a angina instável manifesta-se por dor torácica
anginosa que ocorre com atividade física de intensidade cada vez mais baixa ou mesmo em repouso. A dor torácica associada ao
IAM costuma ser mais grave, é prolongada (em geral, dura ≥ 30 minutos) e não é aliviada com o repouso.
Mecanismos da dor cardíaca As vias neurais envolvidas na dor cardíaca isquêmica são pouco entendidas. Acredita-
se que os episódios isquêmicos excitem receptores locais sensíveis a estímulos químicos e mecânicos que, por sua vez, estimulam
a liberação de adenosina, bradicinina e outras substâncias que ativam os terminais sensitivos de fibras simpáticas e vagais aferentes.
As fibras aferentes atravessam os nervos que se conectam aos cinco gânglios simpáticos torácicos superiores e às cinco raízes
torácicas distais superiores da medula espinal. A partir daí, os impulsos são transmitidos para o tálamo. Na medula espinal, impulsos
cardíacos simpáticos aferentes podem convergir com os impulsos vindos de estruturas torácicas somáticas, e essa convergência
pode ser a base da dor cardíaca irradiada. Além disso, fibras cardíacas vagais aferentes fazem sinapse no núcleo do trato solitário
do bulbo e então descem para o trato espinotalâmico cervical superior, e essa rota pode contribuir para a dor anginosa sentida no
pescoço e na mandíbula.
OUTRAS CAUSAS CARDIOPULMONARES
Doenças pericárdicas e outras miocárdicas (Ver também Cap. 265) A inflamação do pericárdio devido a causas
infecciosas ou não infecciosas pode ser responsável pela dor torácica aguda ou crônica. A superfície visceral e a maioria da
superfície parietal do pericárdio são insensíveis à dor. Assim, acredita-se que a dor da pericardite surja principalmente da inflamação
pleural associada. Por causa dessa associação pleural, a dor da pericardite em geral é pleurítica e exacerbada pela respiração, pela
tosse ou por alterações na posição. Além disso, devido ao suprimento sensitivo sobrejacente do diafragma central via nervo frênico
com fibras sensitivas somáticas originárias do terceiro ao quinto segmentos cervicais, a dor da pericardite pleural costuma irradiar-
se para o ombro e o pescoço. O acometimento da superfície pleural do diafragma lateral pode resultar em dor na parte superior do
abdome.
Doenças inflamatórias agudas e outras miocárdicas não isquêmicas também podem causar dor torácica. Os sintomas
da miocardiopatia Takotsubo (relacionada com estresse) em geral começam abruptamente, com dor torácica e dificuldade
respiratória. Essa forma de miocardiopatia, em sua apresentação mais reconhecível, é desencadeada por um evento estressante e
pode simular o IAM pelas anormalidades comumente associadas do ECG, inclusive elevação do segmento ST e dos biomarcadores
de lesão miocárdica. Estudos de observação confirmam uma predileção por mulheres > 50 anos de idade. Os sintomas de miocardite
aguda são extremamente variáveis. A dor torácica pode originar-se de lesão inflamatória do miocárdio ou ser causada por aumentos
severos no estresse da parede miocárdica relacionados com mau desempenho ventricular.
Doenças da aorta (Ver também Cap. 274) A dissecção aórtica aguda (Fig. 11-1) é uma causa menos comum de dor
torácica, mas é importante pela história natural catastrófica de certos subgrupos de casos, quando o diagnóstico é tardio ou o
problema não é tratado. As síndromes aórticas agudas abrangem um espectro de doenças aórticas agudas relacionadas com a ruptura
da camada média da parede aórtica. A dissecção aórtica envolve uma laceração na íntima aórtica, resultando em separação da média
e criação de um lúmen “falso” separado. Uma úlcera penetrante foi descrita como ulceração de uma placa aórtica ateromatosa que
se estende através da íntima e para a média aórtica, com o potencial de iniciar uma dissecção intramedial ou ruptura na
adventícia. Hematoma intramural é um hematoma na parede aórtica sem flap ou laceração da íntima demonstrável em radiografias
e também sem lúmen falso. O hematoma intramural pode ocorrer devido à ruptura dos vasa vasorum ou, menos comumente, a uma
úlcera penetrante.
Cada um desses subtipos de síndrome aórtica aguda costuma apresentar-se com dor torácica em geral intensa, de início
súbito e às vezes descrita como de qualidade “dilacerante”. As síndromes aórticas agudas que envolvem a aorta ascendente tendem
a causar dor na linha média da parte anterior do tórax, enquanto as síndromes aórticas descendentes manifestam-se com maior
frequência por dor nas costas. Assim, a dissecção que começa na aorta ascendente e segue para a aorta descendente tende a causar
dor torácica anterior, estendendo-se para o dorso, entre as escápulas. As dissecções aórticas proximais que envolvem a aorta
ascendente (tipo A na nomenclatura Stanford) implicam alto risco de complicações importantes que podem influenciar a
apresentação clínica, incluindo (1) comprometimento dos óstios aórticos das artérias coronárias, que resulta em IAM; (2) ruptura
da valva aórtica, causando insuficiência aórtica aguda; e (3) ruptura de hematoma no espaço pericárdico, ocasionando
tamponamento pericárdico.
O conhecimento da epidemiologia das síndromes aórticas agudas pode ser útil para lembrar esse grupo relativamente
incomum de distúrbios (com incidência anual estimada de 3 casos por 100 mil pessoas na população). As dissecções aórticas não
traumáticas são muito raras na ausência de hipertensão ou condições associadas à deterioração dos componentes elásticos ou
musculares da média aórtica, incluindo gravidez, doença aórtica bicúspide ou doenças hereditárias do tecido conectivo, como a
síndrome de Marfan e a de Ehlers-Danlos.
Embora os aneurismas aórticos sejam mais frequentemente assintomáticos, os aneurismas da aorta torácica podem
causar dor torácica e outros sintomas pela compressão de estruturas adjacentes. Essa dor tende a ser constante, profunda e
ocasionalmente intensa. A aortite, seja de etiologia infecciosa ou não, na ausência de dissecção aórtica, é uma causa rara de dor
torácica ou nas costas.
Condições pulmonares As condições pulmonares e vasculares pulmonares que causam dor torácica em geral o fazem
em conjunto com dispneia e costumam acarretar sintomas de natureza pleurítica.
EMBOLIA PULMONAR (VER TAMBÉM CAP. 273) Êmbolos pulmonares (com incidência anual de
aproximadamente 1 por 1.000) podem causar dispneia e dor torácica de início súbito. Tipicamente de padrão pleurítico, a dor
torácica associada à embolia pulmonar pode resultar de (1) envolvimento da superfície pleural do pulmão adjacente ao infarto
pulmonar resultante; (2) distensão da artéria pulmonar; ou (3), possivelmente, estresse da parede ventricular direita e/ou isquemia
subendocárdica relacionada com hipertensão pulmonar aguda. A dor associada a pequenos êmbolos pulmonares geralmente é lateral
e pleurítica, e acredita-se que esteja relacionada com o primeiro dos três mecanismos. Em contraste, a embolia pulmonar maciça
pode causar dor subesternal intensa, que pode simular um IAM e ser atribuída de maneira plausível ao segundo e ao terceiro desses
mecanismos potenciais. A embolia pulmonar maciça ou submaciça também pode estar associada a síncope, hipotensão e sinais de
insuficiência cardíaca direita. Outras características típicas que ajudam no reconhecimento de embolia pulmonar são discutidas
adiante neste capítulo (ver “Abordagem ao paciente”).
PNEUMOTÓRAX (VER TAMBÉM CAP. 289) O pneumotórax espontâneo primário é uma causa rara de dor
torácica, com incidência anual estimada nos Estados Unidos de 7 por 100 mil homens e < 2 por 100 mil mulheres. Os fatores de
risco incluem sexo masculino, tabagismo, antecedentes familiares e síndrome de Marfan. Os sintomas em geral têm início súbito e
a dispneia pode ser discreta, razões pelas quais a busca por atendimento médico às vezes é adiada. Pode ocorrer pneumotórax
espontâneo secundário em pacientes com distúrbios pulmonares subjacentes, como doença pulmonar obstrutiva crônica, asma ou
fibrose cística, e em geral causa sintomas mais graves. O pneumotórax hipertensivo é uma emergência clínica causada pelo
aprisionamento intratorácico de ar, que precipita colapso hemodinâmico.
Outras doenças do parênquima pulmonar, pleurais ou vasculares (Ver também Caps. 277, 278 e 288) A maioria
das doenças pulmonares que causam dor torácica, incluindo pneumonia e câncer, o faz devido ao envolvimento da pleura ou de
estruturas adjacentes. A pleurisia costuma ser descrita como uma dor semelhante à de uma facada, que é agravada à inspiração ou
tosse. Em contrapartida, a hipertensão pulmonar crônica pode manifestar-se por dor torácica que pode ser muito similar à angina
em suas características, sugerindo isquemia miocárdica ventricular direita em alguns casos. Doenças reativas das vias aéreas
também podem causar dor torácica em aperto associada à dificuldade respiratória, em vez de pleurisia.
CAUSAS NÃO CARDIOPULMONARES
Condições gastrintestinais (Ver também Cap. 314) Distúrbios gastrintestinais são as causas mais comuns de dor
torácica não traumática e em geral causam sintomas difíceis de se discernir das causas mais graves de dor torácica, incluindo
isquemia miocárdica. Distúrbios esofágicos, em particular, podem simular angina na característica e na localização da dor. O
refluxo gastresofágico e os distúrbios da motilidade esofágica são comuns e devem ser considerados no diagnóstico diferencial de
dor torácica (Fig. 11-1 e Tab. 11-1). O refluxo ácido frequentemente causa dor em queimação. A dor do espasmo esofágico, em
contraste, costuma ser intensa, compressiva, de localização retroesternal e, como a angina, pode ser aliviada por nitroglicerina ou
pelos antagonistas do canal de cálcio di-hidropiridínicos. A dor torácica também pode resultar de lesão ao esôfago, como uma
laceração de Mallory-Weiss ou mesmo uma ruptura esofágica (síndrome de Boerhaave), causada por vômitos intensos. A
localização mais comum da dor de úlcera péptica é epigástrica, mas pode irradiar-se para o tórax (Tab. 11-1).
Os distúrbios hepatobiliares, incluindo colecistite e cólica biliar, podem simular doenças cardiopulmonares agudas.
Embora a dor causada por esses distúrbios em geral se localize no quadrante superior direito do abdome, ela é variável, podendo
ser sentida no epigástrio e se irradiar para as costas e para a parte inferior do tórax. Às vezes, essa dor é sentida na escápula ou, em
raros casos, no ombro, sugerindo irritação diafragmática. A dor é constante, em geral dura várias horas e passa espontaneamente,
sem sintomas entre as crises. A dor que resulta de pancreatite é normalmente epigástrica intensa e se irradia para as costas.
Causas musculoesqueléticas e outras (Ver também Cap. 363) A dor torácica pode ser causada por qualquer
distúrbio musculoesquelético que envolva a parede torácica ou seus nervos, o pescoço ou os membros superiores. A costocondrite,
que causa sensibilidade das articulações costocondrais (síndrome de Tietze), é relativamente comum. A radiculite cervical pode
manifestar-se como uma dor intensa prolongada ou constante na parte superior do tórax e nos membros. A dor pode ser exacerbada
pela movimentação do pescoço. Ocasionalmente, a dor torácica pode ser causada por compressão do plexo braquial pelas costelas
cervicais, e a tendinite ou a bursite que envolve o ombro esquerdo pode simular a irradiação de angina. A dor na distribuição de
um dermátomo também pode ser causada por cãibra de músculos intercostais ou por herpes-zóster (Cap. 188).
Transtornos emocionais e psiquiátricos Até 10% dos pacientes que chegam à emergência com dor torácica aguda
têm um transtorno do pânico ou condição relacionada (Tab. 11-1). Os sintomas podem incluir aperto no tórax ou dor associada a
uma sensação de ansiedade e dificuldade respiratória. Os sintomas podem ser prolongados ou transitórios.
FONTE: Medicina Interna de Harrison - 2 Volumes.
DESCREVER OS MECANISMOS QUE LEVAM À FORMAÇÃO DO TROMBO (RELACIONAR COM ANTICONCEPÇÃO, PROCESSOS INFLAMATÓRIOS SISTÊMICOS, VARIZES,
TRAUMA, ETC).
TROMBOSE
Trombose é a solidificação do sangue no leito vascular ou no interior das câmaras cardíacas, em um indivíduo
vivo. Trombo, que é a massa sólida de sangue gerada pela coagulação sanguínea, pode formar-se em qualquer território do sistema
cardiovascular: cavidades cardíacas (na parede do órgão ou nas válvulas), artérias, veias e microcirculação.
Após a morte do indivíduo e por causa da parada da circulação sanguínea, o sangue forma coágulos. Coágulos, que
se formam após a morte pela parada do fluxo sanguíneo, são moldes completos da estrutura interna onde se originaram e geralmente
são contraídos, descolando-se facilmente da superfície interna dos vasos ou do coração quando manipulados (coágulos podem
formar-se também após hemorragias, como em hematomas). Trombos recentes e coágulos post-mortem podem ser muito
semelhantes, podendo ambos dissolver-se espontaneamente, dificultando sua identificação. De modo geral, trombos são friáveis e
aderentes à parede do vaso ou do coração; coágulos são elásticos, brilhantes e não aderentes.
A fluidez do sangue é indispensável para que o sistema circulatório possa realizar o transporte de oxigênio e nutrientes
para as células e recolher e transportar os catabólitos até a sua via de eliminação. A circulação dos cerca de 5 litros de sangue no
interior de tubos com pressão hidrostática positiva, que têm segmentos com paredes finas e passíveis de ruptura por traumatismos
mínimos, fez surgir um mecanismo de proteção, o sistema de coagulação sanguínea, que tem por finalidade tamponar eventuais
sítios de fuga do sangue do interior dos vasos.
Do ponto de vista evolutivo, mesmo antes de o sistema circulatório desenvolver-se nos organismos multicelulares, o
sistema de gelificação de fluidos já existia como forma de restringir a saída de líquido citoplasmático por ruptura limitada da
membrana celular e para impedir mecanicamente a invasão de microrganismos no citosol, funcionando, portanto, como mecanismo
inato de defesa. Tal resposta se dá também no sangue, no qual o fenômeno de coagulação atua como mecanismo efetuador da
resposta imunitária inata e contribui para limitar a invasividade de agentes infecciosos.
Apesar de muito eficiente na prevenção de perda sanguínea, a coagulação é uma ameaça ao organismo, pois a
solidificação do sangue pode dificultar ou mesmo impedir a circulação. Para evitar coagulação excessiva e potencialmente
lesiva, a natureza desenvolveu um sistema regulador da coagulação, representado por fatores anticoagulantes capazes de inibir
ou limitar todas as fases do processo (ver Figura 4.9) ou de dissolver trombos após sua formação (sistema fibrinolítico). O estado
de fluidez ideal do sangue resulta do equilíbrio entre coagulação e fatores anticoagulantes. Aumento da atividade coagulante ou
redução da atividade anticoagulante favorece a formação de trombos.

ETIOPATOGÊNESE
A formação de trombos envolve o processo de coagulação sanguínea e a atividade plaquetária, estando associada a 3
componentes (clássica tríade de Virchow): (1) lesão endotelial; (2) alteração do fluxo sanguíneo; (3) modificação na
coagulabilidade do sangue. Na maioria dos casos, dois ou os três fatores estão implicados na formação de trombos.
LESÃO ENDOTELIAL
Como descrito no Capítulo 4, o endotélio tem ações pró e anticoagulante. Agressões variadas ao endotélio (físicas,
químicas ou biológicas) podem torná-lo pró-coagulante por aumento na síntese de fatores da coagulação (fator VII) e de fatores
ativadores de plaquetas (TXA2 e ADP), por redução na sua capacidade anticoagulante (p. ex., diminuição na expressão de
antitrombina no glicocálice) ou por perda do revestimento contínuo dos vasos. Isso se dá por alterações estruturais ou funcionais
do endotélio.
Lesão estrutural do endotélio com solução de continuidade ocorre em traumatismos (p. ex., cateterismo), por
agressões químicas, em inflamações e em ateromas. Perda de células endoteliais expõe a membrana basal (conjuntivo
subendotelial), sobre a qual as plaquetas se aderem e são ativadas, iniciando a formação do trombo. Trata-se de processo em
tudo semelhante ao que ocorre na formação do tampão plaquetário, descrita anteriormente (ver Figura 9.13). Ao mesmo tempo, é
ativada a cascata da coagulação sanguínea.
A trombose sobre ateromas tem, em parte, esse mecanismo: a perda endotelial ocorre por aumento excessivo da
força de cisalhamento sobre a placa ou por desligamento do endotélio da matriz extracelular facilitado pela ação de metaloproteases
liberadas por macrófagos inflamatórios no interior da placa. A força de cisalhamento aumentada já é por si só fator que favorece
muito a deposição de plaquetas sobre ateromas. Lesão endotelial é também o fator primário de trombose na parede ventricular em
infartos subendocárdicos, em áreas de endocardite de qualquer natureza, em arterites, em flebites e na coagulação intravascular
disseminada (nesta ocorre reação inflamatória sistêmica).
Nem sempre é necessária a perda de células endoteliais para se formarem trombos. Alterações funcionais, mesmo
sem destruição endotelial, são capazes de modificar o balanço entre fatores pró e anticoagulantes, favorecendo a trombose.
Hipóxia de qualquer origem, por exemplo, agride o endotélio e o torna pró-coagulante. Disfunção endotelial ocorre em várias
condições, como hipertensão arterial, diabetes melito, hipercolesterolemia, tabagismo, ateromas, entre outras.
ALTERAÇÃO NO FLUXO SANGUÍNEO
Modificações na velocidade do sangue (aumento ou redução) e turbulência no fluxo sanguíneo são fatores importantes
na gênese de trombos. Retorno venoso diminuído, com estase sanguínea, pode dever-se a fatores sistêmicos (insuficiência cardíaca,
imobilidade no leito, uma vez que a contração muscular favorece o retorno venoso) ou locais (compressão de vasos); trombose
venosa profunda nos membros inferiores é frequente em pacientes acamados, principalmente após cirurgias.
Quando há turbulência ou se há modificação na velocidade do fluxo sanguíneo, o endotélio torna-se ativado e
desaparece o fluxo laminar, situação em que plaquetas e outras células passam a circular próximas do endotélio; turbulência
também lesa diretamente o endotélio.
Além de agredir o endotélio, estase sanguínea dificulta a remoção de fatores pró-coagulantes e reduz a chegada de
fatores anticoagulantes.
Exemplos dessas situações são aneurismas e corações com dilatação de câmaras cardíacas, arritmias cardíacas
(especialmente atriais), insuficiência ou estenose valvar ou anomalias congênitas. Com átrios dilatados e fibrilação atrial, há
redução do fluxo (estase) pronunciada nas aurículas, local onde os trombos se formam preferencialmente. Nesses casos, além da
estase sanguínea, que produz hipóxia (lesão endotelial), a formação de trombos é favorecida também por alteração no fluxo, que
promove ativação plaquetária. Trombos auriculares crescem nos episódios de arritmia e representam risco constante de
tromboembolismo devido ao fato de a atividade contrátil do coração favorecer sua fragmentação ou desprendimento. Em
aneurismas arteriais, além das alterações reológicas da circulação que alteram o fluxo do sangue e favorecem a ativação plaquetária,
as alterações primárias na íntima que contribuíram para a formação do aneurisma também participam na gênese do trombo.
A Figura 9.14 mostra a formação de um trombo em aneurisma sacular.
A regurgitação de sangue que ocorre na insuficiência valvar e em comunicações anômalas no coração produz um jato
de sangue em direção ao endocárdio das câmaras de menor pressão. O impacto do sangue tem dois efeitos mecânicos: sobre o
endotélio, é capaz de causar desnudamento da íntima; sobre as plaquetas, inicia a sua ativação.
AUMENTO DA COAGULABILIDADE DO SANGUE
Aumento da coagulabilidade sanguínea, por defeitos genéticos ou por condições adquiridas, resulta de:
(1) aumento do número de plaquetas;
(2) maior disponibilidade de fatores pró-coagulantes;
(3) redução de inibidores da coagulação.
Aumento do número de plaquetas e da síntese de fatores da coagulação, especialmente fibrinogênio, acompanha
inflamações localizadas ou generalizadas (citocinas variadas estimulam o endotélio e o tornam pró-coagulante) e a resposta
sistêmica ao parto, como um componente de defesa para facilitar a hemostasia. Aumento da coagulabilidade sanguínea e redução
na velocidade circulatória nessas duas situações favorecem a formação de trombos venosos (trombose em pacientes imobilizados
no leito e trombose venosa periparto). Após traumatismos, queimaduras, cirurgias extensas e outras agressões teciduais, há
liberação de tromboplastina, que ativa a via extrínseca da coagulação.
Outras situações também acompanham-se de aumento da coagulação sanguínea:
(a) em indivíduos com certos tipos de câncer, encontram-se hipercoagulabilidade sanguínea e maior tendência à
formação de trombos em vários locais (síndrome de Trousseau);
(b) anticoncepcionais orais associam-se a maior risco de trombose, assim como gravidez e período pós-parto;
(c) síndrome de anticorpos antifosfolipídeos deve-se à formação de autoanticorpos contra componentes lipídicos (p.
ex., cardiolipina), os quais podem agredir células endoteliais ou ativar plaquetas. Na maioria desses casos, os pacientes têm alguma
doença autoimune (p. ex., lúpus eritematoso); em outros, não há doença associada;
(d) condição curiosa e aparentemente paradoxal em que há maior risco de trombose é a síndrome trombocitopênica
induzida por heparina, que surge em pequena porcentagem de pacientes em tratamento com heparina (anticoagulante). Parece que
o distúrbio resulta da formação de anticorpos que reagem com complexos de heparina e fator plaquetário 4 na superfície de
plaquetas e células endoteliais, causando ativação, agregação e consumo de plaquetas e lesão endotelial.
Redução de fatores inibidores da coagulação pode ocorrer por: (1) perda urinária (antitrombina III), como ocorre
na síndrome nefrótica; (2) por síntese anormal, por defeitos genéticos. Algumas mutações afetam genes que codificam moléculas
reguladoras da coagulação. Pessoas com mutação pontual no fator V da coagulação (fator V Leiden, em referência à cidade da
Holanda em que o defeito foi descrito) têm risco aumentado de trombose venosa, provavelmente porque o fator V mutado torna-se
resistente à inativação pela proteína C. Mutação pontual no gene da protrombina também confere maior risco de trombose. Na
deficiência genética do ativador do plasminogênio, há tendência a formação de trombos venosos sem causa aparente, em pessoas
na primeira ou na segunda décadas da vida.
É frequente que os três mecanismos da tríade estejam presentes na patogênese da trombose. Um bom exemplo é a
trombose venosa profunda nos membros inferiores (Figura 9.15) que se forma, sobretudo, em pacientes imobilizados no leito,
mais frequentemente após cirurgias ortopédicas ou traumatismo com imobilização. Nesses casos, ocorrem:
(1) diminuição da velocidade do fluxo sanguíneo nas veias por falta dos movimentos musculares importantes no
retorno venoso;
(2) lesão endotelial por hipóxia, devido à redução do fluxo sanguíneo;
(3) alteração na coagulabilidade do sangue decorrente da reação de fase aguda após agressões, em que há aumento na
produção de fibrinogênio no fígado e de plaquetas na medula óssea.
EVOLUÇÃO | CONSEQUÊNCIAS
O crescimento progressivo do trombo pode obstruir total ou parcialmente a luz do vaso ou das câmaras cardíacas
(trombos oclusivos e semioclusivos), com prejuízo no fluxo sanguíneo. Uma vez iniciado, o trombo pode crescer e, após tempo
variável, sofrer dissolução ou organização. Trombos recentes muitas vezes sofrem dissolução (trombólise) espontânea pelo sistema
fibrinolítico.
Trombólise terapêutica é empregada para dissolver trombos recentes com a utilização de ativadores do
plasminogênio (estreptocinase ou ativador tecidual do plasminogênio recombinante, rt-PA) introduzidos na circulação ou
diretamente no vaso trombosado. Aspiração via cateter pode auxiliar o processo de remoção por fibrinólise.
Se não são dissolvidos, os trombos sofrem organização (conjuntivização) ou calcificação. A organização faz-se por
meio de reação inflamatória em que os fagócitos englobam as células do coágulo e digerem a fibrina, ao mesmo tempo em que
liberam fatores de crescimento e quimiocinas que atraem e ativam células que originam o tecido de granulação, que acaba
incorporando o trombo à parede dos vasos ou do coração (conjuntivização do trombo).
Nos trombos oclusivos, no local conjuntivizado pode haver proliferação endotelial que origina canais que permitem
o fluxo de sangue através do trombo, restabelecendo parcialmente a circulação. É o que se denomina recanalização do trombo, a
qual pode restabelecer em parte a circulação no território comprometido. Calcificação distrófica em trombos forma concreções
(flebólitos), mais comumente nas veias dos membros inferiores, podendo ser visíveis em exames de radiografia simples. As Figuras
9.19 e 9.20 mostram a evolução de um trombo.

Os trombos podem também sofrer colonização bacteriana ou fúngica e causar, nos vasos e no coração, diversas lesões,
como endocardite valvar ou mural, tromboflebite e endarterite, as duas últimas favorecidas pelo uso de cateteres intravasculares de
demora (Figura 9.21). Quando se fragmentam, tais trombos originam êmbolos sépticos.
A consequência principal dos trombos é obstrução do vaso no local de sua formação ou a distância, esta quando o
trombo se desprende ou se fragmenta e forma êmbolos. Obstrução arterial leva a isquemia; obstrução venosa reduz a drenagem
sanguínea, provocando hiperemia passiva (congestão) e edema.
FONTE: Bogliolo - Patologia - 9ª Edição.
FATORES DE RISCO PARA TROMBOSE

ANTICONCEPCIONAIS
Os principais fatores de risco envolvidos ressaltam a origem da formação do trombo e são representados pela estase
sanguínea, lesão endotelial e hipercoagulabilidade. O estrogênio, utilizado em formulações contraceptivas ou em terapia de
reposição hormonal, bem como na gravidez, está ligado à hipercoagulabilidade sanguínea e, dessa forma, é considerado fator de
risco para a TVP.
O etinilestradiol (EE) induz alterações no sistema de coagulação, tendo como resultado final aumento na formação
de trombina. Os efeitos dos progestagênios sobre os fatores da coagulação são discutíveis, acredita-se que exerçam discreta atuação
em conjunto com o etinilestradiol, demonstrando pequenas diferenças de intensidade sobre o sistema de coagulação das diferentes
combinações contidas nos Contraceptivos Orais Combinados (COCs).
Os COCs promovem aumento dos fatores de coagulação (fibrinogênio, protrombina, VII, VIII, IX, X, XII e XIII) e
redução dos inibidores naturais da coagulação (Proteína S e antitrombina), produzindo efeito pró-coagulante leve. No sistema
fibrinolítico, aumenta a atividade fibrinolítica, sem, contudo, influenciar no risco de TEV.
FONTE: Tromboembolismo Venoso e Contraceptivos Hormonais Combinados – FEBRASGO (2016)
TABAGISMO
Alguns mecanismos propostos para elucidar os efeitos deletérios do tabagismo envolvem o desenvolvimento da
formação de ateromas: mudanças desfavoráveis no perfil lipídico, aumento da viscosidade sanguínea, alteração nas funções
plaquetárias e atividade adrenérgica aumentada promovem aumento na prevalência de trombose em fumantes.
Ou seja, o tabagismo promove um estado de hipercoagubilidade, marcado por disfunção endotelial, maior
oxidação do LDL, redução do HDL, aumento nos níveis das moléculas de adesão e fibrinogênio, aumento da agregação plaquetária
e aumento na prevalência de espasmo vascular.
FONTE: Efeitos do Tabagismo sobre o sistema cardiovascular: hemodinâmica e propriedades elásticas arteriais
TRAUMATISMOS
Após traumatismos, queimaduras, cirurgias extensas e outras agressões teciduais, há liberação de tromboplastina,
que ativa a via extrínseca da coagulação.
FONTE: Bogliolo - Patologia - 10ª Edição.
COVID-19
A pandemia provocada pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2) é o evento mais severo de saúde pública das últimas
décadas. Desde o início, o número de eventos trombóticos de diversas naturezas tem chamado a atenção de médicos e pesquisadores,
evocando a necessidade de sua compreensão para que os desfechos clínicos mais sombrios sejam evitados.
Ackermann et al. demonstraram que infecção pulmonar pelo SARS-CoV-2 está associada a microtrombose, endotelite
e angiogênese intussusceptiva, em uma intensidade não observada em outras infecções virais ou pneumonias intersticiais de
semelhante gravidade. O endotélio vascular em condições fisiológicas dispõe de diversos mecanismos inibidores de eventos
trombóticos. De forma oposta, estímulos patológicos em nível celular ou molecular estimulam uma resposta trombogênica
endotelial, como o aumento da expressão do FT e do PAI-1, ativação plaquetária, liberação de citocinas inflamatórias e redução
de expressão de anticoagulantes endógenos, como a trombomodulina.
Essas citocinas inflamatórias também são maciçamente liberadas por macrófagos alveolares, células epiteliais e
polimorfonucleares pela resposta imunológica tardia e exacerbada mediada por interferons. Realimentando o círculo vicioso da
inflamação e trombose, as citocinas são fatores quimiotáticos para leucócitos, ativam a coagulação pela via do fator tissular, inibem
a fibrinólise ao elevar a expressão do PAI-1 e inibem vias anticoagulantes endógenas, como a antitrombina, a proteína C e seu
cofator, a proteína S.
O sistema complemento é um dos elementos da resposta imune na infecção pelo SARS-CoV-2 e também está
associado aos processos trombóticos observados. Magro et al. observaram intensa atividade do sistema complemento em pacientes
críticos positivos para SARS-CoV-2, com deposição de frações C5b-9 e C4d na microvasculatura, associadas à microtrombose
com deposição de fibrina e lesão endotelial.

FONTE: Fisiopatologia da trombose associada à infecção pelo SARS-CoV-2 - J Vasc Bras. 2020
DESCREVER OS MECANISMOS QUE LEVAM À EMBOLIZAÇÃO E O TRAJETO A SER PERCORRIDO PARA O TROMBO ALOJAR NOS PULMÕES.
EMBOLOS
Quando trombos venosos profundos se desprendem do seu local de formação, eles embolizam para a veia cava, o
átrio direito e o ventrículo direito (VD) e se alojam na circulação pulmonar, causando, assim, a EP aguda. Paradoxalmente, esses
trombos às vezes embolizam para a circulação arterial através de um forame oval patente ou de um defeito do septo atrial. Muitos
pacientes com EP não apresentam evidências de TVP porque o trombo já embolizou para os pulmões.
FONTE: Medicina Interna de Harrison - 2 Volumes
EMBOLIA PULMONAR
A obstrução de uma artéria pulmonar por um coágulo sanguíneo (êmbolo) é uma causa comum de morbidade (doença)
e mortalidade. A formação de um êmbolo em uma artéria pulmonar ocorre quando um coágulo sanguíneo, glóbulo de gordura ou
bolha de ar proveniente de uma veia da perna, após uma fratura exposta, por exemplo, é levado pelo sangue até os pulmões. O
êmbolo atravessa o lado direito do coração até o pulmão através de uma artéria pulmonar. Pode obstruir uma artéria pulmonar
– embolia pulmonar (EP) – ou um de seus ramos. As artérias pulmonares recebem todo o sangue que retornou ao coração direito
pelo sistema venoso cava. Consequentemente, o resultado imediato da EP é a obstrução parcial ou completa do fluxo sanguíneo
para o pulmão. Na obstrução, há ventilação de um pulmão ou setor pulmonar, sem, entretanto, haver perfusão sanguínea.
Quando um grande êmbolo oclui uma artéria pulmonar, o paciente sofre angústia respiratória aguda decorrente da
grande diminuição da oxigenação sanguínea ocasionada pelo bloqueio do fluxo sanguíneo através do pulmão. Inversamente, pode
haver dilatação aguda do lado direito do coração porque o sangue que chega do circuito sistêmico não pode seguir pelo circuito
pulmonar (cor pulmonale agudo). Nos dois casos, pode haver morte em alguns minutos. Um êmbolo médio pode obstruir uma
artéria que irriga um segmento broncopulmonar, causando um infarto pulmonar, uma área de necrose do tecido pulmonar.
Muitas vezes, as pessoas fisicamente ativas têm circulação colateral – aporte sanguíneo acessório indireto – que se
desenvolve ainda mais em caso de EP, de modo que o infarto não é provável, ou pelo menos não é tão devastador. Há muitas
anastomoses com ramos das artérias bronquiais na região dos bronquíolos terminais. Nas pessoas com comprometimento da
circulação pulmonar, como na congestão crônica, a EP costuma causar infarto pulmonar. Quando uma área de pleura visceral
também é privada de sangue, sofre inflamação (pleurite) e irritação ou fusão à pleura parietal sensível, resultando em dor. A dor na
pleura parietal é referida na distribuição cutânea dos nervos intercostais na parede torácica, ou, no caso dos nervos inferiores, na
parede anterior do abdome.
OBS: HEMOPTISE
A expectoração de sangue ou escarro tingido de sangue proveniente dos pulmões ou da árvore traqueobronquial é
causada por hemorragia brônquica ou pulmonar. Em cerca de 95% dos casos, a hemorragia provém de ramos das artérias
bronquiais. As causas mais comuns são bronquite (inflamação dos brônquios), câncer de
pulmão, pneumonia, bronquiectasia, embolia pulmonar e tuberculose.
FONTE: Anatomia Orientada para Clínica – Moore – 8ª Edição.
Quase todas as embolias pulmonares resultam de trombos que surgem a partir de trombose venosa profunda (TVP)
nos membros inferiores ou superiores. Trombose nas veias profundas das pernas ou da pélvis muitas vezes é insuspeita até que
ocorra uma embolia. Os efeitos da embolia na circulação pulmonar estão relacionados com a obstrução mecânica da circulação
pulmonar e os reflexos neuro-humorais que causam vasoconstrição. A obstrução do fluxo sanguíneo pulmonar provoca
broncoconstrição reflexa na área afetada do pulmão, perda de ventilação, comprometimento das trocas gasosas e perda de
surfactante alveolar. Podem se desenvolver hipertensão pulmonar e insuficiência cardíaca direita quando sucede vasoconstrição
maciça por causa de um grande êmbolo. Embora possam ser observadas pequenas áreas de infarto, é incomum um infarto pulmonar
total.
FONTE: Porth – Fisiopatologia – 10ª Edição.
Em pelo menos 90% dos pacientes, a EP se origina da TVP nos membros inferiores, e até 70% dos pacientes com EP
comprovada ainda apresentam a TVP demonstrável. Os trombos geralmente iniciam nas veias da perna. Em seguida, cerca de 20%
desses trombos nas veias da perna se estendem às veias poplíteas e mais proximais da coxa, a partir das quais a embolia é mais
provável. Embora frequentemente seja assintomática, a EP pode ser detectada em cerca de 50% dos pacientes com TVP proximal.
A TVP da extremidade superior, envolvendo as veias axilares ou subclávias, também pode provocar a EP, mas apenas
10 a 15% desses pacientes desenvolvem a EP. Com frequência, a TVP da extremidade superior ocorre nos pacientes com câncer,
particularmente naqueles com cateteres intravenosos. A TVP não provocada na extremidade superior, que geralmente envolve o
braço dominante, pode ocorrer em um esforço extremado – a chamada síndrome de Paget-Schroetter.
A EP geralmente envolve os dois pulmões, e os lobos inferiores são afetados com mais frequência que os superiores.
Os êmbolos maiores tendem a se alojar na artéria pulmonar principal ou suas ramificações, enquanto os menores ocluem as artérias
mais periféricas. A EP periférica pode levar ao infarto pulmonar, que é caracterizado pela hemorragia intra-alveolar e à necrose
possivelmente baseada na pleura. Uma vez que a circulação para os pulmões se origina nas artérias bronquiais e também nas
pulmonares, o infarto pulmonar ocorre em apenas cerca de 10% dos pacientes sem doença cardiopulmonar subjacente. Por outro
lado, o infarto pulmonar ocorre em até 30% dos pacientes que têm a oxigenação comprometida das áreas afetadas do pulmão,
devido a distúrbios preexistentes como doença das vias aéreas ou aumento da pressão venosa pulmonar por causa de uma disfunção
ventricular esquerda.
FONTE: Goldman-Cecil – Medicina – 26ª Edição.

Mais de 95% dos tromboêmbolos pulmonares se originam de trombos nas veias profundas da extremidade inferior: as
veias poplíteas, femorais e ilíacas.
Trombose venosa abaixo das veias poplíteas, ou ocorrendo nas veias superficiais da perna, é clinicamente comum,
mas não é um fator de risco para tromboembolismo pulmonar, porque trombos nessas localizações raramente migram para a
circulação pulmonar sem antes se estender acima do joelho. Como menos de 20% dos trombos na panturrilha se estenderão para as
veias poplíteas, trombos isolados na panturrilha podem ser observados com testes seriados para excluir extensão ao sistema
profundo, e não precisam de anticoagulação, necessariamente.
Tromboses venosas ocorrem ocasionalmente nas extremidades superiores ou no lado direito do coração; isso acontece
mais comumente na presença de cateteres intravenosos ou fios de marca-passo cardíaco, e pode ter importância clínica crescente à
medida que aumenta o uso prolongado de cateteres intravenosos.
FONTE: Fisiopatologia Da Doença – Hammer.
DEFINIR TEP E CITAR SUA EPIDEMIOLOGIA.
TROMBOEMBOLISMO PULMONAR (TEP)
Embolia Pulmonar (EP) é a obstrução de vasos da circulação arterial pulmonar causada pela impactação de
partículas – formadas por qualquer material insolúvel (sólido, líquido ou gasoso) – cujo diâmetro seja maior que o do vaso
acometido.
Na prática médica, a maioria dos casos é devido ao Tromboembolismo Venoso (TEV), uma entidade que tem como
base a Trombose Venosa Profunda (TVP), e como complicação aguda o Tromboembolismo Pulmonar (TEP). As outras causas
menos comuns de EP são: bolhas de gás (descuido na manipulação de equipos, descompressão súbita em mergulhadores), corpos
estranhos (ex.: talco, em usuários de drogas ilícitas), gotículas de gordura (politraumatizados), líquido amniótico, células
neoplásicas e êmbolos sépticos (ex.: endocardite tricúspide).
A circulação pulmonar é um verdadeiro “filtro”, pois todo o sangue do corpo passa por ela (exceto se houver um
shunt intracardíaco com fluxo da direita para a esquerda). Essa malha vascular impede que êmbolos oriundos do sistema venoso
atinjam a circulação sistêmica. Assim, provavelmente a EP é muito mais comum do que se imagina, passando muitas vezes
despercebida. Na verdade, seu espectro de manifestações clínicas é extremamente variável, na dependência da magnitude da “carga
embólica” e da função cardiorrespiratória basal do indivíduo. Vai desde a completa ausência de sintomas até a morte súbita,
passando por quadros clínicos diversos.
O TEP já foi chamado de “O Grande Mascarado”, por ser capaz de simular uma série de diagnósticos, iludindo até
mesmo os médicos mais experientes. Você precisa entender que não temos como confirmar sua existência – e, principalmente,
excluí-la – apenas com dados clínicos básicos (anamnese + achados físicos): certos exames complementares são obrigatórios
nas situações de risco onde há suspeita clínica.
Também devemos evitar o atraso terapêutico, pois a cada minuto que se passa existe a chance de um novo episódio
embólico, cuja recorrência costuma ser fatal. O tratamento adequado comprovadamente reduz a taxa de mortalidade (de 30% para
2-8%).
OBS: Com certeza você já viu essa cena. Paciente com doença cardíaca e/ou pulmonar grave (ex.: ICC ou DPOC),
restrito ao leito, em pós-operatório, apresenta algum dos seguintes sinais e sintomas (especialmente de maneira súbita): dispneia,
taquipneia, estertores, sibilos, hipoxemia, dor torácica, hemoptise, taquicardia, hipotensão, turgência jugular, síncope. Nossa
tendência natural é tentar “encaixar” as queixas na doença de base, o que na verdade não está errado. Entretanto, é obrigatório
“termos fé” no risco de TEV (a situação descrita acima é de altíssimo risco). O tromboembolismo pulmonar poderia justificar
qualquer uma dessas queixas (que dirá combinações delas), se ocorresse de maneira isolada ou mesmo em paralelo a uma
descompensação primária da doença de base. Pode ser TEP? Existe risco significativo? Então investigue; e sempre que possível
comece a tratar logo.
OBS: QUANDO PENSAR EM TEP?
Em todo paciente com FATORES DE RISCO que apresente qualquer ALTERAÇÃO
CARDIORRESPIRATÓRIA AGUDA. Escores validados (que estimem a probabilidade pré-teste) são úteis para tornar a suspeita
clínica mais objetiva. Quando a probabilidade for alta devemos “perseguir incansavelmente” o diagnóstico de todas as maneiras
possíveis, oferecendo tratamento ao paciente até que o TEP seja excluído ou confirmado, mesmo na presença de outras doenças
que possam contribuir para os sintomas.
Mas a dificuldade em fazer o diagnóstico é só uma parte do problema. Atualmente, o TEV também é considerado um
desafio para a saúde pública! Apesar de existirem medidas profiláticas eficazes, estas ainda são inaceitavelmente subutilizadas,
tanto em serviços clínicos quanto cirúrgicos, pois muitos médicos não sabem quando e como elas devem ser empregadas. Um
elevado número de óbitos que poderiam ser evitados continua ocorrendo.
EPIDEMIOLOGIA
O Tromboembolismo Venoso (TVP/TEP) é a 3° doença cardiovascular mais comum – perdendo apenas para a doença
coronariana e a doença cerebrovascular. A TVP é 3 vezes mais frequente que o TEP e, ainda assim, ele é a principal complicação
pulmonar aguda em pacientes hospitalizados. Mesmo predominando em pacientes terminais (ex.: câncer avançado), uma parcela
significativa acomete doentes com bom prognóstico, cujo TEP (e o óbito) poderiam ser evitados. Todavia, os dados mais
impressionantes nem são esses.
Já faz tempo que repetidas séries de necrópsia vêm alertando quanto à necessidade de melhorar a detecção do TEP.
Um estudo revelou que, de todos os casos onde o TEP foi a causa mortis, confirmada por necrópsia, cerca de 2/3 não receberam
o diagnóstico in vivo (e muitos sequer foram suspeitados para essa condição). Por outro lado, 2/3 dos casos com suspeita
diagnóstica de TEP in vivo não apresentavam TEP na necropsia.
Tal fato ilustra nitidamente a baixa sensibilidade e especificidade do diagnóstico clínico. Veremos adiante que os
exames complementares mais modernos conseguem amenizar essa dificuldade, aumentando a acurácia do diagnóstico. O grande
problema, porém, é saber exatamente em que situações devemos pedi-los. Portanto, vamos analisar a base racional dos algoritmos
de investigação do TEP, para que você tenha mais firmeza na tomada de decisões clínicas.
FONTE: Apostila de Pneumologia – MEDCURSO.
DEFINIÇÕES
O tromboembolismo venoso (TEV) inclui trombose venosa profunda (TVP) e embolia pulmonar. A TVP geralmente
envolve as veias profundas das pernas ou braços, mas pode ocorrer em outros locais. A oclusão das veias profundas em um membro
por trombo prejudica a drenagem de sangue, causando dor e edema distal à obstrução. A embolia pulmonar refere-se à obstrução
de uma artéria pulmonar por trombo que se deslocou de outras partes do corpo, através da corrente sanguínea e para os pulmões.
TVP nas pernas, ou menos comumente, nos braços, é sem dúvida a principal fonte de embolia pulmonar.
As complicações crônicas da TVP e da embolia pulmonar incluem síndrome pós-trombótica e hipertensão arterial
pulmonar (HAP) tromboembólica crônica, respectivamente. A síndrome pós-trombótica, que ocorre em até 40% dos pacientes com
TVP extensa, é caracterizada por edema dependente e desconforto no membro acometido e, em casos graves, pode levar a úlceras
venosas. A síndrome é causada por hipertensão venosa como resultado de obstrução venosa por trombo residual e refluxo de sangue
decorrente de válvulas venosas incompetentes. A hipertensão pulmonar tromboembólica crônica, que complica até 4% dos casos
de embolia pulmonar, ocorre quando os êmbolos nas principais artérias pulmonares não desaparecem e são substituídos por tecido
fibroso que se incorpora às paredes dos vasos, estreitando-os ou obstruindo-os. A obstrução do leito vascular pulmonar aumenta a
resistência arterial pulmonar e pode levar à insuficiência cardíaca direita.
A trombose também pode ocorrer em veias superficiais. Embora benigna e autolimitada quando as veias da mão ou
da fossa antecubital estão envolvidas como uma complicação da coleta de sangue, cateteres intravenosos ou administração de
substâncias psicoativas, a trombose venosa superficial nos membros inferiores pode estender-se para as veias profundas, levando
assim a TVP e embolia pulmonar.
EPIDEMIOLOGIA
Um primeiro episódio de TEV ocorre em cerca de 1 a 2 pessoas por 1.000 a cada ano nos EUA. A incidência aumenta
com a idade, com 5 a 10 casos por 1.000 pessoas por ano aos 80 anos. Embora homens e mulheres sejam acometidos igualmente,
a incidência é maior em brancos e afro-americanos do que em hispânicos e em habitantes das ilhas do Pacífico Asiático.1 A
prevalência de TEV é de aproximadamente 17% nos pacientes hospitalizados com infecção pelo SARS-CoV-2 (Capítulo 342). A0,
1b
Aproximadamente um terço dos pacientes com TEV sintomático apresentam embolia pulmonar, enquanto o restante
apresenta TVP.2 Estima-se que a embolia pulmonar seja responsável por 15% das mortes em pacientes hospitalizados e por cerca
de 150.000 mortes a cada ano nos EUA. Como resultado, a TEV é a terceira causa mais comum de morte vascular após infarto do
miocárdio e acidente vascular encefálico (AVE).
A TVP geralmente começa nas veias da panturrilha. Em pacientes com sinais/sintomas sugestivos de TVP, o
diagnóstico é confirmado em até 25%. A TVP é restrita à panturrilha em cerca de 15% desses pacientes. A maioria dos casos de
TVP restrita à panturrilha desaparece espontaneamente, mas em cerca de 20% desses pacientes, o trombo estende-se para as veias
proximais, geralmente em 1 semana após o início dos sintomas. Após o trombo estender-se para as veias proximais da perna, eles
podem deslocar-se e causar embolia pulmonar.
FONTE: Goldman, Lee, e Andrew I. Schafer. Goldman-Cecil Medicina.
EPIDEMIOLOGIA
O tromboembolismo venoso (TEV) engloba a trombose venosa profunda (TVP) e a embolia pulmonar (EP) e causa
morte cardiovascular e incapacidade, bem como doença psicológica e estresse emocional. Nos Estados Unidos, o Surgeon General
(equivalente ao Ministério da Saúde) estima que ocorram 100 mil 180 mil mortes anualmente causadas por EP, e declarou que essa
é a causa de morte passível de prevenção mais comum nos pacientes hospitalizados. Em um estudo canadense, quase metade dos
pacientes com EP teve limitação aos exercícios, redução da distância caminhada ou dispneia durante 1 ano, o que piorou a sua
qualidade de vida. Os sobreviventes podem sofrer complicações produzidas pela hipertensão pulmonar tromboembólica crônica ou
síndrome pós-trombótica. A hipertensão pulmonar tromboembólica crônica causa dispneia, especialmente aos esforços. A síndrome
pós-trombótica (também conhecida como insuficiência venosa crônica) causa lesão das válvulas venosas do membro inferior e
piora a qualidade de vida por causar edema de tornozelo ou de panturrilha e dolorimento na perna, principalmente após ficar longo
tempo de pé. Na sua forma mais grave, a síndrome pós-trombótica causa úlcera varicosa.
FONTE: Jameson, J., L. et al. Medicina interna de Harrison
DEFINIÇÃO
Doença pulmonar aguda decorrente da obstrução de vasos da circulação arterial pulmonar causada pela impactação de
partículas cujo diâmetro é maior que o do vaso acometido. A maioria dos casos é precedida por uma trombose venosa profunda dos
membros inferiores. Mais raramente, a embolia é causada por ar, líquido amniótico, substâncias injetadas, êmbo-los sépticos ou
tumores. Em alguns casos, a embolia pulmonar (EP) é causada por uma carga embólica tão grande que ponto dificultar a ejeção de
sangue a partir do VD, resultando na redução do débito car-díaco e, logo, no colapso circulatório agudo – o que é chamado de
embolia maciça. De modo geral, a EP é considerada um evento grave e potencialmente fatal, frequente em pacientes acamados e/ou
hospitaliza-dos – sobretudo idosos e pacientes que apresentam algum dos fatores de risco para sua ocorrência.
FATORES DE RISCO
A tendência a trombose ou estado de hipercoagula-bilidade pode ser decorrente de uma situação ad-quirida ou
hereditária (Quadro 29-1).

FONTE: Weiss, Marcelo B. Urgências e Emergências Médicas: Incluindo a COVID-19.


RELACIONAR A FISIOPATOLOGIA DO TEP COM O QUADRO CLÍNICO (SINAIS E SINTOMAS - DOR TORÁCICA, DISPNEIA, HEMOPTISE).
FISIOPATOLOGIA
A embolia ocorre quando uma parte do trombo – ou ele todo – se desloca do seu local de origem (geralmente a
face interna de uma valva venosa), indo parar na circulação pulmonar.
Os grandes trombos que se impactam na bifurcação do tronco da artéria pulmonar são chamados de trombos “em
sela” ou “a cavaleiro”. Estudos de necrópsia mostraram que na maioria das vezes a embolização pulmonar é múltipla, encontrando-
se êmbolos com várias idades, muitos dos quais provavelmente passaram despercebidos antes do evento fatal. Os lobos inferiores
costumam ser os mais afetados.
QUAIS SÃO AS CONSEQUÊNCIAS PULMONARES DA EMBOLIA?
A súbita instalação de oligoemia (diminuição do calibre e do número de vasos pulmonares em regiões específicas ou
difusamente) no parênquima pulmonar dá origem a regiões bem ventiladas e mal perfundidas, aumentando-se o chamado espaço
morto fisiológico.
Ao mesmo tempo, áreas do parênquima distantes do território hipoperfundido começam a sofrer atelectasia, devido a
uma importante queda na produção de surfactante. Mas como isso é possível? Bem. A isquemia dos ácinos alveolares libera uma
série de mediadores inflamatórios (ex.: serotonina e tromboxano) os quais atuarão nas proximidades do segmento afetado, inibindo
os pneumócitos tipo II no tecido pulmonar saudável. Além disso, esses mesmos mediadores são capazes de induzir broncoespasmo
difuso, piorando a ventilação como um todo.
Assim, a principal consequência respiratória da embolia é a hipoxemia, devido a um importante desequilíbrio na
relação ventilação-perfusão (distúrbio V/Q). As áreas de pulmão bem perfundido não estão livres dos efeitos do TEP: pelo contrário,
elas desenvolvem atelectasia e broncoespasmo, e se tornam HIPOVENTILADAS. Eram justamente elas que haviam “sobrado”
após a obstrução de parte da rede arterial pulmonar, e é nelas que acaba ocorrendo o fenômeno do shunt direita-esquerda
intrapulmonar, isto é, o sangue desoxigenado atravessa o pulmão sem receber oxigênio.
Outra consequência extremamente comum da embolia pulmonar é a taquidispneia, resultante da estimulação dos
receptores J alveolares pelos mediadores inflamatórios liberados, o que desencadeia hiperventilação reflexa (levando à alcalose
respiratória), além de uma terrível sensação subjetiva de “falta de ar”. Muitos pensam que a hipoxemia é a responsável por esses
achados, mas como dissemos isso não é verdade.
Quais são as consequências cardiocirculatórias da embolia? A principal alteração é o aumento da resistência
vascular do pulmão, que se manifesta como hipertensão pulmonar aguda. O ventrículo direito é uma câmara acostumada a
trabalhar com baixas pressões, e não tolera aumentos súbitos e intensos em sua pós-carga. Só pra você ter ideia, a pressão arterial
pulmonar já está bastante elevada com 25 a 30% de obstrução do leito vascular. Quando 75% do leito pulmonar for agudamente
obstruído, a pressão necessária para manter o débito de VD gira em torno de 50 mmHg, o que é simplesmente impossível de ser
alcançado, de maneira súbita, pelo VD saudável.
Como a resistência arterial pulmonar aumenta? O primeiro mecanismo é óbvio, a obstrução mecânica promovida
pelos êmbolos impactados! Já o segundo talvez não seja tão evidente: vasoespasmo, secundário à liberação de mediadores
inflamatórios (os mesmos da atelectasia e do broncoespasmo). Por fim, quando o paciente desenvolve hipoxemia importante, a
própria PaO2 baixa exerce efeito vasoconstrictor, levando a um ciclo vicioso de hipoxemia e piora do vasoespasmo.
O VD se dilata perante aumentos em sua pós-carga, na tentativa de manter seu débito (mecanismo de Frank-
Starling). Porém, se o aumento na pós-carga for muito intenso, o débito do VD diminui. Isso acontece por duas razões:
(1) incapacidade de ejetar o sangue contra uma resistência pulmonar elevada;
(2) disfunção isquêmica do VD.
OBS: IMPORTANTE!!!
Mas de onde vem essa isquemia miocárdica? Preste atenção. A dilatação extrema do VD aumenta a tensão em sua
parede, dificultando o fluxo de sangue pela circulação coronariana! E como se trata de uma situação com alta demanda metabólica
pelo miocárdio, é possível a ocorrência de um infarto agudo de VD nesses casos.
Tanto é assim que níveis séricos elevados de troponina são importantes marcadores de mau prognóstico no TEP
(microinfartos subendocárdicos), bem como aumentos do BNP (Brain Natriuretic Peptide) que acompanham a dilatação das
cavidades cardíacas.
A embolia maciça é definida pelo colapso circulatório agudo (hipotensão + choque): o débito cardíaco (isto é, o débito
do ventrículo ESQUERDO) está diminuído. Não é difícil perceber que a combinação de queda no débito sistólico do VD associada
ao abaulamento do septo interventricular para dentro da cavidade do VE, reduzindo seu volume (pela dilatação extrema do VD)
resultam na queda do enchimento diastólico do VE, o que reduz, proporcionalmente, o débito cardíaco! A este quadro dramático e
fatal damos o nome de cor pulmonale agudo, a grande causa de óbito no TEP.
Quais são as consequências da TVP? Por volta de 90% do sangue venoso dos membros inferiores é drenado pelo
sistema profundo. Assim, obstruções mecânicas significativas desse conduto resultam numa intensa sobrecarga de pressão no
interior de seus vasos. Sabemos que o retorno venoso é facilitado pela existência de valvas na parede das veias, as quais impedem
que o sangue tenha fluxo retrógrado, no sentido da força da gravidade. Entretanto, na vigência de altas pressões pela estase venosa,
a estrutura dessas valvas pode ser danificada, gerando incompetência das mesmas. Chamamos este quadro de síndrome pós-
flebítica, o qual é caracterizado por edema crônico unilateral, alterações de coloração da pele (dermatite ocre), e varizes. É comum
o surgimento de úlceras de estase, especialmente no maléolo medial. Tais úlceras podem permanecer “abertas” por anos, e seu
tratamento costuma ser muito difícil.
OBS: INFARTO PULMONAR
Somente 5-7% dos TEP cursam com infarto pulmonar. Você imagina uma explicação para essa taxa tão baixa? O
tecido pulmonar possui circulação dupla, suprida tanto pelas artérias pulmonares quanto pelas artérias brônquicas (ramos da aorta).
Além disso, os septos alveolares (que são estruturas muito finas) recebem oxigênio diretamente do ar inspirado. Os êmbolos que
causam infartos costumam ser pequenos e periféricos, e o paciente geralmente já tem algum grau de comprometimento
circulatório (ex.: ICC com congestão pulmonar, que reduz o fluxo sanguíneo local). O infarto pulmonar no TEP é sempre
hemorrágico (continua vindo sangue pela circulação brônquica), e caracteristicamente tem formato de cone: base larga voltada
para a pleura (mais comum sobre o diafragma), e ápice apontando para o vaso ocluído. Seu quadro clínico é marcado por dor
torácica contínua, tosse, hemoptise, e muitas vezes febre com leucocitose. É fácil confundi-lo com uma pneumonia, especialmente
quando houver imagem radiológica (corcova de Hampton).
QUADRO CLÍNICO
Veja na Tabela 3 a frequência dos principais sinais e sintomas em pacientes com TEP confirmado, segundo o estudo
PIOPED (Prospective Investigation Of Pulmonary Embolism Diagnosis).
Ressalte-se que clínica de TVP foi verificada apenas em 47% desses indivíduos, através da detecção de dor, edema,
eritema e palpação de um cordão venoso endurecido, tanto na coxa quanto na panturrilha (tromboflebite).
Observe que o TEP não costuma se apresentar como colapso circulatório, pelo menos inicialmente. Quando isso
acontece, a presença combinada de dispneia + taquipneia é observada em 91% dos pacientes, além de serem comuns sinais
clínicos de insuficiência do ventrículo direito como distensão jugular, terceira bulha à direita e VD palpável no precórdio.
De maneira simplificada podemos dizer que o principal sintoma em portadores de TVP é uma dor na perna que vai
aumentando ao longo dos dias, ao passo que em portadores de TEP o principal sintoma é a dispneia súbita inexplicada.
Os casos de TEP podem ser agrupados em síndromes.
- TEP maciço: pressão sistólica < 90 mmHg, ou queda > 40 mmHg na pressão sistólica basal por um período maior
do que 15min, a qual não é explicada por outras razões como hipovolemia, sepse ou arritmias. Existe obstrução em pelo menos
metade do leito arterial pulmonar, usualmente bilateral, e o paciente apresenta altíssimo risco de morte (bastaria só mais um
“embolozinho”). O uso de trombolíticos está indicado, e podemos considerar as opções invasivas (ex.: embolectomia por cateter
ou cirurgia) em pacientes com contraindicações ao trombolítico ou naqueles em que houve falha terapêutica do trombolítico.
- TEP moderado a grande: pressão arterial normal, porém dilatação e hipocinesia do VD vista pelo ecocardiograma.
A cintigrafia de ventilação/ perfusão geralmente mostra que cerca de 30% dos campos pulmonares não estão sendo perfundidos. A
disfunção de VD é um marcador de mortalidade intra-hospitalar, e, portanto, diante desse achado, alguns autores recomendam
considerar a utilização de trombolíticos, apesar de ainda não haver consenso a respeito dessa conduta. Pacientes com disfunção de
VD + aumento de troponina representam um subgrupo de altíssimo risco para óbito intra-hospitalar, e o uso de trombolíticos deve
ser fortemente considerado, em particular quando o risco de eventos hemorrágicos for baixo.
- TEP pequeno a moderado: pressão arterial normal, sem sinais de disfunção do VD. Esta é a forma com melhor
prognóstico, e o tratamento é satisfatório apenas com anticoagulação.
Nos portadores de doenças cuja descompensação tenha quadro clínico semelhante ao do TEP (ex.: pneumonia, ICC,
DPOC, asma), uma grande pista diagnóstica, que deve nos fazer pensar na coexistência de um TEP oculto, é a ausência de melhora
com o tratamento padrão utilizado (ex.: uma pneumonia que não melhora com antibióticos).
Eis uma velha dica à beira do leito: “Sempre desconfie de TEP em todo o paciente com dispneia súbita que
mantém os ‘pulmões limpos’ na ausculta do tórax!”.
Com relação ao quadro clínico da TVP, vale a pena destacar o seguinte:
(1) a maioria dos casos de TVP não apresenta sinais ou sintomas;
(2) o clássico sinal de Homans (dor à dorsiflexão do pé) tem baixa sensibilidade e especificidade;
(3) uma TVP muito extensa pode evoluir com duas síndromes dramáticas: Phlegmasia Alba Dolens, caracterizada por
um quadro típico de TVP (dor, edema, empastamento) acompanhado de palidez do membro (o edema intersticial comprime vasos
arteriais) e Phlegmasia Cerulea Dolens, caracterizada pelo surgimento de cianose (hipóxia de estase) subsequentemente à
Phlegmasia Alba Dolens.
FONTE: Apostila de Pneumologia – MEDCURSO.
FISIOPATOLOGIA
Inflamação e ativação de plaquetas: A tríade de Virchow de estase venosa, hipercoagulabilidade e lesão do endotélio
leva ao recrutamento de plaquetas ativadas, as quais liberam micropartículas. Essas micropartículas contêm mediadores pró-
inflamatórios que se ligam a neutrófilos, estimulando-os a liberar seu material nuclear e formar redes extracelulares denominadas
armadilhas extracelulares de neutrófilos. Essas redes pró-trombóticas contêm histonas que estimulam a agregação plaquetária e
promovem a síntese de trombina dependente de plaquetas. Trombos venosos se formam e florescem em ambiente de estase, baixa
tensão de oxigênio e aumento da expressão (upregulation) de genes pró-inflamatórios.
Estados pró-trombóticos: As duas mutações genéticas autossômicas dominantes mais comuns são a do fator V de
Leiden, que causa resistência ao anticoagulante endógeno, a proteína C ativada (que inativa os fatores de coagulação V e VIII), e a
mutação do gene da protrombina, que aumenta a concentração plasmática da protrombina. A antitrombina, a proteína C e a proteína
S são inibidores da coagulação que ocorrem naturalmente. As deficiências desses inibidores, ainda que raras, estão associadas ao
TEV. A síndrome antifosfolipídeo representa a causa adquirida mais comum de trombofilia e está associada à trombose venosa ou
arterial. Outros fatores predisponentes comuns são câncer, obesidade, tabagismo, hipertensão arterial sistêmica, doença pulmonar
obstrutiva crônica, doença renal crônica, transfusão sanguínea, viagens aéreas de longa distância, poluição do ar, contraceptivos
orais estrogênicos, gestação, terapia de reposição hormonal pós-menopausa, cirurgia e traumatismo. A inflamação predispõe à
trombose, e condições como a psoríase e a doença inflamatória intestinal se tornaram fatores de risco reconhecidos de TEV. O
estilo de vida sedentário é uma etiologia cada vez mais prevalente de EP fatal. Um estudo japonês observou que cada aumento de
2 horas ao dia assistindo à televisão está associado com um aumento de 40% na probabilidade de EP fatal.
Embolização: Quando trombos venosos profundos se desprendem do seu local de formação, eles embolizam para a
veia cava, o átrio direito e o ventrículo direito (VD) e se alojam na circulação pulmonar, causando, assim, a EP aguda.
Paradoxalmente, esses trombos às vezes embolizam para a circulação arterial através de um forame oval patente ou de um defeito
do septo atrial. Muitos pacientes com EP não apresentam evidências de TVP porque o trombo já embolizou para os pulmões.
Fisiologia: As anormalidades mais comuns na troca gasosa são hipoxemia arterial e aumento no gradiente alveolar-
arterial da tensão de O2, que representa a ineficiência na transferência de O2 nos pulmões. O espaço morto anatômico aumenta
porque o gás respirado não entra nas unidades de troca gasosa do pulmão. O espaço morto fisiológico aumenta porque a ventilação
para as unidades de troca gasosa excede o fluxo sanguíneo venoso que passa pelos capilares pulmonares.
OUTRAS ALTERAÇÕES FISIOPATOLÓGICAS SÃO:
1.Aumento da resistência vascular pulmonar causada por obstrução vascular ou secreção plaquetária de agentes neuro-
humorais vasoconstritores, como a serotonina. A liberação de mediadores vasoativos pode produzir desequilíbrio na relação
ventilação-perfusão em locais distantes do êmbolo, explicando, assim, a possível discordância entre uma EP de pequena monta e
um grande gradiente alveolar-arterial de O2.
2.Comprometimento da troca gasosa em razão de aumento no espaço morto alveolar causado por obstrução vascular,
hipoxemia em razão de hipoventilação alveolar em relação à perfusão no pulmão não obstruído, shunt da direta para a esquerda ou
redução da transferência de monóxido de carbono em razão da perda de superfície de troca gasosa.
3.Hiperventilação alveolar devido à estimulação reflexa dos receptores alveolares.
4.Aumento da resistência das vias aéreas em razão da constrição de vias aéreas distais aos brônquios.
5.Redução da complacência pulmonar em razão de edema pulmonar, hemorragia pulmonar ou perda de surfactante.
Hipertensão pulmonar, disfunção do VD e microinfarto do VD A obstrução da artéria pulmonar e os mediadores neuro-
humorais causam aumento na pressão arterial pulmonar e na resistência vascular pulmonar. Quando a tensão na parede do VD
aumenta, ocorre dilatação e disfunção do VD, com liberação do biomarcador cardíaco peptídeo natriurético cerebral, devido a
estiramento anormal do VD. O septo interventricular sofre protrusão para o interior do ventrículo esquerdo (VE) e comprime o VE
intrinsecamente normal. A disfunção diastólica do VE reduz a distensibilidade do VE e prejudica seu enchimento. O aumento na
tensão da parede do VD também comprime a artéria coronária direita, limita o suprimento de oxigênio ao miocárdio e desencadeia
isquemia coronária direita e microinfarto de VD, com liberação de biomarcadores como a troponina. A redução do enchimento do
VE pode causar uma queda no débito cardíaco do VE e na pressão arterial sistêmica, com consequente colapso circulatório e morte.
CLASSIFICAÇÃO DA EMBOLIA PULMONAR
Embolia pulmonar A EP maciça representa 5 a 10% dos casos e caracteriza-se por trombose extensa afetando pelo
menos metade da vasculatura pulmonar. Dispneia, síncope, hipotensão e cianose são sinais característicos de EP maciça. Os
pacientes com EP maciça podem se apresentar em choque cardiogênico e morrer com falência de múltiplos órgãos. A EP submaciça
responde por 20 a 25% dos casos e caracteriza-se por disfunção do VD, embora a pressão arterial sistêmica permaneça normal. A
combinação de insuficiência cardíaca direita e liberação de biomarcadores cardíacos sinaliza um alto risco de deterioração clínica.
A EP de baixo risco representa cerca de 65 a 75% dos casos. Esses pacientes têm prognóstico excelente.
FONTE: Jameson, J., L. et al. Medicina interna de Harrison.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE
Embolias pulmonares resultam de trombos que geralmente ocorrem a partir de trombose venosa profunda (TVP) nos
membros inferiores ou superiores.45 A trombose nas veias profundas das pernas ou da pelve muitas vezes permanece insuspeita
até o evento de uma embolia. Os efeitos da embolia na circulação pulmonar estão relacionados com a obstrução mecânica da
circulação pulmonar e os reflexos neuro-humorais que causam vasoconstrição. A obstrução do fluxo sanguíneo pulmonar provoca
broncoconstrição reflexa na área afetada do pulmão, perda de ventilação, comprometimento das trocas gasosas e perda de
surfactante alveolar. Podem se desenvolver hipertensão pulmonar e insuficiência cardíaca direita quando sucede vasoconstrição
maciça por causa de um grande êmbolo. Embora possam ser observadas pequenas áreas de infarto, é incomum um infarto pulmonar
total.
Dentre os fatores fisiológicos que contribuem para o desenvolvimento de trombose venosa, destaca-se a tríade de
Virchow, que consiste em estase venosa, lesão endotelial venosa e estados de hipercoagulabilidade. As trombofilias (p. ex.,
deficiência de antitrombina III, deficiência de proteínas C e S, mutação do fator de V de Leiden) são um grupo de doenças
hereditárias que afetam a coagulação e tornam o indivíduo propenso ao desenvolvimento de tromboembolismo venoso.45 Estase
venosa e lesão endotelial venosa podem resultar de repouso prolongado no leito; traumatismo; cirurgia; parto; fraturas no quadril e
fêmur; infarto do miocárdio e insuficiência cardíaca congestiva; e lesão medular. Pessoas submetidas à cirurgia ortopédica e à
cirurgia para o tratamento de câncer ginecológico estão particularmente em risco, assim como pessoas submetidas a longos períodos
de imobilização. A hipercoagulabilidade está relacionada com diversos fatores. As células cancerosas podem produzir trombina e
sintetizar fatores pró-coagulação, aumentando o risco de tromboembolismo. Acredita-se que o uso de contraceptivos orais, gestação
e terapia de reposição hormonal aumentem a resistência aos anticoagulantes endógenos.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
As manifestações de embolia pulmonar dependem do tamanho e da localização da obstrução. Dor no tórax, dispneia
e aumento da frequência respiratória são os sinais e sintomas mais frequentes de embolia pulmonar. Um infarto pulmonar muitas
vezes causa uma dor pleurítica que muda com a respiração, sendo mais grave na inspiração e mais branda na expiração. Ocorre
hipoxemia moderada, sem retenção de dióxido de carbono, como resultado do comprometimento das trocas gasosas. Pequenos
êmbolos que se alojam nos ramos periféricos da artéria pulmonar podem passar despercebidos, a não ser quando a pessoa já tem
algum comprometimento, como ocorre com idosos ou indivíduos gravemente enfermos. A existência repetida de pequenos êmbolos
reduz gradualmente o tamanho do leito capilar pulmonar, o que resulta em hipertensão pulmonar. Pessoas com embolia moderada
frequentemente apresentam dificuldade respiratória acompanhada de dor pleurítica, apreensão, febre baixa e tosse produtiva com
expectoração de sangue. Muitas vezes se manifesta uma taquicardia para compensar a diminuição da oxigenação e o padrão de
respiração é rápido e superficial. Pessoas com embolia maciça geralmente apresentam colapso repentino, dor subesternal no tórax,
choque e, às vezes, perda de consciência. O pulso é rápido e fraco, a pressão arterial é baixa, as veias do pescoço se mostram
distendidas e a pele se apresenta cianótica e diaforética. Uma embolia pulmonar maciça frequentemente é fatal.
FONTE: Norris, Tommie L. Porth - Fisiopatologia.
BIOPATOLOGIA
Fatores de risco hereditários e adquiridos determinam o risco intrínseco de TEV para cada indivíduo (e-Figura 74.1).
Os fatores de risco hereditários incluem anormalidades associadas à hipercoagulabilidade do sangue (Capítulo 73); as mais comuns
são o fator V de Leiden e as mutações do gene da protrombina G20210A.3 Os fatores de risco adquiridos incluem idade avançada,
história de TEV anterior, obesidade e câncer ativo, todos os quais limitam a mobilidade e podem estar associados à
hipercoagulabilidade. Sobreposto a este risco de fundo, o VTE frequentemente ocorre na presença de fatores desencadeantes, que
aumentam o risco acima do limite crítico. Fatores desencadeantes como cirurgia, traumatismo e gravidez ou terapia com estrogênio
levam a ativação celular endotelial, estase e hipercoagulabilidade, que são componentes da tríade de Virchow.

E-FIGURA 74.1 Limiar de trombose. Fatores de risco hereditários e adquiridos se combinam para criar um risco
intrínseco de trombose para cada indivíduo. Esse risco é aumentado por fatores desencadeantes extrínsecos. Se as forças intrínsecas
e extrínsecas excederem um limiar crítico em que a geração de trombina supere os mecanismos de proteção, ocorre trombose. TEV
= tromboembolismo venoso.
Até metade dos pacientes com um primeiro episódio de TEV não apresentou fatores de risco identificáveis e é descrita
como tendo TEV não provocado ou idiopático. O restante desenvolve TEV secundário a fatores de risco ou desencadeantes; esses
episódios são considerados provocados. Os fatores de risco para TEV podem ser classificados de acordo com a magnitude e duração
como maior ou menor e transitório ou persistente, respectivamente. Os fatores de risco transitórios maiores incluem cirurgia ou
traumatismo, enquanto o câncer ativo é um exemplo de fator de risco persistente maior. Fatores de risco transitórios menores
incluem terapia com estrogênio ou viagem prolongada, enquanto obesidade, história pregressa ou familiar de TEV e defeitos
trombofílicos como fator V de Leiden ou mutações do gene da protrombina são exemplos de fatores de risco persistentes menores
(Capítulo 73).
A TVP pode ocorrer em qualquer uma das pernas. Entretanto, a TVP na gravidez envolve veias iliofemorais da perna
esquerda em 90% dos casos e tipicamente poupa as veias da panturrilha e poplíteas. Essa localização reflete compressão da veia
ilíaca esquerda pelo útero aumentado; um exagero da chamada síndrome de May-Thurner, em que redes venosas e compressão da
veia ilíaca pela artéria ilíaca direita sobrejacente reduzem o fluxo sanguíneo e podem causar TVP.
A maior parte dos êmbolos pulmonares origina-se de TVP nos membros inferiores, e a embolia pulmonar pode ser
detectada em cerca de 40% dos pacientes com TVP proximal. Da mesma maneira, pelo menos 50% dos pacientes com embolia
pulmonar comprovada apresentam TVP demonstrável. A TVP em membro superior envolvendo veias axilares ou subclávias
também dá origem a embolia pulmonar, mas apenas em 10 a 15% desses pacientes. A TVP em membro superior ocorre mais
frequentemente em pacientes com câncer (Capítulo 169), particularmente em pacientes com cateteres venosos centrais de demora.
A TVP espontânea em membro superior, geralmente envolvendo o braço dominante, pode ocorrer com esforço extenuante – a
chamada síndrome de Paget-Schroetter.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
Os pacientes com TVP tipicamente apresentam edema, dor, calor e vermelhidão no membro acometido (Figura 74.1).
Entretanto, alguns pacientes têm sinais/sintomas mínimos. O diagnóstico diferencial inclui traumatismo, infecção, cisto de Baker
rompido (Capítulo 248; Tabela 74.1), doença arterial periférica (Capítulo 71) e outras doenças venosas como insuficiência venosa
crônica; TVP pode coexistir com esses distúrbios.

Os sinais e sintomas mais comuns de embolia pulmonar incluem dispneia aos esforços, dor torácica que
frequentemente é de natureza pleurítica, taquipneia e tosse. Muitos pacientes com embolia pulmonar têm sinais e sintomas
concomitantes de TVP. Os sinais e sintomas menos comuns incluem febre, hemoptise, cianose, hipotensão e choque. Outros
sintomas inespecíficos incluem palpitações, ansiedade e sensação de desmaio.
Pacientes com embolia pulmonar maciça frequentemente apresentam dispneia em repouso e hipotensão e podem ter
síncope (Capítulos 45 e 56) em decorrência de hipoxemia e baixo débito cardíaco. Pode ocorrer cianose central e periférica, e um
ritmo de galope pode se desenvolver como consequência da insuficiência cardíaca. As veias jugulares estão distendidas se houver
desenvolvimento de insuficiência cardíaca direita. A segunda bulha cardíaca (B2) pode ser amplamente desdobrada e o componente
pulmonar (P2) pode estar hiperfonético em razão do retardo do esvaziamento do ventrículo direito. Elevação paraesternal do
ventrículo direito pode ocorrer na embolia pulmonar maciça e hipertensão pulmonar aguda. A combinação de hipotensão,
hipoxemia e aumento da carga de trabalho cardíaca pode desencadear angina (Capítulo 62) ou infarto do miocárdio evidente
(Capítulos 63 e 64).
FONTE: Goldman, Lee, e Andrew I. Schafer. Goldman-Cecil Medicina.
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
Como já foi descrito, não ocorre TEP sem que tenha a formação e propagação de trombos, estando inteiramente
associado à TVP. A literatura descreve as duas patologias como sendo entidades dinâmicas estreitamente ligadas. O
desenvolvimento da TVP em 90% dos casos ocorre nas veias profundas dos membros inferiores, e suas alterações podem ser
notáveis ou não clinicamente (PAULOS, 2008).
Além de trombos outras substâncias também podem embolizar para os pulmões, em diversas situações como, por
exemplo, óleo, liquido amniótico durante o parto, gás, fragmentos de projeteis de arma de fogo, células gordurosas, dentre outros,
entretanto, estas situações são bem raras de ocorrerem. Tornando os trombos venosos profundos os mais comuns. Alguns outros
locais como, veias superficiais, prostáticas, uterinas, renais, e até mesmo das câmeras cardíacas direitas, podem ser fontes de
êmbolos (BONI; SANTOS, 2009).
Após trombos migrarem para os pulmões, esses podem impactar na bifurcação da artéria pulmonar ou em ramos
lobares, prejudicando seu funcionamento hemodinâmico, já os trombos menores alojam distalmente, causando resposta
inflamatória próxima à pleura parietal, ocasionando dor pleurítica (TOPSON, 2008).
Virchow (1821) um renascentista que dedicou a sua vida para estudar a fisiopatologia da TVP e sua consequente
propagação trombótica, definiu três fatores primordiais como desencadeadores da TVP: a estase sanguínea, que é a diminuição do
fluxo sanguíneo, a lesão da camada intima da parede dos vasos e alteração do sistema de coagulação, construindo assim a Tríade
de Virchow (CHAN,2017).
É importante ressaltar que estes três fatores não atuam de forma autônoma, mas existe uma ligação entre eles, à tríade
de Virchow representa um conjunto de processos dinâmicos e não um modelo estático de relação causa efeito, todos os fatores de
risco para TEV e TEP têm sua base em um ou mais elementos da tríade (VOLPE et al., 2010). Os fatores de risco de TEV/TEP são
aqueles que proporcionam condições básicas para formação de trombos que corresponde a esta tríade (figura 1) (CORBELLINI,
2012).
Figura 1- Tríade de Virchow, estease venosa, lesão endotelial e hipercoagubilidade e seus fatores de risco para TVP.
Alguns fatores associados podem aumentar o risco de TEV e TEP que são: imobilização no leito, varizes, pós-
operatório, episódio anterior de TVP, neoplasias, traumatismo, idade avançada, puerpério, obesidade, desidratação e tabagismo
(PAULOS, 2008). Ainda não foram descobertos processos exatos que dão início a trombose venosa. Uma agregação plaquetária
em torno de uma válvula venosa, como caso inicial, leva a estimulação dos fatores de coagulação, resultando com a formação de
um trombo vermelho. Uma vez formado, ele cresce através da deposição de novas camadas de plaquetas e fibrina. Neste caso a
solução é a fibrinólise, que é rápida e processa a dissociação do trombo. No caso se houver um processo incompleto da fibrinólise,
ocorre uma organização que introduz o trombo residual a parede do vaso com pequena área, fazendo com que a permanência do
trombo possa ocasionar o TEP como complicação (CORBELLINI, 2012).
Quando um trombo sofre embolização e se estabelece em um ou mais ramos da artéria pulmonar, desencadeia
alterações pulmonares e hemodinâmicas. As consequências hemodinâmicas são: aumento da pressão próxima ao trombo e
diminuição do fluxo sanguíneo distal ao trombo. Como consequência, os efeitos do TEP geram diminuição da secção transversa do
leito vascular pulmonar, um aumento da resistência pulmonar e da pressão arterial pulmonar, assim como um aumento do trabalho
do ventrículo direito (PAULOS, 2008).
A gravidade dessas consequências dependerá do tamanho do trombo, da presença de bactéria, da presença de doença
pulmonar prévia e/ou doença extrapulmonar prévia. Geralmente há um comprometimento do parênquima pulmonar que pode sofrer
necrose devido à isquemia vascular. Outros problemas associados podem ser hemorragia, edema, hemorragia associada a infarto,
atelectasia e pneumonia. A presença do espaço morto pulmonar é uma área ventilada sem perfusão tendo como consequência, a
constrição do parênquima afetado, perda de surfactante alveolar e hipóxia. (VOLPE et al., 2010).
A redução do surfactante pode ocorrer de duas a três horas após o episódio embólico e se torna severa mais tarde,
cerca de doze a quinze horas. Atelectasias com instabilidade alveolar podem ser detectadas com vinte e quatro a quarente e oito
horas após a embolia (CHAN, 2017).
FONTE: GOMES, Sara Cristina Ferreira. Tromboembolismo pulmonar: fisiopatologia, diagnóstico e tratamento.
2018. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Biomedicina) – Faculdade de Ciências da Educação e Saúde, Centro
Universitário de Brasília, Brasília, 2018.
DESCREVER O PLANO PROPEDÊUTICO NO TEP, IDENTIFICANDO A IMPORTÂNCIA DOS ESCORES DE AVALIAÇÃO DE PROBABILIDADE PRÉ-TESTE E DE ESTRATIFICAÇÃO E
INTERPRETAR EXAMES LABORATORIAIS E DE IMAGEM QUE AUXILIAM NO DIAGNÓSTICO E ACOMPANHAMENTO DO PACIENTE COM TEP.
ETIOLOGIA
Mais de 90% dos êmbolos pulmonares se originam de trombos em veias profundas dos membros inferiores. Nessa
topografia, a TVP com maior risco de embolia significativa é a íleo-femoral (50% cursam com TEP), ao passo que o risco de TEP
com manifestações clínicas, na TVP de panturrilha, é considerado extremamente baixo (porque tais êmbolos são muito pequenos).
Contudo, a TVP de panturrilha é a principal causa de TVP íleo-femoral (pela propagação ascendente do trombo), além
de ser a principal causa de embolia paradoxal (nos pacientes com forame oval patente). A trombose em veias pélvicas também
confere um alto risco de TEP (em torno de 50%).
Já nos casos de TVP em outros territórios, como nos membros superiores, o risco de embolização não é completamente
conhecido, mas parece que a TVP em subclávia causa muito mais TEP do que se pensava até pouco tempo atrás. O número de
tromboses associadas à canulação de veias profundas vem aumentando, especialmente após o advento dos cateteres implantáveis
(como o Portocath, usado em quimioterapia).
Mas quais são os pré-requisitos da trombose venosa profunda? Você não se esqueceu da “tríade de Virchow”, não é
mesmo??? O famoso patologista alemão do séc. XIX já havia percebido que na vigência de qualquer um dos fatores a seguir teremos
favorecimento da trombogênese:
1.Estase – gerando hipóxia intravascular;
2.Lesão vascular – disfunção/desnudamento endotelial, com exposição do subendotélio;
3.Hipercoagulabilidade – hereditária (trombofilias) e/ou adquirida.
Vale a pena conhecer um pouco mais a fundo o terceiro item da tríade, pois sempre devemos nos perguntar se o doente
não possui alguma (ou algumas) das condições relacionadas.
OBS: TROMBOFILIAS HEREDITÁRIAS
Certas mutações genéticas estão associadas a um maior risco de TEV. As chamadas trombofilias hereditárias podem
ser caracterizadas por: (1) excesso de fatores pró-coagulantes; (2) deficiência de fatores anticoagulantes; (3) alterações qualitativas
de componentes do sistema hemostático; (4) combinações dessas anomalias.
A síndrome trombofílica hereditária mais comum é a resistência à proteína C ativada (3% a 7% da população
caucasiana, rara em negros e orientais), resultante da presença do fator V de Leiden. O fator V mutante não consegue ser clivado
pela proteína C ativada, o que a impede de exercer seu efeito anticoagulante. Desse modo, o organismo não alcança um equilíbrio
entre trombose e mecanismos antitrombóticos endógenos, fazendo a balança pender para o lado da trombose.
A segunda síndrome hereditária mais frequente é a mutação G20210A no gene da protrombina. O sítio genético
alterado é uma região indutora da transcrição gênica (promoter) cuja presença faz os níveis de fator II (protrombina) aumentarem
em 25%, potencializando a ocorrência de trombose frente a qualquer insulto trombogênico!
As deficiências de antitrombina, proteína C e proteína S (fatores anticoagulantes) são bem mais raras, porém são
as que acarretam os maiores riscos de TEV. Outros defeitos trombóticos são descritos, mas não entraremos em detalhes; além de
raríssimos, em muitos deles é discutível se realmente aumentam a chance de trombose.
Apesar de as trombofilias hereditárias poderem cursar com TVP espontânea, na maioria das vezes isso não ocorre, e
o evento trombótico quase sempre é desencadeado por um fator de risco adquirido. Só pra exemplificar, um grande estudo mostrou
que o uso de Anticoncepcionais Orais (ACO) aumenta o risco de TVP em quatro vezes. Quando consideramos apenas as usuárias
de ACO que possuem fator V de Leiden, a chance de TVP é 35x acima do normal. Portadores heterozigotos do fator V de Leiden
têm um risco de trombose, ao longo da vida, sete vezes superior que o da população normal.
De fato, uma boa parte dos carreadores de alterações genéticas predisponentes não desenvolve trombose, bem como
na maioria dos casos de trombose não encontramos nenhuma alteração genética. Os fatores de risco ditos “clássicos” são os grandes
determinantes da ocorrência de TEV, inclusive nos pacientes com trombofilia.
Exceção a essa regra é a presença de mais de um defeito genético. Tomemos como exemplo os raros pacientes
homozigotos (dois alelos mutantes) para o fator V de Leiden: seu risco de trombose é 80 vezes acima do normal, sendo comuns
episódios de TVP espontânea!
Então cabe a pergunta: quando suspeitar de trombofilia hereditária?

Pois bem, agora imagine um paciente com suspeita de trombofilia que realizou uma extensa investigação laboratorial
e nada foi encontrado. Por acaso existe algum diagnóstico diferencial que podemos estar perdendo? Em certas situações sim,
observe o Quadro a seguir:

E já que estamos falando em diagnóstico, vamos aproveitar para esclarecer uma dúvida que muita gente tem: o
processo trombótico e a anticoagulação interferem nos resultados de alguns exames para trombofilia? Sim! Muitos autores
recomendam dar início à pesquisa de trombofilias somente após 2 semanas do término da anticoagulação. Observe na Tabela 1 os
tipos de interferência que cada uma dessas condições exerce sobre o resultado dos principais exames utilizados.
OBS: EMBOLIA GORDUROSA
A embolia gordurosa, uma causa não trombótica de EP, é decorrente de politrauma com fraturas de ossos longos. É
a medula óssea gordurosa que “funciona como êmbolo”. Uma síndrome que se inicia em torno de 24 a 48h após a fratura, sendo
caracterizada por: confusão mental; petéquias no abdome; taquidispneia.
Ao contrário da embolia gordurosa, a embolia trombótica geralmente ocorre após o 5° dia de pós-operatórios
ou grandes traumas, diferente da primeira, que é precoce – antes do 3° dia.
Geralmente as gorduras neutras sofrem a ação da lipase, liberando ácidos graxos. Estes promovem uma vasculite
disseminada, com extravasamento capilar nos pulmões, sistema nervoso central e vasos da derme. O tratamento é de suporte e o
prognóstico é variável.
DIAGNOSTICO
Já enfatizamos neste texto que um dos maiores desafios em relação ao tromboembolismo venoso é sua dificuldade
diagnóstica, e dissemos mais: não há como estabelecer ou excluir um diagnóstico de TEP utilizando apenas os dados clínicos
básicos (anamnese + exame físico) – é preciso realizar certos exames complementares.
A justificativa é que os sinais e sintomas que acabamos de citar são vistos com a mesma frequência em pacientes com
TEP confirmado e naqueles onde o TEP foi excluído. Logo, a presença dessas queixas não é suficiente para confirmarmos o
diagnóstico, apesar de elas sempre sugerirem tal hipótese.
Atualmente, a conduta recomendada é: diante de um paciente cujo quadro clínico seja compatível com TVP/TEP,
estime a probabilidade pré-teste desses diagnósticos. Métodos formais de avaliação da probabilidade pré-teste, desenvolvidos
com o intuito de padronizar a capacidade diagnóstica (isto é, “nivelando-a para cima”, ao reduzir a variabilidade interprofissional)
são muito úteis para orientar o clínico em sua prática diária.
É importante frisar que o julgamento clínico individual do médico (especialmente quando estiver presente a famosa
“voz da experiência”) jamais deixará de ser soberano na tomada de decisões clínicas. O grande objetivo das regras de Previsão da
Probabilidade de TEV é fornecer uma justificativa baseada em evidências que nos diga com segurança: – Ei, está indicado um
exame complementar, como uma angio-TC, por exemplo.
O escore mais amplamente utilizado é o escore de Wells, que avalia tanto a probabilidade de TVP quanto de TEP.
Outro escore que avalia apenas a probabilidade de TEP, desta vez se valendo de certos dados laboratoriais básicos, é
o escore de Genebra.

Recentemente foi publicado o escore de Genebra revisado, que mostrou ser equivalente ao escore de Wells. Tal
escore vem sendo muito empregado nos centros médicos europeus, e também é baseado apenas em dados clínicos.

Tomemos como exemplo a aplicação do escore de Wells. Suponha que para qualquer uma das hipóteses (TVP e/ou
TEP) a probabilidade pré-teste seja “moderada/alta. Ora, se o quadro clínico é compatível, existem fatores de risco, a chance de
TEV não é baixa (e você literalmente está com aquela “pulga atrás da orelha”), não tenha a menor dúvida: EXAME DE IMAGEM
NA HORA! E se não houver contraindicação importante, já comece a anticoagular o doente.
A escolha de qual método de imagem solicitar é variável, na dependência da disponibilidade e qualidade dos
mesmos no serviço em que você estiver trabalhando (o ideal é que cada local tenha seu próprio protocolo). Além disso, os exames
são diferentes de acordo com a suspeita diagnóstica (TVP ou TEP). Vamos analisar cada um deles mais à frente.
O melhor método não invasivo para TVP é o duplex-scan de membros inferiores, enquanto a angiotomografia
pulmonar com tomógrafo helicoidal, acompanhada ou não de uma venotomografia dos membros inferiores (para detectar
TVP concomitante), é o melhor método não invasivo no diagnóstico de TEP.
Diante da suspeita de TEP, o encontro de uma TVP nos membros inferiores dá por encerrada a investigação diagnóstica
(pois o tratamento básico – a anticoagulação – acaba sendo o mesmo). Assim, numa paciente grávida onde se suspeita de TEP, por
exemplo, o primeiro exame a ser realizado deve ser o duplex-scan de membros inferiores. Caso positivo, poupamos a doente (e o
feto) da exposição à radiação durante uma angiotomografia de tórax.
Agora considere o seguinte: a probabilidade pré-teste de TVP ou TEP não é alta. Em casos como esse, não é
obrigatório partir direto para um exame de imagem! O estudo CHRISTOPHER avaliou o papel da dosagem do D-dímero na
exclusão de TVP/TEP em tais doentes. D-dímero abaixo de 500 ng/dl, num contexto clínico onde a probabilidade pré-teste
não é alta (Wells < 4 para TEP, ou ≤ 0 para TVP), exclui satisfatoriamente a possibilidade de TEV. Assim, podemos afirmar
que o D-dímero possui elevado valor preditivo negativo em pacientes com baixa probabilidade pré-teste de TEP. Esse estudo
acompanhou 1.028 pacientes com baixa probabilidade de TEV por um período de três meses. Outros exames não foram realizados,
bem como não foi administrado tratamento anticoagulante, pois o D-dímero inicial estava abaixo de 500: apenas 0,4%
desenvolveram TEP, 0,1% desenvolveram TVP e não houve nenhuma morte.

OBS: TEP NO PACIENTE INTUBADO


Doentes graves no CTI representam uma população com risco altíssimo de TEP. Inclusive, esse risco é tão alto que
mesmo com a utilização de profilaxia adequada o evento embólico ainda pode ocorrer. Quando acoplados a uma prótese ventilatória
obviamente devem permanecer sedados, o que torna impossível o conhecimento de suas queixas. Além do mais, tais pacientes
frequentemente apresentam alterações em seus exames complementares básicos (RX, ECG, gasometria, ecocardiograma, D-
dímero, troponinas, BNP), as quais são causadas pela doença de base e pelo seu péssimo estado geral. EXISTE ALGUMA PISTA
PARA O DIAGNÓSTICO DE TEP? Se houver suspeita clínica, podemos calcular o espaço morto alveolar, que quando aumentado
(acima de 20%), sugere oclusão na circulação arterial pulmonar (áreas bem ventiladas, porém mal perfundidas):

OBS: TEP EM GESTANTES


O diagnóstico de TEP durante a gestação apresenta algumas peculiaridades. Em 1° lugar, fique sabendo que não
existe contraindicação absoluta para a realização de exames radiográficos. O TEP é uma doença potencialmente fatal, e precisa
ser confirmada a fim de justificar seu tratamento (o qual acarreta uma série de riscos). Devemos usar utensílios de proteção
abdominal, de modo a minimizar a exposição do feto aos raios X. Se a cintigrafia for empregada, a dose do radiofármaco deve ser
reduzida. Por fim, um período especialmente difícil de se realizar o diagnóstico é o 3° trimestre: a compressão venosa exercida
pelo útero dificulta a interpretação do fluxo e da compressibilidade vascular, realizadas no duplex-scan de membros inferiores. De
toda forma, preconiza-se que o primeiro exame a ser realizado seja o duplex-scan, pois a confirmação de TVP já basta para darmos
início ao tratamento anticoagulante (poupando a gestante da realização de exames radiográficos). A droga de escolha para o
tratamento durante todo o período de gestação é a heparina de baixo peso molecular.
EXAMES COMPLEMENTARES
EXAMES INESPECÍFICOS
Exames inespecíficos devem ser solicitados para todo paciente com suspeita de TEP. Eles não servem para confirmar
o diagnóstico, apesar de poderem “fortalecer” ou “enfraquecer” a suspeita clínica, na medida em que apontarem para outras
etiologias (ex.: pneumonia, IAM etc). Tais exames fazem parte da rotina de avaliação geral de pacientes com queixas
cardiorrespiratórias.
RADIOGRAFIA DE TÓRAX
Até pouco tempo atrás, acreditava-se que o achado radiográfico mais comum no TEP fosse um exame normal. Todavia,
grandes estudos demonstraram que a maioria dos casos evolui com alterações no raio X de tórax, sendo comuns: cardiomegalia,
atelectasia, derrame pleural, infiltrados no parênquima.
Como você pode perceber, tais achados são completamente inespecíficos, e são vistos com grande frequência no
contexto de outras doença. Entretanto, existem 2 situações onde o raio X reforça a hipótese de TEP:
(1) paciente com fatores de risco e início súbito de dispneia, cujo exame é normal (dissociação clinicorradiológica:
sintomas >>> RX);
(2) presença de sinais clássicos de TEP.
Ué, mas o raio X do TEP pode ter sinais clássicos e específicos? Sim. O problema é que eles raramente são
encontrados, e, portanto, são muito pouco sensíveis.
Os sinais sugestivos de TEP no RX de torax são:
- sinal de Westermark (Figura 3A): indica oligoemia focal
- sinal de Corcova de Hampton (Figura 3B): Infiltrado em forma de cunha, base apoiada sobre o diafragma (infarto
pulmonar).
- sinal de Palla (Figura 3C): Dilatação da artéria pulmonar direita.

ELETROCARDIOGRAMA
O ECG é útil para afastarmos a possibilidade de infarto agudo do miocárdio. Lembre-se, porém, que mesmo na
presença de IAM não podemos afastar a ocorrência de TEP somente com o ECG. A alteração mais comum, absolutamente
inespecífica, é a taquicardia sinusal. Anormalidades de ST-T também são frequentes (ex.: inversão da onda T de V1 a V4). Os
sinais ominosos mais importantes são aqueles que revelam a presença de sobrecarga do VD! Um estudo mostrou que, dos 7
principais indícios de sobrecarga ventricular direita, pelo menos 3 podem ser vistos em 76% dos casos de TEP.

Historicamente, a famosa síndrome S1 Q3 T3 (onda S em D1, onda Q em D3 e onda T invertida em D3) foi
considerada o sinal mais sugestivo de TEP no ECG. Trata-se de alteração pouco sensível, pois está ausente na maioria dos casos.
Contudo, nos pacientes com embolia pulmonar maciça e cor pulmonale agudo, a ocorrência do padrão S1 Q3 T3 é relativamente
comum (Figura 4).
GASOMETRIA ARTERIAL
A maioria dos pacientes com embolia para os pulmões apresenta hipoxemia no sangue arterial, bem como
hipocapnia (alcalose respiratória pela taquipneia). Entretanto, não é incomum que indivíduos mais jovens, com boa reserva
cardiopulmonar, tenham TEP com níveis normais de oxigênio. Seja como for, um dos mais importantes estudos a respeito do
diagnóstico de TEP (o PIOPED, citado anteriormente), desfez o clássico mito de que a hipoxemia seria um marcador diagnóstico
importante.
A média de PaO2 dos pacientes com TEP comprovado por angiografia (70 mmHg) não mostrou diferença relevante
com a média de PaO2 dos pacientes onde o TEP foi excluído (72 mmHg). A hipoxemia é um achado sensível, mas também bastante
inespecífico. E como dissemos, em cerca de 26% dos pacientes jovens com embolia pulmonar a PaO2 manteve-se acima de 80
mmHg. No TEP maciço, com choque cardiogênico, é comum encontrarmos acidose mista (respiratória + lática, por causa do
choque).
ECOCARDIOGRAMA
A disfunção de VD no ecocardiograma é um marcador de mau prognóstico: mesmo em pacientes normotensos, sua
presença confere um risco 2 vezes maior de mortalidade!
O exame transtorácico é um método prático e barato, e apesar de não fazer parte do algoritmo diagnóstico de TEP,
deve estar presente na rotina de avaliação de todos os casos. Sabemos de antemão que a maioria dos episódios de TEP cursam com
eco normal.
Já o eco-transesofágico pode ser usado para demonstrar a presença de trombos tanto no tronco quanto nos principais
ramos da artéria pulmonar. Em pacientes instáveis, cujo transporte intra-hospitalar seja de alto risco (ex.: até o aparelho de
tomografia), o uso dessa técnica permite uma comprovação mais fácil do diagnóstico, até porque são esses os doentes com maior
probabilidade de apresentarem tal achado.
Sinais típicos de sobrecarga aguda do VD como dilatação de sua cavidade (com paredes finas), hipocinesia e
regurgitação tricúspide são observados em cerca de 30-40% dos casos, sendo ainda mais frequentes no TEP maciço. Devemos
diferenciá-los dos sinais de sobrecarga crônica dessa câmara cujo marco principal é a hipertrofia miocárdica. Além disso, no cor
pulmonale crônico, a hipocinesia do VD costuma ser difusa, ao contrário do que é visto no TEP, onde apenas a parede basolateral
está disfuncionante, enquanto o ápice se contrai normalmente (sinal de McConnell).
Anomalia menos comum, porém bastante sugestiva de TEP, é a presença de um trombo na cavidade ventricular
direita. Este achado só está presente em 4% dos casos, porém mais de 35% destes evoluem com TEP (cujos êmbolos provavelmente
se originam desse trombo). O encontro de um trombo no VD é suficiente para indicar o tratamento.
MARCADORES BIOQUÍMICOS
As troponinas cardioespecíficas (TnI e TnT) e o BNP não servem para o diagnóstico de TEP (são insensíveis e
inespecíficos), porém são muito úteis na estratificação de risco dos paciente com TEP definido. Níveis elevados das troponinas
cardioespecíficas provavelmente indicam a ocorrência de microlesões miocárdicas na parede do VD, secundárias à sobrecarga
aguda dessa câmara. Valores muito aumentados conferem um mau prognóstico a curto prazo (primeiros 30 dias). O aumento do
BNP também está relacionado à dilatação ventricular, e quando combinado com altos níveis de troponina, constitui-se em poderoso
instrumento de avaliação do prognóstico (ex.: TnT > 0,07 mcg/L + BNP > 600 ng/L estão associados a uma mortalidade em 40
dias de 33%, ao passo que se o BNP estiver < 600 ng/L a mortalidade se aproxima de zero).
Vale ressaltar que atualmente também tem sido bastante valorizada a combinação de troponina elevada + disfunção
de VD vista ao eco. Nos grandes centros médicos esses dois exames são realizados em todos os pacientes com TEP, para fins de
estratificação do risco de óbito intra-hospitalar. Em pacientes onde os dois marcadores são positivos (isto é, troponina elevada
+ disfunção de VD), é fortemente recomendado considerar o emprego de drogas trombolíticas.
O D-dímero é um produto de degradação da fibrina (gerado pela atividade fibrinolítica endógena) que se eleva em
todas as vezes que houver um trombo no interior do organismo. Por causa disso, seus níveis frequentemente são altos no TEV (>
95% dos casos). Já vimos que a grande vantagem desse marcador é seu valor preditivo negativo (99,5% quando a probabilidade
pré-teste é baixa)! Pacientes com D-dímero normal (< 500 ng/ dl) certamente não têm trombose. Apesar de sua sensibilidade
ser muito grande, este exame não pode, por si só, confirmar o diagnóstico de TEV: também está elevado nos casos de sepse, pós-
operatório, ICC.
EXAMES ESPECÍFICOS

DUPLEX-SCAN DE MEMBROS INFERIORES


Também denominado eco Doppler, é o melhor exame para identificação de TVP ileofemoral. O principal critério
ultrassonográfico de obstrução venosa é a perda da compressibilidade vascular, reconhecida pelo não colabamento do lúmen
quando pressionamos o transdutor contra a pele do paciente. Algumas vezes visualizamos diretamente o trombo, que quando agudo
tem aspecto hipoecoico e homogêneo.
Outra manobra utilizada no exame, a compressão da panturrilha, é feita com o intuito de aumentar o fluxo venoso
(analisado pelo Doppler), o que não acontece nos casos de TVP importante.
Devemos notar que um duplex-scan normal não exclui a possibilidade de TEP. Nesses casos, ou o trombo se
deslocou por inteiro, ou a trombose tem sede nas veias pélvicas, longe do território analisado pelo método. O duplex-scan também
é capaz de detectar outras doenças, como o cisto de Baker e o hematoma muscular dissecante.
E a flebografia com contraste? Apesar de ainda ser o padrão-ouro no diagnóstico de TVP dos membros inferiores,
saiba que este exame foi praticamente substituído pelo duplex-scan. Suas principais desvantagens são o fato de ser um exame
extremamente doloroso, e requerer o uso de contraste iodado (risco de nefropatia). Como se isso não bastasse, sabemos que ele
piora a lesão vascular em um sistema venoso já lesado, e cerca de 30% dos casos com TVP confirmada acabam desenvolvendo
TEP após o exame.
CINTIGRAFIA VENTILAÇÃO-PERFUSÃO (V/Q)
Este era o exame mais utilizado para o diagnóstico de TEP antes do surgimento dos tomógrafos helicoidais de última
geração (multi-slice detector). Baseia-se na injeção intravenosa de microagregados de albumina marcada com tecnécio radioativo
(Tc 99), os quais serão retidos na rede capilar pulmonar indicando as áreas de parênquima bem perfundido.
Para aumentar a especificidade do teste empregamos a cintigrafia de ventilação, que consiste na inalação de xenônio
radioativo (Xe 133). Se a cintigrafia de perfusão revelar a presença de áreas mal perfundidas, devemos verificar se elas também
estão sendo mal ventiladas (V/Q matching). Se este for o caso, a baixa perfusão local é justificada por uma doença do parênquima,
e não por embolia. Por outro lado, se existirem áreas mal perfundidas, porém normalmente ventiladas (V/Q mismatching), temos
o indicativo de que existe uma doença vascular pulmonar, provavelmente embólica.
Evidências comprovam que a radiografia de tórax pode ser usada no lugar da cintigrafia de ventilação, sem
prejuízo da acurácia, mas com custos bem menores.
Uma cintigrafia normal virtualmente exclui a possibilidade de TEP, o que dá por encerrada a pesquisa diagnóstica
(elevado valor preditivo negativo). A única situação em que devemos duvidar disso, e seguir investigando, é quando a suspeita
clínica for muito forte. Mas como isso é possível? Sabemos que alguns casos de TEP maciço, com êmbolos centrais (em sela),
podem não causar defeitos de perfusão localizados, pois na verdade todas as áreas pulmonares estão comprometidas por igual. Tal
fato ressalta a importância da probabilidade pré-teste – ela modifica a interpretação do exame.
Uma cintigrafia de alta probabilidade é definida pela presença de 2 ou mais defeitos segmentares bem ventilados
(V/Q mismatching). Assim como ocorre na cintigrafia “normal”, o resultado “alta probabilidade” tem poder diagnóstico: no
paciente com suspeita clínica de TEP, esse resultado comprova a presença de embolia, e dá por encerrado o processo diagnóstico!
Contudo, aqui também existe uma armadilha. É o caso do paciente com TEP prévio, cujas áreas de V/Q mismatching podem
corresponder às sequelas de êmbolos antigos. O ideal é compararmos o exame atual com exames prévios (Figura 5).

OBS: Qual é a grande crítica à cintigrafia V/Q? O estudo PIOPED (que comparou esse exame com a arteriografia
pulmonar) revelou que na maioria das vezes (em torno de 72% do total) o resultado da cintigrafia não foi capaz de confirmar ou
excluir a presença de TEP, ou seja, o exame geralmente não é diagnóstico, sendo necessário continuar investigando. Além do mais,
mesmo em pacientes cujo laudo da cintigrafia indica baixa ou média probabilidade, a prevalência de TEP ainda pode ser elevada,
especialmente quando a suspeita clínica é muito grande (ex.: 33% e 66% nos casos com cintigrafia de baixa e média probabilidade,
respectivamente).
TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA HELICOIDAL (ANGIO-TC)
O grande diferencial desta técnica, em relação à TC convencional, é a velocidade com que as imagens são obtidas. Os
novos aparelhos multi-slice realizam múltiplos “cortes” tomográficos simultaneamente, enquanto o paciente é movimentado no
interior do tomógrafo. Modernos softwares propiciam uma reconstrução tridimensional da anatomia. A vantagem de se realizar um
exame tão rápido é que ele permite visualizar, com mais nitidez, as estruturas arteriais no exato momento em que elas recebem uma
carga de contraste. Por isso o outro nome desse exame é angiotomografia.
Nos dias de hoje, a angio-TC encontra-se amplamente disponível, e é considerada o teste de escolha na investigação
inicial do TEP. Sua sensibilidade gira em torno de 83%, e a especificidade também é boa (> 90%). Inclusive, os novos aparelhos
citados são capazes de delinear até a sexta geração dos ramos arteriais pulmonares, alcançando uma resolução comparável à da
arteriografia. A sensibilidade tende a ser maior, quanto mais proximal for a impactação do êmbolo. Contudo, êmbolos
subsegmentares têm sido mais frequentemente identificados, após a introdução das referidas melhorias técnicas.
Um artifício que também aumentou a sensibilidade do exame de 83% para 90% foi a extensão do “corte” tomográfico
até a pelve e grandes veias proximais dos membros inferiores. A técnica consiste em “cortar” a parte inferior do corpo após um
intervalo de tempo pré-determinado, coincidindo com a fase venosa da circulação do contraste. A esta parte do exame chamamos
venotomografia, que detecta a presença de TVP sem necessidade de injetar mais contraste. Lembre-se que no paciente com suspeita
clínica de TEP, o encontro de uma TVP autoriza o diagnóstico presuntivo de TEP, e, portanto, o tratamento.
Além de útil para o diagnóstico, esse exame também se aplica ao prognóstico. A dilatação do VD pode ser notada
durante o exame, e a presença desse sinal quintuplica o risco de mortalidade! Por fornecer imagens de todas as estruturas torácicas,
a angio-TC também detecta a presença de outras doenças, as quais não poderiam ser pesquisadas, simultaneamente, por outros
métodos (ex.: ao mesmo tempo avalia o parênquima pulmonar, as pleuras, o mediastino e o pericárdio).
As principais desvantagens do método são a ocorrência de nefropatia induzida por contraste e alergia ao contraste.
ANGIORRESSONÂNCIA
O maior ponto positivo da angiorressonância é sua alta acurácia para a detecção de TVP. No que diz respeito ao TEP,
sabemos que teoricamente a acurácia também é boa (ainda que seja inferior a dos novos aparelhos de TC). Porém a realização de
ressonância em pacientes graves, instáveis, é dificultada pelas incompatibilidades entre diversos aparelhos de suporte ao doente
crítico e os próprios aparelhos de ressonância magnética (que na verdade são grandes ímãs). Além do mais, a realização desse
exame consome muito mais tempo do que a TC, e os próprios movimentos respiratórios costumam gerar artefatos.
ARTERIOGRAFIA PULMONAR
É o método padrão-ouro para o diagnóstico de TEP, realizado através do cateterismo da artéria pulmonar, com
injeção direta do contraste em seu lúmen. O TEP pode ser evidenciado pela presença de uma falha de enchimento no leito arterial
pulmonar, ou então a interrupção abruta de um vaso (cutoff).
Qual é a grande indicação de arteriografia? Atualmente, a principal indicação é como método confirmatório nos
casos que receberão tratamento intervencionista endovascular (embolectomia por cateter). A arteriografia localiza o êmbolo com
exatidão, permitindo ao médico posicionar corretamente o cateter para fragmentação e aspiração do material trombótico.
A mortalidade do procedimento gira em torno de 1%, e a taxa de complicações é de 5% (geralmente relacionadas ao
sítio de punção). Em pacientes com cor pulmonale agudo, a injeção de contraste sob pressão no interior da artéria pulmonar (a qual
já estava hipertensa) pode dar origem a uma série de complicações, como arritmias e ruptura da artéria.
DIAGNOSTICO DIFERENCIAL
É óbvio que nem toda dispneia é TEP, assim como nem toda dor na perna é TVP, o que na prática quer dizer que nem
todos esses pacientes merecem ganhar uma bateria de exames específicos (e caros) para investigar TEP. Observe a lista com os
principais diagnósticos diferenciais da TVP e do TEP:

FONTE: Apostila de Pneumologia – MEDCURSO.


DESCREVER OS PROTOCOLOS DE TRATAMENTO, RACIONALIDADE DE RECURSOS, EFETIVIDADE E RISCOS DAS MEDIDAS FARMACOLÓGICAS UTILIZADAS NO PACIENTE
COM TEP E IDENTIFICAR AS MEDIDAS PARA SEGUIMENTO AMBULATORIAL DO PACIENTE COM TEP.
TRATAMENTO
As modalidades terapêuticas no TEV incluem o uso de anticoagulantes, trombolíticos, filtro de veia cava e
procedimentos invasivos (cirúrgicos ou endovasculares).
ANTICOAGULAÇÃO
Os pacientes que não morrem dentro das primeiras 2 horas após o TEP geralmente vêm a falecer mais tarde por causa
de recorrência da embolia! A recorrência tende a ser comum, sendo observada em grande parte dos casos que não recebem
tratamento. Já está mais do que provado que a anticoagulação reduz a taxa de mortalidade em cerca de 80-90%, basicamente pela
sua capacidade de evitar a recorrência do TEP (prevenção secundária).
E como ela consegue fazer isso? Nenhum anticoagulante exerce ação direta sobre o trombo. A dissolução do
mesmo é levada a cabo pelo sistema fibrinolítico endógeno: o que o anticoagulante faz é inibir a continuidade do processo
trombótico, virando a balança para o lado da fibrinólise.
Portanto, anticoagular é a base do tratamento do TEV. Devemos alcançar o estado de anticoagulação plena dentro
das primeiras 24h de terapia. Isso é possível apenas com o uso de medicações parenterais ou com os novos anticoagulantes orais
(inibidores diretos da trombina ou do fator Xa), cujo início de ação é imediato. Em pacientes que recebem cumarínicos
(anticoagulantes orais antagonistas da vitamina K), leva cerca de 5-7 dias para o efeito anticoagulante ser atingido. Por este motivo,
quando optamos pelo uso dessas medicações, é preciso manter uma droga parenteral até que se comprove a obtenção do efeito
anticoagulante pleno do cumarínico (p. ex.: duas medidas consecutivas de INR dentro da faixa terapêutica, que fica entre 2-3).
Ressalte-se que em casos onde a suspeita clínica de TEP for muito grande, mas por algum motivo os exames
confirmatórios não puderem ser realizados de imediato, pode-se anticoagular empiricamente (isto é, até que se providenciem os
exames confirmatórios necessários).
No TEP, é recomendável que o paciente evite a deambulação até estar plenamente anticoagulado. Na TVP isolada,
tal medida não é necessária. A TVP pode ser tratada no ambulatório, mas o TEP, de uma forma geral, não.
HEPARINA DE BAIXO PESO MOLECULAR (HBPM)
As HBPM são comprovadamente superiores à heparina não fracionada para a anticoagulação de pacientes com TEP
que se mantêm hemodinamicamente estáveis. Logo, podem ser escolhidas para início do tratamento nesse contexto, quando se opta
pela utilização de cumarínicos em longo prazo. Em tal situação, ambas as medicações são iniciadas ao mesmo tempo: HBPM +
cumarínico. Atingido o efeito anticoagulante do cumarínico, a HBPM deve ser suspensa.
No caso específico dos portadores de câncer que desenvolvem TEP, atualmente as HBPM representam as drogas
de escolha para anticoagulação, devendo ser mantidas em monoterapia (sem tentativa de transição para o warfarin) indefinidamente
ou até que o paciente seja curado da neoplasia.
Observe na Tabela 4 as principais HBPM:

Outras grandes vantagens da HPBM em relação à HNF são:


(1) Farmacocinética mais previsível;
(2) Uso subcutâneo;
(3) Menor risco de Trombocitopenia Induzida por Heparina (HIT);
(4) Não é necessário monitorar a anticoagulação (dispensa o PTTa). Isso ocorre porque as moléculas de HBPM se
ligam com menos intensidade às células e proteínas plasmáticas do que as moléculas de HNF, o que significa que elas têm uma
biodisponibilidade mais uniforme ao longo do tempo.
Todavia, existem situações especiais onde estaria indicado um exame para avaliar o efeito anticoagulante da HBPM.
Que exame é esse? É a dosagem do antifator Xa, que nada mais é que o próprio componente ativo da HBPM. E em que situações
devemos dosá-lo? Por quê? Observe o quadro a seguir.
As HBPM são excretadas pelo rim, e sua posologia deve ser corrigida ou pelo clearance de creatinina, ou pela dosagem
do antifator Xa. Entretanto, o ideal é trocá-las por outro anticoagulante, na vigência de disfunção renal. Em todas as situações
citadas no quadro anterior, a dose ideal de HBPM não foi adequadamente estudada, e não existe consenso se as doses padrão devem
ser mantidas nesses casos. Por causa disso, a monitoração do efeito anticoagulante seria interessante. Dosamos o antifator Xa 4h
após administrar a heparina, e ajustamos a posologia segundo algoritmos próprios, com o intuito de manter seus níveis séricos em
torno de 0,6 a 1,0 U/ml.
A HBPM possui alguma desvantagem em relação à HNF? Sim. A meia-vida da HBPM é maior que a da HNF (12h
versus 6h). Nos pacientes mais graves, a probabilidade de precisarmos realizar um procedimento invasivo é alta, pois a qualquer
momento o paciente pode descompensar (ex.: punção venosa profunda, cirurgia de embolectomia). Se ele estiver usando HNF, a
reversão do efeito anticoagulante é rapidamente atingida após a suspensão da droga, o que não é observado no caso da HBPM.
Além disso, o antídoto das heparinas, o sulfato de protamina, neutraliza a HNF com muito mais eficácia do que a HBPM (devemos
administrar plasma para uma rápida reversão de seus efeitos).
HEPARINA NÃO FRACIONADA (HNF)
A HNF é o anticoagulante de escolha para tratar os pacientes com TEP que apresentem instabilidade
hemodinâmica. A razão para tal fato é muito simples: é a única droga que demonstrou reduzir mortalidade nesses casos. Os estudos
com HBPM sempre excluíram esses doentes mais graves de seus protocolos e, portanto, não conhecemos seu verdadeiro impacto
nesses casos.
A HNF deve ser feita em bomba infusora, ajustando-se a taxa de infusão contínua de acordo com o Tempo de
Tromboplastina Parcial ativado (PTTa), verificado de 6/6h. A dose inicial no TEP é 80 U/kg em bolus, seguindo-se infusão de 18
U/kg/h. De maneira genérica, o bolus é feito com 5.000-10.000 UI, e a infusão contínua com 1.000-5.000 UI/h. A anticoagulação
estará garantida quando mantivermos um PTTa 1,5 a 2,5 vezes acima do valor do controle (60-80 segundos), o que com frequência
requer ajustes na dose.
A necessidade de monitoração laboratorial vem do fato de que a farmacocinética da HNF é totalmente errática.
Ao contrário da HBPM, a HNF se liga de maneira variável a uma série de moléculas e superfícies celulares no organismo, o que
costuma ser absolutamente imprevisível (e pode variar, no mesmo indivíduo, de um momento para outro).
Uma de suas complicações mais temidas é a trombocitopenia induzida por heparina (“HIT” ou Heparin Induced
Thrombocytopenia), que costuma surgir a partir do 5° dia de uso. A fisiopatologia envolve a produção de autoanticorpos contra o
complexo heparina – fator IV plaquetário, que se encontra exposto na superfície externa das plaquetas. A ligação antígeno-anticorpo
promove intensa ativação plaquetária, e o paciente que estava sendo satisfatoriamente anticoagulado começa a apresentar tromboses
arteriais e venosas. O grande sinal de alerta é a queda progressiva na contagem de plaquetas. É mandatório suspender a heparina
quando essa contagem estiver abaixo de 100.000 cél/ml ou < 50% do valor basal.
Nenhuma forma de heparina poderá ser usada de novo, e obrigatoriamente teremos que usar outro tipo de
anticoagulante (ex.: inibidores diretos da trombina de uso parenteral, como o argatroban ou a bivalirudina).
Gestantes que são anticoaguladas por longos períodos com HNF podem desenvolver osteoporose. A chance dessa
complicação está aumentada a partir de uma dose cumulativa > 20.000 UI/dia por > 30 dias! Em pacientes que precisam de >
40.000 UI/dia de heparina para ajustar o PTTa, devemos considerar fortemente a possibilidade de deficiência de antitrombina
(trombofilia hereditária que funciona como uma espécie de “resistência à heparina”).
FONDAPARINUX
Trata-se de um pentassacarídeo sintético derivado da heparina, que promove uma interação seletiva entre a
antitrombina e o fator Xa, inativando este último. Estudos iniciais indicam que sua eficácia no TEP provavelmente é semelhante à
da HNF, constituindo uma alternativa viável. Suas principais vantagens são: (1) não causa HIT; (2) uso subcutâneo; (3) não precisa
de monitoração laboratorial. Entretanto, uma importante desvantagem precisa ser destacada: não existe antídoto contra essa droga.
O fondaparinux também deve ser evitado na disfunção renal.

WARFARIN (ANTAGONISTA DE VITAMINA K)


O warfarin pode ser iniciado junto com a primeira dose dos modernos anticoagulantes parenterais (HBPM ou
fondaparinux), devendo ser usado em conjunto com essas drogas por um mínimo de 5-7 dias (momento a partir do qual, em geral,
o efeito do warfarin encontra-se plenamente estabelecido). Se a HNF for utilizada, recomenda-se iniciar o warfarin somente após
se atingir a faixa alvo do PTTa. O efeito do warfarin é avaliado pela dosagem do INR (International Normalized Ratio), que deve
se manter entre 2-3 (alvo = 2,5). As drogas parenterais podem ser suspensas após duas dosagens do INR dentro dessa faixa (em
dois dias consecutivos).
A dose inicial é geralmente 5 mg/dia. Indivíduos obesos podem precisar de 7,5 a 10 mg/dia. Pacientes desnutridos ou
que se submeteram a um longo curso de antibioticoterapia devem receber 2.5 mg ao dia, pois é comum que apresentem deficiência
de vitamina K.
Em pacientes que desenvolveram um primeiro episódio de TEP na vigência de fatores de risco transitórios (ex.:
cirurgia), o tempo de anticoagulação deve ser de 3 a 6 meses. Já em pacientes com TEP idiopático, isto é, sem fator desencadeante,
ou TEP recorrente, a taxa de novos episódios a longo prazo é extremamente alta. Preconiza-se que esses indivíduos recebam de
6 a 12 meses de anticoagulação, devendo-se reavaliá-los após esse período quanto à necessidade de anticoagulação permanente.
Além de sangramento, o warfarin pode ocasionar a chamada necrose cutânea induzida pelo warfarin. A necrose
cutânea induzida por warfarin é caracterizada inicialmente pelo surgimento de placas eritematosas em mamas, coxas e abdome. As
lesões progridem para bolhas e necrose cutânea. A biópsia revela trombose dos vasos da pele.
NOVOS ANTICOAGULANTES ORAIS
Essas drogas vêm sendo cada vez mais empregadas no tratamento do TEV. Além do uso oral, outras vantagens são:
(1) uso de doses fixas; (2) anticoagulação plena logo após a 1° tomada; (3) não é necessário monitoração laboratorial; (4) não
possuem tantas interações medicamentosas como o warfarin.
Dividem-se em dois grupos principais: inibidores diretos do fator Xa (rivaroxaban, apixaban e edoxaban) e
inibidores diretos da trombina (dabigatran). No entanto, até o momento, apenas o rivaroxaban foi aprovado pelo FDA para
tratamento do TEP.

TROMBOLÍTICOS
Os trombolíticos reduzem de maneira efetiva a quantidade, ou melhor dizendo, a “carga” de trombos formados. A
uroquinase, a estreptoquinase e o t-PA estão liberados para uso. Estas drogas atuam ativando o plasminogênio tecidual.
Devemos ter em mente que os trombolíticos só podem ser administrados uma vez confirmado o diagnóstico de TEP.
A única indicação absoluta para o uso de trombolíticos no TEP é presença de instabilidade hemodinâmica. Outras indicações
propostas, mas ainda sem consenso são:
- Trombose venosa profunda extensa;
- Envolvimento extenso (múltiplos segmentos ou um lobo inteiro);
- Hipoxemia grave;
- Disfunção ventricular direita evidente ao ecocardiograma (principalmente se associada a um aumento nos níveis de
troponina).
A heparina deve ser suspensa até o término da infusão do trombolítico. Após isso, se o PTT for inferior a 2 vezes o
limite superior da normalidade, a heparina pode ser reiniciada sem dose de ataque. Caso este valor seja superior, pedimos um novo
PTT em quatro horas e reavaliamos.

FILTRO DE VEIA CAVA INFERIOR


As principais indicações do filtro de veia cava inferior são citadas na Tabela 5.

Note que somente as 2 primeiras são consensuais na literatura, sendo as 3 últimas relativamente controversas. Os
filtros de veia cava inferior conseguem impedir a recidiva do TEP em curto prazo, porém aumentam o risco de TVP em
longo prazo – por este motivo, o ideal é que sejam posteriormente retirados, se possível! Esses filtros devem ser posicionados
abaixo das renais, através de punção da veia femoral direita ou da veia jugular interna direita. Uma venocavografia deve ser
realizada após o procedimento.
TERAPIA INTERVENCIONISTA
Hemodinamicistas experientes são capazes de reconhecer o(s) ponto(s) de obstrução por trombo no leito arterial
pulmonar e, em alguns casos, desfazer a obstrução com uma das seguintes opções: (1) trombolítico intra-arterial; (2) embolectomia
succional; (3) embolectomia por fragmentação; (4) outros métodos.
Porém as técnicas de “angioplastia” na embolia pulmonar ainda são realizadas por poucos profissionais. Os pacientes
com embolia maciça, instáveis hemodinamicamente e que apresentam contraindicação ao trombolítico ou refratariedade ao
trombolítico idealmente devem ser submetidos à embolectomia cirúrgica, realizada com CEC (Circulação Extracorpórea).
Atualmente, consegue-se uma mortalidade em torno de 40-50% nas mãos de cirurgiões experientes. Vale ressaltar que esta é uma
cirurgia “heroica” (sem ela o paciente morreria em 100% dos casos). Na indisponibilidade da cirurgia com CEC devemos tentar a
embolectomia por cateter em pacientes com contraindicação ou falência da terapia trombolítica.
OBS: Qual é a conduta na embolia pulmonar maciça?
Devemos suspeitar de embolia pulmonar maciça quando o paciente se apresenta com insuficiência respiratória,
choque, dissociação eletromecânica ou assistolia. A conduta inclui a administração de salina, aminas para suporte da pressão
(dopamina e noradrenalina) e dobutamina para “estimular” o VD, uma vez que a maioria das mortes advém da falência desta
câmara.
A intubação orotraqueal e a ventilação mecânica são geralmente realizadas e o emprego de trombolíticos
recomendado. Para os pacientes com contraindicações à heparinização ou à trombólise, a embolectomia intervencionista é a melhor
conduta, e um filtro de veia cava deve ser instalado, para evitar recorrências.
PREVENÇÃO
O TEP é a principal causa prevenível de morte intra-hospitalar. Devemos, portanto, dominar sua profilaxia! Diga-se
de passagem, ela consegue ser mais eficaz em reduzir o número de mortes do que o próprio tratamento da doença estabelecida.
PACIENTES CIRÚRGICOS
Já vimos os principais fatores de risco do tromboembolismo venoso. Sabemos que, dentre uma longa lista de fatores,
a história de cirurgia recente é um dado que merece destaque. Um grande estudo populacional mostrou que 74% dos episódios
de TEP acontecem na comunidade, sendo que, em cerca de um quarto desses, há história de procedimento cirúrgico nos últimos
três meses. Esse estudo constatou também que cerca de 40% desses casos de TEP não receberam nenhuma forma de profilaxia
durante a internação hospitalar.
Existem escores validados para a estratificação do risco de TEV em paciente cirúrgicos, como o escore de Caprini
modificado (citado no guideline do ACCP – American College of Chest Physicians, uma referência muito utilizada em se tratando
da profilaxia do TEV). No entanto, dada a complexidade deste último, colocaremos aqui um esquema simplificado (e igualmente
válido e aceito pela literatura), o qual é muito mais fácil de memorizar e entender. Seguramente, a Tabela 6 lhe ajudará a acertar
as questões de prova acerca desse tema.

Todos os pacientes com risco moderado ou alto devem receber alguma forma de profilaxia
FARMACOLÓGICA, a não ser que existam contraindicações (ver adiante). A estratégia de primeira escolha na atualidade
consiste no uso de heparina de baixo peso molecular (ex.: enoxaparina 40 mg SC 1x dia). A duração da profilaxia deve
acompanhar a duração dos fatores de risco ou da internação. Cumpre ressaltar que certos pacientes cirúrgicos de ALTO RISCO
devem continuar recebendo a profilaxia farmacológica em casa, mantendo-a por um mês após a alta hospitalar, devido ao risco
comprovadamente alto de desenvolver TEV neste período. Estes são: 1. Artroplastia total de quadril; 2. Osteossíntese de fratura de
quadril; 3. Ressecção de câncer abdominal ou pélvico.
Vamos descrever agora as modalidades de tromboprofilaxia disponíveis na prática (ver Tabela 7).

PACIENTES CLÍNICOS
Também existem escores para avaliação do risco tromboembólico em pacientes clínicos internados no hospital.
Felizmente, o principal escore validado pela literatura é bastante simples e fácil de guardar: trata-se do escore de Padua (ver
Tabela 8). Uma pontuação maior ou igual a 4 indica alto risco e necessidade de tromboprofilaxia farmacológica.

OBS: CONTRAINDICAÇÕES À HEPARINA PROFILÁTICA


Observe a seguir as contraindicações ABSOLUTAS e RELATIVAS para o uso de heparina em doses profiláticas.

FONTE: Apostila de Pneumologia – MEDCURSO.

ENUMERAR AS ORIENTAÇÕES DE CUIDADOS NÃO FARMACOLÓGICOS (CONTEXTO DE VIDA, MUDANÇAS DE HÁBITOS E FATORES DE RISCO) PARA O PACIENTE COM TEP.
PROFILAXIA
Todo paciente de risco para TVP e TEP deve receber alguma forma de profilaxia, que pode ser feita através de medidas
farmacológicas, não farmacológicas ou associação de ambas.
PROFILAXIA NÃO FARMACOLÓGICA
Meias elásticas - As meias de compressão gradual, 18mmHg nos tornozelos, 14mmHg nas panturrilhas, 8mmHg no
joelho e 10mmHg na porção distal da coxa e 8mmHg na proximal produz aumento de 36% na velocidade de fluxo da veia femoral.
Quando a compressão é uniforme de 11mmHg, este aumento é de apenas 10%. Entre os pacientes de baixo risco, reduz a freqüência
de TVP em mais de 50% se comparado com aqueles sem profilaxia. Seu uso precoce associado a deambulação e a movimentação
dos membros inferiores é a primeira medida profilática a ser adotada entre os pacientes hospitalizados.
Compressão pneumática intermitente - A compressão do membro inferior pela insuflação seqüencial de cuffs: 35, 30
e 20mmHg, respectivamente, no tornozelo, joelho e coxa aumentam em 240% a velocidade de fluxo na veia femoral. Quando
somente uma câmara é utilizada, no tornozelo, com pressão de 35mmHg por 12s, este aumento é de 180%. O tempo de clareamento
do contraste da venografia é oito vezes menor quando comparado ao de compressão seqüencial. Há evidências que esta modalidade
de profilaxia aumente a atividade fibrinolítica endógena.
Filtro de veia cava inferior - Indicado em situações especiais, por exemplo, naqueles com contra-indicação para
profilaxia farmacológica e com alto risco de TEP. O portador de fratura ortopédica com fenômeno tromboembólico recente e
necessidade de tratamento cirúrgico, pode se beneficiar do mesmo. É medida eficaz na prevenção do TEP e não atua sobre a cascata
da coagulação. Migração do filtro, estase venosa crônica e TEP através de vasos colaterais, são algumas das complicações. Filtro
temporário (duração de até 14 dias) com sua retirada após comprovação de ausência de trombo é outra opção profilática.

FONTE: Livro-texto da Sociedade Brasileira de Cardiologia – 3ª Edição.


DESCREVER O ELETROCARDIOGRAMA NORMAL E AS POSSÍVEIS ALTERAÇÕES ELETROCARDIOGRÁFICAS NO PACIENTE COM TEP.
ELETROCARDIOGRAFIA
A eletrocardiografia, que, surpreendentemente, mudou muito pouco desde a sua introdução por Einthoven no início
dos anos 1900, possibilita o registro simultâneo da ativação miocárdica a partir de vários pontos na superfície do corpo, permitindo
assim a análise da ativação elétrica em diferentes regiões miocárdicas. A eletrocardiografia de superfície pode ser suplementada
por registros intracardíacos, que são particularmente úteis para o diagnóstico e o manejo de arritmias cardíacas (Capítulo 56).
FUNÇÃO E ELETROCARDIOGRAMA NORMAIS

ATIVAÇÃO CARDÍACA NORMAL


A ativação elétrica do coração depende da propagação pelo músculo cardíaco de uma onda despolarizante proveniente
das células marca-passo, bem como por tecidos especializados de condução (Figura 48.1). Em circunstâncias normais, as células
no nó sinoatrial (SA), localizado na porção epicárdica lateral superior do átrio direito, se despolarizam espontaneamente em uma
frequência mais elevada e, portanto, constituem o marca-passo cardíaco dominante (Capítulo 55). Essa onda elétrica se espalha
pelos átrios direito e esquerdo e células especializadas de condução chamadas de feixe de Bachmann aceleram a onda despolarizante
para o átrio esquerdo. A ativação elétrica atrial promove a contração muscular atrial, propelindo assim o sangue através das valvas
tricúspide e mitral para os ventrículos direito e esquerdo. Normalmente, o nó atrioventricular (AV), onde a condução é atrasada de
maneira fisiológica, age como o único local de conexão elétrica entre os átrios e os ventrículos; os anéis das valvas AV são isolados
eletricamente. A onda despolarizante deixa o nó AV e passa para o feixe de His, um tecido de condução especializado capaz de
conduzir rapidamente a onda elétrica. O feixe de His se bifurca em ramos direito e esquerdo; o ramo esquerdo se divide em
fascículos esquerdos anterior e posterior. Os ramos do feixe de His e suas porções mais distais contendo tecido de condução
especializado são chamados de sistema de Purkinje. A partir desses tecidos condutores especializados, a onda despolarizante entra
e se move através do músculo ventricular. Assim como ocorre nos átrios, a ativação elétrica ventricular promove a contração
muscular, que bombeia o sangue através das valvas semilunares para as circulações pulmonar e sistêmica. Após a ativação elétrica,
ou despolarização, é necessário um período de recuperação elétrica, ou repolarização, antes de uma nova ativação.
Em nível celular, uma ação orquestrada complexa de abertura e fechamento de potenciais iônicos determina o potencial
de membrana durante esse processo. O fluxo de íons para dentro e para fora das células miocárdicas constitui o potencial de ação,
que reflete a despolarização e a repolarização, bem como a despolarização espontânea das células marca-passo (Capítulo 55).

FIGURA 48.1 Sistema de condução cardíaco. O sistema de condução normal consiste em células marca-passo no
complexo do nó sinoatrial (SA), tratos especializados de condução intra-atrial (incluindo o feixe de Bachmann), nó atrioventricular
(AV), o sistema His-Purkinje e miocárdio ventricular e atrial de trabalho.
ONDAS ELETROCARDIOGRÁFICAS
Nomeadas alfabeticamente, começando com a onda P, as ondas básicas do eletrocardiograma (ECG) correspondem a
esses eventos elétricos (Figura 48.2). A onda P representa a despolarização do músculo atrial; durante a hiperpotassemia grave, a
ativação elétrica atrial pode ser desacoplada da ativação muscular atrial e não ocorrer uma onda P. O ritmo resultante é chamado
de sinoventricular. O complexo QRS representa a despolarização muscular ventricular; a disparidade entre as massas musculares
atrial e ventricular gera tipicamente um complexo QRS muito maior em amplitude de voltagem do que a onda P. Registrado a partir
de vários pontos, o complexo QRS fornece muitas informações a respeito da estrutura e da função do tecido ventricular. Em
circunstâncias normais, o intervalo PR, que é o segmento desde o início da onda P até o início do complexo QRS, representa o
retardo entre as despolarizações atrial e ventricular. O segmento ST e a onda T (e, ocasionalmente, a onda U) representam a
repolarização ventricular, um processo de recuperação elétrica que deve ocorrer antes que o ventrículo possa ser despolarizado
novamente. O ponto J (de junção) denota o final do complexo QRS e o início do segmento ST. A musculatura atrial também precisa
ser repolarizada antes da onda despolarizante seguinte. Como a massa ventricular excede em muito a massa atrial, a onda de
repolarização atrial, de baixa amplitude, é mascarada pelo complexo QRS e, portanto, não é observada no ECG.
Um achado raro no ECG, a onda J (de Osborn), quebra a convenção alfabética das outras ondas eletrocardiográficas.
Definida como uma deflexão positiva no ângulo de descida do complexo QRS ou no ponto J, a onda J é vista mais comumente em
situações de hipotermia (Figura 48.3). Ela também é observada em situações de hipercalcemia e de lesão cerebral e está relacionada
com o risco de fibrilação ventricular idiopática (ver adiante).
FIGURA 48.2 Inscrição de um eletrocardiograma (ECG) normal. A despolarização do nó sinoatrial não é visível no
ECG de superfície; a onda P corresponde à despolarização muscular atrial. O intervalo PR denota a condução através do músculo
atrial, do nó atrioventricular e do sistema His-Purkinje. O complexo QRS reflete a despolarização do músculo ventricular. O
segmento ST e a onda T correspondem à repolarização ventricular. O ponto J se encontra na junção do final do complexo QRS
com o início do segmento ST. O intervalo QT é medido desde o início do complexo QRS até o final da onda T. Repare nas linhas
de grade. No eixo horizontal, cada linha de 1 mm (o quadrado “pequeno”) denota 0,04 segundo (40 ms); uma caixa “grande” denota
0,2 segundo (200 ms). No eixo vertical, 1 mm (caixa “pequena”) corresponde a 0,1 mV; 10 mm (duas caixas “grandes”), portanto,
correspondem a 1 mV.

FIGURA 48.3 Onda J de Osborn. Esse eletrocardiograma (ECG) foi registrado em mulher diabética de 40 anos
apresentando hipotermia profunda (26,6°C), cetoacidose diabética e hipopotassemia. Repare nas grandes ondas J nos eletrodos V3-
V6 e ondas J menores nas derivações I, II, III e aVF. Outros achados notáveis incluem bradicardia sinusal e prolongamento do
intervalo QT.
PADRÕES ELETROCARDIOGRÁFICOS
Um ECG padrão é registrado em papel (e, frequentemente, digitalmente) com linhas de grade de 1 mm (quadrados
“pequenos”), bem como de 5 mm (quadrados “grandes”) (Figura 48.2). A amplitude da voltagem é medida no eixo vertical
(tipicamente 10 mm significam 1 mV) e o tempo é registrado no eixo horizontal. Como a velocidade usual de registro de ECG é de
25 mm/s, cada linha de grade de 1 mm (quadrado pequeno) representa 0,04 segundo (40 ms) e cada linha de grade de 5 mm
(quadrado grande) é igual a 0,2 segundo (200 ms). Esses parâmetros, que são tipicamente impressos no ECG para ajudar na
interpretação adequada, representam a calibração usual, ou padronização, mas eles podem ser modificados em circunstâncias
incomuns.
Um ECG padrão é registrado ao longo de um período de 10 segundos, embora os registros possam ser realizados por
períodos substancialmente maiores, se for necessário. Várias derivações são tipicamente registradas de maneira simultânea do início
até o fim da página. Os agrupamentos usuais de derivações incluem I, II e III; aVR, aVL e aVF; V1, V2 e V3 e V4, V5 e V6 (ver
adiante). Cada grupo de derivações é gravado por 2,5 segundos. Um registro de uma única derivação (ou de várias derivações) é
registrado na porção inferior ao longo de todos os 10 segundos. Desse modo, se um ECG for examinado da esquerda para a direita,
o indivíduo vê 10 segundos de atividade cardíaca, com cada complexo registrado simultaneamente em várias derivações.
INTERVALOS NORMAIS
Cada um dos vários intervalos e ondas do ECG apresenta faixas de normalidade, definidas a partir de numerosos
registros eletrocardiográficos em indivíduos (presumivelmente) saudáveis (Tabela 48.1 e Figura 48.2).1,2
O intervalo RR (idêntico ao intervalo PP no ritmo sinusal) que é a medida de uma onda R até outra onda R (ou de uma
onda P até outra onda P) permite o cálculo da frequência cardíaca (FC). Como existem 60.000 ms em um minuto, a FC, em
batimentos por minuto, pode ser facilmente calculada a partir do intervalo RR ou PP em milissegundos:
Embora tradicionalmente a faixa de FC em um adulto normal em repouso seja definida como entre 60 e 100 bpm, a
faixa entre 50 e 90 bpm é, na realidade, mais condizente com a fisiologia normal de um indivíduo em repouso. Vários estressores
(exercício, dor, febre etc.) aumentam a FC; uma FC menor é observada após as refeições e durante o sono. As frequências cardíacas
em repouso tendem a diminuir com a idade. Quando a FC é grosseiramente irregular, como ocorre na fibrilação atrial (Capítulo
58), o intervalo RR pode ser calculado a partir da média de alguns ciclos cardíacos para a estimativa da FC. Como um ECG padrão
registra 10 segundos, a FC (batimentos por minuto) será igual ao número de batimentos registrados em um ECG padrão multiplicado
por seis. Alternativamente, em um ritmo regular, a FC pode ser rapidamente estimada contando o número de quadrados grandes
entre dois complexos QRS ou ondas P consecutivas (i. e., dois quadrados grandes = 150 bpm, três quadrados grandes = 100 bpm,
quatro quadrados grandes = 75 bpm, cinco quadrados grandes = 60 bpm e assim por diante).
DURAÇÃO DA ONDA P
A duração da onda P, desde o início até o fim de uma onda P, tipicamente é menor do que 0,12 segundo (120 ms, três
quadrados pequenos) em comprimento. Uma onda P alargada reflete um atraso de condução intra-atrial e/ou interatrial. Anomalias
na amplitude, na morfologia e no eixo elétrico da onda P podem refletir dilatação atrial.
Tabela 48.1 Intervalos eletrocardiográficos normais.
Frequência cardíaca 50 a 100 bpm
Duração da onda T < 0,12 s (120 ms)
Intervalo PR 0,09 a 0,20 s (90 a 200 ms)
Duração do complexo
0,075 a 0,11 s (75 a 110 ms)
QRS
homens: 0,39 a 0,45 s (390 a 450 ms); mulheres: 0,39
Intervalo QTc
a 0,46 s (390 a 460 ms)
Eixo elétrico do
–30 a +90°
complexo QRS

INTERVALO PR
O intervalo PR, medido desde o início da onda P até o início do complexo QRS, normalmente dura entre 0,09 e 0,2
segundo (90 a 200 ms). Uma condução AV de 1:1 com um intervalo PR maior do que 0,2 segundo é tradicionalmente chamada de
bloqueio AV (BAV) de primeiro grau, mas o termo atraso da condução AV seria mais adequado. A condução através do tecido
atrial, do nó AV e do sistema His-Purkinje contribui para o intervalo PR. Quando o intervalo PR é prolongado, o atraso ocorre
geralmente no nó AV, embora outros locais de retardo sejam possíveis. Um intervalo PR curto pode refletir pré-excitação
ventricular (síndrome de Wolff-Parkinson-White), ritmo juncional ou condução mais lenta no nó AV (Capítulos 56 e 58) e esse
achado está associado a risco elevado de morbidade e mortalidade cardíacas.3
COMPLEXO QRS
O complexo QRS, que reflete a ativação elétrica muscular ventricular, fornece informações importantes sobre
pacientes com doença da artéria coronária (DAC), cardiomiopatia, anomalias metabólicas e outras condições. As letras maiúsculas
(Q, R, S) denotam deflexões de grande amplitude (≥ 5 mm ou 0,5 mV), enquanto letras minúsculas (q, r, s) significam deflexões
de baixa amplitude (< 5 mm ou 0,5 mV). As ondas Q, q, S e s são excursões negativas da linha de base isoelétrica, enquanto as
ondas R e r são deflexões positivas. As ondas Q e q são deflexões negativas iniciais e as ondas S e s são deflexões negativas após
uma deflexão positiva (onda R ou r); um complexo QS é uma deflexão completamente negativa. As ondas Q podem refletir infarto
prévio (Capítulos 62 a 64). Uma onda R’ ou r’ se refere a uma segunda deflexão positiva após uma onda S (ou s). A duração do
complexo QRS reflete o tempo necessário para a despolarização ventricular. A ativação ventricular, em geral, exige pelo menos
0,075 segundo (75 ms, praticamente dois quadrados pequenos). Existe algum debate a respeito do limite superior da faixa normal
de duração QRS; um consenso recente especificou esse valor em 0,11 segundo (110 ms), cerca de 3 três quadrados pequenos. Se a
duração do QRS for prolongada, está presente um atraso de condução intraventricular e/ou interventricular. Padrões específicos de
atraso de condução interventricular são chamados de bloqueio de ramo (ver adiante).
INTERVALO QT
O intervalo QT é medido desde o início do complexo QRS até o final da onda T. Embora o intervalo QT geralmente
seja utilizado como sinônimo da repolarização ventricular, ele também inclui o tempo necessário para a despolarização ventricular
(duração do complexo QRS). O intervalo QT geralmente é medido nas derivações II, V5 e V6 (ver adiante) e é considerado como
o maior intervalo entre os três, usando a média de três a cinco ciclos. Se o intervalo QT não puder ser medido com precisão nessas
três derivações, outras derivações podem ser utilizadas. O intervalo QT deve ser corrigido para possibilitar a comparação desse
intervalo em diferentes frequências cardíacas. A abordagem utilizada mais comumente, a fórmula de Bazett, define um intervalo
QT corrigido (QTc) como:
A fórmula de Bazett trabalha razoavelmente bem em frequências cardíacas na faixa da normalidade, mas ela corrige
demais em frequências elevadas e corrige de menos em frequências baixas. Ritmos irregulares (principalmente a fibrilação atrial)
complicam o cálculo do QTc. Alguns pesquisadores recomendam a medida de pelo menos três intervalos QT para a obtenção da
média e, então, utilizar o intervalo RR calculado como a média ao longo de 10 ciclos. Fórmulas de regressão mais complexas foram
desenvolvidas para a correção do intervalo QT em diferentes frequências cardíacas. Por exemplo, a fórmula de Fridericia:
Ela é mais acurada que a fórmula de Bazett em casos de fibrilação atrial e melhor para a predição de desfechos
adversos,4 mas não tem uso clínico amplo.
A existência de uma onda U complica a medida do intervalo QT (e, portanto, do QTc); pode não ficar claro onde a
onda T termina e se a onda U deve ser incluída em um intervalo QTU. Se a linha de base isoelétrica for alcançada entre as ondas T
e U, a onda U geralmente não é incluída no intervalo QT. Se a onda T se fundir com a onda U sem que a linha de base isoelétrica
seja alcançada, a onda U é incluída no intervalo QT (ou QTU). O QTc de um dado paciente pode variar ao longo do dia e tende a
ser um pouco mais longo em mulheres jovens e de meia-idade do que nos homens. O limite superior de um QTc normal é discutível,
mas um ponto de corte de 0,45 segundo (450 ms) em homens e 0,46 segundo (460 ms) em mulheres geralmente é utilizado. O
intervalo QT é sensível a efeitos de fármacos, bem como a anormalidades de eletrólitos e metabólitos. Pacientes com complexos
QRS alargados frequentemente apresentam intervalos QT e QTc prolongados. Nesses pacientes, o intervalo JT (desde o ponto J até
o final da onda T) pode ser um indicador mais acurado da repolarização, mas ainda não foram estabelecidos padrões normais.
Pacientes com prolongamento de QTc, seja congênito ou adquirido, podem estar em risco de desenvolver taquicardia ventricular
do tipo torsade de pointes (Capítulo 59). Um intervalo QTc muito curto (< 390 ms) é incomum e o raro paciente com síndrome do
QT curto também corre risco de desenvolvimento de arritmias ventriculares malignas.
DERIVAÇÕES ELETROCARDIOGRÁFICAS
O registro de uma única derivação de ECG possibilita o cálculo da FC e, muitas vezes, o diagnóstico acurado do ritmo
cardíaco. Quando o ECG é registrado simultaneamente em vários pontos na pele a direção (ou vetor) da ativação conforme a onda
elétrica se move através do coração pode ser inferida. Embora diferentes sistemas de derivação (e alguns deles são realmente
utilizados em ambientes de pesquisa) sejam possíveis, a eletrocardiografia padronizada utiliza 12 pontos (i. e., derivações), a partir
de 10 eletrodos, sendo seis na parede torácica e quatro nos membros. Na realidade, apenas três derivações nos membros são
utilizadas de verdade para a geração dos registros; a derivação na perna direita funciona como “terra”. As derivações nos membros,
chamadas de derivações no plano frontal, geram registros de derivações bipolares e unipolar aumentada. Os eletrodos no peito ou
precordiais geram registros unipolares. Derivações bipolares registram a diferença de potencial entre dois eletrodos na pele. Nos
registros unipolares, a derivação de interesse, o eletrodo sendo avaliado, é comparada com um eletrodo de referência. Por
convenção, é gerada uma deflexão positiva se a onda elétrica estiver se movendo em direção a um eletrodo positivo em um par
bipolar ou em direção ao eletrodo exploratório em uma derivação unipolar.
As derivações bipolares em membros medem diferenças de potencial entre os eletrodos em pares de membros e
lembram bastante os registros originais no galvanômetro de Einthoven. A derivação I compara o braço direito (negativo) e o braço
esquerdo (positivo), a derivação II compara o braço direito (negativo) com a perna esquerda (positivo) e a derivação III compara o
braço esquerdo (negativo) com a perna esquerda (positivo) (e-Figura 48.1). Como o sentido tanto da despolarização atrial quanto
da despolarização ventricular é para longe do braço direito e na direção do braço esquerdo, geralmente são registrados onda P e
complexo QRS positivos na derivação I. Da mesma maneira, a onda P e o complexo QRS são positivos nas derivações II e III em
um ritmo sinusal normal porque a ativação atrial e ventricular se dá no sentido craniocaudal.
E-FIGURA 48.1 Ativação cardíaca normal observada nas derivações dos membros. Em circunstâncias normais, as
ondas P e o complexo QRS são tipicamente positivos nas derivações I, II, III e aVF e invertidos em aVR. Na derivação aVL, as
ondas P em geral são positivas, embora os complexos QRS possam ser tanto positivos quanto negativos. O eletrodo na perna direita
age como “terra” nesse sistema.
As derivações aVR, aVL e aVF são derivações unipolares aumentadas em que o potencial em cada membro é
comparado com um eletrodo de referência. Para a derivação aVR, o potencial do braço direito é comparado com uma referência
composta pelos eletrodos no braço esquerdo e na perna esquerda. A derivação aVL compara o potencial do braço esquerdo com
uma referência que combina o braço direito com a perna esquerda; aVF compara a perna esquerda com uma referência nos braços
direito e esquerdo. Como a ativação atrial e ventricular normalmente se move da direita para a esquerda e tem direção craniocaudal,
a onda P e o complexo QRS são negativos na derivação aVR, mas são positivos na derivação aVF. Na derivação aVL, as ondas P
e os complexos QRS geralmente são para cima, embora um complexo rS possa ser registrado, sobretudo em pacientes jovens.
Os eletrodos precordiais são posicionados em pontos específicos na parede torácica (e-Figura 48.2A). Essas derivações
unipolares comparam o potencial elétrico entre o eletrodo torácico com um eletrodo de referência chamado de terminal central de
Wilson. O terminal central de Wilson combina os potenciais do braço direito, do braço esquerdo e da perna esquerda com resistores
de 5.000 Ω. As seis derivações precordiais definem a ativação atrial e ventricular em um plano um pouco transversal através da
parede torácica (e-Figura 48.2B). Nesse plano, a ativação atrial se move da direita para a esquerda. A ativação ventricular inicial
envolvendo o septo é direcionada da esquerda para a direita; a despolarização ventricular esquerda, que domina a despolarização
ventricular direita em razão da diferença de massa miocárdica, se move apical e lateralmente. Na derivação V1, à direita do esterno,
a onda P é bifásica (refletindo a ativação atrial direita e, então, esquerda). A ativação ventricular inicial do septo inscreve uma onda
r, enquanto a ativação subsequente para longe da derivação V1 registra uma onda S dominante. Na derivação V6, a onda P é positiva
e a despolarização septal ventricular inicial inscreve uma pequena onda q “septal” (em geral ≤ 0,02 segundo). A despolarização
ventricular subsequente registra uma onda R dominante.

E-FIGURA 48.2 Derivações precordiais. A. Posicionamento dos eletrodos precordiais na parede torácica. B. Ativação
cardíaca normal observada nas derivações precordiais. Repare a pequena onda r e a onda S profunda na derivação V1, a transição
próxima de V3 ou V4, a onda q (septal) e a grande onda R na derivação V6.
As derivações no lado direito do tórax devem ser realizadas quando se suspeita de anomalias ventriculares direitas.
RV3 corresponde à derivação V3 no lado direito do peito e é registrada rotineiramente em pacientes pediátricos em virtude da
possibilidade de doença cardíaca congênita. Em adultos, supradesnivelamento do segmento ST na derivação RV3 é bastante
específico para infarto ventricular direito em pacientes sendo avaliados para um infarto agudo na parede inferior do miocárdio.
EIXO ELÉTRICO
Um eixo de ativação elétrica pode ser definido no plano frontal pela combinação das derivações bipolares e unipolares
aumentadas nos membros (e-Figura 48.3 A). Por convenção, o eixo elétrico paralelo à derivação I, para a esquerda, é chamado de
0 grau. Um eixo no plano frontal entre –30 e +90° é normal; outros eixos são anormais (e-Figura 48.4). Desvios leves para a direita
no eixo, além de +90°, são variações normais em crianças e adolescentes. O eixo no plano frontal pode ser estimado pela
identificação da derivação no membro em que o complexo QRS seja mais isoelétrico (uma amplitude semelhante nas deflexões
positiva e negativa); o eixo é perpendicular a esse eletrodo (e-Figura 48.3 B). Como é possível desenhar duas linhas com uma
angulação de 180° perpendicularmente a qualquer linha, a avaliação da derivação no outro membro define a direção para a qual o
eixo aponta. Se o complexo QRS for positivo em qualquer derivação em membro, o eixo será orientado para a direção da derivação
daquele membro, e não se afastando dele. Por outro lado, o eixo elétrico se encontra na faixa da normalidade se os complexos QRS
estiverem positivos nas derivações I e II.

E-FIGURA 48.3 Eixo de ativação elétrica. A. Vetores para as derivações de membros no plano frontal. B. Referência
hexa-axial para a determinação do eixo do plano frontal. Repare que os vetores para as derivações I, II e III estão na mesma direção
que em A, mas, agora, assim como nas derivações aumentadas dos membros, esses vetores nas derivações dos membros se moveram
de modo que eles passaram a emanar do centro da figura.

E-FIGURA 48.4 Gráfico dos eixos no plano frontal. Normal (NL) = –30 a +90°; desvio do eixo elétrico para a
esquerda (DEE) = –30 a –90° (moderado –30 a –45°; marcante –45 a –90°); desvio do eixo elétrico para a direita (DED) = +90 a
+180° (moderado +90 a +120°; marcante +120 a +180°); desvio extremo do eixo elétrico para a direita (DEED) = –90 a ± 180°. O
DED leve é considerado normal em crianças, adolescentes e adultos jovens.
Um eixo elétrico em si não é definido pelas derivações precordiais. Em vez disso, uma vez que a progressão típica das
derivações V1 a V6 ocorre a partir de um complexo QRS predominantemente negativo para um positivo, o ponto de transição em
geral é definido como o ponto no qual a amplitude da onda R passa a exceder a amplitude da onda S. A rotação no sentido horário
(zona de transição em V4 ou posterior) é preditiva de risco mais elevado de eventos coronarianos futuros e a rotação no sentido
anti-horário (zona de transição em V3 ou anterior) implica um risco menor de eventos.
ABORDAGEM PARA A INTERPRETAÇÃO DO ELETROCARDIOGRAMA
Uma abordagem detalhada para a interpretação do ECG garante que nenhuma característica do traçado deixará de ser
observada (Tabela 48.2).
ELETROCARDIOGRAMA NORMAL
A Figura 48.4 é um exemplo de ECG normal. O ritmo sinusal ocorre em cerca de 78 bpm, com pequenas variações
nos intervalos RR (arritmia sinusal). O intervalo PR, a duração QRS e o QTc estão todos normais. O complexo QRS é mais
isoelétrico na derivação aVL, então o eixo QRS será perpendicular à derivação aVL. Como aVL aponta a –30°, o eixo elétrico do
complexo QRS deve estar em aproximadamente –120 ou +60°. Como o complexo QRS é positivo nas derivações I e II (grandes
ondas R), o eixo elétrico do complexo QRS está em aproximadamente +60°. A transição das derivações precordiais ocorre
tipicamente na derivação V3 ou V4. A onda P é bifásica na derivação V1 e passa a ser positiva nas outras derivações precordiais.
As ondas q septais não refletem infarto lateral, e sim, a despolarização inicial normal do septo e são observadas nas derivações V5
e V6. Pequenas ondas q, uma variação normal, são observadas nas derivações inferiores.
Tabela 48.2. Abordagem detalhada para a interpretação do eletrocardiograma.
1. Calcule a frequência cardíaca
2. Defina o ritmo cardíaco (regular versus irregular; a relação das ondas P com os complexos QRS)
3. Meça os intervalos (PR, duração de QRS, QT)
4. Calcule/estime o intervalo QTc
5. Estime o eixo elétrico do complexo QRS
6. Examine a morfologia, a duração e o eixo elétrico da onda P
7. Avalie a progressão de QRS e a transição nas derivações precordiais
8. Avalie os complexos QRS nos grupos regionais (derivações septais [V1, V2], derivações anteriores [V2, V3, V4],
derivações laterais [I, aVL, V5, V6], derivações inferior e posterior [II, III, aVF, V1, V2])
9. Avalie os segmentos ST nos grupos regionais
10. Avalie as ondas T nos grupos regionais
FONTE: Goldman-Cecil Medicina – 26ª Edição.
INTRODUÇÃO
O eletrocardiograma (ECG) representa recurso diagnóstico fundamental e de amplo uso na cardiologia, sendo um
exame de baixo custo, grande disponibilidade, rápida realização e interpretação. Este capítulo, baseado nas IV Diretrizes de Análise
e Emissão de Laudos Eletrocardiográficos da SBC de 2022 (em vias de publicação para substituir as III Diretrizes, de 2016),1 traz
descrições e critérios para auxiliar de maneira rápida e correta a interpretação do traçado eletrocardiográfico. Abordaremos
primeiramente os conceitos da vetorcardiografia, que fornecem os subsídios para uma melhor compreensão do eletrocardiograma.
VETORCARDIOGRAMA
A vetorcardiografia é um método de registro das forças eletromotrizes do coração no tempo e no espaço, de forma que
a magnitude e a direção das referidas forças possam ser representadas por uma sucessão de vetores instantâneos.3 A sua
representação é de ordem didática, pois, sendo as curvas vetorcardiográficas bidimensionais, apresentam elementos adicionais para
o entendimento e memorização inteligente do ECG. O vetorcardiograma (VCG) tem a sua expressão em planos (frontal ou vertical,
horizontal e sagital), uma vez que o fenômeno elétrico relacionado à atividade elétrica cardíaca se desenvolve de um modo
tridimensional (Figura 1). 3,4

FIGURA 1. A ativação elétrica do coração (em vermelho) e sua projeção nos três planos espaciais, originando assim
as alças vetorcardiográficas nos respectivos planos.
DERIVAÇÕES DO VCG
No VCG, o coração atua como gerador elétrico representado por um dipolo único com magnitude e direção. O método
mais aceito na literatura foi introduzido por Ernest Frank3-5 em 1956, que utiliza apenas 7 eletrodos para determinar os
componentes horizontal (derivação X), vertical (derivação Y) e anteroposterior (derivação Z). A Figura 2 demonstra as três
derivações, perpendiculares entre si, com a direção da positividade de cada uma delas.
Os eletrodos do sistema de Frank são colocados em posições padronizadas, ao longo do 5º espaço intercostal, com o
paciente em decúbito supino. A Figura 3 demostra o posicionamento: o eletrodo A na linha medioaxilar esquerda, o E na linha
medioesternal e o C a meia distância entre os dois primeiros; o eletrodo I posicionado na linha medioaxilar direita e o M na linha
medioespinal. Os eletrodos H e F são colocados, respectivamente, na face posterior do pescoço, junto à linha espinal e na perna
esquerda.5,6 O eletrodo da perna direita (usado como terra) e todos os demais são aplicados com pasta apropriada à pele,
previamente atritada com álcool.
FIGURA 2. Eixos ortogonais do corpo, cruzando-se perpendicularmente no ponto E (centro do tórax). Os eixos (ou
componentes) seguem a seguinte orientação: X, da direita para a esquerda; Y, da cabeça aos pés; Z, da parte anterior para a posterior.

FIGURA 3. Posição dos eletrodos no sistema de derivações ortogonais corrigidas, proposto por Ernst Frank.
Dessa forma, temos os seguintes eixos: X, transversal ou componente esquerda-direita (correspondendo a DI),
derivado dos eletrodos A, C e I; Y, vertical ou componente craniocaudal (correspondente a aVF), resultante dos eletrodos H, M e
F e por fim o eixo Z, anteroposterior ou componente frente-trás, procedente de todos os eletrodos precordiais, situados no 5º espaço
intercostal (A, C, E, I e M, correspondendo a V2).
Esses componentes, combinados dois a dois, dão origem aos três planos ortogonais, em que se projetarão as curvas
espaciais representativas dos fenômenos elétricos do coração (Figura 4). Assim, dos componentes X e Z decorre o plano horizontal;
dos Z e Y, o plano sagital (visto pela direita); e dos X e Y, o plano frontal.5-7
Na atualidade, com maior praticidade, rapidez e economia, podemos realizar a aquisição do vetorcardiograma a partir
do eletrocardiograma de 12 derivações pelo uso de ferramentas matemáticas como a Matriz Inversa de Dowers e o Método de Kors.
REGISTROS DO VETOCARDIOGRAMA
O registro de cada plano depende sempre de duas derivações perpendiculares: transversal e vertical para o plano frontal
(PF), transversal e anteroposterior para plano horizontal (PH) e vertical e anteroposterior para o plano sagital (PS). O VCG é
constituído por três alças fechadas, isto é, que se iniciam e terminam no mesmo ponto de origem – correspondem aos fenômenos
de despolarização atrial e ventricular, e repolarização ventricular.3-6 A alça assim formada é colocada em frente ao monitor do
aparelho e a interrupção é conseguida pela aplicação da diferença do potencial alternante no cátodo do oscilógrafo. Essa ação
oferece duas vantagens:4-6
• Os traços que constituem a alça adquirem a forma de pequenos cometas ou lágrimas. Cada cometa tem sua cauda orientada
para o ponto de origem e com isso sua porção anterior (cabeça) determina a orientação da alça (Figura 5).
• A interrupção da alça se faz de modo constante, a cada 2 ms, de modo que o número de cometas e a distância entre eles
fornecem, respectivamente, o tempo e a variação da velocidade de inscrição da alça.
O comprimento em centímetros desses segmentos é variável, conforme a sensibilidade escolhida para se obter uma
análise detalhada da alça. Utilizando-se sensibilidade (S) igual a 1, cada centímetro corresponde a 1 mV. Com S igual a 2, cada
centímetro corresponde a 0,5 mV e para sensibilidade igual a 4, cada cm corresponde a 0,25 mV.
E: esquerdo, D: direito , P: posterior, A: anterior, S: superior, I: Inferior.
FIGURA 4. Forma de representação dos planos horizontal (PH), sagital (PS) e frontal (PF) conforme são vistos nos
traçados vetorcardiográficos. São indicadas também as notações angulares e as direções de positividade de cada componente (ou
eixo), representadas pelas setas. Prefere-se o plano sagital visto pela direita para a uniformidade das medidas angulares.

FIGURA 5. Detalhe de uma alça com orientação horária e aspectos dos respectivos cometas que a constituem.
Como os vetores são tridimensionais e a alça formada é espacial, o VCG é denominado eletrocardiograma espacial do
coração. Como não há meios de registrá-lo, por intermédio de aparelhos, em formas tridimensionais, suas características podem ser
entendidas analisando suas projeções em três planos perpendiculares entre si. Dessa maneira, utilizam-se os três planos conhecidos:
horizontal, frontal e sagital (direito), como mostra a Figura 6. As alças do VCG representam a soma, ao longo do tempo, de todos
os potenciais captados entre os eletrodos dispostos no sistema de Frank.
Nos planos, observam-se três curvas ou alças distintas: uma menor, correspondente à despolarização atrial (alça de P),
outra de maior magnitude, relacionada à despolarização ventricular (alça de QRS) e uma de tamanho intermediário, alça de T
correspondente à repolarização ventricular. As alças devem ser analisadas nos três planos registrados, mostrando-se sua morfologia,
rotação e orientação média em cada um deles. Também poderá ser obtida a magnitude do vetor máximo das alças, medida em
milimetros, para depois ser avaliada em milivolts, conforme a calibração do aparelho. O vetor máximo corresponde à distância
entre o ponto E (centro elétrico do coração ou ponto de origem aparente de suas forças elétricas) e a parte mais distante da curva
em estudo, corresponde à magnitude máxima da alça. Os ramos da alça vetorcardiográfica são nomeados de eferente (a que sai do
ponto E, afastando-se deste) e aferente10 (a que se aproxima do ponto E) (Figura 7).
A ATIVAÇÃO NORMAL DO CORAÇÃO ESTUDADA PELO VCG
Na Figura 8, observam-se esquematicamente as estruturas envolvidas na geração e propagação desse impulso elétrico
pelo miocárdio. Em condições normais, o impulso cardíaco se origina nas células do nódulo sinusal. Após seu surgimento, esse
impulso elétrico se propaga por meio dos tratos internodais (P [posterior], M [médio], A [ anterior] e B [Bachman]), promovendo,
assim, a contração dos átrios.1,4,5 A despolarização atrial é vista no ECG pela onda P, sendo sua porção inicial associada ao átrio
direito, e final, ao átrio esquerdo (Figura 9). Ao chegar ao nódulo AV, o impulso é retardado por alguns centésimos de segundo, o
que é importante para permitir o enchimento dos ventrículos com o sangue bombeado pelos átrios. Esse atraso é representado no
ECG pelo segmento PR.
A alça de P é a menor alça vetorcardiográfica encontrada (Figura 7). As forças iniciais do átrio direito têm orientação
anterior, inferior e discretamente para a esquerda. A seguir, a ativação caminha para o átrio esquerdo situado posteriormente,
gerando forças orientadas para trás, para a esquerda e discretamente para baixo. A alça de P é mais bem estudada nos planos frontal
e sagital. Sua direção de inscrição é difícil de ser reconhecida, necessitando frequentemente de ampliações. Assume diferentes
configurações, direções e magnitudes nas várias projeções planares. No plano horizontal comumente se inscreve em sentido anti-
horário, com uma parte inicial anterior e um componente tardio posterior, com o aspecto em “8” sendo variante do normal. No
plano sagital direito, inscreve-se no sentido horário, é alongada ou triangular e se orienta para baixo. Já no plano frontal a alça de
P é alongada e se orienta para baixo e para a esquerda, frequentemente no sentido anti-horário8,9 (Figura 10).
FIGURA 6. Alças vetorcardiográficas nos três planos habituais: frontal, sagital direito e horizontal, obtidas em
sensibilidade 2. Observe as coordenadas X, Y e Z correspondentes a D1, aVF e V2, respectivamente.

FIGURA 7. Representação de alça vetorcardiográfica no plano horizontal, sendo destacados o centro elétrico do
coração (E), alças de ativação atrial (P), ventricular (QRS) e repolarização ventricular (T). Nota-se também na alça do QRS, com
orientação em sentido anti-horário (seta vermelha) e suas porções eferentes e aferentes destacadas.

VD: ventrículo direito; VE: ventrículo esquerdo; AD: átrio direito; AE: átrio esquerdo.
FIGURA 8. Representação esquemática do sistema de condução elétrica do miocárdio e sua localização no músculo
cardíaco. O trato internodal tem representados os seus quatro fascículos: Bachman (B) para o átrio esquerdo; anterior (A); medial
(M); posterior (P), assim como o ramo esquerdo do feixe de His: fascículos anterosseptal (AS); anteromedial (AM) e posteroinferior
(PI).
FIGURA 9. Várias formas de representação da despolarização atrial. a) A onda P como soma das despolarizações dos
átrios direito e esquerdo; b) esquema representativo da onda P bifásica em V1 ressaltando a polaridade da derivação
eletrocardiográfica e a associação de cada fase da onda P com uma câmara atrial; c) a alça vetorcardiográfica da despolarização
atrial como a soma dos vetores gerados pelos átrios durante a onda P.
NS: nó sinusal; NAV: nó atrioventricular; VCI: veia cava inferior; VCS: veia cava superior; VP: veia pulmonar; AD:
átrio direito; AE: átrio esquerdo.

FIGURA 10. Aspectos da alça de P nos diferentes planos.


Após a passagem pelo nódulo AV, o impulso elétrico chega aos ventrículos por meio do feixe de His e seus ramos
direito e esquerdo determinando a despolarização ventricular (Figura 8). O ventrículo esquerdo possui mais massa muscular do que
o direito. Para que essa carga muscular extra se despolarize em sincronia, o ramo esquerdo possui três fascículos: anterosseptal
(AS), anteromedial (AM) e posteroinferior (PI). A despolarização ventricular como um todo é representada ao ECG como o
complexo QRS. Por último, o segmento ST e a onda T representam a repolarização ventricular.9 Um vetor é algo que, para ser bem
representado e medido, deve possuir informações sobre sua direção, sentido e intensidade (também designado módulo ou
magnitude). Um vetor é denominado resultante quando representa a soma da contribuição de vários outros vetores simultâneos; sua
direção, magnitude e sentido variam conforme a contribuição de cada vetor nessa soma.9 Como a despolarização ventricular é um
fenômeno de duração mais longa e a massa cardíaca envolvida nesse caso é progressivamente maior, à medida que o coração se
despolariza, é interessante para fins didáticos a criação de três vetores resultantes associados a determinados instantes específicos:
as ativações septal, das paredes livres e das porções basais dos ventrículos. A ativação septal é mostrada na Figura 11.

FIGURA 11. Ativação septal vista no plano horizontal por derivações precordiais diferentes. O mesmo instante
provoca ondas distintas do ECG, conforme a polaridade da derivação. Dentro do quadro em detalhe há a representação do vetor
resultante (vetor 1, em vermelho), nesse instante como sentido positivo em V1 e, ao mesmo tempo, de sentido negativo em V5 e
V6. O traçado pontilhado em preto representa o início da alça do VCG no plano horizontal referente ao primeiro vetor.
FIGURA 12. Dois momentos da ativação ventricular vista no plano horizontal por derivações precordiais distintas:
septal (vetor 1 amarelo) e das paredes livres (vetor 2 vermelho). O mesmo instante provoca ondas distintas do ECG conforme a
polaridade da derivação. Dentro do quadro em detalhe há a representação do vetor resultante da despolarização das paredes livres
(vetor 2 vermelho) nesse instante, como sentido negativo em V1 e ao mesmo tempo de sentido positivo em V5 e V6. O traçado
pontilhado em preto representa agora o desenho da alça do VCG com os vetores 1 e 2.
Dentro do quadro há o desenho esquemático de como se forma o vetor resultante da ativação septal, com
preponderância dos efeitos da parede septal do ventrículo esquerdo sobre a respectiva parede do ventrículo direito, orientado para
a frente e para a direita. O vetor resultante da ativação septal é único nesse instante de tempo, mas é registrado por diferentes
derivações precordiais. Em V1 sua magnitude é registrada como positiva nessa derivação e projetada como uma onda r no traçado
de ECG. Ao contrário, sua direção e sentido são opostos às polaridades de V5 e V6, de modo que sua magnitude seja considerada
negativa e projetada como uma onda q no traçado eletrocardiográfico. Esta é uma das diferenças principais na comparação entre o
ECG e o VCG: o mesmo vetor resultante da ativação septal, visto como uma única entidade, provém em ondas diferenciadas no
ECG conforme sua projeção sobre o eixo imaginário de cada derivação em particular.9-11
Após a ativação septal, há a ativação das paredes livres (Figura 12). O quadro interno mostra um esboço do vetor
resultante (vetor 2) da ativação das paredes livres dos ventrículos direito e esquerdo, também com predomínio deste último na
definição da direção e sentido: para trás, baixo e para a esquerda. Na ativação das paredes livres dos ventrículos, o vetor resultante
tem sentido e direção concordantes com as derivações V5 e V6, e opostos à polaridade de V1. Então, o mesmo vetor é visto naquelas
derivações como uma onda R de grande magnitude e em V1, como uma onda S, de magnitude semelhante.9,11
A última etapa da ativação ventricular é a despolarização das porções basais dos ventrículos (Figura 13). O quadro
interno mostra o cálculo do vetor resultante (vetor 3), da soma de todos os vetores locais de ativação elétrica. Como nos instantes
anteriores da ativação ventricular, a deflexão que esse vetor resultante causa em uma determinada derivação do ECG depende de
como ele é projetado sobre o eixo e da polaridade. O vetor resultante da ativação das porções basais dos ventrículos se situa de
forma quase totalmente perpendicular a V1, de modo que nenhuma onda é gerada no complexo QRS dessa derivação, e esta tem a
configuração típica rS após a total despolarização dos ventrículos. Em relação a V5 e V6, contudo, o mesmo vetor causa uma
deflexão negativa, originando o complexo QRS típico e completo com onda s terminal após a total ativação ventricular.9,11

FIGURA 13. Ativação das porções basais dos ventrículos vista no plano horizontal por derivações precordiais
distintas. O mesmo instante pode ser representado ou não no ECG conforme a polaridade da derivação. Dentro do quadro em
detalhe há a representação do vetor resultante (vetor 3, em vermelho) nesse instante, perpendicular a V1 – e, portanto, de magnitude
inexistente – sendo representado pela deflexão nula da linha isoelétrica; e, ao mesmo tempo, de sentido negativo em V5 e V6. O
traçado pontilhado em preto evidencia a alça vetorcardiográfica gerada pelos três vetores no plano horizontal.
FIGURA 14. Alça vetorcardiográfica típica da ativação ventricular no plano horizontal (A: anterior; P: posterior; D:
direita; E: esquerda). Para fins de comparação e clareza didática são incluídos, com a mesma notação das imagens anteriores, os
vetores da ativação septal (vetor 1), das paredes livres (vetor 2) e das porções basais dos ventrículos (vetor 3). Também são
mostradas morfologias típicas de QRS nas derivações V1, V5-V6, ressaltando como cada deflexão se correlaciona com trechos
específicos da alça. Por último, há a localização dos eixos e polaridades das derivações precordiais V1-V6, tanto no corte anatômico
esquemático quanto na representação da alça vetorcardiográfica.
A Figura 14 mostra, no mesmo plano horizontal das imagens anteriores, a alça vetorcardiográfica completa da ativação
ventricular, sua correspondência com diferentes morfologias de complexos QRS e os três vetores resultantes discutidos
anteriormente, sendo cada vetor um instante específico de tempo. A alça vetorcardiográfica do QRS é a composição de todos os
vetores instantâneos registrados durante a ativação ventricular, unidos entre si pelas setas. É a alça de maior magnitude, assumindo
aspecto alongado ou arrendondado. Quanto à leitura desse VCG, no plano horizontal, a ativação septal ocorre sempre na porção
anterior, iniciando-se pelo seu lado direito e seguindo à esquerda.
A ativação das paredes livres se mantém à esquerda, com um claro predomínio da localização da alça na parte posterior.
Isso se dá em acordo com a noção anatômica – no plano horizontal, o ventrículo esquerdo, de maior massa e, consequentemente,
maior deflexão no ECG, situa-se posteriormente ao ventrículo direito. Por conseguinte, acontece a ativação das porções basais dos
ventrículos, ainda na parte posterior do plano, mas já com uma orientação à direita.12
A Figura 15 representa, no plano frontal, a alça vetorcardiográfica completa da ativação ventricular, sua
correspondência com diferentes morfologias de complexos QRS e os três vetores resultantes, sendo cada vetor um instante
específico de tempo. A alça vetorcardiográfica é a composição de todos os vetores instantâneos registrados durante a ativação
ventricular, unidos entre si pelas setas. A leitura desse VCG, nesse caso, no plano frontal, destaca a ativação septal ocorrida sempre
na porção superior e à direita do plano, iniciando-se pelo seu lado direito e seguindo à esquerda e para baixo. A ativação das paredes
livres se mantém na parte inferior do plano, com um claro predomínio da localização da alça à esquerda, ainda que ela termine no
lado inferior direito. Isso se dá em acordo com a noção anatômica; no plano frontal, os ventrículos possuem uma grande parede
inferior situada acima e próxima ao diafragma. Posteriormente, acontece a ativação das porções basais dos ventrículos, ainda com
uma orientação à direita, na parte posterior do plano.10,12
De maneira geral, a alça do QRS se inscreve de modo simétrico, suave, sem trocas súbitas de direções. Em todos os
planos, a porção inicial e terminal da alça caracteriza-se por moderada lentificação na sua inscrição, particularmente por
aproximação dos cometas, que por vezes assumem morfologia de ponto. No plano horizontal, a inscrição é em sentido anti-horário
em 99% dos traçados, formando uma figura oval, elíptica ou triangular (Figura 16B). Como já mencionado, as forças iniciais estão
sempre com orientação anterior e voltadas para a direita. No plano sagital direito, comumente a inscrição é em sentido horário (95%
dos casos). No plano frontal, pode-se encontrar variação do formato das alças, com orientação em sentido horário em 60% das
vezes e 15% anti-horário. Podem ocorrer configurações de alça aberta e figuras em 8 em até 25% dos casos. O vetor máximo no
plano frontal varia de 0 a 90 graus (Figura 16A).9-12
A alça da onda T tem forma elíptica ou alongada, sendo seu ramo eferente bem mais lento que o ramo aferente. Em
indivíduos normais, a alça de repolarização ventricular situa-se dentro da alça de QRS e tem magnitude inferior a esta e maior que
a alça de P. O vetor máximo tem orientação inferior e para a esquerda, sendo a orientação para a frente comum no adulto, com
rotação da alça acompanhando a do QRS, ou seja, é no sentido anti-horário no plano horizontal, em sentido horário no plano sagital
e variável no plano frontal.

FIGURA 15. Alça vetorcardiográfica típica da ativação ventricular no plano frontal (I: inferior; S: superior; D: direita;
E: esquerda). Para fins de comparação e clareza didática, são incluídos, com a mesma notação das imagens anteriores, os vetores
da ativação septal (vetor 1), ativação das paredes livres (vetor 2), ativação das porções basais dos ventrículos (vetor 3). Também
são mostradas morfologias típicas de QRS nas derivações DI e aVF, ressaltando como cada deflexão se correlaciona com trechos
específicos da alça. Por fim, há a localização dos eixos e polaridades das derivações do plano frontal, tanto no corte anatômico
esquemático quanto na representação da alça vetorcardiográfica.

FIGURA 16. A: representação da alça do plano frontal, orientada em sentido horário, de morfologia ovalada, vetor
máximo em torno de 60 graus e aspectos do complexo QRS nas derivações clássicas; B: nota-se alça de QRS no plano horizontal
com rotação em sentido anti-horário e respectivos aspectos do QRS nas derivações precordiais.
ELETROVETORCARDIOGRAFIA
O avanço da tecnologia permitiu nos últimos anos que o eletrocardiograma e o vetorcardiograma fossem obtidos de
maneira rápida e simultânea, o que representou um ganho para o estudo das situações em que o eletrocardiograma não é totalmente
claro no diagnóstico, bem como o papel importante que o binômio ECG/VCG apresentam atualmente no estudo das doenças
cardíacas que, devido a mutações genéticas, envolvem canais e correntes iônicas. Com isso, a eletrovetorcardiografia representa a
soma das vantagens de ambos os métodos para o diagnóstico diferencial de patologias13 (Figura 17).
METODOLOGIA PARA A REALIZAÇÃO DO ECG
Deve-se realizar o ECG em decúbito dorsal horizontal, preferencialmente com paciente confortável sobre a maca e
com adequado preparo da pele. O registro utiliza 12 derivações: três bipolares dos membros (I, II e III), três unipolares amplificadas
(aVR, aVL e aVF), constituindo-se esse conjunto o plano frontal e seis derivações unipolares torácicas de V1 a V6, que formam o
plano horizontal. Ocasionalmente, podem ser utilizadas derivações especiais, para avaliação de infartos laterais (V7, V8 e V9),
infarto do ventrículo direito (V3R e V4R), de Lewis, Golub etc. A padronização adotada é da velocidade do papel a 25 mm/s e
calibração de amplitude (N) de 10 mm = 1 mV.

FIGURA 17. Aspecto de um estudo eletrovetorcardiográfico normal, combinando os registros do eletrocardiograma


e do vetorcardiograma simultaneamente.
ELETROCARDIOGRAMA NORMAL
Para a análise correta do ECG, deve-se sempre considerar a idade, o sexo e o contexto clínico de sua realização (Figura
18). No ECG, são analisadas as seguintes ondas e intervalos.
FIGURA 18. Eletrocardiograma de um homem de 40 anos, considerado dentro dos limites da normalidade para idade
e sexo.
ONDA P
Representa a ativação de ambos os átrios, com duração de 0,06 a 0,09 s (crianças) e 0,08 a 0,11 s (adultos). Apresenta
morfologia arrendondada, com amplitude de 0,5 a 2 mm, com eixo elétrico da onda P (SÂP) no plano frontal variando de –30 a
+90 graus, sendo comumente positiva em DI, DII, aVF e isodifásica em V1 (onda P de origem sinusal).
INTERVALO PR
Reflete o caminho do estímulo elétrico, das fibras musculares atriais, nó atrioventricular e início da despolarização
ventricular. É aferido do início da onda P ao início do complexo QRS, com duração em adultos de 0,12 a 0,20 s.
COMPLEXO QRS
Representa a ativação ventricular, com duração de 0,08 a 0,12 s, com morfologia variável com complexos do tipo rS,
Rs, qRs, QS, RsR’ etc. O eixo normal do complexo QRS (SÂQRS) de -30° a +130°, conforme o desenvolvimento corpóreo ao
longo da vida.
SEGMENTO ST
Definido como o intervalo entre o fim do complexo QRS (o chamado ponto J) e o início da onda T. Normalmente,
apresenta-se isoelétrico, com pequenos desníveis não superiores a 1 mm.
ONDA T
Representa a repolarização ventricular, tendo morfologia positiva, arrendondada e levemente assimétrica, com
amplitude não superior a 6 mm ou até 30% da amplitude do complexo QRS que a precede.
ONDA U
Deflexão pequena e arrendondada logo após a onda T, originada da ativação das células M.
INTERVALO QT
Medido do início do QRS ao final da onda T. Sua duração é maior em crianças e mulheres quando comparadas com
homens adultos. É inversamente proporcional à frequência cardíaca, de tal modo que o QT medido à frequência (QTm) deve ser
corrigido pela FC, utilizando-se fórmulas, como a de Bazett,15 na qual QT corrigido = QTm/RRo, com RR e QTm em segundos.
Quando o QTm > 500 ms e QTc > 460 ms, são considerados prolongados (QT longo). Os valores para o QTc variam com o sexo e
são aceitos como normais até o máximo de 450 ms para homens e 470 ms para mulheres. Para crianças, o limite superior do normal
é de 460 ms, sendo em contrapartida considerado como QT curto os valores menores que 340 ms.
Existem inúmeros achados eletrocardiográficos que são considerados variantes da normalidade,1,14 como os padrões
gerado pelos biotipos (brevelíneos com eixo horizontalizado ou para cima e esquerda no plano frontal e longilíneos com eixo
verticalizado ou à direita), a persistência do padrão juvenil de repolarização, repolarização precoce etc.
FONTE: Tratado de Cardiologia - SOCESP.
ELETROCARDIOGRAMA TEP
ELETROCARDIOGRAMA
O ECG pode apresentar-se de forma variada, ou seja, normal assim como cursar com achados inespecíficos dentre eles
a taquicardia sinusal e alterações no segmento ST em cerca de 70% dos casos. O padrão S1Q3T3 é altamente sugestivo, mas apesar
de ser considerado um achado clássico apresenta baixíssima sensibilidade.
ATENÇÃO! Fique atento! Algumas alterações eletrocardiográficas como bradicardia, fibrilação atrial, novo bloqueio
de ramo direito, ondas Q nas derivações inferiores (D2, D3 e AVF) e inversão da onda T indicam pior prognóstico em pacientes
com TEP.
FONTE: Tromboembolismo Pulmonar (TEP) – SANARFLIX – Disponível em:
https://www.sanarmed.com/tromboembolismo-pulmonar-tep-resumo-completo-yellowbook
ELETROCARDIOGRAMA
Os achados eletrocardiográficos são inespecíficos e incluem: alterações do segmento ST e onda T na parede anterior
(isquemia do ventrículo direito), arritmias atriais, bloqueio de ramo direito, baixa voltagem periférica, padrão pseudoinfarto (ondas
Q na derivação DII, DIII e aVF). O padrão clássico de cor pulmonale agudo (ondas S1Q3T3, ondas P pulmonale ou bloqueio de
ramo direito) é um achado mais raro17 (Figura 5).

FIGURA 5. Cor pulmonale agudo – S1Q3T3 e inversão da onda T na parede anterior.


FONTE: Tratado de Cardiologia – SOCESP.
INTERPRETAÇÃO
1. Ritmo regular, FC = 120
2. Intervalo PR-0,20ms
3. Morfologia da onda P normal
4. QRS de duração normal, mas com desvio do eixo para a direita e para frente (onda R ampla em V1). Notar a
presença de S amplo em DI, onda Q em DIII com onda T negativa em DIII, o achado de SI-QIII-TIII.
5. Alteração de repolarização ventricular simultânea na parede inferior e Antero-septal (T negativa em DII,DIII e AvF
e V1-V4).
6. Ritmo = Taquicardia Sinusal

FONTE: Medicina Net.


ELETROCARDIOGRAMA (ECG) NA EMBOLIA PULMONAR
O ECG mostra taquicardia sinusal, a uma frequência de 110 bpm, um S1Q3T3 e R = S em V1 em um paciente com
embolia pulmonar aguda comprovada.

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