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Emergência (internato) – Mariane Campos

DOR TORÁCICA

 Introdução:
 Doenças ameaçadoras à vida que se apresentam com dor torácica são:
o Síndromes aórticas: dissecção aórtica – dor intensa, lancinante, irradiação para dorso,
pulsos assimétricos e sinais neurológicos focais.
o Síndrome coronariana aguda: alterações típicas no ECG, sudorese, náusea/vômitos,
associação com esforço e irradiação da dor.
o TEP: dor súbita, pleurítica e TVP.
o Tamponamento cardíaco: dispneia, fadiga, desconforto torácico, edema e choque
cardiogênico.
o Pneumotórax hipertensivo: associado a trauma ou procedimento.
o Rotura esofágica (mediastinite): dor retroesternal lancinante, enfisema subcutâneo,
alcoolismo e vômitos.

 Abordagem inicial:
 Atendimento do paciente instável:
o Monitorização cardíaca.
o Oxigênio se SatO2 < 90%.
o Veia – acesso venoso periférico.

 Avaliação do paciente estável:


o Avaliar características da dor, se intensidade desproporcional ao quadro, irradiação,
tempo de instalação (súbito ou não), sintomas associados, associação com esforço,
sintomas associados como náuseas e vômitos, antecedentes e fatores de risco.
o Exame físico com inspeção local, avaliar simetria de pulsos, medir a pressão arterial nos
quatro membros, ausculta pulmonar e cardíaca, testar dor à palpação e pesquisa de
sinais focais neurológicos.
o ECG em todos os pacientes com dor torácica ou suspeita de equivalente anginoso em
até 2min de sua entrada no PS. Esse exame deve ser visto por um médico e avaliado em
até 10min de sua entrada.
 Equivalentes anginosos: dor epigástrica, dispepsia, dispneia, náuseas e vômitos,
sudorese, hipotensão e síncope. São mais comuns em idosos e mulheres.

 Síndrome Coronariana aguda (SCA):


 Constitui um espectro de diagnósticos de menor a maior risco, iniciando na angina estável,
progredindo por angina instável e IAM sem supra de ST até o IAM com supra de ST.
 Dor torácica com duração de 10 a 20 minutos, com localização retroesternal ou precordial,
com irradiação para ombro e face medial do braço esquerdo. Porém, essa dor típica ocorre
em 50% dos casos.
 Aumenta a probabilidade de ser uma SCA a presença dos seguintes sintomas:
o Associação da dor com esforço.
o Irradiação para um ou ambos os ombros: mesmo que seja só o direito.
o História de náuseas e vômitos.
o Sudorese: especialmente quando observada pelo enfermeiro da triagem ou médico.
 Os fatores de risco para coronariopatia clássicos são hipertensão, diabetes, dislipidemia,
tabagismo e história familiar de coronariopatia precoce (homem < 55 anos e mulher < 65
anos). No entanto, os fatores de risco isoladamente têm fraca associação com o diagnóstico
definitivo de SCA, então sua valorização deve ser feita quando junto com a impressão clínica.
Nenhuma combinação de sinais e sintomas é capaz de confirmar ou excluir completamente
a SCA.
 ECG: fornece pistas para alterações isquêmicas que sugerem infarto oclusivo ou não
oclusivo.
o A principal alteração que sugere infarto oclusivo é o supradesnivelamento de segmento
ST. A definição de IAM com supra de ST é:
 Elevação de 1 mm do ponto J em duas derivações contíguas. São derivações
contíguas DII, DIII e aVF (parede inferior); V1, V2, V3, V4, V5 e V6 sequencialmente
(parede anterior) e DI e aVL (parede lateral alta). Nas derivações V2 e V3 são
exceção, pois são necessários 1,5 mm em mulheres, 2 mm em homens acima de 40
anos e 2,5 mm em homens abaixo de 40 anos.
o No infarto sem supra (não oclusivo) ou angina instável, a isquemia leve pode se
manifestar como ondas T altas e apiculadas e é conhecida como isquemia
subendocárdica. A alteração é indistinguível de hipercalemia moderada. A evolução da
isquemia leva a ondas T negativas e simétricas, com o termo isquemia subepicárdica.
Essa alteração é bastante inespecífica, mas a alteração dinâmica apoia a etiologia
isquêmica. Finalmente, o grau maior de isquemia leva a infra de ST – lesão
subendocárdica.
 Biomarcadores de isquemia cardíaca:
o Troponina: começa a alterar 2 horas após o infarto e os valores atingem o máximo após
24 a 48 horas do infarto e voltam a valores basais após 5 a 14 dias.
 A troponina identifica o infarto agudo do miocárdio quando existe uma curva com
elevação e queda de seu valor. No caso de locais que dispõem apenas da troponina
convencional, a dosagem deve ser feita na chegada do paciente e após 3 horas.
 Como o tempo mínimo para detecção de troponina no sangue periférico após o
início dos sintomas é de 2 horas, caso o paciente se apresente muito precocemente
após o início dos sintomas, recomenda-se postergar a segunda dosagem até
completar 2 horas do início dos sintomas.
 Angina instável não provoca morte de cardiomiócitos e, portanto, não altera o
resultado de troponina; e condições como insuficiência renal, insuficiência cardíaca,
sepse, miocardite e outras podem provocar aumento de troponina.

Paciente A Paciente B
3h de dor 1h de dor
Triponina na entrada: 0,06 ng/mL Troponina na entrada: 0,035 ng/mL
Troponina após 3h: 0,73 ng/mL Troponina após 3h: 0,025 ng/mL
(aumento > 20%) (variação < 30%)
Referência de troponina: 0,04 ng/mL Referência de troponina: 0,04 ng/mL

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Nesse caso, houve variação > 20% - paciente Nesse caso, houve variação < 30% - paciente
de alto risco para evento coronariano de baixo risco para evento coronariano.

 Síndromes aórticas agudas:


 Dor torácica que normalmente irradia para a região posterior e o abdome, tem início súbito,
grande intensidade, sendo máxima desde o seu início e de caráter lancinante ou em pontada
e frequentemente descrita com “sensação de rasgão” com irradiação para região dorsal.
 O paciente apresenta PA elevada, assimetria de pulsos e PA entre os membros (diferença
maior que 20 mmHg na PAS), sendo de extrema importância a palpação dos pulsos e
aferição da PA nos quatro membros em pacientes com dor torácica no departamento de
emergência.
 Os sintomas secundários da dissecção aórtica resultam de oclusões dos ramos arteriais e
incluem AVE, IAM ou isquemia do membro.
 Fatores de risco: sexo masculino, idade superior a 50 anos, hipertensão mal controlada, uso
de cocaína ou anfetamina, valva aórtica bicúspide ou troca valvar aórtica prévia, doenças do
tecido conjuntivo (síndrome de Marfan e síndrome de Ehlers-Danlos) e gestação.

 TEP:
 Sintomas: dor torácica pleurítica súbita, dispneia, hipoxemia, síncope ou choque e pode
haver tosse associada, hemoptise, febre e edema ou dor nas pernas, e alguns pacientes
relatam dor na parede torácica.
 Achados comuns no exame físico incluem taquipneia, taquicardia e hipoxemia.
 Fatores de risco: cirurgia recente, trauma, imobilidade prolongada, câncer ativo, estrógenos
de pílulas anticoncepcionais ou terapia de reposição hormonal, principalmente se tabagismo
associado, trombofilias ou história de embolia pulmonar prévia ou trombose.
 PESI para descartar TEP em pacientes com baixa probabilidade no score de Wells.
 D-dímero normal em paciente hemodinamicamente estável de risco baixo a intermediário,
torna a embolia pulmonar muito improvável.
o D-dímero não deve ser solicitado em pacientes com alto risco.
 Angiotomografia de artéria pulmonar é usualmente o exame de escolha.

 Pericardite aguda:
 Dor torácica aguda, intensa e constante, com localização subesternal. A dor pode irradiar
para o dorso, pescoço ou ombros; piora deitado e por inspiração; e alivia sentando-se e
inclinando-se para a frente. A irradiação da dor para o membro superior esquerdo não é
incomum, mas o local mais característico é irradiação para região do trapézio, que é um
sintoma altamente específico para a pericardite.
 Algumas características merecem destaque:
o Dor aliviada com a inclinação do corpo para a frente e agravada pela posição de
decúbito.
o Os pacientes podem apresentar associadamente dispneia, febre ou taquicardia
desproporcional à temperatura corporal; também são descritos soluços nesses
pacientes.
o O exame físico em pacientes com complicações pode ser normal, mas o atrito
pericárdico está presente frequentemente na borda esternal inferior esquerda e é mais
bem auscultado com a inclinação do paciente para a frente. O atrito é dinâmico e pode
desaparecer e reaparecer.
o As bulhas cardíacas podem ser abafadas.
o Em até 15% dos casos os pacientes podem apresentar complicações; nesses casos,
podemos ter: pulso arterial paradoxal (diminuição > 10 mmHg na pressão arterial

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sistólica durante a inspiração), sinal de Kussmaul (distensão da veia do pescoço na
inspiração), distensão venosa jugular.
 Os achados clássicos do ECG são elevação difusa do segmento ST com infra de PR.

 Pneumonia:
 Dor torácica geralmente descrita como aguda, pleurítica e associada com febre, tosse,
produção de expectoração e, possivelmente, hipoxemia. A ausculta pode revelar sons
respiratórios diminuídos, estertores crepitantes ou sons respiratórios brônquicos nas áreas
de consolidação afetadas.
 Radiografia de tórax geralmente confirma o diagnóstico.

 Pneumotórax espontâneo:
 Dor torácica pleurítica de início súbito, aguda e com dispneia.
 Fatores de risco: tabagismo e doenças pulmonares crônicas, como asma e DPOC.
 Aproximadamente 1 a 3% dos pacientes com pneumotórax espontâneo evoluem para
pneumotórax hipertensivo.
 A ausculta pode revelar sons respiratórios diminuídos e hiper-ressonância à percussão no
lado ipsilateral. A taquicardia sinusal é o achado mais comum no exame físico e enfisema
subcutâneo pode estar presente. Outros achados clássicos ao exame físico, como murmúrio
vesicular diminuído, hipertimpanismo à percussão e ausência de frêmito toracovocal são
dependentes da extensão do pneumotórax e não costumam estar presentes em
pneumotórax pequeno. No pneumotórax traumático, o valor preditivo positivo da ausência
de murmúrio vesicular ipsilateral é de 86 a 97% para o diagnóstico.

 Patologias esofágicas e gastrduodenais:


 Os pacientes com ruptura esofágica apresentam uma história de dor torácica subesternal de
início súbito e acentuada após um forte vômito, geralmente tem também taquicardia, febre,
dispneia ou diaforese. O exame físico pode revelar crepitação no pescoço ou no tórax por
enfisema subcutâneo. A radiografia de tórax pode demonstrar um derrame pleural (mais
comum à esquerda do que direita), pneumotórax, pneumomediastino, pneumoperitônio ou
ar subcutâneo, embora a radiografia normal não possa excluir a ruptura esofágica.
 O espasmo esofágico é frequentemente associado à doença do refluxo e é caracterizado por
um início súbito de dor torácica subesternal apertada. A dor é frequentemente precipitada
pelo consumo de líquidos quentes ou frios ou um grande bolo alimentar e pode ser aliviada
por nitratos.
 Os pacientes com quadros dispépticos, seja de etiologia esofágica ou gastroduodenal,
apresentam dor epigástrica ou retroesternal, em geral em queimação, podendo ser
associada com náuseas, vômitos, regurgitação alimentar com alívio com uso de antiácidos
ou bloqueadores de bomba de prótons ou de receptores histamínicos H2 e podem piorar
com o decúbito. A úlcera péptica é classicamente descrita como uma dor pós-prandial na
região epigástrica. Os pacientes geralmente descrevem o despertar do sono pelo
desconforto. A dor da úlcera duodenal pode ser aliviada após a ingestão de alimentos,
enquanto a dor da úlcera gástrica é frequentemente exacerbada pela ingestão de alimentos.
Infelizmente, distúrbios gastrointestinais muitas vezes não podem ser diferenciados de
forma confiável da síndrome coronariana aguda apenas por história e exame físico.
 A pancreatite aguda e a doença biliar geralmente se apresentam com dor no quadrante
superior direito ou dor e sensibilidade epigástrica imitando quadro de angina de parede
inferior.

 Patologias superficiais:

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 A dor musculoesquelética da parede torácica é caracterizada por dor aguda, altamente
localizada e relacionada com a posição. A dor usualmente é completamente reprodutível por
palpação leve a moderada ou por movimentos específicos e pode ser aumentada por
inspiração ou tosse. No entanto, a sensibilidade da parede torácica também é relatada por
alguns pacientes SCA e embolia pulmonar.
 A costocondrite (síndrome de Tietze) é uma inflamação das cartilagens costais ou suas
articulações esternais e causa dor torácica que costuma ser aguda e frequentemente
aumenta com as inspirações.
 O herpes-zóster que acomete dermátomos precordiais pode simular a dor torácica.

 Dor psicogênica:
 As causas psicogênicas de dor torácica incluem o transtorno de pânico, que é caracterizado
por períodos recorrentes e inesperados de sensação de medo ou desconforto intenso com
pelo menos quatro dos seguintes sintomas: dor torácica, dispneia, palpitações, diaforese,
náusea, tremores, asfixia, tontura, medo de perder o controle ou morte, parestesia, calafrios
ou ondas de calor.
 Em um estudo, 25% dos pacientes no PS com dor torácica preencheram os critérios
diagnósticos para transtorno de pânico. Por outro lado, 9% dos pacientes identificados como
tendo transtorno de pânico foram diagnosticados com SCA na alta hospitalar. Isso significa
que o transtorno de pânico é, na melhor das hipóteses, um diagnóstico de exclusão ou um
diagnóstico que pode frequentemente ser associado com síndrome coronariana aguda.
 Deve-se ter cuidado em realizar o diagnóstico de transtorno de pânico em um paciente com
dor torácica no PS até uma melhor estratificação de risco, em geral com exames
complementares.

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